Novo reitor critica professores

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CAMPUS

Ano 38 Edição 330, de 3 a 18 de outubro de 2008

Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação, Universidade de Brasília.

cultura

cidades

http://www.fac.unb.br/campusonline

esporte

Filosofia sai da sala de aula e chega aos consultórios

Mesmo sem tradição no futebol, DF é referência na arbitragem

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Página 9

Página 10

Flávio Silva

Rádios locais ignoram produção musical brasiliense

Novo reitor critica professores José Geraldo afirma ao Campus que vai combater a “hegemonia” dos docentes na universidade. Sem o sistema paritário, Márcio Pimentel ganharia com 56% dos votos Páginas 3 e 5

parênteses

reforma ortográfica


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editorial

Campus - Edição 330 - De 3 a 18 de outubro de 2008

Carta do editor Memória

Registro de mudanças Findada a consulta eleitoral, a contagem de votos e a distribuição de santinhos, percebe-se a veracidade da informação no Campus. Os resultados corresponderam ao que a pesquisa apresentou. Agora que mais um reitor terá a foto na Galeria de Reitores, esperamos mudanças. Aliás, esta edição é feita de experiências novas. Começamos pelos pesos por segmento, que valorizaram o voto do estudante. Como mostra a matéria Participação mediana de alunos, a mobilização ainda não é total, houve até campanha pelo voto nulo. Personagens do futebol brasiliense aparecem de cara nova. Apesar da má fama no esporte, a capital tem os melhores árbitros

-ExpedienteCampus Jornal Laboratório da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília

do país. E a forma de tratar os problemas pessoais trocou o divã dos psicólogos pela Filosofia Clínica. O suplemento Parênteses traz as alterações que a nova reforma ortográfica provocará na língua portuguesa. Não é só conseqüência que perde o trema, mas editoras, revisores, alfabetizadores, escritores e o nosso próprio vocabulário são atingidos. As mudanças são várias e não acabam. Uma nova gestão promete diálogo igual a todos os segmentos, e os estudanes mostram como influenciam nos resultados. Nós, alunos do Campus, registramos tudo isso, pois é com mudanças que acabamos com a rotina. Marina de Sá, editora-chefe

Editora-chefe Marina de Sá Secretária de Redação Ana Luisa Soares Diretor de Arte Max Melo

Com a manchete “A aventura de reconstruir a UnB”, a edição n° 77 do Campus da segunda quinzena de 1985 apresentou uma entrevista com o então novo reitor, Cristóvam Buarque. Intitulando-se o “reitor da democracia”, Buarque enfrentaria desafios: lutar pela melhoria do salário dos professores, repensar a criação científica e ainda criar um debate franco e honesto com a comunidade.

Editores Caroline Aguiar (Parênteses) Yvna Sousa (Universidade) Felipe Néri (Cidades) Fernanda Ros (Esporte e Cultura) Gabriela Abreu (Opinião) Fernanda Patrocínio (Botafora) Flávio Silva (Fotografia) Fotógrafos Francisco Brasileiro, Mariana Curi, Flávio Silva Repórteres Amanda Sales, Ana Rita Cunha, Bruno Lacerda, Camila Cortopassi, Cristiano Zaia, Daniela Martins, Gisele Novais, Luanne Batista, Max Melo, Nathália Mendes Diagramação Alex Lima, Fernanda Patrocínio, Flávio Silva, Gabriela Abreu, Max Melo, Nádia Medeiros

Ombudsman*

Projeto Gráfico Amanda Sales, Ana Luisa Soares, Flávio Silva, Marina de Sá

Pesquisa incômoda A 329ª edição do Campus gerou polêmica na UnB. O motivo foi a publicação da pesquisa de intenção de votos para reitor realizada em parceria com as empresas juniores Strategos e Estat. Apesar de ter acertado o resultado do 1º turno da consulta, considerando-se a margem de erro, a pesquisa provocou descontentamento em candidatos e eleitores. O candidato Michelângelo Trigueiro afirmou que a pesquisa foi um desservi-

ço à comunidade. Trigueiro enviou e-mail à redação do Campus exigindo a publicação, como direito de resposta, de uma sondagem realizada em uma comunidade do Orkut. A mensagem, replicada no Campus Online, informa: “faço isso em apreço à verdade e com o intuito da defesa ética e da democracia em nossa instituição”. Para a editora da última edição, responsável pela publicação da pesquisa, Nathália Mendes, “se a mesma pesquisa, utilizando os

Erramos mesmos mecanismos, fosse conduzida por uma grande empresa, me pergunto se seria tão questionada.” Num momento eleitoral, a mídia pode interferir no resultado e, dessa maneira, precisa ter cuidado com a publicação dos dados. Por isso é tão importante que os alunos do Campus utilizem a disciplina como espaço de experimentação e responsabilidade social. Jairo Faria é aluno do 7º semestre de Jornalismo

*A missão do Ombudsman é criticar o jornal com a participação dos leitores. Envie sua crítica para campus@unb.br.

Diferentemente do que informou a reportagem “Mais semelhantes que diferentes”, publicada na página 4 da última edição, o candidato José Geraldo era apoiado pelo Reconstruindo o Cotidiano. O grupo Nada Será Como Antes não declarou apoio a candidato algum. Casa Brasil é um projeto do Governo Federal e não do GDF, como publicado na matéria “Medidas Provisórias”.

Ilustradores Henrique Eira, Iúri Lopes, Mariana Capelo, Sharmaine Caixeta, Teo Horta Professores Responsáveis Márcia Marques, Rosa Pecorelli e Solano Nascimento Técnico de Fotografia Luiz Gustavo Prado Secretário da Redação José Luiz Silva Endereço Campus Darcy Ribeiro Faculdade de Comunicação ICC Ala Norte Caixa Postal: 04660 CEP: 70910-900 Contato (61) 3307.2464 - campus@unb.br Tiragem 4 mil exemplares


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Campus - Edição 330 - De 3 a 18 de outubro de 2008

Com paridade, a história é outra Ana Rita Cunha Nathália Mendes Com a adoção da paridade nas últimas eleições, o apoio dos estudantes foi decisivo para a vitória de José Geraldo, com 51,61% dos votos. Se a consulta mantivesse o antigo sistema de pesos diferenciados (70% para professores, 15% para alunos e 15% para servidores), quem assumiria o cargo seria o candidato derrotado, Márcio Pimentel. Ele venceria com 56% dos votos válidos, enquanto José Geraldo somaria apenas 44%. O novo reitor foi escolhido por 5.646 alunos e 792 servidores, enquanto Pimentel conquistou apenas 2.406 votos do corpo discente e 666 dos funcionários. Entre os professores, o movimento foi inverso: 465 optaram por José Geraldo e 661 votaram em Márcio Pimentel. Como os docentes possuíam peso maior no sistema antigo, a diferença de apenas 196 votos garantiria a vitória de Pimentel. Apesar de também terem preferido José Geraldo, os servidores não deram ao novo reitor uma diferença de votos que, sozinha, fosse suficiente para anular a vantagem obtida por Pimentel entre os professores. Assim, a vitória do eleito saiu mesmo da cota dos estudantes. “Eu fui eleito pelo segmento majoritário que optou pela ruptura e entro de uma maneira a me sentir completamente legitimado, inclusive pelo voto dos docentes”, afirma José Geraldo. Ainda que, na paridade, cada uma das três categorias tenha um peso de 33,33%, o potencial individual dos votos varia por causa da diferença entre o número de alunos, professores e servidores. Nas eleições deste ano, a desi-

gualdade entre a força dos votos de professores e estudantes foi suavizada. Sem a paridade, um voto de professor correspondia ao voto de 33 alunos; com ela, a proporção ficou de um para 16. Mesmo derrotado pela paridade, Márcio Pimentel não reclama do sistema. “Quando me inscrevi para concorrer às eleições, sabia que elas seriam paritárias. A paridade é uma realidade. Não adianta lamentar os resultados”, analisa. Ele não acha que a vitória que obteve entre os professores significará dificuldades para José Geraldo. “Somos todos adultos e não vamos levar disputas eleitorais para a administração da reitoria”, afirma. Flávio Botelho, presidente da Associação de Docentes da Universidade de Brasília (AdUnB), concorda com Pimentel, mas lembra que o sistema de pesos iguais não teve o endosso formal dos professores. “A paridade foi votada sem apoio da maioria dos representantes dos professores no Consuni [Conselho Universitário]”, assinala. O órgão, que segue o sistema 70-15-15 na representação dos três segmentos, é responsável por formular a lista tríplice que será encaminhada para o Ministério da Educação e Cultura (MEC). Posteriormente, o presidente da República nomeará o reitor. Além dos nomes de José Geraldo e Pimentel, a lista incluirá o de Volnei Garrafa, o terceiro colocado no primeiro turno das eleições. É tradição o presidente nomear o primeiro da lista.

Diferença maior ainda Da forma como foi implementado, o sistema paritário não correspondeu às primeiras propostas de paridade na UnB. Uma comissão designada para propor as regras das eleições ao Consuni sugeriu que o peso de cada seg-

Flávio Silva

Apoio de estudantes a José Geraldo garante sua escolha como próximo reitor. Sem o peso igual dos segmentos, Márcio Pimentel ganharia com 56% dos votos

mento fosse, invariavelmente, de um terço. No entanto, na paridade adotada nestas eleições, apesar de o um terço funcionar na teoria, na prática o cálculo final leva em conta a relação entre o número de pessoas aptas a votar em cada segmento e o total dos que efetivamente votaram. Ou seja, quanto menor a participação de um segmento, menor o peso dele na consulta. “O sistema atual só permite a paridade real caso todos os eleitores votem”, esclarece Fábio Félix. “É muito mais difícil para os representantes de alunos, que têm de mobilizar quase 25 mil pessoas”, argumenta. Se a paridade total tivesse sido aceita conforme o modelo proposto, haveria uma diferença ligeiramente maior entre os candidatos. José Geraldo teria conquistado 54% dos votos, contra 46% de Pimentel.

A participação de alunos como Luísa Corrêa, 1º semestre de Economia, decidiu a eleição

José Geraldo - 51,61% Estudantes - 70,1% Servidores - 54,4% Professores - 41,3%

Márcio Pimentel - 48,39% Professores - 58,7% Servidores - 45,6% Estudantes - 29,9%

Iúri Lopes


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Campus - Edição 330 - De 3 a 18 de outubro de 2008

Participação mediana de alunos

Total de votos dos estudantes foi quatro vezes maior que em 2005, mas não superou outras federais que adotam a paridade e registram mobilização acima de 50%

Daniela Martins

Já a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) registrou a menor participação, com apenas 9,55% de alunos votantes. Carolina Barreto, membro do DCE da UFRJ, afirma que não houve integração do segmento às propostas do único candidato. “Isso fez com que os alunos não se sentissem participantes do processo”, analisa.

Depois de 15 anos sem eleições paritárias para reitor, a consulta que elegeu José Geraldo de Sousa Júnior foi marcada pela expressiva votação dos estudantes. Os 8.052 alunos - equivalente a 33,23% do total - que foram às urnas este ano superaram em mais de quatro veAbstenção alta zes os votos do último pleiEntre os dois terços do to, realizado em 2005. No segmento discente (66,77%) entanto, o ín d i c e d e p a r que não participaram do ticipação não se destaca processo eleitoral na UnB, quando comparado com estava Davi Magalhães, esos de outras universidatudante do 5° semestre de des federais. Desenho Industrial. Para O Campus levantou os ele, os horários variados das dados da participação estuaulas dificultam a votação. dantil em 21 das 31 univer“Faço estágio, tenho muitas sidades federais que têm aulas e preciso sempre coreleições paritárias para reirer. Nessa falta de tempo, tor. No ranking, a Universisimplesmente me esqueci dade de Brasília encontrade votar”, assume. se na décima colocação, Já o aluno praticamente “Não tínhamos Daniel Ramos, na metade da cultura de participa- do 6° semestre lista. De acorde Ciências Sodo com o coorção política na UnB”, ciais, realizava denador-geral Fábio Félix, do DCE atividades acado Diretório dêmicas fora Central dos do campus e também não Estudantes (DCE), Fábio votou. Ele acredita que houFélix, o resultado pode ser ve pouco tempo para conhemelhorado no futuro. “Não cer os candidatos. “Não tive tínhamos cultura de parcomo pesquisar as propostas ticipação política na UnB. dos candidatos. Se estivesse Foi uma vitória gigantesca, na UnB nos dias da consulmas a tendência é aumenta, preferiria o voto nulo”, tar. Podemos chegar a 60% conta. Fábio Félix, do DCE, de votos”, aposta. Nas universidades pes- aponta outros fatores que quisadas, duas tiveram mais dificultaram a participação de 50% de comparecimento dos estudantes. “A falta de estudantil. Na Universidade sinalização dos locais de voFederal de São João del-Rei tação e o número de urnas (UFSJ), em Minas Gerais, atrapalharam bastante”, diz. Entre os alunos que su55% dos alunos votaram. “A participação política é uma peraram as dificuldades e tradição na cidade e isso se ajudaram a escolher o novo reflete na posição dos estu- reitor, estava Laune Asdantes, mesmo sendo eleição sumpção, 22 anos, do 5° secom chapa única”, explica mestre de Pedagogia. Para Cibele Moraes, assessora de ela, é imprescindível que todos participem. “Não enComunicação da UFSJ.

tendo por que muitos que lutaram durante a ocupação não votaram. Votei agora para ver melhora e ter como cobrar”, revela. Félix diz que muitos alunos ainda não vêem a importância da escolha do reitor. “Alguns separam a participação na eleição do reitor do resto da vida acadêmica.” Movimentos fracassam No segundo turno, simpatizantes de Jorge Antunes, candidato derrotado na primeira etapa, iniciou um movimento de estímulo ao voto nulo. Em carta distribuída pela UnB, o grupo afirmava que o “mais coerente” era anular o voto, já que as candidaturas de José Geraldo e Pimentel expressariam “a mesma política para a universidade”. Rafael Siqueira, aluno do 2° semestre de Filosofia, foi um dos que assinaram o manifesto. “Era uma forma de chamar a universidade para um debate”, disse . O n ú m e ro de votos nulos cresceu de 22, no primeiro turno, para 110, no segundo, mas isso não teve impacto no resultado da eleição. A chapa de Márcio Pimentel encabeçou um movimento pró-voto em cédula. O candidato disse haver suspeitas sobre a inviolabilidade do sigilo do voto eletrônico. “Muitos dos funcionários acreditavam que poderiam ser identificados”, afirmou Pimentel. “O movimento não funcionou”, comemorou o presidente da Comissão Organizadora da Consulta (COC), David Fleisher. O número de votos em cédula caiu de 1.333, no primeiro turno, para 1.183 no segundo. Colaboraram Ana Rita Cunha, Luanne Batista e Nathália Mendes

Índices de votantes Veja como estudantes de 20 instituições de ensino superior do país se envolveram nas últimas eleições paritárias Universidades Federais

Participação dos alunos

São João del Rei (UFSJ)

55%

Piauí (UFPI)

50,5%

Viçosa (UFV)

49,7%

Goiás (UFG)

48%

Grande Dourados (UFGD)

44,8%

Uberlândia (UFU)

41,4%

Rural da Amazônia (UFRA)

41%

Mato Grosso (UFMT)

38,8%

Fundação Universidade do Rio Grande (FURG)

38,4%

Brasília (UnB)

33,2%

Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio)

31,6%

Alagoas (UFAL)

30,8%

Paraíba (UFPB)

30,7%

Lavras (UFLA)

29,3%

São Carlos (UFSCar)

28,7%

Fluminense (UFF)

27,8%

Rio Grande do Norte (UFRN)

27,7%

Pernambuco (UFPE)

26,7%

Espírito Santo (UFES)

24,6%

Paraná (UFPR)

19,5%

Rio de Janeiro (UFRJ)

9,5%


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Campus - Edição 330 - De 3 a 18 de outubro de 2008

entrevista No jardim da FA (Faculdade de Estudos Sociais Aplicados), com voz moderada e entre um cumprimento e outro de estudantes, José Geraldo expôs ao Campus as linhas da sua gestão. O próximo reitor criticou a postura dos professores: “Eu acho que (eles) se acostumaram a uma hegemonia”, explicou. “Isso pode ter gerado a não-necessidade de eles se justificarem ou aprofundarem as discussões.” José Geraldo promete apostar no diálogo entre os segmentos, garantindo o espaço dos alunos, e adianta que não tentará se reeleger.

Flávio Silva

Ataque à “hegemonia” docente

Luanne Batista Yvna Sousa Campus: O senhor foi eleito com um número expressivo de votos dos estudantes. Quais são suas propostas para responder a esse apoio? José Geraldo: Isso é uma tremenda responsabilidade, já que os estudantes perceberam a possibilidade de serem ouvidos. Minha proposta é manter esse diálogo aberto e criar condições para que ele se realize. A primeira medida é instalar o congresso universitário paritário, que funcionaria como um fórum formado por alunos, servidores e professores para debates e exposição de propostas para a Universidade. Além disso, garantir também os espaços que os alunos têm nos colegiados superiores da Universidade. Campus: O senhor teve menos votos de professores em relação ao candidato Márcio Pimentel. Há estratégias para que sua gestão conquiste esse segmento? JG: O principio básico da gestão é o compartilhamento. Isso significa que todos os segmentos poderão participar das decisões deliberativas. Na minha gestão, eles poderão se manifestar em relação àquilo que os levou a não votar em mim.

O reitor eleito pretende resgatar o projeto original da universidade, reafimando seu compromisso social

Campus: O senhor já conseguiu avaliar por que teve menos votos dos docentes? JG: Durante a campanha, houve uma preocupação de que eu tivesse uma candidatura muito politizada. Para alguns professores, talvez isso seja um fator que imobilize a gestão. Mas a minha intenção é mostrar que é possível existir um processo democrático, com debates de onde se extraem ações concretas. Campus: Será que o “medo” da sua política universitária não seria um receio dos professores de uma maior participação dos alunos na gestão? JG: Talvez. Eu acho que os professores se acostumaram a uma hegemonia deles, na medida em que a proporção no processo deliberativo lhes dá um peso maior. Isso pode ter gerado a não-necessidade de eles se justificarem, sustentarem seus argumentos ou aprofundarem as discussões. Esse segmento precisa fudamentar suas decisões, sua tomada de posição. Isso significa que as pessoas devem se pre-

parar para os debates, não basta se apresentar neles com o peso presumido da hegemonia. O diálogo é exigente, pressupõe bons argumentos. Esse diálogo significa reconhecer no outro uma pessoa igualmente capaz de ter opinião sobre as questões universitárias. Campus: Então podemos esperar para a próxima gestão uma quebra de hegemonia... JG: Fortalecendo os consensos e garantindo que as ações não se frustrem adiante. Mas em outros pontos, eu não vejo grandes divergências com os professores. Discutimos muito a qualidade acadêmica e os valores que sustentam a Academia. Meu objetivo é identificar com a comunidade quais são os fins que a Universidade persegue. Campus: Tendo em vista a crise pela qual passou a Universidade, qual é seu plano para fiscalizar as fundações de apoio? JG: Elas devem entrar no pro-

cesso que tem como princípio a transparência e o controle. As Fundações têm autonomia, mas podem ser controladas previamente. Isso poderia ser feito estreitando os vínculos com órgãos externos como o Ministério Público e Tribunal de Contas. Além disso, dentro da própria UnB, a fiscalização pode ser feita pelos colegiados e pelo Decanato de Administração e Finanças. Campus: O senhor afirma que pretende resgatar o projeto original da UnB. Em que sentido isso aconteceria? JG: Significa trazer novamente a idéia de que a Universidade tem compromisso com valores, resgatar a utopia em relação ao conhecimento, para que ele sirva ao desenvolvimento do país. Campus: E o senhor pensa que esse projeto dialoga com o Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais)? JG: O Reuni é um programa de

investimento, mas que tem um horizonte social. Ele aponta para uma demanda de um ensino público de qualidade, inclusive incorpora muito do projeto de inclusão. Campus: Mas alguns dos cursos oferecidos nos campi da Ceilândia e do Gama não têm ainda, por exemplo, o currículo fechado ou laboratórios. JG: As primeiras aulas que foram dadas neste campus (Plano Piloto) sequer tinham salas. E elas iam ao encontro das utopias para esta Universidade. Trata-se de uma construção por etapas: discussão do projeto pedagógico, trabalhar com os alunos e com a dimensão da realidade que dá os meios para que se tenha uma estrutura. Campus: O senhor pensa em se candidatar à reeleição? JG: De jeito nenhum, acho isso um fracasso do dirigente. Se ele não foi capaz de fazer aflorar novos quadros em um momento em que eles são tão abundantes... Não digo que esse deve ser o modelo, mas para mim é um fator de fracasso.


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Apoio feminino à Constituição Estudo de pesquisadora da UnB analisa o discurso das mulheres nas cartas enviadas aos parlamentares membros da Assembléia Constituinte de 1988 Gisele Novais Duas décadas atrás, a então estudante de pedagogia da UnB Telma América Venturelli participou do processo de elaboração da nova Constituição do país, promulgada em 1988. Ela foi uma das mulheres que enviaram cartas aos parlamentares da Assembléia Constituinte com sugestões do que deveria ser contemplado pela “Constituição Cidadã”. Hoje, Telma tem 48 anos e é funcionária pública. Mesmo depois de tanto tempo, ela lembra que a vontade de participar daquele momento histórico foi o motivo para enviar sua colaboração. “Aquela época era rodeada por uma comoção muito grande, um clima completamente ativista, do qual todos nós queríamos participar”, conta. Ao todo, foram enviadas 72.719 cartas, sendo que mais de 23 mil foram escritas por mulheres. Diante desse expressivo número, a professora Izabel Magalhães, à época pertencente ao Departamento de Lingüística, Português e Línguas Clássica (LIP) da UnB, analisou o acervo

de cartas e fez um estudo baseado na linguagem e estilo das propostas femininas. “Toda luta social se faz mediante a linguagem e é através dela que é possível analisar o contexto no qual a mulher estava”, explica Izabel. O resultado do trabalho foi publicado no livro A Constituição desejada (Senado Federal, Centro Gráfico, 1991). Discurso emancipatório A partir de dados referentes a sexo, renda, grau de instrução e faixa etária, 284 sugestões foram selecionadas como amostra da pesquisa. Entre os temas mais recorrentes, estão os direitos da mulher nas áreas da política trabalhista, da organização social e da política educacional. A professora concluiu que a linguagem das cartas indicava o surgimento de um discurso emancipatório. “Foi possível identificar a construção de uma identidade cultural feminina ligada ao contexto tradicional e outra que começava a aparecer e propor mudanças na situação em vigor”, explica Izabel. A senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) era deputada federal

durante a Constituinte e foi um dos parlamentares que integrou a Comissão de Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher. Para ela, a contribuição das mulheres foi essencial para a ampliação e consolidação dos seus direitos. “A maior parte dessas propostas foi acolhida, ao menos parcialmente”, diz. Para a senadora, ainda é preciso avançar nesta área. “Talvez mais importante que sua enumeração [dos direitos da mulher] são os mecanismos que previnem sua violação”, defende. A sugestão de Telma Venturelli não se referia aos direitos da mulher. Tratava, como a de outros missivistas e de representantes de trabalhadores, da “necessidade de se dar aos servidores públicos o direito de terem associações representativas e sindicatos por classe funcional”. Ela se orgulha. “Sou apaixonada por essa constituição. Por quê? Porque eu ajudei a fazer”, revela. O Senado distribuiu milhões de formulários às agências de correio de todo o país. Os documentos foram arquivados e podem ser acessados pelo site do Senado (www.senado.gov.br).

Congresso recebeu mais de 72 mil sugestões de mudanças na legislação

Encontro reúne empresas juniores Entre os dias 24 e 28 de setembro, Brasília sediou o XVI Enej Encontro Nacional de Empresas Juniores. Com o tema “O impacto da inovação na mudança do Brasil”, o evento ocorreu no Bay Park e reuniu mil empresas juniores das mais diversas áreas. Da UnB, três empresas apresentaram trabalhos: a AD&M Consultoria Empresarial, da Administração; a Strategos, Consul-

toria Política, da Ciência Política; e a Práxis, da Psicologia. A AD&M apresentou três cases – experiências bem sucedidas vividas em trabalhos e projetos – e ainda ganhou o prêmio Top of Mind, dado à empresa júnior mais lembrada. “Era o que mais esperávamos, já que no encontro do ano passado ficamos em 3° lugar”, conta Marina Mergulhão, líder de projetos da equipe. Para o presidente da AD&M, Guilherme Junger, a

boa aceitação da empresa é fruto de um trabalho diferenciado. “Em alguns trabalhos nos focamos na área de desenvolvimento de pessoas, pouco explorado no meio empresarial. Esse foi o nosso trunfo: criar algo único”, explicou. A Strategos expôs um painel de uma pesquisa de opinião realizada no Congresso Nacional, acerca das especulações sobre possíveis candidatos para as eleições presidenciais de 2010. “A participa-

ção nesses encontros nos torna conhecidos e respeitados, além de garantir parcerias e fortalecimento da nossa empresa”, disse Max Stabile, um dos integrantes da equipe. A Práxis apresentou um trabalho feito em escolas públicas com o objetivo de aproximar a universidade da realidade dos estudantes. Segundo a coordenadora de relações externas do evento, Carolina Varão, as palestras,

workshops, mesas redondas e cases empresarias representam somente parte dos benefícios proporcionados pelo encontro. “O Enej é importante, sobretudo, pelo momento de integração, troca de experiência e capacitação dos participantes”, afirmou Carolina. (G.N.)


“Chega mais perto e contempla as palavras”

Carlos Drummond de Andrade

Suplemento do Jornal Campus Edição 330-A

De 4 a 18 outubro de 2008

parênteses


Unificação cultural é uma das metas mais perseguidas por países de raiz comum. A unificação do espanhol aproximou a Espanha e a América Espanhola. A Nova Reforma Ortográfica da Língua Portuguesa não foge a esse desejo. Esta edição do Parênteses é toda escrita conforme a reforma. Conheça por quais mudanças os países lusófonos irão passar e as consequências trazidas pelo acordo.

Acordo unifica a língua, mas divide linguistas O Brasil assinou o decreto para a implantação da nova reforma do português a partir de janeiro do próximo ano. Mudança polêmica tem o apoio de oito países e busca padrão entre as nações lusófonas

Camila Cortopassi

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Novo Acordo Ortográfico é uma reforma que entra em vigor depois de 18 anos de negociação e proposição de critérios que unifiquem a língua portuguesa. A reforma acompanha o preceito da globalização, que é interligar o mundo. Neste caso, a relação entre os países lusófonos sairia fortalecida e a cultura dos falantes da língua portuguesa ficaria mais unificada. A reforma é um tratado que tem por objetivo criar uma ortografia única para todos os países de língua portuguesa. Para o presidente da Comissão de Língua Portuguesa (Colip), Godofredo de Oliveira, “o anseio é que o português se torne a terceira língua de maior importância nos fóruns internacionais, com a ambição de ser uma das línguas oficiais da Organização das Nações Unidas (ONU)”. A Colip é o órgão designado pelo Ministério da Cultura (MEC) para tratar de assuntos referentes à reforma. Após dez anos de negociação entre a Academia de Ciências de Lisboa (ACL) e a Academia Brasileira

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de Letras (ABL), a reforma foi assinada no dia 16 de dezembro de 1990. Dos oito países de língua portuguesa, sete concordaram com as mudanças: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. O TimorLeste só assinou o acordo em 2004, quando se tornou independente. A unificação da escrita do espanhol entre a Espanha e a América Espanhola serviu de inspiração para os acadêmicos de língua portuguesa. Mas o tratado só entraria realmente em vigor quando pelo menos três países o ratificassem, o que aconteceu em 2006 com a ratificação de São Tomé e Príncipe. Unificar uma língua, como a portuguesa, com diferenças ortográficas peculiares nos países que a escrevem, resulta em perdas. Em Portugal, 1,6% das palavras sofreram modificações, enquanto no Brasil 0,5% do vocabulário mudou. Em Portugal espalhou-se uma corrente de e-mails pedindo a não-ratificação do acordo, já que os critérios propostos se assemelhavam ao português do Brasil, e não ao de Portugal. “O acordo foi proposto pela Comunidade de Países de Língua Portuguesa, então dizer que o português sugerido pelo acordo se parece mais com o português do Brasil do que

com o português de Portugal é mera impressão”, afirma o professor Godofredo de Oliveira. Apesar do impasse, o presidente da República de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, ratificou o documento no dia 21 de julho de 2008. O prazo de adaptação da sociedade portuguesa às novas regras é de seis anos. Em Angola, na Guiné-Bissau, TimorLeste e Moçambique o acordo ainda não foi ratificado. O professor Antônio Augusto, do departamento de Linguística, Português e Linguagem Clássica da Universidade de Brasília (UnB), participou da primeira leva de professores alfabetizadores no Timor Leste. Ele conta que no Timor havia professores de português de Portugal e professores de português do Brasil. “A unificação ortográfica irá facilitar muito o ensino”, afirma. Cabo Verde ratificou o documento em abril de 2005 e São Tomé e Príncipe em novembro de 2006. Para a professora de Políticas de Idiomas e chefe do departamento de Linguística, Línguas Clássicas e Português da UnB, Enilde Faulstich, “a reforma é positiva quando consideramos a precariedade do ensino da língua portuguesa em alguns países africanos. Um acordo que simplifica a língua facilita o ensino”.

O que muda aqui No Brasil, as alterações consistem na eliminação de alguns acentos, no acréscimo das letras k, y e w ao alfabeto e na modificação das regras de aplicação do hífen. Outra mudança é a completa eliminação


do trema em palavras formadas por qu e gu em que o u é pronunciado, como em tranquilo. O membro da Academia Brasiliense de Letras, autor de mais de 20 livros e também professor de português, Anderson Braga Horta, afirma que a particular eliminação do trema deve gerar confusão entre os falantes. “Em espanhol, pronuncia-se tranquilo sem o som do u também. Ao retirar o trema, está se fazendo um convite para que um erro de pronúncia se generalize”, diz. Para o autor, não existe unificação ortográfica em alguns pontos do acordo. “Os caminhos encontrados para a simplificação da língua nem sempre foram bons. A reforma de 1971, por exemplo, foi muito boa porque eliminou o acento diferencial. Com ele era preciso decorar várias palavras. Mas comparada com a de 71, esta reforma não tem utilidade”, conta Horta. Na reforma de 71, em Portugal, desapareceu o acento agudo dos ditongos abertos –ei, de ideia. No Brasil, baniu-se a dupla grafia de algumas palavras como “facto” e “amnistia”. Mas o diferencial da reforma foi a completa eliminação do acento diferencial. Essa reforma tinha o objetivo de simplificar alguns critérios que entraram em vigor no Sistema Ortográfico de 1943. As modificações de 1971 faziam parte da primeira proposta de unificação da língua portuguesa que se deu entre Portugal e Brasil. A abolição do trema aconteceu em algumas palavras, como “saüdar”. O acento circunf lexo foi eliminado de termos como “instantâneamente” e “bebêzinho”. Em Portugal desapareceram as consoantes mudas c e p das palavras, quando não pronunciadas: baptismo, inspector, entre outras alterações. “A única desvantagem é que a reforma poderia ter avançado mais em alguns aspectos, ter simplificado mais alguns critérios. Mas nenhuma reforma é completa”, afirma o presidente da Comissão de Língua Portuguesa, Godofredo de Oliveira. Para ele, a maior vantagem

“Minha pátria é a língua portuguesa” Fernando Pessoa será a grande mobilidade das publicações que poderão circular entre os países lusófonos. Para Enilde Faulstich, professora da UnB e especialista em política do idioma, o maior ganho é a economia com a “tradução” de um português para outro. Mas para o estudante de ensino médio e fundamental, qual será a grande mudança no primeiro contato com essa reforma? Oficialmente, o Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) não recebeu nenhuma informação do MEC nem do Governo do Distrito Federal sobre o cumprimento de políticas educacionais que consolidem o projeto da reforma. Concluído o processo de ratificação e de acordos, passa-se para o período da implementação das políticas de execução, que recebem um prazo de dois anos para se adaptarem à nova reforma. A Coordenadora da Secretaria de Assuntos Educacionais do Sinpro, Valesca Rodrigues Leão, prevê prejuízos para os alunos a curto prazo. Como alfabetizadora, Valesca acredita que a perda de acentos fundamentais utilizados para discernir algumas palavras, como pelo e pelo, dificultará o ensino da leitura. “Eu me lembro da minha época de escola em que acentuação me ajudava na interpretação de texto”, revela Valesca. Entre novas normas, discordância e resistência, o Acordo Ortográfico entrará em vigor a partir de janeiro de 2009. A mudança da ortografia vai exigir a adaptação de professores, revisores, jornalistas e editores de livros.

Confira a nova escrita

ü

O trema desaparece: tranquilo, aguentar, linguiça

Os ditongos ei e oi deixam de ser acentuados nas paroxítonas: ideia, paranoico, Coreia do Sul

ôo

Cai o acento de palavras terminadas em oo e eem: creem, leem, voo

Cai o acento das paroxítonas cujas vogais i e u são precedidas de ditongo decrescente: feiura, boiuna, baiuca, bocaiuva

á

éi

As palavras para, pelo, pera e polo perdem o acento diferencial: Eu fui ao Polo Norte. Ele não para no semáforo. Este cachorro tem pelo dourado

“O silêncio não tem fisionomia, mas as palavras sim, muitas faces” Machado de Assis

Hífens

ae oo ss

Não se usa o hífen quando a primeira palavra termina com uma letra diferente da qual começa a segunda: paraquedas, coautoria, autoestrada, infraestrutura. O “h” é a exceção: sub-humano, pré-histórico

Usa-se o hífen quando a primeira palavra termina com a mesma letra da qual começa a segunda: micro-ondas, micro-ônibus, arquiinimigo, semi-interno

Quando a primeira palavra termina em vogal e a segunda começa com “r” ou “s”, o hífen desaparece e as consoantes são duplicadas: antissemita, ultrassom, antirrábica, megarrápido, contrarreforma

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Economia e educação também sofrem os reflexos Ministério da Educação, editoras e profissionais da educação já começam a adotar as novas regras ortográficas Cristiano Zaia

S

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comungam dos ensinamentos de Antônio Houaiss, um dos idealizadores da Reforma Ortográfica de 1990. “A reformulação dos nossos dicionários é só mais uma alteração. Mas é significante, se você contar que cada palavra se repete inúmeras vezes ao longo do dicionário”, aponta Mauro Villar, coautor do Mini Houaiss e diretor do Instituto Antônio Houaiss. Ele acrescenta que não houve custo adicional de reformulação dessa publicação e que todos os dicionários Houaiss estão sendo revisados. Segundo ele, a edição do Grande Houaiss reformulado ficará pronta apenas em 2010. A Editora Thesaurus, de Brasília, publica obras de escritores brasileiros e portugueses há 30 anos e mostra rapidez na adesão ao acordo. A obra Bichos, de Ânderson Braga Horta, já está na fase de impressão e a previsão de lançamento é para outubro. O presidente da editora Thesaurus, o português Victor Alegria, afirma, no entanto, que a reforma implicará mudanças apenas para as editoras de livros didáticos, que trabalham com grandes re-edições. Victor considera ser mais vantajoso para as pequenas editoras exigirem que os revisores reciclem o conhecimento ao invés de fazer mais contratações.

O governo exige Responsável por cobrar das editoras de livros didáticos a adequação à nova reforma ortográfica da língua portuguesa e comprador de 103 milhões de livros apenas em 2008, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) comunica que até o próximo ano esses livros poderão ou não estar readequados.

Todas as fotos são montagens à partir de imagens retiradas de bancos da internet

e nos próximos anos você esbarrar em algum cartaz escrito “Estreia hoje nova montagem de Morte e Vida Severina”, não se assuste. A divulgação não estará errada, pois o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa estará em vigor. Em meio às mudanças e opiniões distintas sobre a aceitação da nova norma, muitos profissionais, empresas e órgãos públicos já estão tratando de cumprir as novas regras da escrita. No Brasil, uma atitude sensata do Ministério da Educação (MEC) visou a impedir que alunos da rede pública dos ensinos fundamental e médio fossem prejudicados pela obsolescência dos livros didáticos. A resolução nº 17, de sete de maio de 2008, estipulou o prazo de adequação para o ano de 2011. O MEC prevê que a partir de janeiro de 2009 todas as publicações oficiais e comerciais obrigatoriamente estejam adaptadas ao novo acordo. Já neste ano, alguns minidicionários de língua portuguesa trazem edições reformuladas com as novas alterações ortográficas. É o caso do Houaiss, Aurélio e Michaelis. E também de gramáticas que já ensinam as novas mudanças. A nova edição do Minidicionário Houaiss, após sete meses de realização, está disponível nacionalmente desde o início do mês de agosto. Com mais de 30 mil verbetes, a publicação traz o fato curioso de ter sido desenvolvida por lexicógrafos que

“A palavra é meu domínio sobre o mundo” Clarice Lispector A coordenadora do Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), Sônia Schwartz, explica que em 2010 as editoras serão obrigadas a entregar os livros com as modificações, exceto os títulos para as turmas de 1º ao 5º ano. “O MEC decidiu que os livros das séries iniciais do ensino fundamental ainda não poderão estar reformulados em 2009, pois entende que alunos em processo inicial de escrita teriam dificuldade de adaptação”, explica. São 16 editoras contratadas pelo PNLD que, só para o ano de 2008, recebeu um orçamento de R$ 840 milhões para comprar livros didáticos de Biologia, Física, Matemática, Português e Geografia, beneficiando 7,2 milhões de alunos do ensino médio. “A reforma não teve custo adicional para o PNLD”, reitera Sônia, lembrando que as principais editoras já estão providenciando o lançamento dos livros até o próximo ano, com o selo da reforma. É o caso da Editora Nova Geração, de São Paulo, que lançou duas gramá-

ticas novas e aguarda o lançamento do manual explicativo Corrija-se, de Luís Antônio Saconni. Estão previstos para dezembro deste ano um minidicionário e outro para 2009. A editora Elaine Raya conta que a Nova Geração teve que revisar três títulos, acarretando um custo adicional de 40% à produção. Estão sendo utilizados de cinco a dez revisores contratados para este trabalho de reformulação das obras. “A nomenclatura gramatical vai ser alterada, mas há lacunas no acordo ortográfico. Cada editora se guiou de uma forma com seus autores”, ressalta. Eliane ainda considera que a Academia Brasileira de Letras (ABL) deve agir em conjunto com as outras academias de letras dos países lusófonos para o acordo corroborar suas intenções de integração. “O acordo gerou uma polêmica, pois há contradições de regras ortográficas”, completa. Já a Editora FTD, uma das principais do país, revela que não precisou contratar novos revisores para

a reformulação dos títulos que já estavam editados e não mais podiam esperar a adaptação. Segundo o supervisor de divulgação da FTD Brasília, Eliude Lacerda, o material não reformulado, editado em 2006 e 2007, receberá um suplemento adicional de seis páginas contendo as novas regras ortográficas. “A adequação às novas normas não implica custo adicional, mas o trabalho autoral (adequação do texto), revisão e impressão são complexos e demoram”, afirma Eliude. A editora fornece cerca de 130 milhões de livros para séries escolares de 1º a 5º anos. Os lançamentos editoriais da FTD ou os títulos reformados, que incluem gramática e livros de português, serão lançados este mês. Para o Distrito Federal, a medida parece demorar a chegar. A Subsecretaria de Ensino Básico da Secretaria de Educação do DF informa que será formada uma comissão para avaliar a adoção de livros didáticos adequados às novas normas.


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cultura

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Tesouros nas prateleiras

Bibliotecas de Brasília disponibilizam coleções de excelência ao público, muitas delas compostas por itens raros que servem de referência para pesquisadores Max Melo

Francisco Brasileiro

Não é novidade que Brasília possui grandes bibliotecas. As três principais, localizadas na Universidade de Brasília (UnB), Câmara dos Deputados e Senado Federal possuem juntas quase 1,5 milhão de volumes, entre livros, mapas, periódicos e obras raras. Alguns desses acervos são de qualidade superior, por sua variedade, atualização ou valor histórico. Nos mais de 800 mil títulos da Biblioteca Central (BCE) da UnB, algumas coleções são mais que especiais. Três delas destacamse como de excelência mundial. Guardadas no setor de obras raras, as coletâneas de Luís de Camões, Camilo Castelo Branco e Hipócrates são as mais importantes. Com cerca de 100 volumes, a coleção do português Luís de Camões é referência para pesquisadores. “Só de Os Lusíadas possuímos 17 edições muito raras, do século XVI ao XVIII. Pesqui-

sadores podem estudar a evoluentão conhecidas, uma das obras ção da obra, já que em diferentes mais antigas do acervo. edições algumas partes foram Para Fernando Silva, do Seralteradas”, conta Raphael Greeviço de Desenvolvimento de Conhalgh, um dos bibliotecários leções da BCE, “acervos como responsáveis pelo setor de obras estes têm objetivo de preservar o raras da BCE. patrimônio histó“Só de Os Lusíadas A coleção do rico-cultural, prinromancista por- possuímos 17 edições cipalmente da líntuguês Camilo gua portuguesa”. muito raras” Castelo Branco Fernando também Rafael Greenhalgh, também chama lembra que tais bibliotecário da UnB atenção. São 198 coleções, quando obras, a maioria acessíveis em uma do século XIX. Entre elas, uma universidade, fomentam pesquicópia feita a partir do original de sas e que, por isso, o acervo da A Infanta Capelista, que, a pediUnB é mais aberto que o de oudo de D. Pedro I, foi destruída por tras bibliotecas. “Em outros lugacitar um membro da família real. res, como na Biblioteca Nacional, Atualmente, restam somente três é preciso fazer uma solicitação e originais da obra no mundo. aguardar a autorização para conOutra coletânea notável é a de sultar obras raras”, explica. Hipócrates, considerado pai da Medicina. São livros editados enLeis nas prateleiras tre os séculos XVI e XVIII. O mais Com quase 400 mil volumes, a importante é Opera Omnia, Biblioteca do Senado Federal tem de 1535, tratado sobre as mais o segundo maior acervo aberto diferentes doenças humanas até do DF. Nessa coleção, concen-

tram-se 240 mil obras de Direito. A diretora da biblioteca, Simone Bastos, acredita que a importância do acervo ultrapassa as paredes. “O principal objetivo é auxiliar os parlamentares durante a elaboração das leis”, afirma. Engana-se quem pensa que a coleção do Senado é limitada à Legislação. “Possuímos uma base de excelência de jornais e de obras acadêmicas e científicas que possam apoiar o parlamentar. Ele precisa compreender o mundo para guiar o país”, completa Simone. A biblioteca tem, ainda, uma coleção de livros históricos e de literatura, como os exemplares da primeira constituição imperial e antigas edições dos romances de Machado de Assis. A Biblioteca Pedro Aleixo, na Câmara dos Deputados, é especializada em Ciências Sociais. A maior parte dos 200 mil volumes é sobre Direito. O restante é, principalmente, sobre Ciência Política, Economia e Administra-

ção Pública. A biblioteca também abriga documentos históricos, leis, códigos e livros que contam a história do Brasil desde o período colonial. Natanael Lopes, aluno do 7º semestre de Ciência Política da UnB, é um dos usuários da biblioteca da Câmara. Ele destaca que a principal vantagem é a atualização constante do material. “A coleção é muito boa, principalmente porque tem livros recentes e edições atuais. É bastante comum o pessoal do meu curso estudar lá”, conta. Mesmo fechada para reformas até 2010, a biblioteca permanece viva. Segundo a diretora da instituição, Patrícia Milani, apesar da suspensão do atendimento externo, outras formas de acesso ao acervo estão disponíveis. “Mantemos o atendimento interno para os parlamentares e funcionários da Câmara, o serviço de comutação bibliográfica com outras bibliotecas e a consulta telefônica”, garante.

Serviço BCE Aberta de segunda a sextafeira das 7h às 23h45 e finais de semana e feriados das 8h às 17h45. Telefone: (61) 3307-2417 e 3307-2403 Biblioteca do Senado Federal Aberta para o usuário externo de segunda à sexta-feira das 9h às 14h. Telefone: (61) 3311-4141

Na BCE, encontra-se uma edição de Os Lusíadas, impressa no séc. XIX em comemoração aos 300 anos de Camões.

Biblioteca da Câmara dos Deputados O a t e n dime n t o a o u s u á rio e x t e rn o está suspenso até 2010, por motivo de reforma. Telefone: (61) 3216-5650


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cultura

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“Nós só tocamos sucesso”

A maioria das rádios de Brasília não valoriza músicos locais de renome nacional, preferindo os pacotes padronizados de outras cidades aos talentos regionais Francisco Brasileiro

Ana Rita Cunha Das 14 rádios de Brasília, oito não prestigiam a produção da cidade. Essa foi a constatação do Campus após conversar com produtores de todas as rádios com programação musical. Enquanto a maioria afirma não ser economicamente viável tocar música local, existem artistas brasilienses de repercussão nacional sem espaço. Há três perfis de rádio em Brasília: repetidoras, locais e públicas. As repetidoras são filiais de uma matriz de outra cidade. No DF, há quatro dessas rádios, sendo que a maioria toca um pacote de conteúdo fechado e definido na sede. A Transamérica é a única exceção. Com o projeto Recreio, a emissora vai às escolas da cidade, seleciona bandas e as insere na programação. Fora isso, o coordenador musical da Transamérica em Braprocurando gente daqui”, justisília, Jonnhy Luna, diz que há fica Lins, repetindo o discurso outras formas de os músicos cheda maioria dos programadores garem às rádios. “O músico pode musicais brasilienses. mandar o material. Se for de boa Na contramão da tendência, qualidade e compatível com o esestão as rádios públicas. As quatilo, é capaz que entre”, afirma. tro existentes têm espaço para De acordo com Luna, no entanto, música de Brasíexistem condições que podem Apesar da qualidade, lia. A rádio Verde Oliva, do Exército, simplificar a enbandas brasilienses insere essa músitrada. “Se o cara ficam excluídas da ca e criou, no ano envia material programação passado, o Prêmio para a gente faVerde Oliva de zer promoção, aí Música Brasiliense. De acordo toca mais fácil”, revela. com a assessoria de imprensa Nas rádios locais comerda rádio, a recepção do público ciais, o cenário contrasta mais. é muito boa. O órgão informa Só uma das seis transmite múque é comum os ouvintes ligasica de Brasília. A justificativa rem para saber de onde são as de Arthur Lins, coordenador produções novas. musical da rádio Clube, antiga Na rádio Cultura, um terço 105 FM, é “nós só tocamos suda programação é de música cesso”. Para Lins, não é viável brasiliense. Criada em 1988, foi uma rádio da cidade olhar para a primeira, na década de 1990, a a região. “Não perdemos tempo

Fernanda e Phil, que formam a dupla Lucy and the Popsonics, desistiram da rádio como espaço de divulgação

tocar bandas como Raimundos e Natiruts. Entre 2000 e 2005, por questões políticas, seguiu o formato próximo ao das rádios locais e perdeu o público e o status de grande divulgadora da produção regional. Desde 2006, tenta recuperar esse título. “Queremos criar no público o costume de ouvir música daqui”, afirma Marcos Pinheiro, diretor da rádio. “Não precisamos olhar só para o próprio umbigo, mas as rádios têm que parar de ignorar a música local”, polemiza. Voz às bandas Conhecida pela produção musical relevante, Brasília sempre foi berço de grandes músicos. Hoje, a capital tem muitos nomes com reconhecimento nacional. Móveis Coloniais de Acaju, Phonopop, Lucy and the Popsonics, Beto Só e Casa de Fa-

rinha são alguns dos exemplos de bandas e músicos da cidade que saíram em importantes revistas nacionais. Boa parte deles é requisitada em festivais por todo o país e já tocou no exterior. Todas as qualidades não lhes valeu espaço nas rádios locais. “Nem mandamos mais material porque sabemos que não vai tocar”, afirma Fernanda Popsonic, do Lucy and the Popsonics, banda que apareceu na revista Rolling Stone. Cláudia Daibert, vocalista do Casa de Farinha, vencedor do Prêmio Tim de Música na categoria grupo regional em 2005, conta que o conjunto divulgou-se principalmente nos shows. Sem abertura nas rádios, as bandas se voltam para o público externo mesmo fazendo sucesso internamente. “A primeira resenha que fizeram sobre nós foi em Minas

e, no fim, nosso sucesso maior é fora daqui”, conta Fernando Brasil, vocalista do Phonopop. Goiânia segue em direção contrária às rádios brasilienses. A Interativa, campeã de audiência entre os jovens, conforme dados do Ibope, no primeiro semestre de 2008, abriu espaço para música local. “É preciso trazer novidades para o ouvinte, e os músicos daqui têm identificação com o público”, garante José Araújo, diretor artístico da Interativa. “As rádios de Brasília não representam mais a criação musical local”, afirma Fernando Rosa, produtor musical e apresentador do programa semanal Senhor F, na Rádio Câmara. Rosa diz que a lógica é tocar apenas um padrão. “As rádios da cidade perderam a capacidade de perceber as novidades musicais”, lamenta.


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cidades

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Refletir é o melhor remédio Reservada tradicionalmente a intelectuais, a Filosofia agora ganha espaço como prática terapêutica e compete com psicoterapias mais conhecidas Amanda Sales

outras pessoas e com as coisas. Queremos que o partilhante tenha qualidade de vida”, conta Barbosa. Dentro do mercado de trabalho, a Filosofia Clínica parece querer tirar o espaço antes reservado à Psicologia. Mesmo assim, Enrique Maia, do Insti-

“Quem estuda Filosofia não tem preparo para cuidar da saúde mental dos outros” Agnaldo Portugal, professor da UnB tuto de Psicologia Aplicada, não vê a atuação dos filósofos como uma ameaça. “Todas as práticas terapêuticas concorrem entre si, pois há grande diversidade de propostas”, afirma. “A Filosofia Clínica pode vir a contribuir, mas não se equipara ao trabalho psicológico e nem o substitui.” A fiscal do Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal Eliana Amorim explica

que não precisa existir reconhecimento por parte da Psicologia em relação à Filosofia Clínica, uma vez que são campos diferentes. “O Conselho só fiscaliza psicólogos. Se houver um psicólogo fazendo esse tipo de abordagem, o Conselho se pronunciará”, avisa. “Como se trata de filósofos, não há como intervir.” Diferença metodológica Para Olga Hack, professora do Instituto Packter e única filósofa clínica que atende no Distrito Federal, há diferenças entre a terapia filosófica e as psicoterapias, principalmente em relação à metodologia. Olga conta que o principal é ter fundamentação em preceitos filosóficos. “Não trabalhamos com conceitos de experiências anteriores. Quem se apresenta à Filosofia Clínica é único em sua forma de ser”, afirma. “Com isso, não nos permitimos fazer analogias entre normalidades e patologias, uma vez Henrique Eira

Dificuldade para fazer escolhas, tomar decisões ou manter um bom relacionamento com familiares, amigos e colegas de trabalho. A busca de solução para problemas como esses, que sempre foi feita no divã dos psicólogos, agora também está sendo realizada em outra frente. Trata-se da chamada Filosofia Clínica, que consiste no atendimento baseado na reflexão filosófica acerca das questões que inquietam a existência humana. Na prática, essa corrente trabalha em um campo de atuação terapêutica em que a filosofia acadêmica lhe serve de embasamento, fundamentação, suporte e aprofundamento no auxílio de quem procura o filósofo clínico. Iniciada no Brasil nos anos 1990, a Filosofia Clínica partiu de estudos do psicanalista e filósofo Lúcio Packter, no Rio Grande do Sul. No entanto, até hoje não é muito conhecida nem aceita pelos acadêmicos. Atualmente existem cerca de 5 mil especialistas na área em todo o país. Desses, somente em torno de cem cuidam de partilhantes (termo usado para designar o paciente), enquanto os demais se dedicam à pesquisa ou não atuam na área. No Distrito Federal, o curso de formação em Filosofia Clínica existe há oito anos, mas dos 25 especialistas existentes somente um trabalha atualmente no ramo. Vista por alguns como perigo à saúde pública e por outros como um novo mercado para o filósofo, o tratamento atua em terreno fértil em polêmicas. Ao abarcar o campo da saúde mental, esse segmento se coloca ao lado da Psicologia, Psiquiatria e Psicaná-

lise no tratamento de pessoas por meio de intervenções mentais clínicas. Isso gera controvérsias por envolver a legitimidade da Filosofia como uma terapia. O professor do Departamento de Filosofia da Universidade de Brasília Agnaldo Portugal acredita que o trabalho da Filosofia Clínica envolve riscos muito sérios. “Quem estuda Filosofia não tem preparo para cuidar da saúde mental dos outros. O filósofo não tem e nem deve ter como propósito o tratamento terapêutico, e nem tem base para isso”, explica. Já o professor Gilson Barbosa, membro da Associação Goiana de Filosofia Clínica, afirma que a especialidade não busca a cura do partilhante, como fazem outras psicoterapias com os pacientes, nem trata de doenças. “O filósofo clínico não trabalha em cima de patologia e sadio. Nós trabalhamos com dificuldades existenciais, procuramos a melhoria da relação da pessoa com ela mesma, com

que respeitamos os modos criados para cada estrutura de pensamento”, diz. A jornalista Denize Guedes, 29 anos, é paciente de Olga Hack há dois meses. Ela passou mais de cinco anos se submetendo a psicoterapias tradicionais, mas diz só ter conseguido com a Filosofia Clínica lidar com as dificuldades para as quais buscou terapia. “O tratamento não vai lá atrás para tentar explicar o motivo de um problema que me incomoda hoje. Ela parte do que eu estou vivendo agora, tentando entender o mundo e o cotidiano vivido por mim e através da minha história”, conta Denize. “Você passa a perceber que determinadas coisas na vida acontecem porque foi aquilo que você quis, e assim você entra em paz com questões que antes eram incômodas”. Uma sessão de Filosofia Clínica pode custar de R$ 40 a R$ 200. O profissional tem que ser graduado em Filosofia por uma faculdade reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC) e ter se especializado na área, cujos cursos são vinculados ao Instituto Packter, do Rio Grande do Sul. Na formação, os profissionais estudam metodologias filosóficas para compreender e auxiliar o partilhante. O curso tem duração de dois anos, com 18 meses de aulas teóricas e seis de estágio. Nessa segunda etapa da formação profissional, a partir do 18º mês de curso, o aluno inicia um estágio supervisionado e é avaliado diretamente por dois profissionais. O curso teórico custa R$ 3.600, divididos em parcelas mensais de R$ 200. As aulas ocorrem uma vez por mês, aos fins de semana.


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esporte

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Arbitragem maior que futebol

Investimentos fazem do DF uma das melhores escolas de formação de árbitros do país. Bom desempenho dos juízes eleva a cidade ao topo do ranking nacional

Se com a bola no pé o Distrito Federal ainda engatinha, com o apito na boca a cidade é referência nacional. Segundo a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), o DF ocupa a quarta posição no ranking das federações que mais apitaram partidas da Série A do Brasileirão, atrás de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Os árbitros conduziram 24 das 250 partidas, superando os estados do Paraná e de Minas Gerais. Esta assiduidade nas escalas é fruto de aprimoramento físico e técnico. A Comissão Estadual de Arbitragem de Futebol (Ceaf/DF) e o Sindicato de Árbitros de Futebol do Distrito Federal (SAF/DF) promovem aulas de educação física, testes teóricos bimestrais, especializações e rodadas de discussão e reciclagem. “Isso reflete em um bom trabalho dentro de campo”, aponta Edson Rezende, ex-presidente da

Comissão Nacional de Arbitragem da CBF, o órgão máximo de arbitragem do país. O DF conta com 120 juízes e auxiliares em atividade. Desses, 50 fazem parte do quadro local e seis do quadro CBF, que relaciona os juízes das partidas nacionais. Para ser promovido, o árbitro precisa ter dois anos de experiência na federação, estar atuando na primeira e segunda divisão do campeonato local e ter, no máximo, 35 anos. A posição de destaque da arbitragem é antiga. “A arbitragem de Brasília é muito maior que seu futebol”, atesta Luciano Almeida, ex-árbitro Fifa. “Estou há 28 anos na arbitragem de Brasília e sei que a formação é levada muito a sério”, afirma Jorge Paulo Gomes, presidente da Associação Nacional de Árbitros de Futebol (Anaf) e ex-árbitro assistente do quadro internacional. A falta de recursos impede uma maior expressão dos árbitros da cidade. Não há espaços para

Mariana Curi

Nathália Mendes

Alexandre foi do quadro nacional por dez anos: “Estamos entre os três melhores do país”

treinamento e os juízes atuam em campeonatos sem visibilidade. “Considero os árbitros de Brasília verdadeiros heróis. Eles conseguem se destacar sem mídia por trás”, afirma Luciano.

Sharmaine Caixeta

Prata da casa Sandro Ricci, funcionário público e árbitro há cinco anos, escolheu a carreira para continuar em contato com o futebol. “Ele é uma aposta da Comissão de Arbitragem e, aos poucos, vai encontrando seu espaço”, observa o comentarista da SporTV, Renato Marsiglia. Sandro enumera vantagens e desvantagens de ser juiz no Brasil. “É gratificante conhecer novos lugares, ser remunerado e ter reconhecimento público”, afirma. “Por outro lado, não somos considerados agentes profissionais num ambiente profissional.” O gerente de empresas Wilton Sampaio é árbitro há oito anos e integra o quadro CBF há três. Wilton planeja tornar-se árbitro Fifa. “Sonho com essa perspectiva, principalmente por ser jovem”. Um

árbitro internacional precisa estar apitando jogos da Série A, ter concluído o ensino superior e falar inglês e espanhol. Sérgio Carvalho é o árbitro número um do DF. Até a 25ª rodada deste campeonato – o último de sua carreira -, ele havia sido o árbitro que tinha apitado mais jogos nacionais por federação: 12 partidas. “Sérgio tem postura simples e eficiente. Ao abandonar o apito, terá motivos suficientes para se orgulhar de sua trajetória”, acredita Marsiglia. Para Sérgio, o que falta à arbitragem do Distrito Federal é periodicidade nos cursos. “Estamos carentes de renovação”, critica. O último curso de árbitros ocorreu em 2006. O presidente do SAF/DF, Nivaldo Nunes, explica que a falta de parcerias para cobrir os custos impede a contínua formação. “Para o próximo ano, concluiremos o processo para realizar o curso”, afirma.

Movidos pela paixão Raimundo Lobo e Alexandre Andrade fazem parte do quadro lo-

cal. Alexandre, árbitro há 13 anos, acredita que é mais difícil apitar Cruzeiro x Brasília do que Fla x Flu. “O jogo de elite possui mais infraestrutura e é tranqüilo pelo nível de profissionalização”, conta. Sandro concorda: “Quando você apita em nível local, pode esperar qualquer coisa de um atleta. Não existe mídia que evite reações grotescas”. Sem o reconhecimento de Sandro, Sérgio ou Wilton, os demais árbitros locais são motivados por outros fatores. “O pessoal do quadro básico faz porque gosta. É mais por paixão do que pela carreira”, diz Raimundo. Um juiz ganha taxas de acordo com o número de vezes que é escalado. Um árbitro Fifa pode ganhar até R$ 15 mil por jogo. No DF, as taxas variam de R$ 80 a R$ 220 por partida. “Já que falam que aqui é o país do futebol, por que não dizer que somos o país da arbitragem?”, questiona Wilton. Se depender do talento e da capacidade de nossos árbitros, a capital deste novo país fica mesmo pelo Planalto Central.


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opinião

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debate

espaço do leitor

Arquivo pessoal

Arquivo pessoal

Em entrevista concedida à TV Brasil em 17 de setembro, o presidente Lula declarou ser a favor do casamento gay, permitido em países como Espanha e Bélgica. Outras nações, como as européias Suécia , Inglaterra e França, reconhecem apenas a união civil entre casais homossexuais. E no Brasil, o casamento entre pessoas do mesmo sexo deve ser legalizado?

Boa impressão A última edição estava muito boa. As matérias sobre as eleições foram profundas e certamente tiveram peso na hora do voto. Não apenas a divulgação ágil da pesquisa eleitoral merece elogios, mas a equipe conseguiu superar o trivial e buscou ângulos diferentes. O suplemento também estava irrepreensível, porque foi a fundo nas mudanças e nos desafios trazidos pela democratização da universidade. O que mais me impressionou é que essa foi apenas a primeira edição do semestre. Com tanto profissionalismo, essa turma promete. Estou ansioso para ver os próximos números. Wellton Máximo Jornalista e ex-aluno da UnB, (aluno do Campus no 1º/2001)

Cumprimentos

“A lei não proíbe o casamento de dois homens ou de duas mulheres. Simplesmente a legislação diz ‘o casamento entre um homem e uma mulher’. Ela silencia no que tange ao casamento homossexual, logo, como a lei não proíbe, ela admitiria isso. A Constituição estabelece como princípio que não podemos ter na república qualquer tipo de discriminação. Não cabe ao Estado nem ao particular discutir a comunhão de vida do casal. Segundo o princípio da igualdade, se um homem pode se casar com uma mulher, por que dois homens não poderiam se casar entre si?”

“Isso é um absurdo. Em um país com a cultura que nós temos, que claramente se posiciona contrária ao casamento de homossexuais, o presidente deveria ser sensível e se posicionar contra também. Isso é um ataque frontal à instituição familiar. Homem e mulher se unem em matrimônio para a preservação da espécie. O casamento tem em vista a geração de vida, a geração de filhos e sua educação. Isso só é possível dentro do matrimônio. Não tenho nada contra aqueles que fazem essa opção sexual, mas querer que reconheçamos essa união como família é uma afronta à cultura brasileira.”

Valcir Gassen Doutor em Direito e professor de Direito de Família da UnB

Miguel Martini Deputado federal pelo Partido Humanista da Solidariedade

Informo que recebemos os exemplares do jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da UnB que vocês muito gentilmente nos trouxeram. Na oportunidade, envio os cumprimentos desta assessoria, cientes da importância de empreendimentos como esse enquanto são alunos para que mais tarde se tornem excelentes profissionais. Atenciosamente, Ary Franco Sobrinho Chefe da Assessoria de Comunicação Social do Ministério da Educação

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Censura à experimentação Em 2006, às vésperas das eleições para governador do DF, alunos de jornalismo do Iesb publicaram no portal de notícias da faculdade uma matéria denunciando irregularidades na campanha de um dos candidatos. A matéria foi censurada e tirada do site. Fato semelhante aconteceu no primeiro semestre desse ano, no UniCeub. Com o escândalo dos gastos do governo federal com cartões corporativos, o jornal-laboratório Esquina iria publicar uma matéria sobre gastos semelhantes feitos por servidores do GDF. A matéria foi censurada antes de ser colocada no jornal,

que circulou sem a notícia. Em 1984, o Conselho Federal de Educação estabeleceu que todos os cursos de jornalismo deveriam editar, no mínimo, oito jornais-laboratório em formato tablóide por ano. Os jornais-laboratório, portanto, seriam espaço para a livre experimentação do aluno, preparando-o para o mercado de trabalho e proporcionando-lhe, talvez, a única oportunidade em suas carreiras para escrever livre de censuras. Mas a censura aos jornaislaboratório não se limita ao DF. Em 2002, alunos da Cásper Líbero que estamparam um casal nu multi-racial e homossexual na

capa do Esquinas de SP foram impedidos de imprimir e distribuir o mensário. A matéria falava sobre os diferentes tipos de discriminação e trazia o título “Intolerância”. Segundo o presi-

Deve ser assegurado ao aluno o direito de se expressar dente da Imprensa Oficial de São Paulo, a cena era polêmica e de mau gosto, trazendo mais prejuízos do que dividendos. É essencial velar pelo resguardo da ética, da verdade e do respeito a quem lê o jornal

na prática jornalística. Contudo, deve ser assegurado ao aluno o direito de se expressar livremente. Ainda mais quando se tem a sorte de se estudar em uma universidade laica e livre de interesses particulares. Teoricamente. Em julho de 2003, quando o jornal Campus publicou uma matéria sobre irregularidades no Cespe “Muito dinheiro, pouca transparência”, professores do curso foram chamados à reitoria para conversar com o decanato, que demonstrou preocupação. Para o decanato, a matéria era política e visava atingir a imagem do então vice-reitor, o professor Timothy Mulholland, que pretendia ser reitor.

Na última edição do Campus, publicou-se uma pesquisa que sondava os alunos em relação à consulta para reitor. Antes mesmo de sua publicação e desconhecendo o teor da matéria, alguns candidatos cogitaram formular uma carta que impedisse a circulação do nosso jornal. Esse pedido só se justificaria se o texto possuísse algo de criminoso ou de inverdade, o que não era o caso. Felizmente, o Campus foi publicado antes que houvesse qualquer outra movimentação nesse sentido. Gabriela Abreu Aluna do 7º semestre de Jornalismo


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Campus - Edição 330 - De 3 a 18 de outubro de 2008

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Vir de ônibus para UnB não é tarefa fácil. O ônibus da linha 110, que faz o trajeto UnB – Rodoviária na hora do almoço, está mais para transporte de carga do que transporte público.

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Está sentindo falta de folgas durante a semana neste semestre? Não consegue nem lembrar a última vez que fugiu para a cachoeira mais próxima, saiu com os amigos ou apenas dormiu o dia inteiro? Então procure no caça-palavras os feriados perdidos para os fins-de-semana: 7 de setembro 12 de outubro

2 de novembro 15 de novembro

Um novo refeitório foi aberto no RU para pessoas com hipertensão, diabetes, ou disposição para essas doenças. O cardápio oferece refeições com menos gordura e nada de sal. Resta saber se por lá é possível identif icar de qual fruta é feito o suco do dia.

Mariana Capelo Mariana Capelo

Lennon contemplava a UnB de um lugar privilegiado: ao lado do RU. Agora, ele desce do pedestal e se matricula no curso de f ilosof ia

Teo Horta

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