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CAPA

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Arte sem limites A Sax & Metais conversou com Gerald Albright, saxofonista e baixista que já atuou como sideman e hoje trabalha como artista-solo

Tocar com músicos do calibre de Quincy Jones, Whitney Houston, Phil Collins, Anita Baker, entre muitos outros, não é para qualquer um. Atuar ao lado desses nomes tocando mais de um instrumento é tarefa para Gerald Albright.

Com mais de 30 anos de carreira, o músico conta como deixou seus trabalhos de sideman para investir em carreira-solo, técnicas de estudo do saxofone, diferenças de sonoridade, trabalhos como ator e muito mais. Por Rogério Nogueira e Débora de Aquino | Fotos Divulgação

» Fale um pouco sobre seu início na música. O que o motivou ao estudo da música?

Gerald Albright Comecei aos 8 anos, aprendendo piano. Toquei por cerca de um ano e, por ser tão jovem, não estava muito interessado. Queria saber mais de esportes e de brincar com os amigos. Após esse tempo, meu professor me colocou para aprender saxofone. Foi interessante para mim, porque é um instrumento para soprar, apertar chaves, enfim, mais interessante para uma criança. Acabei me apaixonando, toquei por todo o meu tempo de escola até a faculdade e vem sendo uma parte da minha vida desde então. Sinto como se estivesse apenas começando, mesmo já tocando há mais de 40 anos. Ainda há muito para aprender, muitas canções para escrever. Depois aprendi a tocar contrabaixo. Foi por volta de 1978. Com a música, pude me sustentar.

» Qual a importância de um instrumento harmônico, como o piano, na formação de instrumentistas de sopro?

GA Considero muito importante, porque o piano é como o ‘pai’ de todos os instrumentos harmônicos. Qualquer coisa que vá fazer, como produzir um disco ou escrever uma música, é comum começar pelo piano. O tempo que passei aprendendo a tocar o instrumento ajudou a sentir as habilidades que passei mais tarde para o saxofone. Ainda toco piano de vez em quando, escrevo algumas músicas e coisas assim. É muito útil no sentido de descobrir o que se pretende fazer harmonicamente. É um importante instrumento para sentir a música.

Como foi o início no saxofone e qual foi o primeiro (alto, tenor, soprano)?

GA Comecei pelo sax alto. Comprei o primeiro sax de meu professor. Ele to

O que Gerald Albright usa

• Saxofone: Cannonball GA5 Alto • Boquilha: Beechler Hard Rubber • Palheta: Rico Reeds

Criativo: aprender a tocar todos os tipos de sax tornou Albright versátil em vários estilos

cava com esse sax no exército. Meu pai negociou com ele e acabou comprando. Toquei alto por alguns anos. Quando estava na faculdade, adquiri um sax tenor, comprado também pelo meu pai. Daí parti para o soprano. Mais tarde toquei flauta, um pouco de clarinete e, finalmente, o baixo.

» Em sua opinião, quais são as principais semelhanças e diferenças entre os saxofones alto, tenor e soprano? Qual prefere?

GA Meu preferido é o sax alto, pois é o instrumento que toquei a maior parte da vida. As pessoas me conhecem pela sonoridade no alto, embora eu ame todos os outros saxofones. A diferença, acredito, é que cada saxofone tem seu próprio som, sua própria voz, que agrega uma variedade. Algumas músicas tocadas em alto não soam tão bem em um tenor e vice-versa. Aprender a tocar todos os tipos de sax me deu uma variedade e um número de opções para usar de acordo com o que acho necessário. Sei quais tipos funcionam melhor para determinadas situações. Mas se tiver de escolher, minha primeira opção é o alto.

» Conte como aprendeu a tocar baixo.

GA Inspirei-me para tocar baixo por conta de Louis Johnson, que fazia parte do grupo Brothers Johnson, que Quincy Jones estava produzindo na época, cerca de 20 anos atrás. Ele era um dos meus baixistas preferidos naquele tempo, e ainda é. Tive a chance de vê-lo ao vivo com o Brothers Johnson e ele me impressionou a ponto de eu fazer uma promessa: quando tivesse dinheiro, compraria meu próprio contrabaixo e aprenderia a tocar. Durante a faculdade, acabei comprando de um amigo. Aprendi a tocar sozinho. Nunca tive um professor de contrabaixo. Mas aprendi muito observando e ouvindo outros baixistas, que acabavam me dando dicas sobre o instrumento. Eles foram meus professores, mesmo não me dando aulas formais. Sempre toquei com baixistas que puderam me ensinar muito.

» É verdade que certa vez substituiu o baixista em uma turnê de que participava? Como foi?

GA Estava em turnê com Patrice Rushen e o baixista dela na época era Fred Washington. Ele já tocou com Michael Jackson e outros. Mais ou menos na metade de nossa turnê de verão, ele recebeu um telefonema de sua produtora convocando-o para a participação em um projeto. Patrice Rushen precisava arrumar outro baixista e comentei com ela que eu tocava baixo também. Já estava participando da turnê tocando saxofone, mas pensei: “Bem, se você fizer audições para arrumar outro baixista, eu gostaria de participar”. Ela disse que tudo bem. Quando chegamos a outra cidade, toquei um pouco na passagem de som. Estava estudando o material dela na turnê e fiquei muito confortável com as músicas. Estava confiante o suficiente para a audição. Ela gostou do que ouviu e acabei finalizando a turnê tocando baixo. Fiquei muito empolgado, pois agora eu era o baixista da turnê de Patrice Rushen. Isso me ajudou a conseguir outros trabalhos mais tarde. Toquei com Rodney Franklin e Anita Baker, entre outros.

» Durante um bom tempo você foi sideman de diversos artistas, como Quincy Jones, Whitney Houston, Phil Collins. Como surgiram os primeiros convites para atuar nesse segmento? Que trabalhos você destacaria como mais importantes?

GA Todas as experiências que tive como sideman dos músicos que citou foram maravilhosas. É difícil escolher um ou definir o mais importante. Fiz diferentes coisas com cada um deles. Ter a oportunidade de estar no mesmo estúdio com Quincy Jones e aprender como ele faz álbuns é algo que me ajudou muito como músico e compositor. Estive na estrada com Whitney Houston por três anos. Toquei para multidões com ela. Todas essas experiências me permitiram aprender mais sobre a indústria musical e minha metodologia de trabalho. Todas são especiais para mim.

» Depois de toda a projeção conquistada como sideman, fale um pouco sobre seu disco-solo de estreia. Como foi essa transição?

GA Estava em uma turnê com Anita Baker, tocando contrabaixo, em Long Island, Nova York, nos EUA. Estávamos fazendo o show e eu não sabia que Sylvia Rhone, da Atlantic Records, estava na plateia. Ela me procurou depois do show, pois havia ficado impressionada pelo fato de eu tocar saxofone e baixo com Anita. Perguntou se eu possuía alguma demo ou algo gravado como artista-solo. Depois disso conversamos

5 discos favoritos de Gerald Albright

Cannonball Adderly Work Song Grover Washington Jr. Mister Magic S tevie Wonder Songs In The Key Of Life John Coltrane Giant Steps Gerald Albright Sax For Stax

e expliquei quais eram minhas pretensões para gravar um álbum. Acabamos assinando um contrato e isso mudou minha vida. Gravei sete discos pela Atlantic Records.

» Qual é a diferença entre um saxofonista sideman e o saxofonista solista? Como deve ser o comportamento do músico nos distintos trabalhos?

GA É bem diferente. Sendo líder de uma banda, você precisa assumir mais responsabilidades. Como sideman, apenas fazia meu trabalho como músico. Hoje preciso estar com os cheques em dia, pagar meus músicos, trabalhar com meu empresário. Existem muito mais responsabilidades, principalmente para se manter em um meio tão competitivo como o da indústria musical. Preciso ter a consciência de que tenho que oferecer ao meu público a melhor música possível. É preciso muito tempo e energia para compor músicas, desenvolver conceitos e reinventar a mim mesmo constantemente. Estou nesse meio há mais de 30 anos, mas ainda consigo fazer os dois tipos de trabalho. Recentemente, trabalhei no programa de televisão American Idol como sideman. As responsabilidades aumentam, mas eu gosto, porque a música é minha paixão.

“É preciso saber como sentar e conversar com empresários e fazê-los saber o que você deseja exatamente de sua carreira”

» O que pode dizer aos saxofonistas mais jovens?

GA Bem, nesse estágio de minha carreira, realmente gostaria de incentivar a todos os mais novos, pois são eles que irão ‘carregar a tocha’ para que a música continue. Meu conselho é que pratiquem bastante, desenvolvam sua própria sonoridade. Uma coisa é se espelhar em outro músico e adaptar certos conceitos dele. Outra é simplesmente copiar outro saxofonista. Ninguém quer isso, pois esse tipo de som já existe. Aconselho também a manter contato com outras pessoas, enviar seu cartão, sua demo ao máximo de pessoas que conseguir. Fazer com que os outros saibam que você está na ativa. Montar sua reputação. Preste atenção tanto no lado dos negócios quanto no lado musical. Saiba corretamente que tipo de contrato irá assinar, essas coisas. É preciso saber como sentar e conversar com empresários, advogados etc. e fazê-los saber o que você deseja exatamente de sua carreira. Se conseguir juntar tudo isso ao mesmo tempo, terá grandes chances de sucesso nesse meio.

» Qual é o melhor estudo para as high notes, uma de suas características mais marcantes?

GA Praticar as high notes, ou altíssimo, é algo que faço há muitos anos e não se desenvolve da noite para o dia. Os mesmos exercícios que se costumam usar nas notas regulares podem ser usados no altíssimo. Tudo gira em torno da memória muscular. Quando pratico, geralmente começo nas notas mais baixas e vou fazendo todas as oitavas. Quando seu cérebro decora o tipo de pressão que necessita fazer na boquilha, as coisas ficam mais fáceis. Vai das oitavas, passando pelas escalas, e com o tempo você sugestiona seu cérebro a saber qual a pressão necessária a fazer na boquilha para que a nota saia limpa e forte. É um processo longo, não é algo que exista em algum livro específico. Muito depende do tipo de sax que você possui. Existem variações em diferentes saxofones alto e é preciso saber como tirar o melhor som de cada um. Determinada nota funciona melhor em um sax alto do que em outro.

» Quem foram suas principais influências? O que tem ouvido ultimamente?

GA Minhas influências são John Coltrane, Earl Bostic, Stanley Tarantine, Charlie Parker, Grover Washington Jr. Adoro o jeito como Kirk Whalum toca. Estamos em turnê juntos há alguns meses e é maravilhoso dividir o palco com alguém que você realmente admira como músico. Ele é famoso pelo seu jeito de tocar o sax tenor, eu sou mais conhecido por tocar alto e há um contraste interessante no palco. Esses que citei são os que costumo ouvir e que continuam me inspirando como músico.

» Além de saxofonista, você é produtor e até ator, já tendo atuado em diversos programas de TV. Como essas atividades se complementam?

GA Nunca tentei fazer apenas uma coisa. Gosto de me expandir. Quando tenho a oportunidade de fazer algo diferente, como atuar em frente a uma câmera de TV, aceito o desafio. Tive o prazer de atuar em diferentes programas de televisão, como o seriado Melrose Place, The Arsenio Hall Show e Different Worlds, entre outros, além de programas esportivos. Gosto de misturar e tentar expandir minha carreira o máximo que posso, pois nunca se sabe no que você é bom se não tentar. O mesmo vale para o meu trabalho como produtor. É uma experiência muito agregadora poder trabalhar com outros aspectos da música e composição. Pegar algo que começou com apenas algumas notas ou uma batida de bateria e transformar em música. É como criar uma criança. Ela cresce e aprende mais e é assim com a música também.

» Seu trabalho mais recente é Sax for Stax e você afirma que foi um dos trabalhos mais divertidos que já fez.

GA Sim, foi muito divertido para mim. É um dos meus trabalhos preferidos. Foi legal porque tive a chance de tocar músicas que amo há muitos anos, como de Isaac Hayes e Johnnie Taylor, entre outros. É um tipo de música muito viável ainda. Fiquei feliz pelos mais jovens ainda apreciá-las, pessoas com 16 e 17 anos. Foi ótimo trabalhar com tantos músicos que admiro, uma experiência memorável.

“Os mesmos exercícios que se costumam usar nas notas regulares podem ser usados no altíssimo. Tudo gira em torno da memória muscular”

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