A Castanha do Pará na Amazônia: Entre o extrativismo e a domesticação
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A447 Almeida, José Jonas A Castanha do Pará na Amazônia: Entre o extrativismo e a domesticação: José Jonas Almeida. Jundiaí, Paco Editorial: 2016. 396 p. Inclui bibliografia. ISBN: 978-85-462-0675-9 1. Engenharia 2. Agronomia 3. Agricultura 4. Exploração Florestal. I. Almeida, José Jonas
CDD: 620 Índices para catálogo sistemático: Agricultura Plantações e colheitas IMPRESSO NO BRASIL PRINTED IN BRAZIL Foi feito Depósito Legal
Av. Carlos Salles Block, 658 Ed. Altos do Anhangabaú, 2º Andar, Sala 21 Anhangabaú - Jundiaí-SP - 13208-100 11 4521-6315 | 2449-0740 contato@editorialpaco.com.br
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Para a Luciane. Sem ela, esta obra não seria possível. Aos meus pais José e Olívia, com muitas saudades.
Agradecimentos Este livro contou com a ajuda de várias instituições, as quais possibilitaram o acesso a estudos e fontes documentais que foram essenciais para a realização da pesquisa. Devo também vários agradecimentos às pessoas que me atenderam durante as minhas estadas em Belém, Marabá, Manaus e São Paulo. Gostaria de começar pela Embrapa-CPATU de Belém, onde pude trabalhar contando com a preciosa ajuda de José Maria Fernandes, assistente da biblioteca, que me disponibilizou um material fundamental para o tema. Ao engenheiro agrônomo Alfredo Homma, que me recebeu e disponibilizou os seus artigos sobre a trajetória da castanha-do-pará no Sudeste Paraense, imprescindíveis para todos aqueles que estudam o assunto. Uma citação especial a Carlos Hans Müller, um dos maiores especialistas em castanha-do-pará no mundo, que me recebeu em sua casa, em Belém, para várias conversas sobre os aspectos botânicos da castanheira e o longo processo que levou à domesticação da planta. Ainda em Belém, pude mais uma vez, como no meu mestrado, contar com o apoio do professor Fábio Carlos Silva e do Núcleo de Altos Estudos da Amazônia (Naea). Também agradeço a Oderle Milhomem Araújo, responsável pela biblioteca do Banco da Amazônia, que me disponibilizou livros e os exemplares da revista Amazônia: Ciência & Desenvolvimento. Em Marabá, um agradecimento à Fundação Casa de Cultura, na pessoa de Noé Von Atzingen, que me disponibilizou o Arquivo Público Municipal e o precioso acervo de fotos da instituição. Aos memorialistas João Brasil Monteiro e Walter Leitão Sampaio, responsáveis por preservar as lembranças dos tempos áureos da castanha-do-pará naquele município. Em Manaus, cabe uma menção à Embrapa-Amazônia Ocidental, pela atenção com que fui recebido e a valiosa ajuda na consulta ao seu acervo de documentos, relatórios e livros. Deixo os meus cumprimentos ao empresário paulista Sergio Vergueiro e à sua filha, Alice Vergueiro, que me propiciaram a visita
à Fazenda Aruanã, onde se encontra a maior plantação de castanha-do-pará existente no mundo. Um agradecimento ao agrônomo Gabriel Teixeira de Paula Neto, responsável pela Aruanã, que me acompanhou durante a minha estada em Itacoatiara e prestou muitos esclarecimentos sobre a experiência de plantio das castanheiras. Gostaria de lembrar também de Lucila Souto Borges, responsável pelo envio de documentos importantes, disponíveis apenas na Biblioteca do Ministério da Agricultura, em Brasília, entre os quais o relatório sobre a castanha-do-pará de 1952. Agradeço também a atenção de Adriana Marroquin, voluntária responsável pelo setor de Botânica e Horticultura do Smithsonian Libraries de Washington, nos Estados Unidos. A sua colaboração foi importante para que pudéssemos reunir parte dos artigos que permitiram rastrear a trajetória da Bertholletia excelsa na Ásia. Em São Paulo, ao Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) por meio de sua diretora técnica, Ana Maria Godoy, que me possibilitou acesso a um importante material referente à castanha-do-pará e às pesquisas sobre o seu aproveitamento na indústria de alimentos, realizadas no final da década de 1960. Nosso trabalho não contou com a ajuda de nenhum tipo de recurso financeiro, mas em contrapartida, nenhum pedido ou requerimento me foi negado, por isso a todos os que colaboraram os meus mais sinceros agradecimentos. A pesquisa a qual originou esta obra não teria sido possível sem o apoio de minha esposa, Luciane, com a sua paciência em conter a minha enorme ansiedade, sobretudo na fase final do doutorado. A sua presença e dedicação foram imprescindíveis. Ao meu orientador, Benedicto Heloiz Nascimento, que acreditou na possibilidade do tema e colocou-se sempre à disposição para esclarecer e me ajudar a buscar os melhores caminhos para a pesquisa. Aos integrantes da banca de defesa, professores Janes Jorge, Jose Eduardo Marques Mauro, Julio Cesar Zorzenon Costa e Paulo Henrique Martinez pelas preciosas contribuições e críticas. A todos, deixo os meus mais sinceros agradecimentos.
Sumário Prefácio Introdução
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Capítulo 1 A extração da castanha-do-pará como atividade agrária 1. As possibilidades da castanha 27 Capítulo 2 Aspectos botânicos e ecológicos da castanheira-do-pará 1. A castanheira-do-pará na Floresta Amazônica 38 2. Qualidades da castanha como alimento 45 3. Controvérsias na designação 47 Capítulo 3 Breve história da castanha-do-pará e dos seus usos 51 1. Os primórdios da comercialização da castanha 56 2. A castanha na segunda metade do século XIX 66 3. A castanha-do-pará no início do século XX 72 4. A introdução do beneficiamento 84 5. As primeiras usinas de beneficiamento 88 Capítulo 4 A castanha no médio Tocantins paraense 1. Marabá: centro produtor de castanhas 2. O castanhal e o barracão 121 3. O trabalho nos castanhais 125 4. O entrave do transporte 137
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Capítulo 5 O declínio da castanha-do-pará na Amazônia oriental 1. O desmatamento no sudeste do Pará 148 2. O cemitério das castanheiras 160 3. A proposta do polígono dos castanhais 162
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Capítulo 6 A castanha-do-pará no exterior 171 1. Os usos da castanha no mercado norte-americano e inglês 178 2. Entraves para o produto no mercado externo 192 3. Sugestões para a melhoria na qualidade da castanha 205 4. A persistência do problema sanitário e de qualidade 209 Capítulo 7 A domesticação da castanheira e a permanência do extrativismo 213 1. Primeiras tentativas de domesticação da castanheira 220 2. A domesticação da castanheira no Brasil 236 3. As pesquisas no IAN e no Ipean 249 4. As pesquisas com a castanha-do-pará na Embrapa 262 Capítulo 8 Ações e tentativas de aproveitamento da castanha 279 1. Promoção do produto no mercado interno 285 2. Outras perspectivas de aproveitamento 294 3. A Conferência Nacional da Castanha-do-Pará 300 4. A proposta “industrializante” como alternativa para a castanha 306 5. Recomendações da Conferência Nacional da Castanha 315 6. Os estudos do CTPTA 319 Capítulo 9 Novas possibilidades para o produto 323 1. Uma experiência de cultivo racional: a Fazenda Aruanã 328 2. Alternativas para o futuro 338
Considerações finais Referências
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Anexo 1 Produtos exportados pelo Amazonas e pelo Pará: 1880-1891 (em mil réis)
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Anexo 2 Valor dos principais gêneros de exportação do estado do Pará 1900-1911 (em mil réis) Anexo 3 Exportação de castanha-do-pará pelo estado do Pará (em hectolitros)
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Anexo 4 Produção de castanhas da área do Tocantins em relação ao estado do Pará 1911-1940 (em hectolitros) Anexo 5 Unidades da federação com maior produção de castanhas 1920-1950 (em quilogramas)
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Anexo 6 Produção de castanha-do-pará nos estados do Pará, Acre e Amazonas 1984-2003 (em toneladas)
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Anexo 7 Produção de castanhas no Brasil 1984-2003 (em toneladas)
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Anexo 8 Produção de castanhas na microrregião de Marabá e no estado do Pará 1990-2008 (em toneladas) 393
Prefácio Costumo dizer para meus alunos que a escolha do assunto e tema de estudo é muito importante e determinante na qualidade do trabalho que será feito. Nisso o professor Jonas acertou plenamente, colocando muito bem o centro do seu interesse, destacando a luta pela melhora do produto e pela domesticação da castanheira, mostrando aí as qualidades de ótimo pesquisador e escritor de que é dotado. Expôs corretamente caminho difícil e longo da passagem da pura extração da castanha da floresta para o tratamento da noz, ainda com casca. Demorou-se bastante para chegar ao produto descascado e limpo e para finalmente alcançar um estágio mais elevado, quando o cultivo da castanheira foi iniciado, o que permitiu atingir um padrão de maior sanidade, reduzindo a exposição a umidade e assim a possibilidade de contaminação pela aflatoxina, e produzindo uma noz mais limpa, com melhor possibilidade de comercialização. Este é um processo que ainda está ocorrendo, na medida em que o cultivo da planta, até agora, é incipiente e reduzido, o que também acontece com o tratamento mais rigoroso do produto, o que também, até agora, não ocorre de modo generalizado. A pesquisa requereu, além do estudo em textos publicados, viagens à Amazônia, entrevistas com técnicos, produtores e trabalhadores do setor. A exploração da castanha é semelhante àquela da borracha, com coleta na floresta e utilização de mão de obra de modo rudimentar e praticamente sem usar beneficiamento e maiores cuidados com a mercadoria que até hoje é colocada no mercado na forma bruta. Tudo isso mostrando a impossibilidade brasileira de aperfeiçoar e melhorar a produção da noz e assim alargar o mercado externo e interno para esse produto. Incapacidade que tem o aspecto mais geral e que leva a altos custos e à paralisação da ativi13
José Jonas Almeida
dade econômica, que não muda, se estratificando ou congelando. Geralmente, pouco se cuidou de melhorar o processo de armazenamento, de evitar a umidade e de aperfeiçoar o transporte, a fim de impedir a deterioração e a contaminação da semente pelo fungo da aflatoxina, prejudicando a sua capacidade de concorrer no mercado. Também não se tratou com mais intensidade das possibilidades de aproveitamento e usos da castanha na fabricação de produtos alimentícios e cosméticos. Na atividade de pesquisa sobre o cultivo da castanheira e melhora do seu produto não houve nenhuma preocupação de guardar sigilo e garantir patentes das descobertas, não se procurando evitar a livre divulgação das conclusões a que se atingia, acontecendo de pesquisadores chegarem a assessorar possíveis concorrentes do país. Esta é uma situação muito comum em todo o país, com seus habitantes sempre mostrando impossibilitados de se defenderem de intromissões em suas vidas, trabalhos e destino do país. O brasileiro quer tanto parecer simpático que acaba se tornando excessivamente cordial, passivo mesmo, atitude que se constitui num verdadeiro traço cultural do nosso povo e que pode se tornar um ponto fraco frente aos embates na luta pelo desenvolvimento do país, por acabar, em acordos internacionais, por exemplo, nos quais se faz mais concessões do que as devidas ou necessárias. Por outro lado nossa gente costuma mostrar no preparo de certas festas e jogos grande eficiência e capacidade de trabalho que poderiam, também, ser usadas, com grande proveito, em outras atividades, numa espécie de esforço compartilhado e cooperativo como aquele feito num mutirão, por exemplo. Esforço e trabalho que necessitam sempre ter um caráter de maior permanência e profundidade. Benedicto Heloiz Nascimento Professor titular, aposentado, do IEB/USP
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Introdução Os aspectos envolvendo os vários usos da castanha-do-pará são tão antigos quanto o próprio conhecimento que se tem dessa espécie nativa da floresta amazônica. Desde os primórdios da chegada dos europeus à América do Sul, ela é mencionada e descrita nas narrativas de viajantes, religiosos e naturalistas, como também as formas de aproveitamento de suas sementes, as nozes do Brasil, como são conhecidas no mercado internacional. Apreciadas pelo seu sabor, essas amêndoas são muito utilizadas, principalmente no acompanhamento de doces, confeitos e até mesmo na culinária de modo geral. No exterior, a castanha-do-pará ou Brazil nut foi incorporada aos hábitos alimentares representativos de determinadas épocas do ano no Hemisfério Norte, como o “Dia de Ação de Graças”, o “Dia das Bruxas” e as festividades natalinas. Desde meados do século XIX, o público norte-americano lia nos jornais e revistas relatos a respeito de como a castanha era retirada da longínqua floresta tropical e dos perigos envolvendo o extrator ou castanheiro de ser atingido na cabeça pela queda do fruto. De forma geral, o registro desse produto nas fontes documentais antigas coincide com as áreas que, mais tarde, foram apontadas como sendo as de maior concentração das árvores, os famosos castanhais. Há muito tempo conhecida dos índios da região amazônica, que embora não tenham tornado a castanha um item fundamental de seu próprio consumo, dela fizeram uso para complementar a alimentação e também para outras finalidades, as quais foram sendo assimiladas e adaptadas aos usos do colonizador europeu. Poucos produtos da Amazônia foram tão estudados e analisados como a castanha-do-pará, perdendo talvez nesse quesito apenas para a borracha. Desde o início do século XIX, quando foi cienti15