Notícias da Marioneta #8

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Notícias da Marioneta NM8 outubro 2022

O QUE CONTAM AS MARIONETAS? Marionetas e máscaras são criadas para contarem histórias e, animadas por quem as manipula ou usa, repetem gestos e movimentos em cada atuação. Que histórias estão na origem das peças do Museu da Marioneta? Que narrativas lhes dão vida?

museudamarioneta.pt



Um museu é sempre uma construção, uma ficção, onde se mostram Marcelo peças de diferentes realidades. Narrativas dentro da narrativa proposta pelo Museu, que por sua vez é percecionada e transmitida de infinitas maneiras pela diversidade dos públicos que visitam o museu. Uma história coletiva, em constante questionamento e construção, da qual todos somos protagonistas. Mais uma boa razão para voltar várias vezes ao mesmo museu.

O tema deste número 8 da NM são as narrativas às quais máscaras e marionetas dão forma. A imagem de capa, uma cabeça de búfalo selvagem que transporta nove animais alusivos à terra, ar e água, tudo esculpido numa só peça de madeira, foi produzida na região de Ségou, no Mali, no início do século XX, e conta-nos histórias do Sògobó, palavra que significa a “saída dos animais”. Se em contexto museológico vemos sobretudo a surpreendente peça escultórica, no seu contexto de origem esta máscara ganha corpo e vida. Manipulada por um ou dois dançarinos, integra um corpo em tecido. As atuações evocam os ciclos da natureza, onde cada animal convoca um espírito específico e assegura uma relação harmoniosa entre os humanos e os vários elementos da natureza.

Em novembro o Museu comemora 21 anos, festejados a 26 e 27. Dia 27, o último dia da exposição ANIMAIS, será assinalado com oficinas, visitas ao museu e uma finissage especialmente concebida para os mais novos. A exposição paralela Os animais saem da caixa, cujas obras integram o circuito permanente do Museu, é constituída por peças realizadas nas oficinas de verão pelos jovens artistas dos 6 aos 11 anos. Agora, é tempo de acompanhar durante uma tarde a vida no Museu. Vão poder partilhar o trabalho do conservador, do restaurador, retirar as peças das respetivas vitrines e fazer a sua embalagem para transporte, devidamente acompanhadas da folha de sala onde se encontra o nome do autor da peça.

Até dia 27 de novembro, pode ver a exposição ANIMAIS, onde máscaras e marionetas são a expressão visual de narrativas das mais variadas partes do mundo. Quando em ação, exprimem-se em palavras, textos, música e dança, e contam-nos histórias do Sògobó, do Ramayana, do Mahabharata, lendas do Sri Lanka e do Teatro Kolan, narrativas do Teatro Khon, diabladas da Bolívia ou histórias populares europeias e portuguesas. Na sua diversidade, todas estas histórias partilham desejos comuns: a busca de uma harmonia entre o homem e a Natureza, e a luta do bem contra o mal.

Em dezembro, a sala de exposições, que é também sala de espetáculos, encerra para obras. Concluída a intervenção em final de janeiro, a sala abrirá em fevereiro para mais uma edição da Monstra, o incontornável festival de cinema de animação, no âmbito do qual, pelo 16º ano consecutivo, haverá uma exposição temática no Museu da Marioneta.

Este trimestre será também a ocasião de voltar à sala das peças africanas, onde se expõem a partir de agora novas peças do Mali, da Coleção Francisco Capelo.

Outubro, novembro, dezembro. O último trimestre do ano é simultaneamente o primeiro trimestre do novo ano escolar e um período de trabalho intenso no Museu. O caderno com as atividades do Serviço Educativo do Museu da Marioneta, para o próximo ano letivo, já está disponível no Museu, em formato impresso, ou online, para quem preferir navegar nas ondas do intangível. Ana Paula Rebelo Correia Diretora


No mundo das marionetas Taiwan

Praga

Kasper em Taiwan

Mozart por fios

com outras marionetas de luva

milhares de vezes

Exposição

Espetáculo

Cerca de cem marionetas de todo o mundo reúnem-se numa exposição em Taiwan. O mundo na sua mão: uma exposição internacional de fantoches [The World On Your Hand: An Exhibition of International Hand Puppetry] pode ser vista no Yunlin Palm Puppets Museum e foi co-organizada pelo Instituto Potehi de Taiwan e por Dmitri Carter, diretor do Puppet Center em Seattle, Estados Unidos. A exposição abriu em setembro de 2022 e fica patente até março de 2023. Em destaque estão peças mexicanas feitas por Lola Cueto, uma das primeiras mulheres artistas do México. Viveu no início do século XX e, além da pintura, era também marionetista, dando seguimento a uma prática cultural levada até aquela região pelos colonizadores espanhóis. Outro ponto alto da exposição é o alemão Kasper (ou Kasperl), parente do Punch inglês, da família dos Robertos portugueses. Tal como os Robertos e Punch, Kasper era uma personagem cáustica, popular pela forma como aliava o humor a uma certa crueldade. Entretanto mais moderado, no século XX passou a ser conhecido pelo seu discurso didático. No Museu da Marioneta em Lisboa também há um Kasper na coleção – está na sala das marionetas europeias.

Don Giovanni, a conhecida ópera de Mozart, está, desde sempre, ligada à cidade de Praga, onde se estreou em 1787 no Teatro Nacional. Desde 1991 que está em cena e é protagonizado por marionetas de fios, no Teatro Nacional de Marionetas de Praga. Já foram feitas mais de cinco mil apresentações para público da cidade e para quem está de visita. Convém comprar os bilhetes com antecedência.

França

Proteger a arte da marioneta Património O Ministério da Cultura francês acaba de criar o selo “Centro Nacional da Marioneta”, atribuído a seis teatros, em diferentes regiões do país. Os lugares selecionados têm a missão de apoiar a criação e fabrico de peças, acolher companhias de teatro de marionetas, levar espetáculos à cena e acompanhar novas gerações de marionetistas.

Porto Kasper Autor: Harro Siegel Marioneta de luva Alemanha, meados do Século XX Madeira, tecido, metal Coleção Museu da Marioneta

Marionetas da Europa

Festivais de marionetas em Portugal FIMP – Festival de Marionetas do Porto Porto, 1 de outubro a 27 de novembro Manobras Várias cidades, 17 de setembro a 30 de outubro

Chegar por um clique ao universo das marionetas Coleções O acervo do Museu das Marionetas do Porto – e da Companhia de Teatro Marionetas do Porto – está agora disponível online para consulta. O projeto teve o apoio da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, através do Centro de Investigação Transdisciplinar “Cultura, Espaço, Memória”, e foi desenvolvido em articulação com o Mestrado em Museologia. Contou ainda com o financiamento da DGARTES através do Programa de Apoio em Parceria – Arquivos de Dança, Teatro e Cruzamento Disciplinar.


Na coleção de marionetas e máscaras do Museu da Marioneta há vários registos culturais: mais populares ou mais eruditos, baseiam-se em histórias reais ou imaginárias. As peças vindas do Oriente estão associadas a textos muitas vezes complexos e eruditos. As que são originárias de África são sobretudo usadas em narrativas contadas pela expressão corporal, na dança e música, muitas vezes sem estarem fixadas em texto. Marionetas chinesas Marionetas de luva China, ca 1960 Madeira, tecido, metal Coleção Museu da Marioneta Reservas

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TEMA - O QUE CONTAM AS MARIONETAS?

As histórias que contam as marionetas e máscaras As peças num museu estão fora do contexto para o qual foram produzidas. Olhando para elas em exposição, ou quando saem das caixas nas reservas, não sabemos como atuaram, em que narrativas foram personagens. Nas páginas seguintes contamos as histórias a que algumas marionetas e máscaras das nossas coleções estão associadas, recordando os momentos em que foram construídas e usadas.

“Horrivelmente belas” para a luta entre o bem e o mal Na Bolívia o Carnaval é uma assimilação de múltiplas tradições e festeja-se com histórias antigas que remontam às tradições do povo indígena. Os uros habitaram uma vasta região entre a Bolívia e o Peru antes da chegada dos europeus à América do Sul. As suas narrativas continuam a fazer parte da vida das pessoas daquela região. Segundo a lenda contada entre os uros, o semideus Wari saiu das profundezas da montanha zangado com o povo, para castigar as pessoas por terem abandonado o culto ao sol, na sequência da colonização espanhola. Foram então enviadas quatro pragas a este povo. Tinham a forma de animais monstruosos, um grande lagarto, uma víbora, um sapo, e formigas gigantes – cada uma atacando a região por um lado diferente. Nusta, uma divindidade indígena, intercedeu pelo seu povo. Assimilada na tradição cristã, deu origem à Virgem de Socavón.

A partir do século XVII, a Virgem de Socavón é venerada com grandes festejos estando na origem do que agora é o Carnaval de Oruro, um dos mais importantes da Bolívia. Nas máscaras do Carnaval de Oruro exprimem-se cinco séculos de miscigenações culturais, de cruzamento de crenças, de lendas e tradições locais, de mistura entre liturgia cristã e cerimónias indígenas. A dança diablada é uma das principais atrações das celebrações carnavalescas da Bolívia. Representa a luta do diabo com o arcanjo São Miguel, ou seja, a luta entre o bem e o mal. As pessoas vestem-se de diabos e as figuras dos quatro animais que representam as quatro pragas enviadas por Wari integram as máscaras usadas, numa iconografia exuberante de formas animais e cores berrantes fluorescentes. Fernando Flores fabricou máscaras já durante o século XXI, seguindo a tradição aprendida com o seu pai. Para este criador especializado em diabos, as máscaras tinham de ser “horrivelmente belas”.


Lagarto Máscara Bolívia Resina epoxídica e fibra de vidro, gesso, papel cartão, plástico, tintas sintéticas Coleção Francisco Capelo Reservas Peça da exposição temporária ANIMAIS (até de 27 de novembro)

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TEMA - O QUE CONTAM AS MARIONETAS?

Ntoolen (Calau de África) Marioneta de vara Ségou, Mali | Século XX Madeira policromada, latão martelado Coleção Francisco Capelo Marionetas e máscaras africanas

Aprender com os espíritos No Mali, onde a tradição do teatro de marionetas é muito forte, a origem das marionetas é explicada através de uma lenda que conta a história do pescador Toboji Canta, da tribo Bozo. Raptado pelos espíritos do rio, durante o tempo de cativeiro aprende com eles a arte das marionetas, como esculpir e dar vida às figuras de madeira. Depois de libertado regressa à sua aldeia, nas margens do rio Niger, e começa a ensinar esta arte. Impressionadas pela possibilidade de dar vida a seres que à partida eram inertes, e pelo poder de transformação destas personagens, as pessoas da tribo começam a fazer marionetas e máscaras. Nestas peças, geralmente manipuladas como se fossem “vestidas”, os conceitos de máscara e de marioneta fundem-se. A arte das marionetas alarga-se a outras tribos, mais ligadas à agricultura, como os Bambara, tornando-se parte integrante da cultura do Mali.

É difícil datar estas lendas. A referência mais antiga que se conhece de um teatro de máscaras e marionetas no Mali é do século XIV, contada pelo geógrafo árabe Ibn Battûta, que em 1355 é acolhido pelo imperador do Mali. Na corte assiste a uma representação onde os atores dançavam vestidos com plumas, com uma cabeça de pássaro com um grande bico encarnado, esculpida em madeira. Talvez um calau, como os que pode ver no Museu da Marioneta. Ainda hoje, numa época em que as máscaras e marionetas são produzidas em grande parte por associações, se considera que esculpir, dar forma a um ser, humano ou animal, apela a forças e energias poderosas e não pode ser feito por qualquer um. Geralmente estas esculturas são feitas por ferreiros, considerados os mais aptos a dominar da melhor forma o poder destas energias.


Dança macabra A relação com a morte é uma temática recorrente nas representações com marionetas. As narrativas sempre foram um bom recurso para se lidar com aquilo que não se conhece e atemoriza. Os diabos são personagens frequentes no teatro de marionetas. Na tradição europeia, destaca-se Fausto. Goethe, aliás, decide escrever o seu longo poema depois de ver um espetáculo de marionetas sobre Fausto. A personagem fixada em várias versões da lenda é baseada numa figura real, que viveu no final do século XV, início do século XVI. Um homem rico e poderoso, mas também descontente com a sua vida e que decide, por isso, fazer um pacto com o diabo. A ideia de comprometer o futuro da alma numa possível vida depois da morte em troca de conforto material ou de outro tipo na vida terrena chegou também ao teatro de marionetas português.

Viúva Carolina, esqueleto e diabo travestido Marionetas de fios Autor: Manuel Rosado Portugal, Século XX Madeira policromada, tecido Coleção Museu da Marioneta Robertos e marionetas de fios portuguesas

Manuel Rosado foi marionetista na primeira metade do século XX – e provavelmente o que mais tempo esteve em atividade em Portugal. Era considerado um bonecreiro popular, mas a qualidade reconhecida ao seu trabalho levou-o a trabalhar também com marionetas de fios, que escolhia quando o público dos seus espetáculos era mais erudito. Foi com esta técnica que Manuel Rosado criou uma história de pacto com o diabo protagonizada por uma mulher. A viúva Carolina, personagem principal do espetáculo Carolina na Ponta da Unha, também não se conforma diante da experiência próxima. Inconsolável por não poder voltar a dançar com o marido, faz um acordo com o Diabo, vendendo-lhe a sua alma. Como troca, ainda em vida, dançaria uma vez mais com o marido. A consumar o combinado, o marido falecido aparece na forma de esqueleto dançarino. A peça tinha um enorme sucesso: a dança macabra provocava as gargalhadas na audiência. No Museu da Marioneta pode ver a viúva Carolina, o marido esqueleto e o diabo, curiosamente, vestido de mulher. NM8 outubro 2022 P9


COLEÇÃO

Mareet Marioneta de vara Tailândia, séc. XX Madeira policromada, tecido, gesso, plástico, vidro, bambu Coleção Francisco Capelo Reservas Peça da exposição temporária ANIMAIS (até de 27 de novembro)

Mareet é um demónio que para conseguir atingir os seus fins, se transforma em veado dourado. Surpreendidos na floresta pela sua beleza, os caminhantes seguem-no sem desconfiar de que se trata de um ser maléfico. Este é apenas um pequeno elemento da complexa narrativa do Ramakien, versão tailandesa do épico hindu Ramayana. A história, com múltiplas peripécias, conta as aventuras de Rama, condenado ao exílio durante 12 anos. Divindades, demónios, espíritos maléficos, homens e animais confrontam-se numa luta entre o bem e o mal, que culminará com o resgate da princesa Sita e do seu encontro com o príncipe Rama. Proveniente da Tailândia esta marioneta de vara é, como o nome indica, manipulada através de uma vara de bambu que permite movimentar a cabeça e os braços. Representa uma personagem com um toucado em forma de cabeça de veado dourado – – o demónio Mareet. A posição das mãos e dos dedos, a maquilhagem do rosto, indicam que se trata da representação de um ator, que por sua vez representa uma personagem de ficção. A originalidade destas marionetas, produzidas com muito cuidado e minúcia, é justamente o facto de representarem atores do teatro Khon com os respetivos toucados que os identificam como protagonistas do Ramakien. Temos assim um teatro de marionetas que representa uma narrativa não diretamente através das personagens dessa narrativa, mas através da figuração em marionetas dos atores do teatro Khon, forma de teatro muito exigente e complexa, de grande popularidade na Tailândia.


OUTRAS COLEÇÕ S

The Story Museum O museu das histórias As histórias contam-se, ouvem-se, circulam. Podem ser fixadas em livros, filmes ou outros meios que ainda havemos de descobrir. Mas como se faz um museu de histórias? Em Oxford, o Story Museum tem objetos que pertenceram a escritores e lhes serviram de inspiração, primeiras impressões de livros feitos à mão, exemplares autografados, esculturas inspiradas por personagens de livros. Coisas reais que deixam a vontade de entrar numa viagem pelo universo ficcional – este é o convite deste museu tão particular. Além disso, como outros museus, recolhe, conserva, expõe. E, claro, interpreta e cria momentos em que a leitura acontece, em que uma história faz sentido para quem a ouve ou lê. Para quem está distante de Oxford, o Story Museum também tem histórias para contar. Online é disponibilizada uma coleção de histórias – 1001! – de diferentes tempos e lugares, para pessoas com vários interesses e idades. São histórias em formatos e géneros diversos: contos tradicionais, rimas, poemas, canções, peças de teatro, filme, bandas-desenhadas, programas de televisão e até jogos. Na exposição há espaços e abordagens para vários gostos e interesses, em experiências mais ou menos imersivas, dependendo da vontade. Pode escolher-se o lugar de leitor ou chamar a si o papel principal e ser o protagonista de uma aventura. É um museu muito visitado por crianças, em famílias ou grupos, mas destina-se a pessoas de todas as idades. A visão que guia a equipa do Story Museum é enriquecer vidas, especialmente as vidas dos mais jovens, através das histórias. Têm a missão de conseguir isso colecionando boas histórias e partilhando-as das melhores formas neste museu invulgar.

The Story Museum 42 Pembroke Street Oxford, Reino Unido storymuseum.org.uk/

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A vida no Museu


A VIDA NO MUSEU

Entender o diabo O Museu da Marioneta alberga um conjunto de oitenta e cinco máscaras reunidas pelo colecionador Francisco Capelo. Oriundas de oito países da América do Sul (Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador, Guatemala, México, Paraguai e Peru), estas máscaras foram maioritariamente produzidas no século XX e XXI e usadas durante festas coincidentes com o Carnaval. Estas máscaras, por enquanto conservadas nas reservas do museu, estão agora a ser alvo de uma investigação sistemática. Trata-se de conhecer melhor este património, tanto do ponto de vista iconográfico e etnográfico, como também material, para preservá-lo de forma adequada e expô-lo futuramente.

Foi neste âmbito que Raúl Rodrigues, mestrando em Conservação e Restauro, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, fez um estágio de seis meses no Museu da Marioneta com o objetivo de estudar três destas máscaras. As três representam o diabo. Se o diabo, à partida, não tem uma aparência definida, é uma figura assumidamente sobrenatural e poderosa, e por vezes terrífica quando associada, no imaginário coletivo, à representação do mal e do inferno. Nos casos em estudo, o diabo é retratado com feições humanas, mas com chifres, orelhas pontiagudas, olhos terríveis e dentes aguçados, em que dominam as cores fortes do vermelho e do preto. Não obstante a semelhança dos traços, as máscaras possuem uma volumetria, acabamentos e expressões bem diferentes, que se pretende que sejam comparados, porque cada figurino pode resultar da fusão de muitas crenças e de culturas distintas, com práticas performativas e significados particulares a cada comunidade local. As três máscaras foram escolhidas porque provêm da Colômbia, do Equador e do Perú, tendo, portanto, sido criadas em territórios diferentes, com modos de fazer próprios, e usadas dentro de tradições e costumes que lhes são específicos. Cada representação do diabo teve a sua razão de ser e pretende-se entendê-la. As três máscaras partilham uma outra característica que interessa aprofundar, que é de terem sido produzidas com base na técnica dita de papier mâché. Esta é uma tipologia

material assaz frágil e pouco estudada cientificamente, o que torna este estudo proveitoso do ponto de vista da sua conservação. Perante a qualidade destes artefactos, muitas questões ficam por responder, a nível autoral, material e tecnológico, e ainda no âmbito da antropologia cultural e social. Por quem foram feitas estas máscaras? Em que contexto “oficinal”? Foram produzidas em série ou individualmente? Que técnicas foram empregues para lhes dar a forma que têm, e que materiais e tintas, para a policromia que ostentam? Em que momento, dança ou desfile participaram estas máscaras? Com que simbologia? Quem as envergou? Havia requisitos especiais para as usar? Havia outros elementos (como um traje) associados a cada máscara? Foram envergadas mais do que uma vez? Podem ter sido adquiridas sem terem tido qualquer uso? O desafio é mesmo esse: investigar e descortinar muitos dos aspetos tangíveis e intangíveis inerentes àquelas personificações do diabo.

Raúl Rodrigues e Agnès Le Gac Departamento de Conservação e Restauro Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa

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A vida no Museu

Marionetas para contar as histórias das marionetas São poucas as histórias realmente inventadas. Muitas das marionetas do Museu foram criadas para contar histórias ancestrais, as narrativas a que estão associadas foram recriadas por outros universos. Nos filmes e séries Anime (animação produzida no Japão) podemos reconhecer lendas que circulam há muito. É o caso do épico oriental Ramayana, escrito 300 anos antes de Cristo: o cabelo da personagem Son Goku (série Dragon Ball) lembra as representações do demónio Thosakan, com várias cabeças, à entrada do Museu da Marioneta. Pedro Valente começa muitas das suas visitas associando estas duas figuras. Trabalha há oito anos no Serviço Educativo do Museu da Marioneta e procura usar referências que as crianças e jovens possam reconhecer. Cria assim um ambiente para a descoberta acontecer. Com adultos, recorre ao humor para quebrar o gelo inicial. Além destas ferramentas, Pedro conta com um companheiro de longa data, fabricado por si: Rex, o segundo, é um dinossauro que substituiu um outro misteriosamente desaparecido. Os mediadores do Serviço Educativo constroem o seu kit de marionetas que usam em visitas e oficinas e escondem

em recantos estratégicos. Com estas peças desenvolvem diferentes técnicas e confirmam como as marionetas são também elementos de mediação. Pedro guarda a memória do dia em que um destes “ajudantes” garantiu a ligação a um grupo de pessoas com transtornos do espectro do autismo. Pareciam não prestar atenção ao que dizia e quando começou a usar a marioneta Stewie (personagem da série Family Guy), a comunicação aconteceu – experimentou-se verdadeiramente o poder da marioneta para vencer barreiras. Na equipa de Serviço Educativo do Museu há pessoas com formações muito diversas: turismo, belas-artes, design, arquitetura, museologia. Pedro Valente estudou design, no IADE, instituição vizinha do Museu. Trabalhou como freelance noutras áreas, mas a experiência de trabalho com crianças em atividades de férias pode explicar o sucesso que tem com o público mais jovem. Recentemente, criou uma versão marioneta de Rick (série Rick e Morty), a nova companhia de Pedro e Rex II.


A VIDA NO MUSEU

Bonecos de Santo Aleixo a fechar o ano Nos últimos meses do ano os Bonecos de Santo Aleixo vão fazer parte da vida do Museu. Beniko Tanaka é estudante do Mestrado em Educação Artística (Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa) e estagia no Museu. A aluna estuda os Bonecos de Santo Aleixo e acompanha as atividades do Serviço Educativo. A sua passagem pelo Museu tem o seu ponto alto na última na Manhã Criativa do ano, uma oficina criada a partir da cena do baile dos anjinhos destas marionetas. Esta oficina para famílias tem duas sessões: na tarde de dia 17 e na manhã de dia 18 de dezembro. Entretanto, aguardamos a companhia de Évora na sala de espetáculos do Museu no próximo ano. Bonecos de Santo Aleixo

Fotografia de Paulo Nuno Silva Marionetas do CENDREV

Próximos meses Depois da exposição ANIMAIS – coleção Museu da Marioneta | coleção Francisco Capelo, que pode ver até 27 de novembro, a sala que acolhe exposições temporárias e espetáculos vai finalmente fechar para obras. As portas continuam abertas, o Museu a receber visitas e a equipa de Serviço Educativo a criar novas oficinas e projetos.

Levar para casa a experiência no Museu

À VENDA J DO NA LOA MUSEU DA MARIONETA

Virgininha e primas Réplicas dos Bonecos de Santo Aleixo Realizadas por Dina Nunes

Muitas vezes, depois de se visitar um Museu, fica-se com vontade de continuar a ver as peças, lembrar as histórias que contam, saber mais sobre o que se viu. Na loja do Museu da Marioneta pode encontrar catálogos das exposições aqui realizadas, posters, sacos, cadernos, teatros de papel, fantoches feitos por marionetistas portugueses, marionetas de vara feitas na Indonésia. Uma grande parte do que vendemos são produtos exclusivos. As novidades vão chegando, vale a pena ir passando para conhecê-las e ver, mais uma vez, a exposição do Museu. NM8 outubro 2022 P15


Em breve O Museu da Marioneta faz 21 anos Celebramos o aniversário do Museu da Marioneta com um fim de semana de atividades inspiradas na Exposição ANIMAIS e na vida do Museu. Há uma visita orientada e uma oficina para descobrir mais sobre as peças. Na visita-jogo O Museu Secreto damos a conhecer uma parte da vida do Museu raramente visível ao público. Venha conhecer ou revisitar o Museu e festeje connosco.

Sábado, 26 de novembro

Domingo, 27 de novembro

Exposição ANIMAIS

Animalário

11h00

10h30

Visita com Ana Paula Rebelo Correia

Manhã Criativa

Descobrir as peças da exposição com a diretora do Museu da Marioneta

A partir de desenhos vamos colecionar animais e criar as mais extraordinárias criaturas.

Adultos - e crianças a partir dos 8 anos / 6€ Duração: 60 minutos

Famílias - crianças dos 6 aos 12 anos 6€ (um adulto e uma criança) Duração: 120 minutos

15h00

O Museu Secreto Visita-jogo

Onde estão as peças que não estão à vista no Museu? Famílias (crianças a partir dos 8 anos) 6€ (um adulto e uma criança) Duração: 60 minutos

A ent rada é livr no do e ming o duran te todo o dia .

Mais informações e reservas museu@museudamarioneta.pt

museudamarioneta.pt

/ museu_marioneta

Museu da Marioneta Direção Ana Paula Rebelo Correia (diretora), Maria Carrelhas (adjunta de direção) Comunicação Margarida Ferra Centro de Documentação Rita Luís Serviço Educativo Ana Rita Mateus , Filipa Camacho, Joana Braz, Margarida Archer, Pedro Valente, Rafael Alexandre Secretariado Filipa Machado, Maria Teles Loja/Bilheteira Diogo Ferreira, Luís Condeço, Sara Gertrudes Produção, Luz e Som Rui Seabra


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