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VICE-VERSA Léa Freire e Teco Cardoso

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CARTAS

CARTAS

LÉA FREIRE COMENTA SOBRE TECO CARDOSO

“Mistura da elegância da forma erudita com o suingue e a simplicidade da música popular.” Teco Cardoso

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Foto: Kristian Knack

Conheci o Teco Cardoso quando ainda não tínhamos 20 anos, no Clam – escola dirigida pelo Zimbo Trio –, onde inicialmente entrei para estudar violão com o saudoso Luiz Chaves. O Teco é dessas pessoas unânimes: impossível não gostar dele. Ficamos amigos desde então. A gente  cava estudando no Clam as partituras que o Teco trazia, enquanto ele, que na época também fazia um curso de mágica, desaparecia com borrachas, canetas e o resto que estivesse à mão. Nessa época eu dava aulas de  auta, solfejo e violão… pois é!

Fui para os EUA, onde  quei um ano e meio e, na volta, encontrei o Teco já tocando muito bem o sax num grupo chamado ZonAzul, com o Michel Freidenson no piano, Sylvinho Mazzuca no baixo e AC Dal Farra na bateria. Ia sempre assistir aos meninos num bar chamado Sanja, na Rua Frei Caneca, em São Paulo.

Fiquei chapada com essa novidade de tocar sax em tão pouco tempo! Ainda mais porque ele estava cursando medicina quando fui viajar e acabou se formando médico no mesmo período. O melhor: manteve aquele sonzão de  auta, apesar de estar tocando sax, coisa que não é comum.

O ‘Tecão’ tem uma capacidade fantástica de ser disciplinado sem perder o humor! E ainda por cima cozinha um monte, é um verdadeiro chef. Como consegui uma vaga na família, sou madrinha do  eo,  lho do Teco e da Mônica Salmaso. Tenho a sorte de me dar bem, frequentemente, nas refeições maravilhosas na casa deles no bairro da Aclimação, em São Paulo.

Sem o Teco, o meu CD Cartas Brasileiras não existiria. Ele produziu do começo ao  m, desde a escolha do repertório (eu deixava gravações de piano na secretária eletrônica dele, uma verdadeira mala sem alça…), ideias sobre os arranjos, a arregimentação de pessoas-chave, como o maestro Gil Jardim, produção das gravações no estúdio, capa, títulos, tudo. O Teco sempre acrescenta, assim como fez no DVD/CD Jobim Sinfônico, na Banda Outro Negro, do saudoso maestro Moacir Santos, e no CD/DVD Um Sopro de Brasil, entre outros. Todos os projetos onde ele estiver na  cha técnica têm uma ‘garantia de qualidade’.

Músico, médico, mágico, chef. Acho as quatro atividades muito parecidas em seus aspectos humano e de saúde. A medicina e a culinária por motivos óbvios, a mágica porque produz encantamento, rejuvenesce a gente, e a música… Música faz bem para a saúde. Primeiro para a saúde do músico, depois, se o músico é bom, para a saúde dos ouvintes. Tecão, sou sua fã!

Lá pelo meio da década de 1970, os melhores músicos e futuros também, assim como o melhor da cena musical paulista, estavam ao redor do Clam (Escola do Zimbo Trio). Lá fui ter aulas ainda bem jovem, com uma igualmente jovem  autista, Léa Freire. Na segunda aula, a Léa já havia decidido que não ia mais ter “esse negócio de aula” e que sim, estudaríamos juntos e, como morava bem perto da escola, quase todo  m de tarde ia pra lá e líamos de tudo. Sem dúvida este foi o ano em que mais aprendi música na vida.

Duas semanas após começar a estudar com a Léa no Clam, nós já estávamos tocando juntos num grupo de jovens promissores músicos que acompanhavam o compositor/cantor Filó Machado.

O que sempre me fascinou foi a personalidade forte dela, presente no seu som e nas suas composições, aliada a um lado delicado e feminino. Compositora da pesada, daquelas que aliam a tradição e a brasilidade a uma coisa contemporânea, que ao mesmo tempo nos aponta para um futuro possível e também ideal. Mesclando com maestria suas in uências eruditas e populares, Léa compõe hoje uma música ímpar, daquelas difíceis de ser comparadas. Tem uma coisa de ser simples de ouvir, mesmo sendo às vezes complicada de tocar, e uma alquimia que até então só havia conhecido na obra do maestro Moacir Santos. Uma mistura da elegância da forma erudita com o suingue e a simplicidade da música popular. Com essa mistura, ela vem agregando uma legião de fãs, sobretudo internacionais, que cada vez mais querem tocar sua música. Foi com imenso prazer e com muita honra que produzi seu último projeto, Cartas Brasileiras, CD que acabou proporcionando um panorama da amplitude da obra dela, ao mesmo tempo que reúne o melhor de uma geração de músicos de São Paulo.

Como improvisadora, cada vez mais me parece que ela está compondo um comentário sobre a música, dispensando clichês preconcebidos e criando sempre uma história sem nunca perder contato com o assunto da composição.

Parceira mais do que generosa, tem produzido com o selo musical Maritaca um importante segmento da nova música instrumental brasileira.

Atualmente estamos envolvidos na produção de um novo quinteto, Vento em Madeira (às vezes sexteto, com a participação especial da cantora Mônica Salmaso), grupo que pode bem ser um exemplo dessa tendência de fazer uma música popular e erudita, improvisada e estruturada, camerística e com um pouco das ruas também.

Léa é família, literalmente. Madrinha de meu  lho, irmã de coração, parceira de todos os sons. Um verdadeiro privilégio estar ao seu lado em tantas aventuras, e que muitas venham ainda, porque agora é que está  cando ‘bem bom’.

Foto: Dani Godoy

“O ‘Tecão’ tem uma capacidade fantástica de ser disciplinado sem perder o humor!” Léa Freire

TECO CARDOSO COMENTA SOBRE LÉA FREIRE

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