Roxie Rivera - Her Russian Protector #7 Kostya

Page 1



Tradução: Gisele/Higia/Hera/Isis/Artemise/Inari/Cibele Revisão Inicial: Higia/Hera/Cibele Revisão final: Cibele Conferência: Mitra Formatação: Kytzia/Cibele Disponibilização: Grupo Rhealeza Traduções

08/2019



Depois de um encontro às cegas que se tornou um pesadelo, a cabeleireira Holly Phillips jura que renunciará aos homens. O único problema com esse plano? Seu vizinho misterioso e pecaminosamente sexy, Kostya, que surgiu das sombras e a salvou naquela noite fria e assustadora. Ex-agente secreto Russo e atualmente na máfia Kostya Antonovich vive sua vida com uma regra importante: não se envolver. Mas quando as mentiras que cercam o nascimento de Holly começam a se desenredar, a única escolha de Kostya é quebrar essa regra e quebrá-la com força. Ele usará todas as ferramentas da sua sinistra bolsa preta para proteger Holly de um esquadrão da morte do cartel e do notório agente da KGB que escapou de uma prisão russa para buscar sua vingança. Por ela, ele arriscará tudo.


CAPÍTULO UM Nada trazia um sorriso mais rápido ao meu rosto do que a tagarelice de clientes felizes e os cabelereiros alegres. Enquanto eu girava um pincel através da fórmula semipermanente que tinha acabado de misturar, olhei além da minha cliente sentada na seção de tinturas e me inclinei para a esquerda para ter uma visão melhor do andar de cortes. Quatro clientes estavam nas cadeiras, sorrindo e conversando enquanto seus cabelereiros cortavam e penteavam. —Então, você quer começar o arco da sua sobrancelha direita aqui. —Savannah falou, segurando uma escovinha em um ângulo contra o rosto de uma mulher. —Eu gosto de seguir a forma natural da sobrancelha e arrancar o mínimo possível depois de aparar. —Posso pegar outra bebida para você? —Billie, nossa gerente de relações com os clientes, planava de bancada em bancada, checando os clientes e oferecendo bebidas. Recolhendo uma toalha molhada ocasional ou uma garrafa de água vazia enquanto se aproximava das bancadas. A trança escama de peixe descendo pelas costas parecia fantástica e tinha sido incrivelmente popular na conta do Instagram do nosso salão hoje. Satisfeita com os sorrisos e as fofocas, voltei minha atenção para os produtos químicos cuidadosamente misturados que eu havia preparado para outra cabelereira aplicar. Nisha, a cabeleireira mais popular do nosso salão, estava terminando de cortar o cabelo, então decidi mantê-la na ordem dos seus compromissos. Embora eu misturasse cores várias vezes ao dia, sempre checava minhas fórmulas antes de pintar um fio de cabelo na cabeça de um cliente.


Uma má aplicação de tintura feita no banheiro durante o verão entre meu primeiro e segundo ano do ensino médio havia me ensinado aquela lição dolorosa e embaraçosa. Às vezes eu não conseguia acreditar que a garota que havia transformado o cabelo em violeta e depois em um tom de verde antes de ir a um salão com o rabo entre as pernas era agora a especialista em cores mais bemsucedida da cidade. Eu coloquei a tigelinha de produto no carrinho com os outros suprimentos e empurrei-o em direção à cliente de Nisha. Hannah tinha quase a mesma idade da minha mãe, mas os anos não tinham sido muito gentis com ela. O estresse havia corroído sua autoconfiança e deixado para trás os sinais reveladores nos cantos da boca e dos olhos. Ela sorriu timidamente para mim, quase como se temesse fazer ou dizer a coisa errada, e eu sentia por ela. Como todas as mulheres em nosso salão nesta tarde de domingo, Hannah veio aqui como parte de um programa que oferecemos a pessoas que sofrem violência doméstica e vivem em abrigos para sem-teto. Bianca Bradshaw e sua mãe organizavam gentilmente um bazar de roupas usadas no salão de comunhão de sua igreja, que fornecia a essas mulheres desde peças básicas para recomeçar, quanto vestimentas para o trabalho. Nós fornecíamos a coloração de cabelo, cortes, penteados e serviços básicos de spa, como design de sobrancelhas para mulheres que precisavam de um pouco de autoconfiança impulsionando o ânimo ou uma nova aparência para prepará-las para a procura de emprego e as novas vidas que estavam tentando construir. Elas saíam com uma sacola de presentes e vouchers para dois anos de serviços gratuitos. Um dia de beleza não resolveria seus problemas ou curaria as feridas que a violência e a falta de moradia tinham infligido, mas eu gostava de pensar que a curta fuga que fornecíamos era um breve alívio e um pouco de felicidade. Para as mulheres que procuravam emprego depois de anos desabrigadas ou sob os cuidados de


cônjuges controladores, eu esperava que isso lhes dessem uma nova autoconfiança. Eu queria que essas mulheres soubessem que eram bonitas e dignas e tinham todo o direito de ir atrás do futuro que mereciam. —Você gostaria de outra xícara de chá antes de eu começar sua coloração? Hannah puxou a gola de sua capa e balançou a cabeça. — Estou bem. —Está muito apertado? —Eu toquei a capa. —Eu posso ajustar. —Não, está bem. —Suas mãos imediatamente caíram para o colo. —Vamos verificar, por via das dúvidas. —Eu poderia dizer que a capa estava incomodando, mas ela não ia me dizer que estava desconfortável. Eu não queria nem imaginar o inferno que ela suportou que a deixou sentindo que não deveria nem mesmo expressar algo tão simples quanto seu desconforto. —Às vezes essas capas ficam um pouco desgastadas nas beiradas e arranham a pele. Quando tirei a capa, avistei uma cicatriz grossa ao longo do seu pescoço, logo acima da gola de sua camiseta. Era uma ferida antiga que não cicatrizou bem e parecia bem avermelhada. Eu tive uma sensação terrível de que ela mesma havia cuidado da lesão, provavelmente para manter o abuso que sofria em segredo. Não querendo chamar atenção para algo que obviamente a deixou desconfortável, eu menti. —Sim! É uma capa desgastada. Deixe-me pegar uma diferente, ok? Eu tirei a capa que ela estava usando e troquei por uma diferente na gaveta da bancada de tinturas. Peguei uma toalhinha


também e enfiei-a ao longo da gola da capa como forro. —Como está? —Muito melhor. —Ela conseguiu dar outro sorriso. — Obrigada. —Sem problemas. —Com seu conforto assegurado, coloquei um par de luvas pretas descartáveis, peguei um pente e comecei a partir o cabelo para aplicar a tintura. Não querendo que ela se sentisse pressionada a falar, preenchi o tempo falando sobre as recentes aventuras de minha mãe decorando a casa que comprara recentemente. —Vamos fazer uma pequena viagem até o Round Top para o festival de antiguidades no próximo mês. Mamãe está à procura de uma cristaleira, um aparador e algumas luminárias. —O que seu pai acha de toda essa renovação e compra de antiguidades? —Hannah parecia genuinamente curiosa e talvez até um pouco preocupada. —Soa muito caro. —Eu não tenho pai. —Era uma admissão que achava fácil de fazer agora, mas houve um tempo em que eu morria de vergonha e constrangimento por não ter pai para me dar um nome ou me reivindicar como sua. Hannah olhou para mim e franziu a testa. —Todo mundo tem um pai. —Quero dizer, claro, tecnicamente, tenho um pai por aí em algum lugar, mas não o conheço e duvido que ele me conheça. —Isso deve ter sido difícil para sua mãe. —Não foi fácil, mas ela encontrou um jeito de equilibrar sua carreira e ser mãe. Ela sempre me colocou em primeiro lugar, mesmo que isso significasse que tinha que ficar até tarde da noite, depois que eu estava na cama, para resolver as coisas do trabalho.


—Ela parece obstinada. Eu ri enquanto considerava minha mãe cabeça-quente. — Essa é a mamãe. —É bom saber que você teve um modelo como esse. — Observou Hannah em voz baixa. —Minhas filhas... Quando sua voz sumiu, eu não sabia se eu deveria perguntar sobre elas ou deixar para lá. Felizmente, Nisha me salvou de ter que tomar essa decisão, aparecendo na bancada de tintas que estávamos usando e me batendo com seu quadril. Alta e cheia de curvas, Nisha mostrava seu senso de moda matador com um vestido preto nocauteante, combinado com um cinto prateado e muitas joias azul turquesa, grandes e grossas. Eu invejava seus sedutores cachos escuros e sua silhueta encorpada. Nisha parecia incrivelmente sexy sem muito esforço. Nossos clientes a amavam e sua agenda tinha seis semanas cheias com compromissos. Sem Nisha, Savannah e eu nunca seríamos capazes de fazer do Allure o que ele era hoje. Eu mal podia esperar para ver o rosto de Nisha na manhã de Natal, quando a surpreenderíamos com uma parte do salão como nossa terceira sócia. Ela mais do que merecia. —Obrigada por me ajudar a cumprir o horário. —Nisha disse enquanto colocava um par de luvas. —Eu assumo a partir daqui para você poder ajudar nossa última cliente. Eu cuidadosamente entreguei o pincel que estava usando e tirei minhas luvas. Certifiquei-me de avisá-la quando comecei a aplicação da tinta antes de sair da seção de tinturas para a área de espera, onde nossa última cliente do dia aguardava. Uma jovem mulher estava sentada na recepção com as mãos presas entre os joelhos. Ela usava um vestido estampado mal


ajustado com um cardigã azul-marinho muito grande que parecia ter sido retirado de uma caixa de doações. Não deixei de observar que ela havia escolhido um assento que lhe dava uma visão clara da porta da frente e a deixava de costas para a parede. Ela parecia nervosa e com medo, então decidi me mover devagar e lhe dar algum espaço. —Olá. —Eu afastei algumas revistas e sentei-me no pufe de couro branco em frente a ela. —Eu sou Holly Phillips, e vou ser sua cabelereira hoje. Ela levantou o olhar das mãos presas entre os joelhos e fiquei surpresa. Nós éramos tão parecidas! Mesmos olhos, narizes e bocas. Seu cabelo era mais comprido do que o meu e mostrava os sinais reveladores de uma tentativa malsucedida de clareamento caseiro. Nós definitivamente teríamos que corrigir isso durante a nossa sessão. Como se visse a estranha semelhança entre nós, ela sorriu. Quando falou, as palavras eram estranhas para mim. Russo, eu percebi. Era uma língua que eu estava ouvindo mais e mais em torno do salão. Nossa clientela tinha mudado um pouco depois que Erin Markovic apresentou Vivian Kalasnikov aos nossos serviços. Todos nos círculos sociais de seus maridos queriam uma hora aqui agora. —Eu sinto muito. Eu não falo russo. —Eu me desculpei. — Nosso massagista que fala não está aqui hoje. —Percebendo que ela provavelmente não tinha entendido uma palavra que eu dizia, parei de falar. Como diabos eu poderia trabalhar no cabelo dela se não pudéssemos nos comunicar? —Meu nome.... —Disse ela hesitante e com ênfase em cada palavra, como se experimentasse pela primeira vez. —É Lana.


—É bom te conhecer, Lana. —Apertei a mão dela e notei suas unhas. Estavam limpas, elegantes e a cor coral suave parecia leve e fresca. Alguém havia pintado um intrincado desenho numa pálida concha cor de rosa sobre elas. —Suas unhas parecem fantásticas! Ela entendeu isso, aparentemente, e se animou um pouco. — Obrigada. Eu faço isso com... hum... —Ela parecia estar procurando a palavra certa. —Palito de dente! —Mesmo? —Eu as examinei mais de perto e me apaixonei pelo desenho de renda que ela criara. —Olha, hum, você pode apenas esperar por um segundo? Preciso fazer um telefonema rápido. —Fiz um gesto para que ela ficasse sentada e atravessei a área de espera até a recepcionista. —Ei, Billie, você fica de olho na minha cliente por um segundo? Eu preciso ir ao meu escritório. Billie assentiu. —Certo. Olhando para os produtos de beleza que ela havia tirado das prateleiras, perguntei: —Estes são os últimos da liquidação? —Sim. —Ela pegou duas embalagens de uma fragrância de loção descontinuada da linha preferida de nosso spa e rapidamente aplicou etiquetas vermelhas de promoção. —Se você quiser que eu fique até mais tarde, posso ajeitar o novo display de shampoo e condicionador esta noite. —Você pode cuidar disso de manhã. Você não tirou um único dia de folga esta semana, Billie. Quando terminarmos esta noite, vá para casa e aproveite sua noite de folga. Ela deu um sorriso. —Como quiser, chefe. Saí da recepção, atravessei o salão até a porta dos funcionários e entrei no meu escritório. Nós tínhamos uma política de tolerância zero para telefones celulares no salão de beleza. Eu


odiava quebrar uma regra, mesmo em um dia em que o salão estava tecnicamente fechado para o público, mas eu não sabia mais o que fazer. Eu não tive que ir muito longe na minha lista de contatos para chegar a alguns nomes que poderiam ajudar. Vivian foi meu primeiro pensamento. Ela era uma cliente fiel do salão e alguém que eu considerava uma amiga. Como a esposa de um dos imigrantes russos mais ricos de Houston, ela parecia ser uma das principais damas da pequena mas muito unida comunidade russa da cidade. Mas hesitei em ligar para ela no domingo, especialmente aquele domingo. Na noite anterior, a maioria das pessoas do nosso círculo social esteve no casamento de Bianca Bradshaw e Sergei Sakharov. Vivian tinha sido a dama de honra, e eu só podia imaginar o quanto ela estaria cansada, especialmente considerando que estava grávida. A última coisa que ela precisava era eu a incomodando quando provavelmente estava descansando. Kostya. No momento em que o nome do meu volátil e misterioso vizinho russo passou em minha mente, eu imediatamente me senti calma. Ele estava em Houston esta semana? Ele trabalhava no campo da segurança privada e viajava bastante, quase tanto quanto minha mãe. Eu não o tinha visto no casamento ontem, mas valia a pena tentar. Rapidamente, deslizei a tela do meu iPhone com o polegar, digitando minha senha e o número do único homem em quem confiava para vir correndo se pedisse ajuda. Às vezes ele vinha correndo mesmo antes de eu pedir ajuda... Enquanto esperava que Kostya atendesse, brinquei com a delicada pulseira de ouro e jade que ele me dera no Natal. A


lembrança daquela noite ainda fazia meu coração disparar. Depois de lutar contra o pior encontro às cegas da minha vida, fui empurrada para fora do carro no meu gramado da frente e fui atingida pela minha própria bolsa. Foi humilhante e aterrorizante, até Kostya emergir das sombras como uma espécie de cavaleiro das trevas. Ele me defendeu e protegeu daquele idiota antes de cuidar de meus ferimentos com tanta ternura. —Holly? —A aspereza da sua voz profunda enviou um arrepio de puro prazer até o meu núcleo feminino. —Oi, Kostya. —Eu bati meus dedos na minha mesa. — Hum... você está ocupado? —Você sabe que nunca estou ocupado para você. —Sua resposta me deixou sorrindo como uma boba. —Está tudo bem? —Ele foi direto para o modo alfa de proteção, assim como fazia toda vez que eu ligava. —Você está bem? —Estou bem, mas obrigada por perguntar. Na verdade, eu meio que preciso de um favor. —Claro. Você sabe que pode me pedir qualquer coisa. Quando ele disse qualquer coisa, tive a sensação de que ele queria dizer exatamente isso. Eu não tinha certeza se deveria achar isso lisonjeiro ou aterrorizante. —Você sabe que oferecemos serviços especiais para o abrigo das mulheres no primeiro domingo do mês? —Da. Sim Eu lentamente saí do meu escritório. —Então, há uma jovem aqui que não fala muito bem o inglês... —Ela fala russo?


—Sim. —E você quer que eu ajude a traduzir? Parei na entrada do andar de cortes e mordi meu lábio inferior. —Você se importaria? —De jeito nenhum. —Ele me assegurou. —Muito obrigada. —Caminhei até a sala de espera do salão e sentei-me novamente no pufe. Lana agora tinha uma garrafa de água em uma mão e virava as páginas de uma revista aberta em seu colo. As mangas do cardigã muito grande que ela usava tinham subido um pouco e revelado hematomas feios em seus pulsos. Eu podia ver as marcas das pontas dos dedos e linhas longas e finas que poderiam ter vindo de cordões ou gravatas. Jesus! A que essa pobre garota sobreviveu? Ela deve ter sentido meu olhar porque conscientemente puxou as mangas do cardigã e engoliu nervosamente. Eu olhei para os olhos dela e sorri, esperando deixá-la à vontade. Tocando na tela do meu celular, ativei o viva-voz e segurei entre nós. —Você pode nos ouvir, Kostya? Eu tenho você no vivavoz. —Sim. —Kostya se apresentou para Lana, que se animou quando ouviu alguém falando sua língua. Notei o modo como ela relaxou diante dos meus olhos e, na verdade, sorriu ao responder às perguntas de Kostya. Ela tocou as pontas dos cabelos enquanto falava como se descrevesse um corte mais curto. —Holly? —Kostya se dirigiu a mim. —Você está aí? —Sim. Bem aqui. —Eu me inclinei em direção ao telefone, apenas no caso do ruído de fundo dos secadores de cabelo e da música ser muito alto.


—Lana diz que gosta da sua cor de cabelo e do estilo do seu corte de cabelo. Ela gostaria de fazer o mesmo, se você achar que vai funcionar. —Eu acho que vai ficar ótimo nela, mas você pode perguntar quais produtos ela usou no cabelo? Parece que ela tentou aplicar um kit de clareamento caseiro e depois mudou de ideia e colocou loiro cinza sobre ele. Eu só quero ter certeza de que sei o que está em seu cabelo antes de começar a aplicar a tintura. Kostya conversou com Lana por alguns momentos e, em seguida, me deu um rápido resumo dos produtos que ela usou no cabelo nas últimas semanas. —Ela diz que entende inglês muito bem. Se você seguir perguntas de sim ou não, vai correr tudo bem. Se você precisar da minha ajuda, me ligue ou envie uma mensagem. Estarei por aqui a noite toda. —Tudo certo. Mais uma vez obrigada, Kostya. —A qualquer momento, Holly. Quando terminei a ligação e coloquei meu celular no bolso de trás do meu jeans skinny preto, notei o olhar curioso de Lana. —Ele é meu vizinho. —Expliquei. —Nós somos amigos. Seus olhos azuis brilharam com ceticismo. Ela não acreditava em mim mais do que eu mesma acreditava. Amigos? Certo. Nós éramos amigos, mas eu queria muito mais com ele. E me deixava louca que Kostya parecia completamente alheio. Eu finalmente descobri o único homem que eu não poderia encantar com meu sorriso sarcástico e sedutor do Texas. Não parecia justo que ele morasse na casa ao lado, me tentando, provocando e me deixando frustrada tudo ao mesmo tempo. Pegando-me brincando com a pulseira novamente, forcei meus dedos a largá-la e foquei toda a minha atenção em Lana. —


Vou garantir que você tenha uma experiência maravilhosa no meu salão. Ok? —Ok. —Ótimo. —Fiz sinal para a seção de tinturas. —Vamos começar. Enquanto ela se dirigia para a cadeira mais próxima, abaixeime para pegar uma capa da cesta embaixo do balcão. Quando me virei, tive que abafar o suspiro chocante que ameaçou escapar da minha garganta. Lana havia tirado o cardigã, provavelmente para mantê-lo livre de qualquer descolorante que pudesse escorrer pelo pescoço durante o processo de enxágue. As tiras finas de seu vestido revelavam ombros nus e uma mancha no pescoço e hematomas em estágios variados de cura. Os ossos em seus braços e ombros eram tão proeminentes, e eu só podia pensar em quantas noites ela tinha ido dormir com fome ou tinha sido espancada. Recusando-me a deixá-la desconfortável, disfarcei minhas feições e coloquei a capa ao redor de seus ombros. Eu imaginei que ela provavelmente estava farta de pessoas se metendo e fazendo perguntas desconfortáveis. Durante as poucas horas que ela estivesse no meu salão, eu queria que ela fosse capaz de escapar das terríveis lembranças do que havia sobrevivido. Tive o cuidado de não tocá-la ou mover-me rapidamente enquanto avaliava seu cabelo e formulava um plano para lhe dar o loiro platinado mais brilhante e glacial possível. Tipicamente, eu me certificava de que minhas clientes entendessem que ficar tão loira significava muita manutenção e esforço, mas eu já havia decidido que essa garota receberia o que quisesse e com o meu dinheiro. Enquanto eu trabalhava no cabelo dela, estava perto o suficiente para perceber o quão jovem ela parecia. Mais e mais, eu me preocupava que ela pudesse ser muito jovem. Um sentimento


doentio invadiu meu estômago. E se essa pobre garota não tivesse vindo voluntariamente a Houston? Tinha tido muitas apreensões de tráfico humano em Houston e nos condados vizinhos nos últimos dois anos. Muitas dessas mulheres vinham do sudeste da Ásia, mas eu tinha visto um recente relato de notícias sobre meninas da Europa Oriental e da Rússia que estavam em alto risco de tráfico. Mas como no mundo eu abordaria um assunto tão sensível? Será que Lana me diria se eu pudesse descobrir uma maneira de falar com ela? O que poderia ser feito se minhas suspeitas fossem verdadeiras? Ela estava em um lugar seguro agora, mas estava segura o suficiente? Os abrigos tinham segurança, mas o tipo de pessoa que traficava uma jovem era o tipo de gente que não deixaria que alguns policiais lhe atrasassem. Kostya era a escolha óbvia aqui. Não só ele era alguém que compartilhava sua origem e idioma, mas também ganhava a vida como consultor de sistemas de segurança muito bem-sucedido. Seu negócio era manter as pessoas seguras. Certamente, ele poderia descobrir uma maneira de manter Lana fora de perigo se ela precisasse de ajuda. Além disso, mais de uma vez, eu ouvi rumores de que ele era o homem em Houston a se contactar se alguém precisasse de informações de natureza sensível ou de ajuda para escapar de problemas. Tentei não prestar atenção aos outros rumores que ouvi sobre ele, mas era difícil não me preocupar quando ouvia coisas obscuras sobre sua amizade com Nikolai Kalasnikov. As pessoas sussurravam palavras como máfia, mafioso e gângster sobre aquele pequeno grupo de homens. Eu não sabia em que acreditar. Do lado de fora, Kostya e seus amigos: Nikolai Kalasnikov, Ivan Markovic, Sergei Sakharov, Besian Beciraj, Alexei Sarnov, pareciam membros íntegros e bem-sucedidos da comunidade. Mas eu ouvi coisas. Coisas que me fizeram morder


meu lábio com preocupação. Coisas que me fizeram pensar se eu realmente conhecia meu vizinho tão bem... —Eu gosto muito. —Lana comentou com um sorriso enquanto olhava seu cabelo loiro platinado no espelho. Ainda estava úmido de um enxágue final, mas parecia fantástico. —Apenas espere até que façamos o corte e penteado! —Eu terminei de espremer o excesso de água de seu cabelo antes de borrifar seus fios com um produto que funcionava bem com sua nova cor ultra-loira. Eu lentamente trabalhei no cabelo com um pente e, em seguida, usei alguns prendedores para segurar os fios de cabelo curtos. Eu gentilmente inclinei a cabeça dela na posição certa. —Você pode olhar para baixo por favor? Ela fez o que pedi enquanto eu pegava meu pente de corte e a tesoura. O corte de cabelo foi simples de fazer. Eu usava meu cabelo estilo long bob, bagunçado com ondas e cachos soltos nas últimas semanas e adorava. Eu tive a sensação que Lana iria gostar da versatilidade do corte e da facilidade de modelar. Enquanto eu acertava o corte, Billie passava com uma vassoura e uma pá para varrer o chão. Chamei sua atenção por um segundo. —Ei, Billie, você pode pegar meu celular do meu bolso e enviar uma mensagem rápida para o meu amigo? —Certo. —Ela pegou meu celular do bolso de trás e digitou o texto como ditei a ela. Eu precisava que Kostya traduzisse as instruções de manutenção do cabelo para Lana em um e-mail que Billie pudesse imprimir. Ela fez um grande espetáculo ao tocar minha tela antes de colocar meu celular de volta no meu bolso. — Enviei. Algo mais? —Vá até a frente e pegue meus produtos de cabelo favoritos. Shampoo, condicionador, shampoo tonificante, máscara capilar, produtos para cabelos loiros...


—Certo. —Ela terminou de varrer os últimos cabelos do chão antes de sair para completar sua tarefa. Com meu corte feito, passei um pouco mais de produto no cabelo de Lana e fiquei na ponta dos pés para pegar o secador pendurado na minha seção. Com os dedos penteei seus cabelos enquanto lançava um jato quente para secar a umidade persistente. Ela prestou muita atenção enquanto eu trabalhava com um pequeno alisador para deixa-lo com uma boa aparência, puxando para baixo e enrolando apenas um pouquinho no final para desenvolver uma onda fácil e solta. Depois de guardar meus acessórios, soltei a capa e ofereci-lhe um espelho para que ela pudesse ver a parte de trás de seu cabelo. A felicidade iluminando seu rosto me convenceu de que eu havia lhe dado exatamente o que ela queria. Nós encontramos uma linguagem comum ―moda e beleza‖ e não precisávamos mais de um tradutor. —Lindo. —Lana ficou feliz. —Eu gosto muito. —Você está fantástica. —Eu dobrei a capa e coloquei sobre a cadeira. —Este é um bom visual para você. —Fiz um gesto para ela me seguir. —Vamos brincar no balcão de maquiagem. Como duas garotinhas se esgueirando pelo estoque de maquiagem da mãe, vasculhamos as gavetas coloridas e os displays até encontrarmos os tons perfeitos de blush, sombra e batom. Enquanto a observava ao aplicar a maquiagem, confirmei minha suspeita anterior. Se essa garota tivesse mais de dezoito anos, eu daria cambalhotas no estacionamento. Ela era uma criança, mal saída da infância, e me doía pensar na tristeza e sofrimento que ela conhecera. Não estava certo, e ela merecia mais. Quando nosso encontro chegou ao fim, comecei a pensar em maneiras de manter contato com Lana. Sabia-se que as mulheres no abrigo desapareciam, ou voltando para casa para seus parceiros


abusivos ou fugindo com medo. Meus instintos gritavam que Lana ainda estava em apuros. Ela precisava de pessoas em quem pudesse confiar. Ela precisava de um lugar seguro que não fosse o abrigo. Eu olhei suas unhas bem feitas e uma ideia me surgiu, mas eu precisaria de algum tempo para fazer isso. —Ouça Lana. —Eu a parei antes de chegarmos ao balcão da recepção. —Você gostaria de vir trabalhar para mim? Seu rosto refletia a compreensão e depois a surpresa. — Trabalhar? —Ela gesticulou ao redor do salão. —Aqui? —Sim. Aqui. Ela estremeceu. —Meu inglês... Eu a interrompi antes que ela pudesse terminar. —Nós vamos arranjar uma maneira. Ela começou a protestar, mas o alarme estridente do sistema de segurança a interrompeu. Nós duas pulamos, e eu fiz uma careta para o teto. Esta era a quarta vez nas últimas duas semanas que essa coisa frustrante disparava aleatoriamente durante o horário comercial. —Lana. —Eu toquei seu braço para chamar sua atenção e tive que gritar sobre a sirene. —Venha me ver amanhã. —Olhei de relance para a recepção onde Billie estava com as mãos cobrindo as orelhas para abafar o barulho da sirene. —Billie, certifique-se de que Lana pegue sua bolsa e as instruções para manutenção. Billie me deu um sinal de positivo e depois atendeu ao telefone que tocava. —Pessoal da segurança. —Ela murmurou enquanto apontava para o telefone. —Diga-lhes para desligar esta coisa! —Eu rapidamente me virei e corri para a parte de trás do salão, onde encontrei Savannah


batendo e xingando a caixa na parede lá. —O que disparou isso desta vez? —Não sei que diabos foi! —Ela bateu no teclado duas vezes e rosnou. —Eu estava olhando nossas anotações para a reunião da equipe na manhã de segunda-feira, e essa coisa começou a apitar. Agora eu não consigo fazer isso parar com o nosso código. Imaginando que ela estava a cerca de dois segundos de arrancá-lo da parede, eu gentilmente a coloquei de lado. —Deixe-me tentar. —É todo seu! —Ela jogou as mãos para o ar e saiu bufando de raiva. Eu peguei meu telefone do bolso e rapidamente disquei para a linha de suporte da empresa de segurança enquanto tentava reiniciar o sistema manualmente. Se Billie não conseguisse pedi-los para desligar, eu já queria estar na linha com um representante. Eu ainda estava esperando quando consegui que o sistema aceitasse nosso código de cancelamento. Eu fiquei na linha por mais vinte e sete minutos tentando solucionar o problema contínuo com o representante que atendeu. Quando o representante não pôde explicar por que nosso sistema estava disparando à toa, desliguei frustrada. Usar uma empresa famosa em todo o país estava provando ser um sofrimento. Mais e mais, eu me perguntava se escolher uma empresa de segurança local não seria a melhor escolha. Convenientemente, eu tinha um especialista em segurança morando logo na porta ao lado. Falando em portas... Percebi que as portas duplas do nosso armário de suprimentos principal estavam abertas e caminhei para fechá-las. Savannah não viu quando voltou aqui pois estava batendo no


teclado do sistema de segurança. Se tivesse visto, meu telefone estaria vibrando com um novo alerta de e-mail, porque ela teria enviado um e-mail para toda a empresa lembrando a todos que fechassem as portas, desligassem os eletrônicos e apagassem as luzes. Como a responsável pelo dinheiro do salão, ela observava nossas contas de serviços como um falcão e era fanática por poupar energia. Parada sozinha no corredor dos fundos, perto da entrada dos fundos, de repente tive a mais estranha sensação de não estar sozinha. Foi uma vibração estranha na minha barriga que se espalhou para o meu peito. Na porta do armário de suprimentos, prendi a respiração e escutei... bem. Eu não tinha certeza do que estava ouvindo realmente. Pare de ser um bebê! Não há nada lá, além de shampoo e toalhas. Quando não ouvi nada, revirei os olhos e fechei a porta. Sentindo-me boba por deixar minha imaginação correr solta, voltei para o andar principal do salão. Lana havia desaparecido junto com os últimos clientes retardatários. Billie estava fechando nossos registros e contabilidade do dia enquanto Savannah limpava o balcão de maquiagem. Nisha olhou para mim e sorriu enquanto ajeitava a sua seção. Eu fui para a minha própria bancada e passei pela minha habitual rotina de fim de noite para que pudesse começar a minha manhã tranquila. Ao pôr do sol, só Savannah e eu permanecemos no salão. Voltei para o meu escritório e chutei meus sapatos antes de afundar na cadeira para lidar com os documentos esperando por minha atenção. Lá tinha pedidos de férias para colocar em ordem, currículos de cabeleireiros para escolher e propaganda de fornecedores empilhadas para serem lidas. —Oi, Holly? —Savannah me chamou quando entrou no meu escritório. —Você está ocupada?


—Não. —Eu girei na minha cadeira e encontrei Savannah encostada no batente da porta. Sorri ao ver a cabeça do manequim presa sob o braço dela. —Nisha está começando suas brincadeiras de Halloween algumas semanas mais cedo? Rindo da lembrança dos macabros truques de Nisha, ela deu uma pequena sacudida no manequim masculino. —Não, eu encontrei Harry na sala de conferências e achei que ele estava muito só. —Ela passeou pelo meu escritório e colocou o manequim de prática na minha mesa. Com uma piscadela atrevida, ela direcionou seus olhos castanhos como uísque para mim e disse: —Estou abraçando minha casamenteira interior. Eu acho que Harry é o cara perfeito para você. Eu bufei suavemente. —Como é que é, Savvy? —Por um lado, ele não responde. E olhe! —Ela gesticulou para ele. —Ele não tem mãos, então não precisamos nos preocupar com ele nos agarrando ou ultrapassando a linha, certo? Além disso, ele tem cabelos fabulosos. —Ela correu os dedos pelos cachos escuros e ondulados de Harry. —Vê? Você ama um homem com cabelos grossos e ondulados, certo? Eu balancei minha cabeça para sua tolice. —Eu amo você, Savvy. Nunca mude. —Eu sou muito teimosa para isso. —Ela se inclinou na minha mesa e cruzou os braços. Meu olhar invejoso se assentou em seu busto amplo e curvas assassinas. Mesmo vestida com um jeans skinny simples e um rabo de cavalo alto, ela era um nocaute. — Você, por outro lado, poderia aproveitar uma pequena mudança em sua vida. Eu revirei os olhos e afundei na minha cadeira. —Não isso de novo.


—Sim. Isso. De novo. —Ela cutucou minha perna com a ponta da sua sapatilha vermelha. —Sentimos sua falta ontem à noite na recepção do casamento. Você deveria ter vindo. —Você sabe que eu não gosto de recepções. —Não é sobre gostar ou não gostar. Isso é sobre fazer contatos e construir nosso negócio e ser uma boa amiga para a Bianca. Ela e sua mãe são donas da loja de noivas mais bemsucedida nesta cidade. Elas têm contato com muitas noivas e recomendam nosso salão para elas se arrumarem para as festas de casamento. Temos muita propaganda boca-a-boca por causa delas. O cérebro financeiro e de marketing por trás do salão de beleza, Savannah, enquadrou a questão de uma forma que me atingiu em cheio. Envergonhada, eu balancei a cabeça contritamente. —Você está certa. Eu deveria ter ido e feito minha parte como dona do salão. —É mais que isso, Holly. Bianca e sua mãe tem sido clientes neste salão desde que abrimos nossas portas. Somos todas amigas e colegas. Você veio mesmo no seu dia de folga para ajudar com o cabelo e maquiagem do casamento. Eu pensei com certeza que você ficaria por perto após a cerimônia, mas quando chegamos à recepção, eu olhei em todos os lugares e não consegui encontrá-la. Eu me mexi desconfortavelmente sob seu olhar preocupado. —Eu não tinha companhia. —Então? —Então, eu odeio ser a menina solteira no casamento. Savannah revirou os olhos. —Havia muitas senhoras lá sem um acompanhante, tanto quanto havia ótimos solteiros lá ontem à noite. Rapazes solteiros gostosos. —Ela acrescentou com um sorriso atrevido. —Todos aqueles lutadores grandes, deliciosos e sensuais


da academia de Sergei estavam lá. —Ela se abanou. —Você perdeu uma festa infernal! —Pelo visto sim. —Eu disse dando a ela um olhar avaliador. —E qual desses lutadores você levou para casa? —Ora, ora. —Ela respondeu bem divertida. —Você me conhece. Sou uma boa menina católica. Eu levantei um olhar para ela. —Humm hum. —Quieta. —Ela divertidamente me puniu. Então, mais séria, disse: —Holly, você é uma das mulheres mais bonitas de toda a cidade. Você é doce, inteligente e engraçada. Você é dona do salão e spa mais popular em Houston. Os homens estão tropeçando em seus próprios pés para chegar até você, para que você os perceba. Se você não fosse tão exigente, poderia ter qualquer homem em Houston. —Eu não quero qualquer homem em Houston. —Respondi indignada. Ela estreitou os olhos em suspeita. —Isso tem a ver com ele? —Ele? —Um tique de nervosismo percorreu minha barriga. —Quem? Ela viu através da minha pose. —Você sabe muito bem, quero dizer aquela raposa russa que mora ao seu lado. —Ela exalou em frustração. —Você ainda está sofrendo por Kostya Antonovich. Eu bufei para ela. —Eu não estou sofrendo. Ela me deu uma olhada. —Oh realmente? —Não estou sofrendo. —Insisti defensivamente. —Sofrer é o que acontece depois de um rompimento. Eu nem cheguei a namorar com ele!


—E de quem é a culpa? —O quê? —Você ouviu. —Ela ergueu os ombros, como se estivesse com vontade de discutir. —Vou lhe perguntar uma coisa e quero sua resposta honesta. —Tudo bem. —Tive a sensação de que não ia gostar do que ouviria em seguida. —Você realmente quer aquele homem, Holly? Eu estreitei meus olhos para ela. —O que isso significa? —Isso significa que ouvi coisas sobre Kostya. Coisas que me deixam nervosa por você. —Acrescentou com preocupação. —Que coisas? —Holly... —Savannah. —Eu me endireitei e sustentei seu olhar. —Que coisas? Se são os rumores sobre a máfia, eu ouvi e são todos absurdos. —Tenho certeza que não são sem sentido. Vamos, Holly! Abra seus olhos. O que diabos foi esse ataque que aconteceu no ano passado? Aquele em que Vivian foi arrastada para fora de um carro e Nikolai foi espancado até quase a morte? Isso não parece um pouco ligado à máfia para você? —O jornal disse que foi por causa do pai dela. Você viu a cobertura do noticiário quando ele fugiu dos federais dos EUA. Ela revirou os olhos para mim. —Ok. Nós vamos atribuir isso à história do velho e querido pai, mas você não acha que é um pouco suspeito que o marido de Vivian seja tão rico só de ter um restaurante e algumas outras pequenas empresas?


—Talvez ele tenha chegado aqui com um pouco de dinheiro no bolso e fez alguns bons investimentos. —Eu disse. —Havia muito dinheiro para se ganhar na Rússia. Olhe para Yuri Novakovsky e alguns dos outros caras. É plausível que Nikolai tenha conseguido um pouco desse dinheiro. —Bem. Eu aceito essa também. Mas e o marido de Erin Markovic? O cara era um autêntico brigão, Holly. Ouvi dizer que ele costumava bater nas pessoas para ganhar dinheiro e lutava em valetudo clandestinos em porões! E você viu as tatuagens em suas mãos? —Os olhos dela se arregalaram com algo muito próximo de medo. —Quando Erin veio aqui para fazer as unhas, ele a deixou e entrou para esperar por ela. Ele pagou a conta e eu dei uma boa olhada nas tatuagens em suas mãos. Aquelas tatuagens me assustaram pra caramba. Aquilo significa alguma coisa, Holly. Significa algo ruim. Eu não queria investigar a história obscura e complicada do marido de Erin. Ivan era um cara grande e assustador, e eu não tinha problema em acreditar que ele tinha feito algo menos que coisas desagradáveis. Mesmo assim, ele nunca me mostrou nada além de bondade e respeito. Eu acreditava em segundas chances, e ele parecia ter merecido a sua. Voltando a conversa, eu insisti: —Kostya não tem essas tatuagens. —Talvez não em suas mãos ou braços, mas quem sabe o que está debaixo da camisa? —Bem, eu não o vi nu ainda, então eu não saberia. —Eu respondi um pouco irritada. —Não são apenas os rumores da máfia, Holly. Há algumas coisas não tão legais sobre Kostya que são fatos.


—Tipo? —Mesmo quando pedi informações, temi o que ela diria. Savannah era a maior fofoqueira do salão e tinha um talento incomum para levar as pessoas a divulgar seus segredos. —Ele é dono de clubes de striptease. Eu pisquei com essa revelação inesperada. —Como você sabe disso? —Nisha o reconheceu do lado de fora da igreja no casamento de Bianca. Ela me disse que ele é co-proprietário de vários clubes da cidade com um cara gângster e agiota. —Como ela sabe disso? —O tio dela, Nicky. —Savannah disse. —Você sabe que ele está em todas essas coisas obscuras. O ex dela está no mesmo tipo de merda horrível, então quando Nisha me diz que alguém é problema, eu acredito nela. Eu engoli em seco. Honestamente, eu não sabia como me sentir sobre a descoberta de que Kostya ganhava dinheiro com clubes de striptease. Era um negócio sujo e explorador. —Eu não sei o que você espera que eu diga, Savvy. Ela olhou para mim por um longo momento antes de exalar lentamente. —Eu espero que você diga que tem seus olhos bem abertos e entende que Kostya tem uma história complicada. Ele provavelmente fez algumas coisas ruins, Holly. Talvez ele esteja fazendo coisas ruins agora. Eu preciso saber que você pensou muito sobre isso antes de correr atrás dele. —Eu não estou correndo atrás dele. —Ainda não. —Ela replicou. —Mas você vai. Se você quer ele, vai ter que ir buscá-lo. Pare de esperar que ele faça o primeiro movimento e faça você mesma.


—Isso não é ensino médio, Savvy. Não é tão simples assim. —Você está certa. Não é o ensino médio, então pare de agir como uma adolescente assustada, que nunca foi beijada e aja como uma mulher crescida que sabe o que quer e o que precisa. Odiando que ela estava certa em me puxar a orelha por ser tão ridícula, mas sem vontade de admitir a derrota tão rapidamente, eu fiz uma careta para ela. —Bem, você não é apenas a Senhorita Autoritária hoje! —Estou muito cansada para minha graça e charme habituais. Eu tive que levantar cedo para pegar um lugar no confessionário antes da missa desta manhã. —Sorrindo maliciosamente, ela admitiu: —Depois da diversão que tive na noite passada, eu merecia cada uma daquelas Ave-Marias. Sua observação quase nervosamente. —Você é horrível.

blasfêmica

me

fez

assobiar

—Oh, por favor. —Ela empinou o nariz. —Você sabe que está com ciúmes. —Estou. Completamente. —Cutucando-a com minha caneta, eu disse: —Você sabe que eu quero os detalhes de toda a diversão que você teve, certo? —Amanhã. —Ela prometeu. —Agora, tenho um jantar no Goodnight Charlie's com as Katies. As Katies eram três das nossas irmãs da fraternidade que participavam do comitê de planejamento da festa de gala de caridade que Savvy presidia. Os ex-alunos de Houston de nossa fraternidade organizavam um jantar de véspera de Ano Novo enorme, chique e dançante para arrecadar dinheiro para crianças doentes. Todo ano, Savvy dizia que nunca mais presidiria o comitê. No entanto, todo


ano, sua mão era a primeira a subir quando voluntários eram procurados. —O que vamos doar? —Perguntei, certa de que ela tinha encontrado o presente máximo que o salão poderia oferecer. —Mais do que no ano passado. —Ela disse, checando o relógio. —Nós estabelecemos uma meta muito agressiva para a arrecadação de fundos, então você pode precisar extorquir todos os amigos super ricos da sua mãe. —Mal posso esperar. —Eu respondi sarcasticamente. —Você tem certeza de que não quer vir? Ser minha parceira contra as Katies? —Estou bem. —Fiz um gesto para a minha mesa. —Eu preciso lidar com todas as coisas que tenho adiado pela última semana. —É justo. —Ela se afastou da minha mesa e se dirigiu para a porta, deixando Harry para trás para me fazer companhia. —Não fique até muito tarde. Nós temos uma reunião de pessoal amanhã. —Eu não ficarei. —Siga-me até lá fora e tranca tudo quando eu sair? —Ok. —Oh! —Ela pairou na porta do meu escritório. —O que o pessoal do alarme disse? —Nada de útil! Acho que precisaremos encontrar uma nova empresa. —Eu me ofereceria para ligar para pesquisar preços, mas algo me diz que você está procurando um motivo para ir bater na porta de Kostya. Longe de mim negar-lhe a chance de ter seu flerte...


—Saia daqui. —Eu disse enquanto dramaticamente enxotava-a para longe do meu escritório. Sua risada ecoava pelo corredor enquanto eu a seguia até a saída dos fundos. Depois de um rápido abraço e adeus, eu me certifiquei de que o salão estava trancado e fui para a cozinha dos empregados pegar uma lata de refrigerante da geladeira. Eu abri a tampa, tomei um gole da doçura efervescente de limão e voltei para o meu escritório. Eu tinha acabado de começar a separar os pedidos de férias quando ouvi o primeiro chiado estridente. Ah não. Reconheci o som instantaneamente como o alarme de bateria fraca do detector de fumaça. Afundando na minha cadeira, apertei a ponte do meu nariz e exalei um pouco. A cada poucos segundos, o alarme de fumaça tocava. Levantando-me da minha cadeira, saí do escritório e segui pelo corredor até o armário de manutenção para pegar a escada e a bateria. Eu carreguei a escada por todo o salão, indo da parte de trás do prédio até a frente em busca do alarme. De pé na área da recepção, esperei pacientemente por aquele bip irritante, mas não ouvi nada. Esperei e esperei, mas só houve silêncio. Que diabos? Eu não conseguia afastar a sensação de que alguém estava brincando comigo. Mais e mais, fiquei convencida de que alguém havia invadido nosso sistema ou algo assim. Isso não é normal, pensei enquanto arrastava a escada de volta para o armário e guardava a bateria. De volta ao meu escritório, sentei-me à minha mesa e peguei meu refrigerante. Enquanto eu tomava um longo gole, tentei montar a cronologia de ocorrências estranhas ao redor da loja. Ou a empresa de segurança não estava me dizendo a verdade sobre todos os problemas que estávamos tendo, ou alguém estava maliciosamente fixando um alvo em nossos negócios.


Infelizmente, a última possibilidade não era muito absurda, não para Houston pelo menos. Não muito tempo atrás, uma das nossas clientes quase perdeu a vida quando um corretor imobiliário ganancioso contratou incendiários para forçá-la a sair do prédio de sua padaria. Esta cidade tinha um submundo obscuro que encorajava atos terríveis em nome do dinheiro. Mas quem no mundo iria querer atacar o meu negócio? O prédio era de propriedade da minha mãe, então não tínhamos problemas com o senhorio. Savannah e eu tínhamos um bom relacionamento com as empresas que ficavam em ambos os lados de nosso negócio, uma pequena lanchonete-café e uma butique de roupas. Nós nunca tivemos nenhum problema com salões na área, então definitivamente não era uma coisa de inveja profissional, e nós não demitimos um funcionário desde nosso primeiro ano de abertura. Eu tomei outro gole, fazendo uma careta com o quão sem gás o refrigerante estava, e bati no meu teclado. Pensando no sistema de segurança, me perguntei se a opção mais fácil seria simplesmente substituir todo o sistema e mudar os prestadores. Se isso não resolvesse nossos estranhos problemas, bem, então eu começaria a me preocupar. Bocejando alto, esfreguei meus olhos cansados. As palavras e números na tela do meu computador pareciam tão borradas. Eu pisquei e peguei minha lata de refrigerante, esperando que a descarga de açúcar me desse a energia que eu precisava para passar por essa última parte da papelada antes de desistir e ir para casa. Eu deveria ter pego algo com cafeína... Concentrando-me na tela do computador, tentei entender o que estava lendo, mas havia uma estranha desconexão entre meus olhos e meu cérebro. De repente, minhas pálpebras estavam pesadas, muito pesadas, e senti meu corpo começar a relaxar.


Querendo ou não, eu iria adormecer. Meu cérebro lento me pediu para ceder e aceitar a sonolência. Um cochilo agora era melhor do que dormir enquanto dirigia, certo? Inclinei-me para a frente e descansei minha cabeça em meus braços e pensei que talvez, apenas talvez, tivesse detectado uma sugestão de movimento refletido na tela do computador. Sombras, eu me convenci. São apenas sombras e poeira...


CAPÍTULO DOIS Uma onda de fumaça de cigarro flutuou no ar da noite enquanto Kostya estava no terraço do arranha-céu e observava a cidade deslizar lentamente na escuridão. Ele sentiu o calor se aproximando cada vez mais de seus dedos enquanto o cigarro não fumado queimava da ponta para o filtro. Ele tinha acendido e desperdiçado quatro até agora. Ainda sem vontade de fumar, deixou cair o quinto e esmagou-o com a ponta da sua bota. Ele se abaixou, pegou a bituca e enfiou no bolso para se desfazer mais tarde. Não havia muita chance de alguém descobrir seu local de vigia ou vasculhar o terraço em busca de evidências, mas velhos hábitos como esses estavam enraizados. Nunca deve haver um traço de evidência deixado para trás. Nunca. Limpe. Queime. Destrua. Ele transmitia um desinteresse frio, mas a boca do estômago era uma bagunça de nós e emaranhados. Sua mente corria com os fragmentos de informações e reconhecimento que suas aranhas1 estavam reunindo e relatando a ele o dia todo. Ele checou seu relógio. Noventa e quatro minutos e toda a maldita cidade explodiria em caos e violência. Seu estômago revirou violentamente quando uma onda de raiva e desespero passou por ele. Todo o trabalho! Todos os anos planejando e montando a rede de informações! Todo o dinheiro 1

Suas Aranhas-É assim que Kostya chama as garotas de sua equipe.


gasto e todos aqueles favores negociados para transformar delatores dentro da organização Guzman foram desperdiçados. Naquela noite, Hector Salas lideraria um golpe sangrento, tirando do poder os agentes que estavam entre ele e o trono do cartel. Chegando o nascer do sol, um novo homem estaria no comando ao sul da fronteira, e aquela teia intrincada que suas aranhas tinham tecido, teria que ser redesenhada e tecida novamente. Soltando um suspiro resignado, Kostya passou a mão pelo rosto. Esta não era a primeira vez que ele era forçado a começar do zero. Toda a sua vida parecia ser um ciclo interminável de lousas limpas às pressas e novos começos. Quando a poeira baixasse, ele teria que fazer um balanço de quais informantes haviam sobrevivido à mudança de poder e começar o tedioso processo de reconstruir sua rede. Seu celular pessoal no bolso da frente do jeans começou a vibrar. Era um número que apenas um punhado de pessoas tinha, uma delas, Holly. Preocupado com o motivo de ela estar ligando, ele abriu o macacão sujo e retirou-o. O número de telefone não era de Holly. Era Liam, o traficante de armas irlandês com quem ele trabalhou por muitos anos. Apesar do mau momento, ele teve que atender a ligação. —Sim? —Ele respondeu rispidamente. —Tenho certeza de que você está ocupado. —Liam respondeu rapidamente. —Então vou direto ao assunto. Você pode fazer um trabalho freelancer para mim? —Depende. —Trabalho freelancer para Liam poderia significar qualquer coisa, desde da velha escola de assassinatos até a atuação como intermediário.


—Preciso de ajuda para obter um green card para o meu contato russo. Ele precisa entrar nos EUA o mais rápido possível, e precisa ser capaz de ficar aí. É uma questão de vida ou morte. —Sempre é. Ele tem algum vínculo com Houston? —Sim. Ele tem uma tia e um tio aí. Um deles trabalha no restaurante do seu chefe. Ele viajou algumas vezes para mim a negócios. —Ele está preparado com dinheiro? —Ele está. Bem significava milhões em seu mundo. Armas tinham suas vantagens, aparentemente. —E o registro dele? —Está limpo. Sem prisões. Sem condenações. Nem mesmo uma maldita multa de estacionamento. —Interpol? —Ele teve um aviso azul2 da Interpol há treze ou quatorze anos. Ele era apenas uma criança então. —Lista de procurados? —Eu não tenho certeza. Não é provável. —Verei o que posso fazer. Qualquer solução que eu encontre não será barata ou fácil. —Ele já estava pensando que provavelmente incluiria um casamento de conveniência e um grande pagamento para uma mulher adequada que poderia guardar um segredo. —Essas coisas nunca são. É por isso que eu procuro o melhor. 2

A Interpol tem vários avisos, identificados por cores. Nesse caso, o azul é referente a pessoa que passou por investigação.


—Algo mais? —Não. Só isso. —Envie as informações sobre o seu colega através do meu mensageiro. Vou resolver os detalhes do meu lado. Assim que ele guardou seu telefone pessoal, o telefone descartável enfiado no bolso de trás de seu macacão sujo vibrou. Um dos nós em seu estômago relaxou e se desfez enquanto lia a mensagem de Fox. Está na hora.

Ele digitou sua resposta curta de uma palavra ―chegando‖ e colocou o telefone de volta no bolso. A adrenalina subiu por seu sistema quando puxou o boné com o logotipo de uma empresa de encanamento. Ele sentou atrás do volante da van que pegou emprestada para pagar uma dívida de jogo devida pelo proprietário. Depois de uma rápida olhada no espelho retrovisor para verificar o bigode falso que havia aplicado antes, ele colocou um par de óculos de aro grosso no lugar. Ninguém prestava atenção a comerciantes, especialmente aqueles que pareciam o tio de alguém, e era assim que ele gostava. Ao sair da garagem, ele repassou os planos para a noite. Nikolai não deixaria Vivian fora de sua vista, como de costume. O chefe tinha assegurado que todos seus capitães manteriam seus soldados em público esta noite. Eles seriam vistos em bares, restaurantes e boates. Todo mundo precisava de um álibi sólido. Não haveria um sussurro do envolvimento russo na violência que aconteceria hoje à noite. Certo de que o resto da família estaria a salvo, ele estava focado apenas em proteger Holly. Não foi tão difícil convencer um


dos baristas do café ao lado do salão de Holly a sabotar o encanamento em troca da promessa de um carro novo e um envelope cheio de dinheiro. Fox, uma das crianças de rua que ele salvou anos antes e agora empregava, estava invadindo o sistema de segurança do salão repetidamente. Era imprescindível que Holly ficasse tão frustrada com o serviço de segurança atual que fosse procurá-lo. Depois desta noite, ele precisaria ter os olhos nela em todos os momentos. Disparar o alarme aleatoriamente durante o dia e fazer com que Fox sequestrasse a linha telefônica do suporte técnico de segurança faria Holly chegar ao limite e a forçaria a procurar ajuda externa. Comigo. Culpa tomou-o internamente quando ele pensou em todas as maneiras em que estava manipulando a vida de Holly. Ele estava fazendo isso para mantê-la viva, mas isso não diminuiu o sentimento desconfortável retorcendo seu estômago. A amizade deles tinha sido a mais verdadeira de sua vida, e agora ele a estava manipulando e abusando psicologicamente de maneiras que deixariam os instrutores no Centro orgulhosos. Desde a mais tenra idade, ele fora condicionado e treinado por seus pais, ambos agentes secretos soviéticos sediados fora da Alemanha Oriental, a não se sentir culpado. Ele aprendera a nunca se envolver, a manter distância, nunca confiar. Ele tinha levado essas lições a sério, especialmente depois que sua mãe e pai foram traídos e assassinados. Suas mortes lhe ensinaram a lição mais dolorosa de todas, e ele prometeu a si mesmo que um dia vingaria suas mortes. Algum dia? Merda. Nunca. Todos esses anos depois e ele não estava mais perto de resolver o mistério da terrível morte de seus pais. Tinha sido um trabalho interno. Disso, ele estava certo. A KGB estava em tumulto no momento em que seus pais foram mortos. Como membros do círculo interno, eles eram alvos de alto valor. Suas mortes haviam


sinalizado o fim de uma era e o começo de uma agência de inteligência mais nova, mais enxuta e ainda mais corrupta. Kostya não perdeu tempo e se comprometeu com o FSB, a agência sucessora da KGB. Ele era apenas um menino, mas estava determinado a provar a si mesmo. Não demorou muito tempo para estar no campo onde se destacou em um tipo específico de trabalho secreto. Mokroye delo. Trabalho molhado. Limpeza de assassinatos. Mas ele nunca foi bom em jogar os tipos de jogos que eram necessários para permanecer vivo dentro da agência. Ele não gostava de política, e com certeza não iria lamber botas para subir na hierarquia e mudar do campo para um confortável posto estrangeiro em uma missão diplomática oficial. Assim, quando o rumor de sua morte iminente chegou aos seus ouvidos, Kostya rapidamente virou as costas e procurou emprego com Maksim. O padrinho criminoso mais implacável de Moscou estava precisando de um homem com o conjunto de habilidades de Kostya. Uma vez contratado por Maksim, ele aproveitou a chance de deixar o país e saiu rápido. Uma identidade limpa e um novo começo nos Estados Unidos. Ele tinha feito uma boa vida para si mesmo aqui em Houston. Mas tinha uma dor lancinante na boca do estômago que não ia embora. Era uma sensação, um pressentimento de que ele não poderia escapar. Ele tinha um mau pressentimento de que seus bons dias em Houston estavam contados. E a contagem regressiva estava começando hoje à noite. Durante semanas, houve rumores circulando no submundo de Houston de um ataque retaliatório do cartel planejado para alguém próximo a Nikolai. Kostya temia que o ataque pudesse ser


direcionado a Vivian, agora grávida do herdeiro do chefe, mas a verdade fora ainda mais devastadora para ele. O alvo pretendido para o sucesso de hoje era Holly Phillips. Seus dedos se apertaram ao redor do volante. Sua mandíbula apertou. Minha Holly. Ele não era um homem de se surpreender com facilidade, não depois de tudo o que viu, mas seus joelhos enfraqueceram e seu estômago revirou dolorosamente quando leu as informações do arquivo que Finn Connolly lhe entregara durante o encontro anterior. O irmão Connolly do meio estava em maus lençóis depois de matar um dos assassinos do cartel com um tiro dado como um sniper bem posicionado durante um tiroteio no início do verão. Agora Finn estava sendo chantageado para ajudar o cartel com seu problema russo. Alguém lá fora havia informado ao cartel que Holly e Nikolai tinham o mesmo pai. Agora o cartel queria enviar uma mensagem para Nikolai e o grande chefe em Moscou, matando-a: Ninguém está seguro. Se o que o arquivo dizia fosse verdade, se Holly e Nikolai fossem meio-irmãos, a vida dela estava prestes a ficar muito complicada. Ela cresceu em um emaranhado de segredos e mentiras. Uma vez que a verdade aparecesse, e apareceria, ela ficaria arrasada. O pensamento de Holly se ferir fez seu peito doer. Esfregou o centro do peito e tentou pensar por diferentes ângulos, mas não conseguiu encontrar um resultado que a salvasse da dor e do sofrimento. E você é parte dessas mentiras...


Ainda odiando a si mesmo por aumentar a dor e a traição que ela iria um dia experimentar, Kostya parou na cafeteria e estacionou na vaga mais próxima da porta. Ele inspecionou a área ao redor enquanto fingia iniciar uma ordem de serviço. Rapidamente notou a localização dos vários veículos no estacionamento quase vazio e depois olhou para as fachadas escuras em torno do salão de Holly. Com a prancheta de metal na mão, ele saiu da van e seguiu em direção às portas dos fundos. Escondido da vista, ele colocou um fone de ouvido quase invisível no lugar e pigarreou para ter certeza de que o minúsculo microfone embutido na etiqueta de identificação presa em seu macacão captava o som. Dois cliques curtos ecoaram em seu ouvido. Fox, sua deusa tecnológica, sinalizou que poderia ouvi-lo alto e claro a partir da van que havia estacionado em uma grande loja nas proximidades. Ela estava lidando com toda a vigilância esta noite. Carregando uma caixa de ferramentas, Kostya entrou no café e encontrou o empregado a quem Sunny, outra de suas aranhas, havia subornado mais cedo naquela manhã. O gerente de turno levou-o para a parte de trás do prédio, onde algumas pias de cozinha entupidas estavam transbordando e derramando água turva por todo o chão de ladrilhos. Ele lançou um olhar superficial para o problema. Seria bastante fácil limpar o ralo sabotado depois que ele cuidasse de seus negócios mais ilícitos. Ele apoiou a caixa de ferramentas no balcão de aço inoxidável, abriu-a e levantou a bandeja superior expansível para revelar o compartimento interno. Colocou a mão esquerda na pistola com um silenciador preso e aproveitou para pegar os cinco envelopes cheios de notas de cem dólares. Jogou o dinheiro para o gerente de turnos. Os envelopes atingiram o balcão com um ruído alto.


O homem mais jovem engoliu em seco e olhou para todo aquele dinheiro. Enfiou a mão no bolso com os dedos ligeiramente trêmulos e retirou as chaves da loja. Ele colocou-as no balcão. —Eu fechei os registros e fiz toda a papelada para a noite. —Eu vou trancar quando terminar. O homem assentiu e pegou o dinheiro. —Isso é mais do que eu esperava. —Considere um incentivo para dar o fora dessa cidade. Amanhã. —Kostya acrescentou com dureza em sua voz. —Amanhã? —Ele hesitou antes de pegar o dinheiro. —Esse não foi o acordo que a garota me ofereceu. Ela me disse que eu pegaria um carro novo e algum dinheiro. Eu não posso simplesmente sair assim. Kostya envolveu seus dedos ao redor da arma, mas não a tirou da caixa de ferramentas ainda. Segurando o olhar do gerente, ele entoou em voz baixa: —Eu posso facilmente limpar dois corpos hoje à noite. O gerente empalideceu e lambeu os lábios. —Por quanto tempo devo ficar fora? —Uma semana deve ser o suficiente. —Eu vou sair daqui antes do amanhecer. —Boa decisão. —Kostya manteve o controle da pistola Grach e observou o gerente pegar o dinheiro – todos os cinquenta mil de sua reserva pessoal – e sair da loja. Sozinho no prédio, ele foi até a porta da frente e pulou na parte de trás da van para pegar as ferramentas que precisaria para consertar o ralo entupido. Se alguém estivesse de olho no prédio – e ele tinha certeza de que o assassino do cartel o mataria – o veria


fazendo seu trabalho e nada mais. De volta à cozinha, deixou as ferramentas de encanamento no chão ao lado da pia antes de fechar a caixa de ferramentas e levá-la para a sala de suprimentos que dividia uma parede com o salão de Holly. Encontrou o pequeno armário que abrigava a caixa do disjuntor e o alarme de segurança e localizou um painel de gesso com uma pequena porta de acesso já cortada. Seria meio apertado, mas era o único caminho para entrar no salão sem usar a entrada dianteira ou a dos fundos. Depois de puxar um par de luvas de couro preto, ele abriu o painel de acesso e ligou a lanterna. O painel do outro lado da parede já havia sido removido. Ele viu um borrão de movimento antes que um rosto familiar olhasse para ele. Olhos castanhos, cabelos escuros e aquele rosto jovem e inocente – Lobo. Por um breve momento, ele sentiu uma pontada de culpa quando considerou o que uma garota da sua idade deveria estar fazendo agora. Saindo com seus amigos? Terminando o dever de casa? Assistindo alguma merda adolescente enquanto pintava as unhas dos pés? Mas não isso, ele pensou, definitivamente não isso. Lobo entrou no túnel e estendeu a mão para ele. —Dê-me sua caixa de ferramentas. Ele empurrou a caixa de ferramentas até ela e deslizou pelo túnel de acesso entre as lojas. Do outro lado, ele ficou de pé e examinou a sala de suprimentos em que estava de pé agora. O espaço era iluminado por suas lanternas e alguns bastões luminosos, fontes de luz facilmente extinguíveis. Ele notou que Lobo havia feito uma pequena cama de toalhas em um pallet ao longo de uma das paredes. —Cisne negro está trabalhando na frente do salão. Sua roupa não é exatamente igual a de Odette, mas está perto o suficiente. Ninguém olhando para ela varrendo ou repondo prateleiras através das janelas será capaz de notar a diferença, não com as luzes


apagadas. Fox tem o controle das câmeras. Podemos ver tudo acontecendo dentro e fora do salão. Sunny está seguindo Jarhead. Ele ainda não saiu do hospital. Cisne Negro. Lana Odette. Holly. Jarhead. Finn Connolly. A pupila perfeita, Lobo, tinha controle total do trabalho. Ele faria o trabalho perigoso hoje à noite, mas ela comandava a operação. Era hora de Lobo se mostrar capaz do trabalho que ela foi ensinada e treinada a fazer. Era hora de ela ter uma experiência real. Hoje à noite, os dois saberiam se ela tinha estômago para o trabalho. Por mais que isso doesse nele, Kostya acreditava que ela se sobressairia esta noite. Ela faria seu trabalho e faria bem. Depois desta noite, não haveria volta para ela. Todas as vezes que ele se ofereceu para dar a ela uma nova identidade, para matriculá-la em uma escola particular e pagar sua faculdade, para lhe dar uma vida normal, ela recusou educadamente. Por dentro, ela estava tão arruinada e destruída quanto ele. Talvez ela tenha entendido assim como ele tinha, em uma idade semelhante, que não havia outro curso para a vida dela, além de viver nas sombras e fazer esses atos terríveis. Em todos os aspectos ela tinha sido a aluna ideal desde a noite em que a descobrira acorrentada a um poste de madeira naquele bordel em Ciudad Acuña. Magra, imunda e quase muda, ela de alguma forma escapou dos horrores dos abusos sexuais que ocorriam desenfreadamente em outras partes da casa. Mas os hematomas que manchavam sua pele haviam sido provas suficientes do inferno que ela suportara ali.


Ele tinha estado na cidade da fronteira em um trabalho paralelo na época e ter uma testemunha de seus crimes naquela noite não era uma boa ideia. Colocar uma bala entre os olhos e acabar com o sofrimento dela provavelmente teria sido uma gentileza, mas ele descartou o pensamento tão rapidamente quanto entrara em sua mente. Algo sobre ela tinha o tocado. Ele não tinha sido capaz de deixá-la para trás. Então rompeu as correntes, envolveu-a em um cobertor e a levou. Ele lançou um rápido olhar para Lobo quando ela começou a tirar equipamentos médicos de sua mochila ao lado do pallet. Já havia passado sete anos desde que ele a encontrou? Sete anos desde que ele tinha oferecido a ela essa escolha, ser jogada na primeira delegacia de polícia que ele encontrasse no Texas ou vir com ele e aprender como vingar a morte de sua família. Sete anos desde que ele a batizou de Lobo, eliminando a identidade e a infância que ela não conseguia lembrar, e dando-lhe uma nova vida como um fantasma. Sete anos que ele a mantinha em segredo de Nikolai e Ivan e todos os outros que pensavam que o conheciam. Mesmo de Holly... Sete anos que ele vinha treinando e moldando-a para ser a agente secreta perfeita. Ele saiu da sala de suprimentos sem dizer uma palavra. Lobo não precisava que ele ficasse dizendo a ela para fazer as coisas. Ele se moveu em silêncio e rapidamente pelo corredor dos fundos, mantendo-se rente à parede a caminho do escritório de Holly. Lana apareceu brevemente em sua visão, e seus pés titubearam embaixo dele. Porra, ela se parecia muito com Holly com o cabelo platinado e corte curto. As semelhanças o perturbaram.


Nem uma semana atrás, um de seus contatos no submundo, o Executor, o havia chamado com um estranho pedido de encontro no meio da noite. Kostya esperava receber informações interessantes ou as primeiras informações sobre novas armas, ou talvez até mesmo a chance de conseguir trabalho extra para ganhar algum dinheiro para seu fundo de aposentadoria. Em vez disso, foi levado a um quarto de hotel onde Lana, espancada, machucada e magra, estava esperando por ele. Ela estava segurando um bilhete do Executor, explicando que ele havia encontrado a jovem na casa de um alvo que ele acabara de neutralizar. Depois de ouvi-la falar russo, o Executor decidiu entregá-la a outra pessoa. Não demorou muito para Kostya descobrir que ela havia sido traficada de sua casa em Belgorod depois de responder a um daqueles anúncios populares que procuravam modelos. Ela tinha passado pelo inferno no último ano, e eventualmente ele encontraria os homens que tinham feito isso com ela e os machucaria muito mais. Nikolai teria que ser informado sobre ela em breve, no dia seguinte, mesmo. O chefe ficaria furioso quando descobrisse que o tráfico humano estava acontecendo bem debaixo do seu nariz. Ele não estipulava muitos limites quando o assunto era negócios ilícitos, como ocorria com outros chefes, mas o tráfico era punido com a morte. Nikolai não suportaria isso. Kostya fez um gesto de varredura para Lana, silenciosamente dizendo-lhe para voltar ao trabalho. Ela tinha um propósito esta noite. Ele queria que ela fizesse o papel de chamariz para manter o cartel ocupado aqui. Em troca de assumir esse papel perigoso e arriscar sua vida, ele daria a ela um apartamento, um carro, pagaria suas despesas e daria uma identidade limpa. Ele era um bastardo por colocá-la nessa posição, especialmente depois da maneira como ela foi abusada, manipulada e ferida, mas manter Holly segura era um


objetivo que ele alcançaria, não importando o custo para si mesmo ou para qualquer outra pessoa. Quando finalmente entrou no escritório de Holly, ele hesitou. Desgosto o tomou e retorceu seu estômago com a visão dela caída em sua cadeira de escritório. Ela usava uma máscara sem respirador, e o baixo assobio de oxigênio era fácil de ouvir. Maldito monstro, ele silenciosamente repreendeu. Dê uma boa olhada e lembre-se disso na próxima vez que tiver ideias estúpidas sobre ter essa mulher. Ele se moveu em direção a Holly e checou seu pulso. Batia firme e fortemente sob as pontas dos dedos. Sob as suas ordens, Lobo entrou no salão mais cedo, propositadamente desligando o alarme para que Fox pudesse controlar o sistema e obter uma boa gravação da voz de Holly. Ele dera a Lobo uma dose precisa de um sedativo hipnótico para acrescentar ao que Holly estivesse bebendo, geralmente refrigerante ou chá doce, e exigiu que ela colocasse Holly no oxigênio suplementar assim que ela apagasse, só por precaução. Os arquivos médicos que ele havia roubado não falavam de nenhuma contraindicação para as drogas que ele tinha acabado de forçar nela, mas ele não se arriscaria. A medição no oxímetro preso a seu dedo assegurou-lhe que ela estava respirando adequadamente, mas ele se sentiria melhor quando ela estivesse trancada em segurança na sala de suprimentos, com Lobo brincando de enfermeira e guarda-costas. Se alguma coisa acontecesse com ela esta noite, ele teria que segui-la até o túmulo. Holly arranhou a armadura protetora que ele usava e tinha enrolado aqueles dedos lindamente bem cuidados em volta do coração dele. Ele nunca permitiu que ela percebesse o que significava para ele. Ele não podia arriscar alertar ninguém para essa vulnerabilidade por causa do perigo que isso representaria para ela. Mas ela era isso. Ela era a única, a única.


E você nunca poderá tê-la. Nunca. Com muito cuidado, ele colocou o leve tanque de oxigênio no colo de Holly e, em seguida, gentilmente levantou-a da cadeira. Ele embalou seu pescoço frágil contra a curva de seu braço e levoua para fora do escritório. O aroma de seu perfume e shampoo provocou seu nariz. A sensação dela em seus braços, de seu peso leve e seu calor, era um lembrete cruel de todas as coisas que ele nunca experimentaria com ela. Isso provavelmente era o mais perto que ele chegaria de Holly, e ela nunca se lembraria de nada disso. Mas isso era uma coisa boa. Ele não queria que ela visse ou ouvisse a violência que estava prestes a acontecer aqui. Ele não queria partir seu coração ou destruir seu senso de realidade, revelando todos os segredos que ele sabia sobre ela. O que ele diria? Seu pai é um chefe implacável da máfia? Sua mãe é uma mentirosa? Se ela for a sua mãe... Kostya tinha suas dúvidas de que a mulher que Holly conhecia como sua mãe era sua carne e sangue mesmo. Maksim tinha uma preferência e uma notória queda por loiras jovens, mas Frances Phillips tinha pelo menos quarenta anos quando supostamente engravidara do homem mais poderoso e perigoso de Moscou. Não fazia sentido para Kostya. —Você trouxe o kit de DNA? —Kostya perguntou enquanto colocava Holly na cama de toalhas e arrumava o tanque de oxigênio no chão ao lado do ombro dela.


—Bem aqui. —Lobo colocou no pallet antes de pegar um medidor de pressão arterial automático. —Max disse para pegar cabelo e saliva. —Faça. Rapidamente. —Ele adicionou antes de vasculhar em sua caixa de ferramentas para os itens que precisava. Peruca loira platinada. Duas pistolas com silenciadores. Fio de garrote como uma opção de segurança para uma morte rápida e furtiva. Mini caixa de som portátil. —Você acha que ele vai fazer isso? —Lobo afastou a máscara de oxigênio por tempo suficiente para esfregar o interior da bochecha de Holly. Kostya não precisou perguntar a quem ela se referia. Finn Connolly deveria vir aqui esta noite para matar Holly. Haveria um assassino atrás de Finn para cortar qualquer ponta solta e garantir que o trabalho fosse concluído. Eles provavelmente tentariam plantar evidências para desencadear uma guerra entre os russos e os albaneses ou contra os russos e o pessoal dos hermanos para confundir as coisas. Mas ele mataria o sicario primeiro e qualquer um que viesse com ele. Se ele de alguma forma falhasse, Lobo seria a única a terminar o trabalho. Ele colocou a segunda pistola ao lado do joelho dela e pegou seu olhar por um momento. Ela olhou para a arma que sabia como lidar com pontaria quase perita e acenou com a cabeça. Respondendo à pergunta, ele disse: —Finn vai fazer isso. Lobo não perguntou como ele podia ter tanta certeza. Ela enfiou o cotonete no tubo de proteção e o selou bem. Enquanto ele a observava arrancar alguns fios de cabelo de Holly e colocá-los em um pequeno envelope, pensou no plano de contingência no local naquela noite. Era um plano que ele não havia mencionado a Lobo porque ela lhe daria aquele olhar, aquele que fazia seu peito apertar


com algo suspeito parecido com vergonha. Ele não teria tempo para essa merda naquela noite. Assim que terminou com as amostras de DNA, Lobo verificou a pressão sanguínea de Holly com o medidor de pressão automático e leu o número para ele. Tranquilizado de que ela estava estável apesar das drogas, ele enfiou a mão na caixa de ferramentas e retirou a seringa pré-carregada com uma dose precisa de um sedativo de ação rápida. —Se ela acordar, você injeta isso nela. —Ela não vai acordar. —No entanto, Lobo pegou a seringa e colocou-a de lado. —Não deixe que ela veja seu rosto. —Eu não vou. —Assim que eu sair desta sala e Lana retornar, ninguém abre esta porta novamente, exceto eu. Você coloca duas balas no peito do primeiro que você ver. Entendeu? —Sim. —Ela sustentou seu olhar e calmamente deu sua resposta. —Eu não vou falhar com você. Um orgulho paternal o aqueceu por dentro. Lobo tinha idade para ser sua filha. Seu relacionamento nos últimos sete anos imitava o de um pai e sua filha, se o pai fosse um assassino notório e a filha tivesse sede de vingança. Lançando um último olhar para Holly, ele pegou as ferramentas que precisava e deixou a sala de suprimentos, fechando a porta firmemente atrás dele e deixando as duas mulheres sozinhas no escuro, exceto pelos bastões luminosos e a lanterna. Ele estava a três passos do escritório de Holly quando dois cliques ecoaram em seu ouvido. Ele se animou com o aviso de uma comunicação recebida.


Um momento depois, a voz de Fox atravessou as ondas do rádio. —O sistema clonado está funcionando. Depois de várias infiltrações e testes, ela duplicou o sistema de segurança do salão, criando um clone que o assassino do cartel poderia ativar sem alertar a polícia ou a empresa de segurança. Era um que ela controlava completamente e podia manipular se o assassino conseguisse entrar. Ela permitiria que eles vissem vídeos em tempo real do salão onde Lana fingia ser Holly, mas veriam gravações dos corredores onde ele ou Lobo poderiam ser vistos. — E Jarhead está a nove minutos daqui. —Entendido. —Essa parte da atualização forneceu um pouco de alívio. Ele não precisava mais se preocupar em ordenar que Artyom fizesse algo verdadeiramente desprezível para forçar Finn a seguir com o plano. Consciente da falta de tempo, ele entrou no escritório de Holly para configurar a caixa de som, diminuir as luzes e preparar a cena. Ele ligou o interruptor na caixa de som. —Eu estou pronto para a gravação. —Estou preparada e pronta. Em espera. Depois de dar uma rápida olhada ao redor do escritório para verificar se as luzes estavam baixas o suficiente, ele puxou a peruca, tirou os óculos falsos e sentou-se na cadeira de Holly. Ele bateu na barra de espaço do teclado para reativar a área de trabalho e digitou a senha que Fox colocara temporariamente em todos os computadores conectados à rede do salão. Apreciando quão perfeita ela fez toda essa merda tecnológica, ele decidiu pagar-lhe um pequeno bônus em seu aniversário. Ela era tão boa que fazia tudo parecer muito fácil, mas ele a tinha visto em ação e sabia o quanto ela estava trabalhando para tornar essa operação um sucesso.


Sentado ali, esperando os assassinos dispararem o alarme para chamar Holly-Lana para o escritório dela, onde as instruções deixadas para Finn diziam que ela estaria, ele pensou em todas as maneiras pelas quais seus planos poderiam dar errado naquela noite. Se Finn desse um passo em falso, ele poderia levar uma bala. Um veterano com uma namorada muito rica e muito bem relacionada, ferido, seria um grande problema. Se o ataque do cartel fosse maior do que ele previra, Lobo e Holly poderiam ficar gravemente feridas. Se os assassinos notassem Sunny seguindo Finn ou a van de Fox estacionada não muito longe daqui, elas poderiam ser identificadas e receber uma retaliação. —Está na hora. —Fox calmamente avisou. Todos aqueles problemas lhe fugiram da mente. Ele controlou a respiração e esperou que tudo começasse. Quando o alarme soou, ele engoliu lentamente e ajustou seu aperto na arma Grach que tinha pegado para este trabalho. Ele ouviu passos, os passos de Lana, que pararam no corredor perto do teclado do sistema de segurança. Ela bateu na caixa algumas vezes e então digitou a senha que Lobo a havia ajudado a memorizar. O telefone na mesa de Holly começou a tocar, o sinal que chamaria Lana para lá. Seria Fox do outro lado, claro. Lana correu para o escritório, fazendo o papel de Holly soberbamente e entrou no pequeno armário à esquerda. Ele pegou o telefone, mas não disse nada enquanto Fox jogava a conversa gravada de mais cedo. A parte dela da ligação falsa que havia irritado Holly tocou tanto na linha telefônica quanto pela caixa de som. O fone de ouvido estalou contra o tímpano. —Jarhead está no local.


Não demoraria muito agora. Sessenta segundos? Setenta? Um ou dois tiros bem dados, e tudo estaria feito. Ele controlou sua respiração e ouviu atentamente, esperando o sussurro de um passo ou o ranger de uma porta. Lá! Finalmente. A porta do escritório se abriu devagar. Ele segurou a respiração, esforçando-se para ouvir sobre a gravação. O cabelo fino em sua nuca se eriçou. Ele desviou o olhar da tela do computador para olhar para o canto escuro da sala para dar aos seus olhos tempo para se ajustar antes que tivesse que dar um tiro bom e limpo. Uma mão agarrou o encosto da cadeira e girou-a com uma rápida explosão de força. Finn Connolly caiu em um joelho, saindo da linha de fogo. Kostya avistou a figura escura na porta e centrou a mira no alvo. Ele deu dois tiros rápidos e o homem na porta, o sicario que havia sido enviado para rastrear e matar Finn, e Holly se Finn falhasse, caiu para frente. Kostya levantou-se da cadeira, contornou Finn e correu para a porta. Ele chutou a arma ainda presa na mão do homem do cartel e então se agachou para verificar o pulso do homem. Ele encontrou apenas batidas erráticas de um coração agonizante e exalou uma respiração reprimida. Está feito. —Ele está morto? —Com sua arma apontada com segurança para o chão, Finn levantou-se com a menor oscilação antes de encontrar rapidamente seu equilíbrio na perna com prótese. —Sim. —Ele vasculhou os bolsos do assassino, mas não encontrou nada interessante ou útil. O homem morto era um profissional e não tinha nada nele que pudesse identificá-lo ou vinculá-lo ao cartel.


Finn se aproximou, e então parou de repente, seu corpo inteiro ficando rígido. Kostya levantou a cabeça quando Finn bateu em seu ombro, o sinal silencioso o alertando dos sons de outra pessoa se aproximando. Merda. Mesmo antes de Kostya poder reagir, Finn exibiu os aguçados instintos de fuzileiro e agarrou o possível atacante no momento em que apareceu na porta. Finn bateu o homem na parede e pressionou o antebraço no pescoço dele. —Ei! Ei! —Hector Salas levantou as mãos enquanto sufocava com as palavras. Finn pegou a arma na mão de Hector antes de apontar sua própria arma no novo chefe do cartel. —Você tem três segundos para me dizer por que está aqui. Porra. A última coisa que Finn precisava era virar inimigo de Hector Salas, um homem secretamente ligado à nova namorada de Finn, Hadley. Se Finn estava ciente dessa conexão ou não, Kostya não podia dizer. Tentando evitar um desastre, ele bateu na mão de Finn. — Abaixe a sua arma. Como se percebendo que ele não sabia todos os detalhes, Finn franziu a testa e fez como instruído. Kostya olhou para Hector. —Você está atrasado. —Tem sido uma noite movimentada. Ele só podia imaginar. —Você fez tudo? —Está pronto. —Hector ergueu a mão no ar. —Acabou.


Ele virou-se e cutucou o homem morto com a ponta da bota. —O que você quer fazer com este? —Isso é sua especialidade, não minha. —Respondeu Hector com facilidade. —Isso mesmo. —Kostya respondeu secamente. —Traição e traidores são as suas. Hector o olhou, mas Kostya ignorou. Ele notou aquela expressão pensativa no rosto de Finn e decidiu que era hora de tirar o veterano ferido de lá antes que ele começasse a juntar as coisas. Quanto menos ele soubesse, melhor. Como se compartilhando seus pensamentos, Hector fez um gesto em direção à porta. —Você deveria ir, Finn. Este não é o tipo de coisa que você quer estar sem ter um álibi. Volte para o hospital. Hadley precisa de você. Isso está feito. Você está livre de qualquer obrigação que tinha com o cartel. —Espere. —Kostya enfiou a mão no bolso pegando um de seus cartões especiais. Ele entregou a Finn. —Considere a sua apólice de seguro. O que você precisar, me ligue. Eu tenho uma dívida com você. Finn pegou o cartão e enfiou no bolso de trás. Ele olhou para o corpo no chão, balançou a cabeça e saiu do prédio sem dizer outra palavra. Kostya esperava que fosse o último que ele visse. Sozinho com Hector, Kostya olhou para o usurpador que liderara o golpe daquela noite. —Você deveria sair daqui também. —Eu só vim para ter certeza que você não colocou uma bala no novo namorado da minha prima. —O olhar de Hector desceu para o homem morto sangrando no chão de ladrilhos. A luz azulesbranquiçada da tela do computador iluminou sua expressão confusa. —Deveria haver dois deles. Então, ele mentiu na minha


cara ou este matou o outro antes que o trabalho começasse para pegar o dinheiro. —Ele fez uma pausa e fez uma careta. —Ou estamos deixando um homem escapar. Com sua pulsação disparada, Kostya inclinou sua cabeça em direção ao crachá de identificação pendurado na frente do macacão e saiu correndo do escritório. —Nós perdemos alguém? —Jarhead foi seguido por um homem. —Fox respondeu-lhe rapidamente em meio ao toque das teclas do teclado. —Sunny não viu mais ninguém. Eu não peguei nada no salão ou nas entradas dos fundos e principal. Porra. Porra. Porra. Fox mencionou as entradas, e ele percebeu que tinha esquecido de trancar a porta da frente do café ou programar o alarme. —Nós temos visão da cafeteria? —Não há câmeras lá. É apenas segurança direta com sensores de movimento. —Tap. Tap. Tap. —Há uma câmera de trânsito com vista para o café. Deixe-me ver se consigo... inferno! Está fora do ar. Merda. Temendo o pior, Kostya chegou à porta da sala de suprimentos e rapidamente bateu cinco vezes para ter certeza de que Lobo não acertaria uma bala nele no momento em que a abrisse. Ele girou a maçaneta e abriu a porta. O cheiro de sangue e algo pior o atingiu diretamente no rosto.


Foi como se um punho invisível torcesse seu estômago. Ele tateou a parede para acender a luz e afastou a cegueira momentânea da súbita explosão de claridade. Quando seus olhos se concentraram na cena sangrenta e bagunçada diante de si, Kostya soltou um suspiro agonizante. Porra. Parecia que Lobo tinha estômago para trabalho sujo, afinal.


CAPÍTULO TRÊS Determinado a manter Lobo em segredo, Kostya fechou a porta e se virou para Hector. O outro homem olhou-o com desconfiança e confusão. Kostya colocou a mão no peito de Hector e deu-lhe um leve empurrão. —Você precisa ir. —Ele apontou para a saída. —Eu trabalho sozinho. Saia. Agora. Hector parecia querer argumentar, mas não o fez. Talvez estivesse feliz por não ter visto nada dentro do quarto. O homem tinha segredos suficientes para manter e não precisava de outro. Recuando devagar, Hector disse: —Boa sorte. Kostya seguiu Hector até a saída dos fundos e trancou-a atrás dele. Ele entrou no escritório e abriu o armário onde Lana havia se escondido antes. Ela tinha se escondido no canto, seus joelhos dobrados recatadamente e seus pés curvados debaixo dela. A posição não era confortável, mas ela parecia quase serena e completamente fechada em sua própria mente. Suas pequenas pernas ossudas pareciam fracas e patéticas. Ele teria que se certificar de que essa garota estava comendo bem agora que estava sob seus cuidados. —Venha comigo. Ela assentiu com a cabeça e levantou-se com graça, sem esforço, seus movimentos flexíveis e treinados. Ele não teve que perguntar onde ela aprendeu a se mover assim. Ele tinha estado em clubes de sexo privados o suficiente para saber que alguns homens gostavam de suas mulheres submissas e que aprendessem certas posições para se ajoelhar e sentar e ainda mais regras sobre como ficar de pé ou se curvar. Mesmo que ele nunca tivesse visto as horríveis contusões marcando o corpo de Lana, sua pacata graça


feminina e sua pressa em agradar teriam sido suficientes para fazê-lo suspeitar. Logo atrás, Lana o seguiu para a sala de suprimentos. Ele olhou para ela e franziu a testa. —Espero que você tenha um estômago forte. Seus olhos pálidos brilharam com uma dureza. Ela não tinha perdido a faísca de força que ele sempre admirou em mulheres russas. Respondendo em sua língua comum, ela ergueu o queixo e exigiu: —Mostre-me o que precisa ser feito. Kostya deu um passo para o lado e abriu a porta para revelar Lobo, com o rosto machucado e as mãos escorregadias e vermelhas, apressadamente limpado a poça de sangue que se acumulava ao lado do cadáver. Aproximando-se, ele reuniu as pistas para formar uma ideia do que havia acontecido. O homem obviamente tinha vindo pelo mesmo túnel de acesso que ele havia usado antes. Frascos de shampoo e condicionador haviam caído das prateleiras enquanto Lobo lutava contra o homem. Lobo havia se colocado entre o homem do cartel e o corpo adormecido de Holly. Algo tinha acontecido, um chute ou um soco, que derrubou a arma dela antes que ela pudesse atirar. Ou talvez ela tivesse hesitado em disparar porque não queria assustar o outro assassino no salão. O que quer que tenha acontecido, ficou claro que Lobo e o assassino tinham lutado antes que ela o apunhalasse repetidamente com a chave de fenda de cabo verde de sua caixa de ferramentas. Seu rosto estava uma bagunça, e ela se movia mais devagar do que o habitual e segurava seu lado esquerdo. Ela precisava que suas costelas fossem checadas. Lobo finalmente olhou para ele. Ela secou o nariz sangrando com as costas da mão. —Desculpe pela sua chave de fenda.


O som que escapou de sua garganta saiu como uma risada áspera e estrangulada. —Eu não dou a mínima para essa chave de fenda. —Agachando-se na frente de sua protegida, ele segurou seu rosto e forçou-a a encontrar seu olhar indagador. —Você está bem? Ela estendeu a mão trêmula e tirou os dedos enluvados dele do seu rosto. —Agora não. —Praticamente ordenando. —Não seja legal comigo agora. Ele entendeu o que ela queria dizer. Ela precisava dele para mantê-la pensando na missão, para mantê-la funcionando sob a ação da adrenalina. Mais tarde, quando estivesse sozinha, ela poderia desmoronar. E ela iria desmoronar. Uma primeira matança? Sempre era o mais difícil. Kostya levantou-se. Era pedir demais para ela, mas ele não tinha outra escolha. —Pegue este corpo e limpe essa porra de bagunça. —Ele olhou de volta para Lana. —Entre aqui e ajude-a. Deixando as duas jovens mulheres trabalhando, ele foi até Holly e se ajoelhou ao lado dela. Ele checou seu pulso e estudou seu rosto. Ela ainda estava inconsciente. Olhando para o relógio, percebeu que tinham uma janela de duas ou três horas para limpar tudo antes que ela começasse a despertar. Ele se afastou de Holly e pegou um par de protetores cirúrgicos de pés da mochila de Lobo e rapidamente colocou sobre suas botas. Pegando os lenços e desinfetante em spray que preferia, ele disse: —Vou voltar para o escritório. —Aqui. —Lobo entregou uma lona bem embalada e um rolo de fita adesiva de sua mochila. Ele pegou a lona e a fita e foi para o escritório. Com a eficiência treinada de um limpador, ele envolveu o corpo no plástico e o selou bem. Quando terminou, começou a pulverizar o escritório.


O fluido degradava o DNA, mas não deixava resíduos ou fragrâncias. Ele seguiu a mesma rotina metódica. Do teto ao chão, ele limpou cada superfície antes de detalhar minuciosamente a sala. Era um trabalho irracional, do tipo que ele completara tantas vezes que conseguia fazê-lo por reflexo. O que aconteceria amanhã? Ao sul da fronteira, a guerra estaria começando ao nascer do sol. Hector tinha vindo aqui para tirar os jogadores do poder ao norte da fronteira. De volta para casa no México, ele teria uma guerra maior, mais confusa e mais perigosa para ganhar. Não seria fácil, e o custo seria alto em vidas, subornos e produtos. Kostya duvidou de que toda a carnificina permaneceria no México. Todos no submundo saberiam que Nikolai havia dado permissão para Hector manchar as ruas de Houston de vermelho com o sangue do cartel. Derrubar o chefe do maior cartel de drogas? Não seria muito popular entre as outras famílias em Houston. Besian e sua gangue albanesa entrariam na fila porque Nikolai lhes dera um aviso e a oferta de um gostinho do dinheiro da droga. Nickel Jackson teria que receber um pedaço da atividade de Hector, ou então encontraria outro fornecedor ou criaria problemas com a gangue de rua dos Hermanos ligada ao cartel. O Sr. Lu e o sindicato asiático não gostariam desse novo desenvolvimento, e qualquer solução oferecida por eles seria cara. Mueller seria mais fácil de se alinhar, por enquanto. Ele era o novo rosto na cidade e não conseguira encontrar um aliado para qualquer jogada de poder. Eventualmente ele descobriria o jogo. Kostya precisava ter certeza de que ele teria a informação para que Nikolai precisasse ficar cinco passos à frente de Mueller. Terminando com o escritório, ele arrastou o pacote embrulhado para o corredor e deixou-o ao lado da saída dos fundos. Ele voltou para a sala de suprimentos e encontrou Lana sentada


calmamente ao lado de Holly. Vendo-as lado a lado, ele ficou ainda mais chocado com a semelhança. Pelo tanto que o velho fodeu por aí, ele provavelmente tinha filhos espalhados pela Rússia, de Sokol a Novorossiysk. Talvez eu devesse levar o DNA dela para testar também. —Onde está Lobo? Lana apontou para o acesso aberto no painel. Ele atravessou a sala de suprimentos e se ajoelhou na frente do painel. Com um assobio curto, ele a chamou. Ela não veio imediatamente. Quando apareceu no outro lado do painel de acesso, ela estava com a camisa molhada e uma chave inglesa na mão. Ele percebeu que ela estava limpando o ralo entupido. —Você precisa de ajuda? Ela balançou a cabeça. —Terminei. Era apenas um pano de cozinha preso na parte flexível do ralo. Me dê dez minutos. Vou limpar e depois mover a van para trás. Ele assentiu e recolocou o painel de acesso. Havia uma estante leve que geralmente ficava na frente, então ele a arrastou para o lugar. Levando um momento para verificar o quarto, ele achou tudo limpo. As garotas reuniram um saco de lixo que precisaria ser queimado. —Elas podem perceber a falta de toalhas. —Lana disse calmamente. —Algumas delas sujaram com sangue. —Elas podem. —Ele concordou, mas não havia nada a ser feito sobre isso agora. Voltando-se para Holly e Lana, ele começou a remover o equipamento médico que haviam colocado nela. Ela estava tolerando bem o sedativo e estaria metabolizando o último muito


rapidamente. Ele entregou o equipamento para Lana que apressadamente guardou na bolsa de Lobo. —Ela me ofereceu um emprego. —Disse Lana, com a voz carregada de surpresa. —Ela nem me conhece, mas me ofereceu um emprego. A expressão de Kostya se suavizou quando olhou para Holly. —Ela é uma boa pessoa. Ele não podia imaginar qual tarefa Holly atribuiria a Lana, mas supunha que seria uma coisa boa. Ela teria olhos em tempo integral em Holly. —Você precisa de um emprego. Este é um lugar tão bom quanto qualquer outro para trabalhar. —Olhando de relance para Lana, ele avisou: —Você terá que trabalhar o seu inglês. É terrível. Sua expressão esperançosa se esvaziou e ela se encolheu ensimesmada. —Sim, senhor. Blin. Odiando-se por ser um imbecil, ele estava feliz por Holly não o ter ouvido naquele momento e que ela não conseguia entender russo, mesmo que tivesse. Sua decepção seria mais difícil de suportar do que sua raiva. Com o sorriso mais encorajador que conseguia reunir em ambientes tão sombrios, ele disse: —Trabalhar aqui é uma boa maneira de praticar. Tenho certeza que você vai aprender rapidamente. Seus sentimentos feridos não se recuperaram rapidamente, mas o que mais ele poderia esperar depois do que ela sofreu desde que foi traficada? Ela estava acostumada a ouvir que era estupida e inútil. Saber que ele não era diferente dos bastardos que a machucaram e usaram, não lhe caía bem, mas de alguma forma, ele


não podia pedir desculpas por ferir seus sentimentos. Ele havia sido criado para farejar fraquezas e atacá-las, afinal de contas. —Estamos prontos? —Lobo apareceu na porta atrás deles. —Eu tenho a van nas portas dos fundos. Merda. Ele nem a tinha ouvido voltar para o prédio ou abrir as portas que ele trancou. Como se lesse sua mente, ela acenou para a chave que havia feito mais cedo naquela manhã. Ela estava ficando boa. Talvez boa demais, ele se preocupou com um pouco de paranoia. Algum dia o aluno ultrapassaria o mestre e depois o quê? —Cuide de Holly enquanto levamos os pacotes para a van. —Ele instruiu Lana. —Quando terminarmos, você terá que ir com Lobo. Colocando a mochila de Lobo, Lana olhou para o homem morto e encolheu os ombros. —Eu não tenho medo de homens mortos. —Ela voltou sua atenção para Holly. —Homens mortos não podem me machucar. Kostya ignorou a pontada no peito com a observação e agarrou a extremidade pesada do pacote firmemente enrolado. Lobo levantou os pés e eles levaram o primeiro corpo para a van. Ela pulou na área de carga da van e guiou o cadáver para o ponto certo antes de pular e segui-lo até o segundo corpo. Este era mais pesado que o primeiro, mas ela não se queixou nem o fez carregar mais peso. Parecia que os exercícios aeróbicos e levantamento de peso que ela seguia estavam funcionando. Quando terminaram, ele tirou o macacão e as botas e jogou no saco de lixo. Enquanto Lana subia na traseira da van, ele puxou Lobo de lado no corredor. Ele colocou uma mão paternal no ombro


dela e apertou. —Você se saiu bem esta noite. Estou muito orgulhoso de você. Lobo ficou ereta, mas seus olhos traíram o choque que começava a tomar conta dela. —Foi mais difícil do que eu pensei que seria. —Eu sei. Nós praticamos e treinamos para reagirmos ao reflexo quando a merda bate no ventilador, mas isso não lava o sangue de nossas mãos mais facilmente. —Ele apoiou levemente o queixo dela, erguendo o rosto machucado e forçando o contato visual. —Se você acordar amanhã e decidir que isso foi demais, basta dizer e vou ajudá-la a começar de novo em um novo lugar. Tudo bem se você descobrir que este trabalho não é para você. Ela balançou a cabeça lentamente. —Isso não é o que me assusta. Eu acho, quero dizer, Deus. —Ela fechou seus olhos e sua expressão ficou sombria com autoaversão. —Eu acho que gostei demais. Tudo isso, o planejamento, se infiltrar, o esconderijo, o drogar, a execução. Foi bom. Pareceu certo. Seu peito se apertou dolorosamente. Todos esses anos, ele vinha treinando-a para esse momento. Ele sabia que estava chegando. Este era o resultado inevitável de transformá-la em sua pequena sombra, mas isso o retorceu por dentro. Foi assim que seus pais se sentiram quando reconheceram pela primeira vez a centelha de alegria em seus olhos? Foi assim que seus mentores e professores se sentiram a primeira vez que ele eliminou um alvo? Orgulhoso, mas conflituoso? —Você teve toda a sua família tirada de você. Você teve sua infância arrancada. O que você está sentindo agora, o poder e o controle sobre a vida e a morte, é inebriante. —Ele acrescentou conscientemente. —Mas também é perigoso. Você pode ficar entorpecida com esse tipo de poder sobre outras pessoas. Você


pode ficar viciada na adrenalina. Você pode começar a ver todos, até mesmo seus amigos, como sacos descartáveis de carne e ossos, em vez de pessoas de carne e osso com almas. Ela assentiu com a advertência dele. —Compreendo. Soltando a mão de seu ombro, ele apontou para as portas duplas. —Leve estes dois para a casa funerária. Krikun estará esperando por você. Passe-os pelo forno você mesma. Ele pode ser confiável, mas é um homem velho que precisa de seu sono. Lave a van e veja cada detalhe antes de deixá-la. Fox vai te seguir a noite toda. Ela vai tirar do ar todas as câmeras de trânsito pelas quais você passar e ajudá-la a evitar postos de controle da polícia. —Eu sei o que fazer, Big K. Ficar longe das estradas com pedágio. Ficar longe de áreas ocupadas que têm várias câmeras de segurança. Usar as estradas quando for possível e manter a cabeça baixa. —Mantenha seus olhos abertos. A cidade vai ser um lugar perigoso esta noite. —Você deixou sua arma na minha mochila? —Sim. —Vou me certificar de que esteja limpa e no mercado negro antes do amanhecer. Eu conheço alguém querendo levar algumas armas para o México. Ele franziu a testa para ela. —Tenho certeza que você conhece. Ela revirou os olhos. —Já te disse uma dúzia de vezes. Não é assim com ele. Ele é apenas um amigo. E não o tipo de 'apenas um amigo' que você é com Holly. —Ela falou.


Ela o pegou aí. —Tenha cuidado com esse menino. Algum dia ele vai querer mais do que você pode dar a ele, e vai começar a fazer muitas perguntas. —Você quer dizer como Holly faz com você? Irritação ardeu dentro dele. —Não seja espertinha, Lobo. — Ele apontou para a porta. —Vá. Termine esta merda. Ela zombeteiramente saudou-o e girou nos calcanhares para sair do salão. Depois de assistir a van sair, ele voltou para a sala de suprimentos e gentilmente juntou Holly em seus braços. Ele levou-a para o escritório e colocou-a na cadeira. Ele fez uma rápida visita à sala de suprimentos para mover as toalhas usadas no pallet de volta para as prateleiras e deu uma volta final no salão para se certificar de que tudo estava certo. —Hora de sair. —Ele instruiu Fox através de suas comunicações. —Nós terminamos aqui. —Eu mandei Sunny dar o fora uma hora atrás. Vou ficar de olho nas nossas garotas para garantir que elas passem pela cidade sem qualquer assédio. —Seus dedos podiam ser ouvidos batendo contra um teclado. —A cidade realmente precisa trabalhar nos firewalls que protegem essas câmeras de tráfego. Quero dizer, qualquer bandido com um teclado e um sinal WiFi poderia sequestrá-las para seus próprios propósitos nefastos... —Tente não ser presa. —Ele sugeriu secamente. Ela bufou rindo. —Esses aspirantes trabalhando para o centro de dados da polícia gostariam de poder rastrear uma garota como eu. —Boa noite, Fox. —Noite, chefe.


Com o trabalho feito, ele tirou o bigode falso e enfiou no bolso antes de limpar o resíduo pegajoso agarrado ao lábio superior. Tirou o fone da orelha e colocou-o no bolso de trás da calça jeans junto com a identificação falsa com um rádio transceptor embutido. Do outro bolso, retirou uma seringa tampada, cuidadosamente embrulhada por precaução, e o algodão embebido com álcool grudado nela. Ajoelhando-se ao lado da cadeira de Holly, ele considerou seu pequeno corpo por um momento. Ela tinha o corpo pequeno e magro de uma ginasta ou bailarina. O anti-sedativo que ele queria usar nela precisava ser injetado em um músculo com um pouco de preenchimento nele. Ele também precisava colocá-la em um lugar que ela não teria facilidade de ver, apenas no caso de ficar marcado. Um pouco de dor no quadril ou no traseiro não despertaria suspeitas. Ela poderia ter facilmente esbarrado em algo aqui no salão e não pensaria nada disso. Sentindo-se como o pior pervertido do mundo, ele a colocou na cadeira e apoiou seu corpo contra o dele antes de puxar a parte de baixo de suas calças e roupas íntimas para revelar um local de injeção adequado. Ele limpou a pele e destampou a seringa, mas hesitou alguns segundos antes de enfiar a agulha nela. Ele abominava o pensamento de lhe causar dor e odiava-se por invadir sua privacidade e tocar seu corpo sem seu consentimento. Havia uma palavra para os homens que faziam coisas desse tipo, e o enervava pensar que ele havia cruzado aquela linha, tudo para salvá-la. Depois de administrar a droga, ele guiou Holly de volta para a posição sentada e enfiou a seringa tampada de volta no bolso. Ele recuou lentamente para a porta do escritório e esperou que ela acordasse completamente. Não demoraria muito. Dez minutos, talvez quinze, se o corpo demorasse a reagir à medicação.


Enquanto esperava que Holly despertasse, fez uma anotação mental para pedir a Zec que lhe trouxesse outra remessa de medicamentos. O transportador albanês tinha uma rede global que movia o contrabando de coisas ilícitas e legais. Ele era o único homem em quem Kostya confiava para pegar as drogas específicas que queria de estoques secretos russos e não falsificações perigosas ou ineficazes. Essa droga específica que ele usara em Holly ele também havia dado a Lobo algumas semanas antes para ajudá-la a entender os efeitos e como usá-los para sua vantagem. Uma dose baixa da droga e, uma pessoa se lembraria de pedaços do que havia testemunhado ou ouvido enquanto ia e vinha de um estado sonolento. Demais, e seria hora de fazer uma viagem para a funerária para usar o forno novamente. Holly fez um som suave de choramingo. Prendendo a respiração, ele assistiu das sombras da porta quando ela acordou devagar. Quando ela começou a esticar os braços acima da cabeça, balançando os dedos na direção do teto, ele se afastou do escritório até chegar à porta dos fundos do salão. Esticando a mão, ele abriu e fechou as portas com um estrondo alto. —Holly? —Ele chamou o nome dela em voz alta. —Holly, você está aqui? —No meu escritório. —Ela respondeu em uma voz sonolenta e um pouco confusa. Ele caminhou pelo corredor até o escritório dela e entrou. De frente para a porta, ela se recostou na cadeira e esfregou as têmporas. Olhando para ele completamente desnorteada, ela perguntou: —O que você está fazendo aqui? —Eu estava com um amigo. Nós passávamos de carro e percebi que seu carro ainda estava estacionado aqui. Eu pedi a ele


para me deixar aqui. Eu estava preocupado com você. —Nem tudo isso era mentira. Não a parte mais importante. Ela respirou fundo e olhou ao seu redor. —Devo ter adormecido depois que Savvy foi embora. —Ela bocejou alto e então fez uma cara envergonhada. —Desculpe! Isso não foi muito uma grande soneca, eu acho. Não se ainda continuo com tanto sono... —Deixe-me levá-la para casa. No que quer que você esteja trabalhando, pode esperar até amanhã. —Ele gentilmente ordenou. Com parte do sedativo ainda circulando em seu sistema, ela estava aberta à sugestão e facilmente manipulável. Ele queria agir corretamente aqui e lembrou a si mesmo de novo para ter muito cuidado. —Você precisa dormir um pouco. Holly olhou ao redor do escritório e depois assentiu. —Eu acho que você está certo. Eu não me sinto segura para dirigir. —Ela sorriu para ele, sua expressão atordoada mostrando apenas o quanto da droga ainda corria por suas veias. —Você é o melhor vizinho de todos os tempos. Ele devolveu o sorriso dela, mas por dentro sentia puro desgosto consigo mesmo. O melhor vizinho de todos os tempos? Dificilmente, ele pensou enquanto a ajudava a fechar o salão e a sentava no banco do passageiro do seu cupê esportivo de luxo. Na verdade, ele havia sugerido a concessionária de Alexei no verão e até mesmo a ajudara a barganhar o preço do carro dos sonhos que ela queria. —Vermelho tango com couro cinza. —Ela disse repetidamente para o vendedor. Era a única coisa que ela queria, e estava tão orgulhosa de si mesma por comprar o carro dos seus sonhos.


Claro, ela não tinha ideia de que ele havia pago por esse desconto na vez seguinte que jogou cartas com Alexei... —Tenho certeza de que tranquei a porta depois que Savvy foi embora. —Ela murmurou sonolenta do banco do passageiro enquanto eles voavam pela estrada em direção ao bairro do West U. —Você me deu uma chave. —Ele facilmente cobriu seu erro. —Você estava me falando sobre os problemas do sistema de segurança na semana passada e me deu uma chave extra quando me ofereci para verificar. —Oh? Certo. —Ela respondeu incerta. Esfregando a testa, ela suspirou. —Eu realmente tenho que parar de trabalhar essas longas horas. Meu cérebro está se transformando em uma completa desordem. Você é um maldito bastardo. Um verdadeiro merda. Ele tinha feito algumas coisas realmente terríveis em sua vida, mas colocar essas drogas na bebida de Holly, foi a pior de todas. Ele não estava acostumado com o sentimento de culpa corroendo-o e não gostou nem um pouco. —Você só precisa descansar um pouco. —Ele guiou o carro pela rodovia e desceu uma rua lateral. —Talvez eu precise de férias. —Ela lentamente virou a cabeça para olhar para ele. —Talvez devêssemos ir em um cruzeiro. —Nós? —Ele olhou para ela. —Eu e você? —Claro. Por que não? A imagem de Holly tomando sol em um minúsculo biquíni no convés de um navio de cruzeiro fez seu estômago apertar. Ele limpou a garganta e se mexeu no assento. —Eu não sou realmente um cara de cruzeiro.


Ela revirou os olhos e zombou. —Você não é um cara de cruzeiro. Você não é um cara para ter cachorro. Você não é um cara que namora sua vizinha. Que tipo de cara você é? Ele estremeceu. Ela estava de língua solta por causa da droga e parecia ter um assunto para resolver com ele. Você não é um cara que namora sua vizinha. De onde diabos veio isso? —Eu lhe disse por que não usei o certificado do abrigo. Eu viajo demais, Holly. Eu não posso ser um dono de cachorro agora. —Ele não podia dizer a ela que cachorros latiam e eram intrometidos e gostavam de cavar coisas que ele gostaria de manter enterradas. —Então, deixe o cachorro comigo quando você estiver fora da cidade. —Ela ofereceu. —Nós podemos ser coproprietários! O pensamento de possuir um cachorro com Holly fez algo estranho em seu peito. Ele não tinha certeza do que era essa emoção queimando. Esperança? —Vamos conversar sobre isso amanhã, ok? Sorrindo triunfantemente, ela cutucou o braço dele. —Você é um grande molenga! —Holly. —Ele lançou a ela um olhar irritado, mas ela apenas imitou sua expressão de uma forma exagerada antes de cair na gargalhada. —Você está uma bagunça. —Ele comentou, incapaz de manter uma cara séria enquanto ela ria ao lado dele. E é tudo minha culpa... Ela inclinou a cabeça para trás contra o assento e suspirou alto. Ele estacionou na entrada da casa dela e apertou o controle da porta da garagem preso à viseira. Enquanto ela desenhava formas preguiçosas na janela, ele verificou o interior da garagem e, em


seguida, usou a chave da casa para fazer uma rápida inspeção pela casa, abrindo as portas dos armários e até mesmo verificando o quintal. Um terceiro ou quarto assassino sempre era uma possibilidade. Ele voltou para a garagem e abriu a porta do carro. —Vamos. —Ele estendeu a mão para destravar o cinto de segurança. —Eu vou levá-la para a cama. Ela bocejou de novo e saiu do carro com a ajuda dele. Ele a seguiu até a casa e persuadiu-a a comer alguma coisa, um copo de limonada de uma caixa na geladeira e uma banana, antes de levá-la para seu quarto. Era exatamente o tipo de espaço que ele sempre imaginara para ela. Com a cabeceira da cama de metal branco e o edredom fofo, o quarto cinza parecia um item que ele veria na capa do Country Living enquanto esperava na fila do supermercado HEB. Ela não parecia tão sonolenta, mas ainda estava um pouco instável quando entrou no banheiro. Ele se debruçou contra a parede mais próxima da porta do quarto dela e checou seu celular em busca de mensagens e atualizações de suas aranhas. Quando Holly saiu do banheiro com uma calça comprida e uma camiseta solta, ele observou seus movimentos e tentou avaliar se ela estava segura para dormir sozinha ou se ele deveria arrastar uma cadeira para cá, apenas por precaução. Quando ela cambaleou um pouco, ele cruzou o espaço entre eles rapidamente e passou o braço em volta da cintura dela. Ela caiu contra ele e baixou a testa contra seu peito. —Desculpe. Estou me sentindo um pouco tonta. —Eu posso ver. —Repreendendo-se silenciosamente por não ser mais conservador com a dose sedativa, Kostya cuidadosamente a levou até a cama e se abaixou para retirar o edredom e o lençol de cima. Ele ajudou-a a ir para a cama e depois


se virou para ligar a lâmpada. —Eu vou deixá-la acesa no caso de você se levantar mais tarde. —Kostya? —Ela disse o nome dele naquela voz suave e ofegante que fez seu pau ficar atento. Quando ela enfiou os dedos ao redor dos dele e apertou sua mão, seu coração começou a bater feito louco. —Você vai ficar comigo? Ele engoliu em seco. —Eu vou ficar em seu sofá. —Não. —Ela deu um puxão na mão dele antes de rolar para o lado de frente para a janela, arrastando o braço dele com ela. — Fique aqui comigo. —Holly, eu não acho que... —Eu preciso de você. —Ela interrompeu-o com as três palavras certas para mantê-lo ali. Ela o tinha na palma da mão e não estava prestes a soltar. Com sua voz abafada pelo travesseiro, ela implorou: —Fique. —Tudo bem. Eu ficarei. Ele gentilmente soltou sua mão e sentou-se na beira da cama dela. Abriu o zíper de suas botas e retirou-as antes de se voltar para libertar sua arma favorita do cós de sua calça jeans. Ele colocou na mesa de cabeceira e, em seguida, correu os dedos pelos cabelos, coçando o couro cabeludo e soltando uma respiração barulhenta. Deixando a calça jeans, ele tirou a camisa e as meias e foi para a cama com ela. Esta com certeza não era a maneira que sempre imaginei isso acontecendo... Tendo cuidado para não tocá-la, ele ficou na beira da cama e manteve cerca de quatro ou cinco centímetros entre eles. Ele ouviu a respiração dela e poderia dizer que não estava dormindo ainda. O que ela estava pensando? Estava lembrando de coisas que tinha ouvido esta noite? Ela estava se perguntando por que tinha


adormecido tão rapidamente? Ou tentando lembrar de uma conversa sobre essa chave e o sistema de segurança que nunca tinha acontecido? Sentindo-se o pior dos canalhas, ele engoliu ansiosamente e passou a mão pelo rosto. Missões secretas e longas nunca o tocavam assim, nem mesmo quando era ordenado a seduzir seus alvos ou persuadi-las a se relacionar para obter informações confidenciais. Mas mentir para Holly estava destruindo-o lentamente por dentro como um câncer. Estava corroendo sua medula e deixando-o vazio e dolorido. —Você está bem? —Ela sussurrou a pergunta, como se tivesse medo da resposta. —Estou bem. —Ele mentiu. Virando-se para que pudesse olhar para as costas dela, ele perguntou: —Você está bem? —Estou com frio. —Ela admitiu. Já enterrada profundamente sob o edredom, ela tremeu. Ele estava prestes a perguntar se ela queria outro cobertor quando ela virou-se de frente para ele e procurou seu rosto com olhar questionador. —Você vai me abraçar? Como se ele pudesse dizer não! Ele abriu os braços para ela e Holly se enfiou neles, descansando a cabeça em seu peito e passando um braço em seu abdômen. Ela soltou um suspiro satisfeito e depois se aconchegou mais perto. —Você está quente. —Disse ela em uma voz feliz e sonolenta. —E você tem um cheiro muito bom! Ele reprimiu uma risada e roçou os dedos na nuca dela, deleitando-se com a suavidade de seu cabelo loiro claro. Ele estava quebrando as regras agora, segurando-a assim, tocando seu cabelo e acariciando suas costas, mas ele não se importava. Ele não dava mais a mínima.


Eu matei por você hoje à noite. O que Holly diria se ele confessasse seus pecados? Será que ela o amaria pelo que ele fez para protegê-la ou fugiria horrorizada? O que ela diria quando ele lhe dissesse que tinha pedido à outra jovem para matar em seu nome? Algum dia, em breve, a verdade sobre o monstro que ele era e todas as suas mentiras seriam forçadas a sair e Holly o insultaria. Ela amaldiçoaria a visão dele e desejaria que ele morresse. Então esta noite? Esta noite, ele iria segurar a mulher dos seus sonhos, a mulher que ele nunca poderia ter, e iria aproveitar cada maldito segundo dela. Ele respiraria seu perfume tentador e o imprimiria em seu cérebro para que não o esquecesse. Ele memorizaria a curva suave de sua cintura e o calor dela ardendo na ponta dos seus dedos. Minha, ele pensou possessivamente. Esta noite ela é minha. —Eu não me importo com o que Savvy diz. —Ela murmurou inesperadamente. —Você é um bom homem, Konstantin. Seu coração vacilou em seu peito. Ele não conseguia nem lembrar da última vez que alguém usou seu nome completo. Trinta anos atrás? Antes de entrar na sede do FSB e se comprometer com a causa? A noite em que sua mãe lhe deu um beijo de despedida antes de mandá-lo embora para passar um tempo com amigos no interior da Alemanha numa perigosa tentativa de salvar sua vida? Quando Holly adormeceu, ele fechou os olhos e passou os dedos pelo cabelo dela. Um bom homem? Não, nunca. Mas esta noite? Esta noite, ele poderia fingir que era tudo que Holly merecia.


CAPÍTULO QUATRO Eu acordei com uma vibração estranha no meu quadril. Totalmente confusa, levei alguns segundos para perceber que era um celular vibrando. Ainda mais estranho? Eu podia ouvir o som baixo, não familiar e inesperado de um batimento cardíaco bem embaixo do meu ouvido. Confusa, pisquei algumas vezes. A sensação de pele quente sob as pontas dos meus dedos e bochecha me surpreendeu. Eu levantei minha cabeça e olhei com os olhos sonolentos ao redor do meu quarto. Minha mente era uma confusão de lembranças, mas algumas eram mais claras do que outras. Kostya em pé na porta do meu escritório. Kostya me levando para casa. Kostya subindo na cama comigo depois que pedi para ele ficar. Kostya me segurando quando eu disse que estava com frio. Puta. Merda. Eu realmente pedi para ele dormir comigo? Calor queimou o meu rosto e se espalhou pelo meu pescoço. Estávamos na cama juntos, e eu estava aconchegada contra ele com uma perna enganchada sobre a dele. Eu criei coragem para olhar para ele, e meu coração palpitou descontroladamente. Eu nunca estive tão perto dele. Eu podia ver as linhas suaves ao redor de seus olhos, a barba por fazer escurecendo suas bochechas e queixo e sentir o cheiro persistente de eucalipto de sua loção pós-barba. Arrastando meu olhar pelo rosto bonito, finalmente notei a incrível quantidade de tatuagens cobrindo sua parte inferior do pescoço, ombros e tronco. Todos esses anos nós vivíamos lado a lado e eu nunca o tinha visto sem camisa. Agora entendi o porquê.


Havia uma tatuagem de um punhal perfurando a pele abaixo do seu pescoço. Sangue escorria na ponta afiada. Mais abaixo em seu peito havia teias de aranhas que rastejavam com viúvas negras. Escorpiões rastejavam pelas suas clavículas. Um diabo rosnando e um gato com presas usando uma cartola, decoravam seu bíceps. Havia palavras russas que eu não sabia ler e outros símbolos que não conseguia distinguir na fraca luz da manhã. A advertência de Savannah da noite passada soou alta e clara em minha mente. O que ela disse sobre as tatuagens do marido de Erin? Elas queriam dizer coisas ruins, certo? Mas que coisas ruins? —Você pode perguntar. —A voz grave de Kostya me assustou. Envergonhada por ter sido pega olhando seu corpo tonificado e aquelas tatuagens interessantes, lancei um olhar tímido para o rosto dele. Ele tinha um olho aberto e seguia meus movimentos com ele. Não tendo certeza se queria ouvir as respostas que ele poderia ter para as tatuagens, eu disse: —Eu ia perguntar se você queria que eu preparasse o café da manhã. Seu outro olho se abriu com surpresa. Ele levantou a cabeça do travesseiro e olhou para baixo para mim. —Você não tem que cozinhar para mim. Eu revirei meus olhos. —Eu sei disso, mas eu quero. —Eu levantei meu braço e corajosamente tracei o contorno da adaga em seu pescoço. Senti sua respiração quente no meu braço enquanto ele exalava instavelmente. Eu que fiz isso? Foi meu toque? —Você está aqui. Eu estou aqui. Eu estou com fome. Você provavelmente está com fome. Assim... Eu podia sentir sua garganta se mover enquanto ele engolia. Sua voz ainda grave com o sono, ele disse: —Estou com fome.


—Bom. —Sentindo-me um pouco descarada, eu me arrastei e saí da cama. Quando me levantei, a pistola na minha mesa de cabeceira chamou minha atenção. Ele deve ter me visto olhando para ela porque rapidamente disse: —Está travada. —Eu posso ver. —Abri a gaveta de cima da minha mesa de cabeceira para revelar meu esconderijo de armas. Por nunca ter crianças na minha casa eu tinha optado pelo fácil acesso em vez de um cofre mais seguro. —Eu preferiria que você deixasse aqui quando estiver por aqui. —Percebendo o que disse, acrescentei apressadamente: —Quero dizer, você sabe, se estiver aqui de novo por qualquer motivo. Encolhendo-me pelo jeito que eu tinha tropeçado sobre o convite para dormir comigo de novo, esperei que ele dissesse alguma coisa. O sorriso de Kostya me deixou à vontade. —Eu entendo o que você quer dizer. —Ele colocou sua pistola SIG Sauer no compartimento ao lado da minha Walther. Aparentemente impressionado, ele disse: —Eu nunca imaginei que você era do tipo de garota que tinha uma arma próxima a cama. —Então você vai ficar realmente surpreso quando você espreitar dentro da minha bolsa Tory Burch e ver um pequeno 38 especial pendurado no meu coldre de bolsa. Ele pareceu relaxar com a menção da minha arma de transporte escondida. —Você está sempre armada? —Minha mãe exigiu isso. O mundo está cheio de psicopatas, sabe? —Sim, eu sei. —Ele parecia triste quando confirmou isso. Considerando sua linha de trabalho, eu só podia imaginar que tipo de loucos ele encontrava quando configurava sistemas de segurança para seus clientes. —Devíamos ir atirar algum dia.


—Só se você prometer não fazer beicinho quando eu te vencer no tiro ao alvo. —Eu avisei. Kostya riu e cruzou seu coração com a ponta do dedo. —Eu vou estar no meu melhor comportamento. Decidindo que eu gostava da visão dele na minha cama com aquele grande sorriso, eu fui para o meu banheiro. Eu parei na porta e olhei de volta para ele. Ele rolou de lado, apoiando a cabeça em sua mão, e me observou com a intensidade de um predador explorando uma presa. Um frisson de prazer selvagem queimou em minha barriga e meu peito. —Você pode usar o banheiro de hóspedes do outro lado do corredor. —Eu não sabia o que estava acontecendo entre nós agora, mas parecia um pouco intenso e apressado, então pisei no freio. — Há artigos de toalete extras na gaveta de cima da penteadeira. Oh! E o seu telefone estava tocando. —Era isso? —Ele franziu a testa e deu um tapinha no bolso de sua calça jeans. —Desculpe por ter te acordado. —Eu tenho que ir para o salão logo de qualquer maneira, então não é grande coisa. —Você precisa que eu dirija para você esta manhã? —Ele estreitou os olhos e me examinou. —Você ficou tonta ontem à noite. Como está se sentindo agora? —Eu me sinto ótima. —Dei de ombros. —Eu não tenho ideia do que aconteceu ontem à noite. Acho que preciso começar a ser um pouco mais gentil comigo mesmo e parar de ficar até tarde da noite. —Parece uma boa ideia. —Ele sentou-se e fiquei maravilhada com o jeito que seu abdômen magro ondulou com o movimento. Eu sempre suspeitei que ele era seriamente definido por baixo de


sua roupa, mas isso era incrível. Eu poderia realmente contar os sulcos de seus músculos abdominais. —Holly? —A expressão divertida em seu rosto me disse que ele sabia exatamente o que eu estava fazendo. —Há mais alguma coisa? —Não. —Eu rapidamente entrei no banheiro e fechei a porta. Inclinando-me, inalei uma respiração firme e tentei parar de sorrir. De repente, eu tinha quinze anos de novo e estava à beira de uma risadinha animada, porque Dean Chavez, o melhor quarterback do ensino médio em Houston, havia me convidado para o baile de formatura. Não que minha mãe tivesse me permitido ir, lembrei-me com uma cara feia. Ela ficou horrorizada e me sujeitou a uma conversa de duas horas sobre os males dos meninos mais velhos e como era importante ser uma mulher forte com uma carreira estabelecida antes de acrescentar as complicações que um homem traria. Na época, eu fiquei muito zangada com ela por matar minhas chances com o garoto mais fofo da cidade. Agora, claro, eu entendia o que ela estava tentando me ajudar a entender. Tudo o que eu havia realizado tão cedo na vida foi devido ao seu apoio e orientação. Mesmo quando nos desentendíamos e brigávamos como feras, eu sempre sabia, lá no fundo, que ela estava tentando me ajudar a alcançar meu pleno potencial. Entrando no banho, não pude deixar de imaginar o que ela pensaria do meu relacionamento com Kostya. Ela só o encontrara uma vez, brevemente, e eu imediatamente senti que ela não gostou dele. Sabendo como o seu próprio caso com um russo tinha ido tão mal, ela não ficaria muito entusiasmada comigo mergulhando meus dedos naquela água envenenada. Nunca havíamos falado sobre o meu pai ou por que ele a deixara para criar uma filha sozinha. Às vezes eu me preocupava que ela estivesse escondendo um segredo obscuro de mim. E se meu pai


tivesse outra família? Uma esposa e filhos? Ou talvez ele fosse um político corrupto que ela conheceu através de suas conexões de petróleo e gás? Ou – que Deus me perdoe – um criminoso? Enquanto eu estava no meu momento vaidade secando e penteando meu cabelo, não conseguia parar de pensar nas tatuagens no corpo de Kostya. Apliquei uma maquiagem, nada muito pesado e apenas o suficiente para destacar meus olhos e boca, e decidi que iria perguntar a ele. Se ele ficasse cauteloso ou estranho, eu teria minha resposta. Eu peguei um vestido preto com um decote V profundo no lado do meu guarda-roupa onde eu mantinha todo o meu vestuário de trabalho e coloquei-o sobre minhas roupas de baixo. Calcei um dos meus pares favoritos de saltos Manolos e uma joia turquesa para complementar a roupa toda preta. Depois de arrumar o banheiro, arrumei a cama e saí do meu quarto. Kostya estava na minha sala de estar com uma xícara de café em uma das mãos e seu celular na outra. Ele estava batendo na tela com o polegar enquanto assistia ao noticiário da manhã. Percebi seu olhar persistente quando fiquei ao lado dele para pegar as últimas atualizações sobre Houston. —Estão prevendo chuva esta noite. —Seu olhar desceu para os meus saltos altos. —Você pode querer deixar suas botas de chuva cor-de-rosa no carro para não ter que andar pelo estacionamento hoje à noite com esses sapatos de mil dólares. Ele tinha razão. Sabendo que eu esqueceria, segui logo para a sapateira ao lado da porta da garagem, peguei minhas botas de chuva e as coloquei no meu carro. Quando voltei para dentro, a boca de Kostya se curvou em um sorriso quando ele se inclinou um pouco para trás para cobiçar meu traseiro. —Eu nunca entendi como você aguenta usar isso doze horas por dia, mas aprecio o esforço.


—Pervertido. —Eu disse, batendo levemente no braço dele. Antes que pudesse continuar flertando, minha atenção foi desviada pela notícia horrível piscando na tela da televisão. Houve algum tipo de assassinato de cartel durante a noite. A tela era um borrão de imagens – fita amarela da polícia, viaturas policiais com luzes piscantes, tropas estaduais em seus chapéus Stetsons, peritos na cena do crime e calçadas ensanguentadas. —O que diabos está acontecendo com esta cidade? —Lancei um olhar de pura incredulidade para Kostya enquanto ele calmamente bebia seu café. —Foi uma coisa boa que nós estávamos cuidando da nossa vida e ficamos no meu salão na noite passada! Pelo menos estávamos a salvo lá. Assentindo, ele lentamente tomou um gole de café antes de desviar o olhar para mim. —Você quer ajuda com o café da manhã? —Eu cuido disso. —Eu fui para a cozinha. —Espero que você goste de panquecas, porque essa é a minha especialidade. —Eu gosto de panquecas. —Ele me seguiu e sentou-se em frente à ilha, em uma das banquetas do balcão. —Eu peguei o jornal na sua garagem. Você quer que eu leia a primeira página para você? Eu fiz uma careta. —Não, provavelmente é apenas violência e desordem. Basta jogá-lo na minha lixeira quando terminar. Enquanto pegava os ingredientes necessários da despensa e da geladeira, ele leu em voz baixa no balcão. —Seu novo anúncio é legal. —Ele mostrou o anúncio de meia página acima da dobra para mim. —Eu também vi alguns de seus novos outdoors espalhados pela cidade. —Isso é tudo coisa da Savannah. —Eu quebrei os ovos em uma tigela e joguei as cascas no recipiente para compostagem


embaixo da pia. —Ela é o cérebro por trás de toda a promoção e marketing que fazemos. —Deve funcionar. —Honestamente eu acho que o boca-a-boca impulsionou nossos negócios mais do que qualquer propaganda chamativa. —Eu despejei um pouco de leite na tigela e misturei as gemas com um garfo. —Francamente, Lena Cruz levar Vivian e Erin para o salão levou ao nosso maior boom de negócios de todos os tempos. Costumávamos receber a maior parte das nossas clientes pelo bocaa-boca através de Bianca e suas noivas, mas hoje em dia nossas novas reservas são de senhoras que conhecem Vivian ou Erin. —Eu só posso imaginar quantos novos rostos vieram para o salão. —Ele virou a página e examinou o próximo conjunto de manchetes. —Aquelas duas nunca encontraram um desconhecido. Eu sorri do jeito que ele descreveu as duas amigas. Imaginando que esta era uma boa abertura para perguntar sobre as tatuagens, eu disse: —Você conhece o marido de Erin, certo? —Sim. —Da Rússia? Ele baixou o jornal. —Você está me perguntando se eu sei que o marido dela é russo ou se eu o conhecia na Rússia? Eu bufei para ele. —Obviamente, estou perguntando se você o conheceu na Rússia. Ele sorriu antes de levantar o jornal novamente. —Sim, eu o conheci naquela época. Quando ele não fez mais nenhum comentário, me perguntei por que ele estava sendo deliberadamente vago. Eu medi a mistura para uma panqueca e despejei na tigela. Ele continuou lendo o jornal


enquanto eu aquecia uma panela e deixava cair a primeira colherada de massa sobre a superfície quente. Eu cutuquei a panqueca com a ponta da espátula e decidi ser ousada. De pé ao lado do meu fogão a gás, eu podia ficar de olho no nosso café da manhã e nele. — Kostya? —Sim? —Seu olhar estava colado ao jornal a sua frente. —Suas tatuagens... —Minha voz sumiu enquanto eu tentava pensar em como perguntar sem ser, bem, rude. —Elas se parecem muito com as que o marido de Erin tem em suas mãos. Ele lentamente levantou a cabeça e pousou o jornal. Eu não conseguia ler sua expressão impassível. Ele alisou os dedos sobre o papel do jornal. Com um olhar firme, não piscou nem desviou o olhar. Era quase como se ele quisesse me assegurar que não estava mentindo quando disse: —Elas se parecem muito com as de Ivan porque as fizemos pelas mesmas razões. Sem saber o que fazer com essa abertura que ele permitiu, virei a panqueca. Kostya se levantou e caminhou para o armário onde eu guardava os pratos. Ele pegou dois e os estendeu para mim para que eu pudesse colocar a panqueca pronta em um deles. Nossos olhares se encontraram. Era quase como se ele estivesse me desafiando a perguntar. Então eu perguntei. —Você está na máfia russa? —Sim. —De pé tão perto dele, pude ver a tensão desaparecer em sua mandíbula e pescoço. Ele pareceu aliviado em confirmar minha suspeita. —Você quer ovos? Sua pergunta me balançou, e eu fiz uma careta para ele. —Eu pergunto se você está na máfia, e você me pergunta se quero ovos?


—Eu gosto de ovos com panquecas. —Ele disse com naturalidade. Não tendo certeza se essa era a sua maneira de mudar de assunto ou se ele tentava ganhar algum tempo para decidir o quanto me dizer, apontei para o pote na ilha. —Você sabe onde as panelas e os ovos estão se você quiser. —Está certo. Enquanto eu terminava as panquecas, ele mexeu alguns ovos, me oferecendo um pouco enquanto eu pegava manteiga, calda e talheres. Coloquei leite de amêndoas em um copo e reabasteci sua xícara de café antes de me juntar a ele na ilha. —É tudo o que você queria saber? —Ele perguntou antes de atacar seu café da manhã. —O que mais posso saber? —Eu enfiei meu garfo nos ovos. Isso era um território novo e – francamente – assustador para mim. Eu não tinha certeza do que poderia ou deveria perguntar. —Acho que você provavelmente já sabe mais do que eu gostaria. —Ele disse entre as mordidas. —Acho que você se perguntou sobre Vivian e Erin, sobre seus maridos, suas tatuagens e se os rumores sobre como eles ganham dinheiro são verdadeiros. Eu acho que você sabe exatamente o que o tio de Nisha Jackson faz, e tenho certeza que você sabe tudo sobre o ex-marido dela estar preso por drogas e armas. Acho que você provavelmente já ouviu coisas sobre mim que a deixaram confusa. Bebi meu leite de amêndoas confessando: —Savvy me disse que você é dono de clubes de striptease. —Sim, eu sou. —Ele espalhou um pouco de manteiga em sua pilha de panquecas. —Isso te incomoda?


—Claro que sim! Ele fez uma cara estranha. —Por quê? —Mesmo? —Eu não acreditei nem por um segundo que ele fosse tão estúpido. —Você tem que perguntar por que acho que é repugnante você possuir clubes onde mulheres tiram suas roupas por dinheiro? —Ninguém as força a dançar. Elas são contratadas independentes, e a maioria delas – aquelas que compreendem seu ofício e tiram vantagem de seus atributos naturais – são muito bem recompensadas. —Konstantin! Ele pareceu surpreso com o tom estridente que usei. Seus olhos se arregalaram. —Essa é a segunda vez que você me chama pelo meu nome completo nas últimas oito horas. —E? —E eu gosto disso. —Ele admitiu com uma voz áspera. Uma emoção vívida surgiu em meu peito com seu olhar aquecido. Apontando meu garfo para ele, avisei: —Pare de tentar me distrair com sua sensualidade russa. Eu não terminei com este negócio desagradável de clubes de striptease. Ele sorriu e reconheceu que eu percebi seu jogo com um leve aceno de cabeça. —Você já esteve dentro de um clube de strip? Um sofisticado. —Ele esclareceu. —Um clube masculino muito chique. —Não! —Você gostaria de visitar um? Algo selvagem e pecaminoso queimou em mim. O tabu de um clube de striptease era um dos que eu nunca ousara admitir. A


ideia de ir para uma casa de striptease com Kostya, de ter uma dança erótica perto de mim ou entrar em uma dessas cabines VIP sozinha com ele, fez com que eu apertasse minhas coxas. —Você não tem que decidir hoje. —Ele cortou um belo triângulo de panquecas com o garfo. —O convite fica de pé. Comemos em silêncio por alguns instantes. Por fim, perguntei: —Por que clubes de striptease? O seu negócio de segurança não traz um bom dinheiro? —Meu estômago se apertou quando outro pensamento me atingiu. —Seu negócio de segurança é real, não é? —É real e, sim, é muito lucrativo. —Mas? —Mas clubes de striptease facilitam a lavagem de dinheiro. —Afirmou. Eu o observei com surpresa e um pouco de suspeita. —Você está sendo muito sincero hoje. —Talvez seja hora de ter um pouco de honestidade em nosso relacionamento. —Ele resmungou. Eu não gostei de como isso soou. —Eu nunca menti para você, Kostya. —Estava falando de mim. —Disse ele, seu tom cheio de ódio. —Bem, quero dizer, presumo que a coisa da máfia só funciona se você guardar segredo, certo? —Isso geralmente é verdade, sim. —Nós compartilhamos um olhar que fez meu peito doer. —Você entende que tudo o que eu te disse esta manhã tem que ser nosso segredo agora. Se alguém


achar que você sabe mais do que deveria, você estará em perigo. Se você contar a seus amigos, também os colocará em risco. —Compreendo. —O peso de sua admissão sobrecarregou meus ombros. Savannah nunca perguntaria, mas ela saberia. Ela tinha um jeito de me ler que era igual a minha mãe. Minha mãe... Oh, inferno. Ela ficaria furiosa se descobrisse que eu estava me envolvendo com um homem ligado à máfia russa. Sempre que ela falava de seu tempo na Rússia – e isso era raro – era para me avisar sobre o quão perigoso e corrupto o país era e como a máfia controlava tudo por lá. Kostya terminou seu café da manhã, pegou uma laranja da tigela no balcão e tirou uma faca afiada do bolso. Ele cortou a parte superior e inferior da laranja e cortou uma fatia antes de abri-la para revelar fatias perfeitamente seccionadas. Vendo seu trabalho limpo e a maneira fácil com que segurava a faca, comecei a me perguntar o que exatamente ele fazia pela máfia russa. —É lavagem de dinheiro a sua especialidade? —Nem perto. —Ele respondeu enquanto limpava a faca e a dobrava-a para fechar. Olhando em meus olhos, ele avisou: —Você pode fazer perguntas, mas nem sempre responderei a elas. Não é que não confie em você para ficar quieta. Eu simplesmente não acho que você precisa ser sobrecarregada com a realidade do que eu faço. Seu tom sinistro me assustou. Eu agarrei um guardanapo quando me ocorreu que talvez ele tenha usado aquela faca para cortar algo diferente de laranjas. Eu queria perguntar a ele. A


questão estava bem ali na ponta da minha língua, mas eu não conseguia fazer meus lábios se moverem. Era assim que era para Vivian Kalasnikov? Se os rumores fossem verdadeiros, seu marido era o chefe da família que Kostya servia. Ela ficava sentada em casa imaginando o que seu marido fazia o dia todo? Se preocupava com o risco de prisão? Se preocupava que alguém pudesse colocar um assassino atrás de seu homem ou até mesmo nela? —O que você está pensando agora? —Ele me estudou de perto enquanto descascava outra laranja. —Honestamente? Estou pensando na tatuagem no pescoço de Vivian. —Eu toquei o mesmo ponto na minha pele. —Não estava lá na primeira vez que cortei o cabelo dela, um tempo antes de ela se casar. Quando notei, alguns cortes de cabelo depois, achei que era apenas uma coisa bonita, mas agora? —Eu gesticulei para a base de seu pescoço onde vi aquela tatuagem de punhal. —Agora estou pensando que talvez a coroa em seu pescoço signifique algo para as pessoas em seu mundo. —Significa que ela pertence a Nikolai. —Ele estendeu uma parte da laranja e ofereceu para mim. —Isso significa que ela está sob sua proteção. Quando peguei, Kostya me surpreendeu gentilmente capturando minha mão e me puxando para mais perto. Ele me alimentou com a laranja, pressionando a suculenta fatia de fruta contra os meus lábios e provocantemente deslizando sobre minha pele. Segurando o meu olhar, ele disse: —Isso significa que Nikolai vai matar qualquer homem que a tocar, porque ela é sua rainha. Houve uma agitação selvagem no meu estômago quando o doce sabor cítrico explodiu na minha língua. Kostya arrastou o polegar ao longo meu lábio inferior, limpando o suco pegajoso na


minha pele. Ele lentamente lambeu o resíduo de seu polegar, e meus dedos dos pés se curvaram quando imaginei aquela lambida na minha boceta. Ainda segurando minha mão, ele entrelaçou nossos dedos e estendeu a outra mão para enrolar um pouco do meu cabelo em torno de seu dedo indicador. —Tivemos uma noite interessante e uma manhã muito agradável. —Mas? —Eu sabia o que estava por vir. Ele finalmente me deu um gostinho do que poderíamos ter juntos, mas parecia quase com medo de acreditar que poderia ser permanente. —Mas. —Ele disse com um suspiro pesado. —Minha vida está muito complicada neste momento. Eu não posso, não vou fazer isso com você. —E se eu não me importar que sua vida seja complicada e confusa? Ele deu um puxão brincalhão no meu cabelo. —Eu acabei de dizer que estou cercado, e você está discutindo por que estou tentando te proteger. —Sou uma menina crescida, Kostya. Sei como me proteger. Ele me olhou por alguns momentos. —Quatro semanas. Franzi a testa com confusão. —Eu não entendo. —Quero que você realmente pense sobre o que eu te disse esta manhã. Quero que você entenda o que significa estar com alguém como eu. Toda essa merda que você viu nos noticiários esta manhã? Essa é a minha vida, Holly. De repente, ocorreu-me que sua visita ao salão na noite anterior não tinha sido coincidência. —Você veio por mim ontem à


noite? Você sabia que o cartel estava na cidade? Você foi ao salão para me proteger? —Sim. —Sua mão se moveu do meu cabelo para a minha bochecha com um toque terno. —Para todas as três perguntas. Não é segredo que somos amigos. Ferir você me machucaria. Eu podia não ter uma tatuagem como a de Vivian, mas parecia que eu estava sob a proteção desse homem. Havia algo intoxicante na ideia de pertencer a ele, embora não tivesse me rotulado como sua... ainda. Com uma mão sobre meu rosto e a outra segurando a minha, ele começou a se inclinar para frente. Ele procurou meu olhar como se esperasse encontrar permissão. Eu me certifiquei que ele encontrasse. Fechando os olhos, prendi a respiração e esperei pelo primeiro beijo perfeito... O estalo súbito de Warren Zevon cantando Werewolves of London me assustou. Meus olhos se abriram bem a tempo de pegar Kostya lançando um olhar assassino para o seu telefone. Fazendo um barulho rosnado, ele pegou o telefone no balcão e rapidamente respondeu em russo. Eu não conseguia entender nada da conversa, mas podia dizer pelo tom dele que não era nada bom. Quando terminou a ligação, guardou o telefone no bolso de trás e colocou a mão na minha nuca. —Sinto muito. —Seu polegar roçou minha nuca, provocando uma onda vertiginosa de excitação. —Tenho que ir. —Negócios da máfia? —Arrisquei um palpite. Ele não mentiu para mim. —Sim. —Então não vou perguntar mais nada. —Por enquanto, eu poderia lidar com ficar no escuro. Eu não tinha qualquer direito


sobre ele ou como ele passava seu tempo. Mas eu não tinha certeza se poderia lidar com essa enorme vida secreta a longo prazo. Foi exatamente por isso que ele insistiu que eu levasse algum tempo para pensar sobre isso antes de entrar em um relacionamento com ele. Ele queria que eu desse um passo para trás e considerasse como poderia ser um futuro com ele. O lado romântico e esperançoso em mim queria acreditar que eu poderia fazê-lo me amar o suficiente para se afastar dessa vida, mas o lado realista em mim aceitava que talvez não houvesse uma maneira de se afastar de seus laços com a máfia russa. Sangue para entrar. Sangue para sair. Mesmo que me amasse com cada fibra do seu ser, eu nunca poderia pedir a ele para arriscar sua vida dessa maneira. Eu preferiria tê-lo vivo e profundamente imerso nas águas turvas da máfia do que livre dessas correntes criminosas e a seis palmos de profundidade. Mesmo que isso significasse que nunca poderíamos estar juntos. Kostya me salvou daquele pensamento desanimador, pegando sua carteira no bolso de sua calça jeans. —Quando você tiver algum tempo hoje, quero que você ligue ou envie um e-mail para minha amiga, Fox. Ela opera um serviço de segurança abrangente aqui em Houston, especializado em bancos, empresas de tecnologia e hospitais, mas também oferece serviços de segurança mais simplificados para pequenas empresas de propriedade de mulheres. Ela pode ajudá-la a resolver os problemas em seu salão. Eu tinha mencionado os problemas do sistema de segurança para ele na noite passada? Minhas lembranças eram confusas, mas parecia o tipo de coisa que eu teria feito. Peguei o cartão dele e olhei


para as informações. Sorri para a raposa dos desenhos animados tentando pegar a fechadura em um galinheiro. —Hen House Security3, hein? —Fox é uma figura. —Ele guardou a carteira de volta no bolso. —Eu devo avisar que ela pode ser um pouco rude, mas é muito boa em seu trabalho. —Obrigada pela ajuda. —Eu coloquei o cartão ao lado. — Mas por que eu não posso te contratar? —Porque eu não quero que você se enrole nas merdas ilegais que eu faço. —Sua mão voltou para o meu pescoço e me puxou para perto. Quando ele beijou minha têmpora, eu me derreti contra ele. Não era o beijo que eu queria, mas era mais do que suficiente ser abraçada. —Fox vai mantê-la segura quando você estiver no trabalho. —Ele pressionou seus lábios na minha testa. —E eu vou me certificar de que você esteja segura quando estiver em casa. Eu queria dizer que ele estava sendo superprotetor, mas pensei em todas as coisas horríveis que vimos nos noticiários pela manhã. —Talvez não seja uma má ideia ver se Fox pode dar uma olhada no meu sistema em casa. —Eu acho que é uma boa ideia. —Ele parecia relutante em me deixar quando pegou nossos pratos e os levou para a pia. — Aquela garota? Lana? Aquela que você me pediu para traduzir? —O que tem ela? —Eu terminei meu leite de amêndoas e entreguei o copo. —Ela parecia muito jovem ao telefone. —Ela talvez tenha dezoito. —A tristeza me envolveu quando pensei em seus hematomas. —Eu acho que algo realmente horrível aconteceu com ela. Não me sentia bem em deixá-la voltar para o 3

Galinheiro Segurança


abrigo das mulheres sem poder ajudá-la, então lhe ofereci um emprego. —Eu vou fazer algumas perguntas e ver o que posso descobrir sobre ela. Não deve ser muito difícil descobrir de onde ela veio e se ela tem alguma família. —Ela parece uma garota muito doce. Ela merece um novo começo. Eu meio que acho que deveria tentar encontrar um lugar seguro para ela, para que possa sair do abrigo. —Eu tenho alguns amigos que possuem complexos de apartamentos pela cidade. Eu vou ver se posso encontrar algo perto do salão. —Ela precisa estar a uma curta distância ou a uma pequena distância de ônibus de um supermercado e coisas assim. Eu duvido que ela possa obter uma carteira de motorista em breve. Tente limitar o aluguel a mil. Não tenho certeza se meu orçamento permite mais do que isso. —Eu vou lidar com isso. —Mas m... —Eu vou lidar com isso, Holly. —Ele repetiu, sua voz firme, mas gentil. —Tudo bem, mas não se coloque em problemas financeiros. Podemos dividir o aluguel. Ele parecia querer argumentar, mas em vez disso, apenas assentiu. —Tudo certo. Vou pegar algumas opções e nós vamos dividir. —Obrigada. Ele hesitou. —Eu realmente tenho que ir.


—Mas? —Eu não quero. —Ele admitiu. —Eu não quero que você vá também. —Mas? —Ele perguntou, brincando comigo. —Eu tenho que ir ao salão para a nossa reunião da manhã de segunda-feira. —Ansiosa, bati meus dedos no balcão. —Eu sei que tenho que esperar um mês antes de você concordar em me namorar, mas eu vou te ver por aí? —Sim. —Ele hesitou uma última vez. —Você tem certeza de que está segura para dirigir? Você ainda está com sono ou tonta como estava na noite passada? —Estou bem, mas obrigada. Assentindo, ele recuou devagar. —Ligue para mim se precisar de alguma coisa. —Eu vou. —Assisti-lo sair foi mais difícil do que eu esperava. Depois desse pequeno vislumbre do que era possível entre nós, a ideia de fazer uma pausa de quatro semanas era excruciante. Mas Kostya confiara em mim seu segredo por um motivo. Como Savannah, ele estava me pedindo para tomar minha decisão com os olhos bem abertos. Quando peguei minhas coisas e saí de casa, percebi que não precisava de quatro semanas. Eu já havia tomado minha decisão. Eu queria Kostya. Tudo dele. O bom. O mau.


O feio. Eu sรณ queria que ele fosse meu.


CAPÍTULO CINCO Abalado por sua manhã surreal com Holly, Kostya passou em sua casa para um banho rápido e uma troca de roupa. Falar com ela sobre suas conexões com a máfia nunca tinha sido parte de seu plano, mas ele não tinha mais condições de mentir para ela. Ele não podia dizer toda a verdade a ela, não os fatos sobre seus primeiros anos no FSB ou o trabalho secreto que tinha feito por seu país e, certamente, não sobre a sua conexão com Maksim e Nikolai, mas era bom dizer-lhe algo verdadeiro. Era como um ponto de ancoragem no relacionamento deles. Isso era só uma parte da verdade que ela saberia que ele havia confiado a ela. Algum dia, talvez, ele contaria a ela todo o resto. Só podia esperar que, quando esse dia chegasse, ela ouvisse e tentasse entender por que ele tinha mantido os outros detalhes, os mais fatais, em segredo. Quatro semanas, ele pensou enquanto tirava dois kits de coleta de DNA de uma gaveta e colocava-os no bolso de trás da calça jeans. Era muito tempo e não era tempo suficiente. Seu estômago revirou com o provável desfecho do tempo pelo qual ele mesmo tinha insistido. Depois de um dia ou dois, Holly certamente pesaria os riscos de buscar qualquer tipo de relacionamento com ele e insistiria para que ele nunca mais a procurasse. Pelo menos agora Fox teria os olhos em Holly o tempo todo. Com Lana trabalhando no salão, ele teria uma fonte constante de informações sobre Holly, mesmo que ela o excluísse completamente de sua vida. Não era uma solução perfeita, mas a manteria segura. Isso era tudo o que importava.


Enquanto esperava o fluxo de café escaldante encher sua xícara, a campainha tocou. Colocando a xícara na pia, ele puxou a pistola da parte de trás de sua calça jeans e saiu da cozinha. Checou o olho mágico antes de abrir a porta para franzir a testa para o motorista da FedEx à sua porta. —Sim? —Sr. Antonovich? —O motorista não olhou para cima do dispositivo que segurava. —Sim. —A mão de Kostya aumentou o aperto em sua pistola. O motorista digitalizou o código de barras e entregou para ele. —Tenha um bom dia, senhor. —Obrigado. —Kostya pegou o envelope fino e rígido e fechou a porta, trancando-a atrás do motorista que, sem saber, estivera perto da morte. Observou pela janela mais próxima, espiando por trás das persianas de madeira, para certificar-se de que o motorista tinha ido embora. Quando a van seguiu em frente, Kostya olhou para a etiqueta e não reconheceu o endereço do Cazaquistão. Desconfiado de receber correspondência estranha de sua antiga vizinhança, ele reconsiderou com desconfiança. Um envelope desse tamanho não poderia conter explosivos suficientes para matá-lo. Veneno em pó, por outro lado? Exatamente o tamanho certo para uma dose letal de antraz ou algo pior. Ele recuou do envelope quando o pensamento sobre o polônio 210 e a morte horrível do ex-agente da KGB, Litvinenko, passaram por sua mente. Segurando cuidadosamente, ele caminhou pelo corredor até seu escritório. Abrindo uma gaveta da escrivaninha, pegou um par de luvas e uma máscara cirúrgica. Colocou os dois antes de pegar do fundo da gaveta um contador Geiger para medir a radiação. Era improvável que alguém fosse ousado – ou estúpido – o suficiente


para enviar uma correspondência altamente radioativa, mas o mundo enlouquecera. As velhas maneiras de fazer as coisas, as regras não escritas para encobrir agentes secretos e espiões queimados, foram postas de lado. Havia uma longa fila de pessoas que queriam machucá-lo e uma correspondência aparentemente inofensiva era uma maneira perfeita de fazê-lo. Passando a sonda pelo envelope, ele observou no contador Geiger qualquer primeira sugestão de alarme. Quando nada aconteceu, ele deixou a máquina de lado, abriu outra gaveta e tirou um kit de dissecação simples. Colocou o envelope em cima de uma folha de papel limpa e puxou a cadeira para que pudesse sentar-se. Pegando o bisturi, usou para cortar a borda superior do envelope. Cuidadosamente, o sacudiu. Algumas fotos dobradas caíram primeiro. Um pedaço de papel, amarelado pelo tempo e com as beiradas rasgadas, caiu em seguida. Deixando de lado o envelope vazio, ele pegou o primeiro pedaço de papel e estudou. Velho e manchado, era algum tipo de registro. Nomes. Datas de nascimento. Datas de admissão. Era uma página arrancada de um diário de prisão. Tentou entender a caligrafia borrada e desalinhada enquanto examinava a frente e o verso da página, procurando alguma pista sobre de qual prisão isso tinha vindo e quando. Seu olhar deslizou pela coluna de admissões, os crimes que haviam levado cada prisioneiro lá. Assassinato. Abuso de crianças. Um serial killer. Um canibal. Havia apenas uma prisão em toda a Rússia que veio à mente por abrigar prisioneiros como esses. Colônia Penal 6. O golfinho negro.


Era um lugar para onde os piores dos piores eram enviados para desaparecer. Nenhum dos prisioneiros que passaram pelos portões da frente saíram de lá. Mas por que alguém me enviaria uma página do diário de prisão? Em seu tempo trabalhando para o governo russo, ele colocou seu quinhão de prisioneiros lá. Mas essa página do diário de prisão era de antes de seu tempo como agente. No máximo, as datas correspondiam mais ou menos com as mortes de seus pais. Essa era a pista? Havia algum nome nessa lista que tinha laços com sua mãe e, ou, pai? Era alguma operação que eles haviam trabalhado duas ou três décadas atrás? Deixando de lado a página do diário de prisão, ele pegou a primeira fotografia e desdobrou-a, alisando a imagem desbotada com as pontas dos dedos. Sua garganta travou e seu coração palpitou quando percebeu o que estava vendo. Ali, em preto e branco, estava o corpo sem vida de sua mãe. Tiro. Morta. Caída na rua úmida e fria. O pavor tomou conta dele quando pegou a segunda foto. Era uma foto da cena do crime, do assassinato brutal de seu pai. Eviscerado. Sangue acumulando em torno de seu corpo contorcido e machucado. Seu rosto para sempre congelado em uma expressão de dor e sofrimento. Que porra é essa? Memórias há muito suprimidas vieram à tona em sua mente. A dor, o medo e a tristeza de sua infância o dominaram. Ele tentou afastá-las, para se concentrar no conteúdo desse pacote estranho, mas era impossível ignorá-las. A angústia tentou estrangulá-lo, envolvendo-se apertada em volta da garganta e prendendo sua respiração.


Os assassinatos de seus pais o destruíram irrevogavelmente. Isso havia tirado o futuro com o qual sonhara uma vez e o colocado em um caminho atormentado e difícil que ele nunca conseguiu deixar. Ali estava ele, todos esses anos depois, o produto de todo aquele derramamento de sangue e morte. Ainda fodido. Ainda o garoto assustado se sentindo fora do lugar, sem uma casa, perdido. Ele recostou-se na cadeira e ficou olhando as fotos e a página do diário de prisão. O que tudo isso significava? Era um aviso? Alguém estava tentando ajudá-lo? Era alguém do seu passado? Alguém ainda do lado de dentro? Ou era algo mais? Uma ameaça? O que ele sabia sem qualquer dúvida era que isso era uma complicação e uma distração para a qual ele não tinha tempo agora. Ainda havia pontas soltas da noite passada. Ainda havia problemas a serem resolvidos e muita sujeira para limpar. Ele não poderia ser atraído para esse envelope misterioso e o que ele significava. Tinha que se concentrar nas questões mais urgentes em mãos. Recolhendo o estranho conteúdo do envelope, ele se levantou de sua cadeira, ajoelhou-se e levantou o tapete sob a mesa para revelar o compartimento oculto e seguro. Depois de destrancar e abri-lo, ele olhou para o envelope por um longo momento, permitindo-se lembrar dos rostos sorridentes de seus pais, da segurança e do amor que conhecera quando criança. Quando aquele momento assombrosamente triste passou, ele sacudiu aqueles sentimentos indesejados de tristeza e dor e deixou cair o envelope dentro do cofre. De pé lá em seu escritório, pensando nas estranhas fotos e na página do diário de prisão, ele considerou pegar sua mala e sair de Houston imediatamente. Se houvesse um alvo em suas costas, todo mundo com quem ele se importava estaria em risco. Eles estariam mais seguros se ele fosse embora? Ou eles estariam em mais perigo?


Seriam usados como iscas para atraí-lo de volta para o campo aberto? Eles seriam pegos um por um para machucá-lo? O pensamento de Holly ou qualquer uma das suas pequenas aranhas sendo feridas era demais para suportar. Ele tinha que ficar. Suas garotas estavam contando com ele para protegê-las. Sentindo-se desconfiado quando saiu de casa um pouco depois, ele checou o capô e debaixo de seu Audi A8 procurando por explosivos. Era uma possibilidade absurda, mas ele olhou, mesmo assim. Ele subiu em uma escadinha para olhar o motor do sistema de abertura da garagem só pra ter certeza. Satisfeito que não estava prestes a explodir metade do bairro, entrou em seu carro e saiu. O caminho para a grande mansão de Nikolai em River Oaks não era longo. Ele subiu na calçada e seguiu para a antiga cocheira transformada em garagem na parte traseira, onde Nikolai lhe dera uma vaga permanente. Quando saiu e trancou o carro, lançou um olhar casual para a esquerda e para a direita, mas não viu nada para despertar suspeitas. Ele estava na metade da calçada quando Boychenko saiu da casa em sua roupa de corrida, pronto para acompanhar Vivian em sua corrida matinal. —Rapaz, fique de olho hoje, sim? Está tranquilo esta manhã, mas não podemos ser descuidados, não com ela. —Eu vou mantê-la segura. —O garoto prometeu. Ele tinha aquela bravata que era tão comum em homens jovens que ainda não tinham um gosto real de violência. Talvez Ivan precisasse bater um pouco mais forte nesse garoto na gaiola4...

4

Um lutador de "gaiola" é um lutador de Mixed-Martial Arts (MMA), que por vezes luta em uma gaiola (ou octógono ou ringue de boxe)


Quando ele entrou na casa, olhou para trás observando o garoto e se perguntou se Boychenko podia estar um pouco ligado a Vivian. Eles eram mais próximos na idade do que Nikolai e sua esposa, e às vezes os jovens tinham ideias estúpidas sobre as mulheres que protegiam. Vivian só tinha olhos para Nikolai, mas isso não impediria que outro homem se apaixonasse por ela. —Bom dia, Kostya. —Vivian cumprimentou-o com um sorriso. Vestida com calças pretas de compressão e uma blusa solta de manga comprida com listras refletivas, ela estava terminando um café da manhã simples com suco e torradas cobertas com manteiga de amendoim. Ela apontou para o prato cheio de deliciosos bolos mexicanos no balcão. —Dimitri deixou um pouco para trás. —Ela explicou. —Sirva-se se estiver com fome. Ele balançou sua cabeça. —Já comi. —Kolya está em seu escritório. —Ela tocou o braço dele enquanto ele tentava passar, parando-o antes que pudesse sair da cozinha. Ela dirigiu-lhe um olhar cauteloso. —Ele está em um dos seus momentos de mau humor. Apreciando o aviso, ele assentiu e desejou a ela uma boa corrida. Ilya entrou na cozinha, pegou um bolo cor de rosa gelado e uma garrafa de água da geladeira e se apressou atrás de Vivian. Ele iria de bicicleta enquanto Vivian e Boychenko corriam. Kostya encontrou Nikolai, parecendo perdido em pensamentos, de pé na janela panorâmica de seu escritório que dava para o jardim da frente. —Feche a porta. —Nikolai ordenou sem olhar para trás. Embora ele sempre se irritasse em receber ordens, fez o que Nikolai pediu. Algo no ar o avisou para não desafiá-lo naquela manhã. Era um aviso estático de advertência, uma energia


rodopiante que vibrava de Nikolai. O chefe poderia ter ficado mais brando nos últimos anos, mas Kostya já o conhecia há tempo suficiente para saber que o exterior calmo podia esconder um furacão de raiva. Sem dizer uma palavra, sentou-se em uma das cadeiras confortáveis perto da lareira e estudou o jogo de xadrez em andamento. Pela aparência das peças e suas posições, Vivian era uma jogadora terrível. Ele decidiu dar-lhe alguma ajuda e rapidamente empurrou algumas de suas peças para posições melhores. Se Nikolai notasse quando retornassem ao jogo, ele não diria uma palavra. Ele deixaria Vivian ganhar só para vê-la sorrir. —O agente da condicional foi atrás de Ten esta manhã. — Disse Nikolai finalmente. —Eles forçaram o caminho para entrar na casa de Vanya e reviraram o local procurando uma infração para suspender sua liberdade condicional. —Merda. —Vanya está furioso. Ele já estava na corda bamba com Erin por Ten estar morando lá. Ter a polícia em casa? Ter sua esposa incomodada assim? Ele vai ficar louco sobre isso. —E quanto a Ten? —Seu agente da condicional pediu um teste de urina, mas convenientemente não tinha um em seu kit. Eles o arrastaram para a delegacia para testes. —Nikolai olhou para trás, franzindo a testa. — E para interrogá-lo, tenho certeza. —Ten é o soldado mais leal que você tem. —Ele não estava preocupado que o executor que virou guarda-costas abrisse o bico. —Ele já cumpriu seis anos na prisão por você. Ele vive sob os termos de liberdade condicional desde maio e não colocou um dedo


do pé fora da linha. Ele voltaria lá para dentro antes de dizer uma palavra contra a família. —Isso é o que me preocupa. —Nikolai soltou um suspiro ruidoso e passou os dedos pelos cabelos. —Você e eu sabemos por que eles o arrastaram esta manhã. Eles sabem que ele é um dos meus pontos de pressão. Todos nós temos álibis para o que aconteceu durante a noite e estamos livres. A polícia quer respostas. Eles nunca serão capazes de provar isso, mas sabem que eu dei autorização a Hector para esse banho de sangue. Ameaçar prender Ten novamente é uma maneira fácil de forçar a minha mão. —Ele se virou e cruzou os braços na frente do peito. —Talvez precisemos dar a eles alguns dos homens de Hector para aliviar a pressão. Kostya gemeu. —Hector não vai gostar. —Hector é um menino crescido agora. Se ele vai sentar-se à mesa com o resto dos adultos, terá que aprender que às vezes nós temos que fazer sacrifícios dolorosos. O que Nikolai dizia era verdade, mas Hector estava em terreno instável agora. Ele precisaria de semanas, talvez meses, para solidificar seu poder sobre o cartel e se consolidar como o novo chefe. A julgar pela tensão que irradiava de Nikolai quando abaixou os braços para os lados e deixou a janela, ele sabia disso. Nikolai sentou-se na cadeira do outro lado do tabuleiro de xadrez, pegando a rainha branca a rolou entre os dedos tatuados. As engrenagens na cabeça de Kostya começaram a girar enquanto ele procurava maneiras de tirar o foco da família. —Eu vou ver o Diego Reyes. Ele saberá se algum dos atiradores de Hector tinha problemas com qualquer um de seus alvos. Se há história anterior, podemos dar à polícia um empurrãozinho na direção certa, sem que ela venha atrás de nós. Há um novo detetive de homicídio. Ele está louco para provar seu valor. É um alvo fraco. Posso trabalhar com ele.


—Seja cuidadoso. —A boca de Nikolai ficou em uma linha reta. —Eric vai ficar em cima disso. Não quero que ele aborreça Vivian. Eu não quero nossas impressões digitais em nada disso. — Ele pareceu pensar por um momento. —Use Ilya. Blat? É a especialidade dele. Ilya tinha se tornado seu informante não oficial, um traficante que lidava com favores. Mais e mais, eles confiavam em Ilya para resolver pequenos problemas e manter relações com as outras famílias da cidade. —Falando em Ilya, posso precisar da ajuda dele com um trabalho freelancer que Liam me enviou. —Que tipo de trabalho? —Nikolai fez um sinal de arma e curvou o dedo como se estivesse disparando. —Não, não esse tipo de trabalho. Ele precisa trazer um dos seus garotos para os EUA. Permanentemente. —Acrescentou ele. —Um casamento pelo green card? —Esse foi o meu pensamento. —Terá que ser alguém em quem possamos confiar. Nós não precisamos de um casamento ruim explodindo em nossos rostos três ou quatro anos depois. É muito arriscado. —É por isso que eu queria usar Ilya para escolher a mulher certa para abordar como a possível noiva. Ele é melhor em ler mulheres do que eu. Nikolai riu grosseiramente concordando e depois bateu a peça de xadrez em seu joelho. Ele tinha aquele brilho irritado em seus olhos quando perguntou: —Quando você ia me contar sobre o envio de Artyom para o hospital para vigiar Hadley?


Ele recostou-se na cadeira e encolheu os ombros. —Eu não ia. Nikolai tencionou a mandíbula. —Você não ia me dizer que enviou o meu melhor capitão para o maldito hospital para matar uma menina que está morrendo de problemas cardíacos? —O plano nunca foi matá-la. —Irritado, ele exalou em um bufar. —É por isso que não contei a você sobre o envio dele. Nikolai olhou para ele. —Você está louco em mandar alguém para ameaçar Hadley? Ela é uma das amigas de Vivian. Para não mencionar, que o pai dela tem conexões que poderiam nos enterrar. —Ninguém a ameaçou. —Tecnicamente, ele estava certo. Ele ameaçou Finn. —Artyom estava lá apenas para manter um olho nas coisas. —Não me engane, Kostya. Nós dois sabemos por que ele estava lá. —Ele apontou um dedo irritado. —Não use Artyom assim de novo. Ele fez o suficiente por essa família. Finalmente encontrou alguém que o faz feliz e... Nikolai parou abruptamente quando Kostya levantou a cabeça com interesse. —Artyom encontrou alguém? Quem? Nikolai parecia hesitante em responder. —É Chess. Atordoado, ele insistiu. —Você não está falando sério. —Estou. Eles compartilharam um olhar que silenciosamente comunicou a feia verdade sobre Adrian, o soldado de rua que fizera parte da tripulação de Artyom e pai da filha de quase sete anos de idade de Chess. Era culpa de Adrian que Ten tivesse ido para a prisão, e o resto da família nunca o perdoou.


—Eu não sabia que eles eram tão próximos. —Admitiu Kostya, ao mesmo tempo irritado que tinha perdido uma conexão com o capitão da família e impressionado que Artyom conseguira manter um segredo dele. —Eu também não. —Respondeu Nikolai. —Não até Vee me falar sobre a casa. —Acrescentou. —Que casa? —Aquela nova construção, a de estilo Mediterrâneo com o telhado vermelho, em frente a Vanya e Erin. —Esclareceu. —Erin disse a Vee que viu Artyom com Chess olhando para a casa. Eu perguntei a ele sobre isso. Ele me disse que Chess fez uma oferta e comprou a casa. Ele tentou seguir a cadeia de informações que tinha sido transmitida de uma mulher para a outra. —Como diabos essa garota pode pagar uma casa no bairro de Vanya? Ela estava sem-teto e grávida há alguns anos. —Ela estava, mas agora está rica. —Como? Fazendo o quê? —Ela é dona de uma empresa de sling para bebês. —Que diabos é sling? —Ele interrompeu com confusão. —É um tecido para prender ao corpo. —Nikolai tentou explicar enquanto apontava para o peito. —Vee decidiu que vestirá nosso bebê em vez de colocá-lo em um carrinho de criança. —Ele fez uma careta e Kostya espertamente decidiu não perguntar por quê. —Ela estava me mostrando alguns dos desenhos que Chess vende, e fiquei curioso quando percebi que era a Chess de Adrian. —E?


—E ela fez milhões vendendo seus slings, roupas e coisas para bebês. —Milhões? —Ele perguntou ceticamente. Havia realmente tanto dinheiro para coisas de bebês? —São os desenhos dos tecidos, eu acho. Ela desenha sozinha e usa uma coisa orgânica. —Ele disse com um aceno de mão. —Ela também tem fraldas de pano, móveis e roupas. Vee me mostrou o Instagram dela. A garota tem milhões de seguidores. Target 5 vai começar a revender alguns de seus produtos. —Será que Artyom deu dinheiro a ela? —Ele se perguntou. —Foi assim que ela começou? —Sim. Ele me disse que se sentia responsável por ela depois de tudo o que aconteceu com Adrian. Ele cuidou dela e do bebê. —E agora? Eles são um casal? —Ele disse que não. Que são apenas amigos. —Em seu olhar de descrença, Nikolai levantou as mãos. —Isso foi o que ele disse. Eu não forcei. —Mas? —Mas ele tinha aquele olhar em seus olhos. Sabendo do inferno a que Artyom sobrevivera na Rússia, perdendo a mulher e o bebê, Kostya não se surpreendeu com a possibilidade de Artyom gravitar em direção a uma mãe solteira. Mas havia uma enorme complicação com a escolha dele sobre esta garota e seu bebê. —Eu sei o que você está pensando. —Interveio Nikolai, como se lesse sua mente. —Adrian. 5

A Target Corporation Inc, mais conhecida como Target, é uma rede de lojas de varejo dos Estados Unidos, fundada em 1902 por George Draper


Nenhuma outra palavra tinha que ser dita. Ambos pareciam compartilhar o mesmo pensamento sobre o que realmente aconteceu com Adrian e todos que estavam envolvidos no encobrimento do caso. —Pode ficar confuso. —Disse Kostya com naturalidade. — Pode até ser o tipo de confusão que não poderei limpar. —Então teremos que ter certeza de que Artyom entenda isso antes de fazer qualquer promessa a Chess. —Decidiu Nikolai. Ainda brincando com a rainha branca, ele admitiu: —Acho que ele vai acabar se casando com ela. Quando ele falou sobre ela e tentou defender sua amizade, isso me deu flashbacks de todas as minhas desculpas sobre Vivian. Não se trata de pagar a dívida que ele devia como capitão de Adrian. É algo mais que amizade e proteção. —Ela já vem com uma família pronta. —Ele disse um tanto indelicado. —Depois do que ele perdeu... —Eu não acho que é assim tão simples, Kostya. —Nikolai exalou e esticou as pernas. —Você sabe que a garotinha tem autismo? Ele balançou sua cabeça. —Eu não sabia. —Bem, ela tem. É preciso um tipo especial de homem para querer entrar nessa de ser o pai que a menininha precisa. Não se trata de substituir o que ele perdeu. Ele poderia ter se casado e tido filhos com Lidia ou uma dúzia de outras mães solteiras que ele fodeu por aí nesses anos. Não. —Ele disse com firmeza. —Chess é diferente. —Então? —Ele perguntou, certo que Nikolai estava prestes a estabelecer uma ordem.


—Então. —Nikolai interpôs intencionalmente. —Você quer brincar de jogos de espionagem? Você quer fazer merdas como você fez com Hadley na noite passada? Envie alguém dispensável. —Eu não confio nos dispensáveis. Não podemos nos dar ao luxo de cometer erros. Nikolai apertou a ponte de seu nariz e murmurou rudemente. Ficou claro que o estresse dos últimos meses estava atormentandoo. —Kostya... —Olha, eu não te falei sobre Artyom porque eu sabia que isso iria te comer por dentro se eu tivesse que puxar o gatilho. Você nunca foi bom quando se trata de pressionar famílias, mulheres e crianças. —Há uma linha, Kostya. —Nikolai insistiu asperamente. —Só porque você estabeleceu! —Irritado, ele disse: —Isso é no que eu sou bom. Apenas deixe-me fazer o meu trabalho. Nikolai sacudiu a cabeça. —Talvez você não devesse estar fazendo coisas horríveis também. Talvez seja hora de encontrarmos maneiras diferentes de fazer as coisas. —É um sonho. —Ele respondeu friamente. —Uma fantasia. Estas são as regras do nosso mundo. Nós temos que jogar por elas, ou temos que sair do jogo. O olhar de Nikolai se endureceu. —Não dê sermões para mim. Este era o meu mundo muito antes de ser seu. O chefe o pegou ali. Kostya tocou seu peito em sinal de desculpas, e Nikolai assentiu e continuou brincando com a rainha branca. Claramente desejando mudar de assunto, ele perguntou: — Como está Holly?


—Ela está bem. —Ele não ia contar a Nikolai que passou a noite com Holly. Levantando-se de seu assento, ele esticou a mão e retirou o tubo com cotonete de DNA e o saco de coleta de cabelo do plástico enrolado no bolso. Ele jogou-os no colo de Nikolai. — Eu preciso do seu DNA. O lábio de Nikolai se curvou com desgosto. Com relutância, colocou de lado sua rainha e abriu o cotonete primeiro. Depois de esfregar vigorosamente o interior de sua bochecha, ele enfiou-o no tubo e depois puxou alguns fios de cabelo e colocou-os no saco. Depois que ambos foram selados, ele os jogou de volta para Kostya. —Quando vamos saber? —Em breve. —Você só confirmará que Holly é minha irmã e Maksim é nosso pai. Você não pode provar nada sobre a mãe dela. —Ainda não, mas estou trabalhando nisso. Nikolai não perguntou como. —Há mais alguma coisa que eu precise saber? Ele não achava que era hora de contar sobre o pacote estranho que recebeu mais cedo naquela manhã. Em vez disso, puxou seu telefone do bolso e encontrou a foto que precisava. — Você vai querer saber sobre este presente que o Executor me deixou. —Que tipo de presente? —Ele perguntou cautelosamente. —Esse tipo. —Kostya mostrou a Nikolai a foto de Lana que tinha tirado no motel. A reação do chefe foi instantânea e furiosa. —Que porra é essa?


Antes que ele tivesse a ideia errada, rapidamente explicou: — Eles a encontraram na casa de um alvo e ela não estava inclusa, viva ou morta, então decidiu entregá-la a mim. Ele não lida com garotas traficadas. —Ele deu ela para você? Como um presente? Para quê? — Nikolai lançou-lhe um olhar assassino e Kostya teve que lutar contra o desejo de recuar. —Não é assim! Ele queria que eu encontrasse a família dela ou a ajudasse a voltar para casa. —Você não pode mandá-la de volta para casa! Você sabe o que vai acontecer com ela ou sua família se você fizer isso. Mesmo que os traficantes não voltassem por ela, a vergonha arruinaria sua vida. —Ele ergueu a mão no ar. —Ela fica aqui onde podemos mantê-la segura. O olhar de Nikolai voltou ao telefone. Ficou claro que estava tendo os mesmos pensamentos que Kostya quando a descobriu naquele motel decadente. —Ela se parece muito com Holly. —O chefe olhou para ele. —Você não acha...? —Eu não sei. —Admitiu Kostya. —Eu a usei como um chamariz ontem à noite no salão. A fiz se passar por uma cliente do abrigo das mulheres para que pudesse ter um corte de cabelo e um trabalho de tingimento gratuitos iguais aos de Holly e depois se esgueirar e se esconder no armário até a hora certa. Nikolai bufou como se estivesse se divertindo. —Gratuito? Dificilmente. Vee me extorquiu como um agiota para ganhar cada centavo que pudesse como doação para ajudar Holly a financiar esse programa. —Voltando sua atenção para Lana, ele perguntou: —O que você prometeu a essa garota em troca de sua ajuda na noite passada?


—Um apartamento, despesas de moradia e uma identidade limpa. —Ela vai precisar de um emprego. —Ela tem um. —Como? —Holly ofereceu um a ela. Nikolai riu suavemente. —Ela tem um bom coração como Vee. —Isso é uma coisa ruim? —Isso as torna vulneráveis e fáceis de machucar. —Nikolai levantou-se da cadeira e caminhou até a sua mesa, onde pegou o paletó. Enquanto o vestia, ele disse: —Eu quero uma reunião com o Executor. Eu preciso saber quem era esse alvo para que possamos descobrir como Lana foi traficada para Houston. Kostya enfiou o celular no jeans enquanto se levantava. — Você sabe que ele não aparece cara-a-cara. —Então um telefonema. —Ele insistiu. —Você vai descobrir. E ele descobriria. De alguma forma. Nikolai sacudiu os dedos em um gesto para Kostya andar com ele. Ao saírem do escritório, explicou: —Vou fazer uma viagem para ver um criador de cães e depois volto para a cidade. Eu coloquei Boychenko e Ilya com Vivian. Danny fornecerá cobertura adicional até que Ten seja solto. —Você vai levar Artyom com você? Nikolai assentiu. —Onde você vai estar hoje?


—Por aí. —Ele respondeu vagamente. —Eu tenho algum trabalho a fazer. Nikolai olhou para ele cautelosamente. —Eu não quero saber. Kostya sorriu. —Tenho certeza que não.


CAPÍTULO SEIS Ele deixou a casa de Nikolai, mas não foi direto para o local onde suas aranhas gostavam de se reunir. Sempre preocupado que fosse seguido, ele mudou de rota e ficou de olho no espelho retrovisor. Eventualmente, parou no estacionamento de um shopping center movimentado e entrou em uma livraria. Ele atravessou a loja e se escondeu no almoxarifado onde pegou um boné de beisebol e uma jaqueta de um armário que pagava ao gerente para usar. Com o boné puxado para baixo e a jaqueta mudando levemente sua aparência, saiu pelos fundos da loja e foi direto para o ponto de ônibus mais próximo. Foi uma curta espera de 7 minutos pelo ônibus e um passeio rápido até a parada seguinte, onde mantinha um Dodge Neon velho em uma garagem. Era imperativo que ele nunca fosse rastreado até ao prédio que suas pequenas aranhas tinham apelidado de covil. O prédio comercial na McKinney ficava a poucos quarteirões do Minute Maid Park e em uma área bem movimentada. Não se encaixava nas especificações normais de um esconderijo, o que o tinha tornado tão atraente para ele. Ele estacionou em uma vaga da Ruiz Street e, sem chamar atenção, verificou ao redor antes de sair do carro. Entrou no prédio pela da porta dos funcionários do Sunrise Sunset Delivery Service, o legítimo serviço de entregas que Sunny operava do armazém. Cobriu o dedo com a manga da jaqueta e digitou o código para abrir a porta dos fundos. Passando pela sala de descanso e os armários dos funcionários, destrancou outra porta que dava para um corredor apertado com uma escadaria escura no final. Ele subiu os degraus de dois em dois para o andar superior.


Quando entrou no espaço do armazém no último andar, viu Max carrancuda empoleirada em uma das longas mesas de aço inoxidável. De repente, se arrependeu de ter vindo para cá. Seu cabelo escuro caía ao redor do rosto como chamas furiosas, seus olhos azuis e batom vermelho dando a ela uma ferocidade que ele não estava preparado para enfrentar naquela manhã. Sua pele pálida parecia ainda mais branca contra a saia e blusa pretas e os saltos vermelhos perigosamente altos que ela usava. Fechando a porta, ele examinou o resto da sala rapidamente e notou Sunny tomando um copo de iogurte enquanto se equilibrava com as pernas cruzadas em uma banqueta giratória. Ela arranjara um assento que lhe dava uma visão perfeita da briga que estava prestes a entrar em erupção. A selvagem tonalidade rosa no seu moicano curto e os piercings em seu rosto e orelhas brilhavam sob a luz do sol entrando pelas janelas enormes atrás dela. Segurando seu olhar, ela murmurou baixinho. —Você é um fodido. Suspirando, ele se recostou na porta e cruzou os braços. — Vá em frente, Max. Os olhos dela brilharam quando ela perguntou: —Que porra você estava pensando ao levar Lobo para o seu trabalho na noite passada? Como você se atreve a colocá-la em risco assim! Ela é apenas um bebê, K. Ela é nossa bebê. —Ela apontou para Sunny. — E você quase a matou! Você viu o rosto dela? Viu o que aquele idiota fez com ela? Que porra você tem a dizer em sua defesa? Uma pontada de culpa atravessou seu peito. Ela estava certa, é claro. Sobre tudo isso. Anos antes, ele havia confiado o cuidado de Lobo à mãe de Max, uma dançarina em um dos clubes que ele tinha em sociedade com Besian. Alguns papéis falsificados, e a garotinha era oficialmente parte de sua pequena família. Quando Tracy morreu, Max assumiu como sua guardiã, trabalhando e indo para a


faculdade em tempo integral e ainda encontrando tempo para brincar de mãe. —Eu não esperava que ela se machucasse. Ela só deveria tomar conta de Holly. É isso. —Sim, bem, isso não funcionou tão bem, não é? —Com a mandíbula tensionada de raiva ela rosnou: —Ela poderia ter sido morta, Kostya! —Eu sei. —Disse ele gravemente. —Eu sei. —Ela imitou. —Sério? É tudo que você tem a dizer? —O que diabos você quer que eu diga, Maxine? Hã? —Ele gritou quando se afastou da porta. —O que mais você quer que eu faça, porra? Max pulou da mesa e foi em direção a ele, batendo forte no peito com os dois punhos. O impacto fez ele dar um passo atrás. — Eu quero que você pare de usá-la assim. Ela é uma criança, Kostya. Ela não é uma merda de uma assassina. Ela não é da FSB ou do GRU. Ela não é um soldado ou uma agente. Ela é apenas uma criança. Seu peito estava em chamas, provavelmente marcado com a pressão de seus dedos. Olhando para ela, ele disse: —Lobo fez sua escolha. Ela quer aprender. Ela quer... —Ela não sabe o que ela quer! Ela é apenas uma criança! —Ela tem idade suficiente para tomar suas próprias decisões, Max. Você precisa parar de mimá-la! —Esse é o meu trabalho! Você fez ser o meu trabalho quando você a deu para minha mãe. Ela é minha irmãzinha, e eu a amo. Eu


não quero que ela vá pelo mesmo caminho fodido que você vive. Ela merece algo melhor! Abalado por suas palavras, ele estava prestes a soltar uma torrente de palavras que provavelmente se arrependeria depois quando a porta atrás deles se abriu e Fox irrompeu dentro da sala. Ofegante pelo esforço, ela pediu desculpas em voz alta: —Desculpe! Desculpe, estou atrasada. —Batendo a porta e se apoiando contra ela, perguntou: —Então, eu perdi toda a festa? Você já o fez chorar? —Eu não choro. —Kostya rosnou. —Eu choraria se Max gritasse comigo. —Fox respondeu. — Ela tem aquela coisa de mãe desapontada que faz eu me sentir como se tivesse cinco anos novamente. —Fox, eu já vi você chorar vendo comerciais. —Sunny interrompeu antes de lamber a colher. Fox revirou os olhos. —Uma vez! E eu estava viajando com o biscoito de maconha que Nate me deu. —Podemos voltar ao assunto em questão? —Max perguntou, sua voz cheia de irritação. —Você estava apenas dizendo a K o quanto ele é um monstro fodido. —Lembrou Sunny, sempre tão prestativa. —Obrigada, Sunny. —Ele disse secamente. Não desviando seu olhar de Max, disse: —Eu cometi um erro ao levar Lobo para o trabalho. Eu sei dessa porra. —E? —Max perguntou, a sobrancelha arqueada enquanto esperava que ele dissesse algo mais significativo. —E é isso. —Disse ele com naturalidade. —Eu não vou parar de treinar Lobo se ela quiser aprender.


—Você está cometendo um erro. —Max sustentou seu olhar, seu rosto endurecido com aquele olhar desapontado que Fox acabara de descrever. Ela estava certa. Ele se sentia como um garoto de cinco anos de novo. —Eu acho que um dia você vai se arrepender de toda essa merda. —Exalando tristemente, ela disse: —Eu não posso impedi-la de fazer o trabalho para você, não quando você tem eu, Sunny e Fox envolvidas em sua teia. Mas... — Ela o cutucou bem no peito, sua unha afiada como um estilete o espetando. —Eu não quero que ela faça mais nada neste caso. Ela terminou com essa merda. Você pode usar Fox, Sunny, eu ou a nova garota para essa bagunça da Holly, mas você vai deixar a Lobo em paz. —Tudo bem. —Ele concordou duramente. —Eu a manterei fora desse. Max não deixou de perceber o que ele adicionou à sua aceitação. Como se sentisse que ele poderia estar ferido pelas palavras duras que havia dito sobre sua vida fodida, ela foi certeira. —Você pode, por favor, agir como o pai que ela parece pensar que você é? A inspiração aguda de Sunny ecoou na sala. Fox ainda estava em sua linha de visão, e ela ficou tensa, seu olhar nervoso alternando entre ele e Max. Ele queria atacar Max, dizer alguma coisa ruim sobre seu próprio pai aproveitador, mas não o fez. Lá no fundo, onde era dolorosamente puro, ele sabia que ela estava certa. —Eu não sei como ser pai, Max. —Ele admitiu finalmente. —Eu não sei o que diabos estou fazendo na metade do tempo. Quando se trata de vocês, garotas, estou apenas tropeçando, esperando fazer a coisa certa e se não fizer, que eu não estrague vocês por toda a vida. E.... —Ele exalou alto. —E no que se refere a Lobo, estou tentando dar as habilidades que ela vai precisar algum dia. —Ele hesitou antes de confessar: —Há coisas sobre Lobo que


nenhuma de vocês sabe. Sobre os pais dela. —Ele esclareceu. — Algum dia, tudo isso vai alcançá-la, e ela precisa saber como se proteger. —Bem, ela não vai precisar saber como se proteger como uma adulta se você a matar enquanto ela for apenas uma criança. — Max replicou, com raiva. Certo que a discussão continuaria por horas se ele não se rendesse, ele disse: —Você está certa, Max. Ela estreitou os olhos. —Você está dizendo isso apenas para que eu vá embora. —Está funcionando? Ela checou o relógio e fez uma careta. —Só porque tenho que ir para uma aula que eu estou cobrindo para Vuong. —Pegue isso. —Disse ele, parando-a quando enfiou a mão na jaqueta e retirou os kits de DNA rotulados que havia coletado. —Eu preciso deles o mais rápido possível. Franzindo a testa, Max os pegou. —Estou super ocupada esta semana com palestras, trabalho de laboratório e minha pesquisa. Não tenho tempo para apressar isso para você. —Você vai encontrar tempo se quiser que suas despesas sejam pagas. —Advertiu. —Esse é o nosso quid pro quo6. Ela revirou os olhos. —Um melhor quid pro quo seria você me conseguir uma reunião com alguns dos russos ricos que você tem nas mãos. —Você não quer dinheiro de nenhum daqueles homens. — Ele havia dito isso mil vezes, mas isso não a impedia de perguntar. 6

Quid pro quo é uma expressão latina que significa "tomar uma coisa por outra". É um presente ou uma vantagem que é dada a alguém em troca de algo que eles fizeram.


—Existem maneiras melhores, maneiras mais seguras, de obter os fundos necessários para que seu trabalho seja notado. —Sim, bem, estou ficando sem tempo para ser notada e encontrar esse dinheiro fácil. —Indo para a porta, ela fez uma pausa e olhou para Sunny. —Não esqueça de ir às compras. É a sua vez esta semana. —Sim, mamãe. —Sunny respondeu com um revirar de olhos. Ignorando Sunny, Max se virou para Fox. —Você agendou sua visita com o médico de asma? Fox fez uma careta. —Eu esqueci. —Você está quase sem seus remédios para nebulização e seu inalador está com o último refil. O Ragweeds7 estará alto neste fim de semana, e você sabe o quão ruim fica quando está assim. Eu não vou acordar às quatro da manhã para levá-la ao pronto-socorro para um tratamento respiratório porque você esqueceu de fazer uma ligação telefônica. —Vou ligar agora. —Disse Fox, acenando com o celular para provar isso. Com o papel de mãe cumprido, Max foi embora e Fox foi até um canto da sala para ligar para o consultório do médico. Depois que a porta se fechou, Sunny o olhou com cuidado. —Você sabe que ela não vai parar de pedir para apresentá-la aos russos ricos, certo? —Eu sei. —Ele caminhou em direção aos quadros cobertos pelos rabiscos de Sunny e rapidamente fotografou tudo. Ela estava trabalhando em algumas pistas para ele, rastreando vários membros 7

Ragweeds são plantas com flores no gênero Ambrosia na família Aster, Asteraceae. O Pólen da erva é um alérgeno comum. Uma única planta pode produzir cerca de um bilhão de grãos de pólen por estação. A contagem de polén no ar é divulgada em jornais e pela internet.


do cartel e do sindicato albanês que ele queria vigiar o tempo todo. Olhando para a caixa na mesa de trabalho mais próxima, ele perguntou: —O que é isso? —Um presente. —Disse ela, terminando seu lanche e atirando o copo vazio na lixeira com facilidade. Ele abriu as abas da caixa amassada e olhou para a surpresa lá dentro. —Onde diabos você conseguiu isso? —Desculpe. —Disse ela, levantando-se e caminhando para a mesa. —A primeira coisa que você me ensinou sobre informantes e contatos é nunca compartilhá-los com ninguém, nem mesmo você. Ele cuidadosamente enfiou a mão dentro e vasculhou os sacos de provas selados. Elas continham balas usadas, cartuchos descartados, armas e roupas manchadas de sangue. —O que fez você pensar que eu iria querer qualquer uma destas provas da noite passada? —Chame isso de palpite. Achei que poderíamos precisar fazer alguma pressão no futuro, talvez chantagear alguns dos atiradores da noite passada. —Foi um bom palpite. —Ele sorriu para ela. —Você está sempre dois passos à minha frente. Com o ego acariciado, ela sorriu para ele. —Desde o dia em que nos conhecemos. As lembranças daquela noite ainda eram cristalinas. Ele estava do lado de fora do Racks, um dos clubes de striptease que ele possuía com Besian, fumando um cigarro nas sombras, quando ele a viu se esgueirando pelo estacionamento, movendo-se como um gato selvagem perseguindo a presa. No começo, ele imaginou que ela fosse uma ladra prestes a abordar um bêbado e pegar a sua carteira e relógio, mas então ele viu um bastão retrátil na mão dela. Com um


movimento rápido de seu pulso, ela tinha uma arma completamente expandida capaz de causar sérios danos. Ele provavelmente deveria tê-la parado quando ela se aproximou do cliente que acabara de deixar o clube e estava de pé ao lado de seu carro. Na época, ele não sabia se ela tinha boas ou más intenções. Mas permaneceu parado no local e viu das sombras como ela deu uma surra diferente de qualquer outra que ele já havia testemunhado. Tinha sido rápido e feroz, seus golpes foram perfeitamente dados para causar sérios danos e foram surpreendentemente silenciosos. Somente quando terminou, quando ficou de pé ao lado do homem ferido e sangrando, Kostya percebeu que ela estava tão chocada com a violência que cometera que não conseguia se mover. Ele agiu por impulso então, correndo para pegá-la, juntamente com sua arma, e arrastando-a para o seu veículo. Não demorou muito para obter a história completa dela. Depois que sua jovem sobrinha foi agredida sexualmente e deixada para morrer por um vizinho pedófilo, Sunny perseguiu o bastardo de Nova Orleans a Biloxi, Biloxi a Mobile, Mobile a Memphis, Memphis a Tulsa, Tulsa a Dallas e finalmente de Dallas por todo o caminho até Houston. Ela o alcançou no estacionamento do Racks. Na época, Kostya ficou maravilhado com a maneira como ela havia rastreado o homem tão facilmente em sete estados, quando a polícia não conseguiu localizá-lo ou prendê-lo. Ele viu algo nela. Um dom em rastrear um alvo. Algo útil que ele poderia nutrir e usar. Então, ele ofereceu a ela uma escolha: ficar em Houston e aprender uma nova habilidade ou pegar um envelope de dinheiro e desaparecer. Quatro anos depois, ela ainda estava aqui, aprendendo, praticando e trabalhando silenciosamente nas sombras da cidade.


Quanto ao homem que ela havia espancado? Antes que ele pudesse recuperar a consciência no hospital, Kostya cuidou do problema na primeira noite do homem na UTI. Ele e Sunny nunca falaram sobre o que ele havia feito, mas a verdade foi reconhecida com um único olhar quando a notícia da morte daquele porco saiu nos jornais. No mínimo, ele assegurou sua lealdade para sempre com aquele ato de proteção e vingança. —Eu tenho que ir voando. —Disse Sunny, pegando sua mochila e um pacote. —Eu prometi que isso seria entregue para Zec antes do almoço. Kostya decidiu que quanto menos soubesse sobre o conteúdo do pacote, melhor. O albanês tinha uma queda por Sunny e muitas vezes enviava negócios para ela. Ela tinha se provado confiável o suficiente para que até mesmo os profissionais a usassem como sua principal mensageira. Ele se preocupava com ela se metendo em problemas agindo como a intermediária para esses tipos de transações ilícitas, mas em algum momento, ele tinha que deixar suas pequenas aranhas deixarem sua teia e tecerem as suas próprias. —Você pode passar uma mensagem para o Executor? —Ele perguntou. —Claro. —Disse ela, deslizando os braços pelas alças de sua mochila. —Que mensagem? —Nikolai quer uma reunião. Não para um contrato, mas para obter algumas informações sobre Lana. Ela fez uma careta. —Eu transmitirei a mensagem, mas não esperaria nada. Você sabe como eles são. Faço trabalhos de entregas para eles há anos, e nunca vi seus rostos. —Pergunte. Se ele recusar, Nikolai terá que lidar com isso.


Quando Sunny se foi, ele fechou a caixa de provas roubadas e pegou um rolo de fita adesiva de uma prateleira debaixo da mesa. Quando arrancou uma longa tira de fita, Fox terminou seu telefonema e colocou o telefone no bolso. Juntando-se a ele na mesa, ela disse: —Você sabe que eu já vi. —Você viu o quê? —Vi seus rostos. Os profissionais. —Esclareceu. —Bem, um deles. Ele não podia acreditar no jeito que ela disse isso com indiferença, mencionando isso como se tivesse visto a coisa mais comum do mundo. —Quem? Quando? —Alguns meses atrás. —Ela foi até o quadro branco e o estudou. —Eu estava encontrando Nate para uma bebida. Você sabe, apenas sentada no bar, esperando. Eu ouvi aquela voz. —Ela olhou para ele. —Foi como um choque elétrico na minha espinha. Eu tinha ouvido aquela voz apenas uma vez antes, em um telefonema quando você precisava de mim para delegar alguns trabalhos. Eu sabia quem era imediatamente. Era ele. O Limpador. Ele não duvidou do que ela tinha visto ou ouvido. Fox sempre teve um talento estranho de lembrar de coisas: rostos, vozes, sequências obscenamente longas de números e dados. —Você fez contato visual com ele? —Eu pareço idiota? —Ele não viu você mesmo? Ela balançou a cabeça. —Eu tirei uma selfie e consegui o suficiente dele nela para juntar uma imagem depois. —E? —Eu guardei em um lugar seguro. Criptografado. Você quer?


—Sim. Você disse ao Nate? Ou mais alguém sobre isso? —Não. Você é o único que sabe. —Continue assim. —Ele avisou. —Esses caras ficaram anônimos por um motivo. —Eu sei. —Ela colocou a mão no quadro branco e deu um leve empurrão, virando-o ao contrário para revelar a parte de trás. Lá havia diagramas e árvores genealógicas mapeando os vários sindicatos da cidade e como eles estavam todos conectados uns aos outros. —Sunny trabalhou com a Lobo na noite passada. Ela estava tentando acalmá-la, eu acho. Tirá-la daquele lugar fodido em que ela estava depois... bem... você sabe. —Eu sei. —Ele murmurou demonstrando culpa. —Onde ela está hoje? —Ela estava jogando videogame no meu quarto quando saí de casa. Eu prometi que levaria alguns tacos para ela quando voltasse. —Como ela está lidando com tudo isso? Fox olhou para ele como se ele pudesse ser o homem mais estúpido que ela já tinha visto. —Ela está fodida, K. Honestamente, você tem sorte que Max não te matou esta manhã. Para sua própria segurança, eu não comeria nem beberia nada que ela desse a você pelo menos nos próximos doze meses. Ela provavelmente está preparando um veneno indetectável no laboratório dela agora. Não querendo entrar na discussão novamente, ele assentiu. —Vou levar isso em consideração. —Você precisa falar com ela. Lobo. —Esclareceu. —Sunny conversou com ela ontem à noite. Você sabe, sobre como é matar alguém e como é depois que isso acontece. Eu acho que ajudou um


pouco, mas você deveria sentar-se com ela. Conversar sobre isso. Ser o bom pai que a Lobo precisa. —Eu vou. —Ele hesitou antes de perguntar: —E você? Você contou a ela sobre sua experiência? Os ombros de Fox tensionaram. Com a voz firme e cortada, ela disse: —Não. Ele não forçou. Fazia sete anos desde a noite em que ela esfaqueou Cory até a morte. Sete anos desde que ela ligou para ele em busca de ajuda, atendendo à porta coberta de sangue, seu corpo machucado pelos punhos e dentes de Cory. Sete anos desde que ela descobriu que seu namorado de longa data era um estuprador em série que vinha aterrorizando Houston há mais de um ano... Fox virou-se e dirigiu-se apressadamente para a mochila que havia deixado perto da porta mais cedo. Levantando-a, ela a trouxe para a mesa de trabalho e a abriu. Ela pegou o grosso dossiê dado a Vivian por seu primo, Eric Santos. Eric, um detetive de Houston, recebeu o arquivo de uma desconhecida russa não muito depois de Vivian ter sido baleada. —Eu examinei tudo como você pediu. Escaneei tudo para que eu possa começar a desmembrá-lo para você. —Tenha cuidado com isso. —O arquivo foi preenchido com informações detalhadas sobre Nikolai, Ivan, Artyom e alguns outros capitães da família. Eles imigraram sem antecedentes e com os registros limpos, mas esse dossiê inclui todos os segredos que eles tentaram deixar para trás. —Eu sou sempre cuidadosa com esses tipos de coisas. —Ela virou-se e olhou para o quadro branco. Pegando um marcador verde, ela destampou e desenhou um retângulo. No interior, rabiscou krisha.


Krisha. Cobertura. Era a palavra usada para descrever a proteção paga por empresários russos ricos, políticos e mafiosos. —E quanto a krisha? —Ele se perguntou onde ela estava indo com isso. —A merda nesse arquivo é o tipo de coisa que você paga para se proteger, certo? É o tipo de merda que alguém nessa linha de trabalho teria ao alcance das mãos, certo? —E talvez esse dossiê tenha vindo de alguém dentro da casa de Maksim. —Ele disse, complementando sua teoria. —Talvez eu devesse estar olhando para dentro, sob a cobertura, em vez de fora. —Talvez. —Ela respondeu. —Ainda não explica como o dossiê chegou a Eric. Quem foi a mulher que o encontrou? Como ela está conectada a tudo isso? Quem pagou a ela? Quem a manipulou? Por uma fração de segundos, ele se debateu se deveria dizer a ela ou não. Sabendo que ela poderia manter um segredo e precisando de sua ajuda, ele disse: —Eu recebi um pacote esta manhã. —Que tipo de pacote? Ele apontou para o dossiê. —Similar a isso. Pode ter vindo do mesmo lugar pelo que eu sei. —Você tem isso com você? Nós poderíamos ter Max tentando rastreá-lo antes de eu examinar. —Eu vou pegar para você mais tarde. Você ainda tem uma maneira de acessar os registros da prisão? —Lá? Ou aqui? —Lá.


Ela fez uma careta. —Eu posso entrar nos sistemas sem problemas, mas depende dos anos que você precisa. Alguns deles têm que ser puxados à moda antiga, arquivos fodidos e mofados em uma sala de armazenamento abafada no meio do nada, na Rússia. —Eu quero tudo o que você puder obter da Black Dolphin8 de 85 até agora. —Isso pode demorar um pouco, K. Vou ter que encontrar alguém lá em que possamos confiar. —Você ainda tem contato com Denis? —Sua sombra em Moscou? —Ela perguntou com um sorriso. —Sim, eu tenho o número dele. —Fale com ele. Não conte por que estamos procurando. Somente peça os arquivos. —Eu duvido que ele pergunte por que eu os quero. Como se ele precisasse de mais segredos para guardar? A porta se abriu atrás deles. A mão dele foi para a pistola no coldre sob a jaqueta enquanto Fox deslizava a mão por baixo da mesa onde as garotas mantinham um P30 preso por um imã grande para fácil uso. Ao ver Lobo entrando pela porta, ambos relaxaram. —Você deveria estar em casa. —Observou Fox. —Eu vou dizer a mamãe. Lobo tirou os óculos escuros, revirando os olhos para isso. —Dedo duro. Fox riu e, em seguida, como se percebesse a tensão no ambiente, limpou a garganta e disse: —Acho que vou pegar aqueles tacos que lhe prometi. Voltarei em uma hora para te levar para casa. 8

The Black Dophin (Golfinho Preto, em tradução livre), a Prison Colony IK-6, é uma prisão de segurança máxima localizada em Sol-Iletsk, Orenburg Oblast, na Rússia, junto à fronteira com Cazaquistão.


Depois que Fox saiu, Lobo se juntou a ele na mesa de trabalho, recostando-se contra ela. Ele examinou o ferimento no rosto dela. Os hematomas não eram tão ruins quanto ele esperava. Seu nariz não estava quebrado, mas ela tinha algumas manchas feias que levariam algum tempo para cicatrizar e desaparecer. Era uma coisa muito boa que ela estudasse em casa. Ela teria a diretoria e um conselheiro escolar em cima dela se estivesse em uma das escolas públicas. —Como estão suas costelas? —Ela não parecia estar mais as protegendo, mas ele queria ter certeza. —Você precisa de um médico? Podemos conseguir um na nossa folha de pagamento para vir ver você. Ela balançou a cabeça. —Eu acho que foi apenas uma cãibra muscular na noite passada, na verdade. Eu não bati realmente em nada, mas me retorci muito e chutei. —Ela levantou o lado de sua blusa e mostrou-lhe a área ligeiramente avermelhada lá. —Eu devo ter batido nas prateleiras ou algo assim. Não sabendo como conversar com ela sobre o que aconteceu na noite anterior, ele decidiu ser honesto com ela. —Eu deveria ter voltado aqui para verificar você. Eu não deveria ter deixado as meninas cuidarem de você. Lobo deu de ombros. —Você precisava estar com Holly. Ela é importante para você. Ele cutucou o ombro dela com o seu. —Você é importante para mim. Lobo fez uma careta. —Não vamos ficar piegas e falar sobre sentimentos, ok? —Às vezes precisamos conversar sobre nossos sentimentos. Outras vezes, precisamos encaixotá-los.


—Hoje é um daqueles dias em que preciso falar sobre isso? —Provavelmente. —E o que eu devo dizer? —Tudo o que está sentindo. Qualquer coisa que você quiser. Ela não falou por um longo momento. Quando falou, ela admitiu: —Eu tive um pesadelo na noite passada, mas não foi sobre o que aconteceu no salão. Foi sobre o México. Foi sobre minha mãe. Kostya ficou surpreso ao ouvi-la mencionar sua mãe. Acontecia tão raramente que ele estava inclinado a acreditar que essa menção havia sido estimulada pelo trauma da noite anterior. Saber que ela estivera sozinha a noite inteira, sofrendo por dentro e confusa, lhe revirou o estômago e doeu como uma facada. Sua manhã com Holly tinha sido algo realmente especial, mas veio à custa do bem-estar de Lobo. Max estava certa. Ele era um pai de merda. —Estávamos naquele quarto de hotel. —Continuou ela. — Era legal. —Limpo? —Não como um motel cheio de barata ou qualquer coisa. Alta classe. Talvez um resort? Eu não sei. —Ela hesitou. —Minha mãe me abraçou e ela estava chorando. Ela ficava me dizendo que me amava... e então umas mãos enluvadas a arrastaram para longe de mim. Alguém atrás de mim colocou alguma coisa no meu rosto. Um capuz talvez? E então cheirei algo engraçado... e foi isso. —Provavelmente éter. Não é minha primeira escolha para derrubar alguém. —Ele disse. —Mas tem o seu valor.


Ela bufou. —Você é estranho. Estou aqui contando sobre meu pesadelo e você está usando isso como um momento de ensino. —Desculpe. —Ele encolheu os ombros. —Eu não sou bom nisso, ok? Estou tentando. —Um segundo depois, ele disse: —Eu tenho sonhos sobre meus pais também. Ela olhou para ele, surpresa. —Pesadelos? —Sim, mas não do jeito que você está pensando. Eu sonho com coisas felizes. Meus pais me levando para o parque ou me ensinando a patinar no gelo ou a jogar hóquei. Minha mãe cantando para eu dormir à noite. Sua voz era suave, vulnerável quando ele admitiu: —Eu acordo chorando às vezes. —Estamos tão fodidos. Você. Eu. Sunny. Fox. Max. Estamos todos arruinados por dentro. Eu não acho que haja terapia suficiente no mundo para nos recuperar novamente. Ele balançou sua cabeça. —Não há. Isso nos torna mais fortes em alguns aspectos e mais fracos em outros. —Max quer que eu pare com tudo isso. Ela quer que eu saia de Houston. Que eu vá para uma escola particular e depois para a faculdade e esqueça que tudo isso já aconteceu. —É isso que você quer? Se for, farei acontecer. —Não, não é isso que eu quero. Eu não tenho certeza de onde vou acabar ou como vou chegar lá, mas eu me sinto bem assim. —Ela gesticulou ao redor da sala. —É onde eu deveria estar agora. Eu sinto como se houvesse algo lá fora esperando por mim. Algo grande, assustador e perigoso. —Ela olhou para ele, seu olhar sério demais para a criança que ela era. —Eu preciso estar aqui. Eu preciso me preparar.


Desajeitadamente, ele estendeu a mão e passou o braço em volta dos ombros dela para um rápido abraço. —Mas não hoje. Hoje você deve descansar. Vá para casa com a Fox. Ela vai mantê-la entretida. —Oh Deus. —Lobo gemeu. —Sua ideia de entretenimento é me contar suas teorias doidas de conspiração sobre operações de bandeiras falsas, sobre o estado profundo e os Illuminati. —Bem, ela provavelmente não está errada sobre algumas de suas conspirações. Lobo revirou os olhos. —Por favor, não a encoraje. —Eu não acho que ela precisa de qualquer incentivo. —Ele caminhou até o quadro branco e começou a apagá-lo, limpando qualquer evidência que pudesse ser vista por olhos errados. Se fosse assim tão fácil apagar as memórias...


CAPÍTULO SETE Com a batida da música pop animada marcando cada passo, saí do meu escritório e entrei no andar principal do salão. Era uma manhã movimentada de quarta-feira e quase todas as bancadas estavam em uso. Eu tive um intervalo entre as clientes, então decidi fazer as rondas e bater um papo com as nossas clientes. —A senhorita Candace está aqui para a sua primeira tintura. —Explicou Nisha à sua mais nova assistente, uma recém formada da escola de cosmetologia que recentemente ela escolheu a dedo de nosso sistema de recrutamento. —Então, Mallory, eu quero que você tire um minuto para examinar seu cabelo e criar um plano para cobrir os fios. Elas estavam discutindo a quantidade de fios grisalhos como nós os chamamos em nosso salão – e como dar a sua nova cliente a melhor experiência de tintura. Quando Mallory começou a discutir brilhos e tons com a cliente, eu me mudei para a próxima bancada. Claramente a nova garota de Nisha conhecia o trabalho. Eu passei pelos corredores, parando aqui e ali para sorrir e bater um papo ou para discutir serviços como os alisamentos brasileiros com clientes curiosas. Usando as habilidades de garçonete da época de faculdade, também peguei taças vazias de mimosa e latas de refrigerante e acompanhei os pedidos das clientes. Depois que eu entreguei as bebidas ou lanches, notei que Andy acenava para mim freneticamente com a mão. Corri para o lado dela e me vi tomando sua tesoura e pente na mão e terminando o corte de cabelo que ela havia começado. —Ela está bem? —A cliente perguntou com preocupação.


—Só um probleminha de barriga. —Eu menti, sabendo que Andy não tinha revelado sua gravidez ainda. Sete das nossas cabelereiras eram mães, então o enjoo matinal era algo com que todas nós tínhamos experiência por aqui, mas Andy parecia estar com mais dificuldade do que a maioria. Savannah já tinha oferecido dar a ela uma ou duas semanas de folga ou deixá-la vir por meio turno, mas Andy parecia determinada a permanecer no salão até pouco antes de sair em licença maternidade. Eu suspeitava que o dinheiro era um problema e comecei a pensar em maneiras de oferecer seu trabalho nos bastidores do salão até ela se sentir melhor. Eu tinha acabado de começar a secar sua cliente quando Andy retornou e retomou seus trabalhos. Quando me afastei de sua bancada, avistei Lana carregando uma pilha de toalhas limpas para a bancada dos lavatórios. No momento em que o gabinete foi reabastecido, ela pegou uma vassoura e uma pá e começou a recolher os cabelos nas bancadas de corte mais próximas dela. Sua ética de trabalho nunca falhava em impressionar. A partir do momento em que ela entrava pela porta até o momento em que saía, ela estava ocupada. Às vezes eu me preocupava que ela gostasse de se manter ocupada porque isso a impedia de ter tempo para pensar sobre o horrível abuso que havia sobrevivido. Ela ainda não tinha confiado a nenhuma de nós, sobre como ela tinha ido para o abrigo das mulheres ou até mesmo como tinha vindo para este país. Toda a papelada dela foi checada e ela estava aqui legalmente, mas eu não podia deixar de me perguntar. Billie gostou dela imediatamente. Nisha tinha afinidade com ela. Até mesmo Savannah, que estava menos entusiasmada com minha decisão de contratá-la, não podia dizer coisas boas o suficiente sobre ela agora. Ainda pela manhã, Savvy deixara a inscrição para o semestre de primavera da escola de cosmetologia no


armário de Lana. Era o único programa na cidade com um componente de extensão que incentivava os alunos a melhorar suas habilidades em inglês e sua capacidade de negociação. Eu não tinha certeza se Lana queria uma carreira em cosmetologia. Ela claramente tinha um talento para a arte da manicure e um amor por todas as coisas relacionadas à beleza, especialmente maquiagem, mas eu não tinha certeza se era sua paixão. Depois de vê-la brincando com os dois filhos de uma cliente, tive a sensação de que ela poderia ser melhor adequada para babá ou ensino. Por agora, porém, eu esperava que ela ficasse conosco. Ela precisava de apoio. No mês em que Lana esteve conosco, ela foi acolhida na nossa família do salão. Nós éramos como irmãs aqui, cada uma de nós protegendo as outras. Não um mês, eu emendei em silêncio. Quatro semanas e um dia. Eu estava acompanhando o tempo de Lana no salão porque era uma maneira fácil para eu acompanhar quanto tempo tinha passado desde meu café da manhã com Kostya. Quatro semanas. Um dia. E nem uma palavra dele sobre o nosso acordo. Havíamos trocado algumas mensagens de texto e alguns acenos desajeitados em nossas calçadas, mas só isso. Eu não conseguia entender quando e por que tudo tinha mudado. Eu tinha certeza que as coisas progrediriam rapidamente e iriam esquentar, mas era como se Kostya tivesse atirado água fria no fogo entre nós. Nós tínhamos esfriado – e eu não sabia como acender o fogo novamente.


Risadas estridentes me atraíram para a área de recepção do salão. Mesmo que eu não tivesse olhado para a agenda naquela manhã, teria reconhecido aquelas risadas e vozes familiares de Vivian, Erin, Benny e Bianca. As quatro amigas próximas estavam no salão para suas massagens mensais, manicure e pedicure. Eu tinha visto o nome de Lena na agenda de Nisha para tintura e corte, mas não ouvi sua risada distinta. Conhecendo sua agenda, Lena provavelmente estava saindo de um avião e correndo para o salão em um carro particular agora. Quando entrei na área da recepção, encontrei Erin regalando suas amigas com uma história sobre o seu marido que de tão grande parecia um urso. Pelo olhar no rosto vermelho de Vivian, eu tive um pressentimento que a história de Erin era bastante obscena. As outras garotas estavam rindo muito. Cabeça jogada para trás, Benny enxugou os olhos enquanto Bianca parecia que ia cair do sofá. Juntas, o grupo apresentava uma imagem tão bonita. Vivian e Bianca, ambas grávidas, preferiam estilos mais clássicos. Vivian usava um vestido simples em um tom de vinho profundo que tinha combinado com joias de ouro. O vestido de Bianca foi cortado com uma cintura alta semelhante, mas de um tecido coral vibrante. Ela também usava pulseiras de ouro e grandes argolas de ouro para combinar com o medalhão pendurado em seu pescoço. Erin parecia igualmente elegante em seu vestido de camponesa em tom rosa champanhe e sandálias de tiras dourada. Benny parecia mais casual com calça estilo canga e uma blusa de seda. Ao contrário das outras, ela parecia um pouco cansada e não tinha aquele brilho de descanso em seus olhos. Mas ela tinha um bebê em casa e uma padaria que abria às quatro da manhã! Eu não conseguia nem imaginar tentar administrar um negócio com um bebê pequeno e um marido. Eu tinha dificuldade em lidar comigo e com o salão.


Claro, pelo que eu sabia do marido de Benny, ele parecia ser um pai muito presente. Mais de uma vez, eu tinha visto Dimitri no supermercado lidando com as compras e o bebê com facilidade. Benny parecia ter escolhido bem quando escolheu Dimitri para ser seu parceiro na vida. —Desculpe, desculpe, desculpe. —Lena exclamou enquanto corria para a área da recepção, uma mimosa já na mão e uma bolsa escandalosamente cara pendurada em seu braço. Eu tive que sorrir pela maneira que ela tão facilmente combinava seus sapatos de grife e acessórios com uma legging preta e uma gigantesca camiseta de beisebol da Universidade de Houston. —Meu voo de Moscou atrasou e depois pegamos o tráfego vindo do aeroporto. Erin foi a primeira a pular e abraçar sua melhor amiga. Lena se moveu pela fila de amigas, abraçando e sorrindo. Quando o grupo de amigas terminou seus cumprimentos, Billie reuniu-as e levou-as para a área de spa para cuidar das suas unhas. Quando elas saíram, notei o gigante tatuado sentado no canto da área de espera. Havia um iPad em seu colo e um fone de ouvido firmemente preso em sua orelha esquerda, mas a direita estava vazia, provavelmente para que pudesse ouvir Vivian se ela precisasse dele. Ela chamava seu guarda-costas de Ten, e onde quer que ela fosse, ele estava bem ao lado dela. Como os maridos de Bianca e Erin, Ten era maior que todos os outros. Ele tinha tatuagens nas mãos, braços e saindo no topo de sua camiseta preta justa. O tigre siberiano rosnando em seu braço era uma das tatuagens mais legais que eu já tinha visto. Não que eu fosse dizer isso a ele. Quando me dirigi à recepção para verificar minha agenda de compromissos, observei o modo como Ten não conseguia tirar os olhos de Nisha enquanto ela entrava na área de espera para sua próxima cliente. Não foi a primeira vez que eu o vi olhando para ela


assim. Seu olhar intenso em todos os movimentos dela revelavam seu interesse. Era um interesse desperdiçado, infelizmente. Nisha havia renunciado aos homens para sempre. Ela tinha se casado logo que saiu do colegial – tipo dois dias depois de se formar – com seu namorado que acabou se revelando um abusador de mulheres. Ele regularmente a espancava tanto que a mandava para o hospital. Felizmente, ele tinha estragado um negócio de tráfico de drogas e acabou indo para a prisão. Não muito tempo depois que foi preso, ela mandou a ele os papéis de divórcio e nunca olhou para trás. Mas algo sobre Ten me fez pensar se ele poderia ser o homem que a faria mudar de ideia sobre relacionamentos. —Sua cliente teve que cancelar e reagendar. —Disse Billie quando retornou à recepção, onde clicava na agenda de compromissos em um dos computadores de lá. —Ela estava fechando um negócio e tinha outra casa com duas ofertas que precisava negociar. —Oh, você achou um dia para colocar Susan na minha agenda? —Minha agenda era quase tão apertada quanto a de Nisha, mas para uma cliente como Susan que estava comigo desde o dia em que abri, eu chegaria mais cedo ou ficaria até tarde. —Você tinha um horário amanhã de manhã, mas terá que abandonar uma reunião de fornecedores dez minutos mais cedo. —Isso é bom. Savvy toma as decisões finais de qualquer maneira. —Quando eu estava levando as meninas de volta, Benny mencionou que precisava agendar um corte e Vivian precisava de um corte também. Pensei que talvez pudéssemos trabalhar Benny


com a Peyton e então colocar Vivian na segunda metade da hora vaga de Susan. —Funciona para mim. —Eu cliquei fora da tela da agenda de compromissos. —Eu vou andar pelo salão, se você precisar de mim. Antes de sair da recepção, peguei uma garrafa de água gelada do refrigerador de bebidas e caminhei até Ten. Ele olhou para cima quando me aproximei dele e puxou o fone de ouvido solitário de sua orelha. Eu entreguei a água para ele. —Você está no Wi-Fi gratuito do salão? Não há razão para gastar seus dados enquanto espera por Vivian. —Eu estou. —Ele aceitou a garrafa de água. —Obrigado. —Vivian vai ficar depois de seu horário no spa para um corte de cabelo comigo. —Eu olhei para o seu iPad. —Se você ficar com pouca bateria, peça a Billie um carregador. Mantemos alguns diferentes nas gavetas da recepção. Depois de me certificar de que Ten estava confortável, atravessei o salão, parando no balcão de tinturas, nos lavatórios de cabelo e em cada bancada de corte para conversar com as clientes. Percebendo que os cestos para capas e toalhas estavam ficando cheios, manobrei cuidadosamente os cestos com rodinhas da área de lavagem em direção ao corredor da equipe. Quando passei pelos banheiros dos clientes, ouvi o choro e parei para ver se alguém precisava de ajuda. Quase imediatamente, comecei a me preocupar que uma de nossas clientes tivesse odiado o corte de cabelo ou a cor. Eu tentava ao máximo garantir que minha equipe soubesse se comunicar e ser conservadora quando se tratava de grandes mudanças ou novos clientes, mas às vezes falhávamos. —Eu me sinto péssima por estar com ciúmes e não estar entusiasmada com o chá de bebê dela. Tipo, eu sei que é o meu


trabalho como amiga de Vivian oferecer seu chá de bebê, mas começo a pensar em mim e Ivan e quanto tempo estamos juntos e como ainda não conseguimos um teste positivo. Minha menstruação desceu esta manhã e, em seguida, ter que ouvir sobre os planos do quartinho e os nomes dos bebês – eu simplesmente não conseguia ficar lá dentro. Mas que tipo de amiga eu sou para ficar com ciúmes de coisas assim? —Você é uma boa amiga, Erin, e eu sei que se Vivian ou Bianca soubessem que você estava passando por isso, fariam qualquer coisa para fazer você se sentir melhor. —Lena tentou ser a voz da razão para a sua amiga desesperada. —Caramba, conhecendo Vivian, ela estaria ao telefone com todos os especialistas em fertilidade na cidade, exigindo que eles encaixassem você hoje para um checkup. Ela e Bianca nunca se ressentiriam de você se sentir com ciúmes ou triste ou o que quer que seja que você sente quando vê suas grandes barrigas de grávidas. Não era incomum ouvir coisas assim no salão. Às vezes eu me sentia mais como uma terapeuta do que como uma cabelereira, para ser honesta. Mas eu não sabia que Erin e Ivan estavam tendo problemas para engravidar. Eles ainda não tinham um ano de casados, mas talvez tivessem tentando desde o noivado deles? —E se eu for como minha mãe e Ruby? E se eu tiver endometriose? E se eu não puder ter filhos? Ivan quer tanto ser pai e eu quero ser mãe e ter muitos bebês. E se eu não puder tê-los? —Então eu vou ter seus bebês para você. —Disse Lena com naturalidade. —O quê? —Erin perguntou, sua voz rouca pelo choro. —Garota, eu fui criada para ter bebês. Olhe para esses quadris! Olhe para o meu traseiro e esses seios! Depois que Yuri e eu tivermos um bebê, serei sua barriga amiga.


Meus olhos se arregalaram pela maneira muito calma e confiante que Lena se ofereceu. Ela poderia estar falando em emprestar o carro a Erin em vez de seu útero. —Você está falando sério. —Erin disse um momento depois. —Você realmente seria nossa barriga se isso acontecesse? —Claro que sim! Você é como minha irmã e eu te amo. Nós somos da família, Erin. Eu faria qualquer coisa pela minha família. —Até carregar um bebê gigante do tamanho de Ivan? —Bem, terá que ser uma cesariana! As duas amigas começaram a rir, e eu tomei isso como minha deixa e apressadamente empurrei os dois cestos para a lavanderia. Pouco tempo depois, após colocar um monte de roupa para lavagem, espiei para fora da sala a tempo de ver Erin e Lena saírem do banheiro com os braços dados. —Você precisa de uma massagem. —Decidiu Lena. — Vamos ver se um dos massagistas pode atender você, ok? E quando terminarmos aqui, vamos invadir a adega de Yuri por algo estupidamente caro, pedir algo totalmente gorduroso e fazer uma farra enquanto assistimos Netflix... Quando o corredor estava vazio, saí da lavanderia. O que eu ouvia, eu nunca repetia. Como um advogado, eu acreditava no sigilo cabelereiro-cliente. De volta ao spa, encontrei Bianca abraçando Benny e Vivian enquanto se apressava para um encontro de noivas em sua butique. Parecia que Lena já tinha seguido para sua sessão com Nisha, e Erin tinha sido levada para uma sala de massagem. Apenas Vivian e Benny ficaram quando terminaram suas manicures.


—Eu acho que é bom que você e Nikolai estejam falando sobre isso. —Benny estava dizendo enquanto admirava a cor suave de pêssego em suas unhas. —Quando eu não conseguia parar de chorar, não conseguia dormir e tinha toda aquela ansiedade, Dimitri e eu não sabíamos o que estava errado. Eu me sentia como uma mãe horrível, e ele se sentia como um péssimo pai e marido. Ele achava que todos os problemas eram culpa dele, porque estava trabalhando demais ou não cuidava o suficiente de Sofia à noite, mas não era esse o caso. Eram apenas os hormônios e as substâncias químicas no meu cérebro que precisavam de um ajuste. —Mas você se sente bem com o remédio agora? —Vivian perguntou, sua preocupação clara pelo tom de sua voz enquanto deslizava de volta seus anéis e pulseiras. —A diferença foi como noite e dia, uma vez que a medicação entrou em ação. —Assegurou Benny. —Eu só precisava de uma dose baixa e era seguro para a amamentação. Se você precisar, vai ficar bem, e o bebê vai se dar bem, porque a mãe dele está saudável e feliz. Dele? Essa foi a primeira vez que ouvi Vivian falar que teria um menino. Eu teria que fazer um lembrete para Savannah. Ela adorava comprar presentes de bebê para nossas clientes e certificava-se que elas tivessem suas massagens pré-natal e pós-natal de cortesia e pedicure reservadas. Eu esperei até que houvesse uma pausa na conversa entre elas para caminhar sorridente e perguntar se elas estavam prontas para seus cortes de cabelo. Peguei suas bolsas e telefones para que não tivessem que se preocupar em borrar suas unhas ou que a loção de mão sujasse o couro. Enquanto Vivian foi rapidamente ao banheiro, levei Benny à cabelereira. Quando terminei, encontrei Lana andando com Vivian para a minha bancada de cortes. Elas


estavam tagarelando em russo, e fiquei feliz em ver que Vivian se interessara por Lana. —Como foi a sua sessão no spa? —Eu perguntei enquanto Vivian se acomodava na cadeira da minha bancada. —Muito boa. —Ela mostrou sua manicure fresca para mim. —O que você acha? —Rock Royalty? —Eu imaginei, tendo a certeza que tinha notado o tom roxo profundo. —Sim. —Ela estendeu a mão e mexeu os dedos. —Eu queria algo divertido e diferente desta vez. —E você quer fazer algo divertido e diferente com o seu cabelo? —Eu penteei meus dedos pelas ondas longas e escuras dos cabelos dela. Ela riu. —Definitivamente não. Nikolai teria um derrame se eu chegasse em casa com o cabelo mais curto. —Ela pegou as pontas, enrolando-as ao redor do dedo, e um olhar passou pelo seu rosto. Deve ter sido uma boa lembrança porque um sorrisinho malicioso ergueu os cantos de sua boca. —Não, vamos apenas cortar as pontas e uma escova se você tiver tempo. —Eu tenho tempo. —Eu toquei seu ombro e encontrei seu sorriso no espelho. —Vamos levá-la para uma das pias para uma lavagem. Nós pegamos uma pia de canto, e eu coloquei e prendi uma capa em volta do pescoço dela antes de ajudá-la a se inclinar para trás na cadeira. Ajustei o apoio para os pés, na esperança de aliviar a tensão na parte inferior das costas. Lembrando que ela estava mais sensível, mantive a temperatura da água quente, mas não muito. — Está tudo bem?


—Está bom. —Ela disse, sorrindo para mim. Ficamos de conversa fiada enquanto eu lavava, condicionava e enxaguava o cabelo dela. Quando nós voltamos para minha bancada, continuamos falando sobre seus últimos projetos de arte, uma festa de gala que ela estava organizando em novembro e como era difícil encontrar roupas elegantes para a noite para grávidas. —E não ajuda que eu pareço estar maior a cada dia. —Ela acrescentou, esfregando sua barriga. —Se eu comprar um vestido esta semana, talvez não caiba no mês que vem. —Tenho certeza de que alguém na boutique da Bianca poderia ajustar seu vestido. —Eu sugeri enquanto cortava. —Ela provavelmente vai ter o mesmo problema. —Só que pior já que ela terá gêmeos. —Vivian respondeu. —Ela finalmente desistiu dos saltos altos esta semana. Bom. —Ela riu. —Eu deveria dizer que Sergei passou por seu armário e encaixotou todos eles e os levou para minha casa por segurança. Ele estava convencido de que ela perderia o equilíbrio e se machucaria tudo em nome da moda. —Ela ama seus saltos altos. —Eu verifiquei meu corte. — Estou surpresa que a coleção de sapatos dela não esteja fechada e guardada. Deve ter lhe custado uma fortuna, todos aqueles Jimmy Choos, Manolos e Louboutins. —Ela ficou furiosa quando chegou em casa e seu armário estava vazio. Ele foi até minha casa mais tarde naquela noite para colocá-los todos de volta em seu SUV e levá-los para casa. Tinha o rabo enfiado entre as pernas. —Ela acrescentou com uma risada. —Meu Deus, você pode imaginar o quão dura ela deve ter sido para fazê-lo rastejar?


—Oh, eu tenho certeza que ele pensou em algo para fazê-la esquecer o quão frustrada estava com ele. O brilho malicioso nos olhos de Vivian me fez corar. Sergei era alfa até o núcleo, e era óbvio para qualquer um que o visse com Bianca que ele a amava e pensava que ela era a mulher mais sexy do mundo. Meu rosto ficou vermelho enquanto eu imaginava como era um homem assim na cama. —Tenho certeza que ele pensou. —Falando de homens e frustração... No começo, achei que ela estava falando de mim, mas depois percebi que o olhar dela estava dirigido a Ten. Seu guarda-costas gigante estava saindo do corredor, provavelmente depois de fazer uma visita ao banheiro, e tinha o olhar fixo em Nisha enquanto ela trabalhava no cabelo de Lena. Eu praticamente podia sentir daqui o calor do desejo dele. —Eu acho que ele vai ficar frustrado. —Eu adverti gentilmente. —Nisha não está realmente no mercado para homens agora. —Ten é tenaz. Ele não vai deixar que isso o pare, não se ele acha que há qualquer chance no inferno dela retornar seu interesse. —É por isso que eles o chamam de Ten? —Eu abri uma gaveta na minha bancada e retirei uma escova redonda. —Porque ele é tenaz? —Não. Tive a sensação de que aquela era uma daquelas áreas obscuras de sua vida, então não pedi mais explicações. Levantandome na ponta dos pés, puxei o secador pendurado no teto e comecei a secar seu cabelo. Enquanto trabalhava, pensei em Kostya e em todas as áreas obscuras de sua vida que se tornariam as minhas se eu fosse atrás dele.


—Você está bem? —Vivian perguntou enquanto eu puxava para baixo seus fios brilhantes. —Você ficou quieta. —Estou apenas pensando. —Sobre? Por fim, ocorreu-me que Vivian era a única pessoa em quem podia confiar para falar sobre algo assim. Eu olhei ao redor e percebi que estávamos sozinhas. Mesmo assim, mantive minha voz baixa e perguntei: —Quando você soube que queria seu marido, mesmo com toda a sua... bagagem? Vivian esperou até eu tirar o secador das pontas do cabelo para virar a cadeira para me ver melhor. Ela parecia estar olhando profundamente dentro de mim, como se estivesse tentando decidir se eu poderia ser confiável. Ela deve ter visto algo que a convenceu da minha confiabilidade. —Isso nunca foi uma questão para mim. Eu o amo. Tudo dele. —Acrescentou. —Mesmo as partes sombrias. As partes sombrias? Essa era uma boa maneira de descrever todas as coisas obscuras e perigosas que os homens com quem nos importávamos faziam. —O homem com bagagem, é alguém que eu conheça? Certa de que podia confiar nela, confessei: —É Kostya. —Kostya? —Ela parecia totalmente chocada. —Como assim? —Somos vizinhos. Nós somos há dois anos. Não estamos namorando. Tipo oficialmente ou qualquer coisa. —Acrescentei apressadamente. —Nós estamos dançando em torno disso por um tempo. Há um mês, tivemos um café da manhã perfeito e a passamos a manhã juntos... —E então ele se afastou de você?


Eu balancei a cabeça. —Basicamente. —Kostya é como Nikolai de várias maneiras. Eles são homens quietos. São discretos. Também são muito complicados e teimosos. —Ela tocou a pulseira no meu braço como se a visse pela primeira vez. —Esta é uma das peças de Zoya. Eu conheço o trabalho dela, e também sei que Kostya deve ter dado a você. —No Natal. —Eu confirmei. —O que você deu a ele? Quero dizer, se essa não é uma pergunta muito pessoal, é claro. —Um certificado para o abrigo de animais. Vivian sorriu. —Essa é a ideia mais doce de presente. —Eu não acho que ele ficou muito animado com isso. Ele ainda não usou. —Eles têm estado muito ocupados. —Vivian disse cuidadosamente. —Tem sido um ano difícil até agora. Muita expansão, crescimento e volume de negócios. —Acrescentou, escolhendo com prudência suas palavras. —Realmente não era um bom momento para adicionar um cachorro à sua vida. —Eu disse a ele que poderíamos adotar um juntos e compartilhar responsabilidades. —O que ele achou disso? —Eu não sei. —E o que ele pensa sobre vocês dois namorarem? Eu encolhi os ombros tristemente. —Ele me disse para tirar quatro semanas para pensar se eu realmente queria me envolver com ele.


—Já se passaram quatro semanas? —Ontem. —E? —E eu não o vi. —Eu disse, recuando para terminar de escovar seu cabelo. —Você o quer? —Ela segurou meu olhar no espelho. — Você quer ele e todas as partes sombrias? Quer fazer parte da sua vida complicada? Quer tornar sua vida mais complicada? —Sim. —Eu não pensei. Não questionei. Simplesmente respondi com sinceridade. —Eu quero ele na minha vida. —Então você tem que dizer a ele. —Vivian respondeu com naturalidade. —Seja forte, se necessário. Às vezes esses nossos homens podem ser teimosos. Esses nossos homens... Quando terminei o cabelo de Vivian, avistei a tatuagem da coroa na nuca dela. Se as coisas com Kostya progredissem do jeito que eu queria, eu poderia algum dia fazer parte da família dela. Havia algo estranhamente fascinante na ideia de pertencer a algo tão poderoso e, no entanto, tão secreto. Quando terminei o corte de cabelo e a escova de Vivian, tirei a capa e levei-a para um cesto que ficava escondido em um armário próximo enquanto ela tirava uma selfie. Aquele sorriso travesso dela estava de volta quando digitou uma rápida mensagem e enviou sua foto. Pegando sua folha de cliente na gaveta de cima, perguntei: — Você quer marcar outro corte para daqui seis ou oito semanas?


—Vamos marcar daqui seis. —Ela caminhou ao meu lado até o balcão da recepção, onde entreguei sua folha de cliente e disse a Billie para agendá-la para outro corte. Antes de sair para arrumar minha bancada, Vivian tocou meu braço. —Se você quiser conversar, eu estou sempre por perto para um bate-papo. —Obrigada. Eu realmente aprecio essa oferta. —Só venha em casa ou me encontre no Samovar. Eu geralmente estou lá para o almoço. —Eu vou. Quando voltei para minha bancada, descobri uma das pulseiras de ouro de Vivian no balcão onde sua bolsa estava. Pegando, comecei a chamá-la, na esperança de alcançá-la antes que ela saísse, mas então vi o cartão de marcação dobrado debaixo da pulseira e do bilhete que ela rabiscou. Vou mandar Kostya para pegar isso. Boa sorte!

Guardei a delicada pulseira por precaução e tentei parar de sorrir. Aparentemente, a rainha do submundo de Houston decidiu tentar a sorte para mim.


CAPÍTULO OITO —Eu não sei o que fazer. Ela não me ouve mais. Ela acha que ele a ama, mas ela é apenas uma criança. Nem sabe o que é amor. Kostya recuou, recostando-se na porta da cozinha enquanto a mãe chorosa e cansada despejava seus problemas em Nikolai. Sentado à mesa redonda na casa perfeitamente bem cuidada de Rada, o chefe ouvia atentamente enquanto a mulher mais velha dizia a ele o que todos na rua já sabiam – sua filha de dezesseis anos tinha fugido com um dos traficantes da rua de Lalo. —Ele bate nela. —Ela chorou com desespero. —Não foi só na vez em que Ilya cuidou disso. Outra vez, apenas alguns dias atrás. Ela tinha marcas nos braços. Marcas roxas, grandes e feias. Agredir Tiffany, a única filha de Rada, era tão sério para Nikolai quanto se fosse com seu próprio sangue. O falecido marido de Rada tinha trabalhado para a família em Moscou. Quando ela veio para Houston com a irmã e o cunhado, todos encontraram trabalho e proteção sob o comando de Nikolai. Rada trabalhava no Samovar desde antes de sua abertura, primeiro como cozinheira de linha e agora na parte de trás da casa como gerente de operações diárias. Ela dirigia o restaurante como uma mãe, sendo dura quando necessário e sempre encorajadora e gentil. Era uma boa mulher, e ninguém tinha nada de ruim a dizer sobre ela. E vê-la chorando por sua filha rebelde, chorando tanto que soava como se fosse ficar doente, tocou algo dentro de Kostya. Marco e a garota haviam desaparecido, mas não ficariam sumidos por muito tempo. Não se ele tivesse alguma coisa a ver com isso.


—Nós cuidamos disso antes. —Lembrou Nikolai, não de forma indelicada, mas severamente. —Ilya se certificou de que Marco entendesse a mensagem para não voltar a tocá-la e deixá-la em paz, mas ela foi atrás dele e agora... Depois que Tiffany foi encontrada com Marco pela primeira vez, Nikolai tinha enviado Ilya para endireitar Marco e colocar um fim no seu namorico com uma garota menor de idade sob sua proteção. Ilya tinha lhe dado uma mensagem – com punhos e pés. Quando sua equipe terminou com Marco, ele acabou no hospital, mancando e mijando sangue. Mas não foi suficiente para acabar com os dois amantes ilícitos. Em pouco tempo, Tiffany voltou a andar às escondidas com o traficante mais velho. Disseram para Lalo para colocar seu homem na linha, mas ele claramente não tinha nenhum controle sobre suas equipes. E agora aqui estavam todos, com uma adolescente desaparecida e a chance muito real de a polícia se envolver. Se a polícia o encontrasse primeiro e o colocasse em uma sala de interrogatório, Marco cederia – e depois? —Não sei o que fazer. —Rada repetiu, chorando tanto que Kostya se preocupou que ela pudesse sufocar. Esta era uma mãe que claramente chegara ao limite. Nikolai tirou um lenço com monograma do bolso e gentilmente o pressionou na mão de Rada. —Você não precisa se preocupar mais com isso. Nikolai não precisava dizer mais nada. Rada entendeu o que ele queria dizer. Tiffany seria encontrada e devolvida. Eles cuidariam de Marco e Lalo pagaria qualquer reparação que Rada exigisse. A polícia seria mantida fora de um problema de família e seria isso. Ele ficou para trás para designar dois homens para vigiar a casa, apenas no caso de Tiffany ou Marco decidirem voltar. No


momento em que alcançou Nikolai, a equipe que os seguia já estava a postos e aguardava suas instruções. Com a mão na maçaneta da porta do passageiro, Nikolai perguntou: – Nós sabemos onde Marco fica? —Eu mandei Danny persegui-lo. Ele enviou uma mensagem para me avisar que Lalo está jogando e não vai contar nada sobre Marco. Assim que estavam seguros dentro do carro, Nikolai exalou bruscamente e puxou o cinto de segurança. —Deixar Hector colocar Lalo no comando de Houston foi o maior erro que eu já cometi. —Eu não chamaria isso de o maior erro que você já cometeu. —Ele respondeu, pensando em pelo menos duas outras vezes que Nikolai tinha realmente fodido as coisas. Nikolai lançou a ele um olhar de advertência antes de comentar: —Eu deveria ter deixado Besian e Alexei terminarem com Lalo quando tiveram a chance, dez anos atrás. Esse idiota é perigoso para todos nós. Ele é chamativo e estúpido. Não respeita o código. Não consegue nem controlar seus homens. —Bem, talvez você tenha sorte e alguém faça um favor a você. —Kostya fez um movimento de corte em sua garganta enquanto seu telefone vibrava em seu bolso. —Lalo tem inimigos em todos os lugares. —Ele pegou o telefone e olhou para a tela. — Por falar em favores... —E agora? —Nikolai perguntou entediado, provavelmente esperando outro custo pesado em dinheiro ou homens. —Besian. —Disse ele, tocando a tela e abrindo a mensagem. Codificada, mas facilmente decifrável. —Nenhuma pista ainda. Eles continuarão procurando.


—O que você disse a ele para fazer com Marco se o encontrar? —Tirá-lo das ruas. Trazer a garota de volta para a mãe dela. —Eu quero falar com ela primeiro. Isso não pode acontecer novamente. —Nikolai tamborilou os dedos no painel. —E quanto a Diego? —Diego? —Por que Nikolai queria o líder dos Hermanos? Eles eram a polícia de rua para o cartel, mas havia problemas entre Lalo e Diego. Problemas de pelo menos dez anos atrás, quando eram crianças na escola, quando Gabe, o irmão mais velho de Diego, começou uma briga. —Lalo vai pirar se descobrir que fomos por suas costas para pegar Marco, especialmente se descobrir que estamos usando sua própria gente. —Eles não são sua gente. —Resmungou Nikolai. —Os laços entre os hermanos e o cartel são finos e estão esticados até o ponto de ruptura. Lalo fodeu Diego e seus rapazes muitas vezes. Ele não entende o que quer dizer lealdade. Está apenas preocupado com o próximo passo, para subir mais alto. Apesar de sua preocupação com o resultado, ele perguntou: —Quer que eu fale com Diego? —Não, eu vou falar com ele. —Nikolai abaixou a janela e assobiou para chamar a atenção da turma de Ilya. Um deles correu para atender. —Diga ao rei da Coronado Street que eu quero um encontro. —Ele olhou no seu relógio. —Meio-dia. Cemitério Católico. O soldado assentiu e correu para fazer as chamadas necessárias. Diego seria prudente em não perder a reunião dali a meia hora, mesmo que tivesse que ultrapassar todos os sinais vermelhos na cidade.


Enquanto dirigiam para o cemitério, Kostya pensou no tipo de acordo que Nikolai provavelmente iria oferecer a Diego. Seria algo que colocaria as engrenagens em movimento para outra mudança que beneficiaria os interesses de Nikolai a longo prazo. Lalo sempre foi um substituto em suas mentes. Eles precisavam de um parceiro mais forte, alguém em quem pudessem confiar e alguém que tivesse a confiança dos homens que o serviam. Eles chegaram cedo ao ponto de encontro, dando a Kostya tempo suficiente para explorar a área. Ele enviou os veículos de guarda habituais para pontos específicos no perímetro e depois voltou para o carro para esperar. Silenciosamente, percorreu sua própria lista mental de tarefas e problemas que ainda precisava resolver antes do final do dia. —É amanhã a turnê das esposas e viúvas. —Disse Nikolai, interrompendo seus pensamentos. Ele abriu um sorriso com o nome que tinham dado ao circuito mensal de visitas que precisavam fazer. Cada equipe pagava uma taxa para cobrir os pagamentos de apoio familiar para seus irmãos de armas por tempo de serviço, ou às viúvas e famílias que ficaram para trás quando um soldado morria – naturalmente ou no cumprimento do dever, por assim dizer. Nikolai também prestava ajuda às famílias que haviam trabalhado com a família ou pagaram uma taxa de proteção para seus negócios. Era tudo sobre recompensar a lealdade. Algumas semanas depois de se casarem, Vivian assumira um dever que Nikolai nunca se sentira confortável em fazer. Francamente, ela era melhor nesse tipo de coisa que o marido. Ele era frio e assustava as pessoas, especialmente as esposas e namoradas de soldados que estavam na prisão. Aquelas mulheres nunca tinham certeza de onde eles estavam ou mesmo quão seguras elas próprias ou seus homens estavam.


Até Vivian aparecer. Ela realmente se importava com as pessoas e seus problemas. Os fazia sentir como se fossem importantes para ela. Ela ouvia, e era compassiva e gentil. Também era inteligente o suficiente para entender as regras do jogo. Vivian parecia entender que manter as outras famílias felizes protegia a sua família. Os homens que cumpriam pena por delitos que haviam cometido sob a ordem de Nikolai precisavam saber que suas esposas e famílias estavam sendo cuidadas adequadamente. Homens que pensavam que suas esposas e as crianças tinham sido esquecidas poderiam se tornar delatores. Eles ficavam vulneráveis, fracos e facilmente manipulados para conversar com as pessoas erradas sobre as coisas erradas. Envelopes de dinheiro para pagar por alimentos, aluguéis e consultas médicas eram entregues na primeira semana de cada mês para as famílias que eles haviam deixado para trás. Costumava ser uma simples situação de entrega, mas Vivian tinha mudado tudo isso. Ela sempre trazia algo de bom para a família que estava visitando, geralmente uma caixa de doces e sobremesas do Samovar, e depois ficava um tempo conversando. Ela se certificava de que as esposas e namoradas tivessem ajuda com as contas de creches, uniformes escolares e taxas extracurriculares, e tentava encontrar trabalho se elas precisassem ou quisessem. Nikolai não tinha ficado satisfeito a princípio com o que ele viu como intromissão, especialmente quando isso lhe custou mais dinheiro, mas Vivian o colocou em seu lugar, lembrando-o de que era mais barato pagar taxas de excursões escolares e creches para


algumas famílias do que os advogados se um processo baseado na RICO9 fosse aberto. Lembrar daquela conversa tensa ainda trazia um sorriso ao seu rosto. Mais e mais, Vivian encurralava Nikolai. Ele suspeitava que no fundo o chefe gostava quando sua esposa se recusava a desistir. Uma caminhonete Chevy preta entrou no cemitério. Veio sozinha porque Diego não era chamativo como Lalo. Diego tinha mais homens sob seu controle e era pessoalmente responsável por manter todo o território que Lalo reivindicara como seu, mas não ostentava. Houve alguns problemas alguns anos antes com o irmão mais novo de Benny, mas Diego aprendeu a lição e se emendou logo depois disso. Considerando tudo o que tinha conseguido ainda tão jovem, ele tinha o direito de ser arrogante, mas era discreto, um grande retrocesso da velha escola onde se era o rei da rua. Diego e seu irmão mais novo, Nate, saíram da caminhonete. Kostya avaliou o garoto Reyes mais jovem. Ele era um lutador nato. Se as histórias que Fox lhe contara fossem verdadeiras, Nate vinha brigando desde que fizeram o jardim de infância juntos, muitas vezes enfrentando meninos três ou quatro anos mais velhos que ele. Ele havia perdido a maioria das primeiras lutas, mas elas tinham acendido um fogo dentro dele que não podia ser apagado. Agora ele era um dos melhores lutadores das lutas do circuito subterrâneo e estava preparado para acabar com a longa sequência de vitórias dos lutadores de Nikolai. —Estamos fodidos se aquele garoto continuar melhorando no ringue. —Nikolai resmungou e alcançou a maçaneta da porta.

9

Racketeer Influenced Corrupt Organization Act, ou, em português, Lei Federal das Organizações Corruptas e Influenciadas pelo Crime Organizado, é a lei empregada para impedir atividades de cartéis e de máfias.


—Se aquele garoto não fosse o irmão mais novo de Diego, eu cuidaria dele. —Ele comentou. —Só o joelho. Nada muito prejudicial. Nikolai riu quando saiu do carro. —Isso não vai demorar muito. Kostya levantou-se de seu assento e olhou ao redor do cemitério, seu olhar afiado procurando quaisquer sinais de problemas. Como Diego mantinha as ruas de seu bairro seguras e calmas, Kostya não estava tão preocupado com esse encontro. Seguro neste território, havia apenas uma pequena chance de que algo pudesse começar. Enquanto Diego e Nikolai caminhavam em uma fila de túmulos, Nate Reyes se aproximou e ficou ao lado de Kostya. Ele se recostou contra o carro e, indiferente, enfiou a mão no bolso de trás de sua calça jeans para pegar sua carteira. —Meu irmão queria que eu lhe desse isso. Kostya olhou para o cartão que Nate tirou da carteira. — Deixe-me adivinhar. Diego conseguiu um treinador de luta para você? Nate riu. —Irmão errado, cara. Kostya não tentou esconder sua surpresa com a menção do irmão Reyes mais velho. Gabe não era visto deste lado da fronteira há mais de dez anos. Havia um preço pela sua cabeça e um mandado de prisão esperando por ele se tentasse voltar para os EUA. Até onde Kostya sabia, Gabe tinha uma boa vida – sete dígitos por ano – fazendo trabalho sujo para contratos anônimos bem pagos. Imaginando o que Gabe queria, pegou o cartão oferecido a ele para ver o endereço de e-mail rabiscado no verso. Era um


endereço usando um provedor darknet famoso e extremamente seguro. —O que eu devo fazer com isso? Nate deu de ombros. —Eu não faço perguntas. Certo de que o que quer que o irmão Reyes mais velho tinha para lhe dizer era perigoso, mas importante, ele colocou o cartão em sua carteira. Seu olhar se voltou para Nikolai e Diego, que já estavam caminhando de volta para os veículos. Quando os dois homens se aproximaram, ele notou a rigidez na mandíbula de Nikolai e os passos duros que o trouxeram de volta para o carro. Com o interesse despertado, esperou até que estivessem em segurança em seu carro e Diego e Nate estivessem indo embora para perguntar: —Tudo bem? —Precisamos encontrar Marco. Eu não quero que a polícia chegue até aquele bastardo primeiro. Kostya manteve o pé no freio. —Você acha que ele vai falar? Nikolai girou a aliança de casamento ao redor do dedo. — Diego acha que ele já está falando há algum tempo. Com o estômago agitado, ele perguntou: —Ele é a porra de um informante? —Diego suspeita há algum tempo, especialmente depois da semana passada. —Aquela coisa em Longview? Com o policial disfarçado? — Interveio. —Os garotos Hermanos ainda estão na cadeia, certo? —Sim. —O que isso tem a ver com Marco? —Marco armou isso.


Ele pensou no assunto por um momento. —É possível que Marco não soubesse que estava entregando-os a um policial. — Nikolai olhou para ele. —O quê? —Ele atirou defensivamente. — Acontece. —Nos filmes, talvez. Isso é vida real, Kostya. —O que Diego fez sobre isso? Ele falou com Lalo? —Ele tentou. Lalo não quis ouvi-lo. —Ele poderia estar nessa com Marco. Nikolai empalideceu. —Estamos fodidos se isso for verdade. Por tudo o que sabemos, trata-se de construir um caso RICO. Se formos expostos...? Se alguém falou...? —Se alguém falou, não terá língua por muito mais tempo. — Prometeu Kostya. Levantando o pé do freio, se afastou do cemitério. Sua mente acelerou enquanto pensava em todas as maneiras que isso poderia prejudicá-los. Se a história do delator fosse confirmada, Marco poderia ter falado sobre todas as recentes jogadas de poder e impactos. Havia muito sangue nas ruas. Kostya fizera todo o possível para colocar sacos de areia estratégicos que impediriam isso de fluir para a porta do chefe. Não havia um russo ou um albanês na cidade que dissesse uma palavra à polícia. Os laços de suas irmandades criminosas foram construídos sobre a lealdade e honra. Mas as outras famílias? Kostya não confiava na porra de nenhum deles. —Temos que parar de usar todos os telefones. Agora mesmo. —Ele havia treinado os capitães e seus soldados para não usarem seus telefones pessoais para informações confidenciais. Eles usavam descartáveis quando estavam em serviço e os destruíam


imediatamente após o uso. Eles conversavam apenas em código ou mantinham suas mensagens curtas. Toda a merda pesada era discutida cara a cara. Mas sempre havia uma chance de alguém ser descuidado. Ele pegou seu celular de trabalho e ligou para Ilya, que atendeu no segundo toque. —Encontrei um acordo melhor para nossos contratos de telefone. Encontre-me no lava-rápido. —Estou a caminho. —Minutos após o término da ligação, Ilya discava para o próximo capitão da lista para dar a mensagem. Um a um, cada capitão saberia que eles poderiam ter sido comprometidos. Telefones seriam destruídos. Carros seriam verificados, checados novamente e examinados uma terceira vez a procura de escutas ou dispositivos GPS. Pontos de encontro e empresas seriam limpos e checados do rodapé até cada prego. Não haveria um centímetro de duto ou tubulação que não seria verificado. Eles iriam se unir e ficar longe das outras organizações. As transações comerciais seriam interrompidas temporariamente. Não haveria coleta de taxas de proteção, nenhuma remessa de armas movidas ou vendidas e não haveria novos negócios de qualquer tipo. Nikolai sempre mantinha dinheiro suficiente em reservas escondidas para manter a folha de pagamento e cobrir o dinheiro durante seis meses ou até que o burburinho fosse abafado. Kostya desligou o telefone e jogou no porta-copos. —Você ainda usa seu telefone apenas para chamadas pessoais? —Sempre. Nikolai odiava usar seu iPhone e só o mantinha porque era necessário para seus negócios legítimos e vida pessoal. Havia alguns


descartáveis em sua casa para emergências noturnas e, mesmo assim, ele só enviava mensagens curtas. Me encontre. Preciso ver você. Temos um problema.

—Nenhum aplicativo? Nem mesmo os que Vivian usa com as amigas dela? Nikolai sacudiu a cabeça. —Não. —Nós precisaremos procurar no telefone dela. Nikolai praguejou em voz baixa. —Eu vou lidar com isso. —Vou reunir os capitães e tentar rastrear todas as interações que tivemos com Marco. —Não deve haver muitas. Nós não nos metemos nesse negócio. —Nikolai deu um tapinha no nariz para indicar a cocaína vendida pelo cartel. —A menos que um dos garotos mais novos esteja saindo da linha e tentando ganhar algum dinheiro rápido com um negócio paralelo. —Kostya avisou. —Podemos estar mais expostos do que imaginamos. —Se um dos nossos meninos mais novos estiver vendendo cocaína? —Nikolai apontou dois dedos em direção ao pescoço. Não foi uma ameaça vazia. Havia regras e havia consequências. Enquanto dirigia, Kostya se preocupava com a pequena e improvável chance de haver um caso RICO em andamento. Ainda havia muita violência do cartel ao sul da fronteira, e Lalo claramente tinha controle zero sobre seus homens e suas bocas.


—Mesmo se Diego estiver errado – e eu duvido disso porque ele é bem consistente – a polícia ainda pode usar essa merda com Tiffany – nocauteá-la e sequestrá-la – como trunfo para fazer Marco falar. Ele vai jogar se eles lhe derem a chance. Temos que encontrálo. —Eu dei a Diego um incentivo para encontrar Marco e trazêlo para você. —Quanto? —O suficiente. —Foi dito com um olhar significativo, que dizia que o incentivo era mais do que dinheiro. Pronto para ir trabalhar, ele perguntou: —Você quer que eu leve você de volta para Samovar? —Deixe-me na padaria do Benny. Vou pedir ao Danny para me pegar. Ainda precisamos ter nossa conversa. —O que diabos o garoto fez agora? —É essa coisa com os vizinhos. —Os vizinhos? Em seu apartamento? —Aquele caloteiro está enterrado em dívidas com Besian. —Merda. —Ele xingou. —Pensei que Artyom tinha dito a ele para ficar em seu canto, porra? —Ele disse. Disse a ele para não intervir, que o homem deve e precisa pagar. —Mas? —Mas há uma garota envolvida. —Pelo amor de Deus. —Ele xingou ainda mais rudemente.


—Parece que há sempre uma garota envolvida ultimamente. —Murmurou Nikolai. Um momento depois, acrescentou: —Ela é jovem. Não perdendo a ênfase, ele perguntou: —Quão jovem? —Dezessete? Dezoito talvez. Kostya decidiu que o quanto menos ele soubesse disso, melhor. Ainda assim, sentiu a necessidade de defender o sobrinho de Artyom. —Danny é apenas uns anos mais velho que ela. Ele é um bom garoto. Sempre foi um cara íntegro. As equipes o respeitam. Ele é leal. É esperto. Sempre seguiu ordens – até agora. —Isso é o que me preocupa. —Admitiu Nikolai. —Se a lealdade dele àquela garota o colocar no fogo cruzado de Besian, vamos ter problemas. Eu já esgotei o meu estoque de favores com Besian. O próximo será o preço total. Ele tentou não pensar em como a equipe de Besian iria foder Danila se colocassem as mãos nele. Artyom seria arrastado para isso por causa do sangue em comum e depois? Seria confuso, sangrento e caro. —Você tem certeza que quer que eu te deixe aqui? —Ele ligou a seta e esperou no cruzamento por uma chance de virar à esquerda. —Eu tenho tempo para levá-lo a outro lugar. —Eu preciso parar aqui. —A boca de Nikolai se inclinou com um sorrisinho culpado. —Eu comi todos aqueles biscoitinhos de casamento mexicanos que Vee ama. Ela vai me banir para o sofá se não tiver uma caixa nova para satisfazer seus desejos noturnos. Seu olhar seguiu para o dedo de Nikolai deslizando sobre sua aliança de casamento, o movimento que parecia tranquilizá-lo e acalmá-lo. Ele pensou em como ele conseguia facilmente separar as coisas em sua vida? Durante a maior parte da manhã, eles estavam


falando em se livrar de Marco e de outras partes confusas de seus negócios. E naquele momento estava falando sobre a compra de biscoitos para sua esposa grávida como um gesto doce. Para Kostya, era outro lembrete de todas as razões pelas quais ele não podia perseguir Holly. Ele tinha dado a ela um mês para pensar sobre as coisas. No dia anterior, ficou sentado à porta do salão por uma hora tentando se convencer a entrar e conversar com ela. Mesmo sendo corajoso como era, tinha medo de ouvir sua decisão. Era humilhante admitir isso mesmo que para si mesmo, mas era a verdade. Ele ainda não tinha certeza de qual resposta queria ouvir. De qualquer forma, isso ia complicar, ou até mesmo arruinar a vida dela. Quando entraram no estacionamento da padaria, Nikolai soltou o cinto de segurança. —Nos veremos no Samovar ou no armazém. —Vou procurar algumas pistas e informarei o mais rápido possível. Nikolai hesitou, com a mão na maçaneta da porta, mas sem se mexer. —Tenha cuidado, Kostya. Se Diego estiver certo sobre Marco, Lalo pode entrar em pânico e fazer algo estúpido para encobrir isso. —E se ele fizer? Nikolai fez um rápido gesto de cortar com o dedo. —Cuide disso. Eu limpo as consequências. Ele esperava que as coisas não fossem tão longe. A cidade não poderia ficar desestabilizada novamente, não com Mueller se mudando e tentando ganhar mais terreno. Nickel Jackson e seu negócio já pareciam ameaçados pelo crescimento da turma de Besian. Os soldados de ambos os lados lutavam diariamente por


cada rua e o direito de fazer seus negócios lá. Se Lalo caísse e não houvesse nenhum plano para ajudar rapidamente outro chefão, o caos irromperia quando os albaneses as equipes de Jackson tentassem entrar e ocupar o lugar. Mas se saísse a notícia de que Lalo tinha um espião em sua organização? As ruas queimariam. Determinado a impedir qualquer um desses resultados, ele esperou até que Nikolai estivesse seguro dentro da padaria para sair. Como se seguindo uma sugestão, Danila e Artyom chegaram, ambos deixando seus veículos para seguir o chefe para dentro, seguindo e protegendo-o. Os soldados de suas equipes ficaram do lado de fora, mantendo um olhar atento. Checando o espelho retrovisor, Kostya acompanhou os veículos na rua atrás dele enquanto se afastava da padaria. A ideia de que pudesse estar sob vigilância o incomodava, mas ele era melhor do que qualquer idiota da polícia de Houston. No mínimo, poderia ser divertido brincar de gato e rato. Ele entrou em um mercado decadente, abaixou-se e acenou para o dono idoso que lhe permitia usar o telefone. Ele mantinha os problemas longe da loja e pagava o imposto de proteção do idoso ao sindicato asiático. Certificando-se de que a porta do escritório estava fechada, pegou o telefone e ligou para o escritório de Fox. —Hen House Security. Fox falando. —Fox, mostre tudo o que você sabe sobre Marco Villarreal. Vá fundo. Prisões. Contas bancárias. Registros de celulares. Telefones fixos. Registros de veículos. Impostos sobre propriedade. Dívidas. Tudo isso. —Espere. —Ela disse, sua voz desaparecendo como se estivesse pegando alguma coisa. —OK. Marco Villarreal. —Ela murmurou. —O que mais, Papaizão?


Franzindo a testa para o apelido, ele listou rapidamente as outras informações que precisava. —Verifique a garota com quem ele fugiu e seus pais. —Acrescentou, querendo se certificar de que todas as suas bases estavam cobertas. —A garota pode tentar obter dinheiro das contas deles, se Marco ficar sem dinheiro. —Com que urgência você precisa disso? —Para ontem. —Ele disse antes de desligar e discar o número da empresa de aluguel de pneus onde Lobo trabalhava em meio período. Ele era o dono por trás da rede de franquias que o exagiota John Hagen havia iniciado anos antes como parte de seu legítimo plano de aposentadoria. Lobo trabalhava lá com uma identidade limpa que eles estavam usando para construir sua ―lenda‖. Era importante que ela tivesse uma história de vida sólida – um diploma de estudante em casa, um histórico de trabalho para o Seguro Social, pagamentos de imposto de renda em dia, registros médicos e de vacinas, um bom passaporte. Em algum momento, ela poderia querer sair do submundo e um registro limpo iria ajudá-la. —EZ Aluguel de pneus e calotas. Aqui é a Emily. Como posso ajudá-lo? —Lobo respondeu em um tom alegre. —Emily, estou procurando por um conjunto de pneus novos para o meu Chevy Tahoe 2014. —Usar seu nome falso pareceu estranho para ele mesmo depois de todos os anos em que o usavam em público. —Eu tenho rodas cromadas com raios dourados e detalhe roxo. Personalizado. —Ele acrescentou, descrevendo o veículo que Marco normalmente dirigia. —Você tem pneus para ele? —Você terá que trazer seu veículo para medição, senhor. Meu turno termina em meia hora, mas um dos meus outros colegas ficaria feliz em ajudá-lo. —Eu preciso do trabalho feito esta noite. É importante.


—Temos uma garantia de satisfação, senhor. Devo agendar um horário para você? —Sim. —Ele desligou, deixou cinco notas de cem dólares na mesa para o dono da loja e saiu sem fazer contato visual com o punhado de clientes. Quando Lobo terminasse seu turno na locadora de pneus, encontraria Sunny e juntas rastreariam Marco. Suas pequenas aranhas eram astutas e encontrariam Marco antes de qualquer um. Ele tinha certeza disso.


CAPÍTULO NOVE —Estamos perseguindo uma pista. —Informou Lobo mais tarde naquela noite. —Sunny está abanando o rabo como um cão de caça. Ele sorriu com a descrição de Lobo de sua parceira no crime. Uma vez que ela sentia o cheiro de um alvo, não voltava sem sua presa entre os dentes. —Atualize-me em uma hora. —Farei isso. Ele entrou no estacionamento do armazém de Ivan. Percebeu as pequenas mudanças que Erin estava fazendo no exterior da academia. O prédio ainda era degradado do lado de fora, mas havia uma nova placa com o logotipo que ela tinha encomendado. Markovic MMA também tinha um estacionamento recém pavimentado com vagas reais marcadas por linhas brancas. Foramse os dias em que Erin roubava as chaves dos carros dos armários para mover caminhonetes e carros estacionados em fila dupla, bloqueando saídas de incêndio ou impossibilitando a realização de entregas. No interior, a academia parecia a mesma de sempre, exceto pelos novos aparelhos e esteiras. Ivan permitiu que Erin fizesse o que julgasse necessário para promoção e marketing e para manter a contabilidade limpa, mas a academia em si era seu domínio. A julgar pela forma como o negócio deles estava se expandindo, o arranjo estava funcionando bem. Ivan nunca gostou de lidar com o lado financeiro e comercial das coisas; Erin era uma contadora e uma planejadora de festas por diversão. Ela gostava de planejar e calcular números e mandar nas pessoas.


Mas o mais importante, pelo menos para Kostya, Erin desenvolvera um instinto maternal cuidando de sua irmã viciada e seu grupo de amigos. Este armazém era o refúgio de Ivan, e ela tinha abraçado seu papel como a mãe do refúgio. Ela sabia quais lutadores estavam tendo problemas em casa e quais lutadores estavam com pouco dinheiro. Ao primeiro sinal de um mancar ou um estremecimento de dor, ela tinha gelo, ataduras e ibuprofeno e estava no telefone para agendar médicos e fisioterapeutas. Cruzando o caminho estreito entre as esteiras, ele viu Ivan e Nikolai em pé fora de uma gaiola. Eles estavam assistindo Kir trabalhando com um dos novos lutadores que Ivan esperava que fosse capaz de tomar o lugar de Sergei nas lutas clandestinas. Pelo jeito, esse garoto não ia funcionar também. Cada vez mais, Kostya se perguntava se os dias de competirem com poderosos lutadores e dominarem os torneios das lutas do circuito subterrâneo estavam acabados. Aproximando-se da gaiola, ele chamou a atenção de Nikolai. Com um leve aceno de cabeça, respondeu à pergunta silenciosa do patrão sobre Marco. A boca de Nikolai apertou-se em irritação, mas ele não disse nada. Ivan sorriu e deu a ele um aperto de mão. —Você está aqui para ver os novos lutadores? —Algum deles pode derrubar Nate Reyes? —Se ele estiver bêbado? Se estiver doente? Se tiver dois braços quebrados? Claro. Rindo, Kostya olhou para a gaiola e deu seu veredicto com uma carranca: —Ele não é você, e definitivamente não é Sergei.


—A única chance que temos de encontrar outro Sergei é puxar seu irmão para lutar por nós quando ele chegar aqui ou trazer sangue novo de outro lugar. —Bianca vai queimar este armazém antes de deixar Sergei ou seu irmão serem arrastados de volta para a luta clandestina. — Advertiu Kostya. Ele não estava exagerando. Aquela mulher se esforçou muito para salvar Sergei. Ela havia se casado recentemente com o homem que amava e a conversa na rua era de que estavam esperando gêmeos. Bianca os atacaria como uma mamãe urso se alguém tentasse destruir a família que estava construindo. —Então, precisamos iniciar um processo de recrutamento. —Ivan sugeriu, apenas meio brincando. —Brighton Beach. —Nikolai interveio, seu olhar nunca deixando a gaiola. —Estou recrutando alguns novos soldados. Kostya olhou para Nikolai com surpresa mal contida. Esta era a primeira vez que ele ouvia tal ideia. A ordem deve ter vindo de Moscou e muito recentemente. Tinha que haver algo a mais por trás da ordem, uma ameaça ou um suborno. Não havia outra razão para Nikolai concordar em trazer sangue novo. Ele gostava de escolher seus homens. Todos aqui no sindicato de Houston compartilhavam os laços de amizades de infância ou de prisão juntos ou relações de sangue. Trazer esses refugiados de Nova York era um risco. Eles provavelmente seriam peso morto, idiotas e fodidos. —Esse garoto está bem, mas precisa de muito trabalho. — Nikolai balançou a cabeça e voltou sua atenção para Ivan. —E quanto a Boychenko? Como ele está indo? —Ele está bem, mas não tem o poder ou tamanho para lutar no circuito subterrâneo. Se ele fosse legítimo? —Ivan encolheu os ombros. —O garoto poderia ser competitivo na classe de peso certa.


Era a maneira sutil de Ivan pedir permissão. Por alguma razão, o ex-lutador havia desenvolvido uma afeição aparentemente paternal por Boychenko. Ilya reclamou que Ivan estava tentando convencer Boychenko a deixar sua equipe. —Isso é com ele. —Respondeu Nikolai. —Ele pode fazer o que quiser com sua vida. Ele pode ficar conosco ou ir embora. Kostya compartilhou um olhar com Ivan que dizia tudo. Boychenko nunca tinha sido preso. Ele era limpo como a neve e tinha opções que homens que estavam na família há mais tempo perderam. Ainda nem tinha feito sua primeira tatuagem. Ele poderia sair e ganhar a vida fazendo qualquer outra coisa. Mas ele não faria isso. Ele tinha experimentado a vida ilícita, o mundo sombrio e a forte irmandade que os mantinham juntos. O telefone de Nikolai tocou e ele enfiou a mão no bolso do paletó para pegá-lo. Ele se afastou para atender, mas Kostya podia ouvir a maior parte, do lado do chefe, da conversa. Logo ficou claro que era Vivian no outro lado da linha. —Sim, ele está aqui comigo. Por quê? Há algum problema em casa? —Ele fez uma pausa. —Sua pulseira? Eu posso pegar para você. Enquanto ouvia o que ela tinha a dizer, ele lançou um olhar estranho para Kostya. —Entendo. Bem, eu não acho... —Ele beliscou a ponte do nariz e fechou os olhos. —Sim, sim, você estava certa sobre isso, mas... —Ele exalou uma respiração longa e lenta, como se estivesse tentando se lembrar que sua esposa estava grávida e propensa a mudanças de humor. —Bem. Sim. Eu vou fazer isso. Não, não, não vou me atrasar. Vou jantar com Ivan e Yuri e depois vou para casa. —Ele ficou quieto novamente. —Estou sempre e também amo você. Quando Nikolai voltou para a gaiola, Kostya perguntou: — Está tudo bem?


Ele assentiu rigidamente. —Nós precisamos conversar. Sem desviar o olhar dos lutadores da gaiola, Ivan apontou para o escritório recém-reformado nos fundos do armazém. —Você pode usar o meu escritório ou o da Erin se precisar de privacidade. Ele seguiu Nikolai até o escritório de Ivan e fechou a porta atrás dele. Nikolai recostou-se contra a mesa e o olhou fixamente. —Que diabos está acontecendo entre você e Holly? Surpreso, ele disse: —O que faço no meu tempo privado não te diz respeito. —Diz respeito a mim quando é com a minha irmã. —Nikolai sibilou, sua voz baixa e perigosa. —Você me disse que não havia nada além de amizade aí. Que ela era apenas uma vizinha... —Ela era quando tivemos essa conversa antes, mas... —Mas? —Nikolai se inclinou para frente, como se estivesse pronto para se lançar em direção a ele. —Mas as coisas mudaram. —Ele confessou, esperando ser esmurrado a qualquer momento. —Passei a noite com a Holly depois de toda aquela merda no salão. Na manhã seguinte, contei a ela sobre mim e isso. —Ele gesticulou entre eles. —Ela sabe que eu sou da máfia. Nikolai segurou a beirada da mesa, estreitando os olhos daquele jeito ameaçador que fazia outros homens se contorcerem. —Você está apaixonado por ela? Foi uma pergunta que o fez engolir nervosamente. —Não tenho certeza. —Não minta para mim. —Nikolai atirou de volta. —Posso ver na sua cara, e se eu posso ver, outras pessoas podem ver também. Você sabe o que isso significa.


—Significa que a coloquei na mesma posição que você colocou Vivian. —Ele respondeu com uma espetada na sua voz. — Você não pode ficar ai me dando um sermão sobre colocar Holly em perigo quando você fez o mesmo com Vivian. Nikolai não teve argumento para esse ponto. Mais do que ninguém, ele entendia o que significava arrastar uma mulher inocente para a vida que haviam escolhido anos antes, antes que pensamentos de amor e família passassem por suas cabeças. Eventualmente, Nikolai exalou ruidosamente e disse: —O velho vai perder a cabeça se descobrir que você está com Holly. —Maksim é a menor das nossas preocupações quando se trata de Holly. —Era um fato que ele se preocupava constantemente. Alguém lá fora sabia que ela era a filha biológica de Maksim e era capaz de usar essa informação para machucá-la. —Você destruiu os testes? —Eu mesmo os queimei. —Assim que os testes de Max confirmaram Nikolai e Holly como meio-irmãos com o mesmo pai, ele havia destruído a prova. —Ainda estou trabalhando para conseguir o DNA da mãe dela. Ela está viajando e, quando está na cidade, é muito cuidadosa. Muito cuidadosa mesmo. —Ele adicionou um olhar conhecedor. —Você ainda está convencido de que ela é como você? Como você. Não um mafioso, mas um espião. Um agente secreto. Provavelmente da antiga KGB. —Ela é muito limpa. Seu histórico é impecável. Ambos os pais? Mortos. Parto em casa? O médico que assinou sua certidão de nascimento? Morto. Seu diploma do ensino médio? Perdido em um incêndio escolar. Até ela aparecer na faculdade, não há vestígios dela. Nenhuma foto nos jornais. Nenhum anúncio de nascimento. Sem obituários para os pais dela. Não há pontas soltas para alguém puxar.


—Isso não significa que ela é uma espécie de agente, Kostya. Ela poderia ter sido apenas azarada. Você é paranoico pra caralho. —Por um bom motivo. —Ele disparou de volta. —Você não sabe as coisas que eu sei. Meus pais estavam envolvidos em merda pesada. A razão pela qual nasci em Dresden foi para ajudar meus pais a construir minha identidade para que eu pudesse trabalhar para governos estrangeiros sem as barreiras que minha nacionalidade russa teria causado. Havia dezenas de nós, Nikolai. E não apenas na Alemanha Oriental. Aqui, na América, na Inglaterra, na França e no Canadá. —E daí? Você acha que a mãe de Holly veio para cá como seus pais e trouxe Holly da Rússia para... o quê? Tornar-se uma cabeleireira de sucesso? Como isso é útil para o estado russo? É ridículo, Kostya. Essa coisa toda é ridícula. —E se a mãe de Holly veio para cá quando adolescente? E se ela estiver trabalhando aqui sem cobertura ou proteção? Ela tem o trabalho perfeito. Ela pode viajar para lugares no Oriente Médio, Rússia e China sem despertar muitas suspeitas. Ela está diretamente envolvida na política energética dos EUA, agora que está em um conselho consultivo para o presidente. Ela agiria como um canal entre seus contatos de petróleo e gás da Rússia e o Departamento de Estado aqui. Nikolai não queria ouvir isso. —Mesmo que o que você diz seja verdade, não precisamos nos envolver nisso. Você precisa ficar de fora disso. Você foi queimado, Kostya. Você não tem mais proteção nesse nível. Se a mãe de Holly é o que você diz que é, ela poderia machucá-lo e poderia nos machucar. —Ele acenou a mão no ar. —Esqueça isso, Kostya. Quem quer e, o que quer que ela seja, Maksim confiou nela para criar e proteger Holly. Eu não acho que ela seja um risco para nós se a deixarmos em paz.


Kostya não tinha tanta certeza. As pessoas em sua linha de negócios sempre tinham segundas intenções. —Você disse que contou a Holly sobre a máfia. O que exatamente você disse a ela? —Só confirmei o que ela perguntou. Ela queria saber se eu estava na máfia. Ela ouvira rumores sobre você e Ivan. Juntou dois mais dois. Eu disse a ela a verdade. Na maior parte. —E? —E eu disse que ela deveria tirar algum tempo para pensar sobre o que se envolver comigo significaria. —Ele respondeu com naturalidade. —Aparentemente, ela acabou de pensar. —Nikolai empurrou a mesa e atravessou o espaço entre eles. —Vivian convenientemente esqueceu sua pulseira no salão hoje. Ela quer que você vá buscar. Disse também que você precisa de um corte de cabelo. Kostya tocou as pontas dos cabelos no comprimento dos ombros. Estava ficando desalinhado, e ele estava pensando em uma mudança. Sabendo que Vivian havia usado um golpe semelhante com Sergei, furtando o telefone de Bianca e enviando Sergei para levá-lo de volta para sua amiga, ele avisou: —Sua esposa é desonesta. —Não sei se eu deveria estar orgulhoso ou com medo. — Admitiu Nikolai com um sorriso. Seu sorriso desapareceu e ele ficou sério. Dando um passo, Nikolai invadiu seu espaço pessoal. —Se eu descobrir que você desonrou a minha irmã, eu vou cortar a porra da sua garganta. De qualquer outra pessoa, teria sido uma ameaça bombástica e vazia. De Nikolai, era uma promessa. O chefe tinha amolecido um pouco depois de casar-se com Vivian, mas ainda era um homem


extraordinariamente perigoso. Ele não tinha um relacionamento com Holly, mas ela era da família. Ele era um homem que fazia qualquer coisa por sua família. Para fazê-los felizes, não havia limite para sua generosidade. Para mantê-los seguros, não havia limite para a violência que ele estava disposto a perpetrar. —Eu não quero machucá-la. —Você vai. —Disse Nikolai com tristeza. —Nós sempre machucamos aqueles que amamos. E ele sabia bem. Seu amor por Vivian a colocara em perigo, fez com que fosse sequestrada e quase traficada. Ele a machucou de outras formas também. Mas fizeram as pazes, e ela o perdoou. Holly seria tão generosa quando soubesse toda a verdade sobre ele? Provavelmente não, ele silenciosamente reconheceu quando Nikolai saiu do escritório. Holly não tinha o tipo de experiências de vida como a de Vivian. Ela cresceu privilegiada e protegida e não sabia nada sobre desgosto, tristeza e dor. Incomodado com seus pensamentos, Kostya dirigiu-se ao salão e estacionou nos fundos. Estava fechado havia uma hora e tinha apenas um veículo – o dela – nas vagas demarcadas do salão. Ele saiu do carro, trancou as portas e retirou seu celular pessoal do bolso. Era o telefone que usava apenas para contatos comerciais legítimos e amigos. Ligou para o número de Holly enquanto atravessava o estacionamento e esperou que ela atendesse. —Alô? —Ela respondeu sem fôlego. —Kostya? O som de sua voz ofegante fez coisas loucas com ele. Ele tentou afastar as imagens que o som inspirou em sua cabeça quando perguntou: —Holly, você está bem?


—Desculpe, tive que correr do estoque para o meu escritório para pegar meu telefone. Eu reconheci seu toque e não queria perder sua ligação. Ele não pôde ignorar a batida pesada de seu coração quando ela mencionou um toque especial. Era uma coisa simples e boba e ele não queria ler tão longe, mas não conseguiu se conter. —Estou na porta dos fundos. Você pode me deixar entrar? —Você está aqui? —Ela parecia animada. —Certo. Te vejo daqui a pouco. —Ela desligou e, alguns instantes depois, abriu a porta dos fundos. Ela o cumprimentou com um sorriso lindo, mas tímido. —Oi. —Oi. —Ele repetiu, de repente, sem palavras. Ainda tímida, ela perguntou: —Você está aqui para buscar o bracelete de Vivian? —Ela me pediu para vir buscá-lo. —Lembrando-se da outra instrução de Vivian, estendeu a mão e tocou as pontas do cabelo. — Eu sei que você já fechou e está tarde, mas você tem tempo para cortar meu cabelo? Holly pareceu surpresa com o pedido dele. —Você quer que eu corte o seu cabelo? —Eu posso voltar de manhã, se for melhor. —Ele ofereceu, o tempo todo esperando que ela lhe dissesse para ficar. —Eu tenho tempo para você agora. —Disse ela, dando um passo para o lado. Ele entrou no salão e esperou que ela trancasse a porta antes de segui-la para fora das áreas dos funcionários, da parte dos fundos do salão para o andar de corte. Ela o levou até a bancada e fez sinal para ele sentar-se. —O bracelete de Vivian está trancado no cofre do meu escritório. Lembre-me de pegar quando terminarmos.


—Eu vou. —Vamos ver com o que temos que trabalhar... —Ela começou a examinar o cabelo dele, usando os dedos para separar os fios. Ele experimentou uma emoção perversa de prazer que se estabeleceu em sua virilha enquanto Holly passava os dedos pelos seus cabelos. Ela inclinou a cabeça para o lado enquanto o estudava no espelho e arrastou os dedos pelos fios escuros que terminavam em seus ombros. —Você tem um cabelo muito bonito. —Ela puxou levemente as pontas, e um arrepio de prazer atravessou seu couro cabeludo. —As pontas definitivamente precisam de um corte. Quão curto você quer deixá-lo? Tem algum estilo em mente? —Eu sou um cara simples, Holly. Eu quero tomar banho e sair. —Eu gosto dele um pouco longo e bagunçado. —Ela admitiu, seus dedos ainda o deixando louco enquanto penteava seu cabelo. —Vamos limpar e dar alguma forma. Eu não vou cortar muito. Ele segurou o olhar dela no espelho. —Eu confio em você. A mão dela caiu do cabelo para o ombro dele e deu um aperto. —Vamos para a bancada de lavagem. Em pouco tempo, ele estava de costas, a cabeça descansando confortavelmente no apoio de um lavatório e uma capa em volta de sua parte superior do corpo. Ela molhou o cabelo dele com água morna. O cheiro de hortelã-pimenta do shampoo e a sensação incrível de seus dedos massageando o couro cabeludo o ajudaram a relaxar. Mesmo nessa posição vulnerável e até com as mãos tão próximas de seu pescoço e dos olhos, os lugares em que ele tinha


sido treinado desde a infância para proteger de um ataque, ele não sentiu ansiedade ou medo. Nenhuma mulher jamais o tocou assim. Ele simplesmente não tinha permitido. Suas interações eram quase transações. Bebidas. Foda. Um rápido adeus. Ele não gostava de beijar ou de longas preliminares. Ele só queria sair e ir embora. Sem compromissos. Sem sentimentos. Ele entendeu agora o que tinha perdido quando as mãos suaves e gentis de Holly enviaram ondas de calor e necessidade através dele. Quando ela começou a massagear a nuca, ele sentiu que parte da tensão que sempre o atormentava começou a desaparecer. —Você precisa marcar uma massagem. Seu pescoço está tão duro. —Ela murmurou com preocupação. —Esse tipo de estresse não é saudável. Ele reprimiu uma risada. Se ela soubesse... —Vou pensar sobre isso. —Se você não quiser deixar um dos nossos terapeutas fazer isso, eu posso. —Ela ofereceu quando começou a enxaguar o cabelo dele. —Eu não sou uma massagista treinada, obviamente, mas sei o básico. O pensamento de Holly correndo as mãos ao longo de seu corpo nu fez seu pau pulsar. Só de ter os dedos dela penteando seu cabelo e massageando o couro cabeludo foi o suficiente para fazer o coração acelerar. Se ela tocasse em todo o seu corpo, ele seria reduzido a uma poça de homem derretido e sem valor. —Você realmente precisa adicionar um bom condicionador à sua rotina de tratamento capilar. —Ela suavemente advertiu. —Que tipo de produtos você está usando? —O que for mais barato na Target.


Ela rangeu os dentes enquanto trabalhava com o condicionador em seu cabelo. —Bem, não mais. Vou mandar você levar alguns produtos escolhidos a dedo. Ele queria argumentar que não os usaria e não tinha tempo para tantos passos, mas isso seria uma mentira. Ele os usaria porque isso a faria feliz. —Tudo bem. Holly enxaguou o condicionador do cabelo e depois espremeu o excesso de água antes de pegar uma toalha. Ela posicionou-se na frente do lavatório, seu quadril contra o ombro dele e secou o cabelo com cuidado. Seus olhares se encontraram enquanto ela trabalhava, e ele engoliu em seco, seu corpo reagindo da maneira esperada em sua proximidade. Uma de suas mãos moveu-se do cabelo dele para a testa e depois seguiu devagar ao longo da curva de sua bochecha e mandíbula. A pulseira que ele lhe dera brilhava sob a luz vinda de cima. Ela a usava todos os dias, o ato de um compromisso silencioso, mas constante. Ele tinha sido um tolo por duvidar de sua afeição por ele. Ela vinha tentando dizer todos os dias desde que ele tinha dado a ela aquele presente de Natal. Ele tinha sido muito cego para ver isso. — Holly... —Eu tomei minha decisão. —Ela tocou seus lábios, acalmando-o por um momento. —Eu quero você. Ele cuidadosamente afastou a mão dela de sua boca. —Eu vou te machucar, Holly. Não fisicamente. —Esclareceu. —Mas vou partir seu coração algum dia. —Provavelmente. —Ela disse um pouco triste. —Mas sei o que estou arriscando.


Ele era um bastardo egoísta, mas não conseguia mais se conter. Era uma ideia terrível, e tudo acabaria em lágrimas, mas ele não se importava. Acabou negando a si mesmo esses breves momentos de felicidade. Holly era uma mulher adulta e decidira com os olhos bem abertos. Se ela o queria, ele a deixaria tê-lo. Deslizando a mão para a nuca dela, ele puxou-a para baixo para um beijo. Foi um momento explosivo em que seus lábios finalmente se encontraram. Uma explosão de antecipação e necessidade que o abalou. Com uma mão no quadril e a outra na nuca dela, ele endireitou-se ficando sentado e investiu sua língua contra a dela, desesperado para saboreá-la. Ela agarrou a capa e a arrancou antes de jogá-la de lado. Para manter o equilíbrio, Holly colocou as mãos nos ombros dele enquanto suas línguas se enredavam, mas quando o beijo ficou mais apaixonado e quase desesperado, ela usou sua mão para se alavancar. Jogando uma perna sobre a dele, empurrou-se para a cadeira reclinável do lavatório e subiu em cima dele. A cadeira era apertada, e ela balançou os quadris até que montou sua perna esquerda. —Porra, Holly. —Ele gemeu contra sua boca ao sentir seu corpo quente pressionado contra o jeans na sua coxa. Suas mãos gananciosas deslizaram sob o tecido fino da camisa dele e deslizaram sobre sua barriga e em direção ao peito. Ele ficou surpreso com a rapidez com que ela tinha assumido o papel de comando, assumindo o controle e deleitando-se com isso. Toda a sua vida, era ele quem comandava. Era uma experiência nova estar do outro lado dessa equação. Tudo o que podia fazer agora era se inclinar para trás e deixá-la fazer o que quisesse com ele. —Toque-me. —Ela implorou, seus lábios ainda persistindo sobre os dele. —Eu preciso de suas mãos em mim.


—Holly. —Ele sussurrou entre beijos. —Se eu começar a tocar em você, não poderei parar. Ela mordiscou seu lábio inferior, aquela pontada aguda de dor indo direto para o seu pau. —Então, não pare. Queimando com a luxúria, ele balançou seu pau duro contra o corpo dela, ansiando por estímulo para aliviar o latejar, e deslizou as mãos sob a saia. Os dedos dele tremiam com a dose de adrenalina que saturava sua corrente sanguínea. Ele empurrou o tecido elástico de sua saia lápis para cima das coxas até que estava em volta da cintura. Descobriu uma minúscula tanga preta e teve que engolir um gemido. Segurando seu traseiro nu, ele a moveu em direção a si e encontrou seus beijos vorazes com igual fervor. Uma pequena voz no fundo de sua mente disse-lhe para pisar nos freios e retardar isso. Ela merecia algo melhor e mais elegante do que uma foda rápida e selvagem em uma cadeira. —Holly, deveríamos parar. —Por quê? —Ela já estava puxando o cinto dele. —Eu não quero parar. Você quer? Rapidamente perdendo o controle, ele admitiu: —Não, eu não. Ela desabotoou e abaixou a braguilha do jeans dele. Sua pequena mão roçou a ponta dura de sua ereção, e ele viu fodidas estrelas. —Não me faça esperar mais. —Essa cadeira é pequena demais para nós desse jeito. — Afirmou o óbvio. —Você vai se machucar tentando me montar assim. Ela sorriu. —Então vou montar você amanhã à noite.


Assombrado com essa mulher sexy e confiante que se agitava sobre ele, Kostya deixou que os instintos animais o dominassem. Ele a ajudou a escorregar do colo e se levantou. Sem aviso, a agarrou pela cintura e a colocou na cadeira para que ela estivesse na posição perfeita de quatro. Olhando por cima do ombro para ele, ela balançou sua bunda de forma sedutora, e ele deu uma boa bofetada em cada nádega antes de puxar o pedaço de roupa íntima que guardava o lugar que ele mais queria ver e saborear. Sua pele pálida estava corada de excitação e desejo, e os tapas que ele havia dado deixaram marcas cor-de-rosa em seu traseiro. Querendo chocá-la, ele se inclinou e passou a língua na fenda molhada. Holly respirou fundo e gritou de surpresa antes de tentar se afastar dele. Ele agarrou suas coxas e segurou-a no lugar, provocando seu clitóris com a ponta da língua por alguns bons momentos antes de roçar os dentes ao longo da curva de sua bunda pequena e linda. Ele empurrou para baixo sua calça jeans e libertou seu pau. Correndo a mão para cima e para baixo no comprimento rígido, usou os dedos da outra mão para traçar a abertura da boceta de Holly. Ela estava encharcada, quente, escorregadia e pronta para ele. Guiou a cabeça arroxeada do seu pau para o lugar e pressionou-a em um impulso lento e calmo. Holly soltou um som que era uma mistura de risada e gemido antes de empurrar de volta contra ele, incitando-o a deslizar profundamente até o fim. Tomando um punhado de seu cabelo, ele a levantou de joelhos, forçando-a contra o seu peito, e beijou ruidosamente seu pescoço. Ele estava esperando por isso, por este momento, estava fantasiando sobre isso há meses, e agora não tinha certeza de quanto tempo duraria. Não tinha estado com uma mulher em quase um ano, e estava a ponto de explodir.


Querendo que isso fosse bom para ela, ele deslizou um braço ao redor de sua cintura, descansando seu antebraço entre os seios e segurando levemente seu pescoço. Sua outra mão serpenteou até o local onde seus corpos estavam unidos. Enquadrou seu clitóris entre dois dedos e começou a massageá-lo. Holly estremeceu ao seu toque e se esticou para agarrar seu quadril, suas unhas bem cuidadas arranhando e marcando sua pele. Ele bombeou em sua boceta, seus impulsos rasos e rápidos, enquanto ouvia sua respiração e prestava atenção ao aperto de seus músculos escorregadios em torno de seu pau. Ela estava perto. Ele beliscou-a no lóbulo da orelha e beijou seu pescoço novamente e continuou fodendo, mais rápido e mais profundo, enquanto esfregava seu clitóris do jeito que ela parecia gostar. —Konstantin! —Ela gritou seu nome, sua voz ecoando por todo o salão vazio enquanto gozava. Seu tênue controle estalou ao som de seu nome e a sensação de sua boceta apertando-o em rajadas rítmicas. Suas mãos se moveram para seus quadris, agarrando com força enquanto ela caía para frente sobre suas mãos e joelhos. Ele a fodeu duro e rápido, perseguindo seu próprio orgasmo e deleitandose com o jeito que ela empurrava de volta para encontrar cada impulso. —Kostya! Kostya! Aquela sensação familiar começou baixo em sua barriga e se espalhou ao longo de sua coluna e por suas pernas. Ele começou a puxar para fora, mas Holly o chocou empurrando para trás até que sua bunda perfeita estava plena contra sua pélvis. Com seu pau embainhado em seu calor úmido, ela implorou: —Goze dentro de mim. Eu quero sentir isso. —Holly. —Ele rosnou, sua voz áspera e baixa. Ela o controlava naquele momento, ordenando que ele lhe desse o que ela queria e não permitindo que recusasse sua demanda. Ela se balançou


contra ele, recebendo cada gota e, em seguida, baixou a testa na cadeira. Tremendo e estremecendo, ela ofegava tão forte quanto ele. Tentando recuperar o fôlego e sentindo-se tonto, Kostya inclinou-se para a frente e levantou a blusa dela. Ele beijou uma linha sinuosa ao longo de sua espinha antes de terminar na curva de seu pescoço. Levantando-se, pegou a toalha úmida que estava pendurada precariamente ao longo da beira do lavatório. Ele colocou-a de pé antes de puxar a calcinha de volta no lugar e descer a barra de sua saia. Virando-a, segurou o rosto dela com ambas as mãos e a beijou. Seus beijos deslizaram de sua bochecha até o pescoço e de volta à boca dela. Ele não podia ignorar a culpa que sentiu quando pensou na forma como acabara de violar a irmã de seu melhor amigo em uma cadeira de salão. —Eu não me arrependo. —Disse ela, como se lesse sua mente. —Eu não preciso de romance, velas e música para a primeira vez juntos. Isso foi perfeito. —Foi selvagem e erótico, e eu deveria tratá-la com mais respeito. Ela revirou os olhos. —Às vezes uma garota quer selvagem e erótico, Kostya. —Levantando-se na ponta dos pés, o beijou novamente. Sorrindo maliciosamente, ela disse: —Amanhã você pode me tratar com respeito a noite toda, ok? —Holly. —Ele riu baixinho e balançou a cabeça para a brincadeira dela. Afastando o cabelo para atrás da orelha, tentou descobrir como essa mulher incrível ainda era solteira. Ele não conseguia entender. Ela era inteligente, sexy, talentosa e engraçada, gentil e paciente. Não havia um homem em Houston que não quisesse aproveitar a chance de ser seu homem.


Ela estava esperando por mim. Foi uma conclusão pesada, e uma que o fez reconsiderar tantas coisas que havia aceitado como inevitáveis. E se ele não partisse o coração dela? E se ele lhe contasse a verdade sobre si – sobre tudo -, mas em pequenas porções facilmente digeridas? Ela já tinha aceitado que ele fazia parte de um submundo sombrio. Ela aceitaria o que ele fez? Ela ainda poderia cuidar dele se soubesse que ele era um limpador? O que ela acharia de suas pequenas aranhas e de Lobo, em particular? Ela poderia aprender a aceitar seu passado? Entender sua antiga vida como agente secreto? Entenderia a necessidade de sigilo e aceitaria a possibilidade de que todas as coisas terríveis e sombrias que ele fez em seu passado pudessem voltar para machucá-lo? Ferilos? —Você está bem? —Ela perguntou baixinho. Parecendo insegura, perguntou: —Você está duvidando disso? De nós? —Nunca. —Ele respondeu com sinceridade e firmeza. —A única coisa que me arrependo é nos fazer esperar tanto tempo por isso. —Ele traçou seu lábio inferior com o polegar. —Isso parece certo. É bom. —Eu sei que vai ser complicado, mas quero tentar, Kostya. Eu quero ver se podemos fazer isso funcionar. —E se não pudermos? —Ele perguntou, mais preocupado com ele do que com ela. Holly nunca teria problemas em encontrar um homem melhor, alguém que pudesse oferecer-lhe o mundo, mas ela era sua única chance de ser feliz. Agora que ele finalmente tinha essa chance em suas mãos, experimentou uma necessidade possessiva e esmagadora de segurar firme e nunca soltar. Ele queria mantê-la em sua vida para sempre, não importando o custo.


—Então você terá que vender sua casa e se mudar. —Ela brincou. —Porque, obviamente, Savannah e Nisha farão de sua vida um inferno se você partir meu coração. —Ela riu. —Elas vão te expulsar da cidade se você me fizer chorar. —Eu mereceria isso. —Ele a beijou novamente, tomando seu tempo e aproveitando o doce calor de sua boca. Por favor, deixeme descobrir como fazer isso funcionar. —Você nunca vai cortar o cabelo se continuarmos assim. — Ela brincou enquanto tocava as pontas ainda molhadas de seu cabelo. De volta a seu posto, ela borrifou a cabeça com uma mistura em uma garrafa cromada e pegou um pente de uma de suas muitas gavetas. —Você está com a cabeça dolorida? —Eu estou o quê? —O seu couro cabeludo está delicado? Dói quando você está penteando? —Oh. Não. Não dói. Mesmo que ele negasse qualquer dor, ela penteou suavemente, segurando os fios de cabelo em sua mão antes de puxar os dentes através dos emaranhados que se formaram durante a sua aventura selvagem naquela cadeira de salão. Quando terminou, ela colocou de lado o pente e passou os dedos pelo cabelo dele e inclinou a cabeça para a esquerda e para a direita. Depois que decidiu um plano de ataque, abriu outra gaveta e removeu uma navalha com uma lâmina ameaçadoramente afiada. Ele cautelosamente olhou o instrumento fatal. —Holly...? Ela tocou o ombro dele. —Confie em mim. Vai ficar melhor assim.


Ele confiava nela, mas ainda estava nervoso por ter uma navalha reluzente tão perto de seu rosto. Ela trabalhou rapidamente com sua habilidade, virando e cortando. Cortar cabelo era mais um tipo de arte do que ele tinha reconhecido. Ele sempre tinha pensado que essa era uma habilidade técnica simples que qualquer um poderia dominar, mas enquanto observava Holly trabalhar, podia ver que era um esforço criativo. —Aí. Vê? —Ela colocou de lado a navalha e arrastou os dedos pelo cabelo ainda úmido. —Veja como isso parece natural. Ele balançou a cabeça, embora não pudesse realmente dizer a diferença em usar tesouras ou uma navalha. Ela estava satisfeita e isso era tudo o que realmente importava. Ela se afastou para uma parede de produtos e voltou com um tubo e um frasco. Borrifou o cabelo dele e depois aplicou algum tipo de creme. —Eu tirei um pouco do peso com a navalha. —Eu posso ver. —Essa foi a primeira coisa que ele notou sobre o corte de cabelo. A forma e comprimento eram bons, mas era bom ter tirado um peso extra do pescoço. Ela se levantou na ponta dos pés para pegar o secador pendurado e fez um rápido trabalho de secar o cabelo dele. Quando terminou, sacudiu seu cabelo mais curto e sorriu para ele no espelho. —Bom? —Eu gosto disso. —Só gosta? —Ela fez beicinho dramaticamente. —Eu amo isso. —Ele emendou. —Essa é uma resposta melhor. —Ela soltou a capa e tirou-a dos ombros dele. —Terminamos.


Eles não terminaram. Eles não estavam nem perto de terminarem. Quando ele se levantou e se virou para ficar na frente dela, ela colocou as mãos no peito dele. Enquanto olhava para ele, não queria nada mais do que levá-la para casa e passar a noite fazendo coisas perversas e safadas com ela. Suas pupilas dilatadas e respiração mais profunda lhe disseram que ela queria a mesma coisa. Deslizando a mão ao longo da curva de sua cintura, a puxou para perto e capturou sua boca. Quando as coisas começaram a ficar interessantes, o bolso de seu jeans começou a vibrar. Ele silenciosamente amaldiçoou o celular escondido lá. A ligação terminou antes que ele parasse de beijar Holly. Cinco segundos depois, a vibração começou novamente. Depois de dois toques, parou. Cinco segundos depois, o padrão recomeçou novamente. —Isso soa importante. —Holly murmurou contra seus lábios. —Talvez você deva atender. —Eu não preciso atender. Já sei o que ela quer. Ele tentou beijá-la novamente, mas ela se inclinou para trás e olhou para ele com confusão. —Ela? Ele poderia estar imaginando coisas, mas pensou ter detectado um toque de ciúme em sua voz. —Não é assim, Holly. — Assegurou ele. —Ela é uma das minhas pequenas aranhas. —Suas pequenas o quê? —Minhas aranhas. —Repetiu ele. —Elas rastejam por Houston e juntam informações ou fazem pequenos trabalhos para mim.


—Tipo? —Como rastrear pessoas. —Ele disse. —Como um localizador? Surpresa que ela conhecesse essa palavra, ele perguntou: —O que você sabe sobre localizador? —Eu namorei um agente de recuperação de fiança quando estava na faculdade. Ele me ensinou sobre todos os tipos de coisas interessantes. —Você namorou um caçador de recompensas? —Ele era gostoso, interessante e um pouco perigoso. —Ela traçou a gola da camisa dele. —Acho que sempre tive uma queda por homens como você. —Não há muitos homens como eu, Holly. —Ele avisou com cuidado. —Se você acha que um caçador de recompensas é perigoso... —Eu sei que é um tipo diferente de perigo com você. —Ela interrompeu. —Eu sei. Ela tinha os olhos mais honestos e abertos. Ela não tinha sido ensinada a esconder seus sentimentos ou emoções. Ele podia ver isso escrito claramente em seu rosto. Ela entendia o que ele era, mesmo que não tivesse todos os detalhes sangrentos. —Preciso atender essa chamada. —Ele odiava fazer isso, mas tinha que perguntar. —Posso usar o seu telefone? —Você não pode usar o seu? Ele deslizou a ponta dos dedos por sua bochecha antes de enfiar uma de suas mechas claras atrás da orelha. —É melhor se eu não fizer.


—Oh. —Ela disse baixinho. Dando um leve passo para trás, deu um tapinha no peito dele. —Eu preciso pegar o bracelete de Vivian do cofre de qualquer maneira. Você pode usar o telefone lá. Ele a seguiu de volta para o escritório e pegou o telefone enquanto ela abria o cofre escondido ali. Ele ligou para o correio de voz de Sunny e esperou para digitar a opção. Quando chegou à caixa de correio de voz, ele digitou a senha e escutou a mensagem codificada que Sunny tinha deixado para ele. Memorizou as coordenadas de GPS antes de apagar a mensagem e desligar o telefone. Sunny ligaria para o mesmo número em alguns momentos, verificaria a caixa de correio de voz e a acharia vazia. Esse seria o sinal de que a mensagem foi recebida. —Aqui. —Holly apresentou uma das delicadas pulseiras de ouro de Vivian na palma da mão. —Ela deixou isso depois de seu atendimento. —De propósito. —Disse ele, pegando e guardando-a no bolso. —Ela já fez isso antes com Bianca e Sergei. —Explicou ele. —Ela roubou o telefone de Bianca em um casamento e depois mandou Sergei devolvê-lo para Bianca. Você sabe como essa história termina. —Ela é tão sorrateira! —Holly riu. —Mas acho que devo a ela agora. —Ela não opera dessa maneira. —Ele estava certo de que não era a hora de educá-la sobre a linguagem dos favores e dívidas que governavam a máfia. Algum dia, quando soubesse que Nikolai era seu irmão e Maksim era seu pai, ela aprenderia essa lição. Não esta noite, ele pensou tristemente. Não esta noite. —Quando vou te ver de novo? —Incerteza enchia sua voz.


Ele queria prometer-lhe esta noite e amanhã de manhã e todos os outros dias que se seguiriam. —Estou no meio de algo importante. Vou tentar te ver amanhã à noite. Ela segurou a mão dele e esfregou o polegar no dele. — Negócios? —Do tipo que não podemos falar. —Lembrou a ela. —Compreendo. Ela compreendia agora, mas em poucas semanas ou meses, sua paciência com seus segredos diminuiria e então o quê? Inclinando-se, ele a beijou, deixando seus lábios se demorarem contra os dela. Não queria sair, mas não queria perder Marco se Sunny tivesse pegado sua pista. Deslizando os braços ao redor de sua cintura, ele abraçou-a com força e beijou a lateral de seu pescoço. —Desculpe-me ter que correr assim. Eu gostaria... —Está tudo bem. —Ela beijou sua mandíbula. —Você sabe onde me encontrar. Não pela primeira vez, ele se odiava pelas decisões que tomara em seu passado. Holly não deveria ter que esperar ele ter tempo para ela. Ela deveria ser o centro da porra do seu universo, mas ao invés disso ele estava correndo para capturar, interrogar e possivelmente desaparecer com alguém. Aborrecido com a maneira como a estava deixando após essa incrível mudança em seu relacionamento, Kostya deu um último beijo em sua têmpora. Ele não olhou para trás quando praticamente fugiu do salão. Não tinha certeza se tinha a força de vontade para continuar andando se visse seu rosto triste.


CAPÍTULO DEZ Na noite fria e úmida de outubro, ele destrancou o carro e deslizou para atrás do volante. Não precisava digitar as coordenadas do GPS na tela de navegação. A mensagem codificada de Sunny direcionou-o para um armazém que ele possuía do outro lado da cidade. Manteve este segredo de todos, exceto de suas pequenas aranhas, e se assegurou de que houvesse cerca de uma dúzia de camadas de proteção entre seu nome e o proprietário da instalação. Estava localizado em uma área subdesenvolvida, por isso a privacidade não era um problema. Não havia gerente ou segurança à noite, e Fox tinha a capacidade de apagar remotamente as imagens das câmeras de segurança, se necessário. Quando chegou à propriedade, colocou seu par favorito de luvas de couro preto e digitou o código de acesso no portão. Ele dirigiu para a última fileira de unidades de armazenamento e parou ao lado da elegante Ducati preta de Sunny. Saiu do carro, trancou-o e foi até a porta da unidade. Bateu duas vezes antes de entrar no espaço iluminado e com ar condicionado. —Você está atrasado. —Anunciou Sunny, já se levantando da velha cadeira dobrável e atravessando o local para encontrá-lo. — Temos lugares onde precisamos ir. Ele ergueu uma sobrancelha para ela, mas deixou isso passar quando ela empurrou um endereço rabiscado em um pedaço de papel contra o peito dele. Ele pegou o papel e olhou para o endereço. Não ficou muito animado com a ideia de dirigir até tão longe naquela noite. —College Station? Tem certeza de que ele está lá?


—É a melhor pista que você vai conseguir. —Ela respondeu com naturalidade. —Nós perseguimos todas as pontas soltas aqui na cidade. Era tudo besteira. Entre Diego, Ilya e Lalo, aqueles esconderijos e pontos de encontro foram todos visitados e revistados. Ele não está em Houston. —O que faz você pensar que ele está em College Station? —Você sabe aquele buraco que Lalo e Marco chamam de clube? —Certo. —Há uma pequena mercearia a cerca de um quarteirão de distância daqui, onde Marco gosta de ir buscar seus cigarros todas as tardes. Eu decidi ir lá e ver se eles falariam comigo. A velhinha que gerencia não gosta dele. Chama-o de pendejo. Idiota. —Acrescentou com um sorriso. —Ela me disse que ele vem uma vez por mês e envia dinheiro via Western Union para uma garota em College Station. Ela me disse o nome da mulher e eu pesquisei. —E? —E há oito anos, ele pagou uma fiança para uma mulher que foi apanhada com cheques roubados. Ela estava grávida quando foi pega e teve um garotinho sete meses depois. —Ela fez uma pausa, como se para deixá-lo fazer as contas. —O garoto tem o nome de outro homem, mas Marco envia pelo menos dois mil dólares por mês. Ele também tinha um veículo registrado neste endereço em College Station até duas semanas atrás. —O que aconteceu há duas semanas? —O carro foi registrado sob o nome dela em Phoenix. —Arizona? —Ele perguntou, curioso. —Por quê?


Ela encolheu os ombros. —Não faço ideia. O lugar onde ela morava era alugado. Liguei para o proprietário e descobri que ela ainda tem sete meses no contrato e o aluguel está totalmente pago. Adivinha o nome do seu fiador? —Marco. —Sim. Esse endereço é o mesmo que ele usa para um cartão de crédito com uma grande quantia de crédito não utilizada e cinco telefones diferentes. —Alguém mais sabe sobre essa conexão? —Eu não sei. Provavelmente não. —Ela fechou a frente de sua jaqueta. —Então, vamos no seu carro ou na minha moto? —Nós vamos pegar um dos meus carros de disfarce. Sunny sentou-se no banco do passageiro e afivelou o cinto. Ela começou a falar de todo o trabalho de inteligência que havia feito, contando sobre as rotas de entrada e saída do parque de trailers10 e dando uma estimativa do tempo de resposta da polícia para uma ligação para o 911. —Eu duvido que alguém ligue. —Ela comentou. —Você sabe como esses parques de trailers são. Ninguém quer ser intrometido ou começar o drama chamando a polícia. —Normalmente. —Ele concordou. —Eu procurei alguns lugares que podemos usar para interrogatório, se você não quiser arrastar Marco de volta para Houston. —Eu tenho um lugar nos arredores de College Station. É sossegado e isolado. 10

Nos EUA existem vários parques para trailers, que são divididos em pequenos terrenos e são alugados para "estacionar" casas móveis ou trailers. É normal ter casas móveis, que se pode levar de um parque a outro.


Ela se virou em seu assento e olhou-o com interesse. — Quantas propriedades você possui? —Eu pessoalmente? Apenas minha casa e alguns dos clubes. Ele praticamente podia senti-la revirando os olhos antes de perguntar: —Quantas propriedades as outras pessoas possuem para você? —Trinta e sete. —Como você mantém o controle de tudo? —Com muito cuidado. —Disse ele, entrando em uma loja de conveniências com um telefone público do lado de fora. —Você pode entrar e pegar um café? —Certo. Enquanto Sunny fazia compras, ligou para Nikolai para avisálo que estava saindo da cidade e depois ligou para Artyom. Ele falou três palavras ao capitão, seu código secreto a ser usado sempre que Kostya estivesse saindo da cidade, antes de desligar e voltar para o carro parado, onde Sunny o esperava com dois copos de café preto. Ele dirigiu para o estacionamento onde mantinha um carro extra registrado em nome de uma dançarina exótica que trabalhava para ele. Mantinha veículos como esses guardados em garagens, armazéns e estacionamentos de complexos de apartamentos por toda a cidade. Ele os colocou estrategicamente, certificando-se de que estavam perto das principais rodovias. Cada um tinha uma mochila cheia de equipamentos necessários e dinheiro no portamalas. Depois de tirar a mochila do porta-malas, ele verificou o conteúdo. Era uma redundância, considerando que ele mesmo havia arrumado a mochila, mas sempre tinha que ter certeza, só por precaução.


—Você quer que eu dirija? —Eu vi o jeito que você dirige. —Ele apontou para o banco do passageiro antes de fechar o porta-malas. Depois que terminou de trocar os veículos, eles saíram da cidade, evitando estradas de pedágio e semáforos com câmeras. Sunny não parecia particularmente interessada em conversar. Ela olhava para fora da janela, sua mente obviamente ocupada com algo que não estava confortável em compartilhar com ele ainda. Ele deixou seus pensamentos vagarem enquanto dirigia no limite de velocidade, verificando seus espelhos com frequência. Uma sensação sombria de pavor o atormentava. Ele não tinha conseguido afastar aquela sensação estranha e incômoda desde que tinha recebido o pacote. Sua insônia estava de volta e ele tinha passado horas à noite verificando velhos cadernos codificados. Estava examinando sua antiga vida, sua mente percorrendo o número aparentemente interminável de corpos e mentiras que havia deixado para trás enquanto tentava encontrar a conexão que faltava. Ele estava preso em uma teia emaranhada, da qual não conseguia escapar. Mais cedo ou mais tarde, tudo o alcançaria. Toda aquela limpeza e trabalho sujo colocavam em risco as pessoas com quem ele se importava. Há muito tempo, ele aceitou que iria morrer de uma morte violenta, mas nunca quis isso para pessoas próximas a ele. Seu estômago revirou dolorosamente ao pensar em Holly sendo ferida por causa de coisas que ele tinha feito vinte anos atrás. Claro, quando ele tomou a decisão de seguir os passos de seus pais mortos e se tornar um agente secreto, não tinha nenhum amigo ou família. Ele era um adolescente irritado faminto por vingança e determinado a provar-se como filho de dois dos agentes mais dedicados que a KGB já havia gerado. Coisas como


sentimentos e afeto eram fraquezas que ele havia eliminado de seu sistema. Até Nikolai lhe mostrar amizade, Lobo lhe pedir conforto e orientação paternal e Holly sorrir tão docemente para ele... Tentando não pensar no sorriso de Holly ou em qualquer outra parte dela, ele dirigiu pelas ruas escuras da cidade adormecida de acordo com as instruções de Sunny no banco do passageiro. —À esquerda aqui. —Disse Sunny. —E então é a última casa à direita. A branca com persianas vermelhas. Ele apagou as luzes enquanto entrava na vizinhança. Este não era o tipo de lugar que teria escolhido como um esconderijo ou um refúgio. —Eu não posso acreditar que ele foi capaz de manter essa mulher e o filho dela em segredo. —Seu filho. —Sunny corrigiu. —E eu posso acreditar. O que quero saber é o que há em Phoenix? Por que ele enviou sua ex e o garoto para lá? O que ele sabia que ia acontecer? —Algo que provavelmente vai nos machucar muito. —Ele diminuiu até parar, usando uma grande lixeira para se encobrir. Seu olhar treinado examinou os arredores. A maioria das janelas estavam escuras ao longo da rua, mas havia um brilho fraco atrás de uma cortina, algumas moradias abaixo. Não havia movimento em nenhum dos lados da rua. Até então, a vizinhança estava quieta, mas provavelmente havia mais do que alguns cachorros presos atrás das cercas de arame. Ele não viu ninguém do lado de fora em qualquer um dos quintais ou nas varandas, mas sempre havia a chance de alguém esgueirar-se para fora para fumar durante a noite ou sair para um turno noturno e localizá-lo.


—Eu vejo alguma coisa. —Disse Sunny, olhando para trás. —Merda. É um carro. Ambos deslizaram em seus assentos, escondendo-se abaixo de suas janelas enquanto luzes de faróis viraram para a rua atrás deles. No momento seguinte, os faróis apagaram. —Honda. —Ela disse. —Modelo antigo. Você o reconhece? Não consigo ver a placa. —Não, eu não reconheço. Não perca seu tempo com a placa. Não havia sentido em puxar o registro. O carro seria desmontado e enviado para o ferro-velho antes do amanhecer. Ele ergueu a cabeça apenas o suficiente para ver o sedã parar lentamente em frente à vaga dupla de onde Marco devia estar se escondendo. A porta do lado do motorista se abriu, mas as luzes interiores não se acenderam, o que significava que tinham sido desativadas por alguém que queria ficar escondido. Ele viu uma sombra no formato de um homem saindo do carro. Observando o homem caminhar até a casa móvel com passos decididos, Kostya enfiou a mão no banco de trás e pegou o colete à prova de balas que fazia parte de seu equipamento. Ele colocou sobre Sunny e pressionou-a contra o assoalho para se certificar de que ela estava tão protegida quanto possível. Seguro de que ela estava a salvo, ele manteve o olhar colado ao homem que se movia rapidamente pelo minúsculo quintal e subia para a varanda. Houve um breve lampejo de luz quando o homem abriu a porta da frente – mas era tudo o que Kostya precisava para identificar o criminoso. O contorno de sua mandíbula era familiar, mas foi a longa trança que o denunciou. Spider(Aranha). O presidente do clube de motoqueiros fora da lei que o pai de Vivian fundara e entregara a ele.


Que porra está acontecendo aqui? —Fique aqui. Se você ouvir alguma coisa... —Pulo para o banco do motorista. —Ela respondeu. —Eu conheço as regras. Ele saiu do carro e se moveu furtivamente pelas sombras. Tirou a arma, mantendo-a baixa contra o quadril, pronta para levantar e atirar em um piscar de olhos. Com a outra mão, tirou a lanterna ultra brilhante do bolso. Tomando cuidado com os frágeis degraus da frente, abriu a porta com a mão coberta de couro e entrou na casa mal iluminada. Imediatamente, ergueu sua arma e a lanterna, mirando ambas em Spider que estava na cozinha. O motoqueiro fechou os olhos e fez uma careta, recuando da luz dolorosamente brilhante. Antes mesmo que Kostya tivesse proferido um comando, o cheiro de sangue fresco, quente e metálico atingiu seu nariz. Alguém estava morto ou morrendo. —Coloque as mãos para cima. —Ordenou Kostya. —Não me faça falar duas vezes. —Jesus Cristo, Kostya! —Spider sibilou, com cuidado para não levantar a voz e alertar os vizinhos. —Eu quase me mijei! Tire essa luz da minha cara! —Coloque suas mãos para cima! —Foda-se! —Spider rosnou, mas fez como tinha sido mandado, levantando as mãos e mostrando que não era uma ameaça. —Satisfeito? Sem palavras, ele abaixou o facho da lanterna e o direcionou pelo espaço aberto. Havia uma espingarda apoiada ao lado do sofá à sua esquerda e uma pistola e um pente de balas no balcão da


cozinha. Uma lata de cerveja na mesa da cozinha havia sido derrubada e o líquido ainda pingava da beira da mesa. Havia uma caixa de pizza na poça de cerveja, o papelão amassado em um canto como se tivesse sido pisado e esmagado. Quando o facho de luz se moveu para o outro lado da mesa, ele viu Marco caído contra a ilha, seu queixo tocando seu peito e seu corpo mole. Sangue, grosso e escuro, encharcava sua camisa e jeans. O corte no lado do pescoço e as facadas no peito e no estômago explicavam tudo. O coração em pânico de Marco bombeava seu sangue em rajadas rápidas, pulverizando o chão, a parede e as cadeiras. Ele projetou o facho de luz sobre a poça de sangue, ao longo do jato arterial e depois seguiu uma confusão de marcas de pés e mãos ensanguentadas no linóleo barato. As Marcas levaram-no para uma forma desajeitadamente encolhida entre um freezer e um armário na parede oposta. Um flash de cabelo loiro. Ombros tremendo. Pés pequenos. Tiffany. Voltando sua atenção para Spider, ele perguntou: —Que porra você está fazendo aqui? Spider olhou para a garota. —Eu não acho que este é um bom momento para falar sobre isso. Kostya abaixou a arma e se virou para a janela atrás dele. Ele ligou e desligou a lanterna duas vezes para sinalizar a Sunny que precisava de sua ajuda. Olhando para Marco e depois para Tiffany, ele tentou juntar as peças do que havia acontecido. Conhecendo a história entre os dois, Marco provavelmente começou a bater na garota e ela


finalmente havia desabado. Lidar com o corpo e a cena seria um problema, mas pelo menos Marco não era mais uma ameaça. —Puta merda. —Disse Sunny quando entrou na casa e analisou a cena com sua própria lanterna. Deixou cair a mochila que trouxera do carro no sofá e abriu o zíper. Ela jogou um par de luvas descartáveis para ele e colocou um par em si mesma. Sem uma palavra, pegou um conjunto de botas cirúrgicas para cada um deles e depois juntou o que precisava para Tiffany. Cuidadosa para não pisar em qualquer sangue, ela atravessou a sala de estar e a cozinha e se agachou na frente da Tiffany. Ele não conseguia ouvir o que Sunny dizia, mas a garota parou de chorar e deixou Sunny colocá-la de pé. Levou menos de um minuto para colocar botas descartáveis em Tiffany e uma bata sobre suas roupas ensanguentadas. Dirigindo o olhar para ele, Sunny disse: —Vou tirála daqui. —Vá. Nos falamos mais tarde. —Você precisa de alguma coisa do carro? —Ela perguntou, guiando Tiffany pela confusão. — Não. Livre-se dele quando terminar. Com um aceno silencioso, Sunny pegou uma jaqueta do sofá perto da porta e colocou-a em volta de Tiffany, escondendo seu rosto. Assim que elas se foram, Kostya se virou para Spider. —Não toque em nada. —Sem problema. —Spider esperou um momento antes de acrescentar: —Eu não vim aqui para matá-lo. —Eu não tenho tempo para isto agora. Você pode explicar por que estava aqui mais tarde. —Com cuidado para não pisar na crescente poça de sangue ainda quente, ele se agachou para revistar os bolsos de Marco. Não havia nada neles, então passou por cima


do corpo e pegou o telefone do morto. Precisava da impressão digital de Marco para desbloquear a tela, então cuidadosamente pegou a mão de Marco e tentou o polegar direito. Desbloqueou o telefone. —Pegue um saco para provas e a tesoura de poda na mochila. —Ele ordenou, olhando para Spider. Alguns segundos depois, Spider retornou com os itens solicitados. Com um rápido movimento da tesoura, Kostya removeu o polegar de que precisava. Atrás dele, Spider amaldiçoou o ato macabro. Ignorando-o, ele limpou a tesoura e a devolveu para Spider. —Guarde isso. Ele enrolou o polegar em um pouco de gaze e o lacrou no saco de provas. Guardou o saco e o telefone no bolso da jaqueta antes de se levantar para revistar o resto da casa. Ele encontrou uma mochila Jansport lilás em uma cadeira no quarto. Olhou dentro dela e viu apenas a parafernália normal que esperaria encontrar na bolsa de uma adolescente. No banheiro, reuniu as poucas coisas que pareciam pertencer a Tiffany e enfiou-as na mochila. Ele não queria deixar qualquer coisa ligada a ela se ele pudesse evitar. Ela precisaria de um álibi para mantê-la fora do radar da polícia. Levando a mochila, ele terminou de verificar gavetas, prateleiras e armários no resto dos quartos e no outro banheiro. A maior parte da casa tinha sido limpa antes da mudança para o Arizona, pelo que parecia, então não havia muito a vasculhar. Não encontrando nada que parecesse útil, ele reuniu as armas que Marco tinha deixado. Ao passar por um armário espelhado na cozinha, avistou seu cabelo visivelmente mais curto e xingou. —O quê? preocupação.

—Spider

perguntou,

sua

voz

cheia

de


—A porra do meu cabelo. —Ele retrucou. —Cortei o cabelo mais cedo. Estou soltando fiapos por todos os lugares. —Nós poderíamos aspirar? —Spider sugeriu, claramente por fora da realidade. —Nós não temos tanto tempo. —Dando uma olhada em torno da cozinha, pensou em quantas provas ele havia inconscientemente espalhado pelo lugar. Havia apenas uma opção agora. Hesitando com a ideia de quanto dano colateral um incêndio poderia causar em um parque de trailers lotado, ele disse, no entanto. —Encontre algum combustível. Spider hesitou. —Fogo? Você já viu um incêndio em um parque de trailers? —Essa é a questão. —Porra! —Spider soltou um som áspero e duro antes de atravessar a sala de estar e a cozinha em direção à porta dos fundos. —Provavelmente há uma churrasqueira ou um cortador de grama lá atrás. Vou ver o que posso encontrar. Spider não demorou muito. Voltou com uma caixa cheia de coisas inflamáveis. —Você pode dizer que havia um menino morando aqui. —Disse ele, entregando um recipiente com gasolina e frascos de fluido de isqueiro. —Encontrei algumas coisas de campismo. —Spider inclinou a caixa para revelar a pilha de latas para fogareiro de acampamento. —E fogos de artifício. —Eu posso trabalhar com isso. —Kostya começou a explorar as descobertas de Spider e formou um plano de ataque. Ele construía bombas desde quando tinha quatorze anos. Começar um incêndio violento com tudo isso seria brincadeira de criança. — Você viu algum tanque de propano?


—Não, eu verifiquei a churrasqueira. É a carvão. Procurei por um medidor de gás e não encontrei um. Toda a vizinhança parece funcionar com energia elétrica. —Espero que sim, merda. —Ele não queria uma explosão massiva em sua consciência. Não precisava do incômodo da investigação também. Olhando para Spider, perguntou: —Você já fez isso antes? —Como você acha que eu sei o quão rápido uma casa móvel ou um trailer queima? Você não é o único que já fez merda horrível para seu chefe. Ele entregou a Spider os frascos de fluido de isqueiro. — Quarto principal e banheiro primeiro. Então os outros quartos. Desligue todos os detectores de fumaça. Eles trabalharam rapidamente. Todos os longos anos de trabalho nas sombras, fazendo coisas terríveis por dinheiro, davam em momentos como este. As habilidades que possuíam não eram particularmente glamourosas, mas podiam ser úteis de uma maneira terrível. No momento em que Spider voltou do quarto, Kostya estava espalhando o último gel combustível na pele de Marco. —Saia daqui. Pegue seu carro e espere por mim. —As ruas deste parque estão dispostas paralelamente à estrada principal. Para Graham. —Spider esclareceu. —Posso esperar por você nas caixas de correio na segunda entrada. Quando você sair daqui, corra quatro ruas à direita e eu estarei lá. —É melhor que esteja. Spider saiu em silêncio. Kostya nem ouviu o carro ligar ou se afastar. Ele ficou ocupado terminando seu trabalho, empacotando todo o lixo que havia produzido em um saco que encontrou no


armário embaixo da pia depois de lavar as mãos. Olhando ao redor da cozinha, levou um momento para examinar sua lista mental, percorrendo cada passo que precisava seguir para ter certeza de que a cena estava limpa. Satisfeito por ter feito o seu melhor, começou a encharcar os panos de prato e toalhas com o fluido de isqueiro que tinha reservado. Começando na parte de trás da casa, começou a acendêlos e soltá-los. As chamas cintilaram antes de explodirem enquanto seguiam os ziguezagues de combustível que Spider colocara cuidadosamente pela casa, um caminho errante de destruição de uma extremidade à outra. De volta à cozinha, jogou os farrapos em chamas no corpo que precisava destruir. Recuando, estremeceu com a explosão de calor que o atingiu no rosto e o cheiro horrível de cabelo queimado. Ao redor dele, o fogo ardia rápido e quente. A reputação que as casas móveis tinham por serem armadilhas mortais era muito real. As chamas crepitavam cada vez mais altas, quase um rugido na noite, e ele saiu da casa em chamas, levando todos os vestígios de sua presença. Deixou a porta aberta atrás de si, dando ao fogo bastante oxigênio. De cabeça baixa, se moveu furtivamente, pulando uma cerca e mantendo-se nas sombras das ruas escuras. As luzes da rua queimadas foram sua salvação naquela noite. Estava tão escuro que ele não conseguia nem ver o que estava a sua frente enquanto corria cautelosamente. Um cachorro latindo tirou um xingamento sussurrado dele, mas ele se moveu à mesma velocidade, cauteloso, mas rápido. Quando viu o carro de Spider parado, apressou o passo. Abriu a porta de trás e jogou tudo o que tinha pegado na casa para o banco. Deslizando para o banco da frente, colocou o cinto de segurança e acenou para o motorista. —Vamos lá.


Um rádio com a frequência da polícia chiou no console. Spider gesticulou em direção a ele e disse: —Nada ainda. —Não vai demorar muito. O cheiro de fumaça está começando a chegar longe. —Olhando para trás pela janela traseira, ele só podia ver o brilho fraco do fogo no céu. Logo, toda a vizinhança estaria acordada. Nenhuma outra palavra foi dita enquanto se afastavam da cena do incêndio que tinham acabado de provocar. A estática e o chiado do rádio da polícia preenchiam o vazio. Sua mente estava correndo à frente, compilando uma lista de tarefas que tinha que ser concluída antes do nascer do sol. —Eu preciso que você me deixe em um lugar. Spider parou em um cruzamento. —Onde? —Alexei Sarnov tem uma loja de carros usados na cidade. —Sim. Eu sei disso. —Spider mudou de faixa. —Você não quer que eu o leve de volta para Houston? —Se formos apanhados juntos, estamos fodidos e nossos patrões também. Spider concordou com um aceno de cabeça. —Ainda precisamos falar sobre esta noite. —Mais tarde. —Ele respondeu com um suspiro. — Encontre-me amanhã. Quando chegaram ao estacionamento, ele saiu do carro e tirou suas coisas do banco de trás. Spider se foi assim que ele saiu do carro, claramente querendo sair da cidade antes que os problemas os atingissem. Kostya fez um trabalho rápido de abrir o portão e desligar o alarme de segurança antes de entrar no pequeno prédio de escritórios para pegar as chaves de um sedã dourado.


Deixando o estacionamento como o havia encontrado, Kostya saiu para a rua e deixou a cidade. A alguns quilômetros de distância da cidade, mandou uma mensagem para Max e pediu que ela o encontrasse. Ela ficaria chateada por ser convocada a essa hora da noite, mas ele precisava da ajuda dela. Tudo tinha dado errado naquela noite, e ele tinha que descobrir o porquê.


CAPÍTULO ONZE Completamente em êxtase, encostei-me à parede do salão e fiquei olhando para o espaço depois que Kostya saiu. Eu nunca havia tido um encontro como o que acabávamos de ter. Selvagem. Sexy. Rápido. Intenso. E bom. Tão bom. Meus joelhos ainda estavam um pouco bambos quando eu me afastei da parede. Voltei para a minha bancada e a limpei, retirando as pontas cortadas do cabelo dele antes de desinfetar o lavatório e secá-lo. Uma por uma, apaguei as luzes, voltando para o meu escritório. De pé em frente à minha mesa, olhei para o telefone que Kostya tinha acabado de usar e tentei ignorar a voz que me dizia para apertar o botão de rediscagem. Uma voz mais alta me disse para deixar isso para lá, mas eu não escutei. A curiosidade ganhou de mim. Depois de dois toques, um serviço de atendimento automático respondeu na linha. A voz feminina agradável disse: — Você ligou para o Sunrise Sunset Delivery Services. Não estamos no escritório no momento. Para verificar o status de uma entrega, pressione... Eu encerrei a ligação. Sunrise Sunset? Eu nunca ouvi falar deles. Pegando o meu iPhone, abri o aplicativo do Google e procurei pelo serviço de entrega. Não havia site ou qualquer outra presença nas redes sociais. Estranho para uma empresa de entrega, mas talvez eles fossem um tipo especial de serviço de entrega. Ou uma fachada para algo sombrio e ilícito.


Era uma possibilidade que eu não podia descartar. Não era assim que a máfia operava? Empresas de fachada e falsas? Esta era uma das empresas dele? Era assim que ele lavava dinheiro? O que exatamente ele estava fazendo para Nikolai esta noite? Eu pulei quando o telefone começou a tocar na minha mão. Feliz por ter uma razão para não pensar em todas as coisas ruins que Kostya provavelmente estava fazendo agora, olhei para a tela e sorri enquanto atendia. —Oi, mãe! —Holly! Você está em casa? —Não. Estou no salão. Você chegou agora? —Pousamos há cerca de meia hora. Acabei de passar pela alfândega e peguei minhas malas. Você está ocupada esta noite? —Não estou ocupada. Eu estava prestes a trancar tudo e sair. —Com saudades da minha mãe depois de não vê-la por quase duas semanas, perguntei: —Você quer me encontrar para o jantar? —Venha para casa. Vou fazer uma coisa para você. —Mãe, você acabou de sair de um voo de dez horas! —Quatorze, mas quem está contando? —Ela riu daquele jeito despreocupado dela. —Holly, deixe-me cozinhar para você. Quase não nos vemos mais. Tendo certeza que minha mãe estava com saudades de casa, eu concordei. —Tudo bem. Estou saindo agora. Eu te encontro em casa. —Dirija com cuidado. —Eu vou. —Desligando, peguei minha bolsa e casaco e apaguei as últimas luzes. Liguei o alarme antes de sair do prédio e mantive minha mão dentro da bolsa, bem em cima do meu coldre


escondido astutamente. Esta não era uma área perigosa sob nenhuma perspectiva, mas eu tinha acordado as últimas manhãs com uma estranha e dolorosa sensação de preocupação. Eu não conseguia afastar esse sentimento. A última vez que isso tomou conta de mim, eu tinha quatorze anos e estava de férias com minha mãe em Providenciales. Eu tinha acordado de um pesadelo com uma sensação de enjoo no estômago e disse a ela que achava que algo ia acontecer. Ela me deu um abraço e prometeu que sempre me manteria segura e para eu não me preocupar. Mas, como era de se esperar, nosso quarto de hotel tinha sido arrombado e saqueado enquanto nós desfrutávamos a praia naquele dia. Desde então, escutei meu instinto. A viagem para a nova casa de mamãe em San Felipe não demorou muito. Chegamos em sua casa quase exatamente na mesma hora, com ela entrando na garagem apenas momentos depois de mim. Assim que saí do carro, ela me envolveu em um abraço de urso e me apertou tão forte que mal consegui respirar. Minha mãe nunca foi como outras mães. Não havia muita moleza com ela. Mesmo agora, aos sessenta anos, ela tinha o físico e a força de uma mulher com metade da sua idade. Mamãe recuou de repente e me deu um olhar estranho. Nervosa, perguntei: —O quê? —Você cheira a homem. —Havia um leve tom acusatório na voz dela. —Posso sentir o cheiro de loção pós-barba em você. —E? —Sempre tivemos uma relação aberta quando se tratava de homens e sexo. Eu não ia mentir para ela. —Eu não tenho permissão para me divertir um pouco em uma noite de trabalho? —Bem, isso depende do homem, suponho. —Ela estreitou os olhos. —Eu o conheço?


—Você o conheceu. —Deixando por isso, peguei sua mala de rodinhas. —Como foi no Qatar? Ela percebeu meu jogo, mas não me pressionou por informações. —Quente. Seco. Os shoppings não são tão bons quanto em Dubai, mas encontrei algumas coisinhas para as meninas do meu escritório. —E como foi o seu voo? —Longo, mas essas novas cabines de primeira classe da Emirates Airlines são maravilhosas. Da próxima vez que formos para o exterior, voaremos com eles. Quando entramos na casa, fiquei impressionada com a sensação de vazio e frio. Não havia lembranças aqui, não como a nossa antiga casa. Não havia lembranças de rasgar papel de embrulho nas manhãs de Natal e de se aconchegar no sofá com chocolate quente enquanto assistíamos a filmes, vestidas em nossos pijamas. Nenhuma lembrança do entusiasmo vertiginoso de quando me aprontava para os bailes ou para o baile de formatura. Embora ela estivesse morando aqui nesta casa escandalosamente cara há quase um ano, ainda não me sentia em casa. Entendi por que ela tinha vendido a nossa antiga casa, especialmente agora que tinha dado o salto de C-suite11 para consultoria internacional e voava por todo o mundo, mas foi um ajuste inesperadamente difícil para mim. Eu escondi meus sentimentos, dediquei-me a ajudá-la a decorar sua nova casa e até mesmo organizei sua festa de inauguração. —No voo, li um artigo sobre as melhores praias do mundo. Achei que poderíamos ir a algum lugar quente para nossa viagem de inverno. 11

O C-Level ou C-Suite, é um termo informal usado para se referir coletivamente aos mais importantes executivos seniores de uma corporação.


—Você sabe que estou sempre pronta para uma viagem à praia. Eu tenho que voltar antes ou sair depois da festa de gala de Jeans e Diamantes. —Me avise o que preciso doar para ajudar seu grupo a atingir suas metas. Eu também tenho alguns colegas que podem conseguir doações. —Savvy já está cuidando de tudo. —Eu disse com uma leve carranca. —Eu vou ser arrastada para um comitê. Posso sentir isso. Minha mãe riu. —Você ama esta festa de gala! —Eu gosto de me vestir e beber champanhe. —Respondi. — A festa é apenas o preço que tenho que pagar para conseguir essas coisas. —Bem, é um preço digno. —Ela disse. —Você sabe, eu também estava pensando em ir a Amsterdã na primavera. Apenas uma curta viagem. —Acrescentou. Sorrindo gentilmente, perguntou: —Você se lembra o quanto amava as tulipas quando estávamos lá? —Sim. —Porém, não verdadeiramente. Eu não disse isso a ela. Pela sua expressão melancólica, ela parecia estar tendo um momento sentimental, e eu não queria estragar tudo. —Eu ainda posso ver você naquele lindo vestido rosa no Keukenhof. —Ela pegou uma garrafa de vinho branco do refrigerador embutido na ilha. Quando pegou o saca-rolhas para abrir o vinho, admitiu: —Eu ainda tenho aquele vestido lá em cima. Guardei-o todos esses anos pensando que um dia sua filha poderia usá-lo. Era a primeira vez que minha mãe falava comigo sobre netos. Fiquei surpresa com isso e me perguntei o que no mundo havia provocado essa estranha conversa. —Alguma coisa aconteceu em sua viagem?


Seu olhar estava anormalmente focado na garrafa de vinho. —Não, claro que não. Um pensamento aterrorizante me atingiu. —Você está doente? Ela riu muito disso. —Oh, Holly, há três anos não tenho sequer um resfriado! —Então o que há com a viagem pela estrada da memória e a conversa sobre netos? Ela tirou a rolha e olhou para mim. —Tenho sessenta e seis anos de idade, Holly. Meu relógio do juízo final está correndo tão rápido quanto o seu relógio biológico. Eu revirei meus olhos. —Meu relógio biológico não está correndo. Tenho muito tempo para fazer bebês. —Mas eu posso não ter muitos anos para apreciá-los. —Ela respondeu sobriamente. —Eu comecei minha jornada da maternidade tarde demais. —Você tinha suas razões e elas eram boas. —Eu suponho que eram. —Ela serviu o vinho em duas taças e empurrou uma para mim. Depois de um longo gole, exalou e disse: —Bem, conte-me sobre esse seu homem. —Eu não acho que ele é do tipo que quer ser pai. —Eu avisei com cuidado antes que ela tivesse esperanças. Dizer isso em voz alta fez meu estômago parecer meio estranho. Uma pontada aguda e dolorosa que me surpreendeu. Algum dia eu ia querer uma família. Eu queria crianças, animais de estimação e uma casa barulhenta e bagunçada, mas tive dificuldade em imaginar esse futuro com Kostya, que nem sequer adotava um maldito cachorro.


—É bom que você veja isso desde o começo. —Ela decidiu. —É bom ter uma diversão com esses tipos de homens – e eles podem ser muito divertidos – mas você deve procurar por um homem que queira construir um futuro com você. —Ela levou a taça de vinho até os lábios, mas abaixou antes de tomar a bebida. — Você ainda está com seu DIU? —Sim, mãe. —Eu respondi com um revirar de olhos e tomando um longo gole. Eu não contei a ela sobre Kostya não usar preservativo. Ela teria enlouquecido sobre isso – e com razão. Ele era meu amigo, mas eu não fazia a menor ideia de qual era a situação de saúde dele. —Você disse que eu o conheci? —Eu disse. —O jogador de futebol? O grande e sexy que corta o cabelo com você? —Não havia como confundir sua animação com a ideia de eu me relacionar com um atleta que tinha um futuro brilhante. —Não, não é o Levi. Ela tomou um gole de vinho enquanto pensava. Seus lábios se afinaram quando um pensamento lhe ocorreu. —É o seu vizinho, não é? Você está dormindo com aquele russo? Talvez eu tenha imaginado, mas achei que havia um pouco de desdém em sua pergunta. Endireitando minhas costas e levantando meus ombros, sustentei seu olhar. —Sim. Ela suspirou e serviu mais vinho em sua taça. —Você se lembra do que eu te disse sobre os homens russos? Ela me deu essa palestra cem vezes. Eu realmente não estava interessada em ouvir isso novamente. —Isso de novo não. —Sim, isso de novo.


—Mãe, eu realmente não acho justo julgar um país inteiro de homens baseado em qualquer coisa horrível que tenha acontecido entre você e meu pai. Ela bebeu metade da taça antes de abaixá-la abruptamente. Seu olhar parecia distante quando disse: —Algum dia você vai entender. —Você continua dizendo isso. —Eu a lembrei. —Mas esse dia nunca chega. —Apertei minha taça com força. —Algum dia você vai me contar sobre ele? —Holly. —Disse ela duramente. —Não há nada para lhe dizer. —Besteira. —Eu não gostava de xingar minha mãe, mas estava cansada dessa barreira que ela havia erguido em torno da identidade do meu pai. —Eu quero saber o nome dele. Saber onde ele mora. O que ele faz. Quero saber por que ele não nos quis. Sua expressão dura se suavizou. —Holly, ele queria você. —Não, ele não queria. Deixou você na Rússia grávida de mim e nunca teve a decência de me visitar, me escrever uma carta ou me telefonar. —Holly, você não sabe o preço que ele pagou para mantê-la segura. Ele arriscou tudo por você. Minha respiração ficou presa na minha garganta. Era a primeira vez que ela mencionava algo assim. —O que isso significa? —Seu pai sabia que você não estaria segura se ele reconhecesse você como filha. Ele fez tudo o que pôde para garantir que você estaria segura e feliz aqui em Houston comigo. —Por que eu não estaria segura com ele? —Eu engoli ansiosamente. —Ele é...? Ele é da máfia ou algo assim?


—Por que você perguntaria sobre a máfia? —Ela parecia preocupada. —Quem te deu essa ideia? —Ninguém. —Eu respondi rapidamente. Ela estreitou o olhar. —Kostya disse alguma coisa? —Não. —Respondi ligeiro. Então eu que estreitei o olhar. — Por que você acha que Kostya disse alguma coisa? —Holly, eu não sou idiota. Sei o que esse homem faz da vida. Eu não iria discutir com ela sobre o trabalho dele. —O que Kostya tem a ver com meu pai? —Nada. —Disse ela, apressadamente. —Você está mentindo. —Insisti. —Mãe, o que quer que ele faça, quem quer que seja, eu não me importo. Só quero saber. Eu sempre presumi que ele era casado ou talvez fosse do governo ou um criminoso. —Ele não é do governo. —Ela virou-se para o outro lado da ilha da cozinha e caminhou até o refrigerador embutido. —Pensei que poderíamos fazer algo simples. Ovos? Bacon de peru? Fruta? Olhando para as costas dela, tentei entender o que ela havia dito. Ela confirmou que ele não era do governo, mas e as outras duas opções? —Você está falando que meu pai é casado e um criminoso? Ela manteve o olhar focado no interior de seu refrigerador cuidadosamente organizado. —Ele era casado. —Era? —Sua esposa faleceu há mais de dez anos.


—E a outra parte? A parte criminosa? Ele faz parte do submundo de Moscou? Ela soltou uma risada tensa. —Estou dizendo que ele é o submundo de Moscou. Tentando processar a confirmação do meu pior pesadelo, peguei minha taça de vinho e esvaziei-a em um longo gole antes de pegar a garrafa para reabastecê-la. —Qual o nome dele? —Deixe isso para lá, Holly. Esta é uma porta que você não quer abrir. —Mas... —Holly. —Ela se virou para mim com um tom de frustração. —Seu pai me deu instruções muito específicas quando você nasceu. Eu as segui e isso manteve você viva e segura. Seu pai não faz parte da sua vida, mas ele cuidou de você. Sempre que você precisou de algo, ele foi o primeiro a se oferecer para ajudar. —O que você está dizendo? —O dinheiro que usei para comprar o prédio do seu salão? Sua matrícula na SMU, suas taxas para a fraternidade, suas roupas, seus carros, suas férias. —Ela listou todos os privilégios que eu tinha desfrutado. —Eu sempre tive uma vida muito boa, mas seu pai pagou cada centavo de sua educação. Ele estava ausente de sua vida, mas estava envolvido. Enviei a ele cópias dos seus boletins. Também mandei pinturas a dedo e artesanato em papel. Enviei para ele um vídeo de você torcendo nos jogos de futebol e fotos de você como rainha do baile e na formatura. Sem palavras, observei-a quebrar os ovos em uma tigela. Muito do que eu tinha acreditado sobre meu pai acabara de ser destruído. Eu tinha tantas perguntas, mas senti que minha mãe já tinha terminado por hoje. Sentindo-me confusa e triste, puxei uma


das banquetas altas e sentei-me nela, silenciosamente bebendo o vinho na minha taça enquanto ela cozinhava. Quando ela me presenteou com meu prato, mudou o assunto para compras, e eu deixei. Parte de mim entendeu que era egoísta e cruel fazê-la reviver as memórias do meu pai, especialmente agora que eu sabia que ela tinha sido a outra mulher. Talvez tenha sido por isso que ela nunca se casara, apesar de todos os homens legais com quem namorava. Talvez o coração dela ainda estivesse em Moscou... —Eu não acho que você deva dirigir. —Disse ela, olhandome sobre as duas garrafas de vinho branco que tínhamos bebido durante o jantar. Sentindo-me embriagada, concordei com ela. —Posso usar seu sofá? Ela riu e começou a limpar os pratos. Eu me juntei a ela perto da lava-louças e coloquei as peças que ela me entregou nas prateleiras. Ela acionou o alarme antes de pegar sua mala e levá-la até o terceiro andar, onde a suíte principal estava localizada. A casa tinha um elevador, mas ela nunca usava. Enquanto ela desfazia a mala, fiz uso de sua extensa gama de produtos de beleza para remover minha maquiagem e lavar meu rosto. Nós duas tínhamos um gosto caro quando se tratava de beleza, mas ela me vencia com seus frascos e potes de La Prairie, Shiseido, Sisley e La Mer. Apliquei e esfreguei as várias fórmulas antienvelhecimento que ela tinha à mão antes de encontrar uma escova de dentes extra em um armário e pegar emprestada uma camisola de seu enorme closet. —É melhor não monopolizar todas as cobertas. —Ela avisou enquanto eu me jogava de cara em sua cama.


—Uhumm. —Eu gemi, minha cabeça começando a girar quando a quinta taça de vinho me atingiu. Tendo compartilhado a cama da minha mãe até os quase dez anos, parecia familiar e certo estar aqui novamente. Mesmo depois de ela ter me expulsado permanentemente, eu ainda tinha entrado em seu quarto depois de sonhos ruins ou durante tempestades. Durante o ensino médio, costumava visitar o quarto dela muitas vezes para refúgio e terapia de conversa sobre meninas malvadas e dramas sobre meninos. Muito tempo depois, quando comecei a cochilar, mamãe levantou as cobertas e deitou-se na cama ao meu lado. Senti a mão dela deslizar ao longo do topo da minha cabeça e sobre o meu cabelo, o movimento suave me acalmando e me levando de volta para a minha infância. Não importava quantos aniversários eu comemorasse, eu sempre seria seu bebê. Foi também um daqueles momentos em que percebi quantos anos ela poderia ter ainda comigo. Vinte? Talvez trinta? Não era o suficiente. Nunca seria suficiente. Enquanto o sono me vencia, a ouvi dizer alguma coisa. Poderia ter sido o meu cérebro tonto brincando comigo, mas soava como se ela estivesse falando outro idioma. Uma língua que soava muito parecida com a russa...


CAPÍTULO DOZE Checando o espelho retrovisor, Kostya virou em uma estrada ladeada por prédios abandonados e empresas fechadas. O caminho esburacado era um perigo que ele atravessava com cuidado, não querendo bater o fundo do sedã emprestado. Além do ocasional transeunte, ele praticamente nunca viu ninguém andando por aquelas calçadas rachadas. O antigo complexo da empresa de eliminação de resíduos médicos era o tipo de lugar que poucas pessoas davam mais do que um olhar desanimado enquanto passavam pelo bairro abandonado. Com sua cerca caída, placas enferrujadas e janelas tapadas, o lugar parecia o cenário de um filme de terror pós-apocalíptico. Os sinais de aviso de resíduos biológicos e radioativos eram um desencorajador efetivo para a maioria dos visitantes. Nem mesmo garotos do grafite pulavam as cercas para marcar as paredes. Uma vez na propriedade, entrou no edifício principal e caminhou até uma seção nos fundos da fábrica de processamento abandonada. Ele tinha uma sala trancada e reforçada escondida no piso principal e entrou usando o teclado biométrico. Depois de acender as luzes, colocou tudo o que tinha tirado do esconderijo de Marco na mesa de trabalho de aço inoxidável no centro da sala. Enquanto esperava uma jarra de café ficar pronta, entrou no banheiro. Quando estava se lavando na pia, jogou um pouco de água fria no rosto e esfregou os olhos cansados e secos. Secou o rosto com algumas toalhas de papel da pilha perto da pia e levou um momento para estudar seu corte de cabelo. Ele tocou as pontas e pensou em Holly.


Apenas um gostinho dela e ele estava arruinado. Os dias de mentir para si mesmo se foram. Não podia fingir que estava perfeitamente feliz com sua vida solitária. Ele não podia fingir que não precisava de uma parceira em sua vida e uma mulher para amar. Ele queria o que Nikolai havia encontrado em sua esposa. Vivian parecia suave e doce, mas havia um traço implacável nela. Ela faria qualquer coisa para proteger Nikolai, seu bebê e sua família. Quão longe Holly iria por ele? Quão longe ele a deixaria ir? Ele se encolheu pensando no rosto dela se ela o visse agora. Se tivesse que dizer a ela que havia roubado coisas de um cadáver ensanguentado, o que ela diria? Se tivesse que dizer a ela que tinha incendiado uma casa e arriscado queimar um parque de trailers inteiro, ela ficaria enojada? Horrorizada? Se ela tivesse que vê-lo agora, vasculhando os pertences de um homem morto enquanto tentava decidir quem morreria em seguida, ela iria querer vê-lo novamente? Beijá-lo de novo? Deixá-lo fazer amor com ela? Torturado por esses pensamentos, saiu do banheiro e serviuse de uma xícara de café antes de ir para a mesa. Ele colocou um par de luvas nitrílicas pretas da caixa que mantinha lá e começou a examinar as armas e a mochila que tirara do esconderijo de Marco. As armas eram o que ele esperaria que alguém como Marco tivesse em mãos para proteção. Eram peças descartáveis, não muito baratas, mas também não eram top de linha. As pistolas tinham fita isolante preta enrolada nos cabos. Uma tinha sido disparada recentemente e outra cheirava como se tivesse sido recentemente limpa.


A faca que ele tirou da cena, a que Tiffany usou para esfaquear seu amante até a morte, ele decidiu limpar e destruir. Não havia razão para ficar com ela. Ela era apenas uma garota que entrou em pânico, e quanto antes ela pudesse se afastar de toda essa bagunça, melhor. Procurando em sua mochila, encontrou a carteira dela, o telefone desligado, um carregador de telefone, uma muda de roupas amassadas e alguns artigos de higiene pessoal. Examinou a mochila mais minunciosamente, passando as mãos pelas costuras e bolsos. Ele sentiu algo duro na parte inferior da mochila e inspecionou mais de perto. Uma pequena fenda tinha sido cortada e depois colada de volta com algo claro. Curioso, ele cheirou a costura colada. Esmalte de unhas? Ele abriu a costura e descobriu um envelope pardo dobrado. Jogando de lado a mochila, desdobrou e abriu o envelope. Dentro, encontrou uma pilha de dinheiro e várias identificações limpas para Marco. Certidões de nascimento, cartões de Seguro Social, carteira de motorista de vários estados e passaportes de três países diferentes. Ele examinou cada documento de identificação, observando a alta qualidade das marcas d'água, fontes, tintas e texturas de papel. Estas eram muito melhores que o trabalho médio de um falsificador. Quando olhou para cada peça novamente, estudando-as ainda mais de perto, aceitou que as suspeitas de Diego estavam corretas. A única maneira de Marco conseguir identidades limpas e todos os documentos de apoio com essa qualidade era se ele fosse, de fato, um informante. Alguém deu a ele uma nova vida em troca de informações. Mas por que Marco? O que diabos ele poderia saber sobre algo importante? Isso era apenas um federal ansioso para pegar quem estava dando sopa?


Olhando para o envelope e o bolso escondido criado às pressas, ele começou a formar uma ideia sobre o que Tiffany e Marco poderiam estar discutindo e que levou à sua morte. Não havia nada no envelope para Tiffany. Ele estava planejando se separar e deixá-la para trás? Ele tinha outros planos para ela? Ela descobriu que ele estava planejando fazer algo terrível? Foi o que a influenciou? Ela tentou roubar sua passagem para a liberdade em troca de sua vida ou de outra coisa? Planejando obter essas respostas em algumas horas, quando encontrasse Sunny, ele jogou de lado o envelope e os documentos e pegou a carteira de Marco. Removeu tudo de dentro da carteira e investigou cada peça, até a última nota de dólar. Colocando-a sobre a mesa, tirou as luvas e pegou o café antes de pegar o telefone e o dedo ensacado. Levando ambos para a mesa de laptop do outro lado da sala, conectou um cabo USB ao telefone e pressionou o dedo decepado contra a tela para desbloqueá-lo. Ele adicionou sua própria impressão digital ao sistema antes de abrir o programa que Fox havia criado e que recuperaria tudo do telefone. Enfiou o dedo no saco plástico e levou-o para a pequena geladeira, guardando-o até que decidisse se iria usá-lo ou destruí-lo. Algum tempo depois, quando o programa copiou o telefone inteiro, ele passou alguns instantes clicando nas fotos e na agenda de endereços. À primeira vista, não havia nada no telefone que pudesse ajudá-lo. Havia alguns vídeos picantes e fotos comprometedoras com Tiffany. Não acreditando na estupidez de Marco, ele os deletou imediatamente, nem mesmo abrindo os vídeos além do primeiro. Que tipo de idiota se gravava na cama com uma garota menor de idade? Um alarme suave o alertou para a chegada de outro veículo na propriedade, e ele olhou para as telas das câmeras de segurança montadas na parede oposta. O rosto familiar de Max encheu a tela


enquanto ela digitava seu código no teclado. Ela dirigiu para a propriedade e parou dentro do portão apenas para se certificar de que havia fechado completamente antes de atravessar o lote mal iluminado para estacionar ao lado do carro dele. Eles haviam feito as pazes desde a discussão na manhã seguinte ao ataque frustrado no salão de Holly. De todas as suas pequenas aranhas, Max sempre era a única a colocá-lo na linha. Às vezes ela o aborrecia loucamente, mas principalmente, ele estava contente de tê-la como parte de sua equipe secreta. Ela era a pessoa com quem ele podia contar para sempre cuidar dos outros e mantêlos seguros. Max também era a única pessoa a quem podia confiar o tipo de trabalho de laboratório que precisava fazer. Ela tinha dois anos em seu doutorado em nanotecnologia depois de terminar um bacharelado em bioquímica e nanoengenharia. Era um gênio que praticamente respirava química, biologia e física. Ela adorava brincar de análises forenses desde cedo e passou a criar e manter sua pequena biblioteca de amostras de DNA e coletar armas enquanto ainda estava no ensino médio. Ela ia chegar longe e ele ia sentir falta dela quando ela fosse muito bem-sucedida e ocupada demais para ajudá-lo. A fechadura da porta fez um clique quando destravou. Max entrou no laboratório escondido com uma expressão mal-humorada. Ela tinha um gorro escuro que mal segurava as ondas pesadas de cabelo escuro enrolado na altura dos ombros. Uma legging preta e um suéter enorme com alguma referência geek que ele não entendia camuflava o corpo que ela deliberadamente tentava esconder. —Você sabe, Big K, alguns de nós temos aulas, empregos e pesquisas. —Ela tirou o gorro e colocou no gancho ao lado da porta. —É melhor que isso não me mantenha acordada a noite toda. —Ela olhou para a pilha de evidências sobre a mesa enquanto


enrolava seus longos cabelos em um coque. —Será que quero saber de onde veio toda essa merda? —Do esconderijo de Marco. —Ele respondeu com sinceridade. Ela fez uma careta. —Você achou a garota? Ele assentiu. —Viva? —Sim. —Marco? —Morto. —Oh. —Ela sustentou o olhar dele. —Você? Ele balançou sua cabeça. —Tiffany resolveu o problema para mim. —Jesus. —Max disse suavemente. —Ela tem a idade de Lobo, certo? —Por ai. —Ele respondeu. —Sunny a levou para um esconderijo durante a noite. —E depois? Ele deu de ombros. —Eu não cheguei tão longe. Eu tenho que descobrir uma maneira de trazê-la de volta para Houston com um álibi forte o suficiente para que não seja incomodada. —Boa sorte com isso. —Ela murmurou e pegou um jaleco descartável da caixa no balcão. Depois de colocar o jaleco e luvas, se aproximou da mesa e pegou a mochila. —O que estou procurando? Alguma coisa em particular?


—A mochila não é minha prioridade. Pertence à garota. Mas isso. —Ele apontou para o envelope. —Eu quero o que você conseguir deste envelope e de seu conteúdo. —Então, impressões digitais, vestígios, DNA... —Ela pegou o envelope e estudou. —Com o que tenho que confrontar os resultados? Você tem um suspeito em mente? O que além de vestígios de Marco e Tiffany você espera encontrar? —Eu acho que veio de um federal. Ela levantou uma sobrancelha para isso. —Vou precisar da ajuda da Fox para entrar nessa base de dados. —Acorde-a. Minha folha de pagamento vem com sequências de dígitos. —Ela não será de muita ajuda. Ela e Nate iam sair hoje à noite. Eles provavelmente estão brincando e jogando videogame em sua casa agora. Ele grunhiu de aborrecimento com aquela informação. —Ela continua me dizendo que eles não estão namorando, mas toda vez que viro as costas, eles estão juntos. —Eles definitivamente não estão namorando. —Respondeu Max. —Ou fodendo, como qualquer tipo de amigos-combenefícios. —As mulheres dizem isso o tempo todo quando querem esconder alguma coisa. Max bufou. —Ela está escondendo alguma coisa, mas não é com Nate. —O que você quer dizer com isso?


—Que você precisa abrir os olhos e prestar mais atenção. — Ela disse rudemente. —Tem algo que eu precise saber? Algo que afeta todos nós e nossa segurança? Ela revirou os olhos para ele. —Não. Não é isso que ela está escondendo. Quaisquer que sejam os defeitos de Fox, ela nunca colocaria nenhum de nós em risco. —Suspirando, ela disse: —Não importa. —Se não importa, por que você mencionou isso? —Apenas esqueça isso. Não querendo discutir com ela ainda mais, ele atravessou o laboratório até a porta reforçada e seguramente fechada junto à parede do fundo. Digitou o código no teclado e digitalizou o polegar para desbloqueá-la. As luzes se acenderam automaticamente, as lâmpadas fluorescentes lançando um brilho azul-claro nas paredes metálicas, armários e bancadas. Ele pegou um par de luvas da caixa fixada na parede e se aproximou de um dos freezers onde mantinham amostras. Dentro desse freezer, havia cinco prateleiras, cada prateleira dividida em dezenas de compartimentos. Max mantinha um mapa plastificado detalhado para identificar a localização de cada amostra referenciada por um código de banco de dados pesquisável. Seu olhar se moveu para uma amostra que estava saindo de seu compartimento. Olhando para o mapa, encontrou a referência correta. Chamando Max, ele perguntou. —Por que você estava trabalhando com o DNA da Lana? —Sim, sobre isso. —Ela respondeu e entrou na sala de armazenamento. Mantendo as mãos enluvadas ao lado do corpo, ela


explicou: —Eu tinha uma teoria. Queria verificar antes de dizer qualquer coisa. Fechando a porta do congelador, ele perguntou: —Que teoria? —Bem. —Ela disse cuidadosamente. —Você lembra o dossiê que recebeu durante o verão? —Sim. —E então o pacote que recebeu no mês passado? —Sim. —Bem, eu estava passando pelo pacote depois que Fox me entregou, e encontrei uma impressão digital. —De? —Estava realmente degradada, mas havia correspondência na Interpol. De longa data. —Ela esclareceu. —O nome e todas as informações relacionadas à impressão foram editados, mas o dono da impressão era da Rússia. —Bem, nós já sabíamos disso. —Disse ele, ligeiramente desanimado. —Existe alguma maneira de obter os dados da Interpol? Ela balançou a cabeça. —Eu tentei, mas os registros sumiram. —Eu imaginei. —Ele resmungou, já sentindo um padrão. —Fiquei irritada que as pistas tivessem terminado ai, mas comecei a pensar na idade dos registros e nas fotos. Eles pertencem a alguém que estava lá quando você era criança. Talvez outro agente? Alguém que trabalhou com seus pais? Ou. —Ela adicionou. —Esses registros vieram de alguém que sabe coisas sobre você que


outras pessoas não sabem. Alguém que era próximo a você. Alguém que sabe que você fica esquisito quando seus pais são mencionados. —Eu não fico esquisito. —Argumentou ele. Ela o ignorou com um aceno de mão e continuou: —Então, comecei a pensar em que tipo de pessoa manteria essa merda. Pensei sobre o jeito que você me ensinou a construir minhas próprias pequenas coleções de chantagem. Pensei em suas lições sobre pílulas de veneno. —Ela acrescentou, suas palavras levando-o de volta às várias vezes em que ele ensinou a suas pequenas aranhas os pontos mais delicados da extorsão e a assegurar sua segurança, mesmo que isso significasse ferir alguém que eles cuidassem ou respeitassem. —E você acha que o pacote que recebi é a pílula venenosa de alguém? Que a pessoa que enviou está disposta a se arriscar se isso significar que eu me machucarei também? —Sim. —E o que isso tem a ver com Lana? —Bem, ok, aqui é onde entra uma pequena informação. — Ela olhou ao redor da sala e franziu a testa. —Nós realmente precisamos de um quadro branco aqui. —Você vai me dar uma aula, professora? —Não sou professora até terminar minha tese. —Lembrou ela. —E nem uma palestra. —Esclareceu ela. —Uma viagem pela memória, se você quiser. —Eu prefiro que não. Um passeio pelas minhas memórias é como uma caminhada por um campo minado. —Não é muito mais seguro para mim percorrê-lo. Revirar seu passado é a maneira mais rápida de ganhar uma bala.


—É por isso que sempre te disse para ficar de fora dos meus assuntos. —E, no entanto. —Ela gesticulou ao redor deles. —Aqui estamos nós. Ele exalou asperamente. —Bem, vá em frente. Me conte sua teoria. —Estava pensando sobre o que você me contou sobre o cara que queimou você. Seu antigo parceiro, você lembra? —Não, eu não me lembro de Borya. —Ele disse sarcasticamente. Ele estava em uma missão de longo prazo com Borya, seu mentor. Quando Borya se aproximou demais de uma agente, as linhas entre a realidade e a vida dupla ficaram borradas. Acontecia às vezes. Viver sua vida dupla – seu disfarce – era como respirar. Tudo o que era mentira se tornava verdade. Tamara, a agente de quem Borya tinha se aproximado demais, acabou engravidando. Quando chegou a hora de partir, terminar a missão e libertar-se, Borya recusou-se a deixá-la para trás. Ele tinha tido uma amostra do que uma vida normal poderia ser e não iria se afastar dela. Eles acabaram tendo que lutar para sair, e Kostya tinha levado uma bala por Tamara. Depois de voltarem a Moscou, foram separados permanentemente de equipe. Ele tinha ido fazer operações solitárias, e Borya se casou com Tamara e se mudou para a inteligência. Ele não tinha prestado tanta atenção em Borya como deveria após a separação, e isso custara ao amigo sua integridade e sua vida. Tamara tinha sido uma agente dupla o tempo todo, uma terrorista radical que queria acesso ao funcionamento interno do governo russo – e ela os havia conseguido.


—Certo. —Disse Max. —Mas aqui está a coisa. Eu estava pensando sobre essa história e como ela acabou. —Com todo mundo morto, menos eu? —Isso não é verdade, porém, é? —Eu estava lá. Eu puxei o gatilho. —Você matou o bebê? O filho deles? —Que tipo de pergunta é essa, Max? Não! Eu não matei a filha deles. Ela foi morta pelas mesmas pessoas que tentaram me matar quando me queimaram. Eles estavam usando o bebê como vantagem depois de a sequestrarem. Ela morreu em um acidente de carro quando eles estavam fugindo de seu esconderijo. —Você tem certeza? Você viu o corpo? —Não, eu não vi o corpo. —E, se a menina tivesse sobrevivido, ela seria o quê? Um pouco mais velha que Lobo? —Mais, sim. —Uhum. —Disse ela, segurando o olhar dele. —Mais ou menos da mesma idade que Lana? Como um soco em seu estômago, um pensamento doentio o atingiu. E se Lana fosse aquela menininha crescida? E se ela não tivesse sido usada como vantagem contra Borya e Tamara? E se tivesse sido escondida em algum lugar secreto, treinada e ensinada da mesma maneira que ele tinha sido. E se ela tivesse sido colocada aqui em Houston para se aproximar dele? Para chegar perto de Holly? Chegar perto o suficiente para machucá-la? —Você já tem os resultados?


Ela balançou a cabeça. —Eu comecei ontem à tarde. Tive alguns problemas com a amostra de DNA de Borya porque era muito antiga e degradada. Tratei da situação e comecei a analisá-los ontem antes de ir trabalhar. Você deverá ter sua resposta em quarenta e oito horas no máximo. Tenso com o estresse, Kostya disse. —Se essa garota é quem nós pensamos que ela é, ela está aqui para matar. Ela está aqui por mim e talvez pela Holly. Ela se tornou amiga de Lobo. Ela pode machucá-la para me atingir. —Ela não terá a chance. —Max disse, daquele jeito calmo e frio que ela tinha. —Vocês russos não são os únicos que sabem usar venenos. —Se ela está aqui para nos machucar, eu vou cuidar disso. —Algum dia, isso de cuidar de coisas para outras pessoas vai alcançá-lo. Algum dia, você vai precisar de alguém para cuidar das coisas para você. Incapaz de tirar as palavras da sua mente, ele ficou ali enquanto ela voltava para a parte principal do laboratório e preparava seu espaço de trabalho. Ela estava certa. Algum dia, tudo ia alcançá-lo. Talvez hoje. Talvez amanhã. Logo, ele sentiu isso com certeza. Querendo ter certeza de que Max entendia o quanto ele apreciava a maneira como ela atendia ao seu chamado, não importava o quão inconveniente ele fosse, disse: —Sinto muito por arrastar você para fora da cama e de volta ao laboratório. —Eh. —Disse ela com um aceno de mão. —Eu estava ficando louca com meus dados de pesquisa e estava prestes a perder minha cabeça de tanta ansiedade. —Ela encolheu os ombros. —Se


eu não tivesse vindo aqui, provavelmente teria seguido Nate e Fox para obter um pouco daquela maconha. Para me acalmar... —É ilegal, Max. Ela olhou ao redor da sala. —Uh, tudo isso também. Do tipo... muito mais ilegal que um baseado. —Ok. —Ele admitiu. —Você me convenceu. —Falando em Fox. —Ela disse com um sorriso brincalhão. —Você deve estar preparado na próxima vez que a vir. Ela vai te atacar depois do que viu nas câmeras de segurança mais cedo. —O quê? —Kostya reagiu em choque, mais por sua estupidez do que por qualquer outra coisa. Merda. As câmeras! —Ela disse que não viu nada de mais. Ela desligou as câmeras quando vocês dois começaram a se beijar como um casal de animais no cio. —Animais? —Ele repetiu defensivamente. —Sim. Animais safados e cheios de tesão. —Max riu dele. — Você sabe que ela nunca vai deixar você em paz, certo? Ele bateu a cabeça em ambas as mãos e gemeu. —Vocês, garotas, serão a minha morte. —Provavelmente, Papai. —Disse ela com uma risada. — Provavelmente.


CAPÍTULO TREZE Bocejando, Kostya parou na entrada da garagem particular localizada nos fundos da casa de Nikolai e apertou o código do portão. Ele estacionou em sua vaga habitual e desligou o motor. Esgotado e desesperado para dormir, engoliu os últimos goles do café morno e amargo de sua caneca de viagem antes de pegar sua jaqueta de couro para cobrir sua arma. A regra de Nikolai em casa era que todas as armas tinham que ser escondidas. Em sua opinião, era uma regra inútil, mas obedecia por respeito. Castelo de Nikolai, regras de Nikolai. Saindo de seu carro, olhou para o céu cinzento e se perguntou se poderia haver chuva. Quando abriu o portão de ferro forjado que separava a antiga cocheira do pátio, ouviu o inconfundível som de patas contra a grama molhada e paralelepípedos. Não demorou muito para avistar o enorme e indisciplinado filhote de cachorro correndo em sua direção. Agindo rapidamente, fechou o portão para impedir que o cachorro escapasse do pátio. Enquanto o cachorro corria em círculos ao redor dele, ele ficou parado e deixou que se acostumasse com seu cheiro. Ver o filhote o fez pensar no presente de Natal de Holly. Ela não tinha mencionado isso de novo, mas ele sabia que havia magoado seus sentimentos por não ter escolhido um cachorro ainda. Ele não gostou da sensação que o corroía por desapontá-la. Agachando-se, esfregou entre as orelhas do filhote e coçou-o no peito. Ele achou que o cão tinha entre dezoito e vinte quilos. As enormes patas enlameadas que bateram em suas botas e jeans sugeriam que esse cão se tornaria muito grande e muito barulhento. A julgar pelo seu temperamento feliz, seria um bom cão de família,


que manteria os ladrões e outros bandidos longe, ao mesmo tempo que seria gentil e brincalhão com a dúzia de crianças que ele esperava que Vivian desse a Nikolai. —Vamos. —Ele assobiou alto e afiado para o cão para chamar sua atenção antes de levá-lo pelo caminho de paralelepípedos. Nikolai esperava no alpendre, encostado a uma coluna branca recém-pintada, vestindo apenas a calça do pijama. Era raro vê-lo assim, suas tatuagens escuras contra a pele mais pálida. Havia apenas alguns centímetros de pele que não foram tatuados. Seu corpo era um roteiro de erros e glórias, de arrependimentos e sucessos, de sangue e honra. Aqui, no conforto de sua casa, Nikolai não precisava esconder a verdade estampada em sua pele. Mas era mais do que um homem se sentindo confortável em sua própria casa. Eles nunca falavam do trauma que Nikolai havia sofrido quando criança. Esse era um segredo sombrio e maligno que Nikolai mataria para manter guardado. Mesmo antes de desenterrar aqueles antigos segredos e descobrir o que havia acontecido com Nikolai quando criança, Kostya sempre se perguntara se ele tinha sido ferido. Sempre houve pistas, pelo modo como ele se comportava. Distante, sozinho, frio, isolado. Os caros ternos que ele usava eram como sua armadura. As tatuagens que tinha ganho fazendo coisas odiosas e terríveis eram como seu escudo espiritual. Tudo isso junto, ele se apresentava como um homem acima de sentimentos e emoções. Até Vivian, claro. Ela havia descoberto o que todas as outras mulheres que disputaram a atenção de Nikolai não conseguiram ver. Ela não tentou mudá-lo. Não tentou derrubar as barreiras que ele tinha erguido para se proteger. Ele estava muito assustado e traumatizado para isso. Ela havia se escondido debaixo daquela


cerca gelada, usando seu calor e amor para derretê-la até que estivesse escondida dentro daquele mundo cercado com seu marido. Pouco a pouco, o chefe estava se suavizando. Parado do lado de fora ao amanhecer, o tronco nu enquanto observava o novo cachorrinho de sua esposa brincando pelo quintal era prova disso. Houve um tempo em que Kostya se preocupara se a influência de Vivian enfraqueceria Nikolai. Ele estava completamente errado em considerar isso. Ela havia despertado uma fera protetora dentro do marido. Não havia limites para o que Nikolai faria para manter sua esposa e o bebê que ela esperava seguros. —Você acordou cedo. —Kostya se juntou a ele no alpendre e se apoiou na outra coluna. Procurou no bolso de sua jaqueta por seu maço de cigarros e isqueiro. Era uma coisa estúpida de se fazer, sabendo como Nikolai ansiava pela nicotina quando estava estressado, mas naquela manhã ele precisava disso. —Eu prefiro ficar aqui fora do que lá dentro limpando poças do piso. —Nikolai se inclinou como se para inalar a primeira nuvem de fumaça. —Dar a Vee um cachorro pode não ter sido minha melhor ideia. Acabei sendo acordado quatro vezes por ele. —Parece um bom treino para a paternidade. —Disse Kostya entre as tragadas. —E maternidade. —Acrescentou. Nikolai lançou-lhe um olhar. —Ela precisa descansar, não subir e descer as escadas a noite toda. Ele sorriu conscientemente e apreciou aquela profunda tragada de fumaça antes de exalar. Ele não lembraria Nikolai que sua esposa costumava correr oito quilômetros todos os dias. Subir e descer as escadas para perseguir um filhote de cachorro não era nada com o que ela não pudesse lidar. Em vez disso, perguntou: —Como vocês vão chamá-lo?


—Nós não decidimos. —Você quer dizer que ela ainda não decidiu? —Não, ela quer que eu escolha o nome. —Ele disse como se não pudesse entender o porquê. Endireitando a coluna, retirou-se para uma das cadeiras de vime e sentou-se na espessa almofada. Levantando a perna, descansou o tornozelo esquerdo no joelho direito, mostrando livremente os sinos tatuados no topo de cada pé. Nunca perdendo tempo com conversa fiada, perguntou: —Você o encontrou? Kostya sentou-se na cadeira idêntica. —Sim. —E? Ele apontou para o pescoço, silenciosamente sinalizando que Marco estava morto. A boca de Nikolai se apertou em uma linha sombria. —Você fez isso? Ele balançou sua cabeça. —A garota. —A garota? —Sim. Foi uma mudança que ninguém tinha previsto. —Foi limpo? Ele balançou a cabeça novamente. —Nem de perto. —E? —Eu cuidei disso. —Ele gesticulou com o isqueiro antes de guardá-lo no bolso. Nikolai franziu a testa. Ele não era fã de usar fogo para resolver problemas. —Alguém mais foi ferido?


—Até onde sei, ninguém ficou ferido. —Onde está a garota agora? —Em um esconderijo com alguém em quem confio. —Ele respondeu com cuidado. —Eu vou vê-la mais tarde e obter algumas respostas. —Diego estava certo? Marco era um espião? —Parece que sim. —Ele hesitou por um momento antes de acrescentar: —Eu não era o único à procura de Marco na noite passada. —Oh? —Spider chegou antes de mim na casa. —Spider? O que ele queria com Marco? —Eu não sei. Nós não tivemos tempo para conversar. Eu estava mais preocupado em tirar a garota de lá, limpar a cena e sair da cidade. —Quando você vai vê-lo? —Mais tarde. —Ele disse. —Leve alguém com você. —Nikolai ordenou. —Eu sei que você e Spider se conhecem há muito tempo, mas ele não é um de nós. Não podemos confiar nele. —Eu vou levar o garoto. —Ele decidiu. —Ele precisa ter mais experiência no mundo real. —Você acha que é possível que Spider esteja trapaceando? Que ele estivesse trabalhando com Marco ou mesmo com os federais?


—Tudo é possível. —Respondeu ele. —Eu costumava sentar-me à sua frente e dizer sem hesitação o que eu sabia ser verdadeiro. Ultimamente? Eu não sei, porra. Estou perdendo o jeito. —Você está muito magro. Você está cansado. E você está ficando velho. —Nikolai comentou. —Você precisa encontrar alguém para trabalhar com você. Precisa treinar um dos nossos homens para fazer o que você faz. —Não é fácil, Kolya. Este é o tipo de trabalho que leva anos para dominar. —E as suas pequenas aranhas? —Nikolai perguntou, olhando-o fixamente por um momento desconfortavelmente longo. —O que tem elas? —O chefe sabia que ele tinha pessoas em quem confiava, parceiros secretos que lhe faziam serviços, mas nunca tinha pedido seus nomes. —Tenho certeza de que há um ou dois deles que podem ser bons candidatos para aprendiz. —Nenhum deles é russo. Nikolai franziu a testa. —Isso é um problema, mas talvez possamos contornar isso. —Eu não quero qualquer uma das minhas garotas ligadas à máfia pelo resto de suas vidas. Nikolai reagiu com surpresa. —Garotas? Porra. Ele jogou o cigarro no chão e apagou-o com a ponta da bota antes de esfregar os olhos cansados. —Eu não vou dizer nada sobre elas. —Nikolai disse. —Eu não vou colocá-las em risco.


—Eu já fiz isso. —Disse ele, sua voz abatida e rouca. —Eu nunca deveria tê-las trazido para a minha vida. Nenhuma delas deveria estar envolvida nesta merda sombria e suja que eu faço. —Então por que você fez isso? —Eu não sei. —Ele admitiu suavemente. —Apenas havia algo em cada uma delas que reconheci. Algo que eu sabia que poderia usar. Poderia moldá-las, ensiná-las, transformá-las em algo perigoso e útil. —Mas? —Mas então comecei a me importar com elas. —Confessou. Olhando para Nikolai, esclareceu: —Como um pai. Eu sou o pai fodido de um grupo de garotas órfãs fodidas. —Eu não sei o que dizer sobre isso, Kostya. —Não há nada que você possa dizer que eu já não tenha dito a mim mesmo. Eles ficaram em silêncio por alguns momentos, o som do cachorro correndo ao redor do jardim e o zumbido dos insetos matinais ao redor deles. Eventualmente, Nikolai disse: —Eu não vou perguntar seus nomes ou o que elas fazem por você, mas você precisa ter certeza de que há alguma maneira de eu encontrá-las se algo acontecer com você. Para ter certeza de que elas estão seguras e que elas tenham dinheiro. Ele não deveria ter ficado surpreso com a oferta de Nikolai, mas ficou. —Eu já cuidei delas. Elas estarão bem arranjadas quando eu morrer – mas vou me certificar de que elas saibam encontrar você e possam provar que trabalharam para mim. —Espero que não precisemos nos preocupar com nada disso por um longo tempo.


—Eu ultrapassei minha vida útil. —Ele respondeu sombriamente. —Homens na minha linha de trabalho raramente chegam aos quarenta anos. —Você é um dos sortudos, eu acho. Inclinando-se para pegar a bituca do cigarro sujando o alpendre impecável, disse: —Eu não tenho certeza se é sorte. —Ele jogou a bituca na lixeira de cerâmica escondida sob a mesa do pátio entre suas cadeiras. —O que você quer que eu faça em relação ao Spider? —Depende do que ele tem a dizer. —Nikolai coçou a barba no queixo. —Eu prefiro deixar isso para Romero. Não precisamos de mais problemas. Ainda não encontramos Lorenzo, e ele está ativamente tentando matar minha esposa, meu bebê, meus amigos, minha equipe. —Ele tocou seu peito com cada palavra. —Essa merda com Marco e Tiffany foi uma distração. Descubra o que o Spider estava fazendo lá e esqueça isso. A porta dos fundos se abriu e Vivian saiu para o alpendre. Claramente não esperando encontrar ninguém além de Nikolai ali àquela hora da manhã, ela rapidamente agarrou os lados de seu robe fino e os fechou sobre sua barriga crescente, escondendo a grande faixa de pele aparecendo entre sua blusa e a calça do pijama. —Bom dia. —Ele cumprimentou, mantendo seu olhar treinado em seu rosto para deixá-la à vontade. —Bom dia. —Ela gesticulou para a porta. —Eu não sabia que você tinha companhia. Algum de vocês gostaria de um café? —Não. —Disse Kostya quando Nikolai balançou a cabeça. Abaixando o pé, Nikolai deu um tapinha no seu colo. Vivian sorriu e aceitou o convite do marido, inclinando-se em seu abraço enquanto ele dava um beijo prolongado na lateral de seu pescoço. O


braço dele se curvou ao redor da barriga dela, sua mão descansando na parte mais saliente com um toque protetor. O momento dolorosamente doce e íntimo fez com que Kostya desejasse coisas. Era dolorosamente fácil imaginar Holly assim, grávida e feliz, buscando o calor e a segurança de seu marido. O reconhecimento de que ele nunca seria aquele homem cortou-o como lâminas de barbear, deixando-o ensanguentado e fraco. Não querendo se intrometer na vida doméstica de Nikolai mais tempo que o necessário, ele se levantou. —Eu preciso ir, ou vou me atrasar para as minhas reuniões. —Não se esqueça de passar na academia para conversar com Vanya. Ele está deixando a cidade com Sergei para as lutas em Vegas. Eu lhe disse que cuidaríamos das coisas enquanto estiverem fora. —Quando os garotos de New York chegam? —Procurando mentalmente por todos os homens disponíveis que ele poderia designar para Bianca ou Erin, ele foi lembrado de que estavam com pouca mão de obra. Se uma luta acontecesse, precisariam de todas as mãos capazes que pudessem conseguir. —Em breve. Estou trabalhando nos detalhes. —Antes de você ir. —Interveio Vivian, com um sorriso travesso curvando sua boca e estendendo a mão. —Você tem algo pra mim? —Eu tenho. —Kostya pegou o bracelete de ouro do seu bolso e entregou a ela. Ela aceitou com um sorriso triunfante. —Agradeça a Holly por mim. —Eu vou.


—Quando? Ele ignorou o olhar intenso de Nikolai. —Esta noite. Provavelmente. O sorriso dela aumentou ainda mais. —Esta noite é bom. O filhote começou a latir, e o som surpreendentemente alto chamou a atenção de Kostya. Ele tinha estado em torno de cachorros adultos da raça Dogue Alemão antes, mas não tinha ideia de que os filhotes tinham um latido tão poderoso em uma idade tão jovem. Ele saiu do alpendre para ver melhor o que fez o cachorro latir e viu o gato de um vizinho andando em cima da cerca. O filhote saltou na cerca e fez um rosnado terrível tentando afugentálo. Nikolai assobiou agudamente, e o filhote voltou correndo para o alpendre, seu trote descoordenado fazendo até mesmo Kostya rir. O cachorro fez uma pausa para latir para ele antes de trotar para retornar ao seu mestre. —Stasi12. —Kostya gritou enquanto seguia o caminho de paralelepípedos em direção à garagem. —Chame-o de Stasi. A risada de Nikolai ecoou pelo jardim quando Kostya saiu e voltou para o carro. Ele duvidava que Vivian se importasse com o nome, mas Nikolai provavelmente insistiria nisso agora. Depois do jeito que ela manipulou a situação com Holly, ele não se sentia muito mal sobre isso.

12

A Stasi era a principal organização de polícia secreta e inteligência da República Democrática Alemã. Uma das organizações de vigilância mais intrusivas da história da humanidade


CAPÍTULO QUATORZE A dor latejante em minha cabeça era uma lembrança feroz do porquê eu ficava longe do vinho doce e seco. Era muito agradável, muito fácil de se deixar levar, e eu era uma molenga absoluta quando se tratava de ressaca. Nauseada, rolei na cama, confusa ao ver um teto que não era da minha casa e sentindo lençóis que eram muito sedosos contra a minha pele. Foi o copo de água e as duas aspirinas na mesa de cabeceira que me ajudaram a lembrar onde eu estava. Concentrando a minha energia, sentei-me, peguei as duas aspirinas e engoli-as com longos goles da água ainda fria. Fechando um olho, consegui ler o despertador na mesinha de cabeceira. Quando vi que eram apenas cinco horas, gemi. Mamãe provavelmente estava lá embaixo em sua academia, já suando durante sua uma hora de exercícios aeróbicos e musculação. O pensamento de me exercitar fez meu estômago revirar e minha cabeça latejar. Eu caí de volta no travesseiro e coloquei meu braço sobre os olhos enquanto esperava a aspirina fazer efeito. Minha mente era uma confusão de pensamentos, palavras desorientadas enquanto tentava entender tudo o que tinha acontecido na noite passada. Eu tinha mais respostas sobre meu pai, mas também tinha muito mais perguntas. Qual era o nome dele? Como ele era? Eu tinha irmãs? Irmãos? Eu poderia encontrá-lo agora que cresci e as coisas eram diferentes?


Ele iria querer me conhecer? Essa era a questão mais preocupante. E se ele não quisesse me conhecer? E se ele estivesse satisfeito com a situação atual? Algum dia eu poderia conhecer meus antepassados, minha história, meu povo? —Você ainda está na cama? —Minha mãe entrou em seu quarto limpando o suor da testa com uma toalha. Ela parecia divertida em me ver tão obviamente de ressaca. —Tenho que tomar banho e ir para o escritório. Você gostaria que eu fizesse o café da manhã? O pensamento de comida fez meu estômago revirar. —Não, obrigada. —Devo chamar um motorista para você? —Não, eu vou ficar bem. —Ela olhou para mim e eu disse: —Se eu não me sentir capaz vou chamar um Lyft ou algo assim. 13

Ela franziu o nariz. —Apenas chame um carro, Holly. Eu pago a conta. Não adiantava discutir com ela sobre o custo de um carro particular com motorista. —Ok. —Você pode pegar emprestadas algumas roupas do meu closet. —Ela se abaixou e beijou minha testa. Seus dedos quentes afastaram o cabelo do meu rosto e ela sorriu para mim. —Eu sinto falta de ter você no fim do corredor. Eu toquei a mão dela. —Eu sinto falta de passar tempo com você também.

13

Lyft é uma empresa de rede de transporte dos Estados Unidos semelhante a Uber.


—Nós devemos fazer algo sobre isso. —Decidiu antes de se endireitar e ir para o banheiro. Ela permaneceu na porta. —Talvez você possa vir morar comigo. —Mãe, eu tenho uma casa, uma hipoteca e... —Basta pensar sobre isso. —Ela pressionou. —Por favor? —Tudo bem. Vou pensar sobre isso. —Quando ela desapareceu atrás de uma porta fechada, eu não pude deixar de me perguntar o que no mundo estava acontecendo com ela. Na noite anterior com aquela conversa sobre netos e agora me pedindo para morar com ela? Ela insistiu que não estava doente, mas agora eu estava tomada pelo medo. E se ela estivesse mentindo? Pare. Ela me diria se estivesse doente. Ela não mentiria para mim. Ela mentiu sobre o meu pai... Sentindo-me perdida, abracei um travesseiro e fechei os olhos. Eu quero Kostya. Era um sentimento estranho de reconhecer. Eu o queria comigo. Queria sentir seus braços me abraçando. Queria ouvir sua voz forte e calma enquanto ele me dizia que tudo ficaria bem. Queria ouvi-lo dizer que minha mãe estava bem e que ele me ajudaria a encontrar meu pai. Mas depois que minha mãe foi embora e eu me arrastei para o chuveiro, decidi que pedir a Kostya para se envolver no meu drama familiar era uma má ideia. Se meu pai tinha se esforçado tanto para me manter segura, não ficaria feliz se Kostya começasse a bisbilhotar na minha vida. Considerando que minha mãe havia confirmado que meu pai estava envolvido no submundo do crime russo, eu tinha que ter cuidado. Pelo que eu sabia, meu pai podia ter rixas com a família da máfia que Kostya servia.


Mas como eu conseguiria as respostas que queria? Não podia perguntar à minha mãe. Eu poderia tentar procurar na internet para fazer uma lista de prováveis candidatos – mas então o quê? O que eu faria para reduzi-la? Para identificar meu pai? DNA. Isso me ocorreu de repente. Havia bancos de dados criminal de DNA, certo? E se meu pai estivesse em um desses? E se eu tivesse meu próprio perfil de DNA? Alguém poderia encontrar meu pai usando a metade paterna do meu DNA? Isso era possível? Eu não sabia nada sobre DNA, apenas as coisas que eu tinha visto na televisão e nos filmes. Eu só tinha uma vaga ideia de como os testes de paternidade funcionavam. Meu olhar se fixou na escova de dentes e na escova de cabelo da minha mãe. Seria fácil conseguir o DNA da minha mãe se eu precisasse, mas e o do meu pai? Se ele não estivesse em um banco de dados, como eu conseguiria reunir uma lista de possibilidades? Se eu tivesse uma lista de possíveis pais, como conseguiria o DNA deles? Eu não poderia exatamente ir para a Rússia e começar a pedir a estranhos aleatórios amostras de sangue. Por onde eu começaria? Vivian. Ela me disse que eu poderia ir até ela. Ela pode me ajudar. Mas ela está grávida. Não querendo causar nenhum estresse desnecessário nela, decidi que não poderia ir até ela. Eu não a colocaria em risco e nem pediria a ela algo assim. Mas eu poderia ir ao marido dela. Poderia pedir ajuda a ele. O pior que ele podia fazer era dizer não, certo? Ele poderia me dar uma lista de nomes. Talvez até ter contatos que pudessem se lembrar da minha mãe.


Perguntando-me como abordá-lo sobre o meu problema, terminei de me vestir, enviei uma mensagem de texto para minha mãe para que ela soubesse que eu estava saindo, liguei o alarme e saí de casa. Fui para a Starbucks para pegar a maior dose de cafeína e açúcar que eles ofereciam e peguei um lanche de massa folhada para meu café da manhã, para acabar com a fome da minha ressaca. Quando cheguei ao salão, Savannah já havia aberto o prédio e Billie estava arrumando a área da recepção para os nossos primeiros clientes do dia. Óculos de sol ainda no lugar, evitei os olhares curiosos e acenei silenciosamente antes de passar pelo andar de cortes. Segura em meu escritório, abri meu armário e tirei a nécessaire onde guardava algumas peças extras em caso de acidentes no salão. Eu tirei o vestido emprestado e coloquei sobre a cadeira da minha mesa para que eu pudesse me trocar. Savannah entrou no meu escritório enquanto eu estava recolocando o vestido, cobrindo minha calcinha limpa e sutiã que tinha tirado da nécessaire. Savannah bufou com uma risada antes de fechar a porta atrás de si e encostar-se a ela. —Bem, isso parece uma história interessante. —Não realmente. —Eu respondi, tentando alisar a frente do vestido. Era um tamanho maior que o meu, mas o estilo e corte caíam bem. —Deixe-me decidir. Desembucha! Conte-me todos os detalhes deliciosos. —Bem, não há muito para contar. Eu destruí duas garrafas de vinho com minha mãe, enquanto tínhamos uma conversa adorável sobre meu pai biológico, que aparentemente é um chefão criminoso viúvo em Moscou, e depois desmaiei em sua cama e acordei com uma ressaca infernal.


—Jesus. —Savannah parecia surpresa. —E acho que você pegou esse vestido emprestado do armário da sua mãe. —Ela comentou, gesticulando para minhas costas. —Ainda tem as etiquetas afixadas. —O quê? Merda! —Girei meu pescoço para ver as etiquetas balançando lá. Ela apontou para a embalagem da Starbucks na minha mesa. —Por favor, me diga que você usou o drive-thru e não envergonhou nosso salão inteiro andando por uma Starbucks com o cabelo molhado, sem maquiagem, sem calcinha e com etiquetas da loja Saks penduradas na bunda. —Drive-thru. —Confirmei, pegando a tesoura na gaveta da minha mesa. —Pode cortar para mim? Ela as pegou, mas hesitou. —E se sua mãe quiser devolvê-lo? Eles não vão receber de volta sem as etiquetas. —Eu vou dizer para ela descontar da minha herança. —Seja insolente assim e ela te dará uma surra. —Savannah alertou. —Mamãe nunca me bateu quando eu era pequena. Eu duvido que ela comece agora. —Por mil e novecentos dólares, ela poderia... —Savannah cortou a etiqueta e, em seguida, pegou meu copo da Starbucks e bebeu. —Venha. Vamos colocar você em uma cadeira e deixá-la bem bonita. O salão só abriria para os nossos primeiros clientes dali a meia hora, então tínhamos algum tempo. Savannah me deixou na minha bancada e pegou alguns produtos de cabelo da prateleira na parede mais próxima. Enquanto ela secava e penteava meu cabelo,


eu engoli meu café da manhã e verifiquei meu e-mail e as redes sociais. Sabendo que nossos clientes achariam esse momento divertido, eu tirei uma foto com Savannah e a publiquei em nossas redes sociais com uma legenda divertida. —Você quer falar sobre o seu pai? —Savannah perguntou enquanto me entregava aplicadores descartáveis e pincéis enquanto eu fazia uso do balcão de maquiagem. —Não há muito a dizer. —Eu fiz uma careta enquanto passava meu delineador, e Savvy rangeu os dentes ao meu lado. —Aqui, deixe-me fazer isso! Você vai acabar parecendo um guaxinim de ressaca se continuar arrastando o pincel assim. Grata por sua ajuda, sentei-me na cadeira de maquiagem mais próxima e fechei os olhos para que ela pudesse fazer sua mágica. —Então...? Sobre o seu pai? —Mamãe disse que ele era casado. Ela me disse que ele é o submundo de Moscou. —E daí? Ele é um chefe da máfia? Como um poderoso chefão? —Eu não sei. Talvez? Provavelmente. Quero dizer, é assim que eles chamam em russo? Poderoso chefão? —Não faço a mínima ideia. —Disse Savannah com um encolher de ombros. —Ele parece perigoso, Holly. —Ele deve ser. Mamãe me avisou para não procurar por problemas. —O que significa que você definitivamente não vai deixar isso em paz. —Disse ela, enquanto habilmente aplicava um efeito gatinho.


—Não, eu não vou. Ela ficou quieta enquanto aplicava delineador no outro lado. —Por favor, tenha cuidado, Holly. Você sabe que eu, mais do que ninguém, entendo o que você sente. Eu queria encontrar meus pais biológicos desde que tinha sete anos, mas às vezes, acho que é melhor não saber. Talvez haja uma razão pela qual eles me deixaram em uma mochila em um banco da igreja. Eu agarrei a mão dela e olhei para ela fixamente. —Savannah, se você quiser tentar encontrá-los, eu farei o que puder para ajudar. —Eu sei que você vai, mas não quero saber. Não agora, pelo menos. —Ela apertou minha mão. —Apenas certifique-se de considerar todas as formas como isso pode acabar se você começar a bater nas portas na Rússia. Uma vez que você abrir essas portas, você não poderá controlar quem ou o que passa por elas. Sua advertência permaneceu no fundo da minha mente enquanto eu cumprimentava nossos primeiros clientes. No meio da tarde, tive um intervalo. Depois de limpar minha bancada e avisar Savannah onde eu estava indo, passei pela recepção onde encontrei Billie e Lana falando sobre o fim de semana. —O que você vai fazer na sexta-feira? —Perguntou Billie, entregando a Lana uma pilha de sacolas de presente preto fosco para abrir e preencher com brindes para os clientes. —Não vou fazer nada. —Respondeu Lana, seu inglês bem melhor com a ajuda da constante tagarelice de Billie. —É meu dia de folga. —Você quer ir ver um filme? Almoçar? Lana sorriu animadamente. —Eu gostaria muito disso.


Fiquei feliz por ver que Lana tinha encontrado uma verdadeira amiga em Billie, dei um passo à frente e chamei a atenção de Billie. —Preciso tratar de uns assuntos. Billie apontou para a tela do computador exibindo os compromissos do dia. —Sua agenda está livre até as seis. —Volto às cinco, talvez um pouco antes. Se precisar de mim para qualquer coisa, ligue e eu volto correndo. Depois de um rápido desvio para o meu escritório para pegar minha bolsa e óculos de sol, saí do salão. Uma vez no meu carro, não pensei duas vezes no meu destino. Dirigi direto para Samovar e entrei em um estacionamento a apenas um quarteirão de distância. Sentindo-me um pouco nervosa, alisei a mão na frente do meu vestido e tirei meus óculos de sol, colocando-os dentro da minha bolsa. Quando entrei no restaurante, fiquei surpresa com as cores e a rica decoração. Era como entrar em um ovo Fabergé. As paredes vermelho-rubi da recepção e os sofás de couro castanho-escuros eram convidativos e acolhedores. Na área de jantar principal, atrás da bancada da hostess, as paredes eram de um tom verde esmeralda profundo. Cabines vermelhas reluzentes alinhadas em cada lado e mesas quadradas com toalhas brancas ocupavam o centro da grande sala. Havia portas douradas ao longo da parte esquerda e nos fundos da sala, provavelmente levando a áreas de jantar privadas. Quando me aproximei para pedir uma mesa, a hostess sorriu desculpando-se. —Sinto muito, senhora. Nós já paramos de servir o almoço. Sentindo-se tola por não verificar os horários do restaurante, murmurei: —Oh.


—Abrimos para o jantar às seis. Gostaria que eu reservasse uma mesa para você? —Não, eu vim aqui para... —Senhorita Philips? Não acostumada a ser tratada tão formalmente, olhei para trás e vi o marido de Vivian entrando pela porta da frente. Ladeado por homens com jaquetas de couro escuro e jeans, Nikolai era uma figura impressionante em seu terno cinza sob medida e gravata azulgelo. —Olá. —Eu só tinha falado com ele duas ou três vezes no salão, então não tinha certeza de como me dirigir a ele. Era estranho, no entanto. Quando estava em sua presença, sentia como se o conhecesse há anos. Havia algo estranhamente familiar nele. Algo em seus olhos e seu nariz... —Você está procurando por Kostya? —Ele perguntou, aproximando-se. Ele me olhou de cima a baixo com um olhar investigativo, como se tentasse decidir se eu estava com problemas. —Posso ligar pra ele, se você precisar dele. —Hum, não, eu não estava procurando por ele. Eu estava realmente procurando por você. —Por mim? —Ele parecia surpreso. —Sim. Acho que preciso da sua ajuda. —Admiti, prendendo a respiração assim que as palavras saíram. —Minha ajuda? —Ele pareceu surpreso. Sua expressão ficou sombria com preocupação. —Alguém está incomodando você? —Não. —Surpreendida por sua forte reação, rapidamente acrescentei: —É um assunto pessoal importante.


—Entendo. —Ele me estudou por um momento. —Você já comeu? —Não. Eu estava esperando experimentar a comida aqui para um almoço tardio, mas não sabia que estava fechado. —Você nunca esteve aqui? —Não. —Kostya foi negligente. Ele deveria tê-la trazido aqui em seu primeiro encontro. Então ele sabia que estávamos juntos. —Nós não tivemos exatamente um primeiro encontro ainda. —Entendo. —Seus lábios se apertaram com desaprovação. Desviando o olhar de mim, começou a falar em russo com o homem alto com a cabeça raspada de pé atrás dele. O homem gesticulou com um aceno de mão – uma mão que só tinha três dedos. Gesticulando em direção à sala de jantar principal, Nikolai mudou para o inglês e disse: —Venha comigo. Caminhando ao lado dele, permiti algumas rápidas olhadas em seu perfil. Ele era alto e magro, mais parecido com o marido de Lena do que o de Erin. O calafrio intimidante que parecia segui-lo e cercá-lo estava ainda mais frio, estando tão perto dele. Ele não me machucaria nem seria cruel, mas havia algo perigoso nele. Isso tornava seu relacionamento com Vivian ainda mais curioso. Ela era tão suave e doce, toda bondade e coração. Seu marido era afiado e firme, distante e contido. —Ficaremos aqui. —Ele abriu uma das portas douradas na parte de trás do restaurante. —Podemos conversar sem interrupção.


—Seu restaurante é incrível. —Eu disse quando ele me acompanhou até a mesa no centro da sala lindamente decorada. A mesa não era uma peça padrão da mobília do restaurante, mas uma antiguidade óbvia com cadeiras coordenadas e estofadas em cor creme. O espaço aconchegante tinha uma iluminação que destacava a arte russa tradicional pendurada nas paredes de cor azul-Prússia. —Essas cores são tão intensas. —Tenho certeza que você entende a necessidade de transportar seus clientes para outro lugar quando eles passam pelas portas da frente. —Disse ele, segurando minha cadeira. —Quando Savvy e eu fomos decorar o salão, decidimos que esse era o nosso foco. Queríamos que os clientes entrassem no Allure e esquecessem tudo exceto serem mimados. —Funciona. Vivian adora ir lá. —Depois que eu me sentei, ele andou até o outro lado da mesa e sentou-se. —Obrigado por manter seu bracelete seguro e devolvê-lo a ela. Aparentemente do nada, um garçom apareceu de uma porta lateral e encheu nossos copos com água antes de pegar os guardanapos artisticamente dobrados da mesa e colocá-los em nossos colos. Nikolai disse algo ao homem mais velho em russo, mas parou com a mão levantada. Voltou sua atenção para mim e perguntou: —Você é alérgica a algum alimento? Peixe? —Não. Ele terminou de dar instruções ao garçom que saiu da sala com passos suaves e fechou a porta atrás de si. Quando estávamos sozinhos, ele pegou o copo de água. —Espero que você não se importe. Eu pedi o almoço para nós. —Bem, se eu me importasse, seria um pouco tarde para perguntar, não é? —Um segundo depois da minha resposta


reconhecidamente atrevida, eu me arrependi. Este homem não era conhecido por engolir sapos de ninguém. O rosto de Nikolai registrou surpresa – e então ele riu. Não foi muito alto nem muito longo, mas ele parecia quase divertido com o meu retorno ácido. —Posso ver porque Vivian gosta tanto de você. —Eu não deveria ter... —Você deveria. —Ele respondeu com naturalidade e bebeu sua água. Colocou o copo de volta na mesa e me olhou com cuidado. —Isso entre você e Kostya... —É um assunto pessoal. —Interrompi sem hesitação. Consegui segurar seu olhar frio e penetrante enquanto estabelecia os parâmetros da conversa. —Eu sei que Kostya trabalha para você. — Escolhi minhas palavras com cuidado. —Não estou aqui para descobrir o que isso significa ou implica. —Então por que você está aqui? —Eu preciso de ajuda para encontrar alguém. Ele franziu a testa. —Você está sentindo falta de um empregado? —Não. —Toquei a borda dourada do prato na minha frente. —Estou procurando meu pai. Alguns momentos de silêncio tenso se estenderam entre nós. —Seu pai. —Sim. —Certamente sua mãe... —Ela foi muito clara que não vai me dizer mais nada sobre ele.


Nikolai bateu os dedos da mão direita na mesa. Percebi que ele usava sua aliança de casamento naquela mão. Vivian usava diamantes em ambos os dedos anelares, e só agora me ocorrera que era a mão direita dela que segurava a aliança de casamento. —O que você sabe sobre o seu pai? —Não muito. —Eu admiti. —Sei que ele é um viúvo russo que está no mesmo ramo de trabalho que você. Sua boca se contorceu com um sorriso. —Bem, não há muitos homens no mesmo ramo de trabalho, então não deve ser difícil encontrá-lo. Um frisson de esperança floresceu dentro de mim. —Então, você vai me ajudar? —Eu posso tentar. —Ele manteve o olhar fixo ao meu por um momento. —Você entende o que está pedindo, Holly? Você entende que, uma vez que começamos a abrir as portas, elas vão nos dois sentidos? Você entra do lado bom e pessoas más sairão do outro lado. —Minha melhor amiga me disse a mesma coisa esta manhã. —Ela é esperta. Você deveria ouvi-la. Eu engoli nervosamente. —Entendo que talvez não goste do que vou encontrar. —Essa é a menor das suas preocupações. —Seus lábios se achataram em uma linha perturbada. —Você tem uma boa vida. Tem uma mãe que te ama. Tem amigos. Tem Kostya. — Acrescentou em voz baixa. —Você tem tudo que precisa em sua vida. Não precisa procurar problemas.


—Você está certo. —Concordei suavemente. —Eu tenho uma vida maravilhosa, mas preciso saber quem eu sou. Preciso saber de onde eu vim e quem é meu povo. Você consegue entender isso? Nikolai olhou para longe de mim, seu olhar caindo para a mesa por um momento. —Eu era órfão. Não me lembro da minha mãe e não encontrei meu pai até muito recentemente. Então, sim, Holly. —Ele ergueu o olhar para o meu. —Eu entendo você. —Você vai me ajudar? —Eu perguntei suplicante. Ele suspirou e assentiu. —Eu não deveria, mas eu vou. A porta se abriu antes que eu pudesse agradecê-lo, e o garçom voltou com um reluzente carrinho prateado carregado de aperitivos. Ao avistar o caviar, olhei para Nikolai com surpresa. Caviar para o almoço parecia um pouco exagerado, mas ele agiu como se fosse a coisa mais normal do mundo inteiro. —Se você vai comer caviar, tem que beber a vodka. —Ele fez um gesto para a incrível seleção de pratos que o garçom começou a colocar na mesa. —Ou champanhe. —Ele ofereceu uma alternativa. —É realmente a única maneira de apreciá-lo. —Vou precisar de um Uber. —Murmurei, observando o garçom encher copos com vodka e taças de vinho com algo branco e borbulhante. Nikolai riu. —Tenho certeza que podemos encontrar alguém para levá-la de volta ao salão. —Ele ergueu o copo alto e fino cheio de vodca e imitei o movimento. —Za roditeli. Certo de que não havia nenhuma maneira de tentar isso sem massacrá-lo, eu disse: —Saúde. Nikolai engoliu sua dose, mas eu beberiquei a minha, apreciando a clara queimadura da vodka gelada. —Uau. —Disse


com uma expiração lenta. Eu me senti como um dragão exalando um sopro de fogo. — Isso é potente. —Apenas o melhor para os novos amigos. —Ele gesticulou em direção ao caviar. —Por favor. —O que o seu brinde significa? —Perguntei, me inclinando para inspecionar as iguarias diante de mim. —Aos nossos pais. Mas havia algo em seu tom que me fez pensar que estava perdendo a piada. Ele não estava sendo cruel ou zombando de mim, mas era como se ele soubesse algo que eu não sabia. O que quer que fosse, eu tinha a sensação de que isso mudaria minha vida para sempre.


CAPÍTULO QUINZE Estou em apuros? Era a primeira vez que Boychenko falava desde que Kostya o pegara. Ele olhou para o garoto. —Consciência pesada? Boychenko sacudiu a cabeça. —Não. —Então por que está perguntando se está em apuros? —Porque as pessoas que você pega e leva para fora da cidade nunca mais voltam! Ele riu do medo óbvio do garoto. —Você vai voltar para Houston comigo, acalme-se e tente não mijar nas calças. Não tenho tempo para levar meu carro para uma lavagem completa. —Eu não vou mijar nas calças! —Boychenko olhou para ele. —Onde estamos indo de qualquer maneira? —Galveston. Eu te disse. —Sim, eu me lembro, mas para onde vamos quando chegarmos a Galveston? —Uma praia. —E depois? —Um bar. —E depois? —O garoto perguntou, ficando mais exasperado com cada pergunta. —E então eu vou me encontrar com Spider e você vai ficar na minha retaguarda.


—Por que vamos nos encontrar com Spider lá? Por que não se encontra com ele em casa? —Porque nenhum de nós quer ser visto juntos em Houston. —Por que não? Aconteceu alguma coisa? —Jesus. —Ele rosnou. —Você sempre faz tantas perguntas? O garoto encolheu-se em seu lugar. —Desculpe. Exalando uma respiração cansada, Kostya disse: —Tudo bem. Sou eu. Estou cansado pra caralho. —Você quer que eu dirija? Ele balançou sua cabeça. —Vou dormir se estiver no banco do passageiro. —Sim. Essa é a ideia. —Não é nada contra você, rapaz, mas eu não confio em ninguém no banco do motorista. —Ok. —Boychenko esticou as pernas e tamborilou os dedos no joelho. Depois de alguns quilômetros de silêncio, ele perguntou: —Aquela Holly sabe o que você faz para Nikolai? Ele lançou um olhar de advertência para Boychenko. —O que Holly sabe ou não sabe não é da sua conta. —Foi o que Vivian disse ao chefe quando eles estavam discutindo sobre isso na noite passada. Merda. —Eles estavam discutindo sobre mim e Holly? —Sim. Não alto, com raiva ou algo assim. Era mais uma discussão tensa, eu acho. —E?


Boychenko encolheu os ombros. —Eu não ouvi tudo. Apenas a parte em que Vivian disse ao chefe para cuidar da própria vida e deixar vocês dois resolverem as coisas. —Só isso? —Só isso. Mas por que ele se importa com quem você está namorando? O que Holly tem a ver com qualquer um de nós? —Não é sobre Holly. —Ele mentiu. —É sobre eu não me distrair. O que é exatamente o que está acontecendo agora. —Ele franziu a testa para o garoto. —Ouça, é assim que vai funcionar quando chegarmos à praia...

****

Pouco depois de deixar Boychenko um pouco mais abaixo na praia, Kostya se viu encarando um bar de motoqueiros. O nó de ansiedade em seu estômago não desaparecia. Na verdade, parecia aumentar mais e mais enquanto entrava no bar decadente. Antes da noite anterior, antes de Holly fazer seu movimento, ele nunca teria hesitado em fazer um encontro a sós. Ele sempre foi pragmático sobre a morte. Mais cedo ou mais tarde, ela viria para ele. Sempre aceitou que uma bala com seu nome estava esperando o momento certo para acertar seu crânio. Mas agora ele tinha uma razão para continuar respirando. Atento ao seu entorno, deu uma olhada no bar quando entrou. Não haviam clientes que ele pudesse ver e apenas um punhado de funcionários. Se Spider estivesse trabalhando com Marco ou se as pessoas por trás de Marco soubessem que Spider estava em sua casa na noite anterior ao incêndio, qualquer das


garçonetes poderia ser uma policial disfarçada. Poderia haver escutas debaixo de qualquer mesa ou cadeira e câmeras de vídeo atrás daquelas garrafas de bebidas guardadas atrás do balcão. Três mulheres usando jeans apertados e cropped preto limpavam mesas e organizavam cadeiras enquanto outras duas mulheres estavam atrás do balcão, uma delas preparando o caixa para o início do seu turno e a outra organizando o bar. A que estava no caixa o avistou do lado de dentro da porta e apontou para o fundo da área onde Spider estava sentado com uma cerveja e um café da manhã tardio. Ele segurava uma bola cheia de guardanapos na mão esquerda e parecia estar apertando-a ritmicamente. Sem uma palavra de saudação, Kostya acomodou-se na cadeira em frente a ele. Spider pegou a cerveja, as mãos mostrando um leve tremor e tomou um gole. —Então, como foi a viagem? —Curta. Spider gesticulou para o prato de ovos meio comidos, batatas fritas e bacon gorduroso. —Você quer café da manhã? Posso pedir à Susie para ligar a grelha. —Estou bem. —Ele duvidou que o lugar passasse por uma inspeção sanitária. Olhando para a garrafa de cerveja, comentou: — Um pouco cedo para uma bebida. Spider resmungou antes de tomar o último gole da cerveja. —É hora de nossa caminhada romântica na praia? Kostya abriu um sorriso e pegou sua carteira. —Deixe-me pagar seu café da manhã primeiro. Depois de jogar um par de vinte dólares, Kostya enfiou a carteira no bolso de trás e saiu do bar com Spider alguns passos atrás dele. Eles seguiram a calçada rachada ao lado do edifício em direção ao caminho que levava à praia. Kostya esperou até que eles


estivessem escondidos pelo prédio e um par de lixeiras para lançar seu ataque. Com velocidade que chocou Spider e o deixou indefeso, Kostya atingiu o outro homem na frente de seu pescoço e peito, prendendo-o na parede do fundo do prédio. Com o antebraço contra a garganta de Spider, deu um bom empurrão, mostrando a Spider que estava falando sério, e então empurrou rapidamente o colete de couro gasto e apalpou-o procurando por armas e fios. A pele suada sob a camisa de Spider disse-lhe tudo. Este homem estava com medo pra caralho. Depois que Kostya retirou seu antebraço, Spider o empurrou com as duas mãos e rosnou: —Que porra está errada com você? Ele ficou cara a cara com Spider. —Você vai me perguntar isso? Depois da noite passada? O que diabos está acontecendo, Spider? Querendo jogar uma isca para esse cara e esperando que ele aproveitasse a chance de se salvar, ele disse: —Somos amigos desde o primeiro dia em que pisei em Houston. Nós trabalhamos juntos há anos. Sempre fomos honestos, e sempre fizemos certo um com o outro, mesmo quando não era fácil. Diga-me que porra está acontecendo aqui – e farei o que puder para protegê-lo se você estiver em apuros por causa de Marco. Spider se afastou da parede e passou a mão por cima da cabeça e pelo comprimento de sua trança escura. Ele olhou para o bar e balançou a cabeça. —Aqui não. Seus passos rápidos o levaram pelo caminho rachado em direção à praia e Kostya apressou-se em segui-lo. Quando estavam a uma distância segura do bar, Spider sem dizer nada lhe ofereceu um cigarro. Kostya pegou, inclinando-se para a frente para acendê-lo no isqueiro Zippo preto que estendeu para ele. Depois de uma tragada


lenta, respirou fundo e perguntou: —Por que você estava na casa de Marco na noite passada? Spider bateu as cinzas no chão. —Eu estava seguindo ordens. —Ordens? —Ele repetiu, surpreso. —Quem te deu ordens para matar Marco? Spider hesitou. —Seu povo. —Meu povo? —Chefe do seu chefe. —Maksim? —Ele não acreditou. —Maksim te deu um emprego? —Romero me deu o trabalho. Disse-me que tinha vindo de Moscou. Me disse para me livrar de Scorpion(escorpião) e Marco e fazer isso rápido. Eu não fiz perguntas. —Spider olhou para ele com desconfiança. —Você realmente não sabia? —Eu não estaria aqui fazendo perguntas estúpidas se soubesse. —O que Spider tinha acabado de dizer girava em torno de sua cabeça. —Você disse que eles disseram para você se livrar do Scorpion. Você se livrou? —Eu não consegui encontrá-lo. Imaginei que Scorpion iria para a casa de sua irmã ou que ela pudesse saber onde ele estava, mas só encontrei Marco lá. Faria sentido que ele estivesse lá, com a história entre ele e a irmã de Scorpion. —Que história? —Eles têm um filho juntos. Marco e a irmã de Scorpion. — Ele esclareceu. —Foi um caso de uma noite há anos. Se eu soubesse onde ela estava, provavelmente poderia encontrar o Scorpion.


—Ela e o garoto estão no Arizona. —Ele compartilhou, juntando as peças. —Meu localizador diz que ela e o garoto saíram há algumas semanas. —Conveniente. —Resmungou Spider. —Você acha que Scorpion iria com ela? —Talvez. Ela tentou ficar longe de problemas. Scorpion não falava sobre ela ou o garoto muitas vezes. Ele só falou sobre ela reclamar que Marco estava atrasando seus pagamentos de pensão alimentícia e ter que rastreá-lo para conseguir o dinheiro que sua irmã precisava. —Romero lhe deu algum motivo para matá-los? —Eu presumi que Marco e Scorpion estavam conversando com as pessoas erradas. —Disse Spider. —Scorpion iria foder todos nós por um punhado de moedas de prata. Maldito Judas. —Ele resmungou com raiva. —Ele e Romero sumiram por um longo tempo, e quando eu subi de cargo, em vez dele, ele começou a se afastar do nosso clube. Eu suspeitava que ele estava jogando um jogo diferente, que tinha um plano a longo prazo diferente do resto de nós. —Ele sabe demais para ser uma ponta solta. —Advertiu Kostya, pensando em todos os anos em que Scorpion esteve mergulhado na coisas do clube, organizando transações de drogas, armas e coisa pior. —O que ele tem contra você pessoalmente? —O suficiente para me manter preso o resto da minha vida. —Spider jogou o cigarro e esmagou-o com a bota suja e desgastada. —Mas não é por isso que preciso encontrá-lo e matá-lo. Eu vou para a prisão. Não tenho medo de cumprir minha pena. Isso é parte desta vida, e aceitei isso quando me alistei e fiz o meu primeiro trabalho.


—Mas? —Mas ela não. Eu não vou deixar que ele arruíne a vida dela. —Ela? —Marley. Minha enteada. —Ele está ameaçando-a? Posso conseguir alguém para mantê-la segura. —Esse não é o problema. —Spider parecia abatido e cansado. —Você já contou uma mentira tão grande que te escapa das mãos? Vinte anos depois, você olha para cima e nem consegue imaginar como diabos você pode consertar as coisas. —Ele parecia destruído e abatido quando disse. —Eles estão certos, você sabe. Não é a primeira mentira que te pega. São as seguintes. —Entendo isso melhor do que qualquer pessoa que você possa conhecer. —Ele hesitou em perguntar, não tendo certeza se precisava de outro segredo para guardar. —Que mentira você contou? —A mãe de Marley não é sua mãe. —Spider revelou com uma pressa angustiada. —É tudo mentira. Tudo isso. Tudo sobre seu nascimento, o pai, a mãe e eu. Surpreso, ele perguntou: —Por que você mentiu? —Porque o pai dela, o pai de verdade dela, era um idiota que estuprou minha irmãzinha. —Spider explicou com uma raiva mal contida. —Ela era apenas uma criança. Não tinha sequer dezesseis anos e ele a machucou tanto... —Sua voz sumiu enquanto as lembranças pareciam dominá-lo. —Foi minha culpa. Eu deveria estar observando-a melhor. Eu não deveria ter deixado ela ter alguma relação com o clube ou comigo. Kostya ficou em silêncio e deixou o homem confessar tudo.


—Quando descobri o que aconteceu, me descontrolei. Eu o encontrei e nós o levamos para o meio do nada e batemos nele. Então entregamos a ele uma pá e lhe dissemos para começar a cavar. Quando estava profundo o suficiente, eu o matei e cobrimos o túmulo. —Nós? —Romero, eu e... —Scorpion. —Kostya terminou para ele, juntando as peças. Spider não era o padrasto de Marley. Ele era o tio dela. —O que aconteceu com sua irmã? Por que você precisa mentir sobre a identidade da mãe dela? Ele não respondeu no começo. Engoliu algumas vezes, como se estivesse engasgado, e finalmente disse: —Annie se matou. Colocou uma maldita mangueira no escapamento do carro e trancou-se em uma garagem. Eu a encontrei mais tarde naquela noite. A bebê, Marley, estava gritando no berço quando cheguei lá. Spider desviou os olhos, seu olhar se movendo para o suave movimento do oceano. —Depois do funeral, tomei uma decisão. Eu não queria aquela merda seguindo Marley pelo resto de sua vida. Então, comecei a procurar uma mãe para cuidar dela. Não tive que procurar longe. Kim praticamente tinha crescido com Annie. Elas eram melhores amigas desde que eram crianças. Ela não tinha família, então eu não precisava me preocupar com outras pessoas sabendo do nosso segredo. —Então, você deu Marley para Kim? Spider assentiu. —Ela amou Marley desde a primeira vez que a abraçou e eu percebi que ela só queria ser mãe. Ela queria um lar e uma família. Romero me ajudou a obter uma certidão de nascimento falsificada. Kim era jovem, talvez jovem demais, mas eu não tinha


habilidades ou tempo para ser pai. Eu estava envolvido com o clube. Naquela época, eu era um filho da puta com raiva, e não tinha como ser pai. Nós inventamos nossa história e começamos a vivê-la. Eventualmente, eu me casei com Kim porque fazia sentido e mantinha Marley perto de mim. E nós apenas – bem – nunca dissemos a verdade. —Blyat. —Agora você entende porque tenho que encontrá-lo. —Mesmo que você mate Scorpion, ele provavelmente já contou essa história para outra pessoa. Eles vão usá-la para te machucar ou te chantagear. —Eu vou para a prisão antes de expor minha equipe. — Disse Spider resignadamente. —Mas Marley... —Vou me certificar de que ela seja cuidada. —Ele prometeu. —É o mínimo que posso fazer. —Eu agradeceria. Eu tenho um seguro de vida e alguns investimentos para ela. Ficará bem quando eu tiver partido, mas se eu estiver na prisão? Ela passará por dificuldade. —Pelo que ouvi, ela é uma garota muito esperta. Vai ficar bem. —Espero que sim. —Disse Spider com um sorriso triste. — Espero por Deus que ela me perdoe quando descobrir que estive mentindo todo esse tempo. —Eu gostaria de poder ajudá-lo com isso, mas não posso. — Ele estendeu a mão e Spider apertou-a. —Boa sorte. —Sim. —Spider apertou a mão com força. —Boa sorte para você também, irmão.


—Corte a porra do seu cabelo. —Ele ordenou, recuando. — Eu te reconheci no escuro por causa dessa trança. Você vai querer passar despercebido em breve. Com o conselho dado, ele se afastou de Spider. Sentindo a brisa fresca do mar em sua pele, seguiu o caminho de madeira gasto de volta para o estacionamento. Quando estava atrás do volante, examinou os arredores, procurando por qualquer sinal de alguém o seguindo, e deixou o estacionamento. Ele encontrou Boychenko no ponto de encontro deles. —Onde vamos agora? —O garoto perguntou quando colocou o cinto de segurança. —Webster. —Que porra tem em Webster? —Duas garotas. Uma delas com um grande segredo...


CAPÍTULO DEZESSEIS —Agora, escute. —Disse Kostya, enquanto paravam na entrada da garagem, esperando a porta se abrir. —O que quer que você veja ou ouça hoje, você vai levar para o túmulo. Se não acha que consegue lidar com o segredo, fique no carro e espere por mim. —Eu posso lidar com isso. —Boychenko assegurou-lhe. A porta da garagem começou a se mover e ele avançou para o espaço. —Não fale. Não faça perguntas. Encontre um canto e fique nele. Ouça. Observe. Aprenda. Boychenko assentiu com ar pensativo. —Entendido. Quando a porta da garagem se fechou atrás deles, a porta lateral da casa se abriu para revelar Sunny. Vendo que era ele, ela visivelmente relaxou e se afastou da porta, desaparecendo de volta lá para dentro. Saindo do carro, ele notou o SUV preto elegante parado no espaço à direita e as prateleiras organizadas no forro da parede no fundo da garagem. Aparentemente, Sunny passava mais tempo aqui do que ele pensava. Boy seguiu-o até a casa onde encontraram Tiffany sentada em frente a uma mesa de jantar, bebendo um Sprite. A menina parecia cansada e doente, a pele pálida e olheiras roxas ao redor dos olhos. Seu cabelo molhado pendia frouxamente ao redor de seu rosto, e ele ficou impressionado com a idade que ela aparentava. O estresse a que ela havia sobrevivido a envelhecera dez anos em poucos dias. —Onde você achou esse garoto? No recreio? —Sunny brincou, olhando para Boychenko com alguma curiosidade enquanto subia para o balcão e pegava sua caneca de chá quente. — Este é seu primeiro dia bancando a sombra de Kostya? —Quando


Boy acenou com a cabeça, ela disse: —Bem, boa sorte, garoto. — Gesticulando para a máquina de café Keurig no outro balcão, perguntou: —Você quer café, K? Ele começou a recusar a oferta, mas depois decidiu que precisava de outro choque de cafeína. Depois de arrumar uma xícara, ele sentou-se em frente a Tiffany e esticou as pernas. Tomou sua bebida, saboreando o calor e o sabor amargo, antes de soltar: — Você provavelmente não vai acreditar em mim, mas estou aqui para ajudá-la. Meu objetivo é levar você de volta para Houston, para sua família e sem a polícia envolvida de qualquer maneira. Uma expressão de pânico cruzou seu rosto. —Por favor, eu não posso ir para casa. —Ela olhou para Sunny e implorou: —Você prometeu que eu não teria que voltar! —Eu prometi, e eu quis dizer isso. —Assegurou Sunny. Olhando para ele, ela explicou: —Depois de ouvir o que ela tem a dizer, você vai entender por que ela não quer ir para casa. Certo que ele estava prestes a descobrir mais uma camada de merda que tornaria sua vida ainda mais difícil, ele recostou-se em sua cadeira. —Bem... vamos ouvir isso. Tiffany correu o polegar para cima e para baixo na sua lata de Sprite, movendo a condensação ao redor enquanto seu lábio inferior tremia e suas bochechas flexionavam ritmicamente. —Eu não sei o que estava pensando quando me envolvi com aquele psicopata. No começo, foi emocionante, sabe? Meu coração estava sempre acelerado quando eu estava com ele, e ele era tão diferente de todos os outros garotos que namorei. —Ela fechou os olhos. —E então ele me mostrou o monstro que era. —Você matou aquele monstro. —Ele comentou. —Ele não pode mais machucar você.


—Oh, sim, ele pode. —Ela insistiu. —Ele sabe coisas sobre mim e minha família. Coisas que vão matar todos nós! —Ela começou a chorar. —Foi a única razão pela qual concordei em encontrá-lo novamente depois do jeito que ele me espancou na última vez que o vi. Ele disse que se eu não fosse encontrá-lo, ele iria ligar para o Departamento de Imigração e denunciar toda a minha família. Ele disse que minha tia e meu tio seriam deportados, e minha mãe iria para a prisão perpétua. Ele olhou para Sunny, que estava sentada sem demonstrar nenhuma expressão antes de perguntar a Tiffany: —O que ele contou sobre sua família? Tiffany enxugou os olhos. —Ele tinha fotos da minha mãe quando ela era mais jovem. Ela estava com uniforme do exército aprendendo a usar armas e facas. Havia fotos da minha mãe com cabelos escuros e um lenço na cabeça. Juro por Deus que parecia que ela estava no Afeganistão ou no Irã. —Ela fungou alto e balançou a cabeça. —Não fez nenhum sentido para mim. Minha mãe é a presidente da associação de pais e mestres! Ela era uma mãe da turma14 quando eu era pequena. Ela fazia cupcakes e levava caixas de suco e fatias de maçãs. Nós não temos armas em nossa casa. Somos apenas pessoas normais! A frequência cardíaca de Kostya aumentou. Foi a mãe de Tiffany quem trouxe o dossiê sobre Nikolai e os outros para Houston? Foi ela quem o deu ao Eric? Ela era uma ex-agente? KGB? FSB? —O que aconteceu depois que ele te mostrou as fotos? Onde você estava?

14

Um pai ou mãe da sala (também conhecido como pai da turma) facilita a comunicação entre os pais e o professor, a administração da escola e / ou a organização de pais e professores (PTO) e apoia o professor nas necessidades que possam surgir.


—Eu o encontrei no Stripes. Estávamos estacionados nos fundos, onde estava escuro. Depois que joguei as fotos nele, ele me bateu e depois me algemou. Ele tinha uma arma! O psicopata ficava me dizendo que me mataria se eu fizesse algum barulho ou tentasse pedir ajuda. Ele me levou para dois lugares diferentes, um motel barato com manchas em toda a cama e tapete e, em seguida, para a casa móvel, onde me contou sobre seu filho. —Qual era o plano dele? —Ele ia me usar como isca para atrair vocês. —Nós? Eu? —Ele tocou seu peito. —Ou Nikolai? —Todos vocês, eu acho. Ele disse que minha mãe iria pedir ajuda a vocês e eles mandariam você me procurar. Ele iria sequestrálo e levá-lo para encontrar alguém. Algum cara com nome de bicho. —Scorpion(escorpião)? —Ele adivinhou. —Sim. Eu acho. —Ela limpou o rosto cheio de lágrimas. — Ele ficava me dizendo que tinha um acordo e me mostrou todas as suas identidades falsas. Eu as peguei e coloquei na minha bolsa quando ele estava dormindo depois que ele me fez... —Sua voz sumiu quando ela fez uma careta, e ele entendeu o que ela não queria dizer. —Foi assim que a luta começou na cozinha ontem à noite. Ele percebeu que o envelope havia desaparecido. Ele me bateu de novo e eu perdi o controle. Peguei a faca e, bem, você sabe. —Eu sei. —Ele murmurou. —Ele disse alguma coisa sobre as pessoas que lhe deram um acordo? —Só que ela era uma federal. —Tiffany fungou e pegou um guardanapo de papel do cestinho no meio da mesa. Ela limpou o nariz e disse: —Aparentemente ela sabe tudo sobre todos os


criminosos da cidade. Ele disse que você estava no topo da lista dela. —Estou no topo de muitas listas. —Ele respondeu, nem um pouco incomodado por essa ameaça. —Ele disse mais alguma coisa? Há algo que você descobriu com ele que possa me ajudar a encontrar as pessoas que querem ferir sua família? Ela balançou a cabeça. —Isso foi tudo o que ele me disse antes... —Sim. —Ele disse, sabendo que ela queria dizer antes de matá-lo. —Eu cuidei disso. Você não precisa se preocupar. Sunny vai ajudá-la a criar um álibi que funcione. —Nós temos trabalhado nisso. —Assegurou Sunny. —Você tem problemas suficiente para lidar, então deixe-me cuidar de tudo isso. —Com prazer. —Ele terminou seu café em um longo gole, levantou-se e levou a xícara para a pia. —O que quer que você tenha que gastar, eu reembolsarei você. Apenas a mantenha em segurança e escondida o máximo que puder. —Eu vou. —Vamos, garoto. —Ele enfiou a mão no bolso e jogou as chaves para Boychenko. —Você dirige. O garoto pareceu surpreso, mas depois sorriu e correu porta afora. Sunny revirou os olhos ao entusiasmo de Boychenko. —Ele é como um cachorrinho. —Ele já está domesticado. —Disse Kostya com um sorriso. —É um bom garoto. —Acrescentou seriamente. —Podemos confiar nele.


—Espero que sim. —A voz de Sunny tinha aquele tom de aviso, que lhe lembrava que ela não piscaria se pensasse que Boychenko era um risco para sua própria segurança. —Escute. — Ela disse, tocando o braço dele enquanto o seguia até a garagem. — Eu tenho que fazer um trabalho freelancer. Estou indo encontrar Fence. Fence era um dos profissionais. Ele era seu especialista em falsificações, venda e aquisições de bens roubados e outros trabalhos similares. —Para a menina? —Ele perguntou, certo de que era a única razão pela qual Sunny iria procurar sua ajuda. Ela assentiu. —Temos um problema que precisamos resolver o mais rápido possível, mas ela não tem idade suficiente para fazê-lo sem a assinatura da mãe. Preciso de uma identidade falsa para ela. Apenas algo para aumentar a idade dela para dezoito anos, para que não nos incomodem na clínica. —Clínica? Ela está doente? Sunny sacudiu a cabeça. —Não esse tipo de clínica. E então ele entendeu. —Ah, entendo. A aparência da pobre garota fazia sentido agora. Grávida, raptada, estuprada, espancada – ela tinha sofrido demais. Ela queria uma pausa, queria fugir desse período horrível de sua vida e começar tudo de novo. —Se você não conseguir o que precisa com Fence, me avise. Existem outras opções na cidade. Elas são limpas e seguras. — Acrescentou ele. —Não são clínicas clandestinas que fazem um péssimo trabalho e que mais parecem um show de horrores.


—Vamos resolver isso. —Ela disse a ele. —Eu só queria que você soubesse que eu estava indo na sua concorrência. Não queria que isso machucasse seus sentimentos. —Engraçadinha. —Ele resmungou e se afastou dele. —Mantenha-me informado. Avise se precisar de ajuda. —Tenha cuidado, Kostya. Quando ele deslizou para o banco do passageiro, olhou para Boychenko. —Se você estragar meu carro? Se for parado? Se fizer alguma coisa estúpida? Você vai conhecer meu cemitério. Compreendido? Boy engoliu em seco e colocou o carro em marcha a ré enquanto a porta da garagem se abria lentamente. —Sim.


CAPÍTULO DEZESSETE Depois de deixar Boychenko no Samovar com instruções explícitas sobre o que dizer a Nikolai, Kostya foi direto para a casa de Tiffany. Do lado de fora, nada parecia errado. Ele tentou a porta da frente e encontrou-a destrancada. Cautelosamente, entrou na casa, puxando sua arma e ouvindo atentamente. Se a mãe de Tiffany fosse uma agente secreta, ela era perigosa. Lá dentro, a sala de estar parecia exatamente como da última vez que esteve lá. Havia uma revista na mesinha de centro, uma xícara de chá pela metade ao lado, em um porta-copo. A casa parecia vazia e muito quieta. Ele deu um passo deliberado em frente e depois outro. Pensou se deveria verificar os quartos ou a cozinha primeiro, antes de se decidir por ir para a cozinha. No instante em que sua bota atravessou a entrada da cozinha Ele sentiu e ouviu o inconfundível farfalhar de plástico. Estava colado no chão, no teto e nas paredes. Ele usou a mesma configuração em várias ocasiões para facilitar a limpeza. Parecia que alguém teve a mesma ideia para limpar sua morte. E esse alguém era a mãe de Holly. Vestindo calças e blazer brancos, Frances parecia uma rainha de gelo sentada à mesa da cozinha. Ela parecia insensivelmente fria, com as costas rígidas e retas e sua expressão descontente o avisou para não foder com ela. Agarrando nas mãos com luvas brancas, uma pistola equipada com um silenciador, ela estava procurando um motivo para puxar o gatilho. —Estava esperando por você. —Ela disse em russo perfeito. Tendo apenas a ouvido falar inglês com aquele leve sotaque do Texas, ele ficou francamente impressionado.


—Eu teria corrido de volta de Galveston se soubesse. —Ele respondeu em sua língua materna, guardando sua arma e abrindo a jaqueta para mostrar a ela que era a única arma de fogo que ele tinha acima da cintura. —Tornozelo? —Ela perguntou, mantendo a arma apontada para o peito dele. Ele levantou a calça jeans para mostrar a ela o que tinha amarrado em cada bota. Ela não pediu para ele remover as facas ou armas. Apenas gesticulou para a cadeira em frente a ela e ele a ocupou. —Então. —Disse ele, esticando as pernas e pegando no bolso o seu cigarro e isqueiro. —Então. —Frances repetiu, observando-o acender. Ela zombou um pouco. —Você tem mesmo que fumar? —Meu último cigarro. —Disse ele, batendo as cinzas sobre a mesa e notando a pasta na frente dela. —Acho que é tradição, não é? Um último cigarro para o homem condenado? —Eu não faço ideia. Meus alvos raramente têm a chance de ver meu rosto e muito menos ter tempo de pegar um cigarro. —Eu acredito nisso. —Ele respondeu, exalando uma lufada de fumaça. —De que outra forma você poderia ter passado tanto tempo sem ser detectada? —Eu sobrevivi por muito tempo sem ser detectada porque sou muito boa. —Frances respondeu. —Eu escrevi o livro que você usou para se tornar o homem que é hoje. De certa forma, eu fui mais mãe para você do que Nina.


Ele endureceu com a menção a sua mãe. Sua observação cortou-o como uma navalha, ferindo a parte sensível e vulnerável dele. Não mordendo a isca, perguntou: —Vocês trabalharam juntas? Ela assentiu. —Uma ou duas vezes. O território deles era a Europa e o meu era aqui. —Há quanto tempo você está aqui? —Eu vim para cá quando era uma criança. É a mesma história que a maioria de nós tem. Fui escolhida do orfanato e levada para um centro de treinamento especial. Depois de alguns anos, eles me trouxeram para cá, onde cresci tão americana quanto uma torta de maçã. —O disfarce perfeito. —Ele meditou. —E depois que a KGB entrou em colapso? Você começou a trabalhar para a FSK e a FSB? —Por um tempo. —Ela admitiu. —Mas depois saí em meus próprios termos. Por causa de Holly? —Tudo o que faço agora é por causa de Holly. —Ela respondeu com sinceridade. —Incluindo me matar? —Ele perguntou, seu olhar fixo na ameaçadora Grach apontada para seu peito. —Eu ainda não decidi. —Ela olhou para ele com desconfiança. —Não tenho certeza se você realmente se preocupa com Holly ou se está usando-a para se vingar do Maksim. —Por quê? —Ele perguntou, genuinamente confuso. Sua expressão pungente hesitou. —Você não sabe? —Sobre Holly ser sua filha? Sim eu sei disto.


—Não, não isso. —Disse ela com um suspiro. Empurrou a pasta para ele. —Leia. Imaginando o que não sabia sobre Maksim, ele pegou a pasta e abriu-a. A pilha de fotos no topo tinha toda a sua atenção. Ele as folheou, cada foto fazendo seu estômago se revirar mais forte e dolorosamente. Holly. Maksim. Nikolai. Vivian. Os filhos de Maksim com sua falecida esposa. Yuri e Ivan com as esposas deles. Dimitri segurando sua filha. Artyom andando de mãos dadas com a filha de Chess pelo zoológico. Uma bela jovem loira em roupas dos anos 80. E então finalmente sua própria família. Minha mãe. Meu pai. Eu. Cada foto tinha um número rabiscado em vermelho. Os que estavam mortos, seus pais e a linda loira, tinham grandes marcas vermelhas de X em seus rostos. As outras fotos estavam numeradas. Vivian tinha o número seis. Nikolai tinha o número cinco. Holly tinha o quatro. Frances tinha o três. Maksim o dois. E eu sou o número um. —A quem que pertence esta lista? —Ele perguntou, seu olhar demorando no rosto de Holly. —Pensei que você já soubesse isso agora. —Frances comentou com desapontamento. —Eu lhe enviei todas as pistas que precisava. Claro. —Os dois arquivos eram seus? Aquele que chegou à minha casa no mês passado e o arquivo que Eric recebeu? Ela assentiu. —O dossiê que Rada deu a Eric manteve o detetive ocupado perseguindo becos sem saída por um longo tempo. —Então, Marco estava certo sobre os pais de Tiffany. — Disse ele, jogando mais cinzas sobre a mesa. —Eles eram seus agentes?


—Eu os herdei de um antigo colega. Eles queriam sair da vida e eu fiz acontecer. Entregar ao Eric aquele dossiê foi a última coisa que Rada fez por mim. Ele aproveitou esse detalhe. —Para você? Mas ela está trabalhando para outra pessoa agora? —Sim. Não por sua própria escolha. —Acrescentou ela. — Ela estava sendo chantageada. —Por? —A mesma pessoa que está manipulando Marco. —E quem é ele? —É complicado. —Sempre é na nossa linha de trabalho. —Onde está Marco? Você tem a localização dele? —Em um necrotério em College Station. —Disse ele, olhando para as fotos novamente. —Tiffany puxou a mãe dela. — Ele apontou para o pescoço. —Deixou uma bagunça para trás. Ela estreitou os olhos. —O fogo? Foi você? Ele assentiu. —Você fica de olho nas notícias. —Um corpo? Incêndio provocado? —Ela encolheu os ombros. —Ele entrou no meu radar. —A menina está segura, caso você esteja se perguntando. —Eu estava. A mãe dela está muito preocupada. —Você moveu eles?


—E os enviei para um esconderijo. Eu devia pelo menos isso a eles. Você quer reunir Tiffany com sua mãe? —Não. —Ele respondeu com firmeza. —Ela disse claramente que não quer ver sua família tão cedo. —Você a culpa? É sempre difícil para as crianças descobrirem coisas assustadoras sobre seus pais. —Foi por isso que você não contou a Holly quem é o pai dela? Quem é você? Frances olhou para longe, seu olhar pousando no chão enquanto a tristeza escurecia seu rosto. —Ela nunca me perdoaria e eu não posso perdê-la. —Eu não quero perdê-la também. —Ele admitiu. —Mas ela merece saber o que eu sou e o que eu fiz. —Ainda não. —Frances disse, colocando-o no lugar com seu olhar frio. —Nós temos que passar por isso. —Ela acrescentou, apontando para a pasta. —Antes de dizer a ela a verdade. Se você fizer isso, ela vai fugir e teremos mais dificuldade em mantê-la segura. Se você se importa com ela. —Ela fez uma pausa. —Se você a ama, vai esperar. Não querendo falar com Frances sobre seus sentimentos por Holly, ele simplesmente concordou com a cabeça antes de voltar sua atenção para a pasta à sua frente. —Quem estava manipulando Marco? Para quem ele achava que estava trabalhando? —Era um falso agente da DEA. —Ela se inclinou para frente e vasculhou as páginas e fotos na pasta que ele ainda não tinha olhado. Ela encontrou a foto que estava procurando e colocou na frente dele. —Slava Gruzin. Ela estava no Canadá com um nome falso ―Sally Green‖, desde os anos noventa.


—Eu a conheço. —Disse ele, olhando mais de perto. —Ela era mais jovem, obviamente, mas eu me lembro dela vindo jantar em nossa casa quando eu era uma criança. —Sentindo-se estranhamente com saudades de casa em ver um rosto ligado a sua infância, ele olhou para Frances. —Ela ainda está por ai? Ela balançou a cabeça. —Lidaram com ela há duas noites. —Você? Ela balançou a cabeça. —Eu sou muito velha para assassinatos. Eu tenho um contratado que chamo para trabalhos como esse. —Local? —Ele perguntou, pensando que ela usou um dos Profissionais. —Ele costumava ser. —Ela respondeu, inclinando-se de volta em sua cadeira. Pegando sua sugestão, ele perguntou: —Gabe Reyes? Era por isso que Gabe quis falar com ele? Por que pediu ao Nate para lhe dar os detalhes de contato? Para dar-lhe um aviso sobre o trabalho que ele faria em seu território? —Sim. Suas taxas são mais altas que a maioria, mas ele vale a pena. E está limpo sobre o seu trabalho. —Ela adicionou, estreitando seu olhar. —Aquele fogo foi patético. —Você não estava lá. Eu não tive muito tempo para limpar a cena. Eu tive que dar um jeito. —Ele acenou com a mão. — Funcionou bem. Poucos danos colaterais. —Sua falta de planejamento é surpreendente. Como nunca gostou de receber críticas graciosamente, ele respondeu: —Sua falta de transparência vai matar Holly.


Ela franziu os lábios. —Você não pode se sentar aí e me dizer como proteger minha filha. —Você não é a única que quer protegê-la. —Estou ciente disso. —Disse ela, colocando a pistola na mesa. —E é por isso que você ainda está respirando. Ele jogou a pasta. —Estou cansado desses jogos. Apenas me diga o que diabos preciso saber e vamos descobrir como vamos proteger Holly. Frances inspirou profundamente antes de exalar devagar. Ela pegou a arma baixando-a para o colo, mudando a mira do peito para o pau dele. Ele não estava entusiasmado com isso, mas achou que era melhor do que uma bala no coração. —Você não vai gostar da história que eu vou contar. —Ela começou. —Há uma chance muito real de morrermos. Você e eu. —Ela disse. —Eu por algo que fiz anos atrás e você pelos pecados de seus pais. —Bem, você terá que ser mais específica porque eu vi os arquivos dos meus pais e eles cometeram vários pecados pela pátria. —Sim, mas este, em particular, foi o pior. —Ela respondeu. —Não está em nenhum dos arquivos, mas foi o que começou tudo isso. —Ela apontou para a pasta. —A garota. A loira. Ele tirou a foto dela da pasta. —O que tem ela? —Olhe para ela. Ele olhou. Ele realmente olhou para ela. E então soube. — Essa é a mãe de Holly? Sua mãe biológica?


Frances assentiu. —Kira Gurianova. Ela era uma jovem agente. Nova, mas muito boa. Ela tinha talento natural para esse tipo de trabalho. Teria sido ótima algum dia. —Mas? —Mas ela cometeu o erro de se apaixonar por meu irmão. —Seu... irmão? —Kostya finalmente fez a conexão. —Você é a irmã de Maksim. Você é a tia de Holly. Tia de Nikolai. Ela assentiu. Seu olhar ficou distante. —Depois que nossos pais morreram, fomos separados quando crianças. Maks acabou no orfanato de meninos e eu fui ao orfanato de meninas. Fui arrancada muito rapidamente e enviada para o treinamento. Ele teve um início de vida mais difícil. Muito parecido com Nikolai. —Ela adicionou. —É por isso que eles são tão parecidos. Não em suas relações com as mulheres, felizmente, mas de todas as outras formas. —Kira era uma isca para o seu irmão? —Começou assim. Ele estava atrás dela em um instante. Sempre foi assustadoramente bom em desmascarar mentirosos. Ele sabia o que ela era e o que queria desde o primeiro encontro. Ela mexeu com ele. Antes que percebessem, estavam apaixonados. Amor verdadeiro. —Enfatizou. —Ele a amava de uma maneira como nunca se importou com outras. Acho que ele acabaria se divorciado de Galina por Kira. Foi muito sério. —O que teria sido um problema para seus manipuladores. — Ele murmurou conscientemente. —Por que eles estavam atrás de Maksim? Aquele era um momento selvagem em nosso país. Politicamente. —Ele esclareceu. —Pelo que li dos arquivos daquela época, a máfia não estava no topo da lista de prioridades para nossas agências de inteligência.


—Você está certo. Não estava. Isso não era sobre política ou segurança nacional. Era uma vingança, pura e simplesmente. —Entre? —Maks e Igor Rybak. Ele piscou. —O cabeça da KGB? O homem que treinou pessoalmente meus pais? —E a mim. —Ela disse. —E Kira. E muitos outros. Percebendo o quão profundas as conexões entre Maksim e sua própria família eram, ele se sentiu subitamente desequilibrado. —Qual era o motivo da vingança dele? —Uma mulher. —Ela respondeu com tristeza. —Parece ser o tema recorrente na vida do meu irmão. Os detalhes não são importantes, mas foi ruim o suficiente para que Igor passasse a maior parte da vida tentando machucar meu irmão. Kostya tinha certeza de que os detalhes eram importantes, mas receberia essas respostas depois. —Mas ele não sabia que você era a irmã de Maksim? Ela balançou a cabeça. —Não havia arquivos sobre nós quando crianças. Depois da guerra, houve coisas mais importantes do que fazer a papelada corretamente. Não encontrei Maks de novo até os meus vinte e poucos anos. A essa altura, ele tinha uma história sangrenta e violenta, e Igor fazia parte disso. Eu mantive minha boca fechada e me certifiquei de nunca sermos descobertos como irmãos. Fiz tudo o que pude para ajudar Maks a criar seu império e ele fez o que pôde para me ajudar quando eu precisei. Voltando para a foto de Kira, ele disse: —Igor sabia que Maksim não seria capaz de resistir a uma beleza como essa.


—Sim. Ela não foi cuidadosa, no entanto. Ela engravidou e, assim que seus manipuladores perceberam sua condição, eles a tiraram do campo. Ela foi mantida em isolamento e interrogatório por algumas semanas antes de eles a enviarem para fazer um aborto. —Isso obviamente não aconteceu. —Ele comentou. —Ela matou os agentes que a escoltavam e escapou. Maksim colocou-a em diferentes esconderijos, manteve-a feliz e saudável enquanto carregava seu bebê. Eu estava trabalhando em Moscou na época, fazendo contratos de energia e negociações entre os governos russo e americano. Mantive meu ouvido atento e tentei manter Maksim informado de qualquer acontecimento em relação a Kira. —Se a Central a quisesse, eles a encontrariam eventualmente. Você, de todas as pessoas, deveria saber disso. —Ele disse. —Eles enviaram sua melhor equipe para encontrá-la e eles conseguiram. Parecendo ansiosa de repente, ela estendeu a mão para o maço de cigarros que ele havia deixado lá. Ele deslizou seu isqueiro na direção dela, que o acendeu, seus dedos finos e elegantemente enluvados trabalhando no isqueiro com uma espécie de elegância graciosa que ele raramente tinha visto. Ela tragou, seus olhos fechando brevemente, e depois expirou longa e lentamente. —Recebi uma pista de um amigo de dentro e saí para encontrá-la e movê-la. Maksim estava muito longe, então eu sabia que tinha que ser a primeira a chegar lá. Mas houve uma tempestade. —Explicou ela. —Uma nevasca terrível. Isso me atrasou. Quando cheguei ao esconderijo, já era tarde demais. Seus guardas estavam mortos. A enfermeira e a parteira que estavam com ela estavam mortas.


—E Kira? —Um tiro no coração e na cabeça, morta no chão com um berço vazio. —Ela fechou os olhos e engoliu em seco. —Ela tinha entrado em trabalho de parto no início do dia. Todos os equipamentos e suprimentos para o parto foram utilizados. Ainda havia uma pilha de roupa suja no canto da sala. Ela provavelmente estava fraca demais para lutar ou fugir. —E Holly? —Ele perguntou, com o coração na garganta. —Eu ouvi um barulho na cozinha. —Disse Frances, com os olhos brilhando de lágrimas. —Eu segui-o e encontrei a porta dos fundos aberta. Estava batendo contra a moldura por causa do vento. Havia neve se acumulando no chão da cozinha. Fui fechar a porta e então ouvi um som estranho. Era... era como um gatinho. Apenas suave e fraco. —Sua mão estava tremendo quando levou o cigarro à boca para outra tragada. —E foi quando eu soube o que eles tinham feito. Eles jogaram o bebê no frio para morrer. —O quê? —Ele perguntou, horrorizado com a crueldade. — Só a jogaram na neve? —Eles a colocaram na lata de lixo. Apenas a deixaram lá dentro como um monte de lixo. —Ela bateu as cinzas na mesa. — Eu a peguei e a coloquei dentro do meu casaco. Entrei no carro, coloquei ela dentro da minha blusa, contra a minha pele e fechei o casaco sobre ela e me afastei o mais rápido que pude. Levei-a para um hospital em que podia confiar, disse-lhes que ela era minha e nunca mais saí do seu lado. Foi bastante fácil conseguir os documentos que eu precisava para levá-la para casa como minha filha. Kostya estava sem palavras. Seus negócios eram confusos e, às vezes, coisas terríveis eram feitas, mas torturar um bebê jogando-


o para morrer no frio? Era algo que ele não conseguia entender. Era uma crueldade que ele não entendia. —Como Maksim reagiu? —Ele perguntou. —Da mesma forma como sempre faz. Violência. Derramamento de sangue. —Ela apagou o cigarro na beira da mesa e guardou a bituca no bolso. —Era uma época politicamente volátil, e ele usou seus contatos para se certificar de que Igor estivesse acabado. —Ele o matou. —Disse Kostya, tentando lembrar quando, exatamente, Igor havia morrido. —Era fevereiro, não era? Quando ele morreu? Ela sorriu ironicamente. —Você realmente acha que meu irmão iria deixar o homem que matou sua amante e tentou matar seu bebê apenas morrer? Você acha que ele é misericordioso? Ele ficou frio ao pensar em até que ponto Maksim iria para se vingar. —Tortura? Ela assentiu. —Por um tempo. —E depois? —E então Maks o enviou para um lugar onde ele seria esquecido. Ele finalmente reuniu as pistas que ela lhe enviou. —A impressão digital! —Eu sei que uma das suas aranhas entrou no banco de dados da Interpol. Igor foi apagado da base de dados anos atrás. Ele é um fantasma. —Mas ele é o prisioneiro da Black Dolphin que você queria que eu encontrasse.


—Ele era o prisioneiro da Black Dolphin. —Era? —Ele repetiu, seu coração acelerando algumas batidas. —Ele está morto ou escapou? —Escapou. —Como? Essa prisão é inescapável. —Não quando você está morto. —Ela respondeu. Estendendo a mão, tocou a foto de Slava. —Ela finalmente o localizou na prisão há alguns meses. Encontrou um médico trabalhando na instalação que ela poderia subornar. Ela o usou para Igor ser declarado como morto após um ataque cardíaco que ele provavelmente induziu com medicação. Uma vez que Igor estava no necrotério da prisão, foi fácil para ela levá-lo para o mundo real. Ele olhou para as fotos e seus números. —E esta é a lista de alvos dele. —Sim. Ele está matando todos que o traíram ou abandonaram. Tentando pensar de forma crítica e lógica, ele disse: —Igor está velho agora. Esteve em um buraco por quase trinta anos. Ele está acabado física e mentalmente. —Ele olhou para a foto de Slava. —E sua única aliada está morta. —Não. —Ela respondeu. —Ele encontrou outros aliados. —México. —Disse ele, sentindo aquele frio percorrer novamente sua espinha. Não é de admirar que não tenham conseguido localizar Lorenzo. —O inimigo do meu inimigo. —Respondeu ela. —Ambos são homens sem nada a perder.


Preocupado com o caos que Lorenzo e Igor poderiam causar juntos, ele afirmou o óbvio. —Temos que encontrá-los. —Eu tenho Gabe trabalhando nisso. Ele obteve algumas informações de Slava, mas não tenho certeza do quanto foi útil. Suspeito que vai farejar Lorenzo mais rápido que Igor. —Um nos levará ao outro. —Ele começou a empilhar tudo de volta na pasta. —O que você está planejando fazer? —Trabalhar com meus contatos. Convencer meu irmão a ficar em Moscou. Manter Holly em segurança. —Maksim está querendo vir aqui? —México. —Ela respondeu com um aceno de cabeça. —Ele quer ser aquele que finalmente matará Igor. —É exatamente o que precisamos. —Ele resmungou, pensando nos problemas que Maksim poderia causar no sul. Ele era tão teimoso quanto Nikolai, talvez até pior. Assim que ele começou a fechar a pasta e colocá-la em sua jaqueta avistou a foto de sua mãe. Lembrando o que Frances dissera antes sobre os pecados de seus pais, ele lentamente olhou para ela. Ela tinha um olhar triste no rosto, seus olhos sem brilho, escurecidos pelo arrependimento. Ela balançou a cabeça, como se estivesse lendo sua mente. —Você não precisa perguntar se não está pronto para ouvir. Seu coração clamou em seu peito, tornando difícil para ele respirar. No entanto, perguntou: —Qual equipe eles mandaram atrás de Kira? —Seus pais. —Ela disse depois de um segundo de pausa. — Nina e Arkady.


Sentindo-se tonto, ele se levantou abruptamente e se afastou da mesa. Guardou a pasta, os cigarros e o isqueiro. Com a boca seca, disse: —Estarei com Holly esta noite se precisar me encontrar. Frances não tentou impedi-lo de sair ou dizer que não o queria perto de Holly. Talvez ela entendesse mais do que ele suspeitava. Talvez ela o visse como uma mãe veria seu filho. De repente, ele era um garotinho cuja vida tinha sido completamente alterada pelo conhecimento de que seus pais haviam tentado matar o bebê que crescera para ser a mulher que ele amava. Ele precisava ver Holly. Ele precisava abraçá-la e amá-la. Ele precisava estar com alguém que se importasse com ele, que sempre fora real e sincera. Já em seu carro, ele passou seus dedos trêmulos pelo cabelo. Havia outra coisa que Frances não tinha dito a ele. Era uma resposta que ele não estava pronto para ouvir. Se seus pais mataram Kira, Maksim matou sua mãe e pai? Olhando para trás para a casa, ele sentiu como se levasse um soco em seu estômago. Ou ele estivera sentado em frente à mulher que tinha assassinado seus pais?


CAPÍTULO DEZOITO —Você viu a maquete do salão de festas e a estimativa de custo para a festa de gala? —Savannah perguntou quando entrou no meu escritório e se jogou no sofá. —Eu vi. —Eu disse, meu olhar fixo na tela do computador à minha frente. Enquanto eu estava no Samovar, houve uma pequena desavença entre uma cliente e uma das nossas mais novas cabeleireiras. Gesticulando para a tela, perguntei: —Você estava lá quando esta cliente reclamou? —Sim. —Ela disse com um revirar de olhos. —Foi uma besteira absoluta. Nisha estava supervisionando Katie. Conversaram com essa garota sobre a cor que ela queria e quantas seções seriam necessárias para alcançar o resultado. Ouvi Nisha e Katie sugerirem um tom mais natural de pêssego ou caramelo para as luzes, mas a cliente insistiu em loiro platinado! —Ficou realmente tão ruim quanto o comentário de merda dela me fez acreditar? —Relendo o comentário desagradável que havia sido deixado em nossa conta na rede social, eu me preocupei que a cliente tivesse ficado com uma coloração horrível. Ela balançou a cabeça. —As luzes ficaram lindas. Katie fez um ótimo trabalho ao dar a cliente o que ela queria, ao mesmo tempo em que equilibrava a aparência geral de seu cabelo. Não é culpa de Katie que a cliente dela não ouviu o conselho que recebeu. Aqui. —Ela puxou o celular do bolso da saia e jogou para mim. — Veja as fotos que tirei do cabelo dela. Parece perfeitamente bom. E estava. Parecia muito bom, até mesmo bonito. Não era exatamente prata, mas estava perto. Com apenas uma seção não


havia como mudar o cabelo de castanho-escuro para prata, mesmo com um balde de produtos químicos e calor. —Parece muito bom. —Concordei, tentando ser o mais imparcial possível. —O que deixou a cliente insatisfeita? —Ela disse que não era da mesma cor da garota da foto no Instagram. Tentei explicar que a garota na foto tinha uma cor de cabelo diferente e que também a garota na foto tinha, tipo, sete filtros juntos. Quem diabos saberia qual a cor real daquelas luzes. —Você quer lidar com isso? —Joguei o celular de volta para ela. —Normalmente, eu faria, mas você estava lá quando aconteceu. —Eu vou lidar com isso. —Gentilmente. —Eu pedi, sabendo como Savannah poderia ficar às vezes. —Sim, mamãe. —Ela respondeu sarcasticamente. —Então, como foi sua pequena missão? —Estranha. —Eu admiti. —O marido de Vivian foi estranhamente acolhedor e concordou em me ajudar a encontrar meu pai. —Bem, acho que é uma coisa boa. —Ela disse desconfortavelmente. —Acho que sim. —Você é uma menina grande. Confio que saberá quando precisar dar um passo atrás. —Disse ela, levantando-se do sofá e encolhendo os ombros. —Você tem algum plano para esta noite? —Tenho que acabar algumas tarefas e depois vou para casa lavar roupa e cuidar das tarefas domésticas. Você?


—Tenho uma reunião sobre a festa de gala para discutir o orçamento. —Ela fez uma careta. —E depois disso, alguns comprimidos de Advil, uma garrafa de Moscato e qualquer coisa que eu possa encontrar na Netflix que ainda não tenha visto. — Sorrindo, apontou para a porta. —Estou saindo. Todas as garotas já foram embora e o salão está fechado. —Eu vou embora em alguns minutos. —Disse, desligando o meu computador. —Ok. Boa noite. —Boa noite. Depois de fechar meu escritório e fazer uma verificação final no salão, ativei o alarme e saí do prédio. Uma vez no carro, abri o aplicativo Waze no meu celular e olhei para o endereço que encontrei anteriormente. Debati alguns segundos antes de tocar na tela e sair do estacionamento. A voz do aplicativo me guiou através dos alto-falantes do meu carro, me dizendo quando e onde virar. Eu diminuí a velocidade quando cheguei ao meu destino e estacionei em frente ao edifício escuro em uma das poucas vagas disponíveis. Pensei em sair e investigar o prédio, talvez tentar a porta da frente, mas meus melhores instintos me alertaram para ficar quieta. Sunrise Sunset estava escrito em amarelo na porta. O logotipo de um sol nascente refletido como um sol poente logo abaixo. Não havia número de telefone. Nenhum site. O lugar não tinha nenhuma presença nas redes sociais. Era definitivamente uma fachada, mas para quê? Algo simples como lavar dinheiro ou algo pior? Eu queria mesmo saber? O que Kostya diria se descobrisse que eu vim aqui esta noite? Que espiei seu telefonema?


Assustada pelo som do meu celular, quase pulei pelo parabrisa. Olhando para a tela, vi o rosto da minha mãe e atendi rapidamente. —Oi, mãe. —Holly, onde você está? Passei pelo salão, mas já estava fechado. —Oh, estou fora resolvendo alguns assuntos. —Eu menti, colocando meu carro em movimento e voltando para a estrada. — Por que você foi ao salão? Você precisa de um corte? —Não, não, não. —Ela respondeu. —Pensei em parar e te fazer companhia enquanto você fechava. —Desculpe! Eu teria ficado até mais tarde se soubesse que você estava indo me ver. —Não se preocupe com isso. Estou voltando para casa. Se você precisar de alguma coisa ou se quiser vir, ficarei acordada por um tempo. —Esta noite não. —Eu disse, passando por um cruzamento. —Eu tenho que lavar roupa e fazer uma limpeza que tenho adiado. Minha casa está uma bagunça. —Bem, se você mudar de ideia... —Eu sei para onde ir. —Tudo bem. Avise-me quando você chegar em casa. —Eu aviso. Boa noite, mãe. —Amo você, Holly. —Também te amo. Depois que desliguei, não consegui afastar a ideia de que minha mãe não estava me contando a verdade sobre sua saúde. Por


que outra razão ela estaria agindo de forma tão estranha? Preocupada com o fato de ela poder estar doente, decidi que passaria a noite seguinte com ela e tentaria arrancar-lhe a verdade. Quando virei para a minha rua, vi o carro de Kostya parado na minha garagem. Meu estômago entrou em erupção com um enxame de borboletas ao vê-lo encostado em seu carro, esperando por mim. Havia algo em sua postura que me preocupou. Ele parecia rígido, quase agressivo no modo como segurava os braços. Parecia um predador pronto para atacar. Quando entrei na garagem, ele voltou para o carro e entrou no espaço vazio do lado direito. Quando saí do meu carro, ele estava esperando por mim enquanto a porta da garagem se fechava atrás de nós. A expressão em seu rosto me preocupou. Ele parecia tão cansado e destruído, com os olhos tristes e o rosto demonstrando estresse. Tocando sua bochecha, perguntei: —Você está bem? Ele se inclinou na minha mão. —Agora estou. —Kostya. —Eu acariciei seu rosto. —O que há de errado? —Tudo. —Ele se inclinou e roçou os lábios em mim. Sua boca procurou a minha e eu me levantei para encontrá-lo, pressionando meus lábios nos dele. Suas mãos caíram no teto do meu carro e ele me pressionou contra a porta, seu corpo duro e quente parecendo tão bom contra o meu. Agarrei-me a ele, puxando sua camisa e aproximando-o ainda mais. Seus beijos selvagens me deixaram sem fôlego enquanto eu me perguntava o que teria acontecido no mundo para deixá-lo tão abalado. —Posso ficar com você esta noite? —Ele perguntou entre beijos febris.


—Sim. Por favor. Suas mãos deslizaram para a minha bunda. Eu estremeci intensamente, meu corpo pulsando com desejo e necessidade. — Posso usar o seu chuveiro? —Só se você deixar eu me juntar a você... Ele me seguiu até a casa, a mão dele na minha. O calor que irradiava do corpo dele incendiou meu corpo, acendendo todas as minhas terminações nervosas e fazendo meu coração acelerar ainda mais. Quando chegamos ao banheiro da suíte master, tínhamos tirado nossos sapatos e ele tinha jogado a jaqueta descuidadamente para uma cadeira no meu quarto. Observei-o tirar o coldre do ombro e guardar a arma na gaveta ao lado da minha. Fiquei um pouco surpresa com as facas que ele tinha escondidas em seu corpo. Por um momento, ele ficou parado ali, olhando para mim. Havia algo tão vulnerável em seus olhos esta noite. Ele parecia ferido. Se eu perguntasse, ele não me contaria o que estava incomodando-o. Eu o conhecia bem o suficiente para saber disso. Então, estendi a mão e acenei para ele se juntar a mim. Seus dedos eram fortes ao redor dos meus. Com um sorriso, o puxei para o banheiro. Soltando sua mão, liguei o chuveiro, ajustando a temperatura da maneira que eu gostava, quente, mas não muito. Quando me virei, ele já havia tirado a camisa. Aproximei-me e agarrei a fivela do cinto, soltando-a lentamente enquanto olhava fixamente para ele. Ele se inclinou e pressionou a boca contra a minha. Seu beijo era gentil, penetrante e eu me derreti nele. Entre beijos febris, nós despimos um ao outro, rindo e achando graça quando ele meio que tropeçou no jeans enrolado em torno de seus tornozelos. Eventualmente, entramos no chuveiro. A água quente e o vapor eram muito bons na minha pele, mas os braços de Kostya me abraçando e me puxando contra ele eram


ainda melhores. Estremeci quando ele beijou uma linha lenta e sinuosa pelo meu pescoço. —Senti sua falta hoje. —Ele disse suavemente, sua respiração fazendo cócegas na minha orelha. —Eu quis ver você tantas vezes. —Você deveria ter ido ao salão ou me telefonado. Eu teria te encontrado em qualquer lugar que você quisesse. Ele beijou minha têmpora antes de se afastar de mim. — Estive em Galveston na maior parte do dia. É um longo caminho para você dirigir só para me ver. —Eu teria feito isso. —Eu sei que teria. —Ele pegou um sabonete entre as mãos. —Foi por isso que eu não liguei. Eu fiz uma careta para ele. —Que tolice. —Não, não foi. A maneira como ele disse isso fez meu estômago estremecer. O que quer que ele tenha feito desde que deixou o salão na noite anterior obviamente tinha sido muito perigoso. Pela sua expressão abatida, isso o afetou. Tocando seu peito, olhei para ele. —Eu sei que você não pode me dizer o que estava fazendo, mas preciso que você saiba que eu nunca quebraria sua confiança. Espero que um dia possamos chegar a um lugar onde você possa me dizer a verdade, onde possa desabafar e saber que nunca vou contar a uma alma viva. Sua expressão se suavizou. Inclinando-se, ele me beijou carinhosamente. —Holly, confio em você. Se eu pensasse que contar tudo tornaria as coisas mais fáceis para nós, eu faria em um piscar de olhos. —Mas?


—Mas, agora, a única coisa que nos mantém a salvo é o meu silêncio. —Eu entendo. —Sussurrei contra seus lábios e o beijei novamente. Esse parecia ser o fim de sua disposição para conversar. Suas mãos ensaboadas começaram a vagar pelo meu corpo, delineando as curvas dos meus seios e quadris. Eu também não queria mais falar. Agarrando seus ombros, fechei meus olhos e saboreei a sensação de suas mãos deslizando sobre a minha pele. Diferentemente da noite passada, nós estávamos indo devagar agora. Explorando. Sentindo. Tomando o sabonete dele, comecei a ensaboar sua pele, movendo minhas mãos sobre a pele tatuada. Seu corpo magro estava duro sob as pontas dos meus dedos, cada músculo, cada tendão perfeitamente delineados. Estudei a arte decorando sua pele, imaginando se algum dia descobriria o que cada uma dessas peças significava. Deslizando minha mão por seu abdômen plano, eu não perdi tempo bancando a tímida. Agarrei seu pau duro, acariciando-o da base à ponta e provocando um gemido animalesco dele. Ele empurrou na minha mão e eu sorri triunfantemente, levantando-me para mordiscar seu lábio inferior. Ele gemeu novamente e inalou uma respiração instável quando minha outra mão desceu pela coxa e segurou seu saco. —Holly... —Relaxe. —Pedi, querendo dar-lhe algum alívio de toda a tensão que ele carregava. Acariciei seu eixo para cima e para baixo, o sabonete escorregadio facilitando o movimento. Investi minha língua contra a dele, pedindo-lhe para se soltar e ele assim o fez. Ele pressionou minhas costas contra o azulejo e empurrou na minha mão enquanto devorava minha boca, deixando-me sem fôlego.


Segurou minha bunda em uma palma e apoiou a outra contra o azulejo atrás de mim, se preparando. Acariciando-o cada vez mais rápido, o incitei com um sussurro: —Goze para mim. Ele rosnou meu nome antes de capturar minha boca em um beijo que me deixou tonta. Gozou na minha mão enquanto eu diminuía o ritmo com delicadas carícias. Abraçando-me, ele me arrastou de volta para baixo da água. Sua boca encontrou a minha novamente enquanto a água escorria pelos nossos corpos, enxaguando o sabão agarrado a nós. Nós não nos incomodamos com as toalhas quando saímos do chuveiro. No fundo da minha mente, encolhi-me com o pensamento de molhar meu edredom, mas no momento, não me importei muito. Tudo que eu queria era Kostya. Em cima de mim. Na minha cama. Sua boca estava na minha enquanto me guiava de costas pelo quarto. Quando a parte de trás das minhas coxas bateram na beira da cama, ele me deu um pequeno empurrão e acabei deitada de costas. Rindo e tentando alcançá-lo, eu me empurrei mais para cima na cama. Ele desceu em cima de mim, seus lábios batendo contra os meus antes de enfiar sua língua entre eles. —Konstantin. —Suspirei seu nome e arqueei com seu toque. Suas mãos eram fortes e seguras enquanto se moviam sobre o meu corpo, deslizando ao longo das minhas curvas e acariciando-me gentilmente. Ele traçou uma linha de beijos suaves e delicados ao longo do meu pescoço até os meus seios. Ele permaneceu lá, seus lábios nos meus mamilos até que eles doessem. Agarrei seus ombros e arrastei meus dedos pelo cabelo, arranhando minhas unhas sobre o couro cabeludo e fazendo-o gemer. —Abra as pernas. —Ele quase ordenou. Um arrepio de antecipação percorreu meu corpo enquanto eu seguia sua instrução, afastando minhas coxas e apoiando meus calcanhares na beira da


cama. Ele beijou uma linha de provocação no interior de cada coxa antes de acariciar sua boca contra minha boceta necessitada. Seus dedos me separaram, me deixando exposta ao seu olhar faminto. No primeiro toque de sua língua, deixei cair minha cabeça na cama e fechei meus olhos. Ele foi gentil no início, sua língua explorando e mergulhando em mim. Eu tentei inclinar meus quadris e direcionar a atenção para o meu clitóris, mas ele não estava disposto a me conceder isso. Suas mãos fortes seguraram minhas pernas abertas e meus quadris para baixo, forçando-me a ser paciente. Toda a tensão e preocupação que eu carregava nos últimos dias se dissipou de mim. Sua boca trabalhou carinhosamente sobre a minha parte mais sensível, lambendo e chupando até que eu estava respirando com dificuldade. Quando ele colocou a língua sobre o meu clitóris, gritei de alívio. Ele riu baixinho contra mim, o som adicionando uma deliciosa rotação aos seus movimentos rápidos. —Eu vou gozar. —Sussurrei sem fôlego, sentindo aquela espiral de prazer crescendo dentro de mim. Ele gemeu contra a minha boceta, pedindo para eu me soltar e sentir. Meu clímax começou lentamente, a espiral de êxtase se abrindo e se espalhando pelo meu corpo. Eu balancei contra sua boca, minhas mãos em seus cabelos enquanto eu gritava seu nome de novo e de novo. Quando meu orgasmo começou a desvanecer, ele desviou sua atenção do meu clitóris. Primeiro um dedo e depois dois encontraram o caminho dentro de mim. Ele penetrou com cuidado, empurrando e esfregando até encontrar aquele pequeno ponto que fez todo o meu corpo sacudir. Eu saltei na cama, meus quadris arqueando para cima enquanto minha cabeça caia para trás. — Kostya! Ele riu da minha situação antes de deixar cair a boca no meu clitóris novamente. Ele me estimulou de uma maneira que nenhum


outro homem tinha feito comigo. Eu tive alguns bons orgasmos na minha vida, mas puta merda. A forma como Kostya enfiava os dedos e me lambia com sua língua forte me deixou gritando. Meu clímax me atingiu com uma explosão selvagem de prazer que disparou através de mim. Meu corpo inteiro ficou tenso e gozei no ritmo de suas lambidas incessantes. Passei minhas unhas pela cama, agarrando-me aos cobertores e esperando como louca enquanto ele mudava o ângulo de seus dedos e a pressão de sua boca. O terceiro orgasmo foi tão rápido e forte que eu vi estrelas e não conseguia respirar, minha boca aberta enquanto eu pressionava contra ele, desesperada para usufruir de cada estímulo que pudesse ter dele. —Deus! Chega! —Tentei me afastar, mas ele tinha agarrado meus quadris com ambas as mãos agora, sua língua languidamente se movendo entre as minhas dobras, provocando o meu clitóris. — Por favor. Com um suave beijo final entre as minhas pernas, ele parou. Acariciou minha barriga e coxas enquanto eu tentava recuperar o fôlego. Meus braços e pernas formigavam e eu pude sentir a bagunça molhada que ele tinha feito na parte interna das minhas coxas. Abaixei minha mão para tocá-lo, meus dedos encontrando seu cabelo úmido. Com um pequeno puxão, eu o incitei para cima de mim. —Nós não temos que... —Cale a boca e me fode. —Interrompi rudemente, minha voz rouca por todos aqueles gritos. Travando minhas pernas ao redor de sua cintura, praticamente o desafiei a tentar escapar de mim. Ele sorriu para mim antes de pegar minha bunda em uma mão e puxar meu corpo um pouco mais para cima. Ele estava duro como pedra novamente, seu pau cutucando entre as minhas pernas e me fazendo arquejar de excitação.


—Oh. —Soltei a palavra em um gemido baixo quando ele deslizou profundamente em um impulso suave. Com uma mão no meu quadril e outra apoiada ao lado da minha cabeça, Kostya se inclinou para me beijar. Os músculos de seu pescoço estavam tensos enquanto ele me fodia, seu ritmo lento e sem pressa. Cada golpe era como o céu e nossos corpos trabalhando perfeitamente juntos. Ao contrário do nosso sexo apressado no salão, isso era diferente. Terno. Gentil. E tão bom. Eu agarrei seus ombros, enterrando meu rosto em seu pescoço. Ele cheirava a meu sabonete, floral e leve, mas também uma pitada de mim ainda persistia nele. Eu beijei seu pescoço e mandíbula antes de finalmente descansar meus lábios contra sua orelha. Minha respiração forte o fez estremecer e ele começou a aumentar seu ritmo em mim. Senti que ele estava tentando segurar o tempo suficiente para eu gozar novamente, mas meu corpo estava esgotado pelas coisas más que ele tinha feito com a boca. Deslizei a mão por suas costas e por cima de seu quadril antes de pegar sua bunda. Eu o puxei com força para dentro de mim, levando-o mais fundo com seu impulso e angulando meus quadris para encontrá-lo. Ele olhou para mim, seus olhos perguntando e eu assenti, silenciosamente comunicando que eu queria que ele gozasse. Ele baixou a testa na minha, seus quadris estalando rapidamente enquanto ele perseguia seu clímax. —Holly. —Ele gemeu meu nome, seu sotaque arrastando a primeira sílaba de uma maneira que eu passei a amar. Eu o abracei com força, não querendo deixá-lo ir. Aqui, no meu quarto, estávamos a salvo de toda a merda da máfia em que ele estava mergulhado por toda a vida. Estávamos seguros aqui, isolados de tudo e de todos que queriam nos separar. Quando ele deslizou para fora de mim e caiu de lado, passou o braço pela minha cintura e me arrastou contra ele. Seus braços me


cercaram, e eu poderia dizer que ele tinha os mesmos pensamentos que eu. Ele não queria sair desse quarto. Não queria enfrentar a verdade da nossa situação. Não queria reconhecer o que nenhum de nós era corajoso o suficiente para dizer. Isso não vai durar. Pisquei com força, recusando-me a chorar ou a ceder àquela sensação de tristeza que me engoliu com o pensamento ruim. Mais do que tudo, eu queria fazer isso funcionar. Ele queria o mesmo. Eu podia sentir isso pelo jeito que me tocava e pela forma que olhava para mim. Queríamos a mesma coisa, uma vida juntos. Mas não dependia de nós. Seus segredos e laços com a máfia ameaçavam este novo relacionamento florescente. Seríamos fortes o suficiente para desatar os laços? O pensamento agitava-se na minha cabeça enquanto adormecia em seus braços. Quando acordei algumas horas depois, com a boca seca e o estômago roncando, gentilmente me afastei dele. Ele estava apagado. Os círculos escuros sob seus olhos e as linhas de estresse em sua testa me entristeceram. Querendo que ele descansasse, eu me movi cuidadosamente para longe dele e da cama. Sem me incomodar com roupas, usei o banheiro, limpei as gotículas de água acumuladas no piso e apaguei a luz. Estava um pouco abafado no quarto então liguei o ventilador de teto e apaguei as luzes que tínhamos deixado acesas depois de fazer amor. Querendo que fosse mais aconchegante para ele descansar, diminui o termostato. Quando segui pelo corredor, peguei a roupa que havíamos deixado cair antes. Havia luz do luar suficiente entrando pelas janelas da minha cozinha para eu não me incomodar com as luzes. Parada nua na frente da geladeira aberta, olhei para as prateleiras procurando algo para comer. Nada parecia particularmente saboroso, então fechei a


porta e caminhei até o armário perto da pia para pegar um copo. O som dos cubos de gelo batendo contra o copo era alto na casa quieta. Eu esperava que não acordasse Kostya, já que ele parecia ter o sono tão leve. A água fria foi uma boa sensação quando a engoli, com sede. Quando abaixei o copo, senti um arrepio estranho no pescoço e nas costas. Era uma sensação estranha, quase como se alguém estivesse me observando. Virando-me para a porta em arco da cozinha, eu esperava ver Kostya aparecendo ali daquele jeito calmo e sério dele. Mas o arco estava vazio. Algo afiado e frio pressionou contra a minha coluna e uma mão áspera e fedorenta apertou minha boca. A palma calejada bateu com força nos meus lábios, reprimindo o grito de choque que irrompeu da minha garganta. Um hálito horrível me envolveu quando o intruso aproximou sua boca do meu ouvido e assobiou: —Grite de novo e te estriparei como um cervo. Nua, sozinha, e vulnerável, rezei para que Kostya acordasse. E me salvasse.


CAPÍTULO DEZENOVE Despertado por Holly ao sair da cama, ele estava cansado demais para perguntar aonde ela estava indo. De olhos fechados, a ouviu andar pelo banheiro. Ela ligou o ventilador de teto e apagou a luz, deixando o quarto mais confortável. Ele considerou levantar-se para um copo de água, mas todo o seu corpo doía pela falta de descanso. Seu cérebro desfocado e olhos secos exigiram que ele ficasse bem onde estava, a sede que se danasse. Ele tinha começado a cochilar de novo quando ouviu o barulho de cubos de gelo. Isso acordou-o apenas o suficiente para que percebesse outra coisa. Um cheiro que não pertencia à casa de Holly. Ele sentou-se, de repente alerta e respirou profundamente. Gasolina? Óleo? Escapamento? Seu estômago se apertou. Era um cheiro que ele havia detectado antes naquela manhã com Spider. Era o cheiro de um motociclista. Porra. Ele pulou da cama, sem perder tempo para pegar suas roupas. Pegou um cinto dourado fino que Holly tinha deixado sobre uma cadeira. Ele não se atreveria a disparar uma arma em sua casa. Agora não. Não com todas as complicações agitando a cidade. A polícia rastejando pela casa de Holly e vasculhando suas vidas seria um desastre absoluto. Com discrição, ele se moveu para o fundo do corredor, seus pés descalços silenciosos no piso. O grito abafado de Holly atingiu seus ouvidos, retorcendo-o por dentro e fazendo seu coração acelerar. Adrenalina disparou em sua corrente sanguínea. Seus


músculos se contraíram. Sua mandíbula se apertou. Ele ia matar alguém. Ele hesitou perto da porta aberta da cozinha. Ela mantivera as luzes apagadas, familiarizada o suficiente com a casa para não necessitar delas no escuro. Ele estava feliz por isso. As sombras o protegeriam e dariam a ele o elemento surpresa que precisava. O chiado baixo da voz de um homem cortou o som da respiração em pânico de Holly. Ocorreu-lhe que ela estava nua e um novo fogo de fúria o acendeu. Algum merda tinha as mãos sobre ela e estava sentindo a pele macia que pertencia a ele e somente a ele. —Onde diabos está aquele russo? Holly gritou e um momento depois, o homem rosnou: —E não minta para mim, sua cadela magricela. —Qua-quarto. —Ela gaguejou em um gemido de dor. —Você vai me levar até o quarto. Se você fizer um barulho, eu vou cortá-la. Se você fizer alguma coisa para acordá-lo, eu vou te cortar. Agora mexa-se! Kostya recuou, escondendo-se na escuridão dentro do banheiro de hóspedes. Grato pela porta aberta, controlou sua respiração, ficando quieto e desaparecendo nas sombras. A respiração arfante de Holly encheu o corredor, o medo dela era palpável. Seu atacante tinha uma faca, disso Kostya tinha certeza. Ele tinha que ter cuidado. Tinha que ser preciso. Aparentemente alheia à sua presença no banheiro, Holly passou com pernas trêmulas. Ele contou até três, observando o homem atrás dela passar pela porta antes de sair em um lampejo silencioso de movimento. Ele enrolou o cinto fino ao redor do pescoço do homem, torcendo as pontas enroladas em suas mãos.


Houve um som áspero de asfixia e o barulho de uma faca batendo no chão enquanto Kostya levantava o homem. Chutando e se debatendo, o atacante tentou se libertar. Kostya puxou com mais força, esmagando a garganta do homem e esperando pelo revelador baque de um homem morto. Levando o homem para o chão, passou as pernas ao redor da cintura do atacante e continuou puxando o cinto, a pressão suficiente para esmagar a traqueia do homem e deixar seus pulmões e o cérebro sem oxigênio. As luzes se acenderam de repente, momentaneamente cegando-o. Certo que o idiota estava morto, ele soltou o cinto. Holly encostou-se na parede no final do corredor, ao lado de seu quarto. Sua mão apoiada no interruptor de luz enquanto ela chorava silenciosamente, lágrimas escorrendo pelo rosto. Um fio de sangue seguia a curva de seu quadril e descia pela coxa. —Você está ferida! —Ele ficou de pé, mas ela recuou como se tivesse medo dele. Destruído pela visão de seu medo, ele parou de se mover. Era normal que ela reagisse assim. Ela nunca tinha estado próxima da violência. Nunca tinha visto o lado feio da vida. Mas ainda assim doeu ver o medo dela. —Holly... —Ele... ele está morto? —Seus olhos estavam fixos no corpo estrangulado no chão do corredor. —Sim. —Ele entrou na frente dela, bloqueando sua visão da expressão medonha no rosto do homem. —Quem é ele? Ele olhou de volta para o corpo. Mesmo sem o colete de couro e com suas tatuagens cobertas com mangas compridas, ele reconheceu o homem. —Seu nome é Scorpion. Ele anda com uma gangue de motoqueiros.


—Por que ele queria te matar? —Ela perguntou, sua voz baixa e ansiosa. Ele suspirou e passou as mãos no rosto. —É uma longa e feia história, Holly. —Que você não vai me dizer. —Ela adivinhou corretamente. Ele balançou a cabeça. —Agora não. Ela não parecia feliz com isso, mas não discutiu com ele. Tremendo menos, perguntou: —Como ele entrou aqui? —Eu não sei ao certo. —Ele tentou se lembrar de tudo que fizeram e não fizeram ao entrar na casa. —A porta da cozinha que leva à garagem. —Merda. —Ela praguejou baixinho. —Eu costumo trancar, mas... —Eu sei. A culpa é minha. Eu deveria ter me assegurado que estava trancada e que seu alarme estava ativado. Me desculpe, Holly. Isso não deveria ter acontecido. —Mas aconteceu. —Ela disse sombriamente. Nervosa agora, perguntou. —O que faremos? Quer dizer, não podemos chamar a polícia. Certo? Isso seria realmente estúpido? —Não seria a opção mais inteligente para nenhum de nós. — Ele concordou. Sabendo o que tinha que ser feito, disse: —Vista-se. —E você? —Eu tenho que embrulhar este corpo antes que ele faça uma bagunça. Ela franziu a testa com confusão. —O que você quer dizer?


Não querendo fazê-la passar mal, explicou: — Estrangulamento causa uma perda completa do controle muscular. Compreensão filtrou em seu rosto. —Oh. —Ela parecia repentinamente enojada. —O que você precisa? —Eu posso lidar com isso. Preocupe-se apenas consigo mesma. Grato que ela não tinha perdido completamente a cabeça depois de ter sido atacada e de vê-lo matar um homem, ele entrou no banheiro de hóspedes e arrancou a cortina do chuveiro da haste. Os anéis da cortina se espalharam e tilintaram quando caíram na banheira. Ele também pegou um par de toalhas e uma toalhinha da prateleira. No corredor, colocou a cortina do chuveiro sobre o piso e suavemente rolou o corpo de Scorpion sobre ela. Enfiou uma toalha na boca dele e enrolou toalhas na cintura para conter qualquer líquido que pudesse escapar. Olhando para o homem que conhecia há uma década, não muito bem, mas como uma peça em movimento do maquinário do submundo, ele franziu a testa. Embora seu rosto estivesse relaxado agora, quase pacífico, Scorpion claramente tinha passado pelo inferno. Cabelos oleosos, barba espessa, o forte cheiro de suor, sujeira e óleo impregnados em sua pele e roupas. O olhar de Kostya se fixou nas manchas do sangue de Holly na faca, na mão e no antebraço de Scorpion. Fios claros de seu cabelo brilhavam em sua outra mão. A visão do sangue e do cabelo de Holly o atingiu com o peso de um trem de carga. Esse motoqueiro de merda tinha o apanhado na casa de Holly. Ele estava tão envolvido nela, em suas necessidades e desejos, que a colocara em perigo. Idiota estúpido. Silenciosamente se repreendendo, vasculhou as roupas de Scorpion como um batedor de carteiras. Um telefone desligado.


Uma carteira. Algumas notas soltas e moedas. Uma faca. Uma arma. Nada de útil. Colocando de lado os pertences pessoais, ele embrulhou Scorpion firmemente na cortina do chuveiro. —Aqui. Ele olhou para Holly. Vestindo um short cinza e um suéter rosa enorme, ela estendeu um rolo de fita adesiva. —Obrigado. Ele fez um trabalho rápido de selar o corpo embrulhado e se levantou. Entregando a fita de volta para ela, disse: —Eu preciso me vestir para que eu possa lidar com isso. —Lidar com isso? —Ela perguntou, seguindo-o para seu quarto. —Holly. —Disse ele em um tom de aviso. —Você realmente não quer saber. —Mas certamente eu quero! Seu grito furioso pegou-o de surpresa quando ele vestiu sua cueca boxer. O medo que a atingiu antes tinha desaparecido. Ela estava tomada pela raiva. —Ouça, uma pessoa maluca acabou de invadir minha casa, colocou uma faca na minha coluna e tentou nos matar. Eu vi você estrangulá-lo com o meu cinto. Acho que mereço saber o que diabos está acontecendo na minha maldita casa! E, de repente, todas as razões que ele teve para nunca ter cruzado a linha da amizade deles para um namoro estavam gritando em sua cabeça. Era isso o que ele estava tentando evitar. Ela não pertencia a seu submundo sujo e decadente, mas aqui estava ela, atolada em um assassinato que ele tinha cometido em sua casa.


—Eu fui procurar uma menina que estava desaparecida. — Disse ele, agarrando seu jeans. —Ela estava envolvida com um homem, um homem mais velho, que a estava usando como isca. —Isca? Para quê? —Para chegar a sua família. —Disse ele, pegando suas meias e deliberadamente não entrando nos detalhes sobre a mãe de Tiffany. —O homem com quem ela esteve tinha uma parceria com Scorpion. —Ele apontou para o cadáver no corredor. — Scorpion veio aqui para me matar esta noite porque descobri seu plano secreto contra nossos chefes. —Ele é o único vindo atrás de você? Ele riu asperamente. —Dificilmente. —É assim... é assim que é para você toda noite? —Ela perguntou, sua voz cheia de preocupação. Ele balançou sua cabeça. —Você ficaria surpresa em como raramente esse tipo de merda acontece comigo. —Porque geralmente você é quem entra sorrateiramente na casa de alguém para lidar com eles primeiro? Ele encontrou seu olhar inabalável. Não havia sentido em mentir para ela agora. —Sim. Ela engoliu em seco. —Então, isso é o que você faz? Para Nikolai? —Principalmente. —Ele admitiu. —É meu trabalho manter nossa família a salvo. Normalmente, não chega a esse ponto, mas se chegar, não hesito. —Quantos? —Ela perguntou, sua voz fraquejando. — Quantos você já...?


—Eu não me lembro. —Ele mentiu. —Muitos? —Isso importa? —Eu não sei. —Ela admitiu, soando insegura. — Provavelmente deveria. —Mas? —Ele perguntou, com o coração na garganta. —Mas eu te amo. —Ela confessou com um soluço. —Eu te amo e não me importo com o que você fez ou o que vai fazer. Seu coração quase explodiu em seu peito. Ele cruzou o espaço entre eles com passos decididos e envolveu seus braços ao redor dela. Puxando-a contra o peito dele, enterrou o rosto em seu cabelo e segurou-a enquanto ela chorava. O matou saber que ele tinha feito isso com ela. Que ele tinha conquistado seu amor e confiança, mas também a fez se sentir em conflito. Ela ama um assassino. —Holly. —Ele sussurrou contra o cabelo dela. —Eu te amo. Eu nunca amei alguém como eu te amo. Nunca houve alguém como você e nunca mais haverá novamente. Você é única para mim. —Eu não quero perder isso. —Disse ela, com a voz abafada contra o peito dele. —Eu não quero te perder. Tenho tanto medo que não sejamos fortes o suficiente para fazer isso funcionar. Ele pegou o rosto dela e inclinou a cabeça para trás para que pudesse olhar em seus lindos olhos. —Se eu fosse um homem melhor, deixaria você agora mesmo. Eu sairia pela porta e nunca mais voltaria. Eu deixaria você ir. Deixaria você encontrar um homem que mereça você. Um bom homem. Alguém que não vive nas sombras. Alguém digno de você. —Ele pressionou os lábios nos


dela em um beijo demorado. —Mas eu não sou um homem melhor. Não quero te perder. Não quero deixar você ir. —Então não deixe. —Disse ela, agarrando-se a seus braços. —Não me deixe ir. Ele afastou os fios macios de cabelo do rosto dela. —Holly, há muito mais coisas horríveis acontecendo agora. Existem segredos que podem nos machucar. Há coisas terríveis no meu passado. —Nós vamos descobrir isso. —Disse ela com naturalidade. —De algum jeito, de alguma forma, vamos descobrir, Kostya. —Eu prometo a você, Holly, que vou me esforçar ao máximo. —Ele a beijou novamente, não querendo que isso acabasse. —Vou tentar. —Eu sei que você vai. Sua fé resoluta nele o abalou profundamente. Ele pressionou os lábios em sua têmpora por um momento antes de deixá-la ir. Segurando seu rosto, disse: —Eu preciso que você venha comigo. Você não está segura aqui. Ela assentiu sem hesitar. —Ok. —Arrume uma mala com o que precisar para alguns dias, roupas, produtos de higiene, sua arma. —Certo. Enquanto ela se dirigia para o closet, ele vestiu o resto de suas roupas. Olhou no seu relógio. Pelo menos ainda era cedo. O bairro deles era habitado por trabalhadores e ele duvidava que alguém estivesse na rua a essa hora.


—Preciso do meu passaporte? —Ela estava na porta do closet, uma mala pequena de couro na mão. Ela vestiu leggings e colocou um moletom de capuz e tênis. —Ou dinheiro? Ele esperava que não chegasse a esse ponto, mas não era uma má ideia pegar as duas coisas. —Sim. —Ok. —Ela andou até a cômoda na parede oposta do quarto, abriu a gaveta de baixo e pegou uma caixa trancada. Girou os números na fechadura e abriu a tampa. Pegou pilhas de dinheiro e jogou em sua mala junto com seu passaporte e alguns cartões de crédito. —Minha mãe. —Disse ela, como se sentisse que ele iria querer uma explicação. —Ela tem algumas regras estranhas sobre estar sempre pronta para sair a qualquer momento. Ela teve algumas viagens a negócios repentinas, e isso a deixou paranoica. Você não sabe a metade disso. Ele não disse nada, claro. Ele não ia dizer à Holly que sua mãe era muito mais do que ela pensava. Agora não. Não essa noite. Não depois do que acabara de acontecer com ela. —Às vezes a paranoia nos mantém seguros. Ela bufou suavemente. —Eu posso apenas imaginar o que você guarda em segurança. —Crypto, diamantes, moeda internacional, documentos. — Ele listou o conteúdo. —Eu gosto de manter as coisas pequenas e leves, fáceis de transportar. —Crypto? —Ela fechou a bolsa. —Como Bitcoin? Ele assentiu. —Eu guardo um pouco no cold storage15. 15

Armazenamento frio no contexto do Bitcoin refere-se a manter uma reserva de Bitcoins offline. Geralmente, essa é uma precaução de segurança necessária para minimizar a possibilidade de um invasor roubar toda a reserva em uma violação de segurança. Para isso, o operador do site mantém a maioria da reserva em armazenamento refrigerado ou, em outras palavras, não presente no servidor da Web ou em qualquer outro local ou outro computador


—Comprei alguns há uns anos. —Ela fez uma pausa, como se estivesse tentando pensar. —Mais do que alguns anos atrás. Está em uma carteira que Savvy me ajudou a configurar. Não tenho ideia o quanto vale. —Provavelmente uma porra de fortuna. —Ele respondeu. —Você acha? —Eu acho. —Eu vou dar uma olhada quando voltar. —Ela levantou a bolsa e hesitou antes de perguntar: —Vou voltar, certo? —Em alguns dias. —Disse ele, aproximando-se e puxando-a em seus braços. Ele beijou sua bochecha e segurou-a perto. —Eu quero ter certeza de que tudo se acalmou e que não haja nada que possa ligar Scorpion a esta casa. Assim que estiver limpo, você pode voltar para casa. Ela se afastou e sorriu tristemente. —Não acho que isso seja mais a minha casa. Sentindo-se o maior merda do mundo por trazer violência e morte para sua casa, ele a beijou carinhosamente. —Ajudarei você a encontrar uma nova. Comprarei esta casa para que você possa sair daqui o mais rápido possível. —Se algum outro cara dissesse isso para mim, eu saberia que ele estava falando merda, mas você? Você entrará pela porta com um cheque administrativo. —Valor de mercado. —Ele brincou. —Nós não queremos levantar quaisquer suspeitas. Sufocando uma risada, ela pressionou seus lábios nos dele. Quando se afastou do beijo, ficou séria. —O que acontece agora?


Sombriamente, ele disse: —A parte que eu nunca quis compartilhar com você.


CAPÍTULO VINTE Segurando minha caneca de viagem com café açucarado, me perguntei por quanto tempo meu nervosismo duraria. Ao meu lado, Kostya percorria as ruas escuras da cidade, ocasionalmente pegando seu café no console central. Preto, claro. Como seu carro. Como suas roupas. Como as sombras onde ele habitava. Eu quase morri. O pensamento continuou na minha cabeça. Era um zumbido incessante e irritante no fundo. Eu quase morri. Mas não morri. Considerando todas as coisas, eu saí do meu primeiro contato com a morte com apenas um pequeno corte. Ainda latejava um pouco, mas a cicatriz seria pequena e imperceptível. Não para ele. Eu olhei para Kostya. Toda vez que via o machucado da lâmina de Scorpion, ele se culpava pelo que havia acontecido. Ele se sentia culpado por ter me exposto a esse mundo horrível que ele habitava. —Eu escolhi isso. —O quê? —Confuso, ele desviou o olhar do para-brisa e franziu a testa para mim. —Escolheu o quê? —Você. —Expliquei. —Escolhi você com os olhos bem abertos. Quero dizer, eu não sabia exatamente o quê estar com você implicaria, mas eu tinha uma ideia boa o suficiente. O que aconteceu esta noite na minha casa não foi tudo culpa sua. Eu te convidei para a minha vida e para a minha casa e problemas seguiram você. A culpa é minha.


Ele não disse nada a princípio. Sua mandíbula se apertou e relaxou. Finalmente, estendeu a mão para segurar a minha. Levantando nossas mãos entrelaçadas, ele beijou as costas da minha. —Isso não torna mais fácil para mim. —Mas vai. Eventualmente. —Eu adicionei. —Somos adultos. Nós tomamos decisões adultas. Agora, estamos lidando com consequências adultas. Ele grunhiu de acordo e nós ficamos em silêncio. Eu não tinha certeza de onde ele estava me levando e não me importei em perguntar. Apenas estar com ele, segura em seu carro, era o suficiente. Em pouco tempo, porém, percebi para onde estávamos indo. —O que há em Texas City? —Um armazém que eu possuo. —Disse ele, pegando seu café. —Você possui muitos armazéns? —Sim. —E outras empresas além de seu trabalho de segurança? —Sim. Engoli ansiosamente antes de perguntar: —Como Sunrise Sunset Delivery? Seu olhar se voltou para o meu. —O quê? Brincando com o zíper do meu casaco, confessei: —Na outra noite, quando você usou meu telefone do escritório, liguei para o número. Foi para uma gravação, então eu meio que... bem... eu fui lá. —Quando? —Esta noite.


—Você saiu do carro? —Não, eu estacionei do outro lado da rua. Minha mãe ligou e eu me assustei e fui embora. Ele suspirou. —O negócio não é meu. Uma mulher que ajudei alguns anos atrás é a proprietária. Ela lida com entregas de natureza sensível. —Ela é uma boa amiga? —Eu perguntei, tentando impedir que o ciúme transparecesse em minha voz. —Sim, mas não desse jeito. —Ele me assegurou. —Eu não tenho uma amiga assim desde alguns meses depois que você se mudou para a casa ao lado. —Você está falando sério? —Eu me virei no assento para estudá-lo. —Você não teve namoradas em todo esse tempo? —Nem uma. —Ele confirmou. —Bem, agora eu me sinto uma merda. —Eu tentei não pensar em todos os encontros que eu tive enquanto ele estava esperando pacientemente na porta ao lado. —Pelo quê? Aproveitar sua vida? Não se sinta. É uma coisa boa que você estivesse feliz. —Eu não estava feliz. —Respondi. —Eu tive alguns bons encontros, mas eles sempre pareciam... errados. Houve apenas alguns que eu trouxe para casa... —Eu sei. —Ele interrompeu, sua voz mais sombria e áspera agora. Eu estreitei meus olhos para ele. —Exatamente quão perto você esteve me observando? —Eu não tenho câmeras em sua casa.


—Mas? —Mas acompanho quando você sai e chega em casa. —Ele admitiu. —Pervertido. —Provoquei, estendendo a mão para beliscar sua perna. —Eu não ouvi você reclamando mais cedo. —Ele pegou minha mão e me puxou para mais perto, meio que me tirando de meu assento para que pudesse me beijar. Foi um toque rápido e quente de nossos lábios antes que ele se afastasse e voltasse sua atenção para o tráfego. —Eu só fiz isso para mantê-la segura. Eu me preocupei que alguém pudesse machucá-la para chegar até mim. —Eu sei o porquê você fez isso. Se eu tivesse descoberto isso há alguns meses, teria surtado com você, mas depois dessa noite, entendo porque você faz as coisas que faz. Mesmo que sejam meio assustadoras. —Acrescentei. —Vou tentar ser menos assustador no futuro. —Disse ele com um sorriso. Pensei nos nossos meses e meses de oportunidades perdidas. —Sabe, Kostya, o que nós tivemos juntos nas últimas noites foi melhor do que qualquer coisa que eu já experimentei com qualquer outro homem. —Eu não preciso de uma massagem no ego. —Disse ele, estendendo a mão para apertar minha coxa. —Mas é bom ouvir. Eu revirei meus olhos. —O que estou tentando dizer é que... —Eu sei o que você está tentando dizer. —Ele disse, sério. Sua mão deslizou pela minha coxa para agarrar a minha. —Sinto o mesmo. É diferente com você.


De mãos dadas, seguimos o resto do caminho sem falar. Não parecia haver mais nada a dizer. Quanto mais nos aproximávamos de Texas City, mais eu podia sentir o cheiro sulfuroso de petroquímicas saturando o ar. Eventualmente, as fileiras de casas ordenadas deram lugar a complexos industriais maciços cheios de baterias de tanque, fábricas e chaminés altas soltando só Deus sabe o quê no ar da noite. Kostya fez uma série de curvas antes de seguir até um portão fechado em torno do prédio mais feio que eu já tinha visto. Estava apodrecido em alguns pontos, a ferrugem consumindo através do telhado de metal e dos lados. Um letreiro desbotado tinha caído da frente do prédio e agora ostentava marcas de grafite. Três gatos selvagens atravessaram a calçada rachada, esquivando-se e se escondendo enquanto os faróis do carro os assustavam. —Este lugar é seguro? —Perguntei, minha mão apertando a dele. —Não realmente. —Ele admitiu. —Não toque em nada quando entrarmos. Você precisará de uma vacina antitetânica se fizer isso. Eu não sabia se ele estava brincando ou falando sério. Ele se inclinou sobre mim para abrir o porta-luvas e pegou um par de luvas de couro preto. Depois de calçá-las, abaixou o vidro e digitou no teclado para abrir o portão. Atravessou-o, esperando que se fechasse atrás de nós, antes de avançar para a propriedade. Escolheu uma vaga atrás do armazém, protegida da rua e de todos os outros prédios à nossa volta. —Vamos lá. Eu o segui para fora do carro e para dentro do prédio, caminhando atrás dele na calçada rachada e pisando com cuidado. Quando chegamos à pesada porta, ele desparafusou uma tampa na


ponta da grade de metal que corria ao longo da calçada e retirou uma chave escondida. Destrancou a porta, guardou a chave no bolso e me alcançou, pegando a minha mão na sua com luva de couro e me puxando para o prédio escuro. Cheirava mal lá dentro. Empoeirado, sujo, úmido e simplesmente horrível. Incapaz de ver na escuridão do espaço, agarrei-me à sua mão e me perguntei como diabos ele podia se guiar tão facilmente. Parecia que estávamos andando a uma eternidade quando ele parou e abriu outra porta. Quando passamos por ela, ele acendeu uma luz fluorescente e piscante. Depois de alguns segundos, ela acendeu totalmente, brilhando intensamente e iluminando o escritório velho e sujo. —Sente-se aqui. —Ele apontou para a cadeira de couro e madeira atrás da mesa. —Não quero que você saia desta sala. —Onde você vai? —Perguntei, apreensiva em ser deixada sozinha. —Para outra área da fábrica. —Disse ele, tentando me tranquilizar. Ele segurou a minha nuca, seus dedos enluvados de couro deslizando sobre o meu cabelo quando me puxou para perto. —Eu preciso cuidar das coisas. —Coisas? —Eu fiz uma careta. —O corpo? Ele assentiu. —Seu DNA e o meu estão nele. Preciso ter certeza de que ele está limpo antes... —Antes de você despejá-lo? —Imaginei o quão perto estávamos de Galveston Bay. —Na água? —Sim. As correntes geralmente são favoráveis para esse tipo de disposição, mas às vezes as coisas não funcionam como deveriam. Se ele for retirado da água muito depressa, quero ter certeza de que não há vestígios nossos sobre ele.


Eu não tinha certeza se queria ouvir a resposta dele, mas perguntei, de qualquer maneira. —Esta é a melhor maneira de lidar com isso? Quero dizer. —Eu suspirei. —Eu sei que não é como nos filmes, mas que tal, você sabe, um barril de ácido ou fogo ou algo assim? Como eles fazem em programas de TV e coisas assim? Sua expressão transformou-se, indo de uma de culpa por me expor a esse lado de sua vida, para uma de choque. —Jesus Cristo, Holly, o que diabos você está assistindo? —Um segundo depois, ele acrescentou: —Sim, existem outras maneiras, mas essa é a certa para esse trabalho. Eu preciso que pareça que não tem nada a ver com você ou comigo. Se ele for encontrado, precisa parecer que alguns motociclistas o pegaram. Há bares e clubes ao longo da costa. Se ele aparecer, é lá que a polícia irá primeiro com suas perguntas. —E se... Kostya se aproximou e me silenciou com um beijo. —Sem mais perguntas, Holly. Fique aqui. Eu venho buscar você. Ele saiu sem outra palavra, me deixando fechada na caixa sem janelas que havia sido um escritório. Com uma bufada irritada, sentei-me na cadeira estridente. Era surpreendentemente confortável e bem feita. Eu a girei em um círculo lento e observei as prateleiras cheias de manuais amarelados e fichários marrons rachados. Havia uma velha impressora na outra parede e um aparelho de fax que tinha que ser mais antigo que eu. Entediada e segura de que ficaria presa aqui por um tempo, peguei um dos manuais. Eu soprei o pó e abri. Era um manual para algum tipo de processo químico para limpar metal. Sem dúvida, foi a coisa mais entediante que já li, mas continuei lendo. Eu lutei contra o desejo de me levantar, abrir a porta e procurar por Kostya. Ele tinha sido muito claro e mesmo que eu quisesse saber o que ele estava fazendo, confiava que ele sabia o que era melhor para mim no momento.


Virando a página do manual, tentei imaginar minha mãe em um lugar como esse. Ela deve ter passado muitas horas assim, ouvindo os operadores e supervisores machistas de empresas petroquímicas em salas como esta. Não deve ter sido fácil para ela ir tão longe em um campo dominado por homens. Se ela pudesse me ver agora, ficaria furiosa. Todas as lições que me ensinou sobre ficar longe de homens como Kostya, e aqui estava eu, me escondendo em uma fábrica abandonada enquanto o homem que eu amava fazia coisas indescritíveis para me manter segura. O medo de desapontá-la fez meu estômago revirar. Ela fez tudo por mim, trabalhou tão duro para ter certeza de que eu tivesse a vida que ela não teve e agora eu estava arriscando tudo por Kostya. Ela nunca saberá. Ninguém jamais saberá o que aconteceu esta noite. Tinha que ser assim. Eu tinha que guardar esse segredo feio para sempre. Noventa e quatro páginas do manual depois, ouvi um barulho do lado de fora da porta. Sentei-me mais ereta, fechei o manual e escutei. Era um animal? Um daqueles gatos que eu vi antes? Um rato? Um guaxinim? Passos. Não parecia o Kostya. Ele se movia com discrição. Esses passos eram altos e desajeitados. Levantei-me com cuidado, prendendo a respiração e rezando para que a cadeira não rangesse. Olhando em volta, procurei freneticamente por uma arma. Meu olhar pousou em uma vassoura no canto. Eu a peguei, segurando-a como um bastão, e me preparei para bater enquanto a porta começava a se abrir para dentro. Eu não hesitei. Bati o mais forte que pude, apontando para a figura com um moletom escuro com capuz entrando no escritório.


O intruso sibilou e se esquivou e eu bati a vassoura na porta de metal, quebrando a madeira e gritando quando o impacto sacudiu meus pulsos. —Puta merda, senhora! —O intruso jogou o capuz para trás, revelando cabelos escuros e óculos estilo gatinho de aro azul. —Eu não sou seu inimigo, Holly! Ainda segurando um grande pedaço da vassoura, a mantive pronta para atacar novamente. —Como você sabe meu nome? —Minha empresa instalou o sistema de segurança em seu salão, lembra? Hen House Security? Sou eu. —Ela tocou seu peito. —Sou a Fox. Kostya é meu amigo. Ela estava certa. Eu finalmente a reconheci. Percebendo que tinha quase arrancado a cabeça dela, eu larguei a vassoura. —Oh meu Deus! Eu sinto muito! —Não, está tudo bem. Eu também teria feito isso. —Ela olhou para mim e perguntou: —Você está bem? Você se machucou? —Estou bem. —E K? Ele está bem? —Estou bem, Fox. —Ele apareceu atrás dela, nos assustando. Olhando de cara feia para Fox, perguntou: —O que você está fazendo aqui? —O que você acha que estou fazendo aqui? —Ela respondeu sarcasticamente. —As câmeras do perímetro da sua casa pifaram. Eu peguei alguém entrando na casa dela. Tentei ligar para você, mas não atendeu. Consegui encontrar Sunny e a mandei até sua casa. Você tinha ido embora quando ela chegou lá, mas o carro da Holly ainda estava na garagem. Ela sentiu cheiro de alvejante e imaginou que você tinha saído para cuidar de um problema.


—Onde está Sunny agora? —Ela encontrou uma motocicleta a alguns quarteirões de distância. Deixou a dela na garagem de Holly e levou a outra a uma loja de desmanche. —Devil(Diabo)? Fox assentiu. —Sunny confia nele e odeia aqueles malditos motociclistas. Ele fará a moto desaparecer pela manhã. —E você veio aqui por que...? —Porque eu não tinha certeza se você precisava de ajuda. — Ela disse. —Você não estava em casa. Não estava atendendo seu celular. Eu verifiquei todos os registros de segurança em seus edifícios, e este foi o único lugar que você visitou. —Eu agradeço que você tenha vindo nos verificar, mas estamos bem. —Você não está. —Ela argumentou. —Nate veio me ver pouco antes de você ser atacado na casa de Holly. —E? —E ele realmente insistiu que você deve entrar em contato com Gabe. Tipo hoje à noite. Tipo agora. —Disse ela, enfiando a mão em seu moletom e tirando um celular barato. —Nate me deu um número. Está totalmente carregado e pronto para usar. Ele pegou o celular de Fox e o guardou no bolso. Olhando para mim, disse: —Eu preciso que você vá com a Fox agora. —O quê? —Eu balancei a cabeça. —De jeito nenhum! Não quero me separar de você. —É mais seguro assim. —Ele deu um passo em minha direção e Fox silenciosamente saiu do escritório. —Holly. —Ele


segurou meu rosto. —Se Gabe está tentando entrar em contato comigo assim, é porque é urgente. É o tipo de urgência que significa que coisas terríveis estão chegando. Preciso lidar com isso e preciso saber que você está segura. Fox tem lugares por toda a cidade onde você pode se esconder. Fique com ela e estará em segurança. Eu irei buscar você assim que puder. —Kostya, por favor. —Implorei, meus olhos ardendo de lágrimas. —Deixe-me ir com você. —Holly. —Ele suspirou meu nome e pressionou a testa na minha. —Eu preciso lidar com algumas coisas para poder estar com você no futuro. Preciso ter certeza de que toda essa merda seja resolvida. —Ele me beijou com tanto amor que comecei a chorar. — Eu quero sair, Holly. Quero uma chance real com você. Eu tenho que fazer isso. Fungando, eu o beijei, agarrando-me a seus ombros como se ele pudesse desaparecer no ar. —É melhor você voltar para mim. —Eu vou, Holly. —Ele me esmagou em seus braços, me segurando com tanta força que eu não conseguia respirar. Eu não me importei. Queria ficar com ele, apenas assim, para sempre. Soltando-me, ele recuou. —Fique com a Fox. Ligue para dizer que está doente para trabalhar. Entrarei em contato o mais rápido que puder. Eu assenti silenciosamente, enxugando as lágrimas no meu rosto. Ele virou as costas para mim e saiu do escritório, parando apenas o tempo suficiente para dar instruções à Fox. E então se foi.


CAPÍTULO VINTE E UM —Casa ou apartamento? —Fox perguntou enquanto descia a estrada em seu jipe preto. —O quê? —Você quer se esconder em uma casa ou apartamento? Eu tenho acesso a ambos. —Estou bem com qualquer coisa. —Eu decidi. —É a minha primeira vez fazendo essa coisa de esconderijo, então não tenho preferência, eu acho. —Sim, é meio louco na primeira vez. —Ela disse, trocando de faixa. —Espero que você não tenha que fazer isso novamente. —Quantas vezes você teve que fugir assim? —Duas vezes. —Ela acelerou para passar por um caminhão e trocou de pista novamente. —Você está com fome? Surpreendentemente, eu estava. Eu estava enjoada depois de ter sido atacada e observar Kostya manejar um cadáver envolto em uma cortina de chuveiro. Meu estômago protestava com o vazio agora. —Eu não diria não a um café da manhã. —Tacos está bom? —Está. —Há um food truck de tacos que eu realmente gosto. Ele roda pela cidade, geralmente perto de locais de construção. Tem os melhores tacos de café da manhã. Barbacoa16 que derrete como 16

A "Barbacoa" é um tipo de carne cozida lentamente, desfiada e misturada com um molho ralo, tipicamente servida com tortillas. Este prato é originário do México, mas pode ser preparado e servido em qualquer lugar.


manteiga em sua boca naquelas tortilhas de milho super macias... — Ela sorriu animadamente. —É uma experiência espiritual. Reconhecendo as mesmas peculiaridades nela que haviam me encantado em Savvy, perguntei: —Você come sempre, tacos no café da manhã? —Eu tenho problemas para dormir. —Seu sorriso brincalhão desapareceu e suas mãos apertaram o volante. —Estou tentando lidar melhor com a automedicação, então eu dirijo muito. Eu fico com fome. Eu como. É um ciclo. —Você já pensou em terapia? Uma das minhas amigas teve problemas de insônia. Ela foi à terapeuta e dorme como um bebê agora. Fox bufou. —Se eu fosse a uma terapeuta com minha história, ela teria me internado como maluca ou chamado a polícia e mandado me prender por assassinato. —Oh. —Eu disse baixinho, imaginando o quão segura eu estava com ela. —Foi defesa pessoal. —Ela acrescentou rapidamente. —Meu namorado. —Ela se mexeu desconfortavelmente em seu assento. — Ele não era o cara que eu pensava que era. Era um monstro e fez uma merda terrível. Quando descobri o que ele estava fazendo, tentei ir embora, mas ele era maior e mais forte. Antes que eu percebesse, estávamos lutando até a morte. De alguma forma, venci e, de repente, tinha um corpo aos meus pés. —Kostya? —Eu perguntei, pensando em como a história dela era parecida com a minha. Ela assentiu. —Ele veio e lidou com isso. —Foi assim que você o conheceu?


—Não. —Fox sacudiu a cabeça. —Quando eu estava no ensino médio, tive alguns problemas. Hackers, lavagem de dinheiro e jogos ilegais. —Ela explicou com um aceno de mão. —Eu estava do lado errado dos albaneses que executam a maior parte da ação aqui na cidade. Kostya viu algo em mim, eu acho. Algo útil. Ele me tirou daquela bagunça e me ajudou a acertar tudo. —Existem outras como você? Outras pessoas que ele ajudou de sua própria maneira estranha? —Sim. Eu e algumas outras garotas que você provavelmente vai conhecer em breve. —Ela disse, virando para um estacionamento com um food truck com tacos pintados e uma fila movimentada de trabalhadores da construção civil. Ela estacionou e estendeu a mão para puxar meu capuz. —Coloque isso, e fique aqui. Mantenha a cabeça abaixada e não olhe ao redor. Não há tráfego ou câmeras de segurança de alta definição para conseguir uma boa imagem de você, mas não quero correr nenhum risco. Eu cobri meu cabelo e abaixei o rosto, olhando para o meu colo. Ela não demorou muito, dando-me tempo suficiente para começar a pensar em como eu tinha perdido o controle total da minha vida. No momento em que ela voltou ao jipe, entregando-me uma sacola de papel cheia de tacos, eu tinha muitas perguntas e não tinha certeza se ela tinha as respostas. —O que vai acontecer agora, Fox? —Estamos indo para um lugar que eu tenho na Capitol Street. —Ela afivelou o cinto de segurança e saiu da nossa vaga de estacionamento improvisada. —Assim que chegarmos lá, vou configurar um celular descartável para você. Ele vai chamar como seu número habitual para que nenhum dos seus amigos ou familiares estranhem. Você vai dizer a todo mundo que não está se sentindo bem. Vai tomar café da manhã e dormir.


—Eu não sei se consigo dormir. —Admiti, minha cabeça tocando a janela. —Estou muito agitada. —Vai passar. —Ela disse com naturalidade. —Você vai dormir como uma pedra. Você não está acostumada com o pico de adrenalina e cortisol. Vai apagar por algumas horas. —Você está acostumada com os picos? Ela riu. —Garota, eu fumo tanta maconha para acalmar minha ansiedade que minha glândula adrenal está saturada. Eu provavelmente não poderia ter um pico nem mesmo se alguém apontasse uma arma na minha cabeça. E de qualquer maneira, não auxilio realmente no trabalho braçal. Isso é mais para Sunny e Lobo. Max e eu somos os cérebros por trás da maioria dos trabalhos mais complexos de Kostya. Eu não sujo minhas mãos nem fico exposta à grande parte da merda assustadora. —Quem são Lobo e Max? —Duas das outras aranhas. —Ela explicou. —É assim que ele nos chama. Nós somos suas pequenas aranhas rastejando por toda a cidade para ele. Eu cuido da maior parte da tecnologia. Sunny faz a localização. Max é nossa cientista residente, e Lobo é, digamos, sua aprendiz. —Ela olhou para mim e acrescentou: —É tudo o que você vai saber de mim sobre esse assunto. As histórias são dele para contar. De repente, me sentindo cansada e irritada, esfreguei minha testa. —Compreendo. —Eu sei que é muita coisa, Holly. —Ela estendeu a mão e apertou meu braço. —É fácil aceitar que merdas loucas como essas acontecem com outras pessoas, mas é difícil aceitar que está acontecendo com você.


Sentindo como se eu pudesse confiar nela, perguntei: —Você acha que ele vai conseguir sair? Se afastar da máfia? Ela ficou quieta por um momento. —Outros fizeram isso. Ivan Markovic, Sergei Sakharov – ambos foram embora. —Mas? —Os casos deles eram diferentes dos de Kostya. Ivan e Sergei eram soldados de rua. Eles estavam no topo da hierarquia local, mas não eram uma enorme ameaça à família original em Moscou. —Mas Kostya é. —Eu disse baixinho. —Literalmente, ele sabe onde os corpos estão enterrados. — Ela interveio. —E isso nem leva em conta a merda que ele fez com o FSB antes de se juntar à máfia. —O que é FSB? Uma família diferente da máfia? Com os olhos arregalados, Fox olhou para mim. —Ele não lhe contou sobre o FSB? —Não. O que é isso? —Eu perguntei, o medo rastejando de volta ao meu peito. —Federal'naya sluzhba bezopasnosti Rossiyskoy Federatsii. —Ela disse, em um russo soando perfeito. —Serviço Federal de Segurança da Federação Russa. —Traduziu. —É basicamente a versão moderna da KGB. Tecnicamente, era o FSK quando Kostya entrou, quando era adolescente e foi renomeado para FSB mais tarde. Eu engoli em seco. —Então, ele era, tipo, da CIA russa? —Sim, basicamente. —Ela confirmou. —Foi assim que ele aprendeu todas as habilidades que usa agora como limpador.


Eu senti meu mundo inclinar novamente. Kostya não estava apenas na máfia. Ele tinha sido um espião. Um agente secreto. — Konstantin Antonovich é mesmo seu nome verdadeiro? —Konstantin é. —Ela confirmou. —Quando ele ingressou, na adolescência, eles lhe deram um nome limpo e documentos. Konstantin morreu com seus pais. Quando ele se queimou, decidiu que não havia mais razão para se esconder sob um pseudônimo. Ele voltou a usar seu nome de nascimento. —Queimou? Eu não vi nenhuma cicatriz em seu corpo. —Não é esse tipo de queimadura. —Ela disse. —É o que eles chamam quando o disfarce de um espião é descoberto e ele perde o apoio de seu governo. É por isso que ele teve que sair do FSB. —Por que ele foi queimado? —Política. —Ela disse com naturalidade. —Ele precisava sair, então foi ao grande chefe em Moscou, juntou-se a Nikolai e veio para Houston. —Mas, o que quero dizer é, o nosso governo sabe o que ele era, certo? —Eu agarrei meu cinto de segurança enquanto considerava quantas pessoas poderiam estar me vigiando. —Claro, eles sabem, mas também sabem que ele tem conhecimento sobre as coisas mais sujas que estavam fazendo. Há uma espécie de cortesia profissional que eles têm quando agentes se aposentam. Enquanto ele não interferir nos assuntos do governo aqui ou tentar apoiar as operações do governo russo, eles não o incomodarão. —Mas ele está na máfia aqui. —Eu protestei.


—Você sabe disso. Eu sei disso. Existe prova? —Ela olhou para mim e encolheu os ombros. —A polícia aqui sabe o que acontece com Nikolai e os albaneses e Nickel Jackson e os irmãos Reyes e o cartel e os motociclistas, mas se eles pudessem provar seus crimes, todos eles estariam na cadeia. Esses caras que correm no submundo são espertos. Eles são cuidadosos. Estão limpos. Ficam longe de problemas. —E se a sorte deles não se sustentar? E se alguém cometer um erro? —Há maneiras de lidar com isso. —Como? —Subornos. Chantagem. —E se isso não funcionar? —Exílio. —Para onde? Ela encolheu os ombros. —Um país sem tratados de extradição, ou um lugar onde você tem amigos que podem ajudá-lo a viver fora do radar. —Para onde você iria? —Eu me perguntei, pensando na facilidade com que ela levava tudo isso tranquilamente. —Nepal. —Ela respondeu sem hesitação. —Eu abraçaria o meu lado Doutor Estranho e me encontraria em um templo em algum lugar. —Doutor Estranho? —Você sabe, Steven Strange? —Ela fez movimentos bizarros com a mão quase como se estivesse fazendo um truque de mágica. —Brilhante, o cirurgião idiota que danifica as mãos em um


acidente de carro, então foge para o Himalaia para encontrar um Ancião para curá-lo, mas no final ele se torna o Feiticeiro Supremo. Ainda confusa, perguntei: —Isso é tipo uma coisa de superherói? —Você está brincando comigo? —Não. —Jesus, ok, ouça, depois que você tirar uma soneca, vamos fazer uma maratona da Marvel. —Eu não sei se isso é algo que eu... —Escute, você pode ficar sentada na segurança da minha casa preocupada com Kostya ou pode relaxar e me deixar distrai-la com super-heróis sensuais. Isso tudo será muito mais rápido se você mantiver sua mente ocupada. —Tudo bem. —De má vontade, assenti e aceitei seu conselho. Quando nós viramos para a Sampson Street, eu estudei nosso entorno. Era uma mistura de residencial e comercial. Parecia que houve tentativas de revitalizar a área. Pelo que parece, as tentativas não foram muito bem sucedidas. —Aqui estamos nós. —Disse ela, virando para a Capitol e depois para um beco entre as fileiras de moradias. As garagens para um carro estavam escondidas nos fundos de cada moradia. Quando ela entrou na nossa, eu disse: —Este lugar parece novo e muito bom. —O anúncio ou o corretor de imóveis, alguma merda dessas, chamava de chique industrial. —Ela bufou. —Eu tento não pensar sobre o amianto que eles provavelmente cobriram e a tinta à base de chumbo que cobriram com algumas camadas de primer. —Ela


desligou o motor. —Mas fiz um bom negócio nisso. A maioria das moradias nessa faixa de preço são buracos absolutos, sabe? —Sim. —Soltando meu cinto de segurança enquanto nossa viagem chegava ao fim, perguntei: —O que você acha que ele está fazendo agora? —Quem? Big K? —Sim. —Planejando. —Ela disse seriamente. —Tentando lidar com sua raiva assassina. —O que diabos é raiva assassina? —Isso é o que Max chama quando uma das pessoas que ele ama se machuca. —Explicou ela. —A única cura é a morte e ele é o ceifador.


CAPÍTULO VINTE E DOIS —Você é um homem difícil de encontrar. —Gabe Reyes rosnou, sua voz áspera e profunda. —Eu tenho estado ocupado. —Disse Kostya, pulverizando um eliminador de odores no porta-malas de seu carro. —Você e eu estamos, idiota. Kostya sorriu para a grosseria de Gabe. Não era nada pessoal. Era apenas sua atitude habitual em relação a todos. —Eu vou mostrar mais cortesia profissional da próxima vez. —É melhor. —Gabe disse. —Eu não tenho tempo para te perseguir, cara. Estou aqui investigando várias pistas, mantendo o controle sobre o cartel e este maldito russo e você não pode nem pegar o maldito telefone? —Peço desculpas, Gabe. —Disse Kostya, esperando que isso fosse suficiente para acalmar o mercenário irritado. —Sim, cara, é mesmo uma merda. —Ele rosnou. —Ouça, você tem problemas, Kostya. Sua cidade? Está prestes a ficar muito barulhenta e sangrenta. —Oh? —Ele apoiou o telefone entre a orelha e o ombro e enfiou a mão na bolsa preta em busca de outro frasco da solução que ele usava para jogar em alguns pontos do estofamento do portamalas. —Tenho estado de olho nos retardatários do cartel que não prometeram lealdade a Hector. E percebi que há uma chance de que eles me levem a Lorenzo ou ao prisioneiro foragido da velha senhora, que estou perseguindo. Um agente da Patrulha da Fronteira


que eu pago por informação me disse que todos os retardatários atravessaram ontem à noite —Explicou Gabe. —Eles atravessaram em diferentes pontos – Hidalgo, Laredo, Progreso, Brownsville. Alguns deles estavam em veículos particulares. Os outros vieram em caminhões comerciais. Era uma mistura de mexicanos e americanos. —Quantos? —Dezenove. —Merda. —Ele olhou em seu relógio e depois calculou mentalmente quanto tempo eles teriam levado para dirigir da fronteira até Houston. Olhando em volta do estacionamento vazio do armazém, ele disse: —Eles já estão aqui. —Sim. Imaginei que você devia ser informado caso Hector não soubesse o que estava por vir. Ele não tinha notícias de Hector há semanas. O novo chefão do cartel estava ocupado reconstruindo seu império e esmagando as últimas forças de Lorenzo, mas ele deveria ter negociado mais informações. —Esquadrão da morte? —Alguns deles, sim. O resto não é bem treinado. Haverá danos colaterais. Ele estremeceu, pensando em todas as vidas inocentes que poderiam ser perdidas e toda a publicidade e policiais que isso traria. Nikolai ficaria furioso. —Obrigado pelo aviso. —Gostaria de poder ajudar mais, cara. Ligue para o Diego e Nate. Eu lhes enviei uma lista dos nomes. Esses caras provavelmente tentarão se esconder em seu território até atacarem. Meus irmãos podem te dar algumas informações das ruas. —Eu os encontrarei mais tarde.


—Você atira em um dos meus irmãos e eu vou atirar em você, Kostya. Você sabe disso, certo? —Eu sei que você vai. —De qualquer outra pessoa, ele teria considerado uma ameaça vazia, mas Gabe era ferozmente protetor de sua família. Ele tinha feito muito pior do que atirar em alguém para ganhar seu exílio. —Eu entrarei em contato se tiver outras atualizações. — Gabe pareceu hesitar antes de acrescentar: —Tome muito cuidado. Você tem uma avalanche de merda vindo em sua direção. —Devidamente anotado. —Livre-se do telefone. A ligação terminou e ele quebrou o telefone. Terminou os detalhes no porta-malas de seu carro, verificando em sua lista mental de limpeza para se certificar de que não tinha pulado nenhuma etapa e, finalmente, sentou-se atrás do volante. O desejo de ligar ou mandar uma mensagem para Holly era forte. Ele afastou o pensamento, lembrando-se de que cada segundo que desperdiçava era um segundo que seus inimigos estavam conspirando. Pegando seu telefone de trabalho, ele ligou para Artyom. —Sim? —Artyom resmungou no segundo toque, sua voz rouca de sono. —Sou eu. Estou chegando. —Ele desligou e ligou para Sunny. —Fox encontrou você? —Sunny perguntou, muito séria. —Encontrou. —Vocês estão bem? —Estamos bem. Fox está com Holly.


—Esconderijo? —Sim. —Você sabe qual deles? —Eu não perguntei. —Estou quase terminando na casa de Holly. Você deve a ela novos produtos de limpeza. —Avisou Sunny. —Eu não tinha certeza de onde precisava limpar, então limpei toda a casa. —Obrigado. —Você se livrou do lixo? —Sim. Fox disse que você achou uma moto? —Eu lidei com isso. —Escute, nós temos outro problema. —Ele rapidamente informou a ela sobre o que Gabe lhe contara. —O que você precisa que eu faça? —Ela perguntou, pronta para suas ordens. —Fique com a Fox. Tenha sua vigilância aberta em todos os nossos locais de primeiro e segundo escalões. Espalhe pelas ruas que estamos pagando por boa informação. —Algo mais? —Diga a Max para levar Lobo para fora da cidade. Eu não quero nenhuma delas aqui para a tempestade que está chegando. —Eu vou lidar com elas primeiro. Vou entrar em contato mais tarde. —Seja cuidadosa.


—Você também. —Disse ela e terminou a chamada. Ele jogou o celular em um porta-copos no console central e esticou o pescoço. Quando parou em um sinal vermelho, tentou entrar na mente do esquadrão da morte mexicano que tinha sido enviado para Houston. Eles não tentariam grandes alvos primeiro. Eles iriam descer ao longo da cadeia alimentar – soldados de rua como Boychenko. Talvez acertar alguns capitães como Artyom ou Danny ou os homens que saíram como Ivan e Sergei. Ou, se quisessem fazer uma declaração, iriam atrás das mulheres e das crianças. Vivian, Erin, Lena, Benny, Bianca, Holly – as mulheres eram os alvos que causariam a maior dor para Nikolai. Ele enxugou o rosto e pisou no acelerador. Perder homens era esperado. Um capitão aqui, alguns soldados de rua ali, era apenas parte dos negócios. Mas famílias? Esposas, namoradas, crianças, nunca. Seria o maior fracasso de sua vida se alguma delas fosse ferida. No entanto, ele não podia negar que usá-las como isca era provavelmente a maneira mais fácil de acabar com toda essa confusão com o cartel de uma vez por todas. Era arriscado. Era perigoso. Poderia terminar mal, mas o pensamento não o deixava enquanto ele voltava para Houston. Ele tentou se lembrar que estava se preparando para um evento como este há anos. Havia camadas de segurança. Havia protocolos a seguir. Os homens foram treinados. Eles sabiam o que procurar e como reagir. Atrair o esquadrão para uma armadilha usando as esposas e namoradas seria relativamente fácil de planejar. Quando estacionou na casa de Artyom, desligou o motor e parou um momento atrás do volante para organizar seus pensamentos. Saindo do carro, olhou ao redor do bairro tranquilo. A maioria dos vizinhos de Artyom eram aposentados ou solteiros


mais velhos. Qualquer um que estivesse à espreita e esperando causar problemas seria facilmente identificado. Olhando para o céu, calculou quanto tempo eles tinham até o nascer do sol. Enquanto travava seu carro, verificou a rua novamente antes de seguir pela calçada para a porta da frente. Antes mesmo que levantasse a mão para bater, a porta se abriu e Artyom a usou para proteger seu corpo. Seu olhar estava estreitado com suspeita, e ele tinha uma arma na mão, mas apontou para o chão. —Desculpe acordá-lo tão cedo. —Kostya entrou e esperou que Artyom trancasse a porta da frente. —Eu nem quero saber, porra. —Artyom resmungou, com os olhos cansados, o rosto com a barba por fazer. Ele colocou a arma carregada na mesa de entrada e coçou o pescoço. Seu moletom pendia baixo em seu abdômen. Seu peito nu e braços eram um roteiro de ações e crimes sujos, as tatuagens escuras cobriam quase todos os centímetros da pele. Seus antebraços e mãos tinham poucas tatuagens, mas havia mais escondidas sob as calças. —Scorpion invadiu a casa de Holly, colocou uma faca contra ela e tentou nos matar. —Não havia sentido em dar a informação de uma maneira agradável. Artyom praguejou em russo antes de se virar. —Precisamos de café. —Eu prefiro vodka. Artyom apontou para o carrinho de bebidas móvel em sua cozinha enquanto prosseguia para a cafeteira no balcão. — Scorpion? —Resolvido. —Ele olhou ao redor da cozinha ultra elegante e moderna. Era o último projeto de remodelação de Artyom na casa da cidade. Logo, o capitão da rua a colocaria à venda e encontraria


uma nova propriedade para aproveitar seu tempo de inatividade e se acomodar por alguns meses. Artyom havia conseguido uma quantia considerável de dinheiro vendendo propriedades pela cidade. Fazia parte do seu plano de aposentadoria. De vez em quando, ele deixava outro soldado entrar nos negócios e compartilhar um pouco dos lucros e do conhecimento. —Holly está segura? —Sim. —Ele se serviu de um pouco de vodka e a bebeu em um só gole. Ele expirou a queimadura ardente e depois se serviu de um pouco mais. —Eu a mandei para um esconderijo. —Um dos nossos? —Não. —Melhor assim. —Artyom decidiu. —Se você a mandasse para um dos nossos, Nikolai estaria batendo na porta em meia hora. —Ele olhou por cima do ombro. —Ele sabe? —Ainda não. —Kostya murmurou antes de beber o resto da vodka. —Eu prefiro não estar lá quando ele descobrir. —Eu não quero estar lá também. —Ele respondeu com uma carranca. —Prometi a ele que a manteria segura. —Tecnicamente, você manteve. —Artyom colocou uma caneca de café quente na ilha central para ele. —Eu não acho que Kolya vai ficar feliz com os detalhes técnicos. Você quer leite? —Sim. Você sabe, se tiver notícias piores do que Holly e Scorpion, dê a ele depois. Faça isso rápido. —Sugeriu Artyom. —


Ele vai ficar tão chateado com a nova informação que vai esquecer a bagunça que você fez com sua irmã. Não era o pior plano que ele já tinha ouvido. Antes de abrir a geladeira para pegar o leite de Artyom, notou os desenhos infantis e a arte pendurada no aço inoxidável. Seu olhar se dirigiu para a moldura de papel de zebra em torno de uma foto de Artyom com Chess e sua filhinha no zoológico. Artyom parecia bem na foto. Feliz. Natural. Ele era o tipo de homem destinado a ser pai. —Então você e Chess? —Ele perguntou, abaixando-se para pegar a caixa de leite da geladeira. —Cuidado. —Advertiu Artyom, aprofundando a voz. —Eu não estou interessado em nenhuma opinião sobre como escolho passar meu tempo livre. Kostya levantou a mão enquanto levava o leite para a ilha. — Eu não tenho problema com isso. Nem o chefe. —Mas vocês conversaram sobre isso. —Nós conversamos. —Ele confirmou. —Disseram-me para deixá-lo fora do trabalho mais sujo. Kolya não quer você em apuros. —Eu aprecio o pensamento, mas fazer o trabalho sujo é o meu ofício. Foi a única razão que me trouxe para cá com ele. — Artyom pegou o leite e serviu o suficiente para deixar o café num tom marrom claro. —Não é esse tipo de relacionamento, no entanto. —O que isso significa? Você não está transando com ela? Artyom fez uma careta para ele. —Você tem que ser tão grosseiro? —Eu só estou perguntando. —Ele encolheu os ombros e devolveu o leite para a geladeira. —Isso é um não?


—É complicado. —Finalmente Artyom falou. —Eu me preocupo com Chess. Eu não deveria ter me permitido aproximar dela, mas aconteceu tão devagar que nem sequer reconheci o que era até... —Até que você perceber que a amava? —Sim. —Ela ama você? —Eu não sei. —Artyom admitiu. —Às vezes, acho que ela vai me dizer que se preocupa comigo. Às vezes, penso em finalmente convidá-la para sair em um encontro. —Você nem sequer saiu com ela? —Você já saiu com Holly? —Não. —Ele admitiu amargamente. —Então cale a boca sobre o meu relacionamento com a Chess. —Artyom retrucou. —Cuide da sua própria vida. —Esqueci-me de como você fica irritado de manhã. — Kostya respondeu, nem um pouco desconcertado pela grosseria de Artyom. —Ouça, tome o conselho do homem que esperou demais para agir. Pare de brincar e faça acontecer com Chess. Você está ficando velho demais para jogar esses joguinhos. Se você a ama e quer ser o pai dessa criança, é melhor você agir antes que outra pessoa o faça. Alguém que não vai cuidar do jeito que você vai. — Ele adicionou intencionalmente. —Quando você se tornou o Dr. Phil? Kostya riu e tomou um gole de café. —Eu tive muito tempo para pensar nas últimas semanas. Estou sentindo o tempo todo que


perdi. Todo o tempo que eu perdi rastejando por aí na escuridão. Estou cansado de tudo isso. As sobrancelhas de Artyom se ergueram. —Você quer sair? Kostya exalou um longo e lento suspiro. —Sim. —Nikolai deixaria você ir amanhã, mas o velho... —Artyom balançou a cabeça. —Eu não sei, Kostya. Pode ficar perigoso. Especialmente com o problema da Holly. —Ele disse, preocupado. —Você sabe o quão possessivo o velho pode ser. —Eu sei. —Sabendo que Artyom estava tentando ser um bom amigo, ele disse: —Terei cuidado. —O que diabos vamos fazer sem você? —Eu tenho planos de emergência prontos. —Ele prometeu. —Algumas das minhas aranhas são mais do que capazes de assumir o controle para mim, e nós sempre podemos promover alguém de dentro da hierarquia. —Tipo? —Boychenko. —Ele disse. —O garoto? —Artyom perguntou incrédulo. —Ele não é feito para o seu tipo de trabalho. —Não sabemos do que aquele rapaz é capaz, porque ele nunca teve chance. —Kostya retrucou. —Acho que ele poderia ser ensinado a ser um bom limpador. Ele é uma lousa em branco. Ele não tem maus hábitos para mudar. Ele é uma esponja esperando ser preenchido com conhecimento. Artyom resmungou baixo e tomou um bom gole de seu café. —O chefe não vai gostar. —Ele não precisa gostar. Ele só tem que confiar em mim.


—Boa sorte para convencê-lo disso. —Artyom rodou o café em sua xícara com um leve movimento do pulso. —Você não me acordou para falar sobre Holly e Scorpion. Por que você está realmente aqui? —Gabe Reyes me ligou. Ele está trabalhando com alguém em quem eu confio, e queria que eu soubesse que um esquadrão da morte atravessou a fronteira ontem. Eles estão vindo para cá. —Está finalmente acontecendo, hein? —Sim. Hoje. —De todos os malditos dias! Já estamos sobrecarregados nas ruas e temos duas equipes em Erin e Bianca. —Quando Ivan e Sergei voltam? —Esta noite. Devo chamá-los de volta antes? Kostya sacudiu a cabeça. —Isso pode dar uma dica ao cartel que nós sabemos. —Qual é seu plano? —Montar uma armadilha. —Com? —O rosto de Artyom ficou lívido quando juntou as peças. —Você quer usar as mulheres como isca? —Por mais que revire meu estômago, usar Vivian e as outras é provavelmente a maneira mais fácil de pegar esses idiotas. Eles querem machucar Nikolai pessoalmente pela forma como ele apoiou o golpe contra Lorenzo. Ir atrás de sua esposa ou as esposas de seus amigos é a maneira de fazer isso. —Preocupado que Artyom pudesse estar muito distraído, ele perguntou: —Chess? —Ela e Aly estão em Los Angeles a negócios. Elas vão ficar na Disneylândia por alguns dias.


—Bom. Nós sabemos que elas estão seguras. —E as outras? Elas estarão seguras? E se fodermos tudo? —Nós não vamos. —Ele tentou parecer otimista, mas sempre havia uma chance de que as coisas dessem errado. Artyom soltou um suspiro ruidoso e passou a mão no rosto. —Vou precisar de mais café.


CAPÍTULO VINTE E TRÊS —Tem certeza de que não quer que eu te traga alguma coisa? Talvez uma sopa? —Savannah ofereceu, sua voz cheia de preocupação. —Ou posso te levar à emergência se você precisar de soro ou medicamentos. Eu odiava mentir para minha melhor amiga. —Não, estou começando a me sentir melhor. Vou descansar e me concentrar em me hidratar. —Sério, porém, quantas vezes eu te disse para não comer aquele lixo de sushi de supermercado? —Eu sei. Estou pagando por isso agora. —Ok, bem, se você mudar de ideia sobre sopa ou uma carona, me ligue. Vou ficar até tarde para colocar em dia alguns documentos, estoque e reabastecimento. —Tenha cuidado, Savvy. Essas caixas são pesadas e desempacotá-las é uma tarefa para duas pessoas. —Lana vai ficar até tarde comigo. Estou treinando-a nos nossos sistemas de inventário. Ela está pronta para assumir mais responsabilidade. —Talvez deva falar com ela um pouco sobre a faculdade comunitária. —Sugeri. —Ela é tão inteligente, Savvy, e eu não quero que ela perca oportunidades. —Eu estou com você nessa, Holly. Vou conversar com ela. Vou pedir a ela para procurar o programa de incentivo jovem ou o Lone Star. O único obstáculo será sua fluência em inglês.


—Ela realmente está fazendo muito progresso. Tenho certeza que existem aulas que podem ajudá-la a se tornar mais fluente. Podemos ligar para os escritórios de admissão e ver o que eles recomendam. Não faz mal perguntar. —Concordo. —Ela fez uma pausa e eu pude ouvir Billie chamando-a. —Eles precisam de mim de volta no salão. Me ligue se precisar de alguma coisa. —Eu vou. —Tome cuidado, querida. Desligando o telefone que Fox tinha me dado, me acomodei no sofá confortável e fechei os olhos. Eu não gostava de mentir. Isso fazia eu me sentir nojenta. No fundo, eu sabia que Savannah entenderia por que eu estava mentindo, mas isso não me fez sentir melhor. —Você está protegendo-os ao mentir. —Fox disse por trás de uma enorme bancada de telas de computador do outro lado da sala de estar aberta. Ela monitorava diferentes sistemas de segurança e câmeras de trânsito o dia todo. Seu telefone tocava a cada meia hora mais ou menos e ela dava a alguém – Sunny, provavelmente – uma atualização. —Eu sei. —Respondi sombriamente. Olhando para seu sistema de vigilância, perguntei: —Como vão as coisas? —Tranquilo, na maior parte. —Ela disse e levantou-se de sua cadeira. —Estou indo para a cozinha. Você quer alguma coisa? Eu balancei a cabeça e gesticulei para a sobra de pizza na mesa. —Eu ainda estou cheia. —Vou guardar o resto na geladeira. —Ela pegou a caixa a caminho da cozinha. —Quer outra bebida?


—Eu estou bem. —Conseguiu falar com sua mãe? —Ela gritou sobre o som de cubos de gelo caindo em seu copo. —Não. —Eu respondi. —Isso não é incomum, no entanto. Ela está sempre em reuniões e recebendo ligações. Enviei uma mensagem a ela e foi lida então ela sabe que estou tirando o dia de folga para ajudar um amigo. —Você acha que ela vai acreditar nisso? —-Fox perguntou, voltando para a sala de estar com três latas de Dr. Pepper presas entre o braço esquerdo e o corpo e um copo cheio no outro. — Porque se ela passar pela sua casa e você não estiver lá e ela começar a investigar... —Ela não vai a minha casa sem me ligar antes. Ela sempre foi muito respeitosa com minha privacidade. —Porque ela te pegou em flagrante delito uma vez antes? —Ela adivinhou com um sorriso provocante. Meu rosto ficou quente só de lembrar da única vez que minha mãe tinha invadido meu quarto e me encontrado deitada de costas, com as pernas no ar e a cabeça do meu namorado na época enterrada entre as minhas coxas. —Eu tinha vinte anos e estava em casa nas férias de verão. Foi super embaraçoso. Fox riu. —Essa é uma das vantagens de não ter família, eu acho. Ninguém nunca me incomodou por me esgueirar para uma tarde de prazer. —Nenhuma família? Você cresceu em um orfanato? Ela assentiu. —Sim. Não foi horrível como um filme do canal Lifetime ou algo assim. Eu tive alguns pais adotivos muito legais. Eu era mais velha quando entrei no sistema – com sete anos


– e tive alguns problemas de comportamento, então não cheguei ao topo da lista para adoção. —Ela encolheu os ombros. —Eu tive uma infância muito boa mesmo assim. Terminei o colegial aos dezesseis anos, e minha última mãe adotiva me ajudou a arrumar tudo para que eu pudesse me emancipar aos dezessete anos. Nunca olhei para trás depois disso. —Você mantém contato com qualquer uma das famílias que a incentivaram? —Sim. Cartões de Natal e aniversário. Esse tipo de coisa. Uma batida na porta nos interrompeu. Rapidamente, Fox pegou uma arma atrás de sua mesa e tocou em seu teclado. Ela relaxou depois de alguns momentos tensos e apreensivos e colocou a arma de volta em sua mesa. —É a Sunny. —Eu vou abrir. —Levantei-me do sofá e atendi a porta, tomando cuidado para não mostrar meu rosto quando abri. Assim que Sunny entrou pela porta, eu a reconheci. O penteado moicano fúcsia elaborado que ela ostentava tinha sido um dos meus estilos favoritos que saiu em nosso salão nas últimas semanas. —Você é uma das clientes de Nisha! —Sim. —Ela disse, mudando a sacola de plástico branca de uma mão para a outra. Ela fechou e trancou a porta atrás de si. — Não abra a porta novamente. Seu tom severo me pegou de surpresa. —Ok. —Sério, Kostya vai cortar nossos pescoços se alguma coisa acontecer com você. —O olhar avaliador de Sunny percorreu a casa. Ela franziu a testa para a televisão. —Ela está fazendo você assistir todos os seus filmes de super-heróis? —Eles são divertidos. —Eu disse, me sentindo um pouco na defensiva de Fox. —Eu precisava do descanso mental.


—Se ela começar a jogar quadrinhos para você, corra. Você vai acabar ouvindo sobre o enredo cômico que o MCU precisa adaptar em seguida. Guerras Secretas versus Invasão Secreta versus Wang, o Conquistador. —É Kang, o Conquistador. —Fox corrigiu irritada. —Você foi ver o Nate para obter informações? —Sim. —Sunny estendeu a sacola plástica de compras. —Ele lhe enviou um presente da avó dele. —Ooh! —Fox reagiu com entusiasmo e correu para longe de seus monitores. —Tamales! Dê-me! Sunny segurou longe dela. —Prometa-me que não vai comer uma dúzia esta noite. Fox revirou os olhos. —Pare de policiar meu consumo de alimentos. —Não me chame chorando, pedindo um antiácido às três da manhã. —Sunny entregou o pacote. —Vou ligar para Max. —Fox respondeu, pegando o pacote com as duas mãos e abraçando-o apertado. —Ela não me deixará sofrendo. —Max e Lobo estão fora de alcance. —O quê? Quando? —Ordens do papai. —Disse Sunny. —Ele queria que elas saíssem da cidade. Max levou Lobo para o aeroporto George Bush pegou um voo e estão a caminho de Nova York. —Cidade? Ou estado?


—Ambos, aparentemente. Elas vão passar uns dias fazendo turismo na cidade e depois alguns dias em um B & B em Sleepy Hollow. —O quê! Essa era a minha ideia! —Fox fez beicinho. —Eu ia levar Lobo para Sleepy Hollow e Salem! Nós íamos fazer toda a coisa das Sanderson Sisters17! Sunny encolheu os ombros. —Leve-a novamente. A criança precisa sair mais, de qualquer maneira. Ela passa muito tempo praticando seus exercícios de armas e... —Criança? —Eu interrompi tentando acompanhar a conversa delas. —Quantos anos Lobo tem? —Outro pensamento me surpreendeu. —Ela é filha dele? —Não! —As duas responderam em uníssono antes de trocar um olhar preocupado. Fox finalmente me respondeu. —Ele encontrou Lobo quando ela era pequena. Ele a trouxe para Houston, e nós meio que a adotamos. —Tecnicamente, Max a adotou. —Sunny corrigiu. —Ela tem a guarda de Lobo até ela completar dezoito anos. —Mas ela é uma criança. —Eu interrompi, horrorizada com a ideia de uma pessoa tão jovem ser puxada para toda essa merda. —Por que uma adolescente está sendo exposta a isso? —Meu estômago apertou. —Ele está... ele está a treinando? Para matar pessoas? Para limpar cenas de crime? Sunny parecia desconfortável. —Olha, eu acho que estas são perguntas que você deve fazer a Kostya.

17 As Sanderson Sisters são as principais antagonistas do filme Hocus Pocus, de 1993.


—Pode apostar que sim. —Resmunguei, ficando de pé e levando meu novo telefone comigo. Sunny e Fox começaram a discutir em voz baixa enquanto eu marchava para o quarto que me deram e fechava a porta. Sentindo-me mal do estômago com a ideia de uma garotinha ser ensinada a fazer as coisas horríveis que Kostya fazia, com raiva enviei uma mensagem a ele. É

sério

adolescente

que

para

você

fazer

o

está

treinando

uma

seu

trabalho?

PQP,

Kostya!

Eu andei de um lado para o outro enquanto esperava por sua resposta. Meu estômago revirou ainda mais quando comecei a entender que não tinha ideia de que outros segredos ele tinha. Até a noite passada, eu consegui me convencer de que seu trabalho misterioso e ilegal não me afetava de maneira alguma. Eu não fui forçada a confrontar a realidade do que ele faz. Ele mata pessoas. Ele matou por mim. Eu esfreguei meu rosto com as duas mãos e me perguntei o que dizia sobre mim o fato de eu não estar tão incomodada por ele ter matado Scorpion. O homem tentou matar nós dois. Era mais fácil desculpar o que ele fez porque nossas vidas estavam em perigo. Eu disse a mim mesma que seria diferente se Kostya tivesse acabado de matar alguém para proteger o negócio ilícito da máfia. Mas ele fez isso. Todas as notícias sobre assassinatos no estilo de gangue e a violência nas ruas passaram pela minha mente. Em quantos ele esteve envolvido? Quantos outros crimes nunca haviam sido relatados porque ele os fez desaparecer como o corpo em minha casa?


Pareceu-me então que as mãos que me tocavam tão amorosamente eram as mesmas mãos que haviam feito coisas terríveis e violentas. Por mais que me doesse admitir, eu gostaria de ter suas mãos em mim novamente em um piscar de olhos. O amor não me deixava cega às suas falhas. Só tornara mais fácil aceitá-las. Aceitei Kostya pelo homem que ele era, em vez do homem que eu queria desesperadamente que ele fosse. Uma série de alarmes interrompeu meus pensamentos conturbados. Saí correndo do quarto e entrei na sala de estar onde Fox e Sunny estavam conversando rapidamente e encarando os muitos monitores de computador. Fox mudava de monitor para monitor, tocando seus teclados e amaldiçoando em alto e bom som. —Merda. —A testa de Sunny franziu. —Essa é a casa de Markovic, certo? —Sim. —Há alguém vigiando sua esposa? —Ela perguntou, inclinando-se para frente. —Erin. —Eu disse, correndo para se juntar a elas. —O nome dela é Erin. Havia várias imagens do sistema de segurança nos monitores. Meu olhar se moveu para o monitor que tinha toda a atenção de Sunny. Um caminhão de entrega marrom estava estacionado em frente a luxuosa casa de Erin. Havia homens usando uniformes iguais e portando armas em pé na varanda e na entrada da casa. Meu coração pulou uma batida com a visão de um homem careca no chão, de bruços e em uma poça de sangue. Ele parecia familiar, como um dos guardas que às vezes vinham ao salão com Vivian.


—K, você tem cinco imbecis na casa de Markovic. —Disse Sunny em seu telefone. —Parece que um dos seus homens está caído. É o Arty. Estou procurando por Erin agora... —Lá. —Disse Fox, apontando para um monitor. —Eles estão com ela. Minha atenção saltou para a tela que Fox indicou. Erin, com as mãos algemadas a sua frente e algum tipo de tecido enfiado na boca, lutava com dois homens tentando arrastá-la para fora da casa. Eu cobri minha boca para abafar meu suspiro chocado. Ambos os pés dela estavam fora do chão enquanto ela chutava e se contorcia, jogando os cotovelos e até mesmo tentando dar uma cabeçada no homem que a colocava na traseira do caminhão. Ela foi atirada lá e o outro homem pulou atrás dela. A porta se fechou e o veículo saiu acelerado da garagem. —Porra. —Sunny praguejou com força no telefone que segurava. —Parece que eles levaram Erin em um caminhão de entrega. Nós temos a polícia a caminho. Estou indo atrás do caminhão. Melhor ficar de olho em Vivian. Me ligue quando receber isso. —Eu preciso voltar para o meu prédio. —Fox disse quando Sunny colocou o telefone no bolso. —Eu preciso de acesso às câmeras de tráfego e outras coisas. —Vá. —Sunny ordenou. —Encontre esse caminhão. —Ela olhou para mim e franziu a testa. —Você fica aqui. Portas trancadas. Cortinas fechadas. Luzes desligadas. Você é um fantasma aqui, entendeu? Eu balancei a cabeça, meu coração acelerado com ansiedade. —Eu vou ficar bem. Vá. Ajude seus amigos.


—Kostya ou eu voltaremos para você mais tarde. —Sunny disse enquanto caminhava para a porta. —Vamos levá-la para um esconderijo diferente o mais rápido possível. Sem olhar para trás, Sunny se foi. Fox juntou suas coisas, me deu um abraço rápido e encorajador e correu para a entrada da garagem ao lado da cozinha. Quando calçou um par de tênis deixados lá, ela disse: Tenho segurança em todo este lugar. Você está segura aqui. Apenas não saia. Assim como Sunny, ela se foi sem me dar tempo para responder. Conversando com a porta fechada, eu disse: —Mas esses eram meus tênis...


CAPÍTULO VINTE E QUATRO —Que puta show de merda. —Ilya rosnou enquanto empurrava Ten ferido para um SUV que esperava. —Eu não preciso de sua besteira agora. —Kostya respondeu. Totalmente consciente de que tinha fodido e subestimado a gangue enviada do México, ele já tinha assumido a responsabilidade pelo desastre que se desenrolava diante dele. Naquela altura, seu foco era consertar a merda e levar todos para casa em segurança. Fulminando-o com o olhar, Ilya fechou a porta uma vez que Ten estava no banco de trás. —Eu não posso acreditar que Artyom concordou com esse seu plano de iscas. Agora ele está baleado e no hospital. Foma e Mitya estão mortos na casa de Vanya. A esposa do chefe quase foi morta. —Ele apontou para o estúdio de arte do armazém onde Ten e Vivian foram emboscados. —Temos que conseguir que Ten fique bem antes que seu agente da condicional o apanhe e jogue de volta na prisão. E agora perdemos as esposas de Ivan e Sergei, além de Danny e Boy! —Nós não as perdemos. —Comentou Kostya asperamente. Ele estava checando seu telefone pela centésima vez quando Fox enviou uma mensagem de que havia encontrado o caminhão de entregas que tinha levado Erin e estava seguindo-o pelas câmeras de trânsito para rastreá-lo até o seu destino final. —Nós teremos a sua localização em breve. —Sim? E se elas foram feridas? Você quer ser a pessoa a dizer a Vanya que a única mulher que ele já amou foi raptada? Estuprada? Morta? —Ilya sacudiu a cabeça. —Pode ter certeza que essa merda não vai sobrar para mim.


—Elas vão ficar bem. —Kostya disse, sua voz calma enquanto seu estômago estava uma bagunça. Ilya estava certo sobre tudo isso. Se algo acontecesse à Erin, Ivan ficaria furioso. Com Sergei ao seu lado, os dois homens se enfureceriam como feras selvagens e os danos colaterais seriam impossíveis de conter. —Espero que você esteja certo. —Ilya abriu a porta do SUV. —Se você não estiver, serei o primeiro a me oferecer para levá-lo em um barco e deixar seu corpo no Golfo. Como se eu fosse dar uma fodida chance... Seu olhar desviou do SUV de Ilya para Vivian, seu rosto e parte superior do corpo coberta pela jaqueta de Nikolai enquanto seu marido a colocava no SUV de seu pai. O aparecimento inesperado de Romero algumas horas antes tinha sido uma complicação indesejável. Considerando o que havia acontecido com Scorpion, ele não ficou muito feliz com a ideia de contar a Romero o que havia acontecido com seu amigo de longa data. Surpreendentemente, o ex-presidiário levou a notícia com pouco mais que um dar de ombros. Aparentemente, Romero suspeitava há muito tempo que Scorpion era traidor. —Onde eles estão indo? —Kostya perguntou quando se juntou a Nikolai na calçada do lado de fora do armazém. —O mais longe possível daqui. —O olhar de Nikolai estava fixo na parte de trás do SUV, levando sua esposa e seu bebê para longe da cidade. —Ela estará segura com ele. Ele fez um som evasivo. Uma vez, anos atrás, Romero tinha deixado Vivian para morrer com um tiro. Agora, ele estava tentando provar que era o pai do ano. O mundo era um maldito lugar selvagem às vezes.


—Você sabe que Vanya vai estrangular você quando descobrir que Erin está desaparecida. —Observou Nikolai. —Se, por algum milagre, ele não te matar, Sergei vai. —É a porra da minha bagunça. —Ele respondeu com naturalidade. —Tomei a decisão errada esta manhã baseado em informações não reveladas. Nossas mulheres se machucaram. Eu tenho que responder por isso. Se isso significa que Ivan e Sergei vão me dar uma surra e me colocar na UTI por algumas semanas? Que assim seja. —Você diz isso agora. —Nikolai resmungou. —Você nunca foi atingido por Vanya. — Passando os dedos pelos cabelos, perguntou: —Você tem alguma ideia de para onde eles levariam Erin ou Bianca? Você acha que elas estão juntas? Com Danny e Boy? —É mais fácil guardar quatro reféns em um local do que separadamente. —Você acha que eles ainda estão na cidade? Ele balançou sua cabeça. —Provavelmente por perto, no entanto. Eu os levaria para algum lugar rural. Algum lugar onde não fossem ouvidos facilmente. Para algum lugar, que fosse fácil esconder os caminhões de entrega e os grandes veículos que transportaram esse esquadrão para a cidade. —Um celeiro? —Nikolai sugeriu. —Uma fábrica? Um armazém? —Algo assim. —Concordou Kostya. —Como vamos encontrá-los? —Minhas aranhas estão trabalhando nisso.


—E essa bagunça? —Nikolai fez um gesto para o armazém atrás dele e os cadáveres lá dentro. —Eu já fiz uma ligação. —Os profissionais? —Sim. —E Holly? —Nikolai perguntou, sua mandíbula flexionando com óbvia irritação. Ele não ficou muito satisfeito quando soube que Holly tinha estado na ponta da faca e ajudou a descartar um corpo. —Segura. —Ele garantiu. —A mãe dela sabe? —Nikolai olhou para ele. Para alguém que só havia descoberto naquela manhã que sua tia morava em Houston e tinha sido uma agente secreta, o chefe estava aceitando bem. —Nós realmente não precisamos da complicação de uma exagente da KGB na nossa cola. —Estou mais preocupado com o fato de ela ser sua tia. – Respondeu Kostya. —A família é ainda mais perigosa que os espiões. —Eu suponho que no meu caso isso é verdade. —Nikolai resmungou. Esfregou a mão sobre a mandíbula e exalou alto. —Eu não posso nem acreditar que minha tia e minha irmã moravam aqui todo esse tempo. Eu deveria estar cuidando das duas. —Eu não acho que a mãe de Holly precisa ser cuidada. — Kostya comentou secamente. —De qualquer forma, nós precisávamos dela mais do que ela alguma vez precisou de nós. —Suponho que Holly não precisará mais da minha ajuda para encontrar o pai dela.


Kostya franziu o cenho para ele. —Do que você está falando? —Ela não disse a você? —Nikolai parecia surpreso. —Ela foi ao Samovar ontem à tarde. Almoçamos e ela me pediu para ajudá-la a encontrar seu pai. —Por que ela iria até você? —Ele perguntou, tentando não soar ferido. —Sua mãe disse a ela que seu pai era da máfia russa, então ela veio até mim para ajudá-la a encontrá-lo. —Pelo amor de Deus! —Ele fechou os olhos e imaginou como ela poderia ser tão incrivelmente ingênua a ponto de entrar no restaurante de Nikolai e pedir esse tipo de ajuda. —Ela não vai deixar isso passar. —Eu vou lidar com isso. —Quando? —Em breve. O telefone de Nikolai começou a tocar e ele se afastou para atender. Kostya pegou o seu e mandou uma mensagem para Fox para uma atualização. Ela respondeu rapidamente. Perdi o caminhão na I-10W. Seguindo outra pista. Enviarei uma mensagem com atualizações assim que Sunny encontrar alguma coisa.

—Alguma novidade? —Nikolai espiou, guardando seu celular.


—O caminhão com Erin foi visto pela última vez na I-10W. Minhas aranhas estão seguindo outras pistas. —Ele gesticulou com um levantar de cabeça. —Você? —Besian. —Disse Nikolai. —Ele está nos emprestando homens suficientes para cobrir nossos feridos e desaparecidos. Eles tiveram um ataque na garagem, mas Devil lidou com isso. —Algum outro problema? Nikolai sacudiu a cabeça. —Ainda não. —Mas? —Ele está preocupado com os outros clãs na cidade tentando criar problemas com os garotos de Lalo. —Esse não é nosso problema esta noite. Hector e Lalo deveriam ter mais controle sobre seus homens. Tudo isso? —Ele fez sinal ao redor deles. —Foram eles que não compartilharam informações e que não nos disseram que Lorenzo tinha homens suficientes para esse tipo de trabalho. Se a merda for para o lado deles? Não é problema nosso. —Eu não quero que os meninos Reyes entrem no meio disso. —Explicou Nikolai. —Eles são úteis. Eles são o futuro. —Não diga isso alto o suficiente para Lalo te ouvir. Ele fará algo estúpido. —Isto seria uma maneira fácil de se livrar dele. —Nikolai argumentou. —Vamos limpar um golpe completamente, antes de começarmos outro, sim? —Ele enfiou a mão no bolso para pegar seu celular que estava vibrando e atendeu. —Sim?


—Acho que os encontrei. —Disse Sunny, com a voz calma. —Fox verificou os nomes da lista que Gabe deu a você. Ela encontrou uma antiga fazenda de gado leiteiro que pertencia ao avô de um dos caras da lista. Foi hipotecada há alguns anos. Alguém comprou em leilão por uma ninharia. Fox aprofundou-se, e rastreou que foi vendida algumas outras vezes até que acabou nas mãos do neto. —Parece uma boa pista. —É. —Ela confirmou. —Estou verificando agora. Com binóculos. —Ela acrescentou, deixando-o saber que estava longe e escondida. —Há um enorme prédio aqui. Provavelmente onde faziam a ordenha? As portas estão fechadas, mas há algumas marcas de pneus grandes e profundos na lama e na terra seca. Eu vi seis caras diferentes até agora. Deve haver mais deles lá dentro... —Como está o perímetro? Qualquer tipo de segurança? —Fox está olhando mapas para mim agora. Existem duas estradas rurais diferentes que se dirigem para este caminho, e uma parece que vem da parte de trás da fazenda de gado leiteiro. A segurança é inexistente, pelo que parece. Vou procurar mais um pouco e te aviso. —Seja minuciosa. —Sim. Ele baixou o telefone e encontrou o olhar ansioso de Nikolai. —Uma das minhas garotas acha que encontrou o esconderijo. —Onde? —Uma fazenda de gado leiteiro. —Disse ele, olhando para o horizonte. —Vai escurecer em breve. Essa é a oportunidade perfeita para entrar e sair sem ser visto.


Nikolai olhou para o relógio. —Sergei e Ivan devem estar no aeroporto agora. —Ele fez uma careta. —Se formos encontrá-los, será um inferno. —Ilya já me disse que não vai contar ao Ivan o que aconteceu. Suspirando, Nikolai pegou seu celular e discou um número. —Dê o telefone para Ten. —Ele ordenou. Um momento depois, disse: —Eu preciso que você encontre Vanya e Sergei. Conte a eles o que aconteceu. Achamos que encontramos as mulheres e nossos soldados. Enviarei os detalhes assim que os tiver. Depois que o chefe desligou, Kostya perguntou: —Sério? Vai enviar Ten quando ele já está ferido? —Nem Sergei nem Vanya vão bater nele naquela situação. Ele está mais seguro que qualquer um de nós. Ele não podia argumentar com essa lógica. Enquanto caminhavam para o carro, ele voltou a verificar seu telefone e notou a mensagem que tinha perdido de Holly. Merda. Ele leu duas vezes, perguntando-se como diabos o assunto Lobo e como ela entrou na vida dele tinha surgido no esconderijo de Fox. Ele nem queria pensar no que Holly estava imaginando agora. Seu polegar pairou sobre a tela por um momento. Outra mensagem apareceu em sua tela, esta, de Sunny. Ele apressadamente digitou uma resposta para Holly e clicou em enviar. Ela não ia gostar, mas ele não tinha tempo para falar sobre isso com ela agora. Deslizando atrás do volante, ele olhou para Nikolai antes de deixar seu telefone em um porta-copos. —Sunny encontrou um celeiro onde podemos nos reunir...


CAPÍTULO VINTE E CINCO Não muito tempo depois que Fox saiu com meus tênis em seus pés, me sacudi do estupor que a ansiedade induzida pelas imagens das câmeras de segurança havia causado. Lembrando-me do que Sunny havia dito, desliguei todas as luzes e monitores de computador e me certifiquei de que todas as janelas estivessem com as persianas e as cortinas fechadas. Verifiquei as fechaduras de todas as janelas e das duas portas. Satisfeita que estava segura, eu me encolhi no sofá e tentei não pensar sobre o que estava acontecendo com Erin. Continuei vendo o homem sangrando em sua porta, e o jeito que Erin lutou para se libertar dos homens que a sequestraram. Eles estavam machucando-a? Ela estava sofrendo? Tentei me convencer de que os homens que a levaram não a machucariam. Certamente, ela valia mais para eles intocada e ilesa. A não ser que... Não. Recusei-me a pensar assim. Sentindo-me triste e oprimida, fechei os olhos e desejei que pudesse dormir um pouco. Eu queria parar de pensar em todas as coisas terríveis acontecendo. Não queria me preocupar com Kostya, Erin, Sunny, Fox ou qualquer outra pessoa que tivesse sido arrastada para esse pesadelo de violência. Queria voltar para a minha vida fácil e despreocupada, onde minha maior preocupação era se cumpriríamos as metas de clientes no mês. Atormentada pelos pensamentos de "e se", acabei caindo em um sono intermitente. O som distante de um telefone tocando finalmente penetrou meu pesadelo vívido, e eu acordei. Levei um


momento para entender o ambiente estranho. A sala estava escura como breu e estranhamente silenciosa. Parecia tarde, como se horas tivessem se passado desde que adormeci. Ao ouvir o telefone tocar outra vez, procurei-o, batendo nas almofadas ao meu redor. Lembrando que eu tinha deixado meu novo telefone no quarto, levantei-me do sofá e atravessei a sala para encontrá-lo. Meus passos foram cuidadosos enquanto eu caminhava pela casa escura, tentando me lembrar da disposição dos móveis. Vendo o brilho azulado do telefone, peguei-o e sentei-me na beira da cama. Verifiquei as chamadas perdidas e mensagens de texto. Eram principalmente da minha mãe, cada uma mais chateada e contendo mais letras maiúsculas do que a anterior. Aparentemente, ela passou pela minha casa e a encontrou vazia, meu carro na garagem e nenhum sinal de mim em lugar algum. Agora ela estava ameaçando chamar a polícia se não tivesse notícias minhas. Checando a hora, percebi que haviam passado horas desde que ela tinha entrado em contato. Eu dormi mais tempo do que eu imaginara. Sabendo que minha mãe provavelmente estava tendo um ataque, enviei-lhe uma mensagem rápida, lembrando-a que tinha ligado e enviado uma mensagem a ela antes sobre ajudar um amigo. Esperando aliviar o pânico dela e impedi-la de causar uma cena, prometi ligar para ela em dez minutos. Rapidamente, li as outras mensagens, quase todas de Savannah sobre coisas do salão. Havia apenas uma de Kostya, uma resposta um pouco grosseira à minha mensagem sobre Lobo.

Falaremos sobre Lobo mais tarde. Não saia do esconderijo.


Eu fiz uma careta ao tom de sua mensagem, mas decidi não responder com algo igualmente conciso. Eu estava muito cansada para entrar em uma briga por mensagem de texto, e realmente não queria ter uma conversa tão importante sem poder olhar ele nos olhos. Meu polegar pairou sobre a tela quando o telefone tocou novamente. Eu não reconheci o número e decidi não atender. Era provavelmente um robô ou algum golpe, de qualquer maneira. Assim que a ligação foi para o correio de voz, comecei a digitar uma mensagem para Kostya, mas então apareceu uma mensagem do número que não reconheci na tela. Curiosa, toquei a mensagem para abri-la e ofeguei. Era uma foto de Savannah e Lana. Ambas amordaçadas e chorando com sangue nos rostos, um fio escorrendo do nariz de Savannah e uma trilha espessa da boca de Lana. Começando a entrar em pânico, dei zoom na foto e percebi que elas estavam em algum tipo de veículo. Uma van? Um caminhão de entrega? Pensando em Erin na imagens das câmeras de segurança, comecei a pirar. —Porra! Porra! O que eu faço? Ligar para Kostya. Essa era a única opção. Outra mensagem chegou. Desta vez, havia facas pressionadas nos pescoços de Savannah e Lana. Ambas tinham os olhos fechados. Ambas pareciam estar rezando. Outra mensagem foi mandada. Continha um endereço e uma ameaça. Venha sozinha. Você tem 30 minutos. Ou começaremos a cortar.


Tremendo pela adrenalina, verifiquei o endereço e ficava a menos de dez minutos do esconderijo. Eu tinha tempo para chegar lá a pé, mas teria que me apressar. Certa que Kostya ficaria furioso, tirei uma captura de tela e enviei a imagem para ele com uma pequena mensagem. Eu

não

posso

esperar.

Estou

indo.

Sinto

muito. Encontre-nos. Por favor.

Na sala de estar, peguei os tênis que Fox havia deixado para trás e os calcei. Eles eram pelo menos um tamanho maior, mas não me importei. Sabendo que os alarmes silenciosos da casa iriam alertá-la que eu saí, abri a porta da frente, corri através do xeriscaping18 e pulei na calçada. Contente que eu tinha pelo menos tentado manter o meu treino de cardio e exercícios, segui em um ritmo constante. Desviei meu olhar do mapa na minha tela para as ruas escuras que me cercavam. Enquanto corria, um milhão de pensamentos bombardeavam meu cérebro. Nenhum deles era bom. Eu não era idiota. Sabia que estava cometendo um erro colossal. Eu estava correndo direto para uma armadilha, mas não podia deixar minha melhor amiga morrer sem tentar ajudá-la. Se eu chegasse lá a tempo, talvez pudesse enrolá-los até Kostya ou Fox perceberem que eu tinha saído. Se eu chegasse lá, talvez eles deixassem Savannah e Lana e me levassem. A parte esperançosa em mim, a parte que acreditava em Kostya e suas habilidades, sabia que ele me encontraria e salvaria a todos nós. Não havia outra opção. Era isso ou nossas mortes.

18

Xeriscaping é uma filosofia de paisagismo que utiliza o maior número possível de plantas nativas resistentes à seca e as organiza de maneira eficiente e economizando água


Sem fôlego e sugando o ar como um peixe, dobrei uma esquina e diminuí o ritmo. De acordo com o mapa, eu estava perto do meu destino. Corri cautelosamente, meu olhar pulando entre as fachadas de armazéns escuros e a rua estranhamente quieta e vazia. Havia um espaço grande e vazio entre uma loja de armários e um armazém que parecia me chamar para mais perto. Percebendo que era para onde eu precisava ir, engoli em seco e liguei a lanterna no telefone. Segurando-o na minha frente, movi o feixe luminoso de um lado para o outro. Pisei cautelosamente na grama crescida, os tênis esmagando o vidro quebrado. Evitei as latas descartadas e o lixo, preocupada em cair ou me machucar. O som de um veículo em marcha lenta – um grande – chamou minha atenção. Virei-me ao lado da loja de armários e vi uma carreta branca no estacionamento vazio atrás do edifício. Antes que eu pudesse dar uma olhada na placa para tirar uma foto para Kostya, os cabelos na minha nuca se eriçaram. Reconheci a sensação como um aviso de que alguém estava perto – perto demais. Mas antes que eu pudesse me virar, uma mão enluvada tapou a minha boca, sufocando meu grito de medo. Algo afiado picou meu pescoço e depois apunhalou-me profundamente. O telefone caiu da minha mão. Eu tentei lutar, para me afastar da dor da agulha enterrada no meu pescoço, mas minha cabeça começou a doer de repente. Minha visão embaralhou e tive dificuldade em respirar. Mole e quase inconsciente, senti meu corpo sendo erguido alto. Minha cabeça balançou contra as costas de um homem que cheirava a cigarros velhos e comida gordurosa. Eu tentei lutar contra o sono ameaçando me subjugar, mas o que quer que tenha sido injetado era muito forte. Eu mal senti quando fui jogada na parte de trás do caminhão, meus quadris e ombros batendo no chão de metal com tanta força que pensei que poderiam ter quebrado.


Assim que meus olhos começaram a se fechar, o último feixe de luz das lâmpadas do estacionamento iluminou Savannah e Lana juntas. Meu último pensamento foi para o único homem que poderia nos salvar agora. Kostya.


CAPÍTULO VINTE E SEIS —Deus Todo-Poderoso, esta coisa é quente! —Spider fez uma careta quando jogou o corpo na placa de metal saindo do forno crematório aberto. —Esse é o ponto. —Comentou Kostya, piscando os olhos cansados enquanto protegia o rosto do calor. Normalmente, ele preferia levar corpos que precisavam ser descartados para a casa funerária, mas usar esta velha fornalha monstruosa que ele pegou alguns anos atrás e escondeu em um armazém era mais discreto e mais rápido. —Quanto tempo leva? —Spider se perguntou enquanto empurrava a gaveta para frente e fechava a porta pesada. —Duas horas. Spider olhou para a pilha de corpos na lona perto do forno. —São dias de trabalho, Kostya. —Sério? —Ele brincou. —Eu não vou fazer todos de uma vez. É muito trabalho. Alguns vão para congelamento. Alguns vão para a Baia do Golfo. Outros irão para debaixo da terra. Tenho que processá-los primeiro. Spider fez uma careta. —Como diabos você lida com esse tipo de trabalho? Que tipo de pesadelos você tem? —Eu não tenho. —Ele mentiu. —Eu durmo como um bebê. —Falou o homem que nunca teve um bebê. —Spider cortou. —Bebês não dormem por merda nenhuma, cara. Você deita e levanta toda a porra da noite. —Esfregando o queixo, Spider perguntou: —Você quer que eu ajude você a processar estes?


—Você tem algum lugar melhor para estar? —Merda, posso pensar em uma dúzia de lugares diferentes que eu preferiria estar do que nesta fábrica de pesadelo. Mas ele não foi embora. Spider ficou e ajudou-o com o trabalho feio de limpar a bagunça deixada por eles na fazenda de gado leiteiro onde Erin, Bianca, Danny e Boy tinham sido mantidos. Considerando a má sorte que eles tiveram o dia todo, a recuperação das mulheres e seus soldados tinha corrido sem problemas. Ivan e Sergei tiveram suas esposas de volta, e Danny e Boy estavam se recuperando no hospital. Ten tinham sido tratado e mandado para casa antes de seu agente da condicional ter percebido a possibilidade de que ele pudesse estar fazendo algo ilegal. —O que você acha que a polícia vai pensar? —Perguntou Spider, enquanto lavavam suas mãos em uma pia algum tempo depois. —Provavelmente um sequestro e um resgate que deu errado. —Raciocinou Kostya. —Eles levaram Erin e Bianca. Ambos os maridos trabalham no armazém. Estavam em Vegas com seus lutadores competindo por prêmios de alto valor. Ivan é conhecido por ser rico. Bianca tem dinheiro. —Eu acho que faz sentido. —Spider concordou. —Porra, os policiais provavelmente estão tão cansados de todas nossas besteiras que não ligarão muito. —Se tivermos sorte. —Disse Kostya, pegando um rolo de papel toalha. Enquanto secava as mãos, perguntou: —Você falou com Romero? Sobre essa merda com Scorpion e Marco? —Sim. —E?


—Ele está feliz que esteja feito. Ficou desapontado ao descobrir que Scorpion havia se voltado contra nós, mas acontece nesse negócio o tempo todo. Eu senti que ele estava esperando por isso. —Você tende a desenvolver um sexto sentido para a traição. —Lembrando-se das preocupações de Spider sobre ser entregue por Scorpion, ele disse: —Eu localizei o contato de Scorpion e Marco. Ela não estava realmente trabalhando com o governo. Está morta agora, então não é um risco para nenhum de nós. Spider estreitou os olhos. —Se ela não estava trabalhando para o governo, para quem ela trabalhava? —Lorenzo e um velho problema da casa. —Ele respondeu. —Lorenzo será tratado hoje à noite. —Você acha que Hector tem boas informações sobre o esconderijo de Lorenzo? —Eu acho. —Hector havia oferecido um endereço pouco antes de invadirem a fazenda abandonada para resgatar Erin e Bianca. Ele checou o endereço com Fox antes de dar a Nikolai e fornecer-lhe tudo o que precisava para finalmente terminar isso. —E o outro problema? O de casa? —Estou trabalhando nisso. —Se precisar de ajuda... —Eu sei onde encontrar você. Spider olhou ao redor do armazém, seu olhar demorando-se no chão agora limpo onde os corpos haviam sido empilhados mais cedo. Kostya sentiu que havia limpado o suficiente por uma noite. —Por que você não vai para casa? Estou quase terminando aqui. Posso lidar com o resto sozinho.


—Tem certeza que pode? Ele assentiu, e Spider saiu sem outra palavra. Sozinho na quietude do armazém, ele levou um momento para fechar os olhos e apenas respirar. Respirações longas, profundas e lentas para relaxar a tensão da ansiedade em seu peito. Ele não estava acostumado ao fracasso. E não gostou. Parado aqui, sabendo que tinha feito uma ligação ruim mais cedo naquela manhã, o cortou fundo. Bianca e Erin poderiam ter sido mortas. Danny, Boy, Ten e Artyom ficaram feridos. Ele perdeu dois homens, ambos deixando para trás namoradas e crianças. Maldito desastre. Inclinando-se contra a pia, ele continuou pensando no que Spider havia dito. O preço que todos esses anos de trabalho sujo lhe custaram estava começando a pesar. Havia um cansaço nos ossos que ele não conseguia afastar. Uma fadiga que não podia ser resolvida com o sono. Ele precisava de uma pausa de tudo isso. Uma permanente. Mas esse sentimento de responsabilidade e lealdade a Nikolai eram difíceis de evitar. Ele não queria deixar sua família do crime em apuros. Não queria que os soldados, capitães e suas famílias sofressem porque ele não estava aqui para limpar suas bagunças e fazer todos os seus erros desaparecerem. Ele não queria perder os únicos amigos reais que já teve. Eu não quero perder Holly. Eis o cerne do seu problema. Ele teria que escolher. Não podia manter Holly em sua vida, ser o homem que ela precisava que ele fosse, e continuar trabalhando como limpador. As duas coisas eram simplesmente incompatíveis.


Um zumbido se infiltrou em seus pensamentos. Ele deu um tapinha nos bolsos, mas estavam vazios. Olhando pelo armazém, viu a mesa de trabalho onde tinha jogado a jaqueta mais cedo. Caminhou em direção a ela e enfiou a mão no bolso direito para pegar seu telefone. Olhando para a tela, viu que ela estava cheia com telefonemas e mensagens de Fox e Sunny. E Holly. Seu coração quase parou em seu peito quando ele abriu sua mensagem e leu. Eu

não

posso

esperar.

Estou

indo.

Sinto

muito. Encontre-nos. Por favor.

Com a boca seca e o estômago revirando, ele bateu para atender a chamada de Sunny. Antes que ela pudesse falar, ele perguntou: —O que aconteceu? —Me desculpe, K. Nós fodemos tudo! Sério. —Disse Sunny em pânico. —Diga-me o que aconteceu! —Eu saí do esconderijo para encontrar pistas. Fox saiu do esconderijo para ir ao centro de controle para ter acesso às câmeras de trânsito. Deixamos Holly no esconderijo e dissemos a ela que ficasse quieta. Tudo estava bem até os alarmes dispararem, e cheguei lá o mais rápido que pude, mas ela já tinha saído. —Saído? Para onde? —Ele tentou acalmar sua voz, mas o medo de perder Holly tinha-o dominado. —Eu encontrei o telefone em um lote vazio atrás de algumas lojas perto do esconderijo. Havia mensagens e fotos de um telefone descartável. Eles usaram Savannah e Lana para atrair Holly para fora


do esconderijo. Ela tinha um limite de tempo, trinta minutos, ou eles iam começar a torturar suas amigas. —Há quanto tempo ela deixou o esconderijo? —Pouco mais de uma hora. —Merda. —Ele amaldiçoou, sabendo muito bem quão longe ela poderia ter sido levada naquele tempo. —Você sabe para onde eles a levaram? Você pode rastreá-la? —Eles derrubaram o telefone dela assim a possibilidade mais fácil está descartada. Fox está vasculhando as imagens do trânsito e câmeras de segurança tentando encontrar veículos entrando e saindo daquela área, mas meio que está uma merda lá embaixo, então não está tendo muita sorte. Isso não está acontecendo. Ele estava tão preocupado que havia tirado os olhos de Holly tempo suficiente para que alguém a pegasse. —Você tem alguma ideia? —Sunny perguntou. —Alguma pista que eu possa perseguir? —Eu tenho que dar um telefonema. —Disse ele, já temendo isso. —Diga à Fox que eu vou vê-la. Encontre-me lá. —Ok. —Sunny hesitou. —Kostya, eu sinto muito. —Não se desculpe. A culpa é minha. —Ele desligou e tentou acalmar seus pensamentos acelerados. Visões de Holly sendo torturada com Savannah e Lana o atormentavam. Ela estaria com medo? Estaria machucada? Sangrando? Engolindo em seco, discou um número que só tinha há um dia. Houve apenas um toque antes de ser atendido. Soando como um gato furioso, Frances perguntou: —Onde está minha filha?


—Ele a levou. Ela se foi.


CAPÍTULO VINTE E SETE Uma sensação dolorosa em meus ouvidos me tirou do sono induzido por drogas. Grogue e nauseada, levantei a cabeça e tentei me concentrar. Meus olhos estavam secos e minha visão tão borrada que eu não conseguia descobrir o que estava vendo. —Shh. —A voz familiar de Savannah soou de uma maneira gentil e maternal. —Se você fizer muito barulho, eles voltarão aqui e te derrubarão com as drogas novamente. Mais acordada, percebi que tinha a cabeça contra o ombro dela. Eu fiz uma careta para a umidade em meu queixo. Eu tinha babado em toda a sua camisa, mas ela não parecia se importar ou sequer notar. Seu olhar estava focado no cabelo loiro platinado em seu colo. Com os pulsos amarrados, acariciou carinhosamente o cabelo de Lana, seu rosto com uma expressão de preocupação. — Ela acordou e começou a brigar com eles, então aplicaram outra seringa nela. —Ela ergueu seu olhar para mim. —Ela é tão pequena, Holly. Eles vão matá-la com essa merda. Compartilhando sua preocupação, esfreguei meu queixo com meus pulsos amarrados e finalmente consegui captar o que estava ao nosso redor e entender tudo. Nós estávamos em um avião. Um jato grande, pelo que parecia. Nós três fomos encurraladas em uma área que normalmente era usada como cozinha. Nossas pernas e pulsos estavam atados com braçadeiras de nylon. Savannah e Lana tinham ambos os rostos machucados e ensanguentados. Eu tinha conseguido evitar esse destino até o momento, mas não tinha muita esperança de que teria sorte o suficiente para continuar assim. Forçando um bocejo, aliviei a pressão dos meus ouvidos. — Estamos descendo ou subindo?


—Descendo. —Savannah disse baixinho. —Você sabe para onde estamos indo? —México. —Ela disse, inclinando-se para olhar para a área principal da cabine. —Há cinco deles nos observando. Dois pilotos. Sem comissárias. Um de nossos sequestradores entrou na cabine há algum tempo e eu os ouvi falando sobre aterrissar. Algo sobre a carga na traseira e os caminhões que eles precisam encontrar para manter o cronograma de entrega. —Carga? Nós? Ela balançou a cabeça. —Este é um jato de entrega. Como se fosse FedEx, mas não é. —Eles tinham caminhões de entrega quando sequestraram Erin mais cedo. —Eles sequestraram Erin? —Ela perguntou, horrorizada. — Ela está bem? —Eu não sei. —Olhando em volta nervosamente, perguntei em voz alta: —Por que o México? Por que eles nos querem? —Você. —Savannah corrigiu. —Eles queriam você. —Ela engoliu ansiosamente e olhou para Lana. —Tenho a sensação de que não vamos ficar por muito tempo. Depois de aterrissarmos, eles não precisam mais de nós. Meu estômago embrulhou. Fiquei nauseada ao pensar nisso, mas ela estava certa. Elas foram usadas como isca para me atrair para uma armadilha. Tinham feito a parte delas. O que aconteceria com elas agora? Eles as matariam? As estuprariam primeiro? Iriam vendê-las como escravas sexuais? Quantas coisas horríveis aconteceriam com elas? Isso é tudo minha culpa. Tudo isso.


Mas porque eu? Por que esses psicopatas me querem? Era Kostya? Estavam me usando para chegar até ele? —Alguns desses caras são russos, Holly. —A expressão de Savannah estava confusa. —Lana estava gritando com eles em russo, e eles estavam rindo dela da maneira mais condescendente. Os outros são mexicanos. Eu só não sei o que pensar. —Talvez seja uma coisa de gangue. —Eu imaginei. —Como uma família diferente na máfia russa e alguns caras do cartel? — Encolhi os ombros sem esperança. —Eu não sei. —Bem, precisamos descobrir se temos alguma chance de negociar por nossas vidas. —Ela disse seriamente. Depois de alguns momentos tensos, acrescentou: —Eu acho que você não estava realmente doente, hein? Envergonhada, eu balancei a cabeça. —Alguém invadiu minha casa na noite passada e tentou nos matar. Kostya me colocou em um esconderijo. Ela arregalou seus olhos. —Você está bem? Ele te machucou? O cara que invadiu sua casa? Eu balancei a cabeça. —Ele me cortou um pouco, mas está tudo bem. —E ele...? Eu balancei a cabeça. —Ele está morto. —Jesus. —Um segundo depois, ela perguntou: —Por que você saiu do esconderijo? —Eles me mandaram fotos de você e Lana. Eu não pude esperar. Eu apenas... corri.


Savannah revirou os olhos. —Eu te amo, mas você é realmente burra às vezes. —Grossa. —Eu bati no ombro dela. —Mas, sim, foi realmente idiota. —Bem, pelo menos você se divertiu com Kostya antes de toda essa a confusão? Meu rosto estava quente quando assenti. —Estávamos nus e na cama quando o arrombamento aconteceu. —Ele transou com você loucamente, hein? —Sua boca se curvou com um sorriso brincalhão. Rindo e começando a chorar ao mesmo tempo, assenti. — Sim. —Ei. —Ela me empurrou com o ombro. —Vamos ficar bem. —Eu não sei, Savvy. —Eu disse, com lágrimas escorrendo pelo meu rosto. —Isso não parece algo de que vamos escapar... —Temos que tentar. —Ela insistiu. —O que quer que seja isso, o que eles quiserem, temos que fazer o que for preciso para continuarmos vivas até que ele nos encontre. —Ela olhou em meus olhos. —Kostya vai nos encontrar. Fungando, limpei meu rosto com as costas das minhas mãos amarradas. —Você está certa. Temos que ficar calmas. O avião começou a descer, a pressão mudando o suficiente para fazer meus ouvidos doerem novamente. Estendi a mão para as mãos atadas de Savannah, agarrando-as o melhor que pude. Nós compartilhamos um olhar, comunicando silenciosamente o que nenhuma de nós podia dizer. Não havia como saber o que nos esperava no chão, mas lutaríamos para sobreviver.


CAPÍTULO VINTE E OITO

—Você poderia parar de fungar no meu pescoço? —Fox falou para Sunny quando Kostya entrou em seu covil particular. Ela havia tomado o último andar do prédio que abrigava a Hen House Security como seu próprio espaço pessoal, equipando-o com os melhores produtos eletrônicos e tecnologia que o dinheiro poderia comprar. Ele há muito tempo tinha desistido de tentar entender o que todos os diferentes aparelhos faziam ou para onde todos a fios iam. —Eu não estou fungando em você! —Eu não posso pensar com você pairando sobre mim! —Desculpe. —Sunny se afastou do centro de controle de Fox e começou a andar de um lado para o outro no canto da sala. Ela levantou a cabeça quando finalmente notou Kostya e franziu a testa. —Nós não temos nada ainda. —Você está procurando no lugar errado. —Ele deu um passo atrás de Fox e rabiscou um nome no bloco de notas junto ao braço dela. —Quem diabos é Igor? —Ela perguntou, franzindo a testa. —O homem que levou Holly e suas amigas. —Interveio Frances da porta. Vestida toda de preto, ela era uma figura intimidante, com sua postura rígida e seu olhar de desdém. Ele praticamente podia ouvir seus pensamentos enquanto ela olhava ao redor da sala, absorvendo o espaço bagunçado de Fox. Provavelmente estava catalogando todas as falhas, as brechas de segurança simples e a falta de saídas em uma emergência.


—Oh, K? —Fox olhou para ele, os olhos arregalados de surpresa. —Por que a mãe da Holly está aqui? —Eu não sou a mãe dela. Biológica. —Frances corrigiu enquanto se aproximava. —Eu sou a tia dela. Maksim é meu irmão. —Que confusão. —Fox murmurou. —E esse Igor? —Ele era meu chefe. —Explicou Frances. —Quando estávamos... —Na KGB. —Fox interrompeu, com as mãos seguindo para uma gaveta abaixo de sua mesa. —Eu peguei os arquivos ontem à noite. —Ela divagou, puxando uma pilha de papéis amarelados e mofados que se aglomerava em pastas verdes desgastadas. —Do nosso contato na Rússia. —Acrescentou ela, abrindo as pastas e folheando as páginas. —Tinha planejado ler todos hoje, mas então tive que levar Holly para o esconderijo e... —Foco. —Instruiu Kostya suavemente. —Há alguma coisa aí que pode nos ajudar? —Havia uma lista de nomes. Pseudônimos. —Ela disse, enquanto folheava os papéis. —Um deles era da Nicarágua. Alguma coisa Ortega. —Mariano. —Disse Frances. —Eu acho que foi o Mariano. Ele estava lá com os Sandinistas19. —Marcelo. —Declarou Fox, encontrando a página correta. —Sim, Marcelo Ortega. —Seu disfarce era gerenciar uma plantação de café. —Kostya comentou, lendo por cima de seu ombro. Olhando para Frances, perguntou: —Você acha que eles levariam as garotas para lá? 19

Sandinísmo é um movimento político nicaraguense pertencente ao espectro ideológico de esquerda, com tendência socialista, anti-imperialista, patriótica e nacionalista, que promove a integração da América Latina


—Eu duvido que a plantação ainda esteja sob seu controle. Já faz muito tempo. O governo teria tomado e privatizado. —Ela adivinhou. —Eu não sei se ele seria capaz de obter a cobertura política que precisa para voar para a Nicarágua sem levantar suspeitas. —Mas se ele tinha um negócio na América Central, ele provavelmente tinha outros. —Sugeriu Sunny. —Bom, foi assim que vocês ganharam dinheiro, certo? Os membros do alto escalão do governo e agentes da KGB? Vocês lavavam dinheiro através de interesses comerciais em outros países. —Sim. —Frances concordou. —Geralmente era assim que se fazia. Tinha sido mais fácil em lugares como a América Central naquela época. Não havia tanta supervisão. Você poderia se safar com muito mais. —Então, talvez, possamos começar investigando os laços comerciais que ele tinha naquela época. — Sunny decidiu, enquanto se movia apressadamente para um computador e sentava-se em uma cadeira de rodinhas. —Usaremos seu pseudônimo e seus laços comerciais para ver se alguma dessas antigas propriedades ou contas ainda estão ativas. Vamos investigar seus antigos parceiros e associados. —Ele está trabalhando com Lorenzo Guzman. —Kostya explicou. —Eles têm um inimigo comum. —Meu irmão. —Frances esclareceu. —Eu tenho certeza que há uma longa lista de pessoas que o consideram um inimigo. —Fox murmurou baixinho. —Sunny, você é capaz de lidar com rastreamento? Eu finalmente tenho acesso aos dados de voo que preciso.


—Dados de voo? —Kostya perguntou, inclinando-se para ver melhor o que ela estava fazendo. —Os caminhões de entrega. —Disse ela, clicando e digitando rapidamente. —Sunny e eu estávamos conversando sobre os caminhões que foram usados para levar Erin e transportar a tripulação do cartel pela cidade. Havia um caminhão de entregas estacionado atrás do salão quando os sequestradores entraram e pegaram Savannah e Lana. Elas foram empurradas para dentro dele. —Você acha que um tipo de avião cargueiro pode ter sido usado para levá-las para fora do país. —Ele disse, seguindo suas suposições razoáveis. —O que você está procurando agora? —Uma lista de todos os voos que decolaram, talvez, uma hora ou duas depois da Holly ter desaparecido. Suponho que eles queriam agir rapidamente. —Sim. Preferencialmente, eles iriam querer levar as meninas diretamente para a pista e embarcá-las no avião. Eles iriam para o sul depois da decolagem, então filtre qualquer outro destino. —Sim. —Fox estremeceu de dor quando digitou. Ele franziu a testa. —Você está bem? —Meus pés estão me matando. —Ela resmungou e encolheu os ombros. —Acho que eles estão inchados ou algo assim. —Você fica muito sentada. —Interrompeu Frances. —Você é jovem demais para gastar tanto tempo em uma cadeira. Você precisa usar uma esteira ergométrica. —Não sou realmente uma fã de exercício. —Fox murmurou enquanto examinava os dados de decolagens. —Estes parecem promissores. —Ela disse, apontando para sua tela. —E este. Merda.


Esses dois também. Precisamos de uma maneira melhor de reduzir nossa busca. —Eu vou ligar para o Gabe. —Frances foi até um canto da sala para ter privacidade. —Ele pode nos ajudar a reduzir a lista de possibilidades. Fox olhou para ele com surpresa. —Ela conhece Gabe? —Ele faz uns trabalhos freelancer para ela. —Freelancer. —Ela resmungou, fazendo um movimento de tiro com a mão esquerda. Enquanto Fox, Sunny e Frances trabalhavam, ele foi para uma estação de computadores a poucos metros de distância e colocou as imagens das câmeras de segurança da Allure. Ele avançou a maior parte, colocando as imagens em câmera lenta quando chegou ao rapto de Savannah e Lana. Ambas as mulheres estavam trabalhando no armário de suprimentos. Savannah parecia estar ensinando Lana seu sistema para organizar e o inventário digital que tinha em um tablet. Lana pegou o tablet de Savannah e começou a inserir dados enquanto Savannah abria as caixas com um estilete. De repente, a imagem ficou escura quando o salão ficou sem energia. Alguns momentos depois, o brilho fraco da iluminação de emergência que Fox havia convencido Holly a instalar começou a indicar os caminhos de saída do salão. Seu olhar voltou para a sala de suprimentos onde o azul do brilho dos LEDs alimentados por baterias iluminava o espaço. Savannah tinha uma mão calmante no ombro de Lana e nem percebeu que os homens entravam no salão pela porta dos fundos. Estes homens estavam vestidos de maneira diferente dos que atacaram Erin e Bianca. Eles se moviam com discrição militar, seus


passos silenciosos, suas armas em punho e prontas. Na sala de suprimentos, Savannah finalmente ouviu o barulho do grupo vindo para sequestrá-las. Ela empurrou Lana para trás e correu para a porta, fechando e trancando-a rapidamente. Segurando o estilete como uma arma, ela andou de costas em direção à Lana e pegou o celular na prateleira próxima. Os homens estavam do lado de fora da porta quando Savannah tentou captar um sinal no celular. Ela não podia saber disso àquela altura, mas os sequestradores tinham bloqueado todos os sinais de telefone celular e cortaram as linhas telefônicas nessa área. Não havia como ter acesso ao mundo exterior ou pedir ajuda. Ela empurrou Lana para um pequeno espaço entre as prateleiras e rapidamente colocou as caixas na frente dela, tentando escondê-la do que estava por vir. A porta sacudiu nas dobradiças quando um dos sequestradores bateu a bota contra ela. Não demorou muito para a porta ceder. O grupo entrou na sala em segundos, esmagando Savannah. Ela lutou como um gato, passando a lâmina do estilete no rosto, pescoço e braços de dois dos homens. Ela não deixaria que eles a levassem tão facilmente. Mas não teve chance. Uma pancada nas costas a derrubou no chão, e ela não se moveu por alguns instantes. Os outros homens da equipe chutaram as caixas e rapidamente descobriram Lana, arrastando-a pelos braços e batendo nela enquanto ela gritava de medo. Em menos de um minuto, os homens tinham ambas as mulheres amarradas e encapuzadas e as levavam para fora do salão como animais amarrados. Ele engoliu em seco ao pensar no que Savannah e Lana poderiam ter sofrido desde que foram capturadas. Holly provavelmente escaparia de qualquer violência real, porque era o alvo de alto valor, mas suas amigas? Elas eram dispensáveis. As


mulheres que eram dispensáveis não se davam bem em situações como essas. Holly nunca se perdoaria se Lana ou Savannah fossem espancadas, estupradas ou assassinadas. Ela nunca esqueceria. Ela nunca se livraria da culpa. Isso iria consumi-la e arruiná-la. —Porra! —Fox rosnou e se afastou de sua mesa. Ela tirou um e depois o outro tênis e jogou-os do outro lado da sala, fazendo birra como uma criança. Ela esfregou os pés doloridos e franziu o cenho enquanto murmurava o mais sujo recital de palavrões. —Você quase me acertou! —Sunny gritou com irritação, pegando o tênis que havia pousado em sua mesa. Ela estava prestes a jogá-lo de volta em Fox quando parou e olhou para o calçado em sua mão. —Este tênis não é seu. —Não, é da Holly. —Frances disse, pegando-o da mão de Sunny. —Eu tenho um par igual. Nós compramos em uma viagem de compras. —Oh. Meu. Deus. —Fox disse cada palavra dramaticamente e cobriu o rosto com as mãos. —Eu sou tão estúpida. Estúpida! — Ela voltou para o teclado e começou a digitar furiosamente. —Tão burra! —Você estava com pressa. —Frances argumentou. —Tenho certeza. —Não é por isso que ela é estúpida. —Interrompeu Sunny, levantando-se de sua cadeira. —Ela é estúpida porque se ela pegou os tênis da Holly, então Holly provavelmente está usando os dela. —E? —Frances perguntou, a testa franzida. —E Fox coloca rastreadores de GPS em todas as suas coisas. —Explicou Sunny. —Ela está sempre perdendo as coisas. Seu


telefone, seus tênis, suas bolsas, suas chaves, ela é como uma criança. —Eu ouvi isso. —Fox resmungou. —Eu não posso evitar. Eu tenho transtorno de déficit de atenção. Sunny revirou os olhos. —Autodiagnosticado. Kostya levantou a mão, dizendo silenciosamente a Sunny para deixar para lá. As duas discutindo não ajudaria. —Os tênis não estão enviando sinal agora. —Disse Fox. — Mas eles transmitiram um no aeroporto. —Qual? —Bush. —Fox minimizou e abriu outra tela. —Se usarmos o registro de horário e a localização GPS dos tênis. —Ela murmurou, enquanto percorria os dados das partidas dos voos de carga. — Podemos reduzi-los a... —Ela parou e abriu outra janela para obter a localização de GPS das pistas no aeroporto. De volta à tela de partida, ela rolou e clicou. —Este! Aeroporto Internacional General Francisco Javier Mina. —Tampico, certo? —Disse Sunny, quase correndo de volta para a mesa que estava usando. —Sim. —Respondeu Fox. —TAM é o código. —O que você achou? —Kostya perguntou, seu coração acelerando quando percebeu que suas aranhas estavam resolvendo o quebra-cabeça. —Esse Igor? Ele costumava executar seus embarques de café através de um porto em Altamira, que fica bem perto de Tampico. Ele tinha um monte de armazéns naquela área. —Tinha?


—Diz que eles foram todos confiscados pelo governo, mas isso não significa realmente nada, não é? —Ela olhou para ele por cima do ombro. —Lorenzo poderia tê-los comprado de volta em algum momento. Você nunca foi capaz de encontrar suas pilhas de ações no México. Procuramos em todos os lugares, mas nunca tivemos esses dados. —Ela gesticulou para a pilha de papel. —Este pode ser o lugar onde ele mantém todas as suas armas extras, dinheiro e drogas. Talvez onde manteve alguns dos homens que vieram aqui para matar e sequestrar hoje à noite. —Quanto tempo de voo de Houston para Tampico? — Frances perguntou, já ao telefone. —Duas horas? —Fox disse, lendo as informações de partida e chegada em sua tela. —Não podemos simplesmente aterrissar lá e esperar que eles não saibam. —Advertiu Kostya. —Precisamos de um plano melhor. —E é isso que estou fazendo. —Frances disse, virando as costas para ele e se afastando enquanto começava a dar instruções para a pessoa do outro lado da linha. Fox tocou o braço dele e deu um sorriu encorajador. —Você vai encontrá-la e salvá-la. Nós sabemos o que estamos fazendo agora, KGBeast. O uso de seu apelido era um momento de leveza que ele precisava desesperadamente. Ele estendeu a mão e puxou seu rabo de cavalo em resposta. —Nós somos sua equipe, Kostya. —Sunny se juntou a eles. —Nós estamos com você. O que você precisar, nós encontraremos. Custe o que custar, vamos recuperá-las. —Você é útil com uma arma. —Frances falou para Sunny, mas não foi uma pergunta.


Sunny assentiu. —Sim. —Você vem com a gente. —Frances olhou para Fox. — Você vai ficar aqui. Precisamos da sua ajuda quando chegarmos ao país. —Olhando em seus olhos, Frances disse: —É hora de acabar com isso. Tudo isso. Estou farta de olhar por cima do meu ombro. —Acho que isso nunca acaba. —Comentou Kostya secamente. —Mesmo se nós matarmos todos eles. —Talvez. —Frances concordou. —De qualquer maneira, será bom finalmente cortar a garganta de Igor. Nisso ele acreditava de todo coração.


CAPÍTULO VINTE E NOVE —Alguém está vindo. —Sussurrou Lana, afastando-se da porta onde estava ouvindo atentamente. Ela rapidamente se moveu para trás entre nós e puxou os joelhos para o peito, tornando-se o menor alvo possível. Eu engoli ansiosamente e olhei para a porta. Assim que o avião pousou, fomos drogadas novamente e levadas a esse lugar estranho e decrépito. Eles tinham nos colocado em um quarto úmido e escuro que cheirava a mofo e tinha camadas de sujeira por todo o chão de concreto. Nós tínhamos sido liberadas de nossas amarras, mas tiraram nossos calçados, relógios, joias e até o cinto de Savannah. Com apenas uma única garrafa de água para compartilhar e um balde de plástico imundo no canto servindo como banheiro, nós estávamos sentadas aqui por horas. Havia um banco de metal antigo ao longo de uma parede, mas era frágil, enferrujado e inseguro. Nós já tínhamos tentado olhar pela janelinha nos fundos da sala, mas o revestimento escuro de mofo e sujeira tornava impossível ver qualquer coisa claramente. Era assustadoramente silencioso em volta do prédio, então raciocinamos que estávamos no meio do nada. Nenhum barulho de estrada, nenhum carro, nenhum avião em cima. Apenas o zumbido constante de insetos. —Nós precisamos de armas. —Savannah sussurrou, seu olhar correndo ao redor do quarto escuro. —Precisamos de uma maneira de nos proteger. —Eles têm armas. —Lana respondeu com naturalidade. — Eles vão fazer o que quiserem conosco. —Ela parecia de repente mais velha e mais sábia quando disse: —Quando eles te pegarem,


não lutem. Eles vão lhes machucar mais se vocês brigarem. Fechem seus olhos. Abram suas pernas. Deixem que peguem o que quiserem. É mais fácil assim. Melhor para vocês. É mais seguro. Meu coração doeu por Lana quando percebi o que ela tinha passado antes de entrar em nossas vidas. Havia sinais de que fora vendida e usada, mas nunca foi uma certeza. Não até agora. —Respirem fundo. —Ela acrescentou, com olhar assombrado. —Dói menos se vocês relaxarem. —Ela gesticulou entre as pernas. —E se eles quiserem o outro, usem a boca primeiro. Eles não vão durar tanto tempo lá se você fizerem assim. É mais fácil de suportar quando é rápido. Meu estômago tentou se revoltar e engoli a onda de bile que ameaçava irromper. Quantas vezes Lana foi estuprada? Quantas vezes foi sodomizada? Por quanto tempo foi usada e abusada por homens? Semanas? Meses? Anos? A tranca da porta se moveu e as dobradiças rangeram quando foi aberta. Lana agarrou minha mão e a de Savannah, segurando firme enquanto encarávamos um de nossos sequestradores. Ele nos olhou, seu olhar demorando em Savannah por um momento longo demais antes de voltar para mim. Apontando em minha direção, disse algo em russo que eu não entendi. —Você tem que ir com ele. —Lana traduziu suavemente. — O chefe deles quer você primeiro. —Não! —Savannah estendeu a mão para me impedir, mas eu me afastei, prendendo-a no lugar com um olhar. Ela silenciosamente implorou para eu não ir, mas fiz um gesto com a mão, dizendo-lhe para ficar com Lana. Como um tubarão, o sequestrador russo me olhou com um olhar predatório. Um arrepio percorreu minha espinha enquanto eu


passava por ele e saía do quarto. O corredor era sujo e escuro, e lutei contra o desejo de me abraçar e começar a chorar. Depois de trancar a porta, o russo sacudiu os dedos para mim. Segui ao lado dele, lutando para acompanhar seus grandes passos. Com olhares sorrateiros, tentei entender o que ele era. Suas roupas – calça e camisa pretas, botas pesadas de estilo militar – me informavam que ele não era um homem do qual eu pudesse escapar ou fugir. Ele parecia treinado e eu não queria testar suas habilidades. Voltei minha atenção para o caminho que estávamos seguindo, passando por uma série de corredores antes de chegar ao andar principal do armazém. Havia caixas empilhadas em todo o lugar. Eram enormes torres, algumas de madeira e outras de metal. O cheiro de ferrugem e algo mais que eu não consegui identificar me atingiu. Era um cheiro estranho e cáustico, e eu não queria respirá-lo profundamente. Ficando perto do russo, o segui através do labirinto de caixas, cada passo me enchendo de pavor. Ele parou, e eu tive que me segurar antes de esbarrar em suas costas. Ele falou com alguém que eu não pude ver e depois se afastou. Sua mão grande segurou meu ombro, e me empurrou para frente. Eu tropecei em meus pés, arrastando os dedos descalços do pé esquerdo pelo concreto irregular e esfolando as pontas. Estremecendo, engoli meu grito de dor. Meu olhar disparou para o velho, em pé na frente de caixas de transporte juntas como uma mesa improvisada. Alto e magro, tinha os ombros curvados e havia apenas alguns tufos de cabelos brancos em sua cabeça careca. Havia manchas escuras em sua pele, mostrando sua idade e saúde debilitada, e linhas profundas de rugas ao longo do pescoço. Quando ele se virou para mim, forcei uma expressão firme e não reagi à escuridão absoluta de seus olhos. Eram desprovidos de emoção e me congelaram profundamente. Ele sorriu para mim, seu


sorriso maligno como um vilão de filme de terror. Seus dentes eram escuros e quebrados, e mesmo a essa distância, eu podia sentir o fedor horrendo vindo de sua boca a cada respiração. —Você se parece com ela. —Ele disse, sua voz grave e carregada e seu sotaque fortemente russo. Ele tossiu em um lenço manchado preso em sua mão direita muito magra, seus pulmões parecendo cheios. —Assim como ela. —Quem? —Eu perguntei, com medo de chegar mais perto e tentando ganhar algum tempo. Notei as manchas de sangue em sua camisa branca mal ajustada e me preocupei que ele tivesse algum tipo de doença que fizesse com que ele tossisse um muco sangrento. Ele limpou a boca e o escarro no lábio inferior e enfiou o lenço no bolso da calça preta. —Kira. Confusa, eu fiz uma careta. —Quem é Kira? Ele riu, seus pulmões protestando contra o esforço enquanto ofegava e tremia. Tirando o lenço do bolso de novo, pigarreou e limpou a boca. —Sua mãe. —O nome da minha mãe é Frances... —Sua verdadeira mãe. —Ele interrompeu. Eu pisquei. —Eu acho que você está confuso... —Eu não estou confuso. Eu sei o que sei. Conheço todas as mentiras que lhe disseram. —Ele voltou para a mesa improvisada e pegou algumas fotos. Quando ele se aproximou de mim, eu recuei, não querendo respirar o ar dele, mas o sequestrador russo estava tão perto atrás de mim que estendeu a mão e colocou entre minhas omoplatas, segurando-me no lugar. —Veja.


Relutantemente, tirei as fotos dele. Eu não reconheci o homem, mas havia algo familiar nele. Os olhos dele. O nariz dele. Eu os vi em algum lugar antes... Olhei para a jovem mulher com quem ele estava, seu braço em torno de sua cintura fina enquanto a puxava para perto. Meu estômago revirou quando estudei seu rosto. Era como me olhar no espelho. Ela me lembrou a mim mesma quando eu estava na faculdade. Eu passei para a foto seguinte. Era a minha mãe com o homem da primeira foto. Eles estavam sorrindo na foto, mas a proximidade deles era diferente. Não era a proximidade de dois amantes. Parecia mais... familiar. —A mulher que você conhece como sua mãe nasceu em Leningrado. Seu nome era Ekaterina Prokhorovna quando a encontrei em um orfanato. Ela era exatamente o que precisávamos. Inteligente. Moldável. Ansiosa para sobreviver. Implacável. —Ele suprimiu uma tosse enquanto continuava. —Eu a escolhi. Eu transformei-a na mulher que ela é hoje. Eu a enviei para a América. Eu dei a ela a oportunidade de uma vida, e ela me traiu. —Eu não sei quem você pensa que sou, mas você está errado. Minha mãe nasceu em... —Longview? Sim? Seus pais morreram quando ela era jovem. Sua casa de infância foi incendiada para que não tivesse fotos deles ou a sua certidão de nascimento original. Pois não? Eu hesitei. —Muitas pessoas perdem seus pais jovens ou têm suas coisas queimadas. Isso não faz da minha mãe uma mentirosa ou o que quer que você pense que ela é. Ele balançou a cabeça e voltou para sua mesa. Pegou outra pilha de fotos e empurrou-as para mim. —Veja.


Eu não queria olhar. Queria sair dali. Queria fugir deste velho maluco. Mas eu não fiz isso. Eu peguei as fotos. Eu olhei. Elas eram fotografias da minha mãe, muito mais jovem, em um uniforme de estilo militar. Ela estava aprendendo a lutar e atirar. Em outras fotos, estava sendo treinada em algum tipo de academia, livros abertos à sua frente, um lápis na mão. Mal conseguindo falar, perguntei: —O que é isso? —Ekaterina no instituto. Ela estava muito motivada. Eu nunca conheci nenhuma criança com uma determinação tão forte quanto ela. Eu não vi de novo até Kostya. Ergui minha cabeça e estreitei meus olhos. —O quê? —Eu nunca consegui treiná-lo, mas já o tinha escolhido para ser meu próximo protegido. Seus pais haviam trabalhado para mim. Eu os encontrara da mesma maneira que encontrara Ekaterina. Eles eram os agentes perfeitos e estavam criando o filho perfeito. Eu ia trazê-lo para ficar sob minha proteção, e então você aconteceu. Surpresa, perguntei: —Eu? —Kira. —Explicou ele, apontando para a foto da jovem que se parecia tanto comigo. —Ela era uma das minhas agentes. Era uma armadilha para Maksim, mas quebrou todas as regras. Se apaixonou por ele. —Ele disse, sua voz carregada com desdém. —E então ela concebeu você. Eu olhei para a foto de Kira e Maksim novamente. Ele estava certo? Eram esses meus pais biológicos? Mas como a minha mãe se encaixa em tudo isso? —Ekaterina ajudou Kira depois que ela escapou da minha custódia. Ela estava na Rússia na época, em uma viagem de


negócios, e assim que descobriu que seu irmão ia ter um bebê com uma das minhas agentes, escolheu a família em vez de mim e tudo o que eu tinha dado a ela. —O irmão dela...? —Ekaterina e Maksim são irmãos. A mulher que você acha que é sua mãe é na verdade sua tia. Sua verdadeira mãe, Kira, morreu no mesmo dia em que você nasceu. Bem. —Ele adicionou com um sorriso cruel. —Ela não morreu exatamente. Foi assassinada por Nina sob minhas ordens. Nina Antonovich. — Esclareceu. —A mãe de Kostya. Tentei absorver tudo o que ele tinha acabado de dizer, mas era um turbilhão de palavras e emoções angustiantes. A mãe de Kostya tinha assassinado a minha quando eu não tinha nem um dia de vida! —Ekaterina cuidou de Nina. Apanhou-a alguns dias depois. Foi rápida. Foi uma morte limpa. O pai de Kostya, no entanto... — Sua voz sumiu quando suspirou dramaticamente e então começou a tossir. —Bem, Maksim e seu temperamento eram infames. Meu estômago revirou ao modo como ele tão casualmente discutia os assassinatos de minha mãe e dos pais de Kostya. Ele agia como se fossem apenas peças descartáveis de xadrez que ele havia empurrado pelo tabuleiro para sua própria diversão e ganho. —Por que você está me dizendo isso? Por que nos sequestrou? —Eu gesticulei ao redor do armazém. —Qual é o sentido de tudo isso? Chocando-me com seu movimento rápido e força, ele invadiu meu espaço e agarrou meu pescoço em sua mão ossuda e dura. Ele apertou tão forte que eu não podia respirar e comecei a sentir minha visão ficar nublada. —O ponto é que você é a razão pela


qual passei décadas na prisão. Você é a razão pela qual fui torturado, passei fome e fui espancado. Você, Ekaterina e Maksim arruinaram minha vida e agora eu vou tirar a sua. Sua outra mão envolveu meu pescoço, aumentando a pressão e me sufocando. Sentindo-me tonta e com medo de desmaiar, juntei a última gota da minha energia e chutei o velho bastardo com força, bem na canela. Seu aperto diminuiu enquanto ele me amaldiçoava de forma horrível, e inspirei fundo de forma instável antes de acertar meu joelho em seu estômago fazendo ele inclinar-se para frente com dor. Mãos fortes seguraram meus ombros, girando com tanta força que praticamente voei pelo ar antes de bater no chão de concreto sujo. Meus joelhos bateram primeiro, sacudindo meu crânio, antes de eu cair para frente e bater meu queixo. Atordoada e sangrando, ofeguei por ar e tentei ficar consciente. Minha visão ficou turva e não consegui perceber o que estava para cima ou para baixo. Fechei meus olhos por um momento e lutei contra o desejo de vomitar ou desmaiar. O velho rosnou com raiva. Um momento depois, o guarda me tirou do chão e arrastou-me para longe. Consegui colocar os pés no chão e tropecei para frente, ficando de pé bem perto dele. Tentei lutar contra meu raptor, lançando meus cotovelos e arranhando seus braços, mas ele era muito mais alto e maior. Quando consegui golpear seu rosto, rasgando sua bochecha e pescoço com minhas unhas, ele gritou furiosamente e me deu um tapa com tanta força que caí sentada de costas. Abaixando-se, ele apertou meus antebraços com tanta força que gritei de dor, seus dedos queimando e machucando minha pele enquanto ele torcia meus braços para longe do meu corpo e me levantava novamente. Agarrando meus pulsos em uma das suas enormes mãos, ele apertou meu queixo entre o polegar e o indicador


e me forçou a olhar para ele. —Eu vou fazer você assistir enquanto meus homens fodem suas amigas. Quando terminarem, você vai ficar de joelhos e lamber cada homem até ficarem todos limpos. Então? Seus buracos serão meus. Horrorizada por suas ameaças, não lutei contra quando ele me arrastou para o quarto que virou cela. Ele segurou a minha nuca, seus dedos emaranhados no meu cabelo e puxando meu couro cabeludo, enquanto destrancava a porta. Ele me empurrou para frente no quarto, e eu corri para me afastar dele e ir direto para os braços de Lana. No mesmo momento em que percebi que Savannah estava desaparecida, ele pareceu perceber também. Ele entrou no quarto, caminhando na direção de Lana para interrogá-la. Só vi Savannah quando ela o atacou. Usando todo a sua força e os anos de jogos de softball de caridade que tinha em seu currículo, ela bateu um pedaço de metal na nuca dele, deixando-o atordoado. Ela não hesitou antes de bater novamente, desta vez acertando o lado de seu crânio. O sangue espirrou por toda parte quando o couro cabeludo se abriu. Lana e eu nos encolhemos com o rangido doentio de metal batendo no osso. Quando ele caiu para frente, Savannah se virou, novamente acertando-o entre os ombros para se certificar de que ele estava caindo. Aterrorizada que outro guarda tivesse ouvido a briga, eu corri para a porta, fechando-a silenciosamente e empurrando minhas costas contra ela, desesperada para mantê-la fechada. Lana arrancou suas meias sujas e empurrou-as na boca do guarda, silenciando seus gemidos. —Aqui. —Savannah tinha tirado sua cinta modeladora, deslizando pelas pernas e puxando de debaixo da saia. —Amarre suas mãos com isso. —Ela pegou os cadarços dele em seguida, arrancando-os rapidamente e usando-os para amarrar seus tornozelos para que ele não fosse capaz de ficar de pé ou andar.


—Ajude-nos. —Savannah sussurrou enquanto gesticulava para que eu me aproximasse.

apressadamente

Juntas, nós três arrastamos e empurramos o guarda para o canto da sala. Vasculhamos seus bolsos, pegando seu telefone, os pesos mexicanos e dólares americanos em sua carteira e a faca em sua bota. —Eu pensei que ele teria uma arma. —Savannah admitiu sombriamente. —Poderíamos aproveitar uma arma. —Nós temos uma faca. —Eu disse encorajadoramente. —E você tem isso. Ela levantou o pedaço de metal que eu finalmente reconheci como uma perna do banco. —É melhor que nada. —Nós realmente temos que sair daqui. Tipo agora. —Eu disse, pensando nas ameaças do guarda de nos estuprar e no velho demente que tentara me estrangular. —O homem que nos sequestrou é um maluco de verdade. E ele está doente. —Doente? —Savannah repetiu. —Como assim? —Ele estava tossindo. Tipo cuspindo sangue. —Fiz um gesto para o meu rosto e camisa, ambos salpicados com sua saliva. —Ele é esquelético e encurvado, e acho que pode ter fugido de uma prisão ou de um hospital psiquiátrico da Rússia. —Tuberculose? —Lana sugeriu nervosamente. —É comum lá em casa, especialmente em lugares como prisões. —Oh, isso é muito bom. —Savannah resmungou. —Estou indo embora daqui com tétano. —Ela mostrou as mãos cortadas e o pedaço enferrujado de metal. —E você com tuberculose. —


Balançando a cabeça, disse: —Bem, vamos lá, huckleberries20, vamos sair daqui. —O que é huckleberries? —Lana perguntou com confusão. —É uma coisa de filme. —Eu disse, pegando a mão dela e arrastando-a para trás de mim. —Tombstone. O personagem Doc Holliday tem tuberculose. Vamos assistir quando chegarmos em casa. —Você acha que pode nos tirar daqui? —Savannah perguntou quando abriu a porta alguns centímetros e olhou para o corredor mal iluminado. —É como um labirinto lá fora, mas eu sei o caminho que nós absolutamente não queremos ir. —Isso é melhor do que nada, eu acho. —Ela murmurou antes de sair para o corredor. Seguindo-a, acenei para a direita, indicando que precisávamos ir por esse caminho primeiro. Atrás de mim, Lana trancou a porta da sala onde estávamos presas, de modo que parecesse que ainda estávamos presas ali. Silenciosa, mas rapidamente, seguimos em fila pelo corredor, parando nos cantos e segurando nossas respirações antes de escolher uma nova direção. Assustadas pelo som inesperado de tiros, nós três congelamos. Trocamos olhares aterrorizados e nos aproximamos, nos encolhendo contra uma parede e deslizando para baixo como se assim nos tornássemos alvos menores. —Devemos ir ou ficar? —Savannah perguntou, sua coragem vacilando ao mesmo tempo que a minha. 20

Huckleberries-Mirtilos= Gíria na moda por volta do final do século XIX. As pessoas o usavam como elogio, como substituto de doçura ou amor. Ou apenas para descrever alguém que era realmente o melhor. Também foi usado em alguns círculos de jogo. É aqui que Doc Holliday entra. Você pode "apostar um mirtilo em um caqui", o que significaria fazer uma pequena aposta.


—Ir. —Disse Lana energicamente. —Vamos. Agora. Ou morremos. Sabendo que ela estava correta, eu me levantei primeiro e dei uma olhada na esquina mais próxima de nós. Ouvindo o tiroteio, parecia estar vindo bem atrás de nós, na área principal do armazém onde tinham me mostrado as fotos da minha mãe, Maksim e Kira. Parecia mais seguro seguir em frente, então puxei Lana atrás de mim e corri. Quando chegamos ao final de outro corredor, Savannah avançou e assumiu a liderança. Espiou pela esquina e recuou rapidamente. Ela encolheu-se e me empurrou contra a parede. Eu fiz o mesmo com a Lana. Savannah levantou o pedaço de metal e se preparou para arrancar a vida de alguém. —Porra! —Um homem praguejou alto enquanto bloqueava a perna do banco com o antebraço. Com os olhos escuros estreitados e uma expressão de irritação no rosto, ele arrancou-o das mãos de Savannah e abaixou o cano ameaçador do fuzil HK416. —Cuidado, Barbie Rebatedora. Estou aqui para te salvar. —Quem diabos é você. —Savannah retrucou, não confiando nele mais do que eu. —Você provavelmente trabalha para esses idiotas que nos sequestraram. —Baby, se eu fosse roubar você e amarrá-la, seria para mantê-la na minha cama. —Vá se foder. —Ela rosnou quando ele a olhou de cima a baixo. Seu rosto duro se suavizou com diversão. À medida que mais tiros foram disparados, sua expressão brincalhona ficou séria. —Eu sou Gabe Reyes. Estou aqui para levar vocês três em segurança


enquanto Kostya cria uma distração. Então, você pode vir comigo agora ou tentar encontrar uma saída sozinha. Nós três trocamos olhares nervosos. Eu reconheci sua arma como uma usada pelas forças americanas. Minha mãe e eu atiramos juntas em um clube de tiro feminino, então eu estava ciente de sua história e uso. No armazém com o velho maluco, eu vi rifles e armas russas, principalmente AKs e imitações baratas como WASR-10s. —Nós vamos com ele. —Eu decidi. Nós não tínhamos outra escolha. Se ele trabalhasse para os sequestradores, atiraria em nós se tentássemos escapar dele. —Vamos. —Ele largou o pedaço de metal e voltou para o caminho que tinha vindo. Com os movimentos medidos de um militar, ele nos conduziu por um corredor e depois outro. Nós ficamos juntas, com medo de nos separarmos ou sermos deixadas para trás. Ele manteve sua arma levantada, pronta para atirar. Nós só poderíamos esperar que ele estivesse mirando em nossos inimigos. Ele levantou o punho fechado para nos sinalizar para parar. Chegamos a uma interseção dos corredores com uma porta de saída à frente. Amontoadas, observamos ele seguir o corredor perpendicular antes de abrir a saída apenas uma fresta. A luz do sol matinal entrou no espaço escuro e o cheiro limpo de ar fresco encheu o salão úmido. Com seu pé segurando a porta, ele ficou com a arma levantada, pronto para disparar enquanto olhava para todos os lados em busca de problemas. —Venham. Savannah saiu primeiro. Eu empurrei Lana atrás dela e fiquei atrás. Quando estávamos fora do prédio, ele fechou a porta cuidadosamente com o pé, não deixando bater ou fazer algum barulho. Ele assumiu a liderança novamente, empurrando Savannah


antes de pegar a mão dela e puxá-la para atrás dele. Ela procurou por Lana e Lana por mim. A essa altura, meu coração batia com tanta força que o pulsar nos meus ouvidos abafava tudo ao nosso redor. Eu estava vagamente ciente do tiroteio incessante explodindo no armazém abandonado. Minhas pernas estavam trêmulas e meus dedos tremiam quando o pico de adrenalina me dominou. A mão de Lana estava tão vacilante quanto a minha, seus dedos trêmulos e frios. O alívio me dominou quando finalmente avistei Kostya. Ele estava usando a porta de um SUV como cobertura enquanto disparava rapidamente para o armazém. O colete à prova de balas preto sobre a camisa cinza apertada amenizou o terror que eu senti ao vê-lo tão exposto e em risco. Incapaz de desviar o olhar dele, eu nem sequer ouvi as instruções de Gabe para Savannah e Lana. Em vez disso, segui sem piscar, meu olhar fixo em Kostya. Eu respirei fundo ao ver minha mãe. Ela estava do outro lado do SUV, disparando tão rapidamente quanto Kostya. Ela abaixou o rifle, deixando pendurado pela alça no ombro, e pegou outra arma dentro do veículo. Quando levantou a arma enorme com tanta facilidade e conforto, percebi que tudo que me disseram no armazém era verdade. Minha mãe não era minha mãe biológica. Ela era minha tia e era uma espiã russa. A enorme arma de cano disparou com um barulho alto, atirando um projétil no armazém. Antes mesmo de acertar, ela disparou mais duas vezes, enviando grandes disparos pelas janelas. Uma rajada de explosões me mandou para o chão. Eu caí em cima de Lana, protegendo-a com meu corpo e cobrindo seu rosto e pescoço enquanto a explosão de calor e fumaça saía do prédio. As paredes de metal fizeram barulho quando caíram, e o armazém lançou chamas altas no céu. Ouvi homens gritando e depois mais disparos enquanto corriam para fora do prédio


destruído. Dentro do armazém, o conteúdo das caixas começou a pegar fogo e detonar. Cada nova explosão estremecia meu corpo, sacudia minha cabeça e socava meu estômago. —Levante-se! —A voz de Kostya estava bem no meu ouvido quando ele me levantou do chão e me puxou. —Temos de ir. Agora! Sunny pegou Lana pela mão, arrastando-a para o SUV com motor ligado. Gabe já havia empurrado Savannah para uma porta aberta e estava forçando-a a entrar. —Holly! —Kostya gritou novamente, me sacudindo do meu estupor. —Temos de ir! Toquei seu rosto, minha mão em sua mandíbula e olhei para ele. Naquele momento, tudo em que eu conseguia pensar era a horrível e terrível verdade entre nós. Kira. Minha tia-mãe. Meu pai. Os pais dele. Todas essas pessoas que deveriam nos amar e nos proteger tinham arruinado tudo antes mesmo de nos conhecermos. —Kostya. —Eu disse com um soluço. —Minha mãe. —Eu sei. —Ele sussurrou apressadamente, me puxando. — Eu sei tudo sobre isso. Eu caí contra ele, desesperada por seu calor e sua segurança. —Eu sinto muito. Por tudo. —Não. —Ele disse, beijando minha têmpora. —Nenhuma desculpa. Você está a salvo. Você está voltando para casa. Isso é tudo que importa. Olhando para ele através dos meus olhos marejados, levantei nas pontas dos pés para beijá-lo. A mão dele segurou atrás da minha cabeça quando esmagou sua boca contra a minha. Agarrei as tiras de seu colete, segurando-o como a vida e não querendo nunca soltá-lo.


E então Kostya me empurrou. Uma vez. Duas vezes. Mais duas vezes. Seu aperto em mim vacilou, apenas me tornei consciente de uma estranha dor em meu lado. Ele recuou, sua expressão lívida com o choque. Eu senti então – a umidade na minha pele. Olhando para baixo, vi a mancha vermelha encharcando sua camisa e a minha. Não fazia sentido no começo. Ele estava usando um colete, mas ele estava de lado, dando uma abertura suficiente para que um punhado de balas o atravessasse. Duas tinham atingido do outro lado e ido direto para mim. Nós dois cambaleamos juntos, ele alguns passos para trás e eu dois passos para frente. Nós éramos como dançarinos bêbados, cada um segurando-se ao outro para se equilibrar. Ele caiu primeiro, deitado de costas, e eu caí ao lado dele. Ele estava respirando com dificuldade, puxando ar em suspiros assustadoramente superficiais. Sangue jorrava dele agora, encharcando a grama e a sujeira ao nosso redor. —Vá! —Ele me empurrou, rude e fracamente. —Vá, Holly. —Eu não vou deixar você! —Ignorando minhas próprias feridas, eu coloquei a mão nos buracos de bala que eu podia alcançar, empurrando para baixo com dificuldade para colocar pressão sobre ele. —Você vai ficar bem. Nós vamos levá-lo para um hospital. Uma bala passou zunindo por mim e acertou o chão. Eu me atirei em cima de Kostya, desesperada para protegê-lo de mais ferimentos, e olhei para o armazém. O velho, aquele louco filho da puta, saiu mancando do armazém em chamas, tossindo sangue enquanto levantava seu braço trêmulo para disparar novamente.


Mas não em mim ou Kostya. Seu foco estava fixo atrás de nós. Eu olhei para trás e vi minha mãe correndo para nos ajudar. Ele disparou um tiro que quase a atingiu, e percebi que ela havia deixado suas armas no SUV. Aquele psicopata ia matar minha mãe e o homem que eu amava, a menos que eu fizesse alguma coisa. Senti em minha coxa, a dura coronha da arma de Kostya. Puxei-a do coldre de quadril, tirei a trava de segurança e fiz o que já havia feito milhares de vezes com a minha mãe. Controlei minha respiração. Apontei para o centro do alvo. Apertei o gatilho. Meu primeiro tiro atingiu-o no peito. Meu segundo e terceiro logo abaixo disso. O quarto tiro pegou-o na bochecha quando ele tombou para frente. Sangue espirrou quando ele caiu de cara, ficando imóvel. Ele não ia machucar mais ninguém novamente. Com as mãos trêmulas, travei e larguei a arma. Toda a minha atenção estava em Kostya agora. Seus lábios estavam pálidos. Seus olhos arregalados de choque. Um suor escorregadio cobria sua pele. Ele está morrendo. —Nós temos que movê-lo. —Minha mãe disse quando se abaixou e pegou a arma. Depois de colocá-la em seu cós, ela tocou meu abdômen sangrando. —Você está ferida! —Ele está mais ferido. —Eu tirei a mão dela e me movi para a cabeça dele. Deslizei minhas mãos sob seus ombros, e ela se moveu para agarrar suas pernas. A dor irradiou pelo meu abdômen quando o ergui do chão, mas ignorei, desesperada para salvar o homem que amava. Sunny apareceu de repente e nos ajudou a levá-lo de volta ao SUV. Savannah e Lana tinham baixado os assentos, fazendo um grande espaço na área de carga.


Enquanto nós carregávamos Kostya na traseira do SUV, Savannah subiu no banco do passageiro para dar mais espaço para nós. Sunny fechou a porta traseira e começou a vasculhar alguns sacos pretos procurando suprimentos médicos. Eu caí ao lado de Kostya, minhas próprias feridas começando a me deixar tonta. —Quanto dinheiro você tem? —Gabe perguntou do banco do motorista enquanto agressivamente ligava o motor e deixava o armazém em chamas atrás de nós. —O bastante. —Minha mãe respondeu, tirando o colete à prova de balas antes de puxar o de Kostya. —Vá para o hospital mais próximo com uma sala de emergência. Vamos transferi-lo para um hospital particular quando ele estiver estabilizado. A mão fria de Kostya se fechou ao redor da minha, mas seu aperto era tão fraco que tive que enroscar nossos dedos. Inclinei-me, ignorando a dor no meu abdômen e toquei minha testa na dele. Ele tentou levantar a outra mão para tocar meu rosto, mas seu braço tremeu e caiu de volta. Minha mãe e Sunny começaram a tratar seus ferimentos, colocando ataduras e injetando-lhe seringas previamente preparadas. —Olhe para mim. —Ele ordenou severamente. Quando eu encontrei seu olhar determinado, ele disse: —Nada que aconteceu antes de nos conhecermos importa. Nada disso. —Ele sorriu para mim e sussurrou: —Eu te amo, Holly. —Eu te amo. —Eu o beijei ternamente, desejando poder lhe dar minha força. —Eu te amo muito. Seu sorriso gentil vacilou e suas pálpebras tremeram. Sua mão relaxou completamente e escorregou da minha. Levei um segundo para perceber que algo estava errado. —Ele não está respirando!


—O quê? —Minha mãe se moveu em direção ao peito dele e checou seu pulso. —Holly, você se lembra da sua aula de primeiros socorros? Eu tirava o certificado todos os anos para o salão. Sem pensar duas vezes, entrei em ação com minha mãe. Ela colocou as mãos em seu peito e começou a empurrar com força, bombeando através de seu corpo no lugar de seu coração enfraquecido. Quando fez uma pausa, eu levantei o queixo dele, pressionei minha boca na dele e forneci a ventilação que forçava seu peito a subir. De um lado para outro, fizemos a ressuscitação cardiopulmonar. Sunny manteve pressão com suas mãos, mas o sangue continuava saindo dele, infiltrando-se nos estofados e nas nossas roupas. Gabe e Sunny gritavam de um lado para o outro. Ele dirigiu rápido, mas controlado, mantendo o SUV em segurança na estrada, sem desviar ou arremessar-nos, apesar da alta velocidade. Depois de outra rodada de respiração boca a boca, levantei a cabeça e me senti insuportavelmente tonta. Eu caí para o lado e minha mãe gritou meu nome. Lana me pegou, me guiando para o banco dobrado. Ela falou com a minha mãe em russo, com a voz calma e firme. Alguns segundos depois, estava pressionando um curativo no meu lado. Minha visão começou a desvanecer-se, ficando confusa ao redor. Eu olhei para o corpo imóvel de Kostya, seus braços levantando com cada empurrão das mãos da minha mãe e seu peito subindo com cada respiração compartilhada de Sunny. Por favor, não morra.


CAPÍTULO TRINTA Com a boca seca e dor de cabeça, acordei do sono mais estranho. Meus braços e pernas pareciam estranhamente dormentes, mas minha garganta e nariz estavam doloridos. Minha cabeça doía e meu estômago parecia desconfortavelmente cheio e pesado. Pisquei várias vezes, esperando limpar minha visão confusa. Os sons de máquinas apitando se infiltraram em minha consciência enquanto eu tentava entender o que me cercava. —Você está em um hospital, Holly. —A voz gentil da minha mãe chamou minha atenção. Ela estava sentada perto de mim, em uma cadeira de cabeceira e segurava minha mão esquerda. Suas roupas estavam amassadas. Seu cabelo, liso e sem graça. Ela parecia tão cansada e envelhecida. —Você quer um pouco de água? Eu balancei a cabeça e agradecidamente bebi da água gelada que ela colocou em uma garrafa. A água desceu pela minha garganta e aliviou a dor ardente. Memórias do sequestro e do tiroteio correram diante de mim. Olhei para o meu lado e tentei levantar minha camisola hospitalar para ver o dano. —Cuidado. —Minha mãe repreendeu baixinho enquanto deixava de lado a garrafa de água. —As cicatrizes são mínimas. — Ela me ajudou a levantar o lençol e a camisola hospitalar para revelar o curativo que se estendia do meu quadril até o umbigo. — Você teve sorte, Holly. Eles pensaram que o seu intestino tinha sido perfurado pelos tiros que eram para Kostya, mas foi principalmente um ovário e trompas de falópio. Seu outro ovário está perfeitamente seguro e saudável. Você poderá ter filhos. —Ela me assegurou. Aliviada pelo dano não ter sido pior, resmunguei —Quanto tempo?


—Que você está aqui? Eu balancei a cabeça lentamente. —Este é o quarto dia. Você teve uma infecção. Alternou momentos de consciência e inconsciência desde a cirurgia. Sua febre baixou durante a noite, e os resultados de seus exames de sangue foram bem melhores esta manhã. —Ela parecia que ia começar a chorar. Limpando a garganta, acrescentou: —Eles também começaram a tratá-la para exposição à tuberculose. Lana me disse que você estava preocupada, então mencionei isso para os médicos. Você precisará tomar remédio por um tempo para se certificar de não ficar doente. —Kostya? —Ele está vivo. —Ela apertou minha mão. —Eu não vou mentir para você. Foi muito complicado os primeiros dois dias, mas ele lutou muito para voltar para você. —Ela afastou o cabelo da minha bochecha e colocou-o atrás da minha orelha. —Ele ainda está em coma induzido. Houve muitos danos e perda de sangue. Seu corpo precisa de tempo para se curar, mas os médicos daqui estão otimistas. Meus olhos começaram a arder quando minhas emoções me dominaram. Minha mãe murmurou suavemente e subiu na cama comigo, se movendo para o meu lado não ferido e me abraçando. Ela passou os dedos pelo meu cabelo e beijou minha têmpora. — Holly, você foi tão corajosa. Eu sempre tive muito orgulho de você, mas você foi tão corajosa. Você salvou a si mesma, Kostya e a mim. Querendo me manter corajosa, perguntei: —Quem era o homem que nos sequestrou? Ela suspirou, mas não hesitou em me responder. —Seu nome era Igor. Ele era um alto funcionário da KGB. Ele era meu...


—Supervisor? —Eu interrompi, forçando-a a encontrar meu olhar curioso. —Sim. —Ele me mostrou fotos suas. Quando você era Ekaterina. —Expliquei. —Eu não queria acreditar, mas depois te vi fora do armazém... —Eu não faço esse tipo de trabalho há muito tempo, Holly. Parei quando você nasceu. Eu me afastei dessa vida. —Ela enxugou as lágrimas do meu rosto com os polegares. —Eu ainda ocasionalmente faço algum trabalho de inteligência freelancer para a CIA, mas nada violento. —Então, todas aquelas viagens de negócios...? —Nem todas elas, mas muitas. —E o seu negócio de consultoria agora? —Me dá alguma cobertura se eu precisar ir a lugares que não são muito seguros. —Ela admitiu. —Vou me aposentar no final de dezembro. —Acrescentou. —Está na hora. Eu tenho me preparado por um tempo. Com Igor morto, não tenho nada mais a temer. —E quanto a Kostya? —Eu me perguntei preocupada. —E sobre tudo o que aconteceu naquele armazém? —Já foi resolvido, Holly. Quando você estiver mais lúcida, vou contar a história toda. Foi bem simples. Lana e Savannah não tiveram problemas com isso. Francamente, a polícia aqui tem problemas suficientes para lidar. Eles ficaram felizes em encerrar o caso tão rapidamente quanto possível. Preocupada com Lana e Savannah, perguntei: —Elas estão bem? Savvy e Lana? Onde elas estão?


—Estão no resort a poucos quarteirões de distância. Este hospital privado e o resort estão em uma espécie de complexo que oferece turismo médico. Vamos mandá-las para casa amanhã. Fechei os olhos, pensando na bagunça que Savannah teria que lidar quando chegasse em casa. —Preciso falar com Savannah antes que ela vá embora. —Ela não vai embora sem ver você. Vou trazê-la mais tarde para vocês duas discutirem as coisas. —Minha mãe apertou os lábios. —Você tem que se lembrar de ser paciente com ela, Holly. Ela passou por muita coisa, e pode estar um pouco chateada. —Por causa do jeito que eu a arrastei para isso? Ela assentiu. —Ela é sua melhor amiga, e vai acabar aceitando, mas você tem que dar a ela algum espaço. —Eu vou. —No que diz respeito a Kostya, ele vai ficar aqui por algum tempo. Semanas. Ele precisa se recuperar e não será fácil. Seu trabalho em Houston. —Ela me deu um olhar. —Terá que ser tratado por outra pessoa. Espero que, enquanto estiver em período sabático, Nikolai perceba que o tempo de Kostya como limpador acabou. —E então, o quê? Ele apenas se afasta da máfia? —Eu fiz uma careta para ela. —Eu não acho que funciona assim, mãe. —Não funciona. —Ela concordou. —Mas existem maneiras para ele estar, sem fazer o trabalho sujo. —Ela se acomodou no travesseiro e sorriu para mim. —Você me chamou de mãe? Eu fiz uma careta. —Do que mais eu poderia chamar você? —Ekaterina? Tia? Não-é-minha-mãe-e-eu-odeio-você?


—Eu não te odeio. —Eu toquei minha cabeça na dela. —Eu não estou feliz que todo mundo mentiu para mim toda a minha vida, mas depois de conhecer Igor e sobreviver à invasão em minha casa na outra noite, entendo porque você fez isso. Eu não gosto, mas entendo. —Holly, tudo que eu fiz foi para proteger você. Tudo o que farei no futuro será para mantê-la segura. —Eu sei, mãe. —Eu pisquei as lágrimas. —Eu te amo. —Eu amo você, Holly. Havia tantas outras perguntas que eu queria fazer, mas eu estava tão cansada. Eu não achava que minha mãe queria um interrogatório também. Alguma parte de mim não queria saber de qualquer maneira. Eu me preocupei que estivesse abrindo a Caixa de Pandora. Talvez algumas coisas ficassem melhores se mantidas em segredo.

*******

—Você está pronta para receber alguns visitantes? — Savannah perguntou da porta do meu quarto de hospital mais tarde naquela noite. Assentindo, eu sorri encorajadoramente. Os sorrisos de Savannah e de Lana vacilaram quando chegaram ao meu leito. Logo, nós três estávamos chorando e nos abraçando. O trauma compartilhado do qual havíamos sobrevivido foi esmagador, mas era bom estarmos juntas novamente, para saber que havíamos saído vivas.


—Trouxemos algumas coisas para você. —Disse Lana, enxugando os olhos e colocando três sacolas de compras no pequeno sofá do outro lado do quarto. —Roupas, produtos de higiene pessoal, algumas revistas. —Ela explicou. —Para que você fique mais confortável aqui. —Obrigada. Eu realmente aprecio isso. —Minha pele e cabelos pareciam tão sujos. Eu precisava de um banho e queria usar algo diferente daquela camisola fina de hospital. —Mal posso esperar para me sentir limpa novamente. —Se as enfermeiras deixarem você tomar banho agora, eu vou ajudá-la. —Savannah ofereceu. —Não é como se eu nunca tivesse visto sua bundinha de frango nua. Fiz uma carranca para ela. —Eu não tenho bunda de frango! Savannah olhou de relance para Lana. —Ela tem. Uma bonita bundinha de frango. Lana riu e se acomodou na cadeira ao lado da minha cama. —Eu não acho que deveria comentar sobre isso. Eu quero manter meu emprego. —Depois do que passamos, você tem um emprego no salão pelo tempo que quiser. —Assegurei a ela. —E se isso foi demais, vou ajudá-la a encontrar um emprego em outro lugar. Eu entendo se você não puder lidar com a volta ao salão. —Não foi demais. —Respondeu Lana daquele jeito calmo dela. —Estou feliz por estarmos juntas. Nós fazemos uma boa equipe. —Nós fazemos. —Savannah concordou. Ela sentou na beira da minha cama e ajustou o lençol. —Nisha e Billie estão segurando as pontas no salão. Muitos de nossos clientes estavam preocupados conosco. Nossas páginas nas redes sociais bombaram e Billie tem


lidado com elas. Há repórteres que querem nos entrevistar sobre o nosso ' sequestro e resgate ', mas eu realmente não estou interessada. —Nem eu. —Concordei. —A última coisa que quero é mais atenção na minha vida particular. —Concordo. Acho que é melhor se fizermos uma declaração e depois colocarmos um fim nisso. —Sugeriu Savannah. —Se você quiser, eu escrevo amanhã. Posso enviar por e-mail para você ou sua mãe, e você pode me dar uma aprovação ou sugestões para mudar algo. Eu balancei a cabeça. —Eu confio em você, Savannah. Você sabe o que precisa ser dito. —Falando de coisas que precisam ser ditas... —Ela olhou para Lana que estava de pé e me deu um abraço cuidadoso antes de me desejar melhoras e sair. Assim que a porta se fechou atrás dela, Savannah suspirou. —Eu sei que este não é o momento para entrar em uma enorme discussão sobre o que aconteceu, mas preciso que você saiba que não estou bem em ser puxada para essa merda de mafioso. Nós poderíamos ter morrido, Holly! Nós poderíamos ter sido estupradas ou vendidas. Temos muita sorte por estarmos saindo ilesas disso. —Eu sei. —Você sabe? —Ela inclinou a cabeça. —Você entende o que o amor de Kostya quase nos custou? —Não foi culpa de Kostya. Savannah zombou. —Não arrume desculpas para ele! —Não foi culpa dele. —Repeti com força. —Não dessa vez. Isso foi sobre mim. Sobre quem eu sou. Sobre meus pais biológicos. —O que você quer dizer? Biológicos? Mas sua mãe...


—Ela é minha tia. Meu pai é irmão dela. Minha mãe, a mulher que me deu à luz, era uma espiã russa. O homem que nos levou? Ele era da KGB. Meu pai era um dos alvos dele e minha mãe, Kira, era uma de suas agentes. Ela se apaixonou pelo meu pai e eles a mataram por isso. Então, mamãe me tirou da Rússia, me levou para Houston e me criou como filha dela. Savannah se encolheu em choque. —Puta merda, Holly. —Sim. É... é muita coisa. —Sim é. —Ela me deu um olhar estranho. —Eu não posso acreditar que você é russa! Eu revirei meus olhos. —Sempre soubemos que eu era meio russa. —Sim, mas agora você é como uma russa puro-sangue! — Abaixando a voz, ela perguntou: —Você é uma cidadã legal? Como vamos fazer se o Departamento de Imigração bater em nossas portas para levá-la para um desses campos de concentração na fronteira? —Tanto quanto sei, sou legal. —Eu realmente não sabia. Quase tinha medo de descobrir, mas teria que perguntar à minha mãe em breve. —Jesus, Holly, sua vida é como uma novela! —Ela mordeu o lábio inferior antes de perguntar: —Sua mãe sabe que sua mãe biológica era uma espiã? Que o irmão dela era um alvo? Eu balancei a cabeça. —Sim, ela sabe de tudo. —Isso é tão fodido, Holly. —Ela hesitou. —Como você está encarando isso? Quero dizer, acho que agora você sabe do seu pai. —Era o que eu queria saber. —Concordei. —Eu queria descobrir quem sou e de onde vim e descobri.


—Mas não é a história que você estava querendo ouvir, certo? —Nem perto. —Eu admiti, me sentindo culpada por não contar a verdade sobre a parte da minha mãe na história. Havia alguns segredos que eu não iria compartilhar. —Holly. —Ela pegou minha mão. —Eu realmente acho que você precisa tirar um tempo do trabalho. Tipo, mais tempo do que o necessário para curar seus ferimentos. Talvez receber algum aconselhamento. Você passou por tanta coisa, e agora está descobrindo toda essa merda sobre sua família? Eu não quero que você volte a trabalhar cedo demais. O estresse de administrar o negócio, manter seus clientes felizes e lidar com as consequências de tudo isso pode acabar com você. Eu comecei a discutir com ela. Eu queria dizer que estava perfeitamente bem e poderia voltar ao trabalho em breve. Eu queria dizer a ela que voltar para minha rotina normal de trabalho seria bom para mim. Mas eu não fiz porque ela estava certa. Eu precisava organizar direito minha cabeça. —Deixe Nisha dividir meus clientes entre as outras meninas. —Eu instruí. —Ela tem um bom olho para combinar cabeleireiras com clientes. Ela vai mantê-los todos felizes até eu voltar. —Eu estava planejando fazer isso de qualquer maneira. — Disse Savannah. —Devemos dizer a Nisha que estamos dando a ela parte do negócio. —Decidi. —Não é certo pedir a ela para fazer todo o trabalho extra sem dar o que ela merece. —Ela vai recusar.


—Ela vai, mas você não vai aceitar um não como resposta. —Eu não vou. —Prometeu Savannah. Curvando-se, me puxou para um abraço de irmã. —Não se preocupe com o salão ou com Lana. Eu vou cuidar de tudo enquanto você está se recuperando. —Eu sei que você vai. —A abracei com tanta força quanto pude. —Eu realmente sinto muito por tudo, Savvy. Eu nunca quis que algo assim acontecesse. —Eu sei que você não quis. —Ela me liberou. —Eu falei sério sobre o que disse sobre Kostya, Holly. Eu sei que você o ama, mas talvez dar uma pausa nele seja uma boa ideia também. Nosso sequestro não foi culpa dele, mas a invasão? O assassinato em sua casa? Isso é sobre ele. Você realmente precisa descobrir se quer se candidatar para uma vida assim nos próximos cinquenta anos. Eu não queria pensar em terminar com Kostya ou não vê-lo assim que conseguisse sair desta cama. Eu não queria brigar com Savannah também. Não agora, quando ela estava saindo. —Vou pensar sobre isso. Ela não acreditou em mim. Suspirando, ela disse: —Ok. Eu acompanhei com o olhar sua saída do quarto, vendo-a pela janela comprida perto da porta. Ela se encontrou com Lana e elas se foram juntas. Fechando os olhos, descansei a cabeça no travesseiro e pensei em tudo o que Savannah havia dito. Quando caí no sono, fui atormentada por sonhos de Kostya se afastando de mim para sempre.


CAPÍTULO TRINTA E UM Na manhã seguinte ao retorno de Savannah e Lana a Houston, recebi luz verde para sair da cama e tomar banho. Minha mãe me ajudou, sem fazer nenhuma observação sobre minha suposta bunda de frango, e então me encorajou a ficar fora da cama e andar se eu pudesse. O primeiro passeio pelo corredor foi excruciante. Depois de um cochilo, tentei de novo e fiz três viagens antes de precisar sentar-me novamente. No final do dia, senti-me forte o suficiente para fazer a caminhada até a UTI para visitar Kostya. Mamãe foi comigo, próxima de mim, mas me fazendo suportar meu próprio peso e arrastar meu suporte para soro. No começo, me aborreceu que ela não estivesse ajudando mais, mas no fundo eu sabia que ela estava fazendo isso para o meu próprio bem. Ela queria que eu melhorasse, e me mimando não ia atingir esse objetivo. Quando chegamos à sala de UTI de Kostya, encontramos Gabe sentado e desenhando na única cadeira da sala. Ele parecia mais simpático nesse cenário, menos ameaçador e mortal em seus jeans e camisa Henley preta. Ele era tão alto e solidamente construído quanto eu me lembrava, e seus olhos ainda eram tão escuros quanto o café mais escuro. Seu nariz obviamente havia sido quebrado uma ou duas vezes e não estava muito bem. Havia pequenas cicatrizes no rosto e maiores nos antebraços, a maioria delas escondidas por suas tatuagens. —Eu vou sair do seu caminho. —Disse ele rudemente, recolhendo seu caderno de desenho, lápis e jaqueta. —Vou jantar, eu acho. —Ele parou quando se aproximou da porta. —Você não quer nada?


Eu balancei a cabeça. —Estou bem, mas obrigada. Ele balançou a cabeça e saiu, fechando a porta de correr de vidro até a metade para me dar alguma privacidade. Ele conversou brevemente com minha mãe antes de ir embora e desaparecer pelo corredor. Empurrando a cadeira para mais perto do leito de Kostya, sentei-me nela e reorganizei o equipo do soro depois reposicionei o suporte que segurava os sacos do fluido que eu ainda precisava. Observando a cama do hospital e todas as máquinas e tubos, fiquei abalada com a aparência pálida e doente de Kostya. Para mim, ele sempre pareceu tão forte e poderoso, tão no controle. Agora ele parecia fraco e vulnerável. Doía vê-lo assim. Machucou-me saber que ele estava aqui assim por minha causa. Havia incisões no peito e no abdômen, todas cobertas com ataduras. Algumas tinham fluidos ou sangue infiltrando-se nelas. Um lençol branco cobria-o da cintura para baixo. Seu peito subia e descia no ritmo da máquina que respirava por ele. Encontrei consolo no bipe rítmico de seu batimento cardíaco no monitor e no assobio lento do ventilador. Ele estava vivo. Estava lutando. Ele acordaria em breve, e poderíamos começar de novo, apagar tudo e tentar construir um relacionamento baseado na verdade. —Holly? —Pouco mais de uma hora depois, mamãe chamou meu nome da porta. —As enfermeiras disseram que é hora de você voltar para o seu quarto. —Tenho de ir? —Eu soava como uma criança petulante, mas não pude evitar. —Eu quero ficar. —Eu sei que você quer, mas ainda está se recuperando. Você não terá qualquer utilidade para ele se ficar doente.


Acenando por sua ajuda, esperei até que ela estivesse de pé na minha frente para segurar suas mãos e deixá-la me firmar enquanto eu me levantava. A dor ao longo das minhas incisões foi intensa, e eu me preocupei que meus pontos rompessem e meus órgãos caíssem como em uma cena de filme de terror. —Você precisa de seus analgésicos. —Minha mãe me repreendeu. —Vamos levá-la de volta para a cama. —E quanto a Kostya? Alguém vai ficar com ele? Eu não gostava da ideia de ele ficar sozinho, especialmente quando estava tão vulnerável. —Estou aqui. —Gabe anunciou da porta. —Eu não vou a lugar nenhum até que ele esteja fora dessa cama. Eu apertei o braço dele. —Obrigada. Com um olhar demorado por cima do ombro, deixei o andar da UTI e voltei para o meu quarto. Minha mãe me ajudou no banheiro e voltei para a cama. Uma amável enfermeira me trouxe uma refeição quente e um remédio para a dor forte, que eu agradecidamente engoli. Quando terminei minha sopa, já estava sonolenta novamente. Minha cabeça caiu contra o travesseiro enquanto minha mãe limpava minha bandeja. Ela abriu o saco de artigos de higiene que Lana e Savannah me trouxeram. Tirando um lenço de limpeza facial de um pacote de viagem, ela gentilmente limpou meu rosto e pescoço antes de espalhar um pouco de hidratante de um pequeno tubo. Uma rápida passada de protetor labial hidratou minha boca rachada. —Pronto. —Disse ela, dando um passo para trás. —Não é a sua rotina de beleza normal, mas vai servir. —Obrigada, mãe.


Ela beijou o topo da minha cabeça. —Descanse um pouco. Você precisa disso. Eu não discuti. Fechei meus olhos e sonhei com Kostya.

******

Em algum momento no meio da noite, acordei desesperada para usar o banheiro e com uma sede infernal. Limpando minha garganta, pisquei algumas vezes e deixei minha visão se ajustar à pouca iluminação. —Mãe? Pode me ajudar? —Sua mãe não está aqui. Mandei-a para o hotel para descansar. Assustada, quase pulei para fora da cama quando percebi que havia um homem sentado na cadeira ao meu lado. —Quem diabos é você? —Cuidado. —Ele repreendeu suavemente, levantando as mãos na frente dele. —Você vai se machucar. Seu forte sotaque russo se destacando. Ele sentou-se para frente, deixando-me vê-lo melhor na penumbra. Seu cabelo era branco e seu rosto era mais velho e enrugado, mas eu o reconheci das fotos. —Maksim? —Sim. —Com tristeza, ele apontou para a cama do hospital. —Não era assim que eu queria que nos encontrássemos. —Não. Nem eu. Nós nos encaramos por um longo momento antes de ele perguntar: —Você precisa de uma enfermeira?


Eu balancei a cabeça. —Você pode me ajudar a sair da cama? —Claro. —Ele se levantou da cadeira, seu movimento rápido e suave. Ele era velho, mas parecia em forma e forte. —Pegue minhas mãos. Elas eram quentes e muito maiores que as minhas. Cautelosamente, ele me ajudou a sair da cama e colocou uma mão entre minhas omoplatas. —Você precisa de ajuda para andar? —Não. Eu consigo. —Eu nervosamente sorri para ele antes de pegar meu suporte para soro e ir em direção ao banheiro. Uma vez trancada lá dentro, eu me olhei no espelho. Isso estava realmente acontecendo? Meu pai finalmente estava aparecendo na minha vida? Em um quarto de hospital no México? Todos esses anos, eu imaginava que conhecer meu pai seria algo mágico e bonito. Na realidade, pareceu muito estranho. Sentindo-me mal e confusa, usei o banheiro e lavei as mãos. Quando saí do banheiro, Maksim estava em frente às grandes janelas com vista para o resort. Eu notei que havia uma nova garrafa de água e uma caixa de suco na bandeja ao lado da minha cama. —Eu não tinha certeza do que você gostaria. —Disse ele, de costas para mim. —Eu posso conseguir outra coisa das enfermeiras. —A água está bom. —Cheguei a minha cama e subi de volta sem ajuda. Ele se aproximou, pronto para me estabilizar se eu perdesse o equilíbrio. Pegou os travesseiros e afofou-os atrás de mim, tornando mais fácil para mim sentar e beber. Ele se acomodou nos pés da cama, a perna esquerda dobrada para que pudesse me encarar. — Como você está se sentindo?


—Cansada. Dolorida. —Eu bebi um pouco mais de água. — Mas vou me recuperar em breve. —Sua mãe ficará feliz em voltar para Houston. Eu suspeito que ela já contratou alguém para arrumar todas as suas coisas e mudá-las para a casa dela. Ela sempre lutou contra sua independência dela. —Ela nunca demonstrou isso. —Respondi, surpresa com o quanto ele entendia do estado emocional da minha mãe. —Ela sempre me incentivou a sair e viver minha vida, ser uma mulher forte e independente. —Sim. —Ele concordou. —Mas ela temia estar longe de você. Estava preocupada o tempo todo em não estar lá para protegê-la. —Ela me criou para ser capaz de me proteger. Ela fez tudo certo. Tenho sorte de tê-la como minha mãe. —Nós dois temos a sorte de tê-la em nossa família. — Decidiu Maksim. —Ela fez mais para me ajudar do que qualquer outra pessoa na minha vida. Ela manteve dois dos meus filhos seguros em Houston todos esses anos. —Dois filhos? —Eu perguntei com surpresa. —Eu tenho um irmão em Houston? —Você tem um irmão em Houston. Você tem uma cunhada. Em breve, terá um sobrinho. —Seu rosto cauteloso se suavizou com a menção de um neto. —Você acha que...? Quer dizer, meu irmão gostaria de me conhecer? Ele sabe sobre você? Sobre mim? —Ele sabe sobre você, e você já o conheceu e à sua esposa. —Ele sorriu quase maliciosamente. —Ela é uma das suas clientes.


—O quê? Sério? Quem? —Vivian. Surpresa, afundei nos travesseiros. —Vivian é minha cunhada? Então, isso significa...? Oh meu Deus. —Cobri meu rosto com minhas mãos. —Eu me sinto tão idiota. —Por quê? —Maksim perguntou curioso. —Fui a Nikolai e pedi ajuda para encontrar você – meu pai – na Rússia. Ele foi muito prestativo e gentil. —Eu revirei meus olhos. —O que, claro, faz sentido agora, porque ele sabia o tempo todo! Maksim riu suavemente. —Sim, isso soa como uma piada que ele iria gostar. —Ele não parece o tipo de homem que brinca muito. —Ele teve uma vida difícil. A maior parte foi minha culpa. —Admitiu. —Eu nunca fui um pai muito bom. Não para Nikolai ou para você ou meus outros filhos. Nunca pareceu natural para mim, e nunca tentei ser realmente um pai melhor. Minha falecida esposa cuidou de criar nossos filhos e fiquei feliz em deixar isso para ela. Katya levou você para Houston. Era estranho ouvir minha mãe sendo chamada de Katya, mas achei que era mais adequado para ela do que Frances. —E quanto a Nikolai? Quem cuidou dele? —Ele cuidou de si mesmo. Sua mãe morreu quando ele era muito jovem e deixei que ele fosse para um orfanato. Quando ele tinha idade suficiente, eu o puxei para o meu mundo e fiz dele o homem que ele é hoje. Franzindo a testa, lutei contra a vontade de criticar sua paternidade com Nikolai. Já fazia muito tempo e não podia ser


mudado, mas era frio e cruel mandar um menino para um orfanato quando ele claramente tinha os meios para criá-lo corretamente. —Você acha que eu estava errado em mandar Nikolai para o orfanato. —Ele adivinhou corretamente. —Você estava errado. O canto de sua boca se levantou com um sorriso. —Você tem muito de suas mães em você. Nenhuma delas – Katya ou Kira – hesitaram em me dizer que eu estava errado. —Como ela era? —Eu perguntei com cuidado. —Ela parecia muito linda nas fotos que Igor me mostrou. Seu semblante anuviou com a menção do nome de Igor. — Eu deveria tê-lo matado na noite em que o peguei. Kira nunca me perdoaria se soubesse que eu deixei ele chegar até você. Eu não tinha certeza do que dizer sobre isso, então não disse nada. —Sua mãe... —Ele começou. —Kira era diferente de qualquer pessoa que eu já conheci. Ela tinha um senso de humor selvagem. Irreverente. —Acrescentou. —Ela não tinha medo de tirar sarro de mim. Não tinha medo de me cutucar ou me provocar. Ela tinha uma risada rouca e amava a vida. Não temia o que o amanhã traria. Ela estava vivendo seu melhor momento até que eles a mataram. —Lamento que nunca cheguei a conhecê-la. —Eu disse baixinho, meus olhos ardendo de lágrimas. —Ela teria te amado tanto. —Ele me assegurou, pegando minha mão na dele. —Você teria sido a luz absoluta de sua vida. Mas... —Ele disse, limpando a garganta. —Sua vida com minha irmã


é a vida que você deveria ter. Você não pode ficar pensando sobre o que poderia ou deveria ter sido, Holly. —Eu sei. —Sussurrei. —Eu tenho as coisas dela. Quando eu voltar para Moscou, vou mandar para você. Livros, diários, algumas de suas roupas, fotos, seus documentos, eu os guardei todo esse tempo para você. —Eu não sei ler russo. —Eu admiti, sentindo-me estranhamente culpada por isso. —Eu nunca tive uma razão para aprender. —Bem, talvez Kostya possa lê-los para você. Meu olhar saltou para o dele. Eu não consegui ler sua expressão. —Isso te incomoda? Que eu queira estar com alguém do mesmo ramo de trabalho que o seu? —Claro que sim. Você foi destinada a um médico, a um advogado ou a um CEO. —Eu namorei esses tipos de homens. Muitos deles. Eles não eram para mim. —Sim, você tem o mesmo problema de Kira. —Ele resmungou. —Ela sempre teve olhos para homens como eu. Eu esperava que você não herdasse esse gene. —O coração quer o que o coração quer. —Sim, suponho que sim. —Ele franziu os lábios um tanto irritado. —Ele não pode deixar minha organização, Holly. Para homens como Kostya, homens que sabem demais, sair não é uma opção. —Eu sei. —Respondi honestamente. —Descobri isso por mim mesma.


—E você ainda o quer? —Se ele me quiser? Sim. —Você é boa demais para ele. Ele nunca vai te merecer. —Essa é a sua opinião. Ele estreitou os olhos. —Eu vou falar com o Nikolai. Nós vamos descobrir algo para ele. Mas você? —Ele me prendeu no lugar com um olhar sério. —Você vai ficar fora desta vida. Você faria bem em seguir os passos de Vivian. Ela sabe como andar na linha. —Então acho que vou ter que convidá-la para almoçar para que ela possa me ensinar a ser uma namorada de mafioso perfeita. —Eu respondi maliciosamente. Sua boca se inclinou com um sorriso novamente. —Você será uma boa tia para o menino de Nikolai e Vivian precisa de uma amiga como você, eu acho. Vocês serão boas uma para a outra. —Você está escolhendo meus amigos agora? —Minha escolha de amigos para você é melhor do que aquela garota Lana que você colocou sob sua asa. —Ele disse com uma careta de desgosto. —Ela não vale o seu tempo, Holly. Sua mãe era uma terrorista e seu pai traiu Kostya, quase o matou. Embora aquele pouco de informação sobre Lana me chocasse, eu não o deixaria tentar tomar decisões por mim ou mandar em mim como deve ter feito com todas as pessoas em sua vida. —Ok, pai. —Disse com uma ênfase irritada. —Este é o ponto em que eu digo que você não pode simplesmente entrar na minha vida depois de uns trinta anos e começar a me dizer como


viver. Eu gosto da Lana. Ela é doce. Sei pelo que ela está passando, e ela é incrível por ter sobrevivido. E isso é tudo que importa. Seu olhar infeliz se desvaneceu lentamente. —Aí está a coragem que você herdou de Katya. Ela me disse a mesma coisa uma vez, há muito tempo. Ela estava certa também. —Ele abaixou os dois pés para o chão e se levantou. —Mas não diga a ela que eu lhe disse isso. —Sem promessas. —Eu disse, sorrindo, enquanto ele reunia suas coisas. —Você está indo embora? —Eu tenho um voo para pegar. —Gesticulando em direção à porta, acrescentou: —Você está perfeitamente segura aqui. Meu pessoal está cuidando de você. Ninguém ousará te machucar aqui. Eu não duvidei dele. Ele não parecia o tipo de homem que as pessoas gostariam de irritar. —Quando você estiver se sentindo bem, quero que você vá me visitar. Quero que você tome ciência sobre sua herança e sua família. —Ele encolheu os ombros. —Estou cansado de minha família estar separada. Somos mais fortes juntos e é hora de fazer as pazes. Eu quero que você conheça seus outros irmãos. —Eu gostaria muito disso. —Sua mãe e eu podemos discutir os detalhes. Pode ser mais fácil para você vir no verão pela primeira vez. O frio pode ser muito chocante para os estrangeiros. —Ele fez uma cara estranha. — Embora, de certo modo, você não seja realmente uma estrangeira. Na verdade, você é mais russa que Kostya! —Como assim? —Ele nasceu na Alemanha Oriental. —Sério?


—Seus pais estavam lá, sob proteção alemã. Então, tecnicamente, ele é alemão. —Eu acho que ele não gostaria que dissessem que ele não é russo. —Eu disse. —Não, ele não gostaria. —Maksim aproximou-se da minha cama e desajeitadamente me abraçou. —Estou feliz que finalmente conseguimos nos encontrar, Holly. —Eu também. —Eu disse, abraçando-o de volta. Nós não seríamos a família que eu sempre sonhei em ter, mas já era um começo. —Entregue a Kostya o meu desejo de melhoras quando ele acordar. —Disse Maksim, caminhando em direção à porta. —Isso é uma ameaça? —Eu me perguntei em voz alta. Maksim riu. —Na verdade, não. —Espere! —Eu chamei, parando-o antes que ele pudesse desaparecer da minha vida novamente. Ele voltou para interrogativamente. —Sim?

o

quarto

e

olhou

para

mim

—Qual era o meu nome? O que Kira me nomeou? Ele engoliu em seco, seus olhos de repente brilhando. — Polina. Ela queria te chamar de Polina. Recostando-me contra os meus travesseiros, eu assisti meu pai sair e puxei as cobertas até meu queixo. Eu nem tentei lutar contra os soluços que saíram da minha garganta. Pensei na mulher que me dera à luz. Ela me amou e me protegeu dentro dela. Ela deve ter tido sonhos para mim. O que ela esperava que eu me tornasse? Ela teria orgulho de mim?


Essas eram perguntas que eu nunca teria respostas. Meu pai estava certo. Eu não podia pensar sobre o que poderia ou deveria ter sido. Minha vida era minha vida. Não havia como mudar a direção que havia tomado até aquele ponto. Eu nunca seria Polina Prokhorovna, nascida e criada na Rússia com todas as esperanças e sonhos de sua mãe, Kira. Eu era Holly Phillips e estava exatamente onde deveria estar.


CAPÍTULO TRINTA E DOIS —Você finalmente acordou? Kostya grunhiu com desconforto. A dor irradiava por todo o seu peito e abdômen a cada respiração que ele dava. Suas juntas doíam e pareciam desconfortavelmente rígidas. Sua garganta queimava e fome latejava na boca de seu estômago. —Você alternou momentos de consciência e inconsciência nos últimos dias. Acordava por dez ou vinte minutos e depois apagava de novo. Fazendo uma careta para a luz do sol brilhante que entrava pelas janelas do quarto do hospital, ele olhou para Gabe, que estava recostado em uma poltrona reclinável perto da cama. Ele traçava seus esboços silenciosamente, seu lápis movendo-se sobre o papel em movimentos rítmicos. Onde estava Holly? Ela ainda estava no hospital? Ela tinha ido para casa em Houston? —Sua menina está com a mãe. —Gabe disse como se estivesse lendo sua mente. —Foram almoçar. Ela esteve sentada aqui perto de você desde que acordou de sua cirurgia. Fica aqui o dia todo. Esperando por você. Flashes de memórias dançaram diante dele. Holly na cadeira. Holly ao lado dele, enxugando seu rosto. Holly lendo um artigo de revista para ele. —Ela está bem? Gabe assentiu. —Tanto quanto eu posso dizer, fisicamente, sim. Ela teve alta há dois dias. Ela e Frances estão hospedadas no resort ao lado. Holly está se recusando a ir embora até que você esteja saudável o suficiente para sair da cama.


Calor se espalhou por ele com essa informação. Ele se lembrou de declarar seu amor por ela quando sangrava na parte de trás do SUV. Ela havia respondido sem hesitar. Ela o amava totalmente e sem reservas. O amava o suficiente para ficar sentada ao seu lado, dia após dia, enquanto cuidava de suas próprias feridas. Ela não pensou em deixá-lo quando ele estava ferido e vulnerável. Ela estava deixando claro que estava com ele até o final. Mas, tão rapidamente quanto aquele maravilhoso sentimento de amor e contentamento o encheu, outro sentimento o substituiu. Pavor. Medo. Ela quase foi morta duas vezes em dois dias. Primeiro, Scorpion e depois Igor. Se ela ficasse com ele, ela seria tão vulnerável quanto Vivian, Bianca e Erin. Ela seria um alvo para pessoas que queriam machucá-lo. Lembrar o sangue em sua camisa e o terror em seu olhar enquanto ela olhava para ele, lutando para ajudá-lo, o atormentava. Ela atirou e matou um homem para salvá-lo. Ela havia perdido sua inocência. Eu a transformei em uma assassina. Seu coração acelerou dolorosamente, o selvagem batimento chamando a atenção de Gabe enquanto passava pelo monitor. — Você está bem, cara? —Estou bem. —A culpa punitiva de saber que ele havia transformado a vida de Holly para pior o deixou irritado. Ele olhou para as máquinas conectadas ao seu corpo por fios e depois para o soro correndo para o equipo. —Posso sair dessa cama? Tomar banho? Gabe deixou de lado o bloco de desenho e o lápis. —Deixeme chamar um enfermeiro.


Uma hora depois e com muita reclamação de sua parte, Kostya finalmente negociara a remoção de sua sonda e a permissão para tomar banho. Escondido atrás de uma cortina enquanto uma enfermeira fazia o que precisava ser feito, ele ouviu Holly chegar. —Ele está acordado? Totalmente perguntou, sua voz cheia de alívio e excitação.

acordado?

—Ela

—Parece que sim. —Respondeu Gabe. —Ele estava assediando as enfermeiras para deixá-lo tomar banho. —Ele vai precisar de ajuda. —Disse Holly. —Eu fiquei inconsciente apenas por alguns dias, e estava tão fraca que precisava da mamãe para me firmar. —Eu vou ajudá-lo. —Gabe ofereceu com diversão. —Tenho certeza que ele vai gostar disso. —Eu posso ouvir você! —Kostya gritou, ignorando a enfermeira rindo de sua situação. Quando a enfermeira terminou, recolheu os suprimentos usados e abriu a cortina em volta da cama. —Cinco minutos no chuveiro. Você pega um dos seus amigos para te ajudar, ou arranjamos uma de nossas enfermeiras. —Sim. Tudo bem. —Ele resmungou, empurrando o lençol para o lado e virando as pernas para a beira da cama. —Devagar! —Holly correu pelo quarto e deslizou na frente dele, com as mãos indo para seus ombros para mantê-lo sentado na cama enquanto ele balançava perigosamente. —Você vai cair e se matar! —Ela balançou a cabeça e franziu a testa para ele. —Deixenos te ajudar. O orgulho era uma coisa condenável. Ele não queria parecer fraco e doente na frente dela. Ele queria ser o homem forte e capaz


com quem ela sempre pôde contar para ajudar. Com seus papéis invertidos, ele se sentiu desequilibrado. —Você não tem força para me pegar se eu cair. Ela revirou os olhos. —Essa é a primeira coisa que você me diz desde que me disse que me amava. Merda. Inclinando-se para tocar sua testa na dela, ele sussurrou: — Eu ainda amo você. —Muito melhor. —Ela brincou, dando um de seus sorrisos brincalhões. —E sim, você está certo. Eu não posso te pegar se você cair. Estou com restrições sobre pegar peso por mais alguns dias. —Ela olhou para a porta. —Gabe? —Eu vou arrastar sua bunda rabugenta para o banheiro, mas você terá que fazer o trabalho prático, a menos que sua mãe tenha outra mala cheia de dinheiro para mim. —Você é terrível. —Disse Holly, franzindo o narizinho delicado. Kostya relutantemente aceitou a ajuda de Gabe para ir ao banheiro. Ele tentou protestar quando Holly o seguiu para dentro e começou a tirar a roupa do hospital dele. Ignorando-o, ela desamarrou a parte de trás da camisola hospitalar e jogou-a no cesto de roupa suja no canto do enorme banheiro. Depois de ligar a água, apontou para a cadeira de banho de plástico e metal. —Vamos. —Eu não vou me sentar nisso. —Ele se recusou teimosamente. —Sim, você vai. —Holly, eu posso ficar de pé.


—Não, você não pode. Você está prestes a cair agora. Ela estava certa e isso o irritava. —Tudo bem. —Ele rosnou e se arrastou para a cadeira. — Feliz? —A última vez que lavei seu cabelo enquanto você estava sentado em uma cadeira, você foi muito mais agradável. —Se essa for uma opção agora, vou começar a sorrir. —Ele alcançou seu quadril, mas ela afastou-o. —Pare! Você vai me deixar toda molhada! —Essa é a ideia, milaya. —Você é incorrigível. E não pense que você pode começar com todos os nomes russos agora. —Ela avisou. —Agora, fique quieto. Fechando os olhos, ele decidiu deixar de ser um idiota e desfrutar de seus serviços gentis. Ela usou o chuveiro de mão para enxaguar seu corpo, começando em seu cabelo e descendo com cuidado. O cheiro de sangue seco, suor e sujeira encheu o banheiro enquanto a água morna amplificava os aromas. Ele quase gemeu quando suas mãos pequenas e macias começaram a massagear seu couro cabeludo com o shampoo cítrico fornecido pelo hospital. Ela tinha aqueles dedos mágicos que incendiavam todo o seu corpo enquanto massageavam seu couro cabeludo e os cabelos. Suas mãos desceram até o pescoço dolorido e massagearam suavemente, aliviando a tensão enquanto ela continuava a massagem em seus ombros. Quando ela começou a lavar seu corpo, ensaboando suas mãos com a pequena barra de sabonete e esfregando-as ao longo de sua pele, ele a observou. Flashbacks de seu banho e o incrível sexo


que se seguiu fizeram sua virilha doer. Havia muitos analgésicos em seu organismo para permitir que ele ficasse totalmente duro, mas seu pau tentou, no entanto. Ela olhou para ele enquanto esfregava sua mão ensaboada para cima e para baixo em seu pau e sobre suas bolas. —Quando eles finalmente deixarem você sair daqui, pretendo terminar isso. —Continue assim, e terá que terminar agora mesmo. Ela se inclinou e o beijou carinhosamente. —Desculpe, mas nossos cinco minutos terminaram. Ele gemeu de frustração enquanto ela lavava suas pernas e pés. Depois de enxaguá-lo, desligou a água e pegou uma toalha. Ela secou a maior parte do corpo dele enquanto ele ainda permanecia sentado e então, cautelosamente, o ajudou a ficar de pé para que pudesse terminar o trabalho. Ela pegou uma camisola hospitalar limpa das prateleiras perto do cesto e ajudou-o a vestir-se. —Você quer escovar os dentes? —Ela perguntou, apontando para os artigos de higiene hospitalares fechados. —Por favor. —Ele disse, desesperado para sentir-se humano novamente. Ela abriu uma escova de dentes e um minúsculo tubo de pasta. —Você quer que eu escove ou só estabilize você? —Eu posso escovar meus dentes. —Ele respondeu, mais ríspido do que pretendia. Ela revirou os olhos e entregou tudo a ele. —Tudo bem, mas você não vai fazer sua barba. Eu farei isso por você. —Você usou uma navalha no meu cabelo. Eu estou perfeitamente confortável com você raspando meu rosto com um aparelho de barbear. —Ele encostou-se a pia e escovou os dentes.


Atrás dele, Holly mantinha as mãos na cintura e o corpo contra o dele, apoiando-o apenas para o caso de ele ficar tonto ou fraco. Quando terminou de escovar e enxaguar, ergueu a camisola para ver melhor o peito e o estômago. Tinha muitas cicatrizes, algumas distorcendo suas tatuagens. Se ele fosse um homem vaidoso, ele as teria retocado, mas não eram tatuagens que ele tinha escolhido por razões estéticas. Elas eram negócios. —Você quer que eu barbeie você agora ou mais tarde? —Mais tarde. —Disse ele, inclinando-se em seu toque quando ela colocou os braços ao redor de sua cintura, cautelosamente evitando seus ferimentos. Seus lábios carnudos pressionaram-lhe beijos nas suas costas. —Estou muito feliz que você esteja acordado. Ele fechou os olhos, deleitando-se com o toque dela e odiando a si mesmo pelo que teria que fazer em breve. —Estou feliz que você esteja aqui comigo. —Sempre. —Ela prometeu. —Eu sempre estarei com você. Não, ele pensou tristemente. Não, você não estará.

******

—Por que você come tacos de peixe e eu tenho que me contentar com sopa? —Kostya perguntou, dramaticamente pegando o caldo com a colher e deixando-o cair de volta em sua tigela. Lutei contra o desejo de suspirar ou revirar os olhos. Desde que ele acordou, há dois dias, estava mal-humorado e difícil. Ele estava agindo como uma criança sobre as coisas, e tanto quanto eu


queria brigar com ele por seu comportamento ridículo, eu entendia que ele estava lutando com sua recuperação. Calmamente, expliquei: —Não sou eu que tenho restrições alimentares. É você. Então, ou você come o delicioso caldo de res que eu trouxe do restaurante ou você vai comer a sopa de legumes que o hospital está servindo esta noite. Ele franziu a testa, mas aceitou seu destino, tomando um pouco da sopa saudável. Não reclamou novamente depois da primeira colherada. Na esperança de afastá-lo de seu mau humor, eu disse: — Savannah me enviou os panfletos para a festa de gala de Jeans e Diamantes. Eles são escandalosamente brilhantes. Não posso nem imaginar como será a postagem deles com todo o brilho e purpurina! —Essa é a coisa de caridade da sua fraternidade na véspera de Ano Novo? —Sim. —Olhei para ele e tentei decidir o tamanho de sua calça jeans. —Nós vamos ter que levá-lo para a loja Cavender para comprar alguns jeans e botas. Talvez ao Republic Boot Co. — Acrescentei, pensando em como poderia conseguir umas botas de cowboy personalizadas para ele. —Eu não vou usar botas de cowboy. —Ele resmungou amargamente. —Você tem que usar. —Eu insisto. —É o tema da festa de gala. De que outra forma você vai dançar two-step 21se não tiver botas? —Eu não danço. 21

Dança de casal, coreografado, dançado livre ou em círculos, como em uma quadrilha.


Eu revirei meus olhos. —Todo mundo dança. —Eu não. —Ele respondeu. —Two-step definitivamente não. —É o mais fácil de aprender. —Assegurei a ele. —Assim que você sair da cama, eu vou te ensinar. Podemos não ser os melhores dançarinos, mas vamos nos divertir. Ele fez um barulho de infelicidade. —Você deveria levar outra pessoa. Eu vou ser um acompanhante horrível para uma festa como essa. Empurrando de lado a bandeja em que estava minha comida, sentei-me mais para frente na cadeira. —Não vou levar mais ninguém para a maior noite de caridade da minha fraternidade. Você é o único que eu quero comigo. Ele largou a colher com um barulho alto. —E o que eu quero? Surpresa com a sua pergunta rude, perguntei: —Você está com dor? É por isso que você está sendo tão idiota? Porque se está sofrendo, eu posso chamar uma enfermeira aqui para te dar algo para que você se sinta melhor. —Sim, estou com dor, Holly. Esses médicos me cortaram como se eu fosse um cervo e me costuraram de volta como o monstro do Frankenstein. —Ele pegou seu copo de água e o jogou para trás com raiva. —Não é por isso que estou agindo como um idiota, como você diz. —O que há de errado? Por que você está tentando arrumar uma briga comigo? —Estreitei meus olhos para ele. —Você está tentando me fazer fugir? Porque não é assim que isso funciona, Kostya. Eu não vou fugir só porque você está aqui rosnando como um urso.


—Então talvez eu precise ser franco. —Ele retrucou. — Quero que você faça as malas e volte para Houston com sua mãe. O mais rápido possível. —Acrescentou, maliciosamente. —Eu não vou embora. Eu não me importo com o quanto você grita e reclama. Vou ficar aqui para ajudar você a se recuperar. —Eu não quero sua ajuda, Holly! Eu recuei diante de seu acesso de raiva. Ele nunca tinha levantado a voz comigo, e o som estrondoso fez meu estômago apertar. —Não grite comigo assim. Eu não sou um dos seus soldados de rua. Você não me assusta. Ele inspirou asperamente e desviou o olhar de mim. Os músculos do pescoço ficaram tensos e as mãos estavam apertando em punhos. —Desculpe ter gritado com você. —Ele disse finalmente. —Mas isso não muda o que eu quero. —Você quer que eu vá embora? —Eu perguntei, estupefata. —Você quer que eu faça as malas e vá embora? Ele encontrou meu olhar confuso. —Sim. Eu quero que você vá. —Por quê? —Porque eu percebi algo quando acordei, Holly. —E o que foi? —Você não é a garota certa para mim. Suas palavras doeram mais do que qualquer bofetada. — Como você pode dizer isso para mim? Depois de tudo o que passamos... —Isso mesmo, Holly. Nós passamos por muito. Foi egoísta da minha parte pensar que poderia ter você. Nós não podemos


continuar com isso. Eu não vou colocar você e as pessoas que você ama em perigo. —Você não pode tomar essa decisão sozinho. — Argumentei, desesperada para fazê-lo entender. —Eu não sou criança, Kostya. Compreendo os riscos. Eu te amo e quero estar com você mesmo que... —Eu droguei você. —Ele interrompeu em voz alta. Chocado com sua declaração, eu pisquei. —O quê? —Naquela primeira noite, que ficamos juntos na sua casa. — Ele disse, sem tirar os olhos dos meus e me obrigando a olhar para ele e ver que ele estava dizendo a verdade. —Quando cheguei ao salão e te encontrei e te levei para casa? —Ele balançou sua cabeça. —Foi tudo uma armação. Você estava em um lista de alvos. Alguém descobriu que você era a filha de Maksim e eles vinham atrás de você. Lana era uma isca... Eu endureci como se alguém tivesse jogado água fria em mim. —O que você quer dizer? Lana era um isca? Como? —Eu a encontrei em um quarto de hotel algumas semanas antes daquela noite. —Explicou. —Ela havia sido comprada e vendida e depois deixada para trás. Um colega meu a encontrou e me pediu para cuidar dela. —Você não a reconheceu? —Eu perguntei, pensando no que Maksim dissera. —O que você quer dizer? —Ele perguntou, com o cenho franzido. —Maksim me disse que sua mãe era uma terrorista e seu pai a traiu. É por isso que seu colega queria que você cuidasse dela?


—Eu não sabia. —Ele disse baixinho. —Eu suspeitava, mas não tinha confirmado. Quando eu a aceitei, só estava pensando nela como sendo útil. —Útil? Ela é uma pessoa, Kostya! Não é uma ferramenta! —Ela era a ferramenta que eu precisava para mantê-la segura naquela noite. —Ele respondeu. —Ela entrou no salão com o resto das mulheres do abrigo, e ninguém notou que ela não pertencia ao lugar. Eu disse a ela para fazer o mesmo corte de cabelo e pintar como o seu. Eu queria que ela parecesse com você de longe. Meu estômago revirou violentamente enquanto ele falava. — E então o quê? —Eu fiz ela te drogar. Sua bebida. —Ele esclareceu. —Ela se escondeu no salão e depois que Savannah saiu, ficou de olho em você até que fosse seguro entrar. Eu levei você para a sala de suprimentos do salão e deixei você com Lana e Lobo enquanto eu cuidava dos negócios. —Cuidava dos negócios. —Repeti. —Quais? —O que você acha? Eu fechei meus olhos com uma onda de repulsa me oprimindo. —Você matou pessoas no meu salão enquanto eu estava desmaiada na sala de suprimentos. —Sim. —E depois? —Eu não queria ouvir o resto de sua história horrível, mas precisava saber. —E então mandei as meninas limparem tudo e se livrarem dos corpos enquanto eu te levava para casa. —Ele respondeu com naturalidade.


—O que há de errado com você? —Eu perguntei, de repente furiosa. —Por que você não veio até mim e me disse que eu estava em uma lista de alvos? Por que não me pediu para deixar você entrar no salão enquanto eu me escondia na sala de suprimentos? Por que diabos você simplesmente pulou direto para me drogar? Ele não parecia ter uma resposta. Não no começo. Eventualmente, disse: —Era mais limpo assim. O segredo de sua ascendência permaneceria enterrado. Você não fez parte dos assassinatos. Você dormiu durante toda a coisa feia e acordou na manhã seguinte sem qualquer consciência do que tinha acontecido. Esfregando meu rosto, perguntei: —É por isso que você queria que eu levasse um mês para pensar em nós? Na manhã seguinte, no café da manhã? Porque você estava se sentindo culpado? —Sim. Parcialmente. Um pensamento preocupante me atingiu. —Você ia me dizer? —Que eu droguei você? Ou que matei pessoas no seu salão? —Ambos! —Eu exclamei com exasperação. —Estou dizendo a você agora. —Não foi isso que perguntei. —Eu não sei. —Ele admitiu. —Eu quis dizer a verdade tantas vezes, mas não consegui. —Por que não? —Eu sou um covarde quando se trata de você. —Ele confessou. —Eu não queria perder você.


—Até hoje. —Eu disse, começando a chorar. —Agora você está tentando me afastar. —Eu não sou um bom homem, Holly. —Ele respondeu, seus próprios olhos brilhantes e escuros. —Eu vou arruinar você. —Você já arruinou. —Eu sussurrei, enxugando minhas bochechas. —Eu te amo. Só você. Se você não me quer, tudo bem. Não tenho medo de ficar sozinha. Sua expressão endurecida relaxou. —Holly, não é isso que eu quero para você. Eu quero que você seja feliz. —Você me faz feliz. Com falhas e erros e tudo mais. — Acrescentei seriamente. —Eu amo você, Kostya. —Peguei a sacola que estava usando como bolsa, pendurei por cima do meu ombro e enxuguei o meu rosto de novo. —Mas eu vou. Se é isso que você quer, eu vou. Voltarei a Houston e deixarei você aqui para se afogar em sua amargura e besteira. Ele endureceu quando cheguei perto da cama e me inclinei para beijá-lo, talvez pela última vez. Eu pressionei meus lábios nos dele, demorando-me por alguns segundos enquanto lutava contra o desejo de chorar. Quando me afastei, ele tinha os olhos fechados, a mandíbula cerrada, enquanto respirava pesadamente. Ele estava tão chateado quanto eu, mas parecia determinado a me expulsar. —Você sabe onde me encontrar se mudar de ideia. Fazendo o possível para me segurar, saí do seu quarto de hospital sem olhar para trás. No corredor, eu corri para Gabe. Ele deu uma olhada em mim, no meu rosto abatido e nas lágrimas brilhando nos meus olhos, e me acolheu em um abraço de urso. — Esse idiota estúpido. —Ele murmurou contra o meu cabelo. —Ele está determinado a ser miserável.


—Ele está sofrendo. —Eu disse, tentando entender o homem que eu amava. —Fisicamente, emocionalmente, ele está ferido. Ele não sabe o que está dizendo. Não de verdade. —Ele se sente vulnerável. —Explicou Gabe. —Ter você aqui faz com que ele se sinta fraco. Ele se sente culpado por tudo que fez. É difícil ter toda essa merda terrível dentro de você quando a mulher que você ama é tão limpa e boa. —Eu não sou perfeita, Gabe. —Comparada com ele? Você é uma maldita santa, Holly. — Ele apertou meu ombro. —Vou ficar de olho nele. Ele estará a salvo comigo. —Obrigada, Gabe. —Você vai partir em breve? —Provavelmente de manhã. —Eu decidi, certa de que havia voos que poderíamos pegar. —Por quê? —Eu tenho algo que queria que você levasse para Houston. —Ele disse, evitando meu olhar como se fosse tímido. Eu suspeitava que fosse algo para Savannah. Ele parecia apaixonado por ela, mas eu não tinha certeza se havia um futuro nisso. Depois que Savannah compartilhou sua opinião sobre Kostya e sua história, não podia imaginar que ela aceitaria alguém como Gabe que parecia ter segredos. —Basta enviar para o hotel. —Eu disse. —Vou verificar na recepção antes de irmos. —Obrigado. —Ele deu um tapinha nas minhas costas. — Você deveria descansar. Não se preocupe com o seu velho. Eu vou lidar com ele.


—Não muito rudemente. —Insisti. —Sem promessas. —Gabe disse, afastando-se de mim. Sozinha no elevador alguns momentos depois, fechei os olhos e encostei-me na parede. Eu queria chorar e agir histericamente. Queria rastejar para a cama com minha mãe e beber vinho até que eu esquecesse sobre a conversa desagradável que eu tinha acabado de ter com Kostya. Eu queria correr de volta para o seu quarto de hospital e exigir que ele me deixasse ficar e cuidar dele. De alguma forma, eu encontrei a força de vontade necessária para deixar o hospital e fazer a curta caminhada até o resort. Atravessei o saguão, entrei no elevador e segui até a suíte espaçosa que eu estava compartilhando com minha mãe. Quando entrei no quarto, ela estava no sofá, tomando algo branco e translúcido enquanto lia em seu tablet. —Você voltou mais cedo do que eu esperava. —Disse ela, deixando de lado sua taça de vinho e tablet. Ela deu uma olhada para mim e suspirou, tirando os óculos de leitura e colocando-os sobre o tablet. —Venha aqui, Holly. Diga-me o que ele disse. Chorando, caí ao lado dela no sofá e derreti em seu abraço maternal. Era simplesmente demais. Tudo o que aconteceu comigo borbulhou para a superfície e irrompeu de mim como um vulcão de tristeza. O arrombamento, Scorpion, ser sequestrada, descobrir sobre meus pais biológicos, atirar em Igor, ser baleada, ver Kostya quase morrer, descobrir que ele me drogou e matou pessoas no meu salão... Solucei e chorei até que não pudesse enxergar ou respirar. Eu permiti que tudo saísse e deixei tudo pra trás. Chega de segredos, prometi a mim mesma. Chega. De. Segredos


CAPÍTULO TRINTA E TRÊS —Você quer pegar esse colar emprestado? —Minha mãe perguntou quando entrou no meu quarto com diamantes pendurados em seus dedos. Ela parecia deslumbrante no vestido azul meia-noite que escolheu durante a nossa viagem de compras à loja Saks. O modelo frente única destacava seus braços e ombros tonificados de uma maneira que me deixava escandalosamente invejosa. Ela havia escolhido brincos de diamantes chamativos e uma pulseira, em vez de optar por um colar atraente. —Eu tenho o outro, a lágrima, se você preferir usá-lo em vez disso. —Eu definitivamente quero esse. —Eu disse, olhando atentamente para a peça chamativa. —Eu tenho que estar deslumbrante com minhas joias, para que as pessoas não me perguntem onde está meu acompanhante inexistente... Mamãe sorriu tristemente. —Estou triste que ele não virá. —Eu também estou. —Levantei as pontas dos meus cabelos enquanto ela prendia o colar no lugar. O colar era pesado e frio, lembrando-me de cristais de gelo. Como um destaque para o meu vestido tomara que caia branco e prateado, funcionava perfeitamente. Minha pulseira e brincos mais simples eram o equilíbrio perfeito. —Você falou com ele hoje? —Surpreendentemente, minha mãe apoiava minha comunicação com Kostya por meio de mensagens de texto, e-mail e telefonemas ocasionais. Ele cedeu primeiro, mandando mensagens nem mesmo uma semana depois que eu saí do México para pedir desculpas e pedir-me para dar a ele algum tempo para entender tudo direito.


—Rapidamente. —Eu respondi com sinceridade. —Ele ligou esta manhã para me desejar um feliz ano novo já que sabe que eu estarei na festa de gala à meia-noite. —Você disse a ele que tem um encontro? —Ela tinha um brilho travesso nos olhos. —Não! Eu não quero deixá-lo com ciúmes por causa de um encontro imaginário. Eu quero que ele volte para mim porque quer, não porque tem medo de que alguém mais chegue em mim primeiro. —Se ele ficar se escondendo no México, alguém vai chegar em você primeiro. —Ela respondeu conscientemente. —Olhe para você. —Ela descansou as mãos nos meus ombros e sorriu para o meu reflexo no espelho. —Que homem esta noite não vai querer te levar para casa? —Mãe! —Eu fiz uma careta com a ideia de ser escolhida na festa. —Eu realmente não estou com vontade de sexo casual. —Bem, eu estou. —Disse ela com um sorriso travesso. —Na verdade, pretendo trazer para casa a minha mais recente conquista, então não tente se arrastar para a cama comigo mais tarde para dormir com sua ressaca. —Mãe! Por favor! —Eu não sabia se ria ou agia de maneira grosseira com o excesso de liberdade dela. —Eu não sei por que deixei você me convencer a voltar a morar com você. Você está quase tão terrível quanto minha colega de quarto no segundo ano na Universidade. Eu nunca sabia no que ia entrar quando abria a porta em um sábado à noite. —Eu vou pendurar uma gravata na porta. —Ela disse com uma risada quando saiu do meu quarto. —Estou saindo agora para conhecer meu encontro. Seu carro estará aqui em meia hora. —Ela


gritou enquanto se dirigia pelo corredor. —Tranque a porta quando sair, por favor. —Eu tranco. —Quando ela estava fora do alcance da minha voz, fiz um som dramático de engasgo. Minha mãe tinha uma vida sexual mais quente do que eu nos últimos tempos. Talvez ela sempre tenha tido uma mais agitada do que a minha, mas eu não tinha notado até voltar a morar com ela. —Eu tenho que conseguir uma nova casa. —Eu murmurei para mim mesma enquanto retocava minha maquiagem. A venda da minha casa deveria fechar em alguns dias. Assim que tivesse meu dinheiro em mãos, planejava começar a procurar algo novo. Eu não conseguia decidir se queria outra casa ou algo mais chique como um apartamento num condomínio de luxo. Mas o que quer que eu escolhesse teria que permitir animais de estimação. Uma das minhas resoluções para o próximo ano era ter um animal de estimação. Eu estava inclinada para um gato, mas um cachorro pequeno, talvez um Pug ou um Lulu da Pomerânia, também estava na minha lista. Havia um punhado de resgates na área que lidava com certas raças, então não tive dúvidas que poderia encontrar o companheiro perfeito. Eu definitivamente não queria uma fera enorme como Vivian e Nikolai tinham. A Stasi era uma cadela maravilhosa e bemcomportada, mas eu não conseguiria lidar com o barulho, a baba ou as despesas de comida. O cachorro definitivamente mantinha a casa em segurança. Até rostos amigáveis ganhavam um latido de doer os tímpanos. Eu não podia nem imaginar que tipo de barulho aquele cachorro faria se alguém tentasse ameaçar a família. Sabendo que eu veria Vivian e Nikolai à noite na festa, eu pratiquei as frases russas que ela me ensinou até então. Ela era uma professora muito boa. Se ela não estivesse tão feliz como uma artista-dona de casa, poderia ter uma carreira muito bem sucedida


como educadora. Ela nunca me fez sentir tonta ou lenta enquanto eu lutava com o estranho alfabeto ou com pronúncia singular que era como um alienígena para a minha língua. Eu invejava sua paciência e calma e tinha certeza de que ela seria uma mãe incrível. A campainha tocou inesperadamente. Olhei para o relógio na minha mesa de cabeceira. O carro não deveria me pegar por mais uns dez minutos, mas talvez eles estivessem adiantados por causa de uma carga de trabalho pesada. Peguei minha bolsa, coloquei meu batom dentro, verifiquei meu reflexo mais uma vez no espelho de corpo inteiro e sai do meu quarto. Desci as escadas com cuidado, não querendo tropeçar ou escorregar, e corri para a porta. Mesmo com saltos, eu tive que me levantar na ponta dos pés para ver pelo olho mágico. Meu coração palpitou. O que ele está fazendo aqui? Tremendo de emoção, abri a porta e sorri para Kostya. Ele parecia adoravelmente desconfortável em seus jeans engomados, camisa branca, jaqueta preta e gravata borboleta. Alguém o ajudou a escolher as botas perfeitas e um chapéu Stetson para completar seu visual. Ele limpou a garganta e puxou a gravata fina em seu pescoço. —Sua mãe escolheu para mim. Eu ri, finalmente percebendo por que ela havia saído tão cedo. —Claro que sim. —Posso entrar? —Ele parecia nervoso, como se esperasse que eu batesse a porta na cara dele. —Por favor. —Eu dei um passo para o lado e fechei a porta depois que ele estava em segurança no hall. Recostando-me contra a porta, estudei-o por um longo momento. —Você parece bem. —Você está linda. —Disse ele, quase sem fôlego. —Você sempre está linda, mas hoje à noite? Você está incrível, Holly.


—Obrigada. —Eu timidamente alisei minha mão na frente do meu vestido. —Eu costumo usar preto para esta festa de gala, mas eu queria tentar algo diferente este ano. —Eu gosto disso. O branco. —Ele esclareceu. —Isso me lembra do Natal. —Oh! —Seu comentário me lembrou do presente que eu tinha para ele. —Eu tenho o seu presente aqui... —Holly. —Ele segurou meu pulso enquanto eu tentava correr para a sala de estar onde nossa árvore de Natal ainda brilhava. —Eu não vim aqui para ganhar um presente. Mordendo meu lábio, olhei para ele ansiosamente e perguntei: —Por que você veio aqui? —Para me desculpar. —Disse ele, segurando meu rosto com a outra mão. —Para implorar para você me aceitar de volta. Para me ajoelhar e implorar se for preciso. —Continuou ele, seu polegar acariciando meu lábio inferior. —Eu fui um idiota por te mandar embora daquela maneira. Eu sei que pedi desculpas antes em nossas mensagens e telefonemas, mas eu queria fazer isso corretamente. Aqui. De pé na sua frente. —Você não tem que ficar se desculpando pelo que aconteceu no México. —Toquei sua mandíbula e respirei sua colônia, o perfume reconfortante e sexy ao mesmo tempo. —Você estava com muita dor e com medo. Você foi um verdadeiro idiota, mas eu entendo o porquê. —Você não precisa me perdoar pelo que fiz no seu salão, Holly. —Ele parecia estar mais incomodado com isso. —Você estava certa. Eu tinha outras opções. Eu poderia ter falado com você sobre a lista de alvos. Poderia ter tomado decisões diferentes.


Eu fui arrogante e estúpido ao pensar que drogar você e te tirar do caminho era a melhor escolha naquela noite. —Sim, você foi. —Passei as pontas dos meus dedos pelo seu queixo e mandíbula. —Você cometeu muitos erros. Muitos deles. — Eu enfatizei. —Mas não podemos avançar juntos se nós dois estivermos atolados no passado. —Podemos começar de novo, Holly? Eu não espero que nós continuemos de onde paramos. —Ele disse. —Nós podemos ir devagar. Podemos fazer do jeito certo, do jeito que você merece. —Sim, podemos começar de novo. Eu gostaria muito disso. —Eu tentei afastar minhas lágrimas, de repente feliz por ter usado meu rímel à prova d'água. Segurando sua mão, eu disse: —Eu sou Holly Phillips. Eu acho que você trabalha para o meu pai. Ele sorriu e apertou minha mão. —Kostya Antonovich. Exespião. Ex-limpador da máfia. Atual Subchefe e empregado de seu pai. —É bom conhecer você, Kostya. —Eu gesticulei em direção à porta. —Estou a caminho de uma festa. Você gostaria de vir? —Como seu amigo? —Ou o meu encontro. —Eu disse com um encolher de ombros. —Podemos ver como a noite será. Ele me puxou para perto, me pegando em seus braços e enterrando o rosto no meu pescoço. —Deus, Holly, eu senti tanto sua falta. Eu estava perdido sem você. Fechando meus olhos, eu segurei seus ombros, desesperada para nunca mais deixá-lo ir. —Você encontrou o caminho de volta para mim. Isso é tudo que importa.


Ele tocou sua testa na minha. —Eu amo você, Holly. Eu sei que estamos indo devagar, mas eu queria que você soubesse que eu nunca deixei de amar você. Eu não achei que fosse possível, mas eu te amo ainda mais agora. Todos os dias, é como se meu coração estivesse ficando cada vez maior para você. Ficando na ponta dos pés, eu o beijei ternamente. —Eu também te amo. Muito. —Bom. —Ele disse, deslizando um braço pela minha cintura e pegando minha mão com a outra. —Eu te amo tanto que deixei Gabe fodido Reyes me ensinar como dançar two-step. Rindo, eu deixei ele me guiar pelo hall da casa da minha mãe, meus pés e suas botas se embaralhando na dança de uma música country imaginária. Eventualmente, eu descansei meu rosto contra o peito dele e aproveitei o movimento suave de seu corpo levando o meu. Eu podia ouvir o coração batendo no seu peito, e isso me lembrou de tudo que eu poderia ter perdido. Não seria tão fácil. Seguir em frente, ainda teríamos muitos problemas para resolver e eu tinha certeza de que haveria desentendimentos. Nós tínhamos chegado tão longe. Juntos, de mãos dadas, não havia nada que não pudéssemos enfrentar. —Feliz Ano Novo, Holly. Ele acariciou meu rosto. —Espero que o próximo ano traga tudo o que você quer. Eu pressionei meus lábios nos dele em um beijo doce. —Já trouxe.

Fim.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.