Acordo UE-Mercosul:
Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos Autor: Thomas Fritz
ESTUDO
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
Informação editorial Autor Thomas Fritz Tradução: Daniela Schobert Redação: Antje Rudolph, Armin Paasch, Jürgen Knirsch Revisão: Carolina Rodrigues, Maureen Santos, Paulo Adario, Marina Lacorte, Julianna Malerba, Madalena Ramos Görne Fotografia primeira página: Greenpeace / Daniel Beltrá Design gráfico: VISUELL Büro für visuelle Kommunikation, Aachen
Publicado em nome de MISEREOR e.V. Mozartstraße 9 52064 Aachen, Alemanha Tel.: +49 (0)241 442-0 www.misereor.de, www.misereor.org
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FASE – Solidariedade e Educação Rua das Palmeiras, 90, Botafogo, cep. 22270-070, Rio de Janeiro, Brasil Tel: 021 2536-7350 www.fase.org.br
Dreikönigsaktion-Hilfswerk der Katholischen Jungschar (DKA) Wilhelminenstraße 91/II f 1160 Wien, Áustria Tel: +43 1 4810991 www.dka.at
Greenpeace Brasil R. Fradique Coutinho, 352 - Pinheiros, São Paulo - SP, Brasil. Cep. 05416-000 Tel: 0800 789 2510 www.greenpeace.org/brasil
Foto: Florian Kopp / MISEREOR
A presente publicação é a versão em português da original publicada na Alemanha, em junho de 2020, por MISEREOR, Greenpeace Alemanha, Dreikönigsaktion-Hilfswerk der Katholischen Jungschar (DKA), CIDSE – aliança internacional de organizações católicas de justiça social e desenvolvimento, que aponta os principais riscos ambientais e aos direitos humanos colocados pelo acordo UE-Mercosul com base nos textos do tratado publicados até o momento.
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Índice Informação editorial
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Prefácio
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Sumário
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1. Introdução
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2. Relações UE-Mercosul: Fortalecimento da indústria extrativa
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3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
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3.1.
Uma hipoteca pesada: A grande importância da alimentação animal
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3.2.
Cotas agrícolas: ser humano e natureza sob pressão
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3.3.
Carne bovina: vetor do desmatamento e das mudanças climáticas
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3.4.
Segurança alimentar em risco: sem referência ao Princípio da Precaução
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3.5.
Agrotóxicos e produtos agrícolas geneticamente modificados: Livre comércio para produtos
de alto risco
19
3.6.
Níveis de resíduos de agrotóxicos: à mercê dos interesses comerciais
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3.7.
Barreiras à proteção ambiental e do consumidor
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4. Comércio de matérias-primas: Acesso a minérios e energia
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4.1.
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Mercosul: Fornecedor de importantes minérios
4.2. Os desastres do minério de ferro: Violação do dever de diligência
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4.3. Restrições às taxas de exportação: As matérias-primas devem permanecer baratas
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5. Instrumentos insuficientes de proteção ambiental e dos direitos humanos
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5.1. Ausência de instrumentos para a proteção do direito à terra
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5.2. Cadeia de suprimentos: inexistência do dever de diligência
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5.3. Cláusula de direitos humanos: permanecerá fraca?
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5.4. Avaliação oficial de impacto: tão tarde, tão deficiente
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6. O acordo UE-Mercosul em discussão 33 7. Conclusões e recomendações 34 Anexo
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Notas
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Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
Prefácio
E
m 28 de junho de 2019, uma sexta-feira em que jovens marchavam pelas ruas de várias cidades do mundo em denúncia à crise ambiental e climática, negociadores da União Europeia (UE) e do Mercosul anunciaram em Bruxelas terem concluído um “acordo em princípio” sobre o escopo do acordo de livre comércio que os dois blocos começaram a debater em 1999. Em síntese, o texto do acordo comercial de 17 capítulos reduz tarifas comerciais, amplia cotas de importação e exportação e elimina barreiras não tarifárias, num prazo de até 15 anos, sobre as principais commodities agrícolas e minerais exportadas pelo Mercosul e sobre produtos industrializados da União Europeia, incluindo carros, máquinas e equipamentos, produtos farmacêuticos e agrícolas. Além disso, inclui também compras governamentais e serviços. O anúncio foi recebido com dois tweets eufóricos. De Osaka, no Japão, onde iria participar de uma tensa reunião da Cúpula do G20, o presidente Jair Bolsonaro, fortemente criticado no Brasil e no exterior por sua retrógrada postura anti-socioambiental, celebrou o acordo como “histórico” e uma vitória de sua diplomacia. “Esse será um dos acordos comerciais mais importantes de todos os tempos e trará benefícios para nossa economia”, disse Bolsonaro nas redes sociais. O presidente que aplaudia esse acordo é o mesmo que estava sob pressão de líderes do G20 por desmontar a estrutura de proteção socioambiental e estimular o avanço de fazendeiros, grileiros, garimpeiros e madeireiros sobre a Floresta Amazônica e o Cerrado, que ardem na pira do “desenvolvimento econômico”. O então presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, também usou o Twitter e a mesma palavra usada pelo presidente brasileiro: "Um momento histórico. Em pleno ambiente de tensões comerciais internacionais, estamos enviando um forte sinal de que defendemos o comércio baseado em regras. O maior acordo comercial jamais celebrado pela UE. Um resultado positivo para o meio ambiente e os consumidores.” Já Olivier de Schutter, professor e especialista em direitos humanos e segurança alimentar e nutricional da ONU, fez uma avaliação bem diferente: "O acordo UE-Mercosul é sobre troca de carros por carne bovina. É um insulto para todos os jovens que marcham pelo clima e para os defensores dos direitos humanos e do meio ambiente no Brasil. O Parlamento Europeu deve fazer uso de seu direito de veto.”
O acordo de livre comércio é parte de um acordo de Associação mais amplo cobrindo três áreas: comércio, cooperação e diálogo político. Proteção dos direitos humanos e do meio ambiente devem fazer parte desse acordo mais amplo, mas as informações divulgadas até aqui demostram que em matéria ambiental e de direitos humanos não se vê avanço algum. O que foi divulgado do “acordo em princípio” mostra que o professor de Schutter foi quem chegou mais perto: um pacto que, longe de assentar as bases de uma necessária transição socioambiental, vai contra a proteção do clima, contra o meio ambiente e contra os direitos humanos. Se algo tem de histórico, é o fato de consolidar, em pleno século 21, a dependência colonial dos países sul-americanos em seu papel de eternos fornecedores de matérias-primas baratas, produzidas com custos sociais e ambientais imensos, em troca de produtos industrializados europeus. Ao reduzir tarifas comerciais e ampliar quotas de importação e exportação, o acordo vai aumentar ainda mais a pressão do agronegócio e das multinacionais de mineração e energia sobre os recursos naturais da Amazônia, do Cerrado, do Chaco e de outras regiões da América do Sul, colocando em risco ainda maior os povos que nelas vivem – sejam eles camponeses e agricultores familiares, povos indígenas, quilombolas ou ribeirinhos. Além disso, poderá ampliar os riscos relativos à contaminação por agrotóxicos, à concentração fundiária e à profunda e desigual distância entre cidadãos europeus e sul-americanos no que diz respeito a segurança e soberania alimentar. A Alemanha assumiu a presidência rotativa do Conselho da UE em 1º de julho deste ano tendo como uma de suas prioridades a aprovação do acordo com o Mercosul – no momento em que o aumento do desmatamento e das queimadas na Amazônia e no Cerrado brasileiro ganhava as manchetes da mídia mundial. O governo alemão, pressionado pela crescente oposição da opinião pública e de políticos europeus, pretende ”finalizar” o acordo antes que expire seu mandato no final do ano. Afinal, os grandes grupos alemães da indústria automobilística, de máquinas e equipamentos e de química serão os grandes beneficiários das reduções tarifárias previstas no acordo UE-Mercosul. Em troca, Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai poderiam exportar para a UE mais produtos agrícolas – historicamente envolvidos com desmatamento, conflitos fundiários, emissões de gases 4
Prefácio
de efeito estufa, migrações forçadas e outras tantas violações de direitos humanos. A presente publicação do autor Thomas Fritz teve sua versão original publicada na Alemanha, em junho de 2020, por Misereor, Greenpeace Alemanha, CIDSE e Dreikönigsaktion-Hilfswerk der Katholischen Jungschar (DKA), e traz uma análise sobre possíveis impactos ambientais, em especial climáticos, e em matéria de direitos humanos, pelo acordo UE-Mercosul. O estudo mostra que, infelizmente, é inútil tentar identificar nos documentos desse acordo alguma norma vinculante e mecanismos eficazes de proteção aos direitos humanos, ambientais e territoriais. Como mostra o presente estudo, o acordo UE-Mercosul não tem as ferramentas necessárias para evitar a tragédia da destruição anunciada.
da conservação da biodiversidade. Tudo isto requer uma mudança fundamental da política em muitas áreas, incluindo políticas comerciais que levem em consideração os custos humanos e ambientais do que consumimos. Os acordos comerciais devem nos ajudar a viver de forma sustentável e não a ampliar o comércio a todo custo. Devemos ter regras comerciais baseadas na solidariedade e cooperação, em vez de competição e destruição. Rio de Janeiro, São Paulo, Aachen, Hamburgo, Viena, Bruxelas Setembro de 2020
Maureen Santos Coordenadora do Grupo Nacional de Assessoria da FASE
Solidariedade em tempos de Covid-19
Paulo Adario
O que distingue junho de 2019 de junho de 2020 é uma pandemia sem precedentes. Esta pandemia é mais do que uma crise de saúde pública. É uma crise sistêmica. Tal como a crise climática e as muitas outras que enfrentamos, ela afeta a todos, mas afeta mais, em particular, os mais pobres e os que se encontram em situação de vulnerabilidade. A pandemia está atingindo um mundo em que a fome é uma realidade. Igualdade, emprego seguro e remuneração justa continuam sendo inatingíveis para a maioria das pessoas, e a próxima crise da dívida já está se aproximando. A pandemia mostra com toda a clareza que o sofrimento humano é ainda maior em sociedades desiguais, com economias e democracias frágeis, como é o caso da maioria dos países do Mercosul. A resposta a esta crise tem que estar obrigatoriamente ancorada na solidariedade, na proteção de todas as pessoas, para superar as consequências sociais e econômicas e atuar na defesa da democracia. Solidariedade também implica a obrigação de salvaguardarmos o meio ambiente e a base de subsistência para as gerações futuras, com importante cuidado para a garantia da manutenção dos modos de vida dos camponeses, povos indígenas e populações tradicionais. Isso inclui o reconhecimento de suas reivindicações em defesa da soberania alimentar, da democratização do acesso à terra, da distribuição de renda, da valorização da diversidade cultural e
Estrategista Sênior de Florestas do Greenpeace
Pirmin Spiegel Diretor Geral da MISEREOR e.V.
Martin Kaiser Membro da Direção Executiva de Greenpeace e.V., Alemanha
Jakob Maierhofer-Wieser Diretor Executivo do Dreikönigsaktion-Hilfswerk der Katholischen Jungschar (DKA), Áustria
Josianne Gauthier Secretária-Geral da CIDSE
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Sumário
N
o final de junho de 2019, a Comissão Europeia anunciou que havia chegado a um acordo em princípio sobre um acordo Comercial com o Mercosul. Os estados que integram o bloco comercial sulamericano são Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. O acordo foi planejado como parte de um acordo de associação mais abrangente e é altamente controverso, tanto do ponto de vista da sociedade civil quanto entre os governos. A presente publicação de MISEREOR, Greenpeace Alemanha, Dreikönigskation-Hilfswerk der Katholischen Jungschar (DKA), CIDSE – aliança internacional de organizações católicas de justiça social e desenvolvimento –, Greenpeace Brasil e FASE, lançada originalmente na Alemanha em junho, aponta os principais riscos ambientais e aos direitos humanos colocados pelo acordo UE-Mercosul com base nos textos do tratado publicados até o momento. A publicação analisa ainda em que medida o acordo poderá impedir a regulação necessária sobre o movimento nocivo de mercadorias.
Foto: Martin Katz / Greenpeace
No entanto, o acordo comercial não contém qualquer indicação para uma produção mais sustentável de soja ou que leve a uma redução do comércio de soja. Em vez disso, existem cláusulas que tornariam a comercialização de ração animal na UE ainda mais barata, como por exemplo a redução das tarifas argentinas de exportação de soja. Com este compromisso, a Argentina estaria arriscando sérias perdas para sua arrecadação financeira, recursos que não estariam disponíveis para financiar programas sociais urgentes.
Amplo acesso aos recursos naturais Uma análise das relações comerciais entre UE e Mercosul revela que dois terços das importações da UE consistem em matérias-primas agrícolas e minerais. Este acesso desproporcional aos recursos naturais do Mercosul faz com que a UE seja uma das grandes corresponsáveis pela degradação ambiental e violações de direitos humanos na região sulamericana. A redução das tarifas aduaneiras prevista no acordo comercial aumentaria ainda mais as quantidades de matérias-primas comercializadas.
Desmatamento na região do Chaco, na Argentina: "Assim começa a mudança do clima"
Vetores da expansão agrícola: Cotas de carne bovina e bioetanol As cotas tarifárias preferenciais adicionais propostas ao Mercosul para a exportação de carne e bioetanol também ameaçam agravar os conflitos socioambientais existentes. Por exemplo, a cota total de bioetanol, de 650.000 toneladas, representa um aumento de seis vezes em relação ao volume importado do Mercosul pela UE praticado atualmente, favorecendo ainda uma maior expansão do cultivo da cana-deaçúcar, principal matéria-prima para a produção de bioetanol na América do Sul. As cotas propostas para a carne bovina e frango, por sua vez, representam um aumento de 50% comparado aos volumes de importação atuais. A cota de
Importação de soja pela UE: um fardo socioecológico As importações de soja pela UE representam o fardo mais pesado no comércio de produtos agrícolas. A área de cultivo de soja no Mercosul que é exportada para a UE chega a aproximadamente 13 milhões de hectares – um terço do tamanho da Alemanha. Como apenas 13 % das importações de soja da UE são consideradas livres de desmatamento, a demanda europeia constitui-se num forte impulsionador para o desmatamento, as emissões de gases de efeito estufa e os conflitos de terra e violações de direitos humanos na América do Sul. 6
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
carne bovina de 99.000 toneladas revela-se particularmente crítica, dado que o desenvolvimento de pastagens é um promotor significativo do desmatamento da floresta amazônica brasileira e da floresta seca do Gran Chaco na Argentina e no Paraguai.
exemplo, produtos agrícolas suspeitos de conterem resíduos de agrotóxicos proibidos ou de excederem os limites de resíduos de agrotóxicos.
Elevado número de intoxicações por agrotóxico
Territórios indígenas ameaçados
Esta lacuna é ainda mais grave, levando em conta que os países do Mercosul utilizam na agricultura muitas substâncias ativas de agrotóxicos altamente nocivas, algumas das quais proibidas ou não autorizadas na UE. Estes agrotóxicos são um perigo em particular para as/os trabalhadoras/es que os aplicam nos campos ou para as pessoas que vivem nas proximidades das plantações. Só no Brasil, de acordo com uma análise de estatísticas governamentais, mais de 7.200 pessoas morreram por envenenamento por agrotóxicos entre 2008 e 2017. Porém, face ao registro deficiente, o número de mortes pode na realidade ser muito maior devido a um elevado número de casos não relatados. O uso de agrotóxicos tornou-se um motivo de preocupação também para as instituições da Organização das Nações Unidas (ONU). Elas advertem, entre outras coisas, que no Brasil pesticidas são algumas vezes deliberadamente pulverizados de maneira a afugentar povos indígenas. Em 2019, o Comitê de Direitos Humanos da ONU adotou uma decisão que responsabiliza o Paraguai por intoxicações graves com agrotóxicos proibidos, porque as autoridades paraguaias não tomaram medidas contra a pulverização ilegal nos campos de soja.
Foto: Florian Kopp / MISEREOR
Entre os mais afetados pela expansão da pecuária ou dos canaviais estão povos indígenas como os Ayoreo no Paraguai ou os Guarani-Kaiowá no Brasil. Acrescenta-se como agravante para estes povos o fato da demarcação de terras indígenas ser muitas vezes deficiente e altamente contestada.
Territórios dos povos indígenas estão sendo cada vez mais ameaçados.
Eliminação de tarifas aduaneiras sobre agrotóxicos e barreiras à regulamentação
A situação é particularmente preocupante no Brasil, onde, sob o governo do presidente Jair Bolsonaro, não só a demarcação foi estagnada por completo como as demarcações existentes estão sob ameaça. Esta indefinição jurídica, por sua vez, encoraja empresas mineradoras, agropecuárias e madeireiras a invadir, frequentemente com uso de violência, os territórios indígenas.
Existem empresas alemãs que também estão tirando partido das diferenças de regulamentação entre os países da UE e do Mercosul. De acordo com um estudo recente, tanto a BASF como a Bayer comercializam no Brasil pelo menos 12 substâncias ativas de agrotóxicos não aprovadas na UE. Entretanto, o acordo UE-Mercosul poderia motivar ainda mais a utilização de agrotóxicos no Mercosul uma vez que ele prevê a redução ou eliminação total de tarifas sobre agrotóxicos e outros produtos químicos. Atualmente, as tarifas do Mercosul aplicadas aos químicos giram em torno de 18%. O acordo, por sua vez, cria obstáculos adicionais a uma regulamentação mais rigorosa dos agrotóxicos, sobretudo devido à consagração insuficiente do Princípio da Precaução. Assim, os países do Mercosul poderiam ativar o mecanismo de resolução de controvérsias
Riscos para a segurança alimentar O acordo também inclui riscos específicos para a segurança alimentar, dado que o Princípio da Precaução da UE não está consagrado no capítulo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (MSF). Devido a essa falha, a UE e o Mercosul não podem contar com o Princípio da Precaução para preventivamente barrar a importação de produtos questionáveis. Isto pode afetar, por 7
Sumário
do acordo, caso a UE baixasse os limites permitidos de agrotóxicos ou considerasse eliminar a autorização de produtos altamente tóxicos, como o glifosato, um agrotóxico amplamente utilizado no Mercosul.
Instrumentos insuficientes para a prevenção de conflitos fundiários Os instrumentos previstos no tratado para a proteção ambiental e dos direitos humanos são extremamente deficientes. Por exemplo, ainda não constam medidas eficazes para punir as violações de direitos humanos no caso de conflitos fundiários. A esse respeito, existe um artigo do capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável que apenas menciona o compromisso das partes do acordo de encorajar o envolvimento dos povos indígenas na cadeia de suprimento de produtos florestais, para os quais estes devem dar seu "consentimento prévio informado". Porém, esta não é mais que uma versão notoriamente distorcida do conceito da ONU sobre a consulta livre, prévia e informada, o qual exige o consentimento dos povos indígenas para qualquer tipo de utilização de seus territórios, e não meramente sua participação na exploração dos recursos.
Garantir matérias-primas baratas: proibição geral de impostos de exportação Os países do Mercosul são também importantes fornecedores de matérias-primas minerais e energéticas. Algumas delas são indispensáveis para a indústria da UE, como o minério de ferro e o caulim do Brasil ou a prata e o cobre da Argentina. Para garantir que o fornecimento destas matérias-primas para a UE se mantenha a preços baixos, o acordo prevê a proibição geral de impostos e taxas sobre as exportações. Três anos após sua entrada em vigor, nenhuma das Partes introduzirá ou manterá direitos de exportação, a menos que se reserve o direito a exceções. No entanto, até hoje apenas a Argentina e o Uruguai fizeram uso dessa possibilidade para um número limitado de produtos. Nesse sentido, a reintrodução de impostos de exportação sobre produtos de mineração como o minério de ferro, que está atualmente sendo discutida no Brasil, constituiria uma violação do acordo UE-Mercosul.
Ausência de cláusula de direitos humanos Além disso, a cláusula referente aos direitos humanos, usualmente encontrada em acordos similares da UE, não foi ainda incluída nas partes do acordo publicadas até esta data. Portanto, não é possível analisar se ela eliminaria as falhas já conhecidas deste instrumento.
O desastre do minério de ferro: Violação do dever de diligência
Foto: Florian Kopp / MISEREOR
Ao mesmo tempo, as importações europeias de minério de ferro acarretam algumas das mais graves violações de direitos humanos, fazendo das empresas da UE corresponsáveis ao longo de suas cadeias de abastecimento, como no desastre da barragem da empresa de mineração Vale em Brumadinho, no estado de Minas Gerais, onde a empresa opera uma mina de minério de ferro. Em janeiro de 2019, a barragem de retenção rompeu causando uma enorme onda de rejeitos que destruiu uma vila, matando 272 pessoas. Pouco antes, porém, a empresa alemã de auditoria técnica TÜV SÜD tinha certificado a estabilidade da barragem, apesar de deficiências consideráveis. Embora as empresas tenham violado seu dever de diligência no desastre de Brumadinho, assim como em outros casos, o acordo UE-Mercosul não contém regras vinculantes sobre responsabilidade corporativa. É certo que no acordo existe uma cláusula no capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável sobre "gestão responsável de cadeias de abastecimento". No entanto, este capítulo não tem força impositiva porque está excluído do mecanismo de resolução de litígios entre as Partes do acordo.
A frágil situação dos direitos humanos nos países do Mercosul.
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Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
Embora esta cláusula permita, em princípio, a suspensão de preferências comerciais em caso de violação dos direitos humanos, os obstáculos à sua ativação são tão elevados que raramente tem sido aplicada, exceto em casos de violações graves, como golpes de Estado. Ela carece, além disso, de órgãos de monitoramento e de recurso. Mais ainda, ela não permite a tomada de medidas de salvaguarda se estas forem contrárias às disposições dos acordos comerciais. Se, por exemplo, as cotas agrícolas acordadas no acordo UE-Mercosul agravarem os conflitos fundiários, estas preferências não poderão ser suspensas.
reforma fundamental da política comercial da UE. Os seguintes elementos poderiam fazer parte dessa reforma: • As relações comerciais da UE devem ser submetidas a rigoroso escrutínio. Em que países elas representam um risco para as pessoas e a natureza, assim como para a transformação socioecológica? Uma análise desse tipo teria de ser realizada em um processo participativo que envolvesse a sociedade civil e os parlamentos da UE, assim como os respectivos países parceiros. • Depois disso, deveria haver uma discussão igualmente inclusiva sobre os instrumentos mais adequados para levar a cabo a transformação das relações comerciais. Também seria necessário considerar requisitos legais, como critérios de sustentabilidade para bens que prejudicam a conservação das florestas (as chamadas "commodities de risco florestal", como soja, carne bovina ou minério de ferro).
Ratificação incerta: Reservas expressas por vários governos Desde o anúncio do “acordo em princípio” entre a UE e o Mercosul, as críticas não têm cessado. Não é certo, portanto, se o mesmo irá efetivamente entrar em vigor. Atualmente os resultados das negociações estão sendo submetidos a uma revisão legal no Mercosul. Na UE a revisão legal já foi concluída, sendo o próximo passo a tradução para todas as línguas da UE. Só então terão lugar a assinatura e o início do processo de ratificação. Caso se mantenha a intenção de que o acordo comercial seja parte integrante de um acordo de associação mais abrangente, o Conselho da UE, o Parlamento Europeu e os 27 Estados-Membros da UE terão de dar sua aprovação. Contudo, vários países já manifestaram reservas em relação a isso. Após as queimadas na Amazônia no ano passado e a atuação altamente problemática do governo brasileiro, o governo francês anunciou que não aceitaria assinar o acordo sob essas condições. O parlamento da Irlanda pediu ao governo que votasse contra o acordo e o governo austríaco também o reprovou em sua forma atual. O parlamento da Valônia deliberou de forma negativa, impedindo assim a aprovação do governo central belga. O governo federal alemão, por sua vez, mantém sua aprovação.
• Decisões sobre a abertura de negociações comerciais só deveriam ser tomadas após o processo participativo de avaliação do impacto dos riscos inerentes a nível social, ambiental e de direitos humanos. • O pré-requisito para iniciar as negociações comerciais seria a ratificação e implementação verificável de acordos ambientais multilaterais e tratados internacionais de direitos humanos. • Os acordos comerciais requereriam cláusulas de direitos humanos eficazes, que incluem órgãos de monitoramento e recurso e permitem a suspensão de preferências em caso de violação e a revisão dos acordos após sua entrada em vigor. • Os capítulos referentes à sustentabilidade em matéria de direitos humanos e de proteção ambiental teriam que ter o mesmo peso que outras partes dos acordos comerciais e dotados de opções de sanção. Além disso, seria necessário complementá-los com regras vinculantes sobre responsabilidade corporativa e mecanismos mais eficazes de monitoramento e recurso por parte da sociedade civil.
Elementos de uma reforma da política comercial
• Alemanha, Áustria e os outros Estados-Membros da UE deveriam ainda adotar leis que regulam as cadeias de abastecimento. A UE deveria também adotar uma regulamentação impondo às empresas o dever de diligência em direitos humanos e meio ambiente. Os objetos de regulamentação deveriam abranger, entre outros, a proibição de produção e exportação de agrotóxicos não autorizados na UE e nos Estados-Membros por razões de proteção da saúde humana e animal ou do ambiente.
A análise dos textos do tratado disponíveis até esta data mostra que o acordo UE-Mercosul não cumpre os requisitos de um acordo comercial moderno. O acordo não contribui para tornar a produção e o comércio mais amigáveis ao meio ambiente nem para prevenir violações de direitos humanos ao longo das cadeias de valor. Nessa medida, a proposta de acordo evidencia claramente a grande urgência de viabilizar uma 9
1 – Kapitelname
1. Introdução
M
uitas partes do mundo estão enfrentando crises sociais e ecológicas cada vez mais graves. Portanto, manter a abordagem “business as usual” atualmente em voga na União Europeia (UE) não é mais aceitável. A elevada contribuição do comércio mundial para a emissão de gases de efeito estufa ilustra isso bem: nos últimos 15 anos, por exemplo, as emissões de dióxido de carbono originadas pelo comércio mundial subiram de um quarto para um terço do total das emissões globais.1 Num cenário como esse, foi ainda mais desconcertante ver a Comissão Europeia anunciar no final de junho de 2019 que tinha chegado a um acordo em princípio sobre um acordo comercial com o Mercosul2. Os estados que integram o bloco sulamericano são Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Tomando como referência a população, esse seria o maior acordo comercial com a UE, abrangendo cerca de 710 milhões de pessoas. Pouco depois deste anúncio, o Brasil foi notícia em todo o mundo por causa do crescente aumento das queimadas na Amazônia e dos violentos conflitos fundiários, fortemente instigados pelo atual governo. O desrespeito do governo brasileiro para com as metas ambientais e de direitos humanos da UE tem colocado cada vez mais pressão sobre a política comercial da União Europeia. As negociações comerciais duraram mais de 20 anos e foram conduzidas em 38 rodadas de negociações, por vezes interrompidas por períodos que duraram vários anos. Porém, o acordo comercial – que deverá tornar-se parte de um acordo de associação abrangente – está longe de sua conclusão. Até hoje não foi assinado nem ratificado. Isso significa que o acordo ainda pode fracassar. Essa é atualmente uma possibilidade real, uma vez que em vários Estados-Membros da UE existem questionamentos consideráveis por parte dos governos e parlamentos, como na França, Áustria, Irlanda e Bélgica. Quais são as críticas ao acordo por parte da sociedade civil da UE e do Mercosul? Quais são os riscos em termos ambientais e de direitos humanos? São estas as perguntas que esta publicação se propõe a responder. Por um lado, foca-se nos produtos mais importantes que a UE importa dos países do Mercosul: produtos agrícolas e matérias-primas. Por outro, analisa os instrumentos previstos no acordo que se destinam a mitigar os riscos para o ser humano
e a natureza. Não serão tratados em detalhe, todavia, os interesses agressivos das empresas europeias e alemãs, cujas exportações para o Mercosul poderão aumentar como resultado do acordo, sejam elas peças de automóveis ou automóveis, maquinários, medicamentos ou produtos químicos (como agrotóxicos).3 No entanto, esta publicação se difere em um aspecto das avaliações de impacto usuais dos acordos comerciais. Normalmente é analisado em que medida um acordo muda o status quo da troca comercial e quais poderiam ser as implicações resultantes. Todavia, tal consideração é insuficiente. A questão cada vez mais urgente hoje é se um tratado desse tipo permitiria o afastamento da lógica das relações comerciais desenvolvidas ao longo da História e que agravam a crise socioecológica. Pois esta crise já assumiu dimensões existenciais para a humanidade. Visando uma avaliação mais ampla, o estudo não se limita, portanto, a estimar as mudanças dos fluxos comerciais e seus impactos sobre o meio ambiente e os direitos humanos. Ele vai mais além, analisando em que medida o tratado previsto restringiria ou ampliaria o potencial de atuação dos Estados no sentido de reduzir e regular a circulação prejudicial de mercadorias. Eis a questão chave: O acordo comercial contribui em alguma medida para a necessária transformação socioecológica e para a descarbonização da economia? A presente avaliação baseia-se nos textos do capítulo comercial do acordo UE-Mercosul, publicados pela Comissão Europeia em seu website em julho de 2019.4 O pretendido acordo de Associação abrangente entre os blocos regionais é baseado em três pilares: comércio, diálogo político e cooperação. Até esta data, porém, a Comissão Europeia apenas publicou partes do pilar de política comercial do acordo de associação, mantendo ainda em sigilo o texto integral desse acordo. Portanto, para uma avaliação global do acordo, estão faltando, no momento da publicação deste texto, partes relevantes do acordo, tais como a cláusula dos direitos humanos normalmente incluída ou as listas concretas de compromissos referentes aos capítulos sobre comércio de bens, investimentos e compras públicas.
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Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
2. Relações UE-Mercosul: Fortalecimento da indústria extrativa
A
s relações comerciais entre União Europeia e Mercosul caracterizam-se por um forte acesso por parte da UE aos recursos naturais provenientes dos quatro países sulamericanos. O bloco europeu importa há décadas grandes quantidades de produtos agrícolas e matérias-primas dos países do Mercosul, resultando daí numerosos conflitos fundiários e um aumento significativo das emissões de gases de efeito estufa, bem como a perda de biodiversidade. A UE não pode se esconder por detrás do aumento do comércio com a Ásia. Pois apesar da crescente importância da China, que há alguns anos se tornou o maior consumidor de bens do Mercosul, a UE continua sendo o segundo mercado mais importante para as exportações de bens do bloco sulamericano (ver gráfico 1).
recursos naturais, se reflete na composição extremamente desigual da gama de exportações de ambas as regiões. Cerca de 84% das exportações da UE para o Mercosul são constituídas por bens industrializados (ver gráfico 3). Nas exportações do Mercosul para a UE o caso já é bem diferente: cerca de três quartos consistem em matérias-primas agrícolas e minerais, dos quais os produtos agrícolas representam de longe a fatia maior (ver gráfico 4). Este acesso desproporcional aos recursos naturais do Mercosul faz com que a UE seja uma das grandes responsáveis pela degradação ambiental e pelas violações de direitos humanos nos países do bloco sulamericano. A redução das taxas aduaneiras
GRÁFICO 1
Exportações do Mercosul: Compradores mais importantes (em bilhões US$) Fonte : Aladi 2020
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No comércio bilateral com o Mercosul, a UE atingiu um superávit comercial ininterrupto desde 2012, alcançando cerca de 2 bilhões e meio de euros em 2018 (ver gráfico 2). O caráter extrativista da relação da UE com o Mercosul, ou seja, a forte concentração na exploração de
Soja a perder de vista. A vegetação original do Chaco argentino é forçada a recuar.
11
2. Relações UE-Mercosul: Fortalecimento das atividades extrativas
GRÁFICO 2
UE: Balança Comercial com o Mercosul (mercadorias em milhões €) Fonte: Comissão Europeia 2019
60 50 40
Importações Exportações Saldo
30 20 10 0 -10 -20 2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
2018
Com o acordo comercial o Mercosul prevê a eliminação gradual em 91% das taxas de importação sobre bens da UE. A Comissão Europeia baseia-se nesta pretensão para prometer aos exportadores alemães elevados lucros adicionais no Mercosul. Máquinas, automóveis e produtos químicos são os produtos mais importantes que a Alemanha exporta para essa região. Os cortes tarifários seriam particularmente significativos para a indústria automotiva. Os direitos aduaneiros sobre automóveis (atualmente em 35%) e sobre peças de automóveis (14 a 18%) deverão ser amplamente eliminados.6
prevista no acordo comercial aumentaria ainda mais as quantidades de matérias-primas comercializadas. Enquanto o Brasil representa o grande peso da política comercial do Mercosul, do lado da UE é sobre a Alemanha que recai esse papel. O país é o principal causador do déficit comercial do Mercosul com a UE. Com um volume de exportações totalizando 15,4 bilhões de euros, a Alemanha foi responsável por cerca de um terço das exportações da UE em 2018, tendo importado, no mesmo período, bens no valor de 6,3 bilhões de euros. Isso resultou, portanto, num elevado superávit – de 9,1 bilhões de euros – no comércio com o Mercosul.5 GRÁFICO 3
GRÁFICO 4
UE-28: Exportações para o Mercosul 2018
UE-28: Importações do Mercosul 2018
Fonte: Comissão Europeia 2019
Fonte: Comissão Europeia 2019
Mineração/ combustíveis 7,9 bilhões €
Bens processados 37,9 bilhões €
Produtos agrícolas 22,5 bilhões €
Outros 1,6 bilhões € Produtos agrícolas 2,5 bilhões €
Bens processados 11,0 bilhões € Mineração/ combustíveis 3,1 bilhões €
Outros 1,2 bilhões €
12
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
C
om o objetivo de estimar a contribuição do acordo UE-Mercosul para a necessária transformação socioambiental, devem ser levados em conta tanto os fluxos comerciais existentes quanto os volumes adicionais que possam surgir. No seguinte ponto, ambas as vertentes são analisadas no contexto do comércio agrícola.
proteínas, há décadas que a soja usufrui de isenção de direitos aduaneiros. A área de cultivo de soja no Mercosul utilizada para exportação para a UE é imensa. Pesquisadores estimam uma dimensão de 13 milhões de hectares.7 Isto corresponde a mais de um terço da área total da Alemanha, que é de 35,7 milhões de hectares. Sendo apenas 13% das importações de soja da UE consideradas livres de desmatamento, a demanda europeia tem uma grande responsabilidade pelo desmatamento e emissões de gases de efeito estufa nesses países.8 A área total de cultivo de soja nos países do Mercosul totaliza atualmente cerca de 58 milhões de hectares, dos quais 35,8 milhões se encontram no Brasil, 17,5 milhões na Argentina, 3,5 milhões no Paraguai e 1,1 milhão no Uruguai. Portanto, só os campos de soja no Brasil já correspondem ao tamanho da Alemanha. O Ministério da Agricultura brasileiro estima que esta área aumentará em quase 10 milhões, para 45,3 milhões de hectares, até a colheita de 2028/29. Esta estimativa nem sequer está contemplando o possível estímulo da demanda motivado pelo acordo UE-Mercosul.9 A expansão dos campos de soja brasileiros conforme está projetada fez soar o alerta no Centro Comum de Investigação da UE, que recentemente apresentou uma avaliação do impacto da demanda europeia sobre o meio ambiente no Brasil.10 De acordo com esse estudo, o cultivo de soja no Brasil não só leva ao desmatamento do Cerrado brasileiro e das florestas tropicais da Amazônia, como também a mudanças indiretas no uso da terra. As áreas de pastagem no Sul e Centro-Oeste do Brasil foram convertidas em campos de soja, resultando no deslocamento da pecuária para os estados do Norte, especialmente os do bioma Amazônia. Se as taxas de desmatamento dos últimos anos continuarem a aumentar no mesmo ritmo, o Brasil ficará muito aquém da meta de redução de gases de efeito estufa a que se comprometeu no âmbito do acordo de Paris, segundo o Centro de Investigação. Assim, a progressão de desmatamento para novas plantações de soja não resultaria em uma redução de emissões de CO2 em 22 milhões de toneladas até
3.1. Uma hipoteca pesada: A grande importância da alimentação animal As importações agrícolas representam mais de metade das importações da UE provenientes do Mercosul. As estatísticas da Comissão Europeia mostram quais são as mercadorias mais importantes (ver gráfico 5). Claramente, grão e farelo de soja são, em termos GRÁFICO 5
Exportações do Mercosul para a UE 2018 Fonte: Comissão Europeia 2019
Outros 5.439 milhões €
Farelo de soja 5.504 milhões €
Soja 2.027 milhões €
Café/chá 1.958 milhões €
Cereais 847 milhões € Sucos de frutas 1.237 milhões €
Carne bovina 1.189 milhões €
de valor de importação, os produtos agrícolas mais importantes para as importações da UE oriundas do Mercosul. A soja é um componente altamente proteico da ração concentrada usada na pecuária industrial, sendo adicionada principalmente na alimentação de aves e suínos e, em menor grau, na de bovinos. Como a UE depende de alimentos animais ricos em 13
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
2030, como indicado na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil, mas sim, em emissões acumuladas adicionais de 900 milhões de toneladas de CO2. Por isso, a fim de evitar mais desmatamento, o Centro recomenda no estudo que o acordo comercial planejado seja condicionado ao cumprimento de "requisitos ambientais rigorosos para bens agrícolas".11 E isso não é o que está sendo previsto. É verdade que o capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável do acordo UE-Mercosul cita compromissos para a "implementação efetiva” 12 de acordos ambientais multilaterais, incluindo a Convenção sobre Diversidade Biológica e o acordo de Paris. No entanto, estas disposições não são efetivamente aplicáveis porque esse capítulo está excluído do mecanismo de resolução de controvérsias do acordo comercial. Esta falha tem consequências práticas. Muito embora esteja cientificamente provado que o cultivo e a importação de soja do Mercosul pela UE estão colocando em risco a biodiversidade e o clima, o acordo não permite que sejam tomadas medidas restritivas comerciais contra a UE ou o Mercosul. Na sua versão atual, o acordo não contém sequer uma possibilidade de rompimento de relações comerciais existentes que sejam prejudiciais ao meio ambiente. Um acordo comercial moderno, contudo, teria de garantir regras claramente definidas para a tão necessária descarbonização da economia. Ele poderia, por exemplo, prever calendários vinculantes para tornar o
Argentina: Impostos de exportação sobre soja
O
s impostos de exportação sobre soja e outros produtos são absolutamente indispensáveis para a Argentina, especialmente na atual situação de aperto do orçamento devido a uma retirada substancial de capital e às negociações conflituosas sobre o alívio da dívida externa argentina.15 Atualmente, as taxas de exportação de soja situam-se nos 33%.16 Em 2019, os impostos de exportação sobre a soja – a uma taxa de 26% na época – lograram ao estado argentino uma receita de cerca de US$ 4,7 bilhões.17 Até 2018, parte das receitas dos impostos de exportação era utilizada diretamente para financiar infraestruturas sociais, como hospitais, escolas ou habitação. Em 2009, o governo de então criou um fundo de solidariedade para as províncias e municípios argentinos (Fondo Federal Solidario), para o qual eram canalizados 30% das receitas fiscais de exportação. Contudo, em 2018, o governo de Mauricio Macri dissolveu este fundo no âmbito das medidas de austeridade.18
Foto: Bruno Kelly / Greenpeace
cultivo de soja e de outras culturas progressivamente mais ecológico ou prever a redução do comércio destes bens. No entanto, nada disso consta nos textos do
A expansão dos campos de soja brasileiros significa destruição extensiva na Amazônia.
14
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
GRÁFICO 6
Exportações do Mercosul para a UE (2018) e cotas adicionais Fonte: Comissão Europeia 2019 / GRAIN 2019
700.000
650.000
600.000
Toneladas
500.000
469.000 392.000
400.000 300.000 200.000 100.000
200.000
180.000 102.000
99.000
100.000 60.000
10.000
0
Carne bovina (fresca/congelada)
Carne de frango
Cana-de-Açúcar
Bioetanol
Exportações do Mercosul → UE
Arroz
Cotas adicionais
acordadas entre a UE e o Mercosul em junho de 2019 estavam no centro do debate público.19 Na sequência deste acordo, a UE concederá ao Mercosul contingentes adicionais de direitos preferenciais para carne, açúcar, arroz e bioetanol. Estima-se que as cotas de carne bovina20 e de frango poderão ter um aumento de 50% comparado com as exportações atuais do Mercosul, e nas cotas do bioetanol esse aumento será de até seis vezes mais (ver gráfico 6). Foto: Marizilda Cruppe EVE / Greenpeace
acordo apresentados até esta data. Pelo contrário, eles contêm cláusulas que ainda estimulam a venda de soja na UE. Por exemplo, em um anexo sobre direitos de exportação existe uma lista longa de produtos para os quais a Argentina se compromete a reduzir os impostos de exportação. Cinco anos após a entrada em vigor do acordo, os impostos de exportação para soja baixarão dos atuais 30 para 18% do valor da mercadoria, e após dez anos para 14%13, tornando a importação de soja pela UE mais barata e permitindo aos criadores europeus comprar a ração rica em proteínas a preços mais baixos. A produção excedente de carne e leite na Europa continuaria a ter um forte apoio.14 Ao mesmo tempo, para a Argentina isto representaria uma grave sangria do orçamento nacional (ver quadro na página 14). O acordo UE-Mercosul também pode indiretamente aumentar ainda mais o consumo de soja. Se os produtores de carne do Mercosul esgotarem as novas cotas de importação de carne bovina e de frango da UE (ver abaixo), as necessidades internas de ração do Mercosul aumentarão, o que, por sua vez, estimulará a produção de soja.
3.2. Cotas agrícolas: Ser humano e natureza sob pressão O acordo previsto irá aumentar os fluxos comerciais transatlânticos de mercadorias por meio da redução dos direitos aduaneiros e da expansão das cotas de importação beneficiadas pelas novas tarifas de importação previstas no acordo. As cotas agrícolas
As fazendas de gado são o maior indutor das perdas florestais.
15
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
GRÁFICO 7
Exportações da UE para o Mercosul (2018) e cotas adicionais
Como as cotas afetam as exportações do Mercosul?
Fonte: Comissão Europeia 2019 / GRAIN 2019
A
35.000
valiar o impacto que as novas cotas de importação terão na produção dos bens agrícolas sujeitos a tarifas preferenciais e no seu comércio transatlântico é uma tarefa marcada por incertezas. Parte das exportações do Mercosul já está hoje sujeita a cotas tarifárias que nem sempre foram integralmente utilizadas no passado, como a cota de carne bovina de alta qualidade (a chamada cota Hilton).21 Essa subutilização ocasional não poderá ser descartada mesmo com a introdução das novas cotas propostas. É possível também que os exportadores passem a utilizar cada vez mais as novas cotas, deixando as existentes frequentemente subutilizadas. Também será possível uma expansão no sentido de, por um lado, esgotar por completo as cotas e, por outro, exportar sob tarifas mais elevadas para além das cotas. Atualmente, por exemplo, os países do Mercosul exportam quase metade de sua carne bovina com as tarifas mais altas fora das cotas existentes.22 Isto é, a carne bovina do Mercosul é tão competitiva que pode até ser vendida com tarifas mais elevadas na UE. Tal cenário – em que os volumes “intracota” são usados e os “extracota” aumentam – é favorecido pela elevada poupança tarifária oferecida pelo acordo. O think tank Bruegel, sediado em Bruxelas, estima que só com as novas cotas de carne bovina os exportadores irão poupar cerca de 430 milhões de euros em direitos aduaneiros. Para a totalidade das novas cotas, a economia poderia chegar a quase 920 milhões de euros.23 Estes rendimentos extras aumentam a margem de lucro da pecuária, o que por sua vez favorece sua expansão nos países do Mercosul. Graças aos lucros extras, as exportações extracota para a UE também se tornarão mais lucrativas.
30.000
30.000
Toneladas
25.000 20.000 15.000 10.000
10.000 5.000
5.000
3.700
2.700 771
0 Queijo
Leite em pó
Exportações UE → Mercosul
Comida para bebês
Cotas adicionais
cedentes para o Mercosul. Esta perspetiva já suscitou protestos do lado dos produtores de leite dos países do bloco sulamericano que temem por seus mercados de venda na região. Os produtores de leite argentinos, por exemplo, exigiram que sua indústria fosse excluída do acordo planejado.24 Efeitos ainda mais substantivos podem ser esperados das cotas agrícolas previstas para o bioetanol e a carne bovina. As condições preferenciais para o etanol, que na América do Sul é produzido principalmente a partir da cana-de-açúcar, consistem em uma cota isenta de direitos de 450.000 toneladas para uso na indústria química e uma cota preferencial de 200.000 toneladas destinadas a biocombustível. Essas cotas devem estimular a expansão do monocultivo de cana-de-açúcar no Mercosul, especialmente no Brasil, o segundo maior produtor e exportador mundial de bioetanol, depois dos EUA. O Ministério da Agricultura brasileiro estima que a área cultivada com cana-de-açúcar poderá aumentar de 9 para 10 milhões de hectares nos próximos dez anos.25 E esta estimativa não leva em consideração a demanda adicional resultante do acordo UE-Mercosul. Em termos de área de terra utilizada, a cana-de-açúcar representa o terceiro cultivo mais importante do Brasil, depois da soja e do milho.26 Embora a concentração da produção de cana-de-açúcar se situe no Sudeste do Brasil, a expansão mais forte está ocorrendo no Centro-Oeste e Nordeste do país, especialmente no Cerrado, cuja biodiversidade é muito rica. Em novembro de 2019, o presidente Jair Bolsonaro abriu caminho para essa expansão, com a revogação do decreto que restringia o cultivo da cana-de-
Em contrapartida, as exportações da UE também se beneficiarão de cotas isentas de direitos aduaneiros cobertos pelo acordo, especialmente para queijo, leite em pó e comidas para bebê. Comparadas com as exportações existentes da UE, estas representam até um aumento considerável: oito vezes para o queijo e treze vezes para o leite em pó (ver gráfico 7). São, portanto, os produtores de leite voltados para a exportação os grandes beneficiados do lado da UE, já que poderiam vender uma parte maior dos seus ex16
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
açúcar na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e em territórios indígenas. O decreto sobre o Zoneamento Agroecológico da Cana-de-Açúcar tinha sido estabelecido em 2009, pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva.27 Os povos indígenas do Brasil são os que mais sofrem com as consequências da revogação do decreto emitido por Bolsonaro (ver quadro ao lado).
Guarani-Kaiowá: Crescente pressão sobre os territórios indígenas
O
s povos indígenas do Brasil, como os Guarani-Kaiowá, no Estado do Mato Grosso do Sul, cujos territórios tradicionais são cada vez mais impactados pela cana-de-açúcar e outros monocultivos, são um grupo que tem seus direitos violados em particular pela expansão da cana-de-açúcar. Por exemplo: o produtor de bioetanol Raízen – uma joint-venture da Shell e da Cosan – comprou cana-de-açúcar que havia sido ilegalmente cultivada em territórios indígenas. Para além disso, os Guarani-Kaiowá sofrem frequentes ataques violentos por parte de empresas privada de segurança e dos funcionários das fazendas, bem como pelas intoxicações pelo uso de agrotóxicos nos cultivos cada vez mais próximos de seus territórios.28 A falta de demarcação das terras indígenas aumenta a insegurança jurídica dos povos originários. Após uma brusca diminuição das demarcações nos últimos anos, é sob o governo do presidente Bolsonaro que ela chega a um impasse total.29 Bolsonaro afirmou repetidas vezes que não autorizaria uma única demarcação a favor de povos indígenas. Pelo contrário, ele pretende reverter e submeter as demarcações já efetuadas a um processo de revisão. Para fazer cumprir sua política, ele nomeou para a direção da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) um ex-delegado da Polícia Federal e apoiador do lobby do agronegócio.30
3.3. Carne bovina: vetor do desmata mento e das mudanças climáticas
Foto: Reinart / MISEREOR
Igualmente problemáticas são as cotas preferenciais para carne bovina, no total de 99.000 toneladas (55.000 toneladas de carne fresca, 44.000 toneladas de carne congelada) previstas a serem concedidas ao Mercosul. Enquanto na UE o aumento na concorrência de preços ameaça, em especial, os criadores de gado que praticam o pastoreio compatível com o bem-estar animal, no Mercosul os rebanhos de gado figuram como perigosos vetores do desmatamento. JBS, Marfrig e Minerva, as maiores produtoras de carne bovina do Brasil e abastecedoras do mercado da UE, não possuem um sistema de controle adequado em suas cadeias produtivas que permita garantir a origem livre de desmatamento do gado que abatem. Muitos de seus fornecedores compram gado que é engordado em áreas desmatadas na Amazônia.31 Imagens de satélite revelam que 70% dos incêndios na Amazônia, que recentemente registraram um grave aumento, ocorreram nas regiões em que se suspeita serem a origem do gado de abate dessas três empresas.32 Em dezembro de 2019, organizações não governamentais, entre elas o Greenpeace Brasil, publicaram uma carta aberta alertando aos investidores a não comprar ações adicionais da JBS e da Marfrig.33 Contudo, o desmatamento por queimada para a exploração de pastagens tem aumentado não só na Amazônia, mas também nas florestas secas da região do Gran Chaco, que se estende ao Brasil, Bolívia, Argentina e Paraguai (ver quadro na página 18). A organização não governamental GRAIN estimou o impacto climático das cotas agrícolas que a UE e o Mercosul acordaram em 2019. De acordo com o relatório, a produção e o comércio dos oito produtos agrícolas para os quais foram acordadas cotas de importação geram atualmente emissões na ordem de 25,5 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano.38 Se os volumes de exportação praticados hoje se mantiverem e as novas cotas agrícolas se esgotarem, serão adicionadas anualmente mais 8,7 milhões de toneladas de CO2 equivalentes. Segundo o GRAIN, a maior parte das emissões adicionais causadas pelo acordo UE-Mercosul é contabilizada pelo aumento
Crianças indígenas do povo Guaraní-Kaiowá em Mato Grosso do Sul exibindo um cartaz de protesto.
17
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
Paraguai: Rebanhos de gado destroem terras indígenas no Gran Chaco
N
Esta região é também a área preferida para a criação de gado. A maior fatia da produção de carne bovina paraguaia é destinada à exportação, quase inteiramente controlada e operada por corporações transnacionais.35 As empresas processadoras de carne estabelecidas no Paraguai estão na expectativa de que um quarto da nova cota de 99.000 toneladas de carne bovina prevista no acordo UE-Mercosul recaia sobre elas.36 Os povos indígenas da região do Chaco estão sendo particularmente afetados pelas queimadas. No Nordeste do Paraguai, muitos dos incêndios estão sendo provocados nas áreas dos Ayoreo, um povo que vive em modo de subsistência. Em seu último relatório, a Coordenação de Direitos Humanos do Paraguai adverte que a destruição das florestas significa uma ameaça direta para a subsistência dos Ayoreo.37
Foto: Martin Katz / Greenpeace
a região do Gran Chaco, numerosas fazendas de gado estão se expandindo em áreas que antes faziam parte da floresta seca. Nesta zona também se registrou um forte aumento dos incêndios florestais no ano passado, muitos deles provocados com o intuito de ganhar terra para a indústria agrícola. Só no Nordeste do Paraguai, mais de 300 mil hectares de floresta de Chaco acabaram devastados pelas chamas.34
Vastas áreas das florestas do Chaco estão sendo destruídas por queimadas.
das importações de carne bovina, que ascendem a 7,1 milhões de toneladas de CO2 equivalentes por ano (ver gráfico 8). Porém, levando-se em conta que a investigação do GRAIN se limita às mercadorias abrangidas pelos acordos de cotas, outros produtos agrícolas importantes estão sendo excluídos da equação dos efeitos climáticos. Por exemplo, as novas cotas de carne bovina, que se dividem em carne fresca e congelada, não consideram os produtos processados, como a carne enlatada.39 Além disso, as enormes importações de soja do Mercosul também estão sendo excluídas do cálculo da GRAIN. Esta omissão deve ser levada em conta, porque o acordo UE-Mercosul pode resultar em um aumento ainda maior do consumo de soja – seja por meio da redução do preço em virtude do abatimento dos impostos de exportação argentinos, seja pelo crescimento da demanda de ração animal no Mercosul caso seus produtores de carne esgotem as novas cotas na UE.
GRÁFICO 8
UE-Mercosul: Emissões adicionais devido a cotas agrícolas (em milhares de toneladas de CO2-equivalentes por ano) Fonte: GRAIN 2019
Outros: 198 Queijo: 365 Etanol: 435
Carne de frango: 561
Carne bovina: 7.146
18
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
de estarem contaminados com agentes patogênicos, de conterem resíduos de agrotóxicos proibidos ou de excederem os limites de resíduos agrotóxicos permitidos.
3.4. Segurança alimentar em risco: sem referência ao Princípio da Precaução O acordo UE-Mercosul também apresenta riscos consideráveis para a segurança alimentar. Por exemplo, o capítulo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (MSF) não faz qualquer referência ao Princípio da Precaução consagrado na legislação da União Europeia, que serve de base de apoio às medidas restritivas de comércio em caso de risco.40 Até esta data só existe uma referência explícita ao Princípio da Precaução, no capítulo sobre Comércio e Desenvolvimento Sustentável, o qual se revela em larga medida ineficaz porque, como abordado anteriormente, este capítulo está excluído do mecanismo de resolução de controvérsias do acordo.41 Além disso, nesse capítulo, a aplicação do princípio está restringida aos riscos ambientais e perigos para a segurança do trabalho. Porém, os riscos típicos para a saúde humana, animal e vegetal abordados pelo capítulo de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias não estão enquadrados no âmbito do capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável. A consequência é que devido a essa falha, a UE e o Mercosul não podem contar com o Princípio da Precaução para preventivamente barrar a importação de produtos que possam gerar algum risco. Isto pode afetar, por exemplo, produtos agrícolas suspeitos
3.5. Agrotóxicos e produtos agrícolas geneticamente modificados: Livre comércio para produtos de alto risco Todos estes riscos são muito reais. Por exemplo, muitos dos agrotóxicos altamente nocivos são utilizados na agricultura dos países do Mercosul, alguns dos quais são proibidos ou não autorizados na UE (ver quadro abaixo). Esses agrotóxicos representam um risco significativo para a saúde, particularmente para as pessoas que os aplicam e trabalham nos campos, e para as comunidades rurais. Terras indígenas e povoados situados à beira de plantações ou campos agrícolas sofrem frequentemente com a contaminação proveniente de pulverizações de agrotóxicos sobre os campos, principalmente efetuadas por via aérea. No Brasil, um dos maiores consumidores mundiais de agroquímicos, milhares de camponeses e trabalhadores rurais das fazendas se envenenam a cada ano por meio do contato direto com agrotóxicos. Assim, entre 2005 e 2015 o Ministério da Saúde do Brasil registrou um total de 84.206 intoxicações por agrotóxicos.42 E existe grande número de casos sub-
Comitê de Direitos Humanos da ONU: Paraguai é responsabilizado por intoxicações com agrotóxicos proibidos
B
em mais da metade das exportações do Paraguai para a UE consiste em grãos de soja e o farelo obtido a partir deles.46 Porém, as sementes plantadas no Paraguai são em sua maioria geneticamente modificadas e, frequentemente, pulverizadas com agrotóxicos, que penetram o solo e chegam a águas subterrâneas, e envenenam os habitantes do entorno das plantações de soja. Em agosto de 2019, o Comitê de Direitos Humanos da ONU aprovou uma resolução responsabilizando o Paraguai pelo grave envenenamento de famílias de pequenos agricultores da região de Canindeyú com agrotóxicos proibidos, em função da pulverização de uma área de soja. Um dos afetados, Rubén Portillo, morreu em 2011 devido ao envenenamento. Como as autoridades locais não tomaram nenhuma medida contra as pulverizações ilegais, os familiares do falecido, que também tinham sido afetados, apre-
sentaram uma queixa no Tribunal Constitucional Paraguaio. Segundo a decisão do tribunal, o estado não cumprira a sua obrigação de proteger a saúde, a integridade e o ambiente.47 Como as autoridades estatais permaneciam inativas, os familiares de Portillo apresentaram queixa ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, em 2013, tendo sido representados pela Coordenação de Direitos Humanos CODEHUPY e a organização não governamental BASE IS. Em sua decisão de agosto de 2019, o Comitê de Direitos Humanos constatou que o Paraguai havia violado o direito à vida das pessoas devido à sua falta de ação contra as operações de pulverização ilegal. Segundo a decisão, o estado tem a obrigação de compensar as vítimas, responsabilizar legalmente os culpados e tomar medidas preventivas para evitar violações semelhantes no futuro.48
19
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
GRÁFICO 9
Brasil: Número de substâncias ativas autorizadas para o tratamento de produtos agrícolas específicos Fonte: Larissa Bombardi 2019
180 160
160 150
140 121
Número
120
120
autorizados no Brasil
116 101
100
100
96
desses, não
85
80 60
autorizados
71
40
na UE
55
47
44 35
30
32
33 25
28
25
16
20
13
11
7
0 Algodão
Soja
Café
Milho
Cítricos
Trigo
Arroz
Maçãs
Cana-deaçúcar
Uvas
Tabaco
Bananas
Produtos agrícolas
notificados porque muitos envenenamentos não são reportados. Estima-se que para cada envenenamento registrado ocorrem mais 50 que não são notificados.43 Em consequência, os números associados às mortes por envenenamento ainda são muito incertos. O jornalista Juca Guimarães analisou as estatísticas do Ministério da Saúde do Brasil e de acordo com o estudo, mais de 7.200 pessoas morreram por envenenamento por agrotóxicos entre 2008 e 2017.44 Em seu último relatório sobre o Impacto da Poluição Ambiental nos Direitos Humanos no Brasil, o relator especial da ONU, Baskut Tuncak, critica a prática comum de grandes proprietários de terras de pulverização aérea sem aviso prévio, de modo que populações vizinhas não tenham condições de se proteger. Assim, escolas, centros comunitários e habitações têm sido repetidamente atingidos pelas pulverizações. Tuncak salienta ainda que em alguns casos usa-se sistematicamente a pulverização para expulsar indígenas de suas terras, como ocorre com os Guarani-Kaiowá.45 Essa prática perigosa também é comum nos países vizinhos do Brasil, o que recentemente resultou em uma notificação ao Paraguai pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU (ver quadro da página 19). Além das intoxicações no campo, resíduos de agrotóxicos são também detectados em alimentos e produtos agrícolas consumidos no Mercosul ou exportados para a UE, tais como cereais, bebidas, frutas, algodão ou tabaco. A geógrafa Larissa Bombardi, da Universidade de São Paulo, apurou em um estudo que das cerca de 500 substâncias ativas de agrotóxicos
Foto: Daniel Beltrá / Greenpeace
autorizadas no Brasil até 2017, 30% eram proibidas ou não autorizadas na UE.49 Por exemplo, das 160 substâncias ativas autorizadas no Brasil para utilização na produção de algodão, 47 foram proibidas na UE. Já para a produção de soja, no Brasil estão autorizadas 150 substâncias ativas, das quais 35 não têm aprovação na UE (ver gráfico 9).
Em países sul-americanos como o Brasil, agrotóxicos perigosos são usados extensivamente.
20
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
Uma das incoerências da política de agrotóxicos da UE, questionável do ponto de vista dos direitos humanos, é que ela não proíbe na UE a produção para exportação de ingredientes ativos de agrotóxicos que na própria UE não são autorizados. Isto é, para fins de exportação empresas como a Bayer ou a BASF estão autorizadas a produzir na Alemanha agrotóxicos que são proibidos ou não aprovados na UE ou na própria Alemanha.50 Essa situação é ainda mais agravada pelo fato de as empresas químicas na UE manterem frequentemente a produção de agrotóxicos que são
proibidos justamente em países que seguem regras de aprovação mais flexíveis do que o bloco europeu ou a Alemanha. Um estudo recente, realizado pelas organizações MISEREOR, Inkota, Fundação Rosa Luxemburgo e outras, revela que tanto a BASF como a Bayer vendem pelo menos 12 ingredientes ativos no Brasil que não estão registrados na UE. Em ambos os casos, seis desses ingredientes ativos são classificados como altamente tóxicos pela Pesticide Action Network PAN (Highly Hazardous Pesticides - HHP). Essas substâncias podem ser cancerígenas, causar danos ao material genético bem como problemas reprodutivos ou prejudicar o meio ambiente (ver gráfico 10). O carbendazim, por exemplo, que é um ingrediente do produto Derosal Plus da Bayer e foi detectado em águas subterrâneas no sul do Brasil, pode danificar a composição genética, a fertilidade e causar má formação fetal.54
Comércio tóxico: A UE e a Alemanha permitem a exportação de agrotóxicos não autorizados em seus territórios
A
Foto: Mitja Kobal / Greenpeace
situação jurídica em relação ao comércio de agrotóxicos na UE é alarmante. O Regulamento (CE) 1107/2009 só permite a colocação de um agrotóxico no mercado da UE se este tiver sido autorizado no Estado-Membro da UE em questão. No entanto, esta regra não se aplica se o agrotóxico se destinar à exportação para um país fora da UE.51 Isso quer dizer que a legislação da UE desconsidera explicitamente a necessidade de proteger as pessoas e a natureza em países terceiros – em benefício dos exportadores de agrotóxicos europeus. Os Estados-Membros da UE poderiam impedir a exportação de agrotóxicos que, apesar de serem produzidos em seus países, não têm aprovação na UE. Recentemente a França fez uso dessa possibilidade. A partir de janeiro de 2022, será aplicada uma nova lei que proíbe a exportação de agrotóxicos para quaisquer países se por motivos de proteção da saúde humana e animal ou do meio ambiente esses produtos não forem autorizados na UE.52 A Alemanha também tem a possibilidade de impor uma proibição de exportação semelhante. A Lei Fitossanitária permite proibir as exportações de determinados agrotóxicos para países fora da UE, por meio de decreto. No entanto, até hoje, o governo alemão nunca fez uso desta opção.53 O objetivo de uma política comercial responsável deve ser o de assegurar que agrotóxicos não autorizados na UE também não sejam exportados para outros países. Tal proibição de exportação teria de se aplicar uniformemente em todos os Estados-Membros da UE.
Muitas substâncias ativas em agrotóxicos nocivas para as abelhas não são aprovadas na UE, mas estão sendo exportadas para a América do Sul.
Uma análise realizada em fevereiro de 2020 pela Public Eye e Unearthed (Greenpeace UK) mostra que a Bayer e a BASF também comercializam produtos químicos altamente tóxicos e particularmente nocivos para as abelhas e outros insetos, os chamados neonicotinoides. O Brasil é, portanto, o principal mercado para o imidacloprido da Bayer – um aniquilador de abelhas cujo uso ao ar livre foi proibido pela UE em 2018. A BASF, por sua vez, também vende dois ingredientes ativos suspeitos de causar mortalidade 21
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
GRÁFICO 10
Critérios PAN para a identificação de pesticidas de alto risco (HHPs) Fonte: PAN (2019), ver nota de rodapé 50
Efeitos negativos a longo prazo devido a exposição crônica → carcinogênico (de acordo com IARC, US EPA ou GHS) → mutagênico → perda de capacidade reprodu tiva/fertilidade
Alta toxicidade aguda → "muito perigoso" ou "altamente perigoso" (de acordo com classe Ia ou Ib da OMS) → "muito tóxico por inalação" (de acordo com o GHS da UE)
Efeitos hormonais
Perigo para serviços ambientais → perigo extremamente elevado para as abelhas (de acordo com EPA)
Elevado impacto ambiental → listado no Anexo A da Convenção de Estocolmo → destruidor da Camada de Ozônio segundo o Protocolo de Montreal → cumpre 2 de 3 critérios: muito persistente, elevada bioacumu lação, altamente tóxico
Reconhecido como causador de efeitos negativos graves e irreversíveis → incluído no anexo II da Convenção de Roterdã
de abelhas no Brasil: o clorfenapir e o fipronil. Esta prática torna-se nitidamente mais preocupante se considerarmos que no ano passado o Brasil sofreu com uma mortandade massiva de abelhas, em que mais de 500 milhões de abelhas morreram em apenas três meses.55 Os ingredientes ativos perigosos que compõem os agrotóxicos estão em diversos produtos comercializados pelas empresas químicas do Mercosul. De acordo com uma análise recente, dos 113 produtos da BASF aprovados no Brasil, 71 são agrotóxicos altamente perigosos e 57 não têm aprovação na UE; dos 123 produtos da Bayer registrados no Brasil, 78 são agrotóxicos altamente perigosos e 36 não têm aprovação na UE (ver anexo).56 Mais da metade dos agrotóxicos vendidos no Brasil são pulverizados em áreas de soja, das quais mais de 90% são plantadas com variedades geneticamente modificadas. De longe o ingrediente ativo mais usado na agricultura brasileira é o herbicida glifosato, amplamente contestado, ao qual as variedades geneticamente modificadas de soja são resistentes. Grande parte das sementes de variedades de soja resistentes a herbicidas utilizadas no Brasil (Roundup Ready e Intacta) é agora vendida pela Bayer após a aquisição da empresa americana Monsanto. Por sua vez, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, da Organização Mundial de Saúde, classificou em 2015 o glifosato como "provavelmente cancerígeno"57 para humanos. Não obstante, a sua aplicação continua sendo permitida tanto na UE como nos países do Mercosul.
Os riscos são ainda maiores considerando que há ainda a questão de resíduos de agrotóxicos nos alimentos, isso tanto para os consumidores brasileiros quanto europeus. Indicador disso é o aumento substancial do uso desses produtos na agricultura e também de novos registros de agrotóxicos no Brasil. Comparado com 2015, os registros de produtos agrotóxicos no Brasil mais do que triplicaram nos últimos três anos (ver gráfico 11). Mesmo sob essa situação alarmante, o acordo UE-Mercosul prevê a redução ou mesmo a eliminação das GRÁFICO 11
Brasil: Autorização de agrotóxicos (número por ano) Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), 2020
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Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
forma generalizada limites de resíduos de agrotóxicos mais rigorosos do que o Brasil. Por exemplo, para soja, trigo e ervilhas os limites brasileiros de resíduos de glifosato são muito mais baixos do que na UE, onde são extremamente elevados. Para o trigo essa discrepância é da ordem de 200 vezes maior e, para as ervilhas, de 1000 vezes (ver gráfico 13). Os consumidores brasileiros podem, portanto, estar sujeitos a maiores riscos para a saúde quando importam trigo ou ervilhas da UE. Entretanto, os limites de resíduos de glifosato na soja são extremamente altos em ambos os lados (Brasil 10 mg/kg, UE 20 mg/kg). Note-se que foi apenas em 1999, sob pressão do lobby agrícola, que a UE aumentou drasticamente o limite para resíduos de glifosato na soja de 0,1 mg/kg para 20 mg/kg – um aumento da ordem de 200 vezes, alinhando-se assim com a Comissão Internacional do Codex Alimentarius, que já tinha subido seu limite para 20 mg/kg dois anos antes. A Comissão do Codex Alimentarius define padrões alimentares, porém, suas decisões são controversas porque muitas vezes se submetem à influência da indústria de alimentos. O Brasil seguiu essa tendência em 2004 e aumentou o limite de glifosato para a soja de 0,2 mg/kg para 10 mg/kg – um aumento da ordem de 50 vezes.59 A Bayer, a BASF e outros fabricantes de agrotóxicos estão exercendo uma enorme pressão sobre a Comissão Europeia para que esta se abstenha de agravar a restrição dos limites de resíduos para produtos agrícolas impor-
GRÁFICO 12
Glifosato e 2,4D: Valores limites para resíduos em 2017 (unidade: mg/kg) Fonte: Comissão Europeia / ANVISA citado por Larissa Bombardi 2019
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Brasil UE
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Cana-deaçúcar
Pera
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Produtos agrícolas
taxas aduaneiras sobre produtos químicos, incluindo os agrotóxicos. O Conselho Europeu da Indústria Química (CEFIC) salienta que o acordo eliminará as tarifas para mais de 90% das exportações de produtos químicos da UE, que até esta data ultrapassavam 18%.58 Face a isto, causa grande preocupação que a redução do preço das importações de agrotóxicos no Mercosul tenha influência direta no aumento ainda maior no uso de venenos agrícolas em detrimento da saúde humana e da natureza.
GRÁFICO 13
Glifosato: Valores limites para resíduos em 2017 (unidade: mg/kg) Fonte: Comissão Europeia / ANVISA citado por Larissa Bombardi 2019
3.6. Níveis de resíduos de agrotóxicos: à mercê de interesses comerciais
20
20
Brasil UE
Existem diferenças significativas entre a UE e o Mercosul no que toca aos níveis máximos permitidos de resíduos de agrotóxicos, como revela uma consulta rápida aos bancos de dados de agrotóxicos da UE e da agência brasileira de vigilância sanitária, a ANVISA. Por exemplo, para diversos produtos a UE impõe limites de permissividade de resíduos dos herbicidas glifosato e 2,4-D mais baixos do que o Brasil. Este é o caso para as culturas de café, cana-de-açúcar e pêra em relação ao glifosato, e o caso das culturas de soja, arroz e milho em relação ao 2,4-D. No caso do café ou da cana-de-açúcar, os limites permitidos para o glifosato no Brasil são até dez vezes maiores do que na UE (ver gráfico 12). Contudo, fazendo-se a comparação com outros produtos agrícolas entende-se que a UE não aplica de
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Produtos agrícolas
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Ervilhas
3. Comércio agrícola: Acesso à terra e às florestas
tados. Pesquisas recentes da organização não governamental Corporate Europe Observatory evidenciam que as empresas são frequentemente bem sucedidas nisso.60
Em última análise, o acordo UE-Mercosul também enfraquece o controle alimentar e a capacidade de identificar e retirar do mercado os alimentos de origem animal contaminados quando da sua entrada no mercado. Isto porque o artigo 7 do capítulo MSF prevê uma aceleração das autorizações de exportação para produtos de origem animal. Para tal, o país importador deve abster-se de efetuar controles de importação se o país exportador fornecer "garantias suficientes"63 referentes às suas empresas exportadoras. Além disso, os parceiros comerciais devem concordar em reduzir a frequência dos controles de importação.
3.7. Barreiras à proteção ambiental e do consumidor
Foto: Adobe Stock
O acordo UE-Mercosul também poderá trazer novos entraves a um possível fim da aprovação do glifosato. Na UE, esta substância é autorizada até 15 de dezembro de 2022. Porém, os países do Mercosul poderiam, no futuro, utilizar o acordo comercial para combater a possível expiração da autorização. Ainda antes da última decisão sobre o glifosato em 2017, negociadores argentinos e brasileiros expressaram seus receios de que a UE pudesse voltar a baixar o elevado nível de resíduos permitido caso se concretizasse a expiração da autorização, o que colocaria em risco as exportações de soja para a UE.61 Efetivamente, o capítulo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (MSF) do acordo não oferece proteção suficiente para evitar disputas comerciais na possibilidade do término da autorização do glifosato ou de uma redução do nível de resíduos. O artigo 11 do capítulo MSF estabelece que, para justificar medidas dessa natureza, seria necessário recorrer a normas internacionais ou informações científicas. Na ausência de ambas, as medidas restritivas do comércio só podem ser tomadas em caráter transitório.62 A falha decisiva, porém, é que o Princípio da Precaução como justificativa para o fim do glifosato ou o agravamento dos limites de agrotóxicos ou medidas similares está faltando nesse capítulo. Devido a essa ausência, os países do Mercosul poderiam responder com sanções comerciais caso os limites na UE fossem reduzidos. Com vista aos perigos provenientes do uso crescente de agrotóxicos para os seres humanos e a natureza, um acordo comercial moderno teria também de incluir regulamentos bem diferentes para fazer face a este problema. Uma possibilidade seria, por exemplo, estabelecer uma janela temporal para a eliminação gradual do uso de agrotóxicos altamente nocivos, ao mesmo tempo que se introduziria uma redução dos limites para resíduos de agrotóxicos tanto no mercado interno como no de exportação. O parceiro comercial economicamente mais forte – neste caso a UE – teria de apoiar financeiramente as conversões necessárias nos processos de produção. Por último, mas não menos importante, por razões de coerência da política de desenvolvimento a nível da UE, seria necessária uma proibição da produção e exportação de agrotóxicos que não são autorizados na UE. O princípio orientador da política comercial da UE deveria ser o objetivo de uma agricultura sem agrotóxicos.
Um escândalo a respeito da proteção do consumidor, envolvendo fiscais de matadouros e políticos subornados – incluindo o chefe de governo – não só abalou o Brasil em 2017, como também fez colapsar as exportações de carne bovina para a Europa e os EUA.
Todavia, isso vem favorecer os grandes produtores de carne brasileiros, como a JBS e a BRF, que estão recorrentemente se envolvendo em escândalos alimentares. Em 2017, a Polícia Federal brasileira descobriu que essas empresas tinham misturado carne podre em seus produtos de exportação, subornando os inspetores sanitários a fim de conseguir certificados de higiene. Uma equipe de jornalistas revelou em 2019 que 20% das importações de carne de frango da UE provenientes do Brasil estavam contaminadas com salmonelas e que apenas uma pequena fração dos fornecimentos fora submetida a testes microbiológicos.64 Uma quantidade considerável da carne de frango contaminada passou a fronteira sem ser detetada. Se no futuro os controles previstos pelo acordo UE-Mercosul abrandarem ainda mais, também o risco para os consumidores se acentuará. 24
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
4. Comércio de matérias-primas: Acesso a minérios e energia
N
o que toca ao comércio de matérias-primas, os textos das negociações disponíveis até esta data também revelam consideráveis riscos ecológicos e de direitos humanos. As regulamentações previstas neste setor não só salvaguardarão as relações comerciais problemáticas, como ainda as acentuarão através da expansão dos fluxos de mercadorias. Os textos das negociações divulgados até então não deixam dúvidas sobre os interesses das empresas europeias: por um lado, assegurar o aprovisionamento da UE e, por outro, expandir as oportunidades de investimento das empresas europeias no setor das matérias-primas do Mercosul.
GRÁFICO 15
Importações de matérias-primas da Argentina pela UE 2010-2014 (porcentagem da importação total) Fonte: Comissão Europeia 2017
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0 Minério de ferro
Manganês
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Cobre
Cobre
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A Comissão Europeia tem investigado, desde há algum tempo, o abastecimento da UE em matérias-primas provenientes de países terceiros. O seu último relatório divulgado a este respeito evidencia que os produtos importados do Brasil, em particular, representam uma fatia significativa das importações totais da UE desses minerais.65 Por exemplo, 57% das importações de caulim e 48% das importações de minério de ferro são exclusivamente provenientes do Brasil (ver gráfico 14). De grande importância para a UE são também as importações de manganês, selênio, bauxita e cobre vindas deste país sul-americano. A Argentina também fornece produtos minerais em quantidades significativas, incluindo prata, cobre e enxofre (ver gráfico 15). Em termos de volume e importância econômica, porém, as exportações brasileiras de matérias-primas para a UE são as mais significativas. Uma visão geral dos dez bens mais importantes em termos de valor, que o Brasil exporta para a UE, ilustra o papel importante das commodities minerais e energéticas, em relação aos produtos agrícolas (ver gráfico 16). Com um valor superior a três bilhões de euros, o minério de ferro é a matéria-prima mais importante das exportações brasileiras para a UE. Outros bens significativos são o petróleo, o cobre, o ferro-gusa e o
Fonte: Comissão Europeia 2017
Caulino
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Importações de matérias-primas do Brasil pela UE 2010-2014 (porcentagem da importação total)
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GRÁFICO 14
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Para a UE, países do Mercosul, e em particular o Brasil e a Argentina, já são hoje importantes fornecedores de matérias-primas minerais e energéticas. No total, os produtos minerais e os combustíveis fósseis representam cerca de 20% das importações da UE dessa região. Alguns dos produtos são vitais para a indústria da UE.
30
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4.1. Mercosul: Fornecedor de importantes minérios
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Magnésio
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4. Comércio de matérias-primas: Acesso a minérios e energia
GRÁFICO 16
ouro. Para o minério de ferro e o petróleo bruto já são aplicadas tarifas aduaneiras nulas na UE, assim como para o cobre e o ferro bruto. Em contraste, outras matérias-primas como a bauxita e bens processados estão sujeitas a direitos de importação, que o acordo comercial poderia eliminar.66 Porém, o objetivo particularmente importante para a UE é evitar eventuais restrições à exportação pelos países do Mercosul no que toca às matérias-primas demandadas pela indústria da UE, especialmente aos produtos essenciais como o minério de ferro.
Top 10: Importações do Brasil pela UE em 2018 (porcentagem da importação total) Fonte: Eurostat. Novembro 2019
4.2. Os desastres do minério de ferro: Violação do dever de diligência Ao mesmo tempo, o minério de ferro acarreta algumas das maiores destruições ambientais e violações dos direitos humanos no Brasil. Os cientistas assumem que cerca de 10% do desmatamento na Amazônia se deve à mineração, citando especialmente a mina de Carajás, no estado do Pará – a maior mina de minério de ferro do mundo.67 A Alemanha é uma das grandes corresponsáveis por essa destruição. Isso porque o minério de ferro essencial para a produção de ferro-gusa e aço na Alemanha é importado em sua totalidade, sendo que mais da metade vem do Brasil.68 No início dos anos 80, a Alemanha e a Comunidade Europeia concederam empréstimos no valor de várias centenas de milhões de euros para o desenvolvimento da Mina de Carajás, garantindo assim à indústria alemã o acesso ao minério
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Minério de ferro
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Ração
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Celulose
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Petróleo
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Café
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Sementes oleaginosas
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Sucos de fruta
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Ferro-gusa
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Ouro
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em bilhões €
Foto: Daniel Beltra / Greenpeace
de ferro brasileiro a preços mais baixos. Os principais destinatários do aço produzido com minério de ferro amazônico são a indústria automotiva, de máquinas e construção civil.69 No entanto, não é apenas a exploração de minério de ferro que destrói a floresta tropical, mas também sua fundição para a produção de ferro-gusa. Isso porque as siderúrgicas brasileiras utilizam, na produção de gusa e aço, grandes quantidades de carvão vegetal, o
As minas de minério de ferro no Brasil são sinônimo de destruição ambiental e condições desumanas de trabalho.
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2,5
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Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
qual, por sua vez, provém de florestas virgens ou de plantações de madeira cultivadas em terras desmatadas, como as plantações de eucalipto que estão se expandindo rapidamente no Brasil e nos outros países do Mercosul.70 A Alemanha e a UE importam não só o minério de ferro, mas também o ferro-gusa produzido com carvão vegetal. Trinta por cento das importações alemãs de ferro-gusa provêm apenas do Brasil.71 As indústrias siderúrgica, automotiva e de máquinas alemãs estão, portanto, de diversas maneiras envolvidas na destruição das florestas nativas brasileiras. Mais ainda, as importações europeias de minério de ferro acarretam algumas das mais graves violações de direitos humanos, fazendo das empresas da UE corresponsáveis ao longo de suas cadeias de abastecimento. Um exemplo particularmente devastador é
o desastre de Brumadinho no estado de Minas Gerais (ver quadro abaixo). Embora as empresas tenham violado seu dever de diligência no desastre de Brumadinho, assim como em outros casos, o acordo UE-Mercosul não contém regras vinculantes sobre responsabilidade corporativa. Efetivamente, o capítulo sobre Comércio e Desenvolvimento Sustentável contém o Artigo 11º sobre "gestão responsável das cadeias de abastecimento", mas todo o capítulo peca por falta de aplicabilidade por não prever nenhum procedimento para a resolução de controvérsias. Além do mais, o artigo apenas obriga os parceiros comerciais a apoiar a aplicação e divulgação das diretrizes internacionais sobre responsabilidade corporativa das Nações Unidas (ONU), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização Internacional do Trabalho
Um desastre anunciado: A ruptura da barragem de Brumadinho
E
Por último, mas não menos importante, a Vale fornece seu minério de ferro para a UE, além de outros países. Entre seus clientes figuram várias siderurgias alemãs, incluindo as da Thyssenkrupp. E como agravante, Brumadinho não é um caso isolado. Já em 2015, ocorreu uma ruptura de barragem semelhante em Minas Gerais na mina de minério de ferro Samarco, detida pela Vale e BHP-Billiton. Naquela época, 19 pessoas morreram e milhares de pescadores perderam o seu sustento devido à contaminação do Rio Doce. O minério de ferro da Samarco também tinha seus compradores na UE e na Alemanha.73 O tratamento legal da catástrofe de Brumadinho está ocorrendo não apenas no Brasil, mas agora também na Alemanha. Em outubro de 2019, a MISEREOR e a organização de direitos humanos ECCHR, juntamente com cinco familiares de vítimas, apresentaram queixa contra a TÜV Süd e um dos seus funcionários no Ministério Público em Munique.74, que já deu início a um processo preliminar contra a empresa.75
Foto: Vinícius Mendonça Ibama / Wikimedia
m Brumadinho, uma mina de ferro operada pelo grupo mineiro brasileiro Vale é sinônimo de um dos maiores desastres do país. Em 25 de janeiro de 2019, a barragem de uma bacia de retenção se rompeu causando uma enorme onda de rejeitos que inundou a região. A enchente tóxica matou 272 pessoas, destruiu uma vila e contaminou o rio Paraopeba. Nesse drama várias ligações conduzem à Alemanha. A barragem foi construída em 1976 por uma subsidiária brasileira do grupo Thyssen. Décadas mais tarde, em setembro de 2019, a empresa alemã de auditoria técnica TÜV Süd certificou a estabilidade da barragem, não obstante ela apresentar consideráveis defeitos. O Deutsche Bank, por sua vez, detém ações da Vale e concedeu empréstimos ao Grupo.72
Vigília para as vítimas da catástrofe de Brumadinho, que causou 272 mortos.
27
4. Comércio de matérias-primas: Acesso a minérios e energia
(OIT), assumindo que sejam signatários das mesmas.76 No entanto, estes instrumentos não são legalmente vinculantes. Ainda segundo o Artigo 11º, os parceiros comerciais deverão incentivar a adoção voluntária de medidas para a responsabilidade corporativa por parte das empresas – uma cláusula igualmente fraca, tendo em conta o fracasso das abordagens voluntárias de governança corporativa.
Enquanto o acordo UE-Mercosul, por um lado, apenas contém cláusulas não vinculantes no que concerne a responsabilidade corporativa, por outro consagra regras vinculantes que garantem e barateiam o fornecimento de matérias-primas às empresas transnacionais. Esse efeito manifesta-se, por exemplo, nas limitações rigorosas às restrições à exportação. Por várias vezes no passado, os países do Mercosul tiveram que recorrer a tais medidas, seja na forma de licenças temporárias de exportação, impostos de exportação, cotas de exportação ou preços mínimos de exportação. Assim, por exemplo, a Argentina restringiu as exportações de cobalto, lítio, cobre e minério de ferro e o Brasil, as exportações de magnésio, entre outras.77 Mesmo para a política atual, estas medidas são indispensáveis, especialmente para gerar receitas públicas em caso de apertos de orçamento. Em setembro de 2018, durante a crise econômica argentina, o então presidente Mauricio Macri decidiu introduzir uma taxa de emergência fixa de 12% às exportações, com sobretaxas adicionais para matérias-primas não processadas. As empresas mineradoras que operam no país protestaram imediatamente, projetando perdas de um bilhão de dólares por ano.78 Mais significativos ainda para as receitas estatais argentinas são os atuais impostos sobre as exportações de soja (ver acima). No Brasil, os congressistas estão atualmente discutindo um retorno aos impostos de exportação sobre matérias-primas minerais e agrícolas; esses tinham sido abolidos em 1996. Um projeto de lei de outubro de 2017 propunha uma taxa de exportação de 30% para matérias-primas minerais.79 Uma proposta recente sugeria um imposto de exportação de 13% sobre matérias-primas minerais e agrícolas e produtos semi-acabados, resultando em advertências imediatas por parte da indústria.80 Todavia, tais medidas restritivas para as exportações estarão em risco se o acordo UE-Mercosul entrar em vigor. Para garantir que o fornecimento destas
Madeira, na região do Pará no Brasil: O apetite gigante da Europa por matérias-primas.
matérias-primas para a indústria na UE se mantenha a preços baixos, o acordo prevê a proibição geral de qualquer tipo de impostos e taxas sobre as exportações. O artigo 8º do capítulo sobre comércio de mercadorias estabelece que, três anos após a entrada em vigor do acordo, nenhuma das partes introduzirá ou manterá essas tarifas de exportação, a menos que sejam reservadas exceções num catálogo específico de compromissos.81 No âmbito da lista de compromissos publicada pelo Mercosul, até agora apenas a Argentina se reservou o direito de cobrar impostos de exportação para uma lista mais ampla de produtos. Contudo, estes terão obrigatoriamente de ser congelados ou reduzidos (para alguns produtos para 14%, para outros para 5% do valor das mercadorias). O Uruguai aparece nessa lista até agora apenas com um grupo de produtos, enquanto o Brasil e o Paraguai não estão sequer listados.82 A reintrodução de impostos de exportação, que está atualmente sendo discutida no Brasil, constituiria uma violação do acordo UE-Mercosul. Outros riscos sociais e ambientais podem estar também implícitos nos regulamentos previstos sobre investimentos e compras governamentais. No entanto, atualmente uma avaliação qualificada não é possível devido à falta de transparência no processo de negociação. Isto porque para ambos os capítulos do acordo que tratam os investimentos e compras governamentais faltam os anexos fundamentais, que integram as listas de compromissos setoriais.83 Só aí ficaria visível em que medida os investimentos em mineração e a licitação de direitos minerários seriam liberalizados. 28
F0to: Marizilda Cruppe / Greenpeace
4.3. Restrições às taxas de exportação: As matérias-primas devem perma necer baratas
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
5. Instrumentos insuficientes para a proteção ambiental e dos direitos humanos
N
os países do Mercosul, a produção de matérias-primas agrícolas e minerais, destinada à exportação, é frequentemente acompanhada por conflitos extremamente violentos. Conflitos fundiários, a que estão expostos os pequenos agricultores e os povos indígenas, têm repetidamente representado um fardo pesado.
medo crescente do movimento sem-terra perante as medidas repressivas e à opinião generalizada de que o atual governo não atenderá, em caso algum, à exigência de uma reforma agrária.85 A CPT constata e documenta igualmente a impunidade desenfreada que continua reinando no país. Entre 1985 e 2019, um total de 1.973 pessoas foram mortas em conflitos rurais. No entanto, em 1.376 desses casos, falta até esta data a condenação dos responsáveis por esses atos.86 A situação dos povos indígenas é particularmente dramática. O CIMI (Conselho Indigenista Missionário) registra um aumento acentuado de invasão ilegal em territórios indígenas no Brasil, seja para fins de apropriação de terra ou extração de matéria-prima. Madeireiros, garimpeiros e fazendeiros penetram cada vez mais nos territórios indígenas, em atitude criminosa, desencadeando numerosos conflitos violentos. É especialmente alarmante o aumento considerável do número de invasões sob o governo de Bolsonaro, que se constata desde o início de 2019. Só nos primeiros meses do ano, o CIMI registrou 160 invasões – um número muito superior ao dos anos anteriores e três vezes maior do que o verificado em 2015 (ver gráfico 18). O governo Bolsonaro não apenas paralisou completamente a demarcação de áreas indígenas, como também pretende assegurar legalmente a liberação dessas áreas para a mineração e o agronegócio. Em início de fevereiro de 2020, o presidente brasileiro enviou para o Congresso o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que, entre outras coisas, pretende legalizar a exploração e extração de minerais, petróleo e gás e a construção de hidrelétricas em terras indígenas. O PL já desencadeou protestos dos povos indígenas, que se uniram na rede de organizações indígenas APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).87 Uma análise do PL 191/2020 revela que a lei prejudicaria não só os direitos garantidos das comunidades indígenas, mas também a proteção ambiental. Entre outras coisas, prevê permitir o cultivo
5.1. Ausência de instrumentos para a proteção do direito à terra No Brasil, por exemplo, a CPT (Comissão Pastoral da Terra) tem registrado um aumento acentuado de conflitos pela água e pela terra (ver gráfico 17). Nos últimos dez anos, o número de conflitos por terra quase duplicou e por água mais do que quadruplicou. O aumento dos conflitos foi particularmente marcante em 2019, desde a posse do presidente Jair Bolsonaro.84 Ao mesmo tempo o número de ocupações de terras por movimentos sociais diminuiu significativamente. A CPT atribui isso, entre outras coisas, a um GRÁFICO 17
Brasil: Crescentes conflitos por terra e água Fonte: Aladi 2020
1.400 1.200 1.000 800 600 400 200 0 2010
2011
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2014
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Conflitos por terra Conflitos por água Ocupação de terras 29
5. Instrumentos insuficientes para a proteção ambiental e os direitos humanos
de plantas geneticamente modificadas em zonas de reservas naturais. Particularmente flagrante, porém, é a violação da Convenção 169 da OIT sobre direitos indígenas, da qual o Brasil é signatário. Estes e outros instrumentos da ONU estipulam que qualquer uso de territórios indígenas requer o livre consentimento prévio e informado das comunidades afetadas – mais precisamente a partir do momento em que novas medidas legais ou administrativas tornem esse uso possível. Por esta razão, o PL 191/2020 já deveria ter sido objeto de consulta aos representantes indígenas, algo que não foi feito.88 Até esta data, o acordo UE-Mercosul não prevê quaisquer medidas eficazes para punir as inúmeras violações dos direitos humanos em conflitos fundiários. O Artigo 8º do capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável apenas inclui um compromisso das partes em promover o envolvimento das comunidades locais e dos povos indígenas nas cadeias de fornecimento de produtos florestais. As pessoas afetadas devem dar seu "consentimento informado prévio" para esse envolvimento.89 No entanto, esta não é mais que uma versão completamente distorcida do conceito da ONU sobre Consentimento Livre, Prévio e Informado, o qual exige o consentimento dos povos indígenas para qualquer tipo de utilização de seus territórios, e não meramente sua participação na exploração de seus próprios recursos.
GRÁFICO 18
Brasil: Invasões ilegais de territórios indígenas Fonte: CIMI, Relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil, 2019: primeiros 9 meses
180 160
160
Número de invasões
140 120
109 96
100 84
80 62
60 40
53 43
42
59
36
33
20 0 2009 2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
madeira e de minerais ilegais, não existe ainda um quadro legal para a aplicação da responsabilidade corporativa pelos Estados-Membros. Tal legislação europeia deveria exigir das empresas a elaboração de planos de diligência passíveis de verificação pública. Em casos de infração que tenham contribuído para danos previsíveis e evitáveis, a legislação teria que prever sanções e responsabilidade civil para as empresas. E ainda, no caso de pessoas afetadas fora da Europa, deveriam ser removidos os entraves ao acesso à justiça nos Estados-Membros da UE.91 Neste contexto, o Parlamento alemão tem-se pronunciado igualmente a favor de uma legislação comum à UE. Em 14 de novembro de 2019, apelou ao governo alemão no sentido de este, "no âmbito da Presidência Alemã do Conselho em 2020, defender, a nível europeu, uma regulamentação uniforme, intersetorial e vinculante para a concepção do dever de diligência corporativa."92 O governo alemão já tinha anunciado uma tal iniciativa a nível nacional e da UE no acordo de coligação caso as empresas alemãs não implementassem voluntariamente suas obrigações de diligência até 2020. Atualmente, porém, esses planos estão sendo bloqueados pelo Ministério Federal da Economia e pela Chancelaria Federal, muito embora, segundo um estudo encomendado pelo governo federal, apenas 18% das empresas alemãs com mais de 500 funcionários cumpram suas obrigações de diligência.93 Enquanto a UE e seus Estados-Membros não obrigarem suas empresas a adotar a diligência devida relacionada aos direitos humanos e meio ambiente, o favorecimento unilateral dos interesses corporativos
5.2. Cadeia de suprimentos: inexistência do dever de diligência Esta lacuna vem somar-se às deficiências do capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável já mencionadas: a exclusão do mecanismo de resolução de controvérsias, a limitação do Princípio da Precaução aos riscos ambientais e de segurança no trabalho bem como a falta de regras vinculantes no que refere à responsabilidade corporativa ao longo das cadeias de fornecimento. Assim, o acordo UE-Mercosul revela nitidamente as lacunas flagrantes na regulamentação das empresas operando em nível transnacional. Na Europa, por exemplo, também faltam leis que obriguem as empresas a observar o dever de diligência ambiental e de direitos humanos ao longo de suas cadeias de abastecimento. Na UE, apenas a França dispõe hoje de uma lei abrangente sobre a cadeia de abastecimento (Loi de Vigilance), enquanto o governo alemão está adiando sua introdução, à espera dos resultados de pesquisas em andamento junto a empresas.90 Mesmo a nível da UE, para além de regulamentos setoriais muito restritos no âmbito do comércio de 30
2018
2019
Foto: Florian Kopp / MISEREOR
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
Olhando para um futuro incerto: Membros da comunidade indígena de Campito em Caaguazu, Paraguai.
irá levar sistematicamente ao enfraquecimento desses direitos e da proteção ambiental. A mesma situação se verificaria no acordo UE-Mercosul. Outro problema é que a UE continua a rejeitar um acordo internacional vinculante sobre empresas e direitos humanos a nível da ONU como o que está sendo atualmente negociado por um grupo de trabalho no âmbito do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Tal acordo obrigaria os países do Mercosul a proteger melhor os direitos humanos contra as violações cometidas por empresas e poderia, além disso, estabelecer uma primazia dos direitos humanos sobre a lei de comércio e investimento no âmbito do direito internacional.94 Até agora, a Comissão Europeia nem sequer se propôs a pedir aos Estados-Membros um mandato de negociação. Estes, por sua vez, se escondem detrás da UE e não participam nas negociações do grupo de trabalho do Conselho de Direitos Humanos da ONU, embora, como estados soberanos, não necessitem de permissão da UE para fazê-lo. Porém, houve alguns sinais de esperança de que algo estaria acontecendo no âmbito da UE, depois de um anúncio do Comissário da Justiça da UE, Didier Reynders, em 29 de abril de 2020. Por ocasião da apresentação de um novo estudo da Comissão Europeia, que sublinha a necessidade de regras vinculantes para as empresas, Reynders anunciou para 2021 um projeto de lei para as cadeias de abastecimento a nível europeu. Esta lei deve obrigar as empresas a respeitar os direitos humanos e as normas ambientais nas suas cadeias de valor e prever sanções legais, bem como a possibilidade para as pessoas afetadas de proceder
a ações legais. Reynders comentou a Iniciativa Lei das Cadeias de Abastecimento (Initiative Lieferkettengesetz), que na Alemanha defende a exigência de regulamentos vinculantes ao longo das cadeias de abastecimento, com as palavras: "Regulamentação sem sanções não é regulamentação".95 Resta saber se ele terá o apoio necessário do governo federal alemão, dos outros Estados-Membros e do Parlamento Europeu.96
5.3 Cláusula de direitos humanos: permanecerá fraca? Esta deficiência é sublinhada pelo fato de as partes do acordo até agora divulgadas não conterem sequer a habitual cláusula de direitos humanos. Preocupada em demonstrar responsabilidade internacional, a UE inclui tais cláusulas em seus acordos comerciais ou em tratados-quadro aos quais os acordos fazem referência. Atualmente, as relações UE-Mercosul estão sendo regidas por um acordo-quadro inter-regional, que entrou em vigor em 1999 e contém a cláusula habitual relativa aos direitos humanos. O artigo 1º desse acordo estabelece que "o respeito pelos princípios democráticos e pelos direitos humanos" constitui um "elemento essencial do presente acordo".97 De acordo com o mandato de negociação de 1999, tal cláusula também teria de estar consagrada no acordo de Associação UE-Mercosul.98 No entanto, como a UE ainda não publicou muitas partes do acordo de Associação, não é possível analisar se a cláusula de direitos humanos prevista eliminaria 31
5. Instrumentos insuficientes para a proteção ambiental e os direitos humanos
os pontos fracos já detectados neste instrumento. Fundamentalmente, esta cláusula permite a suspensão das preferências comerciais em caso de violação dos direitos humanos. Todavia, os obstáculos para a sua ativação são tão elevados que até hoje ela só foi aplicada em 24 casos, na sua maioria casos de violações democráticas graves, como golpes de estado. Muitas outras violações dos direitos humanos permaneceram além do alcance da UE. Na maioria dos casos, as medidas tomadas limitavam-se a consultas.99 Acresce ainda que a cláusula dos direitos humanos não permite que sejam tomadas medidas para proteger os direitos humanos se estas violarem disposições dos acordos comerciais. Se, por exemplo, as cotas agrícolas pactuadas no acordo UE-Mercosul agravarem conflitos fundiários, estas preferências não poderão, apesar disso, ser suspensas. A ausência de órgãos de monitoramento e recurso no âmbito destas cláusulas são outra lacuna a apontar.100
ser evitados através da intensificação dos métodos de produção.102 Além disso, o relatório alega que apenas 40% das terras do Mercosul estariam sendo utilizadas para a agricultura, havendo, portanto, "muito espaço para a expansão da frente agrícola".103 No entanto, na realidade, o desmatamento, o deslocamento e a intensificação da agricultura acontecem em paralelo, não obstante as áreas naturais restantes desempenharem um papel central na preservação da biodiversidade e do clima. Designá-las como reservas livremente disponíveis para valorização econômica é simplesmente inaceitável. Também a afirmação do relatório provisório, segundo a qual o acordo só terá “um impacto insignificante”104 nas emissões de dióxido de carbono, é questionável. Na verdade, as investigações sobre os efeitos climáticos na AIS não dão qualquer motivo para tranquilidade. De fato, segundo a AIS, tanto no cenário conservador como no ambicioso, as emissões na UE, no Brasil e na Argentina continuarão a aumentar até 2032 comparado com um cenário de referência. Somente no Uruguai e no Paraguai as emissões poderiam cair ligeiramente. Contudo, devido ao baixo peso desses dois países no contexto mais amplo do acordo, essa redução não seria suficiente para compensar o aumento nos outros países. A conclusão é que, mesmo com base na AIS, o acordo contribui para um aumento das emissões de CO2 e não para a sua redução, conforme seria necessário. Além disso, uma estimativa mais detalhada apuraria, presumivelmente, um crescimento ainda mais acentuado das emissões. Isto porque a AIS, embora mencione todos os gases de efeito estufa, apenas calcula as emissões de dióxido de carbono. Porém, no mix de gases de efeito estufa dos países do Mercosul, o dióxido de carbono tem um peso menor do que na UE, onde representa cerca de 80%. Nos países do Mercosul, o metano e o óxido nitroso, que são produzidos principalmente na agricultura, têm peso maior na equação.105 A AIS também não examina as emissões provenientes de alterações no uso da terra e do desmatamento que, devido ao crescimento do desmatamento na Amazônia, também aumentarão. Estas deficiências metodológicas têm sido criticadas por organizações não governamentais.106 No quadro da metodologia adotada, nem sequer será viável superar as deficiências centrais da avaliação de impacto. Ela se baseia essencialmente na avaliação de possíveis mudanças nos fluxos comerciais que poderiam ser induzidas pelo acordo. No entanto, a superação do precário status quo das relações comerciais, como observado em numerosas crises ecológicas e de direitos humanos, está além do âmbito de uma avaliação oficial do impacto.
5.4. Avaliação oficial de impacto: tão tarde, tão deficiente Finalmente, também a Avaliação do Impacto de Sustentabilidade (AIS) oficial demonstra ser uma ferramenta inadequada para estimar e mitigar os riscos do acordo. A Comissão Europeia exige a Avaliação do Impacto de Sustentabilidade (AIS) como cláusula obrigatória de suas negociações comerciais. Essa Avaliação informa os negociadores sobre possíveis riscos e faz recomendações a este respeito. Porém, quando a Comissão Europeia anunciou o acordo Político em Princípio em suas negociações com o Mercosul, no final de junho de 2019, nem sequer estava disponível o relatório provisório da Avaliação de Impacto do acordo. Com efeito, o relatório provisório do AIS foi publicado como rascunho apenas em outubro de 2019 e como versão final em fevereiro de 2020 – demasiado tarde para influenciar as negociações. Como agravante, no relatório provisório publicado em fevereiro de 2020, continuam faltando as recomendações e, mais ainda, um resumo das suas principais conclusões. Na verdade, as recomendações políticas e possíveis ações corretivas só serão elaboradas no relatório final, cuja data de publicação ainda se desconhece.101 Para piorar o quadro, as conclusões do relatório provisório, na sua versão atual, praticamente não têm qualquer utilidade, face à falta de dados empíricos suficientes. Assim, a breve seção sobre os direitos das comunidades indígenas limita-se a especular sobre possíveis impactos negativos, derivados da exploração de novas terras agrícolas, que poderiam 32
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
6. O acordo UE-Mercosul em discussão
D
esde que foi anunciado o acordo em princípio entre a UE e o Mercosul, as críticas ao acordo planejado não têm cessado, ao passo que têm aumentado as análises críticas a ele.107 Não é certo, portanto, de que efetivamente vai entrar em vigor. Atualmente os resultados das negociações estão sendo submetidos a uma revisão jurídica e em seguida serão traduzidos para todas as línguas da UE. Só então terão lugar a assinatura e o início do processo de ratificação. O processo das negociações tem-se caracterizado por uma grande falta de transparência. Até agora, a Comissão Europeia não publicou senão algumas partes do acordo comercial, mantendo o texto integral do acordo de Associação guardado a sete chaves. Portanto, para uma avaliação do acordo estão faltando partes relevantes, como, por exemplo, a cláusula dos direitos humanos ou as listas concretas de compromissos referentes aos capítulos sobre comércio de bens, investimentos e concursos públicos. Aliás, até esta data nem o mandato de negociação dado à Comissão pelo Conselho em 1999 foi oficialmente publicado. Só no ano passado é que apareceu uma versão francesa do mandato.108 Esta informação é relevante para o continuidade do procedimento. Porque se se mantiver a intenção de que o acordo comercial seja parte integrante de um acordo de associação mais abrangente, o Conselho da UE, o Parlamento Europeu e os 27 Estados-Membros da UE terão de dar sua aprovação. No entanto, a parte particularmente controversa – o acordo comercial – poderia entrar em vigor provisoriamente, logo após a ratificação pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu. O Conselho, porém, será o primeiro obstáculo. Isto porque o parágrafo 8 do artigo 218º do Tratado da UE estipula que a deliberação do Conselho seja por unanimidade quando se trata de adotar um acordo de Associação.109 Basta, portanto, o veto de um dos Estados-Membros para impedir a ratificação (a abstenção não seria suficiente para impedir a ratificação).110 Face à resposta inadequada do governo brasileiro às queimadas na Amazônia, o governo francês declarou repetidamente que não assinaria o acordo em tais circunstâncias.111
Quanto aos outros países, também não há certezas sobre sua aprovação no Conselho da UE. Numa votação não vinculante em julho de 2019, o parlamento irlandês pediu ao governo que votasse contra o acordo.112 Na Áustria, o Conselho Nacional aprovou, em setembro de 2019, uma moção obrigando o governo de então a vetar o acordo UE-Mercosul.113 A atual coligação governamental austríaca do ÖVP com os Verdes também rejeita o acordo na sua versão atual.114 O parlamento da Valônia, um dos três parlamentos regionais da Bélgica, votou unanimemente contra a adoção do acordo em fevereiro de 2020.115 Em consequência da rejeição da Valônia, o governo central belga também ficará impedido de aprovar o acordo no Conselho da UE. O governo alemão, por sua vez, mantém-se irredutível por sua aprovação, embora tenha tido de admitir que o capítulo da sustentabilidade não permitiria quaisquer sanções em caso de violação.116 Para a sociedade civil, por sua vez, isto significa que as contradições entre os governos da União Europeia favorecem as hipóteses de travar o acordo. A isso se soma a crescente preocupação da opinião pública quanto ao agravamento da crise climática, tornando cada vez mais difícil defender politicamente a adoção de um acordo comercial que não prevê nenhuma medida eficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e que, ao contrário, até mesmo contribuiria para seu aumento. A deterioração da situação dos direitos humanos no Brasil sob o governo Bolsonaro pressiona ainda mais a legitimidade da UE em aprovar o acordo.
33
1 – Kapitelname
7. Conclusões e recomendações
A
‣ Com o reconhecimento da falta de sustentabilidade
análise das relações comerciais UE-Mercosul mostra que uma questão central em qualquer avaliação de relação comercial precisa ser sua inaceitabilidade em termos ecológicos e de direitos humanos. As abordagens convencionais já não são apropriadas para avaliar acordos comerciais nos dias de hoje: não basta simplesmente avaliar as implicações dos fluxos adicionais de mercadorias que poderiam resultar do acordo UE-Mercosul. Um acordo comercial moderno deve ter a capacidade de contribuir de forma comprovada para a superação das relações comerciais que colocam em risco a humanidade e a natureza. Mais concretamente, ele deve ajudar a tornar produção e comércio mais ecológicos e a identificar e prevenir violações de direitos humanos ao longo das cadeias de valor. Baseado neste critério de avaliação, não há atualmente qualquer justificativa para concluir e ratificar o acordo UE-Mercosul. Os instrumentos de sustentabilidade previstos, conforme os documentos publicados até esta data – seja o capítulo de sustentabilidade, a cláusula de direitos humanos planejada ou a avaliação de impacto oficial – são demasiado incipientes para desencadear as reformas necessárias. Além disso, faltam os pré-requisitos legais para uma aplicação efetiva do dever de diligência em termos ambientais e de direitos humanos nas cadeias de valor internacionais. Enquanto a UE não adotar uma legislação sobre direitos humanos e diligência ambiental, faltará uma base fundamental para a regulamentação de seu comércio externo. Isto porque as empresas que operam as relações comerciais podem explorar essa brecha regulatória para evitar atender mínimos padrões sociais e ecológicos. Nesse contexto, o acordo UE-Mercosul, tal como está previsto, é mais um exemplo que evidencia a grande urgência de uma reforma fundamental da política comercial da UE e outras áreas. Por esta razão, são apresentados a seguir, como contribuição ao debate, alguns elementos essenciais para uma tal reforma.
das relações comerciais da UE, perde-se a legitimidade do instrumento privilegiado da política comercial da UE: a negociação de acordos de livre comércio abrangentes que perpetuam e agravam o status quo ao invés de buscarem uma transformação socioambiental sustentável.
‣ O primeiro passo de uma reforma necessária seria
rever as relações comerciais existentes. Em quais países a crescente troca de bens, investimentos e serviços aumenta os riscos para seres humanos e a natureza? Quais as regras comerciais que ameaçam a necessária transformação socioecológica na UE e nos países parceiros? Que regras comerciais alternativas são necessárias para impulsionar tal transformação?
‣ Até mesmo a análise das relações comerciais existentes precisa ser um processo participativo, com envolvimento da sociedade civil e dos parlamentos da UE assim como dos respetivos países parceiros.
‣ Em seguida, é necessário proceder à discussão, igual-
mente inclusiva, dos instrumentos mais adequados para a transformação das relações comerciais identificadas como particularmente precárias. Entenda-se por instrumentos os requisitos legais capazes de impor relações comerciais social e ambientalmente responsáveis, incluindo as legislações de cadeias de suprimento. Ao selecionar os instrumentos adequados, acordos setoriais com objetivos verificáveis de sustentabilidade devem ter prioridade sobre os acordos comerciais abrangentes.
‣ Necessária é também a adoção de salvaguardas
para produtos particularmente prejudiciais à conservação das florestas (as chamadas "commodities de risco florestal", como a soja, a carne bovina ou o minério de ferro). Em outubro de 2019, nove organizações não governamentais apelaram à UE para que adotasse uma regulamentação exigindo das empresas o cumprimento de seus deveres de diligência em prol da proteção das florestas, ao longo de toda a cadeia de suprimentos desses produtos de alto risco.117
‣ É necessário alcançar um consenso fundamental: de que as relações comerciais que a UE mantém com muitos países não são sustentáveis, dado que sua manutenção implica um elevado risco de mudanças ameaçadoras do clima da Terra e de um desrespeito constante a direitos humanos fundamentais.
‣ A decisão, pelas partes, de iniciar ou não negociações de acordos comerciais mais abrangentes, só pode ser
34
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
tomada após a execução de avaliações participativas de impacto social, ambiental e de direitos humanos. Os mandatos de negociação devem refletir os resultados das avaliações de impactos. Eles devem definir as prioridades estabelecidas em relação aos direitos humanos e à proteção ambiental nos acordos a serem negociados.
direitos humanos nos acordos comerciais da UE pode servir de base de orientação.118
‣ Os capítulos referentes à sustentabilidade têm que
ser equiparados às outras partes dos acordos comerciais e dotados de opções de sanção. Será necessário também complementá-los com regras vinculantes sobre responsabilidade corporativa. Estes capítulos também têm de dispor de mecanismos de monitoramento e contestação por parte da sociedade civil, dotados de meios financeiros adequados. Além disso, as regras de sustentabilidade socioambiental devem estar consagradas com força vinculante em todos os outros capítulos dos acordos comerciais.
‣ Pré-requisitos para dar início às negociações co-
merciais devem ser a ratificação e implementação verificável de acordos ambientais multilaterais (incluindo o acordo de Paris sobre Mudanças Climáticas), acordos internacionais de direitos humanos, assim como convenções referentes às normas trabalhistas fundamentais da OIT e aos direitos dos povos indígenas.
‣ Para complementar, a Alemanha, a Áustria e os
outros Estados-Membros da UE deverão adotar leis sobre a cadeia de abastecimento, cujos requisitos legais foram elaborados pela "Initiative Lieferkettengesetz" (Iniciativa Lei da Cadeia de Abastecimento), apoiada na Alemanha por mais de 80 organizações da sociedade civil.119 A UE poderia elaborar o quadro legal para tal legislação. Seguindo o modelo francês, o objeto destas leis deve incluir a proibição da produção e a exportação de agrotóxicos proibidos na UE ou nos Estados-Membros.
‣ Os acordos comerciais devem ser dotados de cláu-
sulas de direitos humanos mais eficazes, devendo estas ser complementadas por órgãos de controle e de recurso operacionais. Além do mais, deve haver a possibilidade de suspender as preferências em caso de infrações. Também deve existir uma cláusula de revisão que permita alterar um acordo após a sua entrada em vigor. A cláusula-modelo elaborada por Lorand Bartels para consagrar a proteção dos
Anexo TABELA 1
Agrotóxicos (produtos comerciais) registrados no Brasil pela Bayer e pela BASF (2020) Fonte: Ulrike Bickel: Pestizidzulassungen in Brasilien (& Argentinien), fevereiro 2020, manuscrito não publicado
Empresa
Número total de produtos comerciais
Agrotóxicos altamente nocivos de acordo com a lista PAN 3/2019
Proibido/não autorizado na UE
Na Lista crítica de agrotóxicos do Greenpeace (2016)
BASF
113
71
57
17
Bayer*
124
78
37
80
* Os dados da Bayer incluem também os da Monsanto-Brasil. 24 dos 124 agrotóxicos da Bayer são da Monsanto-Brasil e todos os 24 pertencem ao grupo de elevada toxicidade.
Fontes: 2ª Coluna: https://www.agrolink.com.br/agrolinkfito/produto/lista/ (1 919 produits commerciaux au total) 3ª Coluna:https://pan-germany.org/download/giftige-exporte-ausfuhr-hochgefaehrlicher pestizide-von-deutschland-in-die-welt/ 4ª Coluna:https://ec.europa.eu/food/plant/pesticides/eu-pesticides-database/public/ ?event=activesubstance.selectionanguage=EN 5ª Coluna:https://www.greenpeace.de/sites/www.greenpeace.de/files/publications/ 20160727_schwarze_liste_pestizide_greenpeace_final.pdf
35
Notas 1
Sylvain Weber et al.: CO2 embedded in trade: trends and fossil fuel drivers, CESifo Working Papers, março 2019: https://www.cesifo.org/en/publikationen/2019/ working-paper/co2-embedded-trade-trends-and-fossilfuel-drivers
2
Comissão Europeia: UE e Mercosul chegam a acordo sobre o comércio, 28 de junho de 2019: https://ec. europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/ IP_19_3396
3
Nesse contexto, veja-se, por exemplo, as publicações da UE que destacam as oportunidades para as exportações europeias: Comissão Europeia: Handelsabkommen EU-Mercosur: Eine Fülle von Chancen für die Menschen in Deutschland, Bruxelas, junho de 2019: https://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2019/september/ tradoc_158340.pdf
4
Comissão Europeia: Novo acordo comercial UE-Mercosul. O acordo de princípio. Bruxelas,1 de julho de 2019. http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2019/july/tradoc_158250.pdf
5
Comissão Europeia: The EU-Mercosur trade agreement – Opening up a wealth of opportunities for people in Germany, junho 2019. Disponível em https://trade. ec.europa.eu/doclib/html/158313.htm
6
A,a.O.
7
Harald von Witzke/Steffen Noleppa/Inga Zhirkova: Fleisch frisst Land. Ed.: WWF Alemanha, Berlim 2014: https://www.wwf.de/fileadmin/fm-wwf/PublikationenPDF/WWF_Fleischkonsum_web.pdf
8
IDH/IUCN-NL: European Soy Monitor – Insights on the European supply chain and the use of responsible and deforestation-free soy in 2017, 2019: https:// www.idhsustainabletrade.com/uploaded/2019/04/ European-Soy-Monitor.pdf
9
MAPA: Projeções do Agronegócio, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Brasília: 2019: http://www.agricultura.gov.br/assuntos/ politica-agricola/todas-publicacoes-de-politica-agricola/ projecoes-do-agronegocio/projecoes-do-agronegocio2018-2019-2028-2029-preliminar/
15 Karin Strohecker/Tom Arnold: Argentina creditors refuse to tango on debt restructuring proposal, Reuters, 20.4.2020: https://www.reuters.com/article/usargentina-debtrenegotiation-creditors/argentinacreditors-refuse-to-tango-on-debt-restructuringproposal-idUSKBN2221GL 16 Andrés Lobato: El Gobierno buscará recaudar más de USD500 millones con la suba de retenciones a la soja, BAE Negocios, 26.2.2020: https://www.baenegocios. com/economia/El-Gobierno-buscara-recaudar-masde-USD500-millones-con-la-suba-de-retenciones-a-lasoja-20200226-0082.html 17 El Cronista: Con el aumento de retenciones, Alberto busca asegurarse u$s 2000 millones extra, 25.11.2019: https://www.cronista.com/economiapolitica/Conel-aumento-de-retenciones-Alberto-busca-asegurarseus-2000-millones-extra-20191125-0062.html 18 I-Profesional: El Gobierno oficializó la eliminación del fondo sojero: éste es el impacto provincia por provincia, 15.8.2018: https://www.iprofesional. com/economia/275833-fondo-de-sustentabilidadsolidario-ajuste-fondos-El-Gobierno-oficializo-laeliminacion-del-fondo-sojero-este-es-el-impactoprovincia-por-provincia 19 Comissão Europeia: Novo acordo comercial UEMercosul. O acordo de princípio, Bruxelas, 1 de julho de 2019: http://trade.ec.europa.eu/doclib/docs/2019/ july/tradoc_158250.pdf 20 Os valores das exportações de carne bovina existentes referem-se apenas a carne fresca e congelada; a UE propõe agora dois novos grupos com condições preferenciais, totalizando 99.000 toneladas (55.000 toneladas de carne fresca e 44.000 toneladas de carne congelada). Se considerarmos ainda outros produtos de carne bovina (como carne enlatada, por exempo), os volumes de exportação do Mercosul para a UE serão ainda superiores às 200.000 toneladas previstas para 2018. A Comissão Europeia estima que o total de importações de carne de bovina do Mercosul para 2018 foi de 269.000 toneladas. Disponível em: Comissão Europeia: Beaf&VealMarket Situation – Beef CMO, 19 de março de 2020, pág. 37: https://ec.europa.eu/info/sites/ info/files/food-farming-fisheries/farming/documents/ beef-veal-market-situation_en.pdf
10 Marco Follador et al.: Assessing the impacts of the EU bioeconomy on third countries – Potential environmental impacts in Brazil of EU biofuel demand to 2030, European Union. Joint Research Centre, Luxemburgo:2019.: https://ec.europa.eu/jrc/en/ publication/eur-scientific-and-technical-researchreports/assessing-impacts-eu-bioeconomy-thirdcountries
21 Comissão Europeia: Meat Market Observatory – Beef and Veal, 18.12.2019: https://ec.europa.eu/info/sites/ info/files/food-farming-fisheries/farming/documents/ beef-quota_en.pdf 22 Comissão Europeia: Beaf& Veal Market Situation – Beef CMO, 19 de março de 2020, pág. 37: https://ec. europa.eu/info/sites/info/files/food-farming-fisheries/ farming/documents/beef-veal-market-situation_en.pdf
11 Op. cit., página 4. 12 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Trade and Sustainable Development:http://trade.ec.europa.eu/doclib/html/158166. htm
23 Michael Baltensperger/Uri Dadush: The European Union-Mercosur Free Trade Agreement: prospects and risks, Bruegel, Policy Contribution, No 11 de setembro 2019: https://www.bruegel.org/2019/09/the-europeanunion-mercosur-free-trade-agreement-prospects-andrisks/
13 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Annex 2 – Export Duties: http:// trade.ec.europa.eu/doclib/html/158187.htm 14 European Milk Board: Milk producers are critical about Mercosur agreement, 2.7.2019. http://www.europeanmilkboard.org/special-content/news/news-details/ article/milk-producers-are-critical-about-mercosuragreement.html?cHash=a31ad4fd412f1fcc0c21f9 ddd6f11f97
24 Miguel Clariá: Lecheros piden ser excluidos del posible acuerdo con la UE, Cadena 3, 7.6.2019: https://www. cadena3.com/noticia/radioinforme-3/lecheros-pidenser-excluidos-del-posible-acuerdo-con-la-ue_216991
36
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
25 MAPA: Projeções do Agronegócio, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Brasília 2019: http://www.agricultura.gov.br/assuntos/politicaagricola/todas-publicacoes-de-politica-agricola/ projecoes-do-agronegocio/projecoes-do-agronegocio2018-2019-2028-2029-preliminar/
37 Miguel Lovera et al.: Los incendios también queman derechos – Derechos de los pueblos indígenas en aislamiento voluntario, in: CODEPUHY (Hg): Derechos Humanos Paraguay 2019, páginas 87- 94: http://codehupy. org.py/wp-content/uploads/2019/12/DDHH-2019_ SEGUNDA-Edicion-DIGITAL.pdf
26 MAPA: Projeções do Agronegócio, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Brasília 2019: http://www.agricultura.gov.br/assuntos/politicaagricola/todas-publicacoes-de-politica-agricola/ projecoes-do-agronegocio/projecoes-do-agronegocio2018-2019-2028-2029-preliminar/
38 GRAIN: EU-Mercosur trade deal will intensify the climate crisis from agriculture, Report, novembro 2019: https://grain.org/e/6355 39 Ver nota de rodapé 15. 40 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Sanitary and Phytosanitary Measures: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158155.htm
27 Mateus Ferreira/Rikardy Tooge: Governo revoga decreto que colocava limites para a expansão da produção de cana na Amazõnia e no Pantanal, G1, 6.11.2019: https://g1.globo.com/economia/agronegocios/ noticia/2019/11/06/governo-revoga-decreto-quecolocava-limites-para-a-expansao-da-producao-decana-na-amazonia-e-no-pantanal.ghtml
41 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Trade and Sustainable Development: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158166.htm 42 Ministério da Saúde: Relatório Nacional de Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos, Brasília 2018: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ relatorio_nacional_vigilancia_populacoes_expostas_ agrotoxicos.pdf
28 Leandro Barbosa: O calvário das crianças Guarani Kaiowá contaminadas por agrotóxicos, 5 de agosto de 2019: https://cimi.org.br/2019/08/o-calvario-dascriancas-guarani-kaiowa-contaminadas-por-agrotoxicos/ 29 Beatriz Jucá: Governo Bolsonaro manobra para travar a demarcação de terras indígenas no Brasil, El País, 4.2.2020: https://brasil.elpais.com/brasil/2020-02-04/ governo-bolsonaro-manobra-para-travar-a-demarcacaode-terras-indigenas-no-brasil.html
43 Graça Portela/Raíza Tourinho: Morte por agrotóxicos é grave problema de saúde pública, diz Fiocruz, Brasil de Fato, 1.2.2016: https://mst.org.br/2016/02/01/ morte-por-agrotoxicos-e-grave-problema-de-saudepublica-diz-fiocruz/
30 Brasil de Fato: MPF pede que Funai não retroceda na demarcação de terras indígenas no Vale de Ribeira, 26.1.2020: https://www.brasildefato.com. br/2020/01/26/mpf-pede-que-funai-nao-retrocedana-demarcacao-de-terras-indigenas-no-vale-do-ribeira
44 Juca Guimarães: Mais de 70% das mortes por agrotóxicos ocorrem nas regiões Sudeste e Nordeste, Brasil de Fato, 22.8.2019: https://www.brasildefato.com. br/2019/08/22/mais-de-70-das-mortes-por-agrotoxicosocorrem-nas-regioes-sudeste-e-nordeste
31 Dom Phillips: Meat company faces heat over ‚cattle laundering‘ in Amazon supply chain, The Guardian, 20.2.2020: https://www.theguardian.com/environment/2020/feb/20/meat-company-faces-heat-overcattle-laundering-in-amazon-supply-chain?CMP= share_btn_link
45 Baskut Tuncak: End-of-visit statement by the United Nations Special Rapporteur on human rights and hazardous substances and wastes, Baskut Tuncak, on his visit to Brazil, 2 to 13 December 2019, June 2019, OHCHR: https://www.ohchr.org/EN/AboutUs/Pages/WhoWeAre. aspx
32 Alexandra Heal et al.: Revealed fires three times more common in Amazon beef farming zones, The Guardian, 10.12.2019: https://www.theguardian.com/environment/ 2019/dec/10/revealed-fires-three-times-more-commonin-amazon-beef-farming-zones
46 Comissão Europeia: Agri-Food Trade Statistical Factsheet: European Union – Paraguay, 17.3.2020: https://ec.europa.eu/info/sites/info/ files/food-farming-fisheries/farming/documents/ agrifood-paraguay_en.pdf
33 Dom Phillips: Don‘t invest in Brazilian meat, warn deforestation campaigners, The Guardian, 11.12.2019: https://www.theguardian.com/environment/ 2019/dec/11/dont-invest-in-brazilian-meat-warndeforestation-campaigners
47 Philipp Mimkes: UN-Menschenrechtsausschuss macht Paraguay für Einsatz verbotener Pestizide verantwortlich, FIAN Deutschland, 28/8/2019: https://www.fian.de/artikelansicht/2019-08-28-unmenschenrechtsausschuss-macht-paraguay-fuereinsatz-verbotener-pestizide-verantwortlich/
34 EFE: Más de 300.000 hectáreas devastadas por los incendios en Paraguay, según un informe, Asunción, 1.10.2019: https://www.efe.com/efe/america/ sociedad/mas-de-300-000-hectareas-devastadaspor-los-incendios-en-paraguay-segun-un-informe/ 20000013-4076960
48 OHCHR: Paraguay responsible for human rights violations in context of massive agrochemical fumigations, Pressemitteilung, Genebra, 14.8.2019: https:// www.ohchr.org/EN/NewsEvents/Pages/DisplayNews. aspx?NewsID=24890&LangID=E
35 Lis García/Claudia Ávila: Atlas del Agronegocio en Paraguay, BASE IS/Fundación Rosa Luxemburgo, Asunción, dezembro 2019: http://www.baseis.org.py/wp-content/ uploads/2020/03/2019_Dic-ATLAS.pdf
49 Larissa Mies Bombardi: A geography of agrotoxins use in Brazil and its relations to the European Union, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo 2019: http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/ catalog/book/352
36 Ultima Hora: ARP aspira a vender 25.000 toneladas de carne a UE, 18.7.2019: https://www.ultimahora. com/arp-aspira-vender-25000-toneladas-carne-uen2832410.html
50 Susan Haffmans/Lars Neumeister: GiftigeExporte, Ed.: PAN Germany, Hamburgo 2019: https://pangermany.org/download/giftige-exporte-ausfuhrhochgefaehrlicher-pestizide-von-deutschland-in-diewelt/?wpdmdl=1711&ind=1569222587253
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Notas
64 Andrew Wesley et al.: Brazil sent one million salmonella-infected chickens to UK in two years, The Guardian, 3/7/2019: https://www.theguardian.com/ environment/2019/jul/03/brazil-one-million-salmonellainfected-chickens-uk
51 Regulamento (CE) N.° 1107/2009 do ParlamentonEuropeu e do Conselho de 21 de Outubro de 2009 relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado e que revoga as Directivas 79/117/CEE e 91/414/ CEE do Conselho.ABl. L 309 de 24/11/2009, pág. 1–50. https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/ PDF/?uri=CELEX:32009R1107&from=PT
65 Comissão Europeia: Study on the review of the list of Critical Raw Materials. Non-critical Raw Materials Factsheets, Directorate-General for Internal Market, Industry, Entrepreneurship and SMEs, Luxemburgo 2017: https://rmis.jrc.ec.europa.eu/?page=factsheets2017-14c133
52 „LOI n° 2018-938 du 30 octobre 2018 pour l'équilibre des relations commerciales dans le secteur agricole et alimentaire et une alimentation saine, durable et accessible à tous“, também abreviada como lei EGALIM(EGalim: "États généraux de l'alimentation"). https:// www.legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte= JORFTEXT000037547946&categorieLien=id
66 Keith Nuthall/Liz Newmark: ‚Easier access to high-quality materials‘ under new EU-Mercosur deal, Fastmarkets MB, 2/7/2019: https://www.metalbulletin.com/ Article/3882032/Easier-access-to-high-quality-materialsunder-new-EU-Mercosur-trade-deal.html
53 Deutscher Bundestag / Wissenschaftliche Dienste: Ausarbeitung Export nicht zugelassener Pflanzenschutzmittel. Rechtliche Regelungen in Frankreich und Deutschland. Berlin, 2020 Deutscher Bundestag [WD 5 - 3000 - 015/20, Conclusão do trabalho: 03 de março de 2020] https://www.bundestag.de/resource/ blob/689790/5d86d62bff8866bae6864f2d8ea2b977/ WD-5-015-20-pdf-data.pdf
67 Zoe Sullivan: Mining activity causing nearly 10 percent of Amazon deforestation, Mongabay, 2/11/2017: https://news.mongabay.com/2017/11/mining-activitycausing-nearly-10-percent-of-amazon-deforestation/ 68 Bundesanstalt für Geowissenschaften und Rohstoffe: Deutschland – Rohstoffsituation 2018, Hannover, novembro 2019: https://www.bgr.bund.de/DE/Themen/ Min_rohstoffe/Downloads/rohsit-2018.html
54 Sarah Schneider/Benjamin Luig et al.: Gefährliche Pestizide von Bayer und BASF – ein globales Geschäft mit Doppelstandards. Ed: Misereor, Inkota, Agrotóxico Mata, Khanyisa, Rosa-Luxemburg-Stiftung, abril 2020: https://www.inkota.de/fileadmin/user_upload/Presse/ Pressemitteilungen/INKOTA_Broschuere_Pestizide_ Suedafrika_Brasilien_2020.pdf
69 Christian Russau: Abstauben in Brasilien – Deutsche Konzerne im Zwielicht, Hamburgo 2016, pág. 111 e seguintes.: https://www.rosalux.de/fileadmin/ rls_uploads/pdfs/sonst_publikationen/VSA_Russau_ Abstauben_in_Brasilien.pdf
55 Crispin Dowler: Soya, corn and cotton make Brazil world leader for hazardous pesticides, Unearthed, 20/2/2020: https://unearthed.greenpeace.org/2020/02/20/ brazil-pesticides-soya-corn-cotton-hazardous-croplife/
70 Laura J. Sonter et al.: Carbon emissions due to deforestation for the production of charcoal used in Brazil‘s steel industry. In: Nature Climate Change, Vol. 5, abril 2015, pág. 359-363
56 Ulrike Bickel: Pestizidzulassungen europäischer Konzerne in Brasilien (&Argentinien), fevereiro de 2020 (manuscrito não publicado).
71 Bundesanstalt für Geowissenschaften und Rohstoffe: Deutschland – Rohstoffsituation 2018, Hannover, novembro 2019: https://www.bgr.bund.de/DE/Themen/ Min_rohstoffe/Downloads/rohsit-2018.html
57 Daniel Cressey: Widely used herbiced linked to cancer, Nature, 24/3/2015: https://www.nature.com/news/ widely-used-herbicide-linked-to-cancer-1.17181
72 Christian Russau: Ein Jahr nach dem Bruch: Von Anzeigen, Klagen und dem Warten auf Gerechtigkeit, Kooperation Brasilien, 22/1/2020: https://www. kooperation-brasilien.org/de/themen/landkonflikteumwelt/ein-jahr-nach-dem-bruch-von-anzeigenklagen-und-dem-warten-auf-gerechtigkeit
58 CEFIC: Concluding a free trade deal with Mercosur will benefit trade in chemicals between the two regions, Pressemitteilung, 3/7/2020: https://cefic.org/mediacorner/newsroom/concluding-a-free-trade-deal-withmercosur-will-benefit-trade-in-chemicals-betweenthe-two-regions/
73 Susanne Fries: Die Schlammlawine von Brumadinho: Eine Katastrophe mit Ansage, MISEREOR Blog, 19/2/2019: https://blog.misereor.de/2019/02/19/dieschlammlawine-von-brumadinho-eine-katastrophemit-ansage/
59 Thomas Bohn/Marek Cuhra: How ‚extreme levels‘ of roundup in food became the industry norm, Independent Science News, 24/3/2014: https://www. independentsciencenews.org/news/how-extremelevels-of-roundup-in-food-became-the-industry-norm/
74 MISEREOR: MISEREOR begrüßt Ermittlungsverfahren gegen TÜV Süd, comunicado de imprensa, 13/12/2019: https://www.misereor.de/presse/pressemeldungenmisereor/misereor-begruesst-ermittlungsverfahrengegen-tuev-sued
60 Corporate Europe Observatory: Toxic residues through the backdoor – Pesticide corporations and trade partners pressured EU to allow banned substances in imported crops, 16/2/2020: https://corporateeurope.org/ en/2020/02/toxic-residues-through-back-door
75 Caspar Dohmen et al.: Staatsanwälte in Brasilien und Deutschland ermitteln gegen den TÜV Süd, Süddeutsche Zeitung, 15/2/2020: https://www.sueddeutsche. de/wirtschaft/tuev-sued-brasilien-drammbruchermittlung-1.4798212
61 Thomas Fritz: Research on the impacts of the EUMercosur trade negotiations, 1 de dezembro de 2017: https://www.bilaterals.org/?research-on-theimpacts-of-the-eu&lang=en
76 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Trade and Sustainable Development: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158166.htm
62 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Sanitary and Phytosanitary Measures: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158155.htm
77 OECD: Export Restrictions in Raw Materials Trade: Facts, fallacies and better practices, Paris 2014: https://issuu.com/oecd.publishing/docs/oecdexport-restrictions-raw-materi
63 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Sanitary and Phytosanitary Measures: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158155.htm
38
Acordo UE-Mercosul: Ameaça para a proteção do clima e dos direitos humanos
93 Adelphi et al.: Monitoring des Umsetzungsstandes der im Nationalen Aktionsplan Wirtschaft und Menschenrechte 2016–2020 beschriebenen menschenrechtlichen Sorgfaltspflicht von Unternehmen, Zwischenbericht, Erhebungsphase 2019: https://www.auswaertiges-amt. de/blob/2314274/3a52de7f2c6103831ba0c24697b7739c /20200304-nap-2-zwischenrbericht-data.pdf
78 Florencia Lendoiro: Efecto retenciones: mineras estiman pérdida de más de US$ 1000 millones, Apertura, 3/9/2018: https://www.apertura.com/negocios/ Efecto-retenciones-mineras-estiman-perdida-demas-de-us-1000-millones-anuales-20180903-0004. html 79 Istoé: Relatório propõe alíquota de 30% de Imposto de Exportação de minérios, 31/10/2017: https://istoe.com. br/relatorio-propoe-aliquota-de-30-de-imposto-deexportacao-de-minerios/
94 Markus Krajewski 2017: Ensuring the primacy of human rights in trade and investment policies: Model clauses for a UN Treaty on transnational corporations, other businesses and human rights, CIDSE, MISEREOR et al: https://www.cidse.org/wp-content/uploads/2017/03/ CIDSE_Study_Primacy_HR_Trade__Investment_Policies_ March_2017.pdf
80 Wellton Máximo: ICMS sobre exportações pode extinguir até 728 mil empregos, prevê CNI, Agência Brasil, 8/2/2020: http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/ noticia/2020-02/icms-sobre-exportacoes-podeextinguir-ate-728-mil-empregos-preve-cni
95 Initiative Lieferkettengesetz, Pressestatement 30. April 2020: „Eine Regulierung ohne Sanktionen ist keine Regulierung“: EU-Kommissar Reynders kündigt Entwurf für EU-Lieferkettengesetz an: https://lieferkettengesetz. de/presse/
81 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Trade in Goods: http://trade.ec.europa.eu/doclib/html/158144.htm 82 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Annex 2 – Export Duties: http://trade.ec.europa.eu/doclib/html/158187.htm
96 ECCJ: Key features of mandatory human rights due diligence legislation, European Coalition for Corporate Justice, ECCJ Position Paper, junho 2018: https://corporatejustice.org/eccj-position-paper-mhrdd-final_june2018_ 3.pdf
83 Ver os dois capítulos sobre serviços, bem como sobre compras governamentais: Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Trade in Services and Establishment: http://trade.ec.europa. eu/doclib/html/158159.htm, e ainda: Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Government Procurement: http://trade.ec.europa. eu/doclib/html/158160.htm
97 Interregionales Rahmenabkommen über die Zusammenarbeit zwischen der Europäischen Gemeinschaft und ihren Mitgliedstaaten einerseits und dem Mercado Comun del Sur und seinen Teilnehmerstaaten andererseits, Amtsblatt der Europäischen Gemeinschaften, Nr. L 69, 19 de março de 1996
84 CPT: Conflitos no Campo Brasil 2019, Comissão Pastoral da Terra, Goiânia, abril 2020: https://www.cptnacional. org.br/publicacoes-2/destaque/5167-conflitos-nocampo-brasil-2019
98 UE-Mercosur – Directives de Negociation, par la Commission, d’un Accord d’Association entre les Parties. Version consolidée. Bruxelas, 17 de setembro de 1999, Título I: https://www.bilaterals.org/?ue-mercosurdirectives-de&lang=en
85 Op. cit., página 23 86 Op. cit., página 123
99 Ionel Zamfir: Human rights in EU trade agreements – The human rights clause and its application, European Parliamentary Research Service, Briefing, julho de 2019: http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/ BRIE/2019/637975/EPRS_BRI(2019)637975_EN.pdf
87 CIMI: APIB repudia projeto do governo Bolsonaro que libera mineração, hidroelétricas e agronegócio nas terras indígenas, 6/2/2020: https://cimi.org. br/2020/02/apib-repudia-projeto-governo-bolsonarolibera-mineracao-hidreletricas-agronegocio-terrasindigenas/
100 Armin Paasch: „Menschenrechte und Handelspolitik“. Stellungnahme bei der Öffentlichen Anhörung des Ausschusses für Menschenrechte und auswärtige Hilfe des Deutschen Bundestags. Berlim, 30 de setembro de 2015 https://www.bundestag.de/resource/blob/485936/ c55777328aa9c401c2cb66aae130989d/stellungnahme_ paasch-data.pdf
88 Paulo de Bessa Antunes: A proposta do Poder Executivo para exploração de recursos naturais em terras indígenas, GEN Jurídico, 10/2/2020: http://genjuridico.com. br/2020/02/10/exploracao-recursos-terras-indigenas/ 89 Comissão Europeia: Trade part of the EU-Mercosur Association Agreement, Chapter Trade and Sustainable Development: http://trade.ec.europa.eu/doclib/ html/158166.htm
101 LSE Consulting: Sustainability Impact Assessment in Support of the Association Agreement Negotiations between the European Union and Mercosur, Final Interim Report, fevereiro 2020: http://www.eumercosursia. com/uploads/4/0/7/2/40728425/eumercosursia_final_ interim_report_.pdf
90 Initiative Lieferkettengesetz: Rechtsgutachten zur Ausgestaltung eines Lieferkettengesetzes, 2020: https://lieferkettengesetz.de/wp-content/uploads/ 2020/02/Initiative-Lieferkettengesetz_Rechtsgutachten_ final.pdf
102 Op. cit., página 103 103 Op. cit., página 116
91 ECCJ: EU Model Legislation on Corporate Responsibility and to Respect Human Rights and the Environment, European Coalition for Corporate Justice, ECCJ Legal Brief, fevereiro 2020: https://corporatejustice.org/ 2020-legal-brief.pdf
104 Op. cit., página 84 105 Op. cit., página 74 106 Op. cit., página 239 e seguintes e ainda: ClientEarth/Fern/Conservation International: Comments on the draft interim report / Sustainability Impact Assessment (SIA) in Support of the Association Agreement Negotiations between the European Union (EU) and Mercosur: https://www.bilaterals. org/?comments-on-the-draft-interim&lang=en
92 Deutscher Bundestag: Antrag der Fraktion der CDU/ CSU und SPD: Kinder weltweit schützen – Ausbeuterische Kinderarbeit verhindern, 12.11.2019, Drucksache 19/15062: http://dip21.bundestag.de/dip21/ btd/19/150/1915062.pdf
39
Notas
118 Lorand Bartels: Eine menschenrechtliche Modellklausel für die völkerrechtlichen Abkommen der Europäischen Union. Deutsches Institut für Menschenrechte/MISEREOR (ed.). Berlim/Aachen, fevereiro de 2014: http://www.institut-fuer-menschenrechte. de/uploads/tx_commerce/Studie_Menschenrechtliche_ Modellklausel.pdf
107 Luciana Ghiotto/Javier Echaide: Analysis of the agreement between the European Union and the Mercosur, Ed.: Anna Cavazzini (The Greens/EFA)/PowerShift, dezembro 2019: https://power-shift.de/analysis-ofthe-agreement-between-the-european-union-and-themercosur/ 108 UE-Mercosur – Directives de Negociation, par la Commission, d’un Accord d’Association entre les Parties. Version consolidée. Bruxelas, 17de setembro de 1999: https://www.bilaterals.org/?ue-mercosurdirectives-de&lang=en
119 Initiative Lieferkettengesetz: Anforderungen an ein wirksames Lieferkettengesetz, fevereiro de 2020: https://lieferkettengesetz.de/wp-content/ uploads/2020/02/Anforderungen-an-ein-wirksamesLieferkettengesetz_Februar-2020.pdf sowie: Rechtsgutachten zur Ausgestaltung eines Lieferkettengesetzes, fevereiro de 2020: https://lieferkettengesetz.de/wpcontent/uploads/2020/02/Initiative-Lieferkettengesetz_ Rechtsgutachten_final.pdf.
109 Vertrag über die Arbeitsweise der Europäischen Union, Artikel 2018: https://dejure.org/gesetze/AEUV/218.html 110 Nas explicações do Conselho da UE sobre os procedimentos de votação lê-se: "Na votação por unanimidade, a abstenção não impede que seja adotada uma decisão." Disponível emConselho da UE, Sistema de votação, Unanimidade: https://www.consilium.europa.eu/de/ council-eu/voting-system/unanimity/ 111 Benoit Van Overstraeten: France will not sign Mercosur deal under current conditions: minister Borne, Reuters, 8/10/2019: https://www.reuters.com/article/ us-france-mercosur/france-will-not-sign-mercosurdeal-under-current-conditions-minister-borneidUSKBN1WN0LD 112 Eddie Wax: Irish Parliament rejects EU-Mercosur deal in symbolic vote, 11/7/2019: https://www.politico.eu/ article/irish-parliament-rejects-eu-mercosur-deal-insymbolic-vote/ 113 Correspondência parlamentar: SPÖ, FPÖ und JETZT setzen sich im EU-Unterausschuss mit Forderung nach Veto gegen Mercosur-Abkommen durch, 18/9/2019: https://www.parlament.gv.at/PAKT/PR/JAHR_2019/ PK0905/index.shtml 114 Em seu acordo intergovernamental lê-se, resumidamente, "Não ao Mercosul": https://gruene.at/themen/ demokratie-verfassung/regierungsuebereinkommen-tuerkis-gruen/regierungsuebereinkommen.pdf 115 Parlement Wallon: Moção 102 nº 4 (2019-2020), 5/2/2020: MOTION déposée en conclusion de l’interpellation de Monsieur Luperto à Monsieur Di Rupo, Ministre-Président du Gouvernement wallon, sur «le traité entre l’Union européenne et le Mercosur»: http://nautilus.parlement-wallon.be/Archives/2019_ 2020/MOTION/102_4.pdf 116 Anja Krüger: Abkommen von EU und MercosurStaaten: Fehlende Nachhaltigkeit, taz, 21/10/2019: https://taz.de/Abkommen-von-EU-und-MercosurStaaten/!5631890/ 117 Client Earth et al: Protecting forests, natural ecosystems and human rights: a case for EU action. NGO Briefing, outubro de 2019: https://www.fern.org/de/ ressourcen/protecting-forests-natural-ecosystemsand-human-rights-a-case-for-eu-action-2046/. Tais critérios podem ser concebidos de forma a não entrarem em conflito com as regras da Organização Mundial do Comércio. Disponível em Enrico Partiti, Regulating Trade in Forest-Risk Commodities, in: Journal of World Trade, volume 54 (2020), caderno 1, páginas 31-58: http://www.kluwerlawonline.com/abstract. php?area=Journals&id=TRAD2020002
40
MISEREOR e. V. Mozartstraße 9 52064 Aachen, Alemanha www.misereor.de, www.misereor.org
Greenpeace e.V. Hongkongstraße 10 20457 Hamburg, Alemanha www.greenpeace.de Greenpeace Brasil R. Fradique Coutinho, 352 - Pinheiros, São Paulo - SP, Brasil. Cep. 05416-000 www.greenpeace.org/brasil
CIDSE Rue Stévin, 16 1000 Brussels, Belgium www.cidse.org
FASE – Solidariedade e Educação Rua das Palmeiras, 90, Botafogo, cep. 22270-070, Rio de Janeiro, Brasil www.fase.org.br
Dreikönigsaktion Hilfswerk der Katholischen Jungschar Wilhelminenstraße 91/II fA 1160 Wien www.dka.at