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Capítulo Dez ........................... PALAS

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Índice Remissivo

Índice Remissivo

Canto agora Palas Atená, a deusa gloriosa, de olhos cinzentos, expedita, de implacável coração. Essa tímida donzela é uma poderosa defensora das cidades, a Tritogéneia, do próprio Zeus a conselheira nascida de sua augusta cabeça, armada de dourada e resplandecente armadura guerreira, e o espanto apossou-se de todos os espectadores imortais.

Hino Homérico a Atená

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Talvez o mito mais notável sobre Palas Atená seja a história de seu nascimento. Conta-se que Zeus perseguiu a Titanesa Métis e fez amor com ela. Essa Métis era a guardiã original do planeta Mercúrio e seu nome significa "Conselho". Ficou grávida depois da aventura. Gaia então anunciou a seu neto Zeus que o primeiro filho de Métis seria uma menina, mas, se a Titanesa sobrevivesse, ela poderia dar à luz um menino que suplantaria Zeus. Como o seu pai, Cronos, antes dele, Zeus resolveu agir e engoliu Métis, embora ela tenha sempre continuado a lhe dar "conselhos" de dentro de seu estômago. Mais tarde, enquanto Zeus passeava pelas margens do lago Tritão, na Líbia, teve uma dor de cabeça insuportável. Seu filho Hefesto aliviou sua dor com o expediente original de

partir a cabeça dele em duas partes. Dali surgiu Palas Atená, filha de Métis, vestida de armadura, soltando um grande brado.

Como filha do cérebro de seu pai, é natural associar Atená com o intelecto humano. Mas suas raízes são muito mais profundas e estendem-se na Antiguidade. Um de seus principais atributos é o escudo que leva, cujo brasão é a imagem da górgona Medusa, um demônio feminino com cobras em vez de cabelos. De acordo com a lenda, foi Teseu quem matou a Medusa com a ajuda de Atená, que lhe deu aquele troféu. Os mitologistas vêem uma identidade entre Atená e essa temível dama das cobras. Partindo do fato de que ela emergiu no lago Tritão, na Líbia, Robert Graves acredita que Atená era uma encarnação grega da deusa líbia Neith das cobras, e a maior parte dos historiadores feministas de mitologia seguiram essa interpretação76. Mas, é possível que as origens verdadeiras de Atená venham de tempos ainda mais remotos. Muitos estudiosos acreditam que a famosa Senhora das Cobras do palácio cretense de Cnossos não é uma sacerdotisa, mas uma deusa, e que essa deusa é uma forma primitiva, minóica, de Atená. A arqueóloga Marija Gimbutas afirmou que a cultura minóica de Creta é a última sobrevivente e o maior desenvolvimento da antiga cultura neolítica do sudeste da Europa. Afirma ainda que uma das principais deusas dessa cultura neolítica (c. 6000 — 3500 a.C.) era uma Senhora das Águas cuja epifania ou forma física era incorporada na cobra, e que essa era a Atená "original'' — que era portanto um tipo de deusa da fertilidade, doadora da

chuva, que trazia a vida77. Mas, se era celestial, era também ctônica, uma criatura do mundo subterrâneo, e — de um ponto de vista astrológico — há fortes ligações entre Palas Atená e o arquétipo de Plutão.

As cobras representavam papéis importantes nos ensinamentos secretos e mistérios sobre a vida, a morte e a imortalidade (Escorpião), e Atená era, para os gregos, a deusa da sabedoria. Dessa forma, podemos concluir que Atená possuía a sabedoria não apenas do intelecto, mas a sabedoria feminina instintiva sagrada à deusa. Algo dessa Atená mais primitiva sobreviveu na atribuição da coruja para essa deusa

Cabeça de Atenas envergando um capacete paramentado com penas de grifo, em um didracma de Velia, Itália, entre 400 e 350 a.C. Da coleção de Michael A. Sikora

76. Graves, Robert, The Greek Myths, ibid., Vol. 1, pp. 44-5. 77. Gimbutas, Marija, Goddesses and Gods of Old Europe, ibid., pp. 18, 145-51.

como pássaro sagrado. A coruja sempre foi conhecida como o pássaro de "sabedoria" — e tipicamente pensamos que isso significa um conhecimento ou compreensão interior profundo, e não a sabedoria de um tipo puramente intelectual. O fato de os gregos a haverem feito deusa da sabedoria intelectual não diz tanto sobre Atená quanto sobre os próprios gregos, que glorificavam o processo intelectual. O conhecimento de Atená, porém, nunca era puramente cerebral: era útil. Conta-se que Posídon e Atená tomaram parte numa competição para determinar qual deles se tornaria a divindade padroeira de Atenas. Posídon criou o cavalo; Atená, a oliveira. Como a oliveira era considerada de maior utilidade que o cavalo, Atená venceu a competição — e, é claro, a cidade de Atenas leva seu nome até hoje. Conta-se também que ela inventou a tecelagem, a culinária, a cerâmica, a matemática, o arado, o carro e o método de construção de navios — todas as artes "úteis". Entre os romanos guerreiros, Atená era exaltada na arena de batalha. Seu nome latino era Minerva; era renomada por suas habilidades de estratégia no campo de batalha. Como guerreira, porém, Atená era estrategista e pensadora, e não uma açougueira. Sempre preferiu a diplomacia e a negociação ao conflito aberto.

O retrato que se fez de Palas Atená, mesmo na literatura feminista contemporânea, concentra-se em seu papel como filha do patriarcado, ou seja, filha de Zeus78. Astronomicamente, é verdade que Palas Atená está mais perto de Júpiter do que os outros quatro grandes asteróides. Não é inteiramente incorreto dizer que ela está dentro da sombra de Júpiter. É também verdade que Atená deu o voto decisivo no julgamento de Orestes — um caso que envolvia a questão do direito maternal versus direito paternal. O voto de Atená, contra a mãe, foi interpretado como uma tendência patriarcal da parte dela. Mas, essa tendência patriarcal não era tanto característica de Atená quanto um sinal dos tempos. Atená é o sustentáculo das leis e da justiça e, como agente delas, reflete as leis que governam a Terra num determinado momento.

Podemos assim observar que a evolução de Palas Atená, desde a deusa cobra primordial, possuidora e protetora da sabedoria feminina, passando pela "filha do patriarcado grego" até a deusa romana da guerra, traça um caminho paralelo ao das mulheres através dos séculos. Até o fim do século XIX, as mulheres não tinham o poder de desenvolver seus próprios dons intelectuais e, realmente, eram punidas, condenadas ou queimadas na fogueira se ousassem mostrar qualquer conhecimento de cura ou magia. Como os tempos mudam e a sabedoria feminina foi novamente devolvida a seu prestígio primitivo, a sabedoria de Palas Atená será novamente honrada e celebrada em suas muitas formas.

78. Bolen, Jean Shinoda, Godesses in Everywoman, Nova York, Harper and Row, 1985, pp. 75-106; e George, Demetra, Asteroid Goddesses, ibid., pp. 80-116.

Diferentemente de muitos deuses e deusas do Olimpo, que preferiam ficar por lá consumindo néctar e ambrosia, essa deusa estava longe de ser inativa. De fato, uma pessoa com uma forte assinatura de Palas Atená no mapa astral pode simplesmente não saber como relaxar. Atená era uma deusa muito dotada, inteligente, corajosa, inventiva e industriosa. Podemos identificar a função mais importante de Palas Atená no mapa astral — sua estratégia, julgamento e sabedoria — encontrando sua casa e posição de signo.

Podemos ver se é Atená, a artesã habilidosa, Atená, a estrategista, Atená, a guerreira, Atená, a intelectual, Atená, a inventora, Atená, a industrialista ou Atená, a conhecedora dos mistérios da vida, quem atrai mais a atenção do indivíduo. Por exemplo, no mapa dos Estados Unidos, Atená está em Aquário, em conjunção com a Lua, uma assinatura que com certeza se relaciona ao uso inventivo e altamente habilidoso da tecnologia que esse país buscou em seu desenvolvimento contínuo. Também sugere a glorificação aberta dos técnicos habilidosos que abriram caminho em um país que luta para manter uma liderança competitiva entre as nações industrializadas. Atená em conjunção com a Lua também daria apoio à idéia de que as oportunidades das mulheres em posições de administração e mesmo de liderança estão disponíveis em um país em que todo o necessário para avançar é a ambição de "fazer bem-feito". A China tem Atená em Virgem e, como esse é o mapa do governo mais recente (a Revolução de 1949), essa posição de Atená reflete a percepção do mundo das forças trabalhadoras chinesas e sua capacidade de criar, de forma laboriosa mas eficiente, artigos em miniatura e peças de maquinado em milhares de fábricas.

Cabeça arcaica de Atenas e uma coruja, de um tetradracma do século V a.C reproduzido numa nota grega atual (1944). Da coleção de Michael A. Sikora

Não é segredo que a Filha favorita de Zeus era Atená, e os gregos refletiam a opinião de seu deus principal honrando-a abaixo apenas de Zeus. Assim, estabelece-se o laço pai-filha, assim como o laço mãe-filha é encontrado em Deméter e Perséfone. A relação paradoxal de Atená com seu pai — e, por extensão, com a visão de mundo dominante simbolizada pelos rei dos deuses — foi responsável pela imagem mais popular da deusa em nosso mundo moderno. Seja sob o ponto de vista da astrologia79 ou da psicologia junguiana80 , a mulher de Atená é prontamente reconhecida como um arquétipo — talvez mesmo como um estereótipo. Fortemente armada por trás de suas defesas emocionais, desdenhando relacionamentos por opção, ela sai ao mundo armada com sua valise e vestida em um terninho cinza com ombreiras exageradas. Como mulher de negócios, joga mais pesado que os Gravura do século XIX de Palas Atená, a homens, e se deleita em partir da estátua original de Fídias superar no poder (Margaret Thatcher se encaixa nesse arquétipo). Toni Wolff e Linda Schierse Leonard chamaram esse tipo de Atená de "Amazona de armadura"81. Mas, esse é apenas um dos aspectos de Atená, e não necessariamente sua manifestação mais saudável. É verdade que a maioria das Amazonas tende a ser Atenas; mas a maior parte das Atenas não é amazona.

79. George, Demetra, Asteroid Goddesses, ibid 80. Bolen, Jean Shinoda, Godesses in Everywoman, ibid., pp. 75-106. 81. Whitmont, Symbolic Quest, ibid.; e Linda Schierse Leonard, The Wounded Woman, Boulder e Londres, Shambhala, 1983.

O Tholos de Delfos, Grécia, é uma das inúmeras construções erguidas dentro do perímetro consagrado a Atená. Começo do século IV a.C. Fotografia de Ariel Guttman

Para perceber genuinamente o potencial incorporado nessa deusa ou asteróide, é necessário incorporar algo de sua sabedoria profunda, de coruja, de serpente.

Para identificar um modo específico de sabedoria de Atená em qualquer mapa astral, é preciso primeiro determinar como ela se relaciona com os signos e planetas que representam o simbolismo do pai nesse mapa. Quando Atená é dominante em um mapa, com frequência há uma forte projeção do pai no início da vida da criança. Seja aceitando a projeção do pai, o que uma Atená provavelmente faria, ou rejeitando-a, o que pode ser simbolizado por um trânsito inicial de algo como Urano para Atená, o objetivo principal é atravessar o escudo e a armadura e entrar em contato com a sabedoria pessoal do indivíduo. É freqüentemente um choque para aqueles que vivem na sombra ou na projeção do pai por toda a vida ter de encarar o fato de que isso não está mais dando certo para eles. Cabe então a essas pessoas entrar em contato com seu próprio senso de sabedoria interior, saindo da armadura que usaram por tanto tempo.

Nessa arena do amor, Atená parece estar em sua posição mais fraca e sua armadura simboliza a dificuldade que ela tem em estabelecer um relacionamento íntimo. Muitos deuses e titãs se ofereceram para casar-se com ela, mas ela rejeitou a todos. Com freqüência, ela nem mesmo conseguia compreender as implicações sexuais de um relacionamento. Por exemplo, uma vez pediu a Hefesto que lhe forjasse uma armadura. Hefesto replicou que faria isso "por amor". Atená ingenuamente pensou que o ferreiro celestial pretendia trabalhar para ela apenas pela bondade de seu coração, mas Hefesto, que estava acostumado a ser pago por seu trabalho, queria dizer algo muito diferente com a palavra "amor". Quando tentou atacá-la, ela resistiu. Hefesto ejaculou em sua coxa. Enojada, limpou o sêmen com um pedaço de lã e o jogou na terra. Dessa fonte improvável nasceu Erictônio, filho de Atená. Era meio homem e meio serpente, e portanto uma representação da Atená primitiva, ctônica, a Dama das Serpentes; mas foi também o primeiro a instituir o "direito-patriarcal" na antiga Grécia e a considerar a linhagem pelo lado paterno. Mas, se Atená evitava relacionamentos, não era tão brutal quanto Ártemis, que cortou Acteão em pedacinhos por espiar sua nudez. Tirésias também teve uma visão assim de Atená; como punição, ela o cegou, mas abrandou a sentença dando-lhe visão interior, o poder da profecia. E ela fazia questão de que sua beleza de olhos cinza fosse reconhecida; como Hera e Afrodite, tomou parte no famoso julgamento de Páris, quando o príncipe troiano teve de julgar qual das deusas era a mais bela (escolheu Afrodite). Vale notar, porém, que, quando cada uma das deusas tentou chantagear Páris oferecendo-lhe certos favores, Palas Atená ofereceulhe algo eminentemente prático e patriarcal: disse que lhe daria a vitória na batalha.

O julgamento de Páris, de um vaso grego do século III a.C.

Quando alguém deve competir habilidosamente e com sucesso em um "mundo de homens", com frequência não há tempo ou lugar para desenvolver a sensibilidade emocional, ou assim devemos pensar. Porém, o oposto é o verdadeiro — a vitória é alcançada quando elementos femininos de sentimento, compaixão e sensibilidade são adicionados às faculdades da ingenuidade e da inventividade, especialmente porque a compaixão é provavelmente algo que o oponente não tem. De fato, conforme cada vez mais mulheres entram no mundo da política, dos negócios, da medicina e do direito, o ingrediente extra parece ser que ela pode e faz tudo! Esse é o arquétipo da supermulher que surgiu na década de 1980 — a mulher que podia cuidar do lar e da família, tratar de ocupações profissionais, controlar o orçamento, manter relações sociais e resolver o problema de todos os que a rodeavam — em suma, a personificação de Palas Atená.

Durante os últimos vinte anos, Palas Atená tem sido um dos arquétipos mais dramaticamente visíveis a emergir na consciência ocidental. Mas o asteróide, é claro, tem também um papel nos horóscopos dos homens. E, se Palas Atená com freqüência aguça os dons intelectuais das mulheres ou lhes dá grande força para enfrentar o mundo patriarcal, provavelmente fará o oposto nos mapas de homens. Há um efeito de abrandamento: quando Palas Atená é forte no mapa de um homem, ele muito provavelmente será capaz de abrandar sua inclinação racional e científica com um pouco de compaixão ou sensibilidade — com a profunda sabedoria simbolizada pela coruja e pela serpente, que tornam o conhecimento "útil".

Palas Atená está entre Marte e Júpiter e sua revolução orbital leva aproximadamente cinco anos. Assim, mais ou menos a cada cinco anos

temos um retorno de Palas, um trânsito que pode ser usado como um tempo para renovar ou entrar em contato com a sabedoria e a habilidade interiores, um período em que, em qualquer acontecimento competitivo, o indivíduo terá mais chances de se sair vitorioso. Pode também apontar um período em que o indivíduo está seguindo um caminho de estudo intensamente concentrado, que resultará num sentimento de superioridade, desenvolvimento ou iluminação.

Cabeça de Juno, segundo a Juno de Ludovisi. Museu Ludovisi, Roma

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