Estrutura Abalada

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CAMPUS

Jovens músicos da cidade trazem uma nova roupagem à tradicional Bossa Nova

Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação :: Universidade de Brasília :: www.fac.unb.br/campusonline :: Ano 38 :: Edição 325 :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Janine Moraes

Laudo acusa risco de desabamento no Hospital Universitário de Brasília. O pronto-socorro da pediatria ficará fechado nos próximos seis meses. Uma

faixa na frente do hospital avisa aos pacientes que o atendimento está suspenso. Os residentes serão realocados no Hospital Regional do Paranoá Página 8

Reco do Bandolim fala sobre cultura brasileira e o Clube do Choro, recém-nomeado patrimônio imaterial do DF

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Pesquisa revela que, na contramão do resto do país, o aumento do trabalho infantil é realidade na capital federal

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Editorial

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

:: Carta do Editor

:: Expediente Campus Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília

Acontecimentos insistentes Ocupam a reitoria, assume reitor pro tempore, a direção da ADUnB muda e o cenário político da universidade está instável. O turbilhão de informações ajuda e atrapalha, a redação esquenta toda vez que os alunos-jornalistas do Campus começam seu exercício principal: pensar um jornal. Não é só escrever, fotografar, imprimir e dar tchau. A cada passo é preciso pensar o que estamos fazendo, para quem e por quê. Os maiores problemas (soluções) que aparecem para balançar um jornal têm nome: fatos, e os benditos insistem em acontecer. E eles acontecem sem dó, mobilizam a todos, nos obrigam a correr, trabalhar e a decidir e julgar qual fato é mais importante.

A direção do Hospital Uni- fundações e das pessoas que versitário de Brasília resolveu dependem delas? fechar a emergência da peNão muito longe do camdiatria do hospital, depois de pus, logo ali na Esplanada, receber um laudo - encomen- nossa equipe de repórteres dado pela própria direção do flagra crianças trabalhando HUB - que acusava risco de em condições complicadas. desabamento. No bom e velho Várias viagens pelos lixões do comprometiDistrito Femento com a deral mosNossa obrigação é informação, tram outros comprar a briga e lá estava o pequenos na encarar os fatos Campus dislabuta. Sol, putando um poeira, caespaço com as câmeras, os lor e mau cheiro descrevem o gravadores e os microfones ambiente de trabalho das pesdos outros veículos. soas que tiram o sustento das A situação do HUB che- coisas que alguém jogou fora. ga para alongar a lista de Os fatos estão aí, as coisas perguntas sobre o futuro da acontecem e cabe a nós, jornaUnB. A nova ADUnB vai mu- listas, exercer a nossa função: dar a cara da universidade? correr atrás dos acontecimenAté quando será discutida a tos e tentar sempre trazer a paridade? Qual o destino das informação para você, leitor.

4 mil exemplares

No caso do HUB, os olhares da mídia se viram para nossa universidade. A função do Campus é mostrar outras faces da história. Mostrar para a comunidade universitária como os acontecimentos que mexem com a vida da redação influenciam a nossa universidade. É difícil competir com a experiência e a periodicidade dos outros jornais, mas é nossa obrigação comprar a briga, peitar a história e encarar os fatos. E no fim das contas, na hora de decidir o que vamos publicar, a equipe do Campus tem mais é que agradecer aos benditos fatos que insistem em acontecer. Cacau Araújo Editora-chefe

Na ressaca dos acontecimentos

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Secretária de Redação Rayane Mello Diretor de arte Beatriz Olivon Editores Alice Abbud (Mercado de Trabalho) Ana Carolina Oliveira (Cultura) Camila Louise (Entrevista e Zé Fini) Carolina Martins (Cidades) Cyntia Dutra (Esporte) Janaína Lazzaretti (Universidade) Janine Moraes (Fotografia) Priscilla Mendes (Variedades e Opinião) Fotógrafos Ana Paula Tolentino, Júlio Reis, Pedro Lacerda Repórteres Amanda Macedo, Camila Gonzalez, Carolina Menkes, Carolina Samorano, Fernanda Soares, Flávia Drummond, Flávia Maia, Juliana Braga, Luar de Morais, Marcela Ayres, Marcos Viana, Mônica Pinheiro, Patrícia Banuth, Telmo Fadul Diagramadores Jairo Faria, Josiane Lima, Júlia Cabral, Maísa Martino

:: Ombudskvinna *

pós o calor dos últimos episódios, com a ocupação da reitoria e então queda do ex-reitor Timothy Mulholland, a Universidade de Brasília debate os rumos que pretende tomar. A edição 325 do Campus traz essas discussões em três páginas do jornal, com o destaque que o assunto exige. A matéria “UnB ainda não tem candidatos” aborda as possíveis candidaturas para a próxima eleição, mas fica apenas nas especulações. Já a retranca “Paridade ainda é tema de discussão” está bem apurada e com bom encadeamento, além de abordar os pontos de vista de professores, estudantes e funcionários e trazer a legislação e dados históricos que contextualizam o que estamos vivendo. Neste caso, a retranca merecia o cargo de matéria principal. A entrevista “Para além do normal”, com uma das pessoas mais inacessíveis da universidade, o professor e coordenador do Núcleo de Estudos de Fenômenos Paranormais (NEFP), Álvaro Luiz Troconi, desperta a curiosidade do leitor. A página de esporte também atingiu seu papel, com o “Balé da equitação em Pequim”, uma temática diferente e relevante para o esporte brasiliense. Diferente destas, “Entre livros e fraldas”

Editora-chefe Cacau Araújo

abordou de maneira óbvia a história das mães universitárias, sem trazer dados novos ou informações interessantes ao público acadêmico. Como nas edições anteriores, Zé Fini fez sucesso com a tirinha “A lixeira do Timóteo”. O humor e sarcasmo do personagem despertam a curiosidade pelo que virá na edição seguinte, o que não aconteceu na primeira parte da página, com “Que calouro você é ou foi?”. Os títulos das matérias, em geral, estão bem criativos e atraem para a leitura. A diagramação casa bem fotografias com ilustrações e as cores estão bem trabalhadas. Enquanto jornal-laboratório, o Campus continua sendo um bom exercício para a prática dos estudantes. Mas desta vez, o desafio é diferente. O jornal, que tem caráter de revista, se adaptou para cobrir hardnews, sem perder a profundidade que uma publicação quinzenal exige. Ana Paula Leitão, Estudante do 7º semestre de Jornalismo da UnB *Ombudskvinna é o feminino de ombudsman, pessoa que analisa criticamente o jornal do ponto de vista do leitor.

Projeto Gráfico Alice Abbud, Amanda Macedo, Cacau Araújo, Carolina Samorano, Carolina Martins, Marcela Ayres Ilustradores Iúri Lopes, Leonardo Almeida, Mariana Capelo, Renato Moll Professores Responsáveis Marcelo Feijó, Márcia Marques, Rosa Pecorelli Secretário da Redação José Luiz Silva Endereço Campus Darcy Ribeiro Faculdade de Comunicação, ICC Ala Norte, Caixa Postal: 04660, CEP: 70910-900 Contato 3307 2464 - campus@unb.br Impressão Kaco Gráfica


Opinião

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

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:: Artigo

A

s cotas para negros nas universidades públicas ganharam um novo debate. A novidade está na discussão dentro do próprio movimento negro. A luta é racial, dizem uns. A luta é de classe, contestam outros. Para os que defendem as cotas, a luta nasce quando os brancos, mandantes, relegaram os negros, mandados, à exclusão que passa de um século. Os que acusam, afirmam que a questão é econômica e de educação. Todos, independentemente da cor, devem ter acesso ao ensino superior. Políticas afirmativas, como as cotas, são as raras medidas públicas feitas para erradicar uma desigualdade histórica. História de 120 anos, quando negros foram libertos das correntes das fazendas para se aglutinarem nas favelas, presos pelas amarras sociais, sem direitos, sem lembranças. O Brasil foi o único país onde, com o fim da escravidão, os donos de escravos que

Renato Moll

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receberam indenização. Entenda se quiser e se puder. Reserva de vagas para negros não é uma novidade no mundo. A novidade, porém, vem da situação de um país que insiste em camuflar as desigualdades provocadas pelo racismo. Outrora, Gilberto Freyre afirmou que nós, o povo miscigenado, vivíamos harmoniosamente, como uma pátria a céu aberto. As estatísticas do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), no entanto, contrariam a versão: entre os 15 milhões de analfabetos no país, 10 milhões são negros. A taxa de pobreza varia de acordo com a cor da pele. Entre os negros, 44,4% estão abaixo da linha da pobreza, ou seja, vivem com menos de um dólar por dia. Da população total, 53% dos pobres são negros. Seja classe ou seja cor, os números nos permitem ver que negros e pobres, no Brasil, são as mesmas pessoas. Observe, repito: da população total, 53% dos pobres são negros. Instituamos, pois, cotas

para pobres e verás quem estará lá. Os mesmos negros das cotas de hoje são os relegados à pobreza no passado. O Ipea ousou dizer, também, que só daqui a cinqüenta anos, caso as políticas afirmativas continuem, pobres e brancos serão iguais. Meio século ainda terão de esperar. Imagina quanto mais terão de aguardar pela melhora da economia, melhora da educação, por oportunidades. A medida deve ser urgente, agora. Ou deixar completar os 170 anos, como uma esperança eterna? Os negros, que representam hoje 49% da população brasileira, até o fim deste ano serão maioria. A presença deles nas instituições públicas, lugares tradicionalmente reservados à branca elite, não representam tão somente a presença de mais cidadãos na universidade. Significa trazer o debate, significa, mais tarde, mudança na economia, mudança na educação, mudança social. Gradativa, porém, urgente.

Pedro Lacerda

Ana Carolina Oliveira

:: Especialistas Correção social As cotas nas universidades significam uma política de promoção da igualdade. O aumento do número de negros dentro das universidades aponta uma mudança de paradigma social. Agora, é injusto considerar que pessoas de origens econômicas e raciais diferentes estejam em condições iguais para concorrer a vagas nas instituições. O que não entendem é que as cotas são políticas temporárias, não são eternas. Servem para que os negros, a partir daí, tenham acesso a outros lugares na sociedade, como mercado de trabalho e cargos antes ocupados só por brancos. Déborah Santos Coordenadora do Núcleo de Promoção da Igualdade Racial da UnB

Arquivo Pessoal

Cotas para quê?

Problemas invertidos No Brasil, a condição de classe é um fator determinante nas questões raciais. A partir desta constatação, reafirmamos que a luta de combate ao racismo deve estar ligada à luta de classes. E existe uma relação de subordinação entre elas. O que hoje passa pela luta sem tréguas aos que encontraram a saída mágica: defender a classificação racial oficial no Brasil, propondo sem nenhum pudor ou honestidade intelectual que se implantem aqui categorias raciais. Isso vai de encontro aos interesses dos donos do poder, paradigma no qual se sustenta a defesa das cotas e o Estatuto. Roque Ferreira Integrante do Movimento Negro Socialista

Charge :: Carta do

Leitor

Sou ex-aluno da UNB e li com prazer o saudoso e velho Campus. Deparei-me com o texto “O exercício na medida certa”. Gostei, mas a grafia de ‘KIVINNA’ necesssita ser corrigida. O correto, em língua sueca, é KVINNA. Não existe o “i” após o “k” inicial. Nildson Álvares Muniz Ex-aluno de Antropologia na UNB

:: Erramos No texto da página 9, “Paridade ainda é tema de discussão”, o nome do estudante de cinema da UFF é Alexandre Barreiro e não Barreto, como publicado. Na página 7, o órgão que deveria ser responsável pelo ordenamento territorial citado em “Fim de semana no Piscinão” é o Instituto Brasília Ambiental (Ibram).


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Entrevista

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Fotos: Pedro Lacerda

Chorinho rindo à toa

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m Espaço Cultural está a caminho para substituir o atual Clube do Choro de Brasília, inaugurado em 1977 e recentemente nomeado patrimônio imaterial do DF. O projeto foi um presente de Oscar Niemeyer, que se encantou com a contribuição cultural do Clube para o país. A idéia é manter as características originais que ajudaram a construir um público fiel. Essa é apenas uma das preocupações do jornalista, músico e presidente do Clube, Henrique Santos Filho - o Reco do Bandolim. O baiano de sotaque suave, perceptível ao falar as palavras ‘menina’ e ‘rapaz’ no final das frases, vive dias agitados. Um dos sinais está em seu celular, que durante a entrevista não pára de tocar. As muitas ligações, entre elas de seu pai com elogios e um convite para apresentação em Portugal, não impediram Reco de conversar com o Campus com a calma e a paciência de um baiano. Carolina Menkes

Campus: O que é o choro? Reco: É um gênero que está na base da música brasileira, a primeira manifestação popular nacional. Representa a nossa maneira de ser, nossos costumes e hábitos. Descendente da Polka, (dança européia em pares que encontrou no Brasil um ambiente receptivo para se desenvolver), o choro não começou como gênero musical. Mas um grande flautista brasileiro – Joaquim Antônio da Silva Callado – passou a interpretar o choro de maneira diferente. Uma coisa era ouvir polka tocada por uma grande orquestra européia, outra era ouví-la com violão, flautinha e cavaquinho. Esses são os primeiros sinais do choro. Só depois foi agregado o sotaque do colonizador, do negro, da música religiosa. Hoje ele está crescendo e é tão generoso e profundo, que passa a ser de novo uma linguagem musical.

Por que os músicos normalmente E qual é a importância do Clube do consideram o choro um gênero di- Choro para a cidade? fícil de se tocar? Está em trazer à tona e apresentar, Porque as músicas no choro uti- principalmente para a juventude, o lizam instrumentos acústicos. lado extraordinário do nosso país: a O choro tem uma estrutura complexa, criatividade, a riqueza, a diversidade uma harmonia nada simples e, em ge- cultural. O marketing tem transforral, tem melodias com um mado tudo em produto balanço que exige suinO choro tem uma comercial, mas o que é gue e habilidade. Quem melodia que exige apresentado na televisão quer tocar tem que estunão é o Brasil. Os grandes suingue e habilidade dar, se dedicar e ter um artistas estão se reunindo pouco daquilo na alma. em pequenos espaços, sem cobertura da mídia. Por que Brasília é considerada a capital do choro? No final de abril, o clube recebeu o Principalmente por causa do traba- título de patrimônio imaterial do lho que fazemos aqui e da seriedade DF. O que levou a essa nomeação? da Escola de Choro Raphael Rabello O tombamento é um reconhecimento (homenagem a Rabello, um dos maio- explícito principalmente da população res violonistas brasileiros, falecido em de Brasília que freqüenta o clube. E é 1995), pioneira no país. Brasília tam- um prestígio que atravessou fronteibém tem talentos que se desenvolve- ras! Já recebemos artistas de outros ram aqui, como Hamilton de Holanda países com interesse na música brasie Gabriel Grossi. leira. Paris, por exemplo, já tem um

clube do choro. Recentemente, nós participamos de um evento na África. Ano passado, recebemos do Presidente da República o prêmio de cultura mais importante do Brasil: a medalha de honra ao mérito cultural. O tombamento também reconhece o resgate e a releitura da obra de grandes autores. A cada ano, escolhemos um nome importante nesse cenário. O escolhido do ano foi Tom Jobim e ano que vem provavelmente será Baden Powell. Na prática, o tombamento fará diferença para o clube? Deve ter mais prestígio, principalmente do ponto de vista institucional. Quando se incorpora ao patrimônio cultural da capital da república, é um bem que pertence ao povo. Esse é o tempo de a gente demarcar o nosso território cultural. Uma iniciativa como essa ressalta a música brasileira que, ao lado do futebol, talvez seja o nosso melhor produto.


Entrevista

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

aquela surpresa, a alegria de ouvir. Foi o momento em que eles se reconheciam brasileiros. Vieram falar comigo depois: não conheciam o choro, não sabiam quem era Pixinguinha e, ainda assim, se reconheceram naquela música. Sou baiano, adoro minha terra, mas quando chego no carnaval de Salvador, por exemplo, e vejo aquela festa enorme, até reconheço alguma arte, mas a música não é a música brasileira. Não é a nossa cultura.

Por que, na sua opinião, o chorinho deve ser preservado? Quando assumi a presidência do Clube, em 1993, o choro estava em situação difícil. Não tinha mais espaço por causa da influência do marketing em sentido contrário. A cultura precisa ter um espaço especial se queremos que o país evolua. É o que faz com que as pessoas se reconheçam como um povo. Li uma vez que quem quiser entender o espírito do povo brasileiro em todos os seus aspectos, deve ouvir Pixinguinha. Aí sim vai compreender bem a nossa alma. A Escola Raphael Rabello ficou pronta depois de muita luta. Como foi até que isso acontecesse? Houve muita incompreensão por parte do Ministério da Cultura, que alegava já existirem escolas de música em Brasília. Inicialmente, eu, o Carlos Henrique (irmão dele) e o Ruy Fabiano (irmão do Raphael Rabello)

queríamos montar a escola. Depois de três anos de luta, o Carlos e o Ruy desistiram. Mas eu continuei, inspirado em meu próprio exemplo, porque tive muita dificuldade ao aprender a tocar bandolim sozinho. Já a partir da fundação, em 1998, surgiu interesse da juventude na nossa música. É aquela velha história: o que não é visto não é lembrado. Qual é a faixa etária dos freqüentadores do Clube do Choro? O clube tinha freqüência de pessoas muito maduras e de repente a faixa etária começou a cair. Hoje encontramos pessoas de todas as idades. Certa vez, no começo do clube, havia um casal bem jovem que ia pela primeira vez. Naquele dia, Altamiro Carrilho tocava “Carinhoso”, do Pixinguinha. A casa estava cheia e eles estavam sentados no chão, olhando Altamiro tocar. Eu pude ver a fisionomia dos dois se decompondo com

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zer um lugar com as mesmas características mas sem os inconvenientes do atual. Além disso, o lugar não será muito maior: apenas ampliaremos os 300 lugares para 450, o que ainda permite manter o silêncio. O grande interesse do Clube do Choro é a música.

Desde quando a parceria com a UnB já era pensada? Quais são as iniciativas previstas? Nós já vínhamos tentando a parceria desde a gestão do Lauro Morhy Há intercâmbio entre o clube e ou- (1997-2005). Todos os grandes totros locais semelhantes no país? cadores de choro foram autodidatas Sim, inclusive temos a prioridade e nosso desejo era justamente levar o de criar, em parceria com a UnB, um gênero para a universidade. Quando centro de referência no vem alguém do exterior, Clube do Choro para sua expectativa é aprenA maioria dos reunir um material professores universi- der música brasileira na substantivo de todo o universidade, mas acaba tários de música não Brasil. O objetivo é ir encontrando música erutocam, são apenas à Bahia, Pernambuco, dita. A maioria dos proRio (onde já conversou fessores universitários, teóricos com filha do Jacob do no Brasil, não tocam, Bandolim), e trazer tudo para o proje- são apenas teóricos. O que esperamos to do Niemeyer, o Espaço Cultural do é ter gente que toque, que conheça a Choro, que vai substituir o Clube. realidade popular. Pretendemos criar um curso de choro na universidade e E como anda o projeto? que os alunos da UnB possam cumprir Niemeyer tomou conhecimento do créditos na escola do clube. clube e da sua importância cultural pela TV Senado e resolveu participar. Como é ser considerado um dos A licitação já foi feita. Precisamos co- maiores bandolinistas do Brasil? brar do governador, pois as obras já de- Sinto-me muito feliz, mas minha meta veriam ter começado. O Espaço Cultu- mesmo é tocar, acho que a música é ral vai ser ao lado do Clube do Choro: isso. Vi um documentário do Nelson terá a escola, uma sala de espetáculos... Freire que me chamou muito a atenção: ele diz que o músico nunca deve Não haverá reclamações por parte do estar à frente da música, deve estar público que já é fiel ao atual local? dentro da música. Isso define bem o Não, porque fizemos questão de fa- que eu penso.


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Cidades

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Sem tempo para brincar Foto: Janine Moraes

No Distrito Federal, 23 mil crianças entre 5 e 13 anos trabalham, muitas delas como catadores nos lixões. O contingente de mão-de-obra infantil e adolescente chega a 1,4 milhão no Brasil de água parada, criadouro de mosquitos. Fezes humanas se misturam com a dos animais e há papel higiênico usado por todos os lados. Daniel, 15 anos, parou de estudar na 5ª série e há dois meses freqüenta esse ambiente insalubre. Ganha R$ 0,40 por quilo de material recolhido. Geisson, de 11, está por perto e ajuda a mãe, Valdirene, a encontrar material reciclável. Usa como ferramenta de trabalho uma faca, com a qual abre as sacolas para a mãe vasculhar. Aparentemente despreocupado, diz que está matando aula porque quer. "Ele mais atrapalha que ajuda. Se o Conselho Tutelar vê ele aqui, vou ter problema”, Além do sustento, crianças procuram brinquedos no lixão para encontrar parte da infância perdida reclama Valdirene. As cenas mudam, mas a siFlávia Maia o fluxo de pessoas, cachorros e "Quero que ele arrume um tuação é a mesma. No coração caminhões é intenso. O cheiro serviço melhor que esse”. de Brasília, em plena Esplanainguém chega ao li- é horrível e aumenta cada vez A poucos metros, Ismael da dos Ministérios e diante do xão da Vila Estrutu- que se pisa em alguma sacola. Salustiano, 17, procura sucata poder político do país, Tales e ral sem se pendurar O sol forte piora o mau chei- para vender, mas tem o traba- Brendo, de 14 e 12 anos, venna traseira de um caminhão ro. A poeira dos caminhões lho interrompido por um poli- dem balas no semáforo às 11 de lixo ou percorrer cerca de suja a carne que alguns cata- cial militar: "Não aparece mais horas da noite. Os meninos três quilômetros a pé por uma dores assam em churrasqueira aqui, menino". Os catadores garantem que estudam pela estrada de terra molhada de improvisada. O rasante dos que viram a cena contaram que manhã . Um mora em Ceilânchorume, líquido viscoso que urubus causa incômodo. "Eles a maioria dos garotos só vai dia, o outro em Riacho Fundo, e voltam para casa escorre dos sacos. Enquanto são os guardiões do lixão", quando precisa no último ônibus leva a reportagem do Campus grita um deles. de dinheiro. ao local, o motorista Linton Lismar Viana, hoje com Em outro ceGeisson, 11 anos, que sai da rodoJohnson conta que sempre dá 23 anos, trabalha ali desde os nário, Valparaíusa uma faca para viária do Plano Piloto. Tiram, carona para crianças. “Elas sete. Naquela época, segundo so de Goiás, no ajudar a mãe a em média, de R$ vêm buscar sucata e restos de informa, não “tinha essa fres- entorno do Discomida”, explica. De vez em cura” de proibir menores no trito Federal, a buscar sucata no lixão 30,00 a R$ 70,00 por dia para ajuquando, a fiscalização apare- lugar, mesmo que fosse para história se repece e proíbe sua entrada, como evitar acidentes, muito co- te: crianças catam lixo em um dar nas despesas dosmésticas. Vinícius, de 11 anos, trabaaconteceu no início de maio. muns no local. O próprio ra- lote baldio no Bairro do PacaMas a repressão é esporádica paz já foi vítima: uma vez caiu embu, área de um motel de- lha até uma da manhã na cane basta os policiais saírem para uma tampa de caçamba sobre molido que foi transformado tina da família, na Asa Norte. as crianças voltarem. sua cabeça. O catador tem um em lixeira das casas da redon- Dudu, de sete, se esconde dos O lixão da Estrutural é filho de três anos e garante deza. A água da chuva, mistu- seguranças do Conjunto Nauma área de 154 hectares. Ali, que jamais o levaria ao lixão. rada ao chorume, forma poças cional para vender chicletes

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sem ser incomodado. Flávia vende balinhas no ônibus para contribuir com o sustento de seus quatro irmãos.

Na contramão do país A pesquisa Pnad/IBGE mostra que no Distrito Federal 96,4% das crianças e adolescentes ocupadas estão na cidade: na informalidade ou no trabalho doméstico, ao contrário da maioria das regiões no Brasil, cujo maior percentual está em atividades agrícolas (41,4%). Segundo a deputada distrital Érika Kokay (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa, o Distrito Federal se encontra na contramão do resto do país. “Entre 2004 e 2006 houve uma redução do número de crianças e adolescentes trabalhadores no Brasil (200 mil), enquanto no DF aconteceu um aumento de seis mil". O orçamento para a erradicação do trabalho infantil em 2007 era de R$ 4.825.906,00, segundo números da Comissão, porém só foram usados 8,85% do valor. Dos R$ 2.983.876,55 reservados para o primeiro trimestre de 2008, nada foi executado, como reconhece a representante da Secretaria de Desenvolvimento Social do DF na Comissão de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, Gláucia Beatriz. “Há pouca procura das famílias aos programas de Assistência Social, mas uma campanha está sendo realizada para aumentar a adesão". Valéria Gonelli, Diretora do Departamento de Proteção


Cidades

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Social do Ministério do De- rados com a compra de equisenvolvimento Social, analisa pamentos, como brinquedos e a situação como um problema eletroeletrônicos. também cultural. "Os pais desA Secretaria de Desenvolvisas crianças cresceram traba- mento Social do Distrito Fedelhando e acham que seus filhos ral fez um cadastro das criantambém devem trabalhar. Esse ças que trabalhavam no lixão é um valor muito forte". Além da Estrutural e, após análise disso, o Estatuto da Criança dos dados, deverá encaminhar e do Adolescente (ECA) não o resultado aos programas de pune pais e empregadores, a auxílio e educação. Gláucia não ser quando Beatriz garante constata que as que uma equipe crianças estão Só 8,85% da verba do GAE (Gesendo submetidas rência de Ações para o fim do a condições insaSociais) fiscaliza trabalho infantil lubres ou de maus o local 24 hofoi usada tratos. “Eles são ras por dia, nos apenas responsafins de semana bilizados”, explica Gonelli, su- e feriados. gerindo que a população não Quanto à situação no Encompre mercadorias vendidas torno, o problema é do goverpor crianças em semáforos e no de Goiás. E não se pensa, bares. "Isso é uma forma de pelo menos por enquanto, em fomentar o trabalho”. planos de ação conjunta. Enquanto o problema está nas ruas, o poder público Brinquedos e sucata se digladia: de um lado, há Rivaldo, de sete anos, gosta a denúncia de que os Coses do Pica-pau e dos desenhos (Centros de Orientação Sócio- de Tom & Jerry. Conhece deEducativa) do DF prestam talhes do caso Isabella Narum serviço precário, pois falta doni, gosta de jogar pebolim, mão-de-obra e muitas crian- futebol e torce pelo Flamengo. ças e adolescentes abandonam Quando crescer quer ser bomas atividades complementares beiro, para apagar incêndios. oferecidas. Do outro, a jus- Sua família veio do Pará e ele tificativa de que houve con- tem quatro irmãos. tratação de funcionários em O menino é uma das 80 regime de urgência, e que os crianças flagradas trabalhanCoses vêm sendo reestrutu- do no lixão da Estrutural em

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Horário Reduzido Quem usa o Eixão para caminhar terá seis horas a menos de lazer. A partir de 24 de maio, a pista funcionará das 6h às 12h, aos domingos e feriados. Segundo o secretário de Transportes do DF, Alberto Fraga, a redução é para não agravar os congestionamentos. A medida pode gerar protestos a favor da reabertura da via. O presidente da ONG Rodas da Paz, Maurício Gonçalves, afirma que a iniciativa é um ensaio para o fim do Eixão do Lazer.

Publicidade kitsch

“Não gosto de brincar, de vez em quando jogo bola”, conta Tales

fevereiro deste ano, aonde ia para procurar brinquedos e catar sucata para vender. Hoje, ele participa do Projeto Viver, organização não governamental que presta assistência a 227 crianças e adolescentes carentes, de sete a 16 anos, desde 1997. A instituição recebe ver-

ba para oferecer educação complementar aos meninos, mas segundo seu presidente, Coracy Coelho, não é possível atender a demanda. "Há mais de cem crianças na lista de espera. Se elas não forem socorridas, voltam para o lixão por falta de alternativa", adverte ele.

O livro "O kitsch e suas dimensões", da professora de Publicidade da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, Christina Sega, chega às livrarias nessa semana. O livro oferece um giro pelas artes plásticas, publicidade e meios de comunicação traçando um panorama sobre a tênue linha que separa o brega do cult, o chamado kitsch.

Segurança pública Má notícia para os que andam de ônibus. Roubos em coletivos aumentaram 65% na capital, em comparação aos quatro primeiros meses de 2007 e ao mesmo período de 2008. O dado foi divulgado esse mês pela Secretaria de Segurança Pública do DF. Entre os transportes alternativos, a diminuição dos roubos foi de 68%. Pudera, o transporte está praticamente extinto na cidade.

Lismar Viana trabalha no lixão desde os sete anos e imagina um futuro diferente para o filho: "Quero que ele tenha um emprego melhor"


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Universidade

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Interdição no HUB prejudica alunos Em seis meses, 18 mil pacientes ficarão sem atendimento no Pronto Socorro. Ainda assim, principais afetados serão os universitários que utilizam o local como laboratório-escola

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paralisação da emergência do Hospital Universitário de Brasília (HUB) na última quintafeira, 15, atrapalha estudantes da Faculdade de Saúde. Um laudo técnico feito a pedido do hospital constatou rachaduras entre 10 e 80 centímetros no piso do prédio do Pronto Socorro que comprometem a sua estrutura. A área foi desocupada e alunos buscam meios de não atrapalhar o ensino. Os setores afetados diretamente foram os atendimentos de urgência da Pediatria e Clínica Médica. O aluno do 11º semestre da Medicina Marcelo Xavier explica que a segurança do HUB esvaziou o prédio, alegando risco de desabamento. "Foi uma correria. Os alunos foram retirando os doentes que estavam no local e reacomodando-os em outras alas". Ele esclarece que os estudantes continuam consultando os pacientes que foram realocados, mas ninguém sabe como será nos próximos dias. Segundo o diretor do hospital, João Batista de Sousa, os doentes que apresentaram

melhoras receberam alta. Os outros 36 foram transferidos para a Enfermaria e a Área Cirúrgica do próprio hospital. Não houve transferências externas. Os 90 funcionários que trabalhavam no Pronto Socorro estão auxiliando os enfermos remanescentes. Uma das alternativas é a transferência do pronto atendimento para o Hospital Regional do Paranoá (HRPa). É a possibilidade mais viável, pois o HRPa faz parte do Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde, que prevê a integração das atividades de ensino da UnB ao serviço público de saúde. De acordo com Pablo Valente, aluno do 7º semestre de Medicina, os estudantes da Faculdade de Saúde receberam a notícia de forma distinta. Ele afirma que alguns acreditam que a mudança será prejudicial, pois o HRPa não possui infra-estrutura de um hospital-escola. Já outros se mostram satisfeitos diante da oportunidade de trabalhar com serviços que o HUB não oferece, como o programa de Medicina da Família. Em coletiva na última sex-

Rachadura de cerca de 50 cm na Pediatria do Pronto Socorro

Fotos: Janine Moraes

Juliana Braga e Patrícia Banuth

Desde a última quinta feira, em média cem pacientes deixam de ser atendidos por dia na Emergência

ta-feira, 16, o diretor do HUB ponderou que, apesar de afetar a população, o maior prejuízo será acadêmico. "O hospital não atende mais de 2% dos casos de emergência do DF", justifica. Desde a interdição, poucos pacientes procuraram o local. "A imprensa divulgou que estamos fechados, e para os que não sabem, colocamos um cartaz na porta do hospital", ressalta o assessor Ricardo Menezes. Nos seis meses em que ficará parado, o Pronto-Socorro deixará de atender 18 mil pacientes. O curso de Medicina dura, em média, 12 semestres. Nos últimos quatro os alunos fazem um estágio obrigatório no HUB, o internato. Durante duas semanas do 10º período passam pela Clínica Médica, e por três semanas do 11º semestre, lidam com a Pediatria. Após a conclusão do curso, há ainda a residência, que é uma

espécie de pós-graduação e dura cerca de dois anos. Rafael Jardim, do 11º semestre, acredita que apesar de a estrutura ser antiga e necessitar de reformas, os demais problemas não inviabilizam seu funcionamento. "O prédio do ambulatório, por exemplo, era uma escola que foi cedida ao HUB. Sua estrutura não é a ideal, mas funciona", afirma. Situação semelhante ocorre no Hospital Universitário Cassiano Antônio de Morais (Hucam), da Universidade Federal do Espírito Santo, onde antes funcionava um sanatório. De acordo com um aluno do 7º semestre de lá, que não quis se identificar, o hospital capixaba não tem alojamento e alguns pacientes têm de dormir na grama. "Boa parte dos problemas são diagnosticados e tratados no próprio hospital, pois tem os melhores profissionais do estado", diz.

O Laudo A Infrasolo-Fundex, especializada em recuperação de fundações e estruturas, foi contratada pelo HUB há dois meses para analisar as condições do prédio da Emergência. Segundo o presidente da empresa, o professor da Engenharia Civil Dickran Berberian, o laudo ficou pronto uma semana antes da evacuação da área, no dia 15 de maio. Sob a estrutura do HUB, encontra-se um solo vermelho poroso. "Se for saturado por água de chuva ou por vazamento de esgoto, ele cede. Em outras palavras, é o que ocorre quando se coloca um biscoito de polvilho na boca - ele derrete", explica Berberian. Isto também é constatado na Asa norte, no Gama e em Santa Maria. Uma solução é a construção de fundações mais profundas, de 6 a 8 metros, já que o terreno superficial do solo vermelho é poroso e fraco. Na ala de emergência do HUB não havia fundação alguma, mas a da estrutura principal do hospital tem 15 metros.


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Longo histórico de problemas Reitor garante que R$ 3,8 milhões resolverão a situação da Emergência do Hospital Universitário em breve, mas há outras dificuldades estruturais Juliana Braga

A

rachadura do Pronto-Socorro revela a estrutura frágil do hospital universitário de Brasília (HUB). Projetado em 1969 a pedido de Garrastazu Médici, seu objetivo era atender, originalmente, apenas os presidentes da República, e por isso ele só dispunha de um leito na UTI. A lógica militar não levou em conta as necessidades da população. Os prédios são reaproveitados de estruturas de outros estabelecimentos e isto compromete a funcionalidade dos edifícios. Um exemplo é a existência de apenas um corredor ligando todas as áreas, ao invés de pelo menos dois corredores: um para a circulação pública, e outro, esterilizado, para uso dos médicos e pacientes, o que evita o contato com bactérias

Soluções

trazidas de fora. O perigo de infecção hospitalar é grande, o que só não acontece devido ao bom serviço dos funcionários, segundo o professor Frederico Flósculo, especialista em Arquitetura Hospitalar. Outro problema é que a Emergência fica no local mais isolado do hospital, e o acesso dos pacientes é dificultado. Além disso, ali funcionou um complexo fisioterápico com várias piscinas, o que pode ter comprometido o solo e ocasionado o afundamento de 80 centímetros do piso da Pediatria e da Clínica Médica da Emergência. "É um verdadeiro milagre o prédio não ter rachado antes", diz Flósculo. Se não bastasse, os quatro terrenos onde estão os prédios do HUB formam uma espécie de colcha de retalhos: o corpo principal pertencia ao Ministério da Previdência Social.

para fornecedores de comida, remédios e outros produtos. Na época, a diretoria do hospital reclamava do peso da folha de pagamento, que fechava em débito de R$ 1,5 milhão por mês. A falta de servidores concursados exigia que o HUB contratasse cerca de 800 terceirizados, que precisavam ser pagos com recursos do próprio hospital. Em abril de 2007 os serviços do Pronto Socorro e da Internação do HUB foram paralisados porque os seis elevadores do centro Cirúrgico e da Clínica Médica estavam quebrados. Vazamentos de água nos prédios causaram o problema. Em fevereiro do mesmo ano, a maternidade e o berçário passaram 11 dias parados por falta de profissionais na Pediatria. Na época, a direção do hospital interrompeu o estágio de 84 internos.

propostas

Trazer a emergência, que fica no final das instalações, para mais próximo à entrada do hospital

Ligar os quatro edifícios com passarelas aéreas para isolar os pacientes durante as transferências Marcela Ayres

Já no Ambulatório, que funciona em uma antiga escola da Fundação Educacional, as salas foram divididas. Como até hoje os interruptores permanecem centralizados, se a luz for apagada em uma delas, todo o resto fica às escuras. Duas vias públicas separavam os terrenos até o ano passado, quando a UnB obteve o direito de posse do local. Antes disso as obras eram freqüentemente embargadas . De qualquer forma, até hoje não há como transferir pacientes de um prédio para o outro sem a utilização da via externa, o que expõe as pessoas a riscos e constrangimentos. Em 2006, o HUB ameaçou interromper novamente as atividades devido às dívidas, que acumulavam R$ 40 milhões. Desse total, R$ 32 milhões eram para a Caesb e para a CEB e R$ 8 milhões

Construir corredores distintos para circulação do público e de médicos e pacientes

Individualizar as salas do Ambulatório, adaptando-as às especificidades do atendimento hospitalar

Trégua da

9

crise

A auditoria instaurada pela Reitoria, Ministérios Públicos Federal e do DF e Controladoria Geral da União propõe uma trégua à crise interna para clarear as irregularidades na Universidade. A investigação começa nas contas da instituição, recolhidos no Centro de Processamento de Dados e na Editora da UnB, pela Polícia Federal. "A Editora virou agência de financiamento ao invés de publicadora de obras", denuncia o reitor Roberto Aguiar.

Vagas para Federais A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que institui 53.257 cargos para servidores e professores nas universidades e escolas técnicas federais. Desses, 14 mil estão reservados aos docentes. O restante será dividido entre técnicos-administrativos e tutores de educação básica. As vagas devem preencher a demanda do Reuni, plano de reestruturação e expansão das universidades federais. O projeto aguarda aprovação do Senado.

Outros Horizontes Onze novos cursos serão ofertados nos campi de Planaltina, Gama e Ceilândia. A medida faz parte do Projeto de Expansão da Universidade, que cria 560 vagas. Embora a previsão seja de que os prédios de Planaltina e Gama fiquem prontos apenas em meados de 2009, cursos de tecnologia e saúde também serão contemplados nestas unidades. As aulas serão ministradas em locais provisórios ainda no segundo semestre deste ano.


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Menos poder para as fundações

Crise

na

UnB

No momento em que a transparência torna-se palavra de ordem na reestruturação da UnB, reitor provisório sinaliza ruptura com as instituições de apoio e defende autonomia de gestão

o Almeida

Leonard

Marcela Ayres e Patrícia Banuth

A

UnB trará para si a responsabilidade de administrar contratos e convênios que eram terceirizados às fundações. A decisão foi tomada junto à Controladoria Geral da União e os ministérios públicos Federal e do Distrito Federal e Territórios, e será formalizada por um Termo de Ajuste de Conduta nas próximas semanas. No instante em que a Universidade abre suas portas para auditorias, a discussão entre público e privado ganha força. Como resultado, são redesenhados contornos que justificam ou contestam a existência das fundações. O reitor pro tempore, Roberto Aguiar, garante que as relações com a Finatec (Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos) vão mudar. "Ela pode continu-

Conseqüência

do

ar existindo, mas não trabalhará com dinheiro público e nem prestará serviços à Universidade", assegura. Apesar disso, a Fundação trabalha na reconstrução de sua imagem. O ouvidor Aryosvaldo Sales está entre os quatro funcionários contratados após a crise e acredita que a credibilidade será restaurada até o fim do ano. "Apoiamos mais de três mil projetos e cerca de 260 estão em andamento". Ainda que a palavra de ordem seja o resgate de imagem, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu, no último dia 13, realizar auditoria em todas as fundações ligadas às universidades federais. O TCU utilizará valores de mercado para determinar se há superfaturamento na prestação de serviços. Marcela Gouveia, gerente de Projetos da Finatec há oito anos, garante que, embora a Fundação tenha sido afetada

por escândalos que culminaram com a renúncia do então reitor Timothy Mulholland, "do ponto de vista das pesquisas, editais e projetos tudo funciona normalmente". No entanto, o ministro do TCU, Aroldo Cedraz, suspendeu o repasse de R$ 30,7 milhões do Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais) à Fundação no dia 16 de abril. No início do mês, o Ministério Público Federal pediu a rescisão de contratos entre a FUB (Fundação Universidade de Brasília) e a Finatec. A verba para expansão do campus havia sido liberada pelo Ministério da Educação, mas a Fundação foi contratada sem concorrência pública. Amparo legal Funcionar como unidade gestora é um dos papéis das fundações de apoio. Criadas

pelas universidades públicas, elas são instituições privadas que se consolidaram a partir de 1993, no governo de Itamar Franco. A lei nº 8958/94, promulgada nesse período, diminuiu a burocracia no financiamento de projetos acadêmicos e previu a dispensa de licitação em alguns casos. Dois anos depois, verbas para pagamento das universidades foram centralizadas no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal. Antes, eventuais sobras eram aplicadas no mercado financeiro e os rendimentos destinados às Instituições Federais de Ensino Superior. A nova medida impediu a utilização desses excedentes e as fundações de apoio tornaram-se uma alternativa à captação de recursos. O secretário-geral do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, Luiz Henrique Schuch, acredita que, com a falta de contratação nas universidades, o Governo Federal contribuiu para o fortalecimento das fundações. A conseqüência foi o desaparecimento de setores, entre eles o de gerenciamento de projetos. De acordo com ele, a lei de licitação que agiliza as demandas das fundações é a mesma que rege o serviço

público. "Os órgãos públicos devem ter caixa único. Estamos diante de um caixa dois que querem oficializar". O coordenador-geral do Diretório Central dos Estudantes da UnB, Fábio Felix, divide a opinião e defende a extinção das fundações, já que a FUB tem condições de gerenciar recursos. "São criadas entidades parasitas que fortalecem a lógica de privatização na Universidade. Ao invés de a UnB colocar R$ 30 milhões do Reuni na Finatec, essa verba deveria ficar na Universidade através da FUB". Se por um lado há os que associam as fundações à privatização do ensino público, outros as defendem como garantia de sobrevivência das universidades diante da contínua redução do envio de verbas do Estado. Segundo o diretor da Faculdade de Tecnologia (FT), Humberto Abdalla Junior, são necessários R$ 4 milhões para o funcionamento ideal da Faculdade. Contudo, o plano de orçamento do MEC prevê liberação de cerca de R$ 270 mil à FT. "Se a UnB fosse ágil para captar recursos, as fundações não seriam necessárias. Os R$ 70 mil do Fundo de Apoio Intitucional são representativos diante da verba do MEC".

Escândalo Fundação continuasse a gerir os recursos. Os estudantes estão à procura de empresas

Criado por alunos de Engenharia Mecânica, o projeto visa participar da competição

gestoras particulares, mas do total arrecadado, no minímo 10% são abatidos com taxas,

anual SAE Brasil Aerodesign - torneio entre aeronaves radiocontroladas, feitas por uni-

e outros 17,5% com impostos. O projeto perderia quase 30% do fundo de auxílio que

versitários. A Finatec mediava os recursos captados junto aos patrocinadores a custo

era revertido integralmente para o grupo. Para o capitão da equipe, Marcos Felipe Bar-

zero e os materiais comprados pelos estudantes eram reembolsados. Após os últimos

bosa, o retorno da Finatec como unidade gestora não ocorre, pois a imagem dela ficou

escândalos, a Infraero, principal patrocinadora do grupo, recusou manter o apoio caso a

manchada junto aos patrocinadores. Por enquanto, os alunos arcam com as despesas.

Pedro Lacerda

Até 2007, a Finatec era a unidade gestora do grupo de aeromodelismo Draco Volans.


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Crise

na

UnB

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Troca de idéias é desafio da nova ADUnB A direção eleita do sindicato dos professores pretende reagrupar docentes da universidade para superar a atual crise, mas enfrentará pluralidade de opiniões sobre o sindicalismo e a gestão da UnB

N

enhum cartaz, carro de som ou distribuição de folderes no Ceubinho. Os dias que precederam a vitória do professor Flávio Botelho e sua equipe à diretoria da ADUnB (Associação dos Docentes da Universidade de Brasília) foram silenciosos e de aparente tranqüilidade. Entre os tutores mobilizados, o período eleitoral passou longe de ser um mar de rosas, uma vez que expôs diferentes estratégias dos educadores para o enfrentamento da crise. De olho nisso, a nova diretoria quer reunir todos os

professores "de volta à casa" e discutir os assuntos da categoria. Mas desde já, o cenário político da UnB demonstra posições divergentes principalmente quando o assunto é paridade, fundações e mobilização sindical docente. Um ponto que gera apreensão entre os segmentos de oposição é como o perfil da diretoria influenciará na escolha do reitor. A nova equipe é contrária à antiga gestão da ADUnB e do ANDES-SN (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior). A gestão eleita garante que fará um "novo" sindicalismo, priorizando demandas históricas dos docen-

Entrevista: Flávio Botelho Após disputar três vezes a diretoria da ADUnB, professor da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, Flávio Botelho, foi eleito com 56% dos votos. Opositor à última diretoria, para ele o principal compromisso de sua gestão será o diálogo com os docentes. C - Qual será o posicionamento da diretoria em relação às fundações? FB - Nossa chapa é plural. Acho que as fundações são um mal necessário. Para ter uma universidade de excelência deve haver flexibilidade. Deve existir monitoramento e controle nas fundações. O Governo lançou decretos que regulamentam essas instituições. Temos que estudar tudo isso para traçar uma estratégia. C - Como respondem à acusação de serem ‘timothistas’? FB - Certamente tem gente que votou em nós e participou da gestão do professor Timothy. Não é certo associar qualquer pessoa daquela direção ao símbolo do erro. Nossa chapa foi a única que não apoiou a paridade explicitamente. A meta é discuti-la para sabermos qual é a posição da categoria.

tes, como aumento salarial e a criação de um plano de saúde. Mesmo com propostas trabalhistas, a chapa eleita tem sido acusada por alguns grupos de alunos e professores de ser conservadora e "timothista". Para alguns docentes, o pleito mostrou como os candidatos se mobilizarão na eleição para a reitoria. Na opinião da professora Rita Segato, que concorreu à presidência da ADUnB pela chapa 2, o processo eleitoral revelou o comportamento e a opinião dos que compareceram às urnas. "Na chapa 1 votaram aqueles que se sentem ameaçados de compartilhar o poder com outros segmentos", aponta Segato. "É uma coalizão que representa uma boa parcela de votantes, mas ainda não sabemos o que isso significará para os professores que votarão no próximo candidato a reitor", acrescenta . Prestes a deixar o cargo em junho, a educadora Rachel Nunes, atual presidente da entidade, reforça que a escolha não deverá influenciar as eleições. "O sindicato tem que ser independente, não pode estar aliado à gestão política, nem ao pro tempore, ou ao reitor eleito. Temos que ter autonomia e independência". Se depender do novo presidente, esse não será um problema da gestão que segue até 2010. Para Botelho, há uma dificuldade histórica da entidade, pois ex-dirigentes e afiliados se candidataram várias vezes à reitoria. "O sindicato já gerou alguns nomes. Eu acho isso muito ruim. A

Fotos: Janine Moraes

Mônica Pinheiro

Durante a apuração, candidatos da chapa 1 e 3 já sabiam quem venceria

ADUnB tem que se concentrar na questão sindical e não deve ser usada como trampolim por candidatos a reitor", conclui o professor. Campanha rompida O tripé formado por estudantes, professores e funcionários na Campanha pela Paridade pode perder força com a nova gestão. Durante a campanha, o DCE (Diretório Central dos Estudantes) manteve a posição de "Todos contra a chapa 1", sem optar pelas chapas 2 ou 3, cujos professores apoiaram os universitários durante a ocupação da reitoria, em abril deste ano. Antes de confirmar voto sobre a paridade, a equipe quer discutir o assunto com toda a comunidade docente.

E em seguida, negociar com os demais segmentos. Botelho critica que o tema da paridade só aparece em época de eleição e, por isso, "não é a questão central da universidade". Segundo ele, o desafio é reunir a categoria e discutir formas de melhorar a universidade. Luísa Oliveira, coordenadora do DCE, acredita que o diálogo se torna difícil pelo "antagonismo" na política das duas entidades. Para ela, a campanha seguirá nos colegiados e nas salas de aula. "Tem um conjunto da universidade se juntando para isso e existe uma possibilidade real de conseguirmos as eleições paritárias e o congresso estatuinte paritário. Vamos nos mobilizar muito para democratizar a universidade", ressalta.


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Mercado de Trabalho

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Os lucros compensam os riscos A implementação do Home Broker, ferramenta que permite o investimento em ações via Internet, aproximou o jovem da bolsa de valores. Hoje, eles são 25% das contas registradas na Bovespa Carolina Samorano

L

ui Veronese é um aluno como todos os outros da Universidade de Brasília, tem 19 anos e cursa o 5º semestre de Administração. Não dispensa um cinema, zoa com os amigos nos fins de semana e é um cozinheiro de mão cheia. Herdou a habilidade do pai e adora criar pratos mirabolantes. Há pouco mais de um ano, porém, ele surpreendeu a todos com uma inusitada paixão: mercado de ações. A curiosidade pelo mundo das finanças vem desde criança. Ele aprendeu sozinho a traduzir as siglas e porcentagens dos confusos gráficos da Bolsa de Valores

Aviso

de São Paulo (Bovespa). Tudo começou na brincadeira, com dinheiro de mentira em um site de simulação, quando a disparada no preço das ações virtuais da Petrobrás, em 2007, rendeu a Lui uma bolada – de mentira. “Naquela hora pensei: ‘droga, por que não é de verdade?’, e resolvi aplicar para valer”, lembra ele, garantindo nunca ter perdido um centavo. “Às vezes há 20% de chance de perder e 80% de dobrar o capital. O risco existe, mas as chances são boas”, analisa com intimidade este business. Lui começou aplicando R$ 3 mil e hoje calcula que o valor esteja perto dos R$ 7 mil. Ele quer deixar o dinheiro rendendo uns dez

aos navegantes

anos. “Não fiz planos por enquanto. Mas, quem sabe, um apartamento?”, sonha pacientemente. Lui faz parte de um novo perfil de investidores identificado pela Bovespa em pesquisa realizada em julho do ano passado, que contabilizou 120 mil jovens, entre 11 e 30 anos, cuja aposta no mercado de ações é uma forma de garantir o futuro. Eles são responsáveis por 25% das 480 mil contas de pessoas físicas registradas na Bolsa, e na faixa dos 21 aos 30 anos (66 mil contas), ganham do pessoal entre 41 e 50 (49 mil) e dos que estão acima de 50 (48 mil). Esse grupo leva a sério quando economiza o dinheiro do estágio ou a mesada. E quantas mesadas seriam necessárias para se chegar a R$ 2 bilhões, quantia que

1. Não conte com lucro rápido. O investimento começa a dar resultado entre 10 e 15 anos 2. Conheça bem as empresas com ações no mercado. Há literatura especializada no assunto, e a Internet está cheia de sites com cursos para iniciantes, como o da Bovespa (www.bovespa.com.br) e de economistas especializados no assunto, com www.grafistabsb.com e www.dojistar.com.br 3. Entenda como funcionam as operações da bolsa em simuladores na Internet, como o do Jovem Invest (www.joveminvest.com.br)

Iúri Lopes

a nova leva de investidores movimenta por mês na bolsa? “O valor pode parecer pequeno se pensarmos que eles são maioria e os demais somam R$ 69 bilhões. Mas lembro que os mais velhos têm mais dinheiro para investir”, esclarece Luis Abdal, diretor de marketing da Bovespa, afirmando que este é o momento para investir, em função da estabilidade da economia brasileira.

Melhor que poupança O economista Gabriel Cintra, presidente da Ação Jovem para o Mercado Financeiro de Capitais (AJMC), afirma que a maioria pensa que é preciso ter uma fortuna para investir na bolsa – uma grande bobagem – segundo ele. “Não há um valor mínimo de investimento. Com R$ 100, ou menos, é possível aplicar através das corretoras (intermediárias entre o investidor e a Bovespa)”, explica. Jonathas Assunção tem 24 anos e se forma em Engenharia Mecânica na UnB no fim do ano. Aprendeu com o pai e com o irmão mais novo as vantagens do investimento a longo prazo e, assim, pretende garantir o pé-demeia. “Comecei com R$ 500 e agora todo mês separo 20% do meu salário e coloco na bolsa. Rende mais que a poupança”, afirma. Ele calcula que o dinheiro renda, em média, 3% ao mês, mas não tem pressa. “Por enquanto só tiro o dinheiro do investimento para comprar mais ações, e aconselho

aplicar R$ 50 por mês que sejam. O retorno é bacana”. Gabriel Cintra acrescenta que não se deve superestimar os riscos. “Eles existem, mas não são tão altos. Além disso, o dinheiro não se multiplica de uma hora para outra”. Não dá para cair de pára-quedas na história: saber onde se pisa e com quem se lida são requisitos obrigatórios. Uma boa forma é ficar de olho nos relatórios das empresas publicados na Internet. O professor Paulo César Coutinho, do Departamento de Economia da UnB, acha que a impetuosidade dos jovens pode ser um ponto a favor. “O mercado é delicado, mas requer coragem, e isso há de sobra na juventude”, acredita o economista. Há várias maneiras de estrear na bolsa e nenhuma delas requer grande esforço mental ou financeiro. Lui e Jonathas investem individualmente, mas é possível entrar em um clube de investimento ou montar o seu próprio com amigos. Basta organizar um grupo de três a 150 pessoas e contar com a assessoria da corretora. Depois, é só procurar uma corretora de valores (algumas exigem quantias mínimas, outras permitem que se compre uma ação de até R$ 0,20) e ficar de olho nas taxas de corretagem. Como elas cobram um valor fixo, às vezes não vale a pena aplicar uma quantia pequena, porque o retorno pode não compensar.


Esporte

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Português, a língua do futebol Marcos Viana

Universidade de Brasília formou este mês a primeira turma do curso para técnicos de futebol, que levará experiência brasileira para a Comunidade de Países de Língua Portuguesa

Lurdes Lutonda (centro), ex-jogadora da seleção angolana, quer levar o que aprendeu para o seu país Marcos Viana

N

ações com graves problemas sociais e baixa industrialização tiveram a oportunidade de formar profissionais do futebol por curso oferecido pela Faculdade de Educação Física da UnB (FEF). A formatura foi dia 15 de maio. Seis dos oito países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) fizeram concursos nacionais para escolher quem iria participar do primeiro curso para técnicos de futebol. Em alguns casos, a disputa por uma vaga foi mais concorrida que o vestibular de Odontologia, chegando a 40 candidatos por vaga. Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e TimorLeste participaram da ini-

ciativa. Portugal, que tem o brasileiro Felipe Scolari como treinador de sua seleção, foi o único país da comunidade que não mandou representantes. Técnico da seleção de São Tomé e Príncipe, Tó Adão é um dos 38 alunos da Escola Internacional de Futebol da CPLP. “Sabendo o que o Brasil representa no mundo do futebol, todos levaremos muito aos nossos países”, afirma. Além do aprimoramento técnico, as aulas proporcionaram uma aproximação do Brasil com os outros países de língua portuguesa. Os alunos tiveram passagens, uniformes, alimentação e hospedagem pagas pela FEF e, posteriormente, foi oferecida uma ajuda de custo. “Houve casos de alunos que ficaram oito horas no aeroporto do Rio de Janeiro esperando a cone-

xão sem comer nada porque não tinham dinheiro”, explica Paulo Henrique Azevedo, coordenador da escola. No total, foram gastos R$ 860 mil em recursos repassados pelo Ministério dos Esportes. As lições abordam também questões éticas e sociais para que o futebol seja fator de desenvolvimento. Paulo Henrique fala que o cunho social do projeto é enorme. "O que surgirá daqui nós só temos uma idéia: são escolas que ajudarão meninos de rua, socialização de classes marginalizadas, são sementes que darão árvores que nunca imaginaríamos”, declara. As aulas foram dadas por profissionais experientes do futebol brasileiro. Dentre eles, o lateral da seleção tricampeã do mundo em 1970, Carlos Alberto Torres, e Pau-

lo Emílio Frossard, técnico que atuou em cinco países e mais de 24 clubes. A admiração dos alunos era tanta que, após a aula, eles pegavam autógrafo com os professores. Bacari Sanha, treinador do time campeão da GuinéBissau em 2006, acredita que a integração dos países lusófonos é o início para melhorar o desempenho na Copa de 2014 no Brasil. “Espero que pelo menos cinco equipes de língua portuguesa estejam participando”, Bacari diz, esperançoso. Dos países da comunidade, apenas três Brasil, Portugal e Angola - já participaram de copas, tendo o último uma única participação, em 2006. Os próximos passos da escola são a formação de jogadores, preparadores físicos, fisioterapeutas, diretores esportivos e todas as funções necessárias para a profissionalização do futebol.

CPLP

nas

Olimpíadas

Brasil Ocupa a 36ª posição no ranking olímpico, com 17 medalhas de ouro, 21 de prata e 38 de bronze.

Portugal Na 60ª posição, conquistou três medalhas de ouro (no atletismo), seis de prata e 11 de bronze.

Angola Participou pela primeira vez em 1980 e aderiu ao boicote comunista aos Jogos Olímpicos em 1984.

Moçambique Na 88ª posição do ranking, ganhou a primeira e única medalha de ouro no atletismo, em 2000.

Cabo Verde Estreou em 1996. Ocupa a 132ª posição no ranking sem ter conquistado nenhuma medalha.

Bola e batom Somente duas mulheres participaram do curso. A angolana Lurdes Lutonda e a timorense Engrácia Fernandes desafiam o clube do bolinha. Lurdes diz que é complicado exercer uma profissão tipicamente masculina. “No início é difícil por causa do machismo dos homens, mas com a competência das mulheres isso tende a acabar”. Em 1996, o futebol feminino estreou como esporte olímpico. Na Copa de 2004, na Grécia, a seleção feminina brasileira trouxe a medalha de prata.

Guiné-Bissau Participou dos últimos três Jogos Olímpicos e vai mandar representantes para Beijing, na China.

São Tomé e Príncipe Primeira participação ocorreu em 1996, mas nunca ganhou nenhuma medalha nos jogos.

Timor Leste Estreou oficialmente em 2004 com quatro participantes do atletismo, um halterofilista e um boxeador.


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Variedades

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:: Crônica

Em ritmo de

E

m terras brasilienses acontece, com mais freqüência do que deveria, um fenômeno extremamente curioso. Uma mistura de tragédia grega à piada de boteco: a nomeação de cidadãos honorários. O processo é espetacular. Em noite de lua cheia (a nova também serve), sob influência espiritual, religiosa, política, humanitária, filosófica ou intuitiva, o deputado devidamente engravatado, faz um Projeto de Decreto Legislativo traçando o perfil e contando os feitos de seu indicado. Se dos 24 companheiros, 13 concordarem com a proposta, negócio fechado. Algo mais ou menos assim: “Hoje acordei fantástico!”. Plim-plim: Cid Moreira tornou-se cidadão honorário de Brasília. Em ritmo de festa, nomes como Sílvio Santos, Yasser Arafat, Bell do Chiclete com Banana e Timothy Mulholland compõem a confraria de 1018 cidadãos honorários da capital federal. Em apenas 18 anos de existência, a Câmara Legislativa conferiu média de um título por semana. A cidade de São Paulo, cinco vezes maior que Brasília, desde 1950 concedeu aproximadamente a mesma quantidade de títulos. Ou o problema é matemático, ou há mais gente merecendo honras por grandes feitos ao Distrito Federal do que imaginávamos. Isso, para não citar a possibilidade

de ter engravatado não fazendo o seu trabalho. Os casos vão do absurdo ao incompreensível. Como a indicação exagerada do expresidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, por 12 deputados. Proposta aceita, optaram por ignorar o currículo pouco honrado do cidadão. Ou ainda a indicação do ex-líder palestino Yasser Arafat pelo exdeputado da bancada cristã, João de Deus (PP). Na contramão dessa lógica subjetiva de recomendação e aceitação, Pelé foi vetado, principalmente pelas deputadas da Câmara, por ter negado durante três décadas a re-

Mariana Capelo

Camila Louise e Camila Gonzalez

Oba

re-

conhecer a paternidade de uma de suas filhas. É exatamente isso. Uma mistura bizarra de princípios, condescendente de um lado, maternal de outro. A situação toda é tão risível, que já teve até quem devolvesse o título por não se sentir no mérito para a coisa. Ou ainda por achar que a coisa toda não tem mérito algum: “devolvo, portanto, o título que não lhes cabe conferir, pois antes de honrar, envergonha o cidadão de bem que, nem no presente nem no futuro, não quer ser considerado pelos seus netos como mais

ba um beneficiário dos desvios, injustiças e desmandos desta Câmara”. O texto espirituoso foi escrito por Francisco César Abreu, dono de uma distribuidora de bebidas, famoso na capital por colocar cartazes de protesto político em frente ao seu estabelecimento. Tamanha sobriedade chega a ser irônica. Mostra que você, cidadão brasiliense-nãohonorário, tem o direito de não engolir essa dose gelada de engodo. Tem inclusive o direito de não se sentir representado pelo dono do Baú da Felicidade ou pelo dono infeliz da lixeira de mil reais. Muito menos pela bispa, aquela presa pelo FBI na alfândega americana e acusada pelos crimes nada santos de estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.

Como toda piada deve ter um fim, essa está caminhando para o seu. No dia 14 deste mês foi aprovado o projeto dos deputados Chico Leite (PT) e Alírio Neto (PPS), em que as indicações antes ilimitadas, passam a ser apenas de uma por ano para cada deputado. Agora, por exemplo, Anilcéia Batalhão – como é conhecida nos corredores da Câmara - sofreria baixa em sua tropa. Se fosse agora, a ex-deputada do PSDB não poderia ter indicado mais de 150 títulos a militares que serviram no Timor Leste. Nem toda a poesia do “Chiiii-cleee-tee... oba! oba!” seria suficiente para conferir o título ao Bell. Daisaku Ikeda, presidente de uma ONG do Japão que promove a paz pelo mundo, perderia a honraria candanga, tão deslocada em sua coleção de mais de 500 títulos. Isto porque nesses novos moldes, só será honorário - aquele que dá honras sem proventos materiais – o cidadão que morar ou tiver morado por pelo menos quatro anos no Distrito Federal. O problema não é a nomeação em si. É a falta de critério sobre o que significa fazer coisas relevantes à cidade e aos cidadãos honrados que moram nela. Sem discernimento crítico e consciência, tudo parece ser produto da camaradagem ébria e da empatia gratuita. Como se fosse resultado de uma conversa de boteco.


Cultura

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Bossa moderna sem desafinar

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:: Indicaí

No cinqüentenário da Bossa Nova, jovens músicos reinventam a famosa batida do violão de João Gilberto e criam versões dançantes para os clássicos Augusto Neto,

Fernanda Soares

A

Apoio da vanguarda

apelo para atraí-los. “Faz com que eles escutem o repertório original. Temos que aproximar a juventude da Bossa Nova, trazer essa galera para escutar e se interessar”, diz. O grupo recebe apoio também de outros pilares da Bossa Nova, como Carlos Lyra e Marcos Valle, que aprovam o trabalho e dão algumas dicas aos garotos. “Se a gente quer mexer na música, liga para eles. É importante vivenciar isso com os criadores e que bom que eles nos dão essa abertura”, conta Cris Dellano, integrante do grupo. O Quarteto em Cy também já teve suas músicas embaladas pelo ritmo moderno. Cynara, uma das vocalistas, questiona o novo som. “É bacana introduzir toques mais modernos, mas acho que é se aproveitar da grande música que é a Bossa para fazer uma coisa que não fica melhor”.

Cacau Araújo

O compositor Roberto Menescal, um dos principais participantes do movimento na década de 1950, acredita no estilo moderno. “A gente não pode reclamar. Nem no começo, nem no auge da Bossa Nova tivemos tanta exposição na mídia”, declara. Em 2001 Menescal dividiu a parceria do álbum “Brasilidade” com o Bossacucanova, um dos primeiros grupos cariocas a modernizar o estilo.

O tecladista Alex Moreira conta que, há 13 anos, ele e Marcelinho da Lua, também integrante do grupo, trabalhavam com Márcio Menescal no estúdio de seu pai, Roberto Menescal. Certo dia, foram a Nova Iorque comprar novos equipamentos e se depararam com músicas que misturavam o soul e o funk. Voltaram ao Brasil e, de brincadeira, resolveram experimentar novos ritmos com a Bossa Nova. Remixaram “Só danço o samba” na versão do quarteto vocal Os Cariocas. Em 98, lançaram o primeiro projeto do grupo de músicas clássicas da Bossa com a batida eletrônica. O Bossacucanova já tem três álbuns gravados e realizou shows na Europa, Estados Unidos e Japão. Com uma platéia jovem, de média de 20 anos, Alex Moreira defende que a bossa eletrônica tem o

Administração, 8º semestre

CD:“Dois”, do grupo Legião Urbana “Esse CD é diferente porque faz uma extrema crítica à sociedade da época. Músicas que, apesar de já existirem há muitos anos, ainda refletem problemas atuais.” Fotos: Pedro Lacerda

programação eletrônica do laptop dá novo ritmo à tradicional Bossa Nova, que há 50 anos precisava só de um banquinho e um violão para reunir a garotada. Em Brasília, a banda Salve é a responsável pelas versões dançantes do ritmo com o projeto “Salve Bossa Nova 50 Anos – O samba diferente que conquistou o mundo”. Os integrantes do grupo têm, em média, 30 anos e uma platéia de 18 a 23 anos, que não aprecia a Bossa Nova tradicional. A banda é formada pelos mesmos integrantes da antiga Salve Jorge, que tocava releituras de Jorge Ben Jor. A partir daí resolveram homenagear o cinqüentenário da Bossa Nova misturando ritmos como samba, groove, jazz e funk. “As pessoas guardam a

imagem do João Gilberto, um banquinho e um violão. Nós queríamos fazer uma Bossa para dançar”, explica o vocalista da banda, Léo Goulart. Nos shows, clássicos da Bossa ganham versões com influências do samba funk e do soul americano. Todo o toque moderno é feito apenas com instrumentos, que vão do piano à bateria.

Bernardo Brandt, Letras, 3º semestre

Livro: “Jerusalém”, de Gonçalo Tavares “É um romance tradicional, e o interessante é que ele desconstrói no final do livro a idéia de que a angústia que vivenciamos hoje é individual. Ao contrário, ela é coletiva.”

Bruno Alves, Letras – Inglês, 4º semestre

Junte samba, groove, jazz, funk e até soul americano à legítima Bossa Nova. A mistura dos ritmos dá origem a Bossa moderna

Filme: “Ensinando a Viver”, de Menno Meyjes “Fala de um escritor que perde a mulher. Com a perda ele decide adotar uma criança e isso mostra a situação de um homem aprendendo valores com uma criança. E o que se pensa é sempre o contrário.”


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Zé Fini

CAMPUS :: 21 de maio a 3 de junho de 2008

Minhocômetro do investimento Ande pelo Minhocão e descubra se sua vida universitária é compatível com os hábitos de um investidor. Não esqueça: conte as jogadas até chegar à cabeça do minhocômetro e confira seu perfil De 4 a 6 jogadas Você é aquele universitário que não tem vida social porque se recusa até a dividir a conta do boteco com os amigos. Mas não se preocupe! Com os lucros da Bolsa, você compra amigos novos!

De 7 a 8 jogadas Universitário típico, não dispensa uma cervejinha gelada. Mas como é estagiário e rala para ganhar seu próprio dinheiro, tem suas reservas. Pode ser que você tenha sucesso enquanto investidor. Ou não.

De 9 a 11 jogadas A gente agradece você ter investido seu tempo neste jogo, mas é só nisso em que você pode investir, amigo! Mas não fique preocupado, porque, no final das contas, o importante sempre é participar, né? Ilustraçã

o: Iúri L

Ilustração: Renato Moll

A lixeira do Timóteo

A Lixeira do Timóteo é o nome dado a um pequeno universo que comporta vários tipos de vida muito semelhantes às que encontramos no nosso planeta.

opes


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