Catálogo Exposição Temporária "A Alma do Colecionador"

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A Alma do Colecionador - Museu de Arte Sacra de S達o Paulo - 2015 ISBN: 978-85-67787-10-7

curadoria:

Isabella Blanco e Jorge Brandao

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Museu de Arte Sacra de S達o Paulo Avenida Tiradentes, 676 - Luz - S達o Paulo - SP - cep: 01102-000 t +55 11 3326-3336 www.museuartesacra.org.br



A Alma do Colecionador 2015

Isabella Blanco e Jorge Brand達o

Curadoria:


Inovar e ousar são duas palavras bastante utilizadas, por exemplo, em áreas como administração e comunicação. Nos últimos anos, porém, esses termos têm adquirido novos usos nos museus da Secretaria da Cultura do Governo do Estado de São Paulo. A exposição que o Museu de Arte Sacra traz agora à população paulista é claro exemplo de estratégia criativa de explorar novos limites e fronteiras no fazer museológico. Ainda que a razão primeira da existência de um museu seja exibir coleções, por que não fazê-lo de maneira a aumentar a fruição do público?

Os seguidos recordes de visitação contabilizados recentemente pelos museus da Secretaria da Cultura são provas irrefutáveis de que os nossos equipamentos têm respondido de maneira satisfatória a pergunta acima. Portanto, é com satisfação que apresentamos mais esta “coleção” à população que, temos certeza, terá tanto prazer em visitá-la quanto o Museu de Arte Sacra teve em realizá-la. Secretaria da Cultura Governo do Estado de São Paulo


O que inspira, move, conduz os colecionadores a constituir suas coleções? O que desejam eles recolher, resguardar, zelar e revelar aos outros com seus objetos, peças, testemunhos? O Museu de Arte Sacra se debruça, nesta exposição, sobre a arte do colecionismo, ou ainda, sobre a alma do colecionador... prática e personagem que, desde um passado muito remoto, reuniram e zelaram por conjuntos inestimáveis e incontáveis de itens; conjuntos cujo valor se desdobrou, antes de tudo, da arte dos colecionadores de conferir sentido às coisas. O mundo destes personagens e práticas parece ter encontrado sua melhor expressão nos Gabinetes de Curiosidade do Renascimento Europeu (séculos XVI e XVII). Tempo no qual o alargamento das técnicas e das fronteiras culturais tornou possível perceber no outro, um outro universo de significados. A arte de atribuir sentidos às coisas, presente no olhar apaixonado sobre os objetos mais corriqueiros, acabou por se transformar numa arte de encantamento das coisas. Esta exposição nos permite compartilhar um pouco das suas paixões. José Oswaldo de Paula Santos Presidente do Conselho de Administração

Os Gabinetes de Curiosidades, onde se reuniam objetos dos mais variados, evolui para coleções voltadas para um só tema que, ao mesmo tempo, alegravam a alma daquele que as colecionava, levando-o a pesquisar, adquirir e trocar, de forma a tornar sua coleção maior e mais preciosa. Conduziam, também, para a memória preservada daquele tema, possibilitando à gerações futuras conhecer um pouco do passado. Com a inauguração do Museu do Louvre, as pessoas físicas colecionadoras passam a ter como companhia instituições, ora abrangentes ora especificas, vez que um museu, sem dúvida, é um grande colecionador. O Museu de Arte Sacra é um daqueles específicos, como o próprio nome indica. Porém, nada mais interessante do que abrigar esta mostra “A Alma do Colecionador”, exibindo coleções primorosas sobre os mais variados temas. Estes colecionadores que nos honram com sua presença lhes darão uma belíssima ideia, principalmente através de suas observações no catálogo, de como se sente um colecionador e de como é leve e bela sua alma. Bem-vindos e desfrutem da exposição! José Carlos Marçal de Barros Diretor Executivo


Colecionar para que É fato que a maioria dos nossos museus foi pensada a partir de coleções; eles poderiam ter sido justificados pelas idéias. Mas, considerando a origem das coleções, são elas que remontam a um dos desejos mais fortes e antigos da humanidade: o desejo de perpetuação. Pensando nessa linha, se os museus tem como função primeira a preservação, é legítimo considerar que as coleções habitem as casas de memória. E considerando a salvaguarda das obras, é preciso ir um pouco além da conservação para que a missão dos museus se efetive. A instituição museal, de fato, nos permite propor e estabelecer um processo aberto entre o colecionismo e os novos caminhos de uma museologia contemporânea. Entre as diretrizes da UNESCO (United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization, organismo máximo da humanidade para a cultura, ciência e educação), através do ICOM, (Internacional Council of Museums, criado para nortear as políticas internacionais e ação científica dos museus), consta que a preservação nas instituições museológicas deve se dar associada aos propósitos de fruição e educação, inclusive por vias não formais. Na intenção, então, de

exercer plenamente sua função de museu, o Museu de Arte Sacra de São Paulo buscou colecionadores para, em meio a eles, selecionar vivências e escolhas frente a inúmeras facetas dos objetos de desejo. Nós cumprimos com nosso papel, e para o deleite do público, apresentamos o glamour e a alma de colecionadores, através destes testemunhos da cultura material. Regozijem-se. Sem dúvida temos um grupo reduzido e diverso, com acervos significativos que capitaneados por Isabella e Jorge, nos trazem um recorte do que pode o homem, com sensibilidade, extrair de sua vivência diária, e transformar em legado, para gerações vindouras, suas coleções. Aparentemente são singelas experiências que, em meio à visão do colecionador, se transformam e assumem, com vigor, um caráter preservacionista. Mas, é preciso lembrar: nós vivemos tempos de crimes de guerra contra acervos da humanidade. Mais do que nunca, preservar é preciso! Maria Inês Lopes Coutinho Diretora Técnica


Um dos slogans mais antológicos da história da propaganda dizia que, na sofisticada loja de departamentos inglesa Harrods, era possível encontrar de tudo: de uma agulha a um avião. Guardadas as proporções, é o que imaginamos oferecer ao público, em nossa exposição ‘‘A Alma do Colecionador”. Do mais inesperado item até o objeto mais comum ao universo do colecionismo, nossa ideia foi a de reunir aqui uma pequena amostra do que desperta o desejo de se iniciar, formar e manter uma coleção. No momento da curadoria, nosso olhar não se voltou somente ao que tinha valor de mercado, sob o ponto de vista de arte ou de antiquariato. Procuramos, sim, abrir espaço para as mais variadas coleções, fossem elas históricas, artísticas, lúdicas, curiosas ou sui-generis. Cada colecionador foi convidado a apresentar um pequeno recorte de seu acervo, ao mesmo tempo em que nos revelaria o porque de colecionar tal item, histórias deliciosas contadas aqui neste catálogo. O inglês - talvez o povo que mais cultiva o colecionismo -, costuma dizer que “beauty is in the eye of the beholder” (a beleza está nos olhos de quem vê). O que pode parecer banal para alguém, pode não ser para mim, ou para você. E vice-versa. Certamente, muitos

sairão daqui se perguntando o que faz um cidadão colecionar objetos no formato de abacaxi. Portanto, acreditamos que, ao contemplar toda gama de coleções em nossa mostra, a missão de incentivar e divulgar o ato de colecionar será cumprida. E, quem sabe, chegaremos a compreender, um instante que seja, a alma do colecionador e o prazer que esta prática encerra. Isabella Blanco Curadora

Quantos adjetivos podemos expressar ao contemplar coleções. Entendo que inúmeros... porém, para citar dois entre tantos: interessante e curioso... apreciei, admirei muitas coleções, todas me instigam e certamente me intrigam. Sendo assim, permanecem permeando minhas lembranças. Em algum momento, alguém me pergunta: colecionas algo? Olhares! – respondo, os quais passeiam e passearam por coleções alheias, talvez para desvendar a “A alma de colecionador”. Jorge Brandão Curador


Museu de Arte Sacra

(numismática e anjos) Numismática - Medalhas, moedas e barras de ouro A coleção de medalhas papais do Museu de Arte Sacra de São Paulo prima pela raridade, importância e representatividade. Abran­ ge mais de dez séculos de história. São produzidas no Vaticano em metais nobres e trazem, de um lado, a figura do Pontífice, e do outro, algum símbolo ou alusão ao seu papado. Já moedas brasileiras repre­­ senta um importante patri­mô­ nio cultural. Temos em prata, bronze e ouro significativas peças, com destaque para os dobrões, certa­ mente as mais importantes moedas cunhadas na numismática. Foram produzidas com ouro proveniente do Sudeste do Brasil, no auge da mineração do século XVIII, o conhecido ciclo do ouro. Mais raras nos acervos paulistas que mineiros, as barras desse período representam verdadeiros objetos de desejo pelas características históricas que lhes conferem as marcações, além, evidentemente, do tom dourado original, que faz bem aos olhos e doura a alma.

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Museu de Arte Sacra de São Paulo


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s anjos fazem parte da corte celeste. O Antigo e o Novo Testamento, e a Angeologia, apresentam diferentes versões da hierarquia desses seres. Existem, entre eles, os querubins, conhecidos rostos de anjos, e os arcanjos, que têm São Miguel como representação máxima. A arte era um importante recurso didático na conversão dos gentios no período da América Colonial. Vários remanescentes desse período são encontrados no acervo do MAS. Segundo estudiosos, a grande quantidade de imagens de anjos da época era usada como representação para os nativos, uma forma de fugir ao tempo e à história. As manifestações de pudor na arte, onde os anjos aparecem cobertos por panejamentos, deixam claro a influência tridentina na América. São raros os serafins, anjos adultos, que tinham o sexo esculpido. Do ponto de vista técnico, a maioria das peças foi confeccionada em madeira policromada ou barro, e raras obras em pedra e metal. As imagens de Nossa Senhora muitas vezes são acompanhadas de querubins.

A Alma do Colecionador

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Agnelo Pacheco

(corujas)

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m 1980, Agnelo ganhou sua primeira coruja da agência carioca Premium, que tinha como estratégia presentear uma coruja por ano, pra dar sorte quando completassem 7. No terceiro ano, percebeu que simpatizava com corujas e começou a coleção. Hoje, tem cerca de 700 peças. Dentre elas, há uma de palha, que foi trazida por um amigo da China, quando ainda era Comunista. Quando abriu sua agência de publicidade, levou as corujas para lá, e acredita que elas trouxeram muita sorte à empresa. Muitas delas foram presentes, pois a coruja se tornou seu “marco”. Todas elas tem o nome de quem deu, o ano e de onde veio. Uma das peças mais importantes é uma coruja feita com peças de relógio pelo pai de um amigo que era relojoeiro, uma coruja completamente diferente. E por esta nutre um carinho especial, devido ao cuidado com que foi feita. Há outra, dentre as preferidas, que foi desenhada por Clodovil, quando o estilista e apresentador o entrevistou, assim como uma pintura do artista plåstico uruguaio Villaró, com dedicatória.

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Coruja de vime, origem China Comunista (sĂŠculo XX)

Coruja de vidro e arame (sĂŠculo XX)

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Alice Carta

(Caixinhas de prata e porcelana)

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sta bela e delicada coleção tem origem familiar, já que a primeira caixinha pertenceu a seu pai, da importante manufatura russa Fabergé, de prata e esmalte guilloché. Outras vieram quando a mãe de Alice se mudou para casa dela. A partir de então, a coleção cresceu por meio de aquisições e presentes de amigos. Guardada num armário de madeira e cristal, ela conta hoje com mais de 400 peças de diversos estilos, acabamentos e épocas.

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Peça de prata e fragmento de porcelana oriental (século XX)

Caixinha russa Fabergè, a primeira da coleção Prata (século XIX/XX)

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Alysson Camacho

(Perfumeiros)

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beleza de um frasco de vidro fabricado no começo do século XX estimulou o jovem Alysson a conhecer e se aprimorar no estudo dos perfumes. Colecionador até então de fotografias e câmeras fotográficas antigas, foi a descoberta do perfume como portador de sensações sofisticadas o que o levou a reunir, no curso de várias décadas, uma coleção de cerca de 3.000 vidros centenários e contemporâneos, de procedências e tradições diversas. O primeiro do acervo era um vidro do perfume Lizard, da Coty, produzido entre 1910 e 1920 e cujo design o encantou pois evocava a natureza, com duas lagartixas na tampa. Sem assinatura, descobriu depois ser um Lalique. Entre peças raras como a primeira edição do “Chanel no.5”, da década de 1920, Alysson coleciona também vidros com figuras de mocinhas românticas da Avon, típicos dos anos 50 e 60 e dos quais tem quase 400 exemplares. Para ele, o colecionismo de frascos de perfume pode ser organizado de várias maneiras: por tema, período, manufatura ou procedência. Ele, coleciona de tudo. Desde caixas para talco e borrifadores, tubos de lança-perfume até garrafas de 1/2 litro, utilizadas para acondicionar água de colônia.

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Vidros de perfumes de cristal frost, manufatura Lalique (primeira e segunda metade do sĂŠculo XX)

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Anne Colesanti

(bonecas)

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artista plástica Anne Colesanti iniciou sua coleção há 40 anos, quando esbarrou numa boneca do princípio do século XX feita de louça, num antiquário em São Paulo. A partir daí, foi uma seqüência de “encontros” com bonecas de época, adquiridas em viagens, feiras de antiguidade e antiquários, além das que foram presenteadas pela família e amigos. Com mais de 60 em sua coleção, é ela quem cuida e limpa cada uma, bem como das roupinhas e acessórios. “Não deixo ninguém mexer porque são peças delicadas e podem quebrar”, defende Anne. Em seu acervo, encontram-se bonecas alemãs, francesas, russas e orientais, todas com seu traje original ou, pelo menos, com as roupas o mais similar possível à época de fabricação do brinquedo. Apesar de a coleção encontra-se espalhada por toda a casa e ao alcance dos netos, vale observar que é a avó quem nutre a maior paixão por ela.

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casal de bonecos indianos (segunda metade do sĂŠculo XX)

Boneca russa (primeira metade do sĂŠculo XX)

A Alma do Colecionador

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