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A súplica de Cristóvão da Silva Ribeiro

A presença dos militantes no Chile teve um problema nodal para a VPR, que foi a ação de Cabo Anselmo e sua ação no meio dos militantes. Como esse caso envolve a Chacina de Recife, trataremos dele em capítulo separado.

A súplica de Cristóvão da Silva Ribeiro

Santiago do Chile se tornaria lugar de resistências, esperanças, reencontros e novas tristezas. Dentre os militantes que se deslocaram para lá, há aqueles que não conseguem, por problemas individuais, pessoais, seguir na luta. E dentre estes, há um caso de arrependimento que vale a pena acompanhar. Quando recai sobre a militância a desconfiança sobre Cabo Anselmo, ela se estende também a James Allen Luz: “não existem mais dúvidas, entre os asilados brasileiros em Santiago, de que [eles] sejam agentes policiais, havendo contra Anselmo uma ordem de execução”. E no mesmo documento, se diz que

O banido Cristóvão da Silva Ribeiro está sendo considerado ‘homem acabado’, entre os asilados brasileiros: não quer mais nada com o trabalho e está desiludido com tudo, o mesmo acontecendo com sua mulher. Suspeita-se que esteja também a serviço da polícia brasileira.14

Um informe do Cisa traz informações sobre ele. Ex-soldado da aeronáutica, serviu na AFA de 1959 a 1961 e começou sua militância no Colina. A partir de julho de 1969 teria se “profissionalizado na VPR, passando a receber NCr$300,00 para sua manutenção, sendo que a organização pagava o aluguel de seu “aparelho”. O relato traz a lista das ações das quais ele participou, indicando os nomes dos demais participantes. Ele foi preso, seu depoimento foi tomado pela FAB, em data imprecisa de 1970. Ele foi um dos banidos em janeiro de 1971, constando da lista dos trocados pelo embaixador suíço. Aproximadamente um ano após sua chegada em Chile, “dirigiu-se ao Consulado do BRASIL em SANTIAGO, em 18/2/1972, dizendo-se arrependido e pedindo para regressar ao BRASIL”. O documento informa que a esposa de Cristóvão estaria enferma, com suspeita de câncer. Supõe-se que ele tinha ação militante, pois “o

14 Chile. Asilados brasileiros. Informe B-1. CIEX, Difusão para SNI e outros, 21/2/1973.

marginado solicitou às autoridades consulares brasileiras o maior sigilo acerca de sua decisão, alegando medo de seus companheiros residentes no CHILE”.15 O documento ainda informa que ele pedia ao governo brasileiro passagens para ele, sua esposa e duas filhas poderem voltar ao Brasil. A DSI-MRE pede um parecer do SNI sobre o caso, o que não localizamos na documentação se foi realizado ou não. Está claro pelas anotações manuscritas que o mesmo foi encaminhado para outras instâncias. Além do teor do documento ser relevante, pois se trata de um militante que se arrepende e tenta voltar com a família para o Brasil, mesmo tendo sido banido e o Brasil vivendo a mesma ditadura, o ex-militante entrega junto uma carta, manuscrita, dirigida ao ditador de turno, “exmo sr Emilio Garrastazu Médici”. A carta segue:

Sabedor dos esforços que V Exa e o povo brasileiro vem realizando no sentido de tornar nosso país no gigante de fato da América Latina, venho por meio desta pedir a V. Exa autorização para incorporar-me nessa tarefa que é de todos nós brasileiros. Presidente, eu sou um dos banidos, que foi trocado pela vida do embaixador da Suíça. Claro que cometi erros e estou disposto a pagálos. Eu quero olhar nosso país e vê-lo na sua juventude e dinamismo, na sua beleza e grandeza, com toda riqueza natural que nos oferece para uma existência digna e feliz. Vamos dedicar nossa inteligência, nossa capacidade e nossas energias para o desenvolvimento, para a prosperidade das nossas coisas, do nosso patrimônio social, cultural e econômico. (...) Ficaria extremamente grato e feliz se recebesse de V. Exa esta resposta: sejam bem vindos todos estejam conosco para juntos empreendermos a trajetória ascendente do progresso brasileiro. (...) Confiante no seu bom acolhimento à presente, aguardo um breve pronunciamento.

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Não temos mais dados sobre Ribeiro, mas a situação era dramática. Não sabemos se ele estava durante este um ano no Chile exercendo tarefas de apoio ao CIEX, não encontramos mais dados neste sentido além do informe do CIEX. O fato é que ele abandonou o barco da luta da VPR e se mostrava arrependido, “disposto a pagar pelos erros”, e sobretudo, voltar

15 Pedido CRISTÓVÃO DA SILVA RIBEIRO, 18/2/1972, Difusão ao SNI. 16 Carta, manuscrita, de Cristóvão Ribeiro para Médici, Santiago, 7/2/1972. Sublinhados feitos provavelmente pelo agente do Consulado.

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