Revista Mundo do Leite 73 - Jun/jul 2015

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Ao Leitor Estudos comprovam que produtores associados a cooperativas evoluem mais, tanto tecnicamente quanto em termos de gestão e lucratividade. Mundo do Leite traz, em sua reportagem de capa, vários exemplos disso na pecuária leiteira. Como o do produtor estampado na capa, Marcílio de Almeida, do Síto Raé, em Taubaté, SP. Feliz da vida, ele recém-adquiriu um trator por intermédio de financiamento da Comevap, cooperativa leiteira no Vale do Paraíba paulista. Veja a história dele e de outros cooperados, que comprovam que se associar é, de fato, um passo acertado. Fazendo nosso trabalho de “extensão” editorial, destacamos também, nesta edição, um assunto de extrema importância: a saúde do úbere. Boa leitura!

LUIZ PRADO

Cooperados lucram em grupo

18 Orgulhoso, Marcílio

Nutrição

de Almeida mostra o trator adquirido com crédito da Comevap.

14 Silagem, volumoso na medida certa

Fazenda

38 Em Chapecó, leite “sai” de pedra

Capa: Lay-out: Edgar Pera Arte final: Edson Alves Foto: Luiz Prado

Infraestrutura

44 Os “segredos” dos corredores de passagem

Entrevista Flávia Sarto 6 Mais cooperativismo nesta edição, desta

Colunistas 10 Gestão, Christiano Nascif 24 Sustentabilidade, Alexandre M. Pedroso 34 Qualidade, Marcos Veiga 50 Seguindo em Frente, Ismail R. Haddade

vez com a Ocesp/Seescop-SP, cujas ações visam fazer crescer a produção leiteira paulista.

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Seções 4 Ao Leitor 8 Mercado 9 Palavra da Indústria 46 Eventos 48 Empresas e Produtos

Mundo do Leite Diretores

Sanidade O úbere

A mastite é a principal doença a acometer a “fábrica de leite”. Entretanto, vários outros problemas os quais o produtor deve conhecer podem afetar a lactação.

É uma publicação bimentral da DBO Editores Associados Ltda., com circulação em fevereiro, abril, junho, agosto, outubro e dezembro. Arte

Daniel Bilk Costa, Demétrio Costa e Odemar Costa.

Editor Edgar Pera

Diretor Responsável

EDITORAÇÃO

Circulação e Assinaturas Gerente: Edna Aguiar

edna@midiadbo.com.br

Demétrio Costa

Edson Alves e Célia Rosa

Redação

Coordenação Gráfica

Prol Editora Gráfica Ltda.

Marketing/COMERCIAL

DBO Editores Associados Ltda.

Editora Tânia Rabello CONSULTOR TÉCNICO

Walter Simões

Edson Gonçalves

Gerente Rosana Minante

Colaboradores

VENDAS

Fernanda Yoneya, Geraldo Hasse, Ivaris Júnior, Marcela Caetano e Mônica Costa

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Tiragem desta edição: 20 mil exemplares. Tiragem e circulação auditadas

Mundo do Leite jun-jul /2015

Márcia Cobra

marciacobra@midiadbo.com.br

Impressão e Acabamento

Rua Dona Germaine Burchard, 229 Perdizes, São Paulo – SP – 05002-900 Tel.: 11 3879-7099 www.portaldbo.com.br



Entrevista

Flávia Sarto

A engenheira agrônoma Flávia Sarto, formada pela Esalq/USP com especialização em Negócios pelo Ibmec-SP, há três anos é consultora de Agronegócios do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo no Estado de São Paulo (Sescoop-SP). O Sescoop é ligado à Organização das Cooperativas do Estado de São Paulo (Ocesp) e é sobre o segmento paulista que a entrevista abaixo se desdobra. Entre os desafios da Ocesp/Sescoop citados por Flávia está a retomada do crescimento da produção leiteira no Estado de São Paulo que, em 13 anos (até 2013), recuou 10%. A consultora nos conta quais os planos da entidade para apoiar o produtor de leite e cooperado paulista.

Em busca do leite perdido Tânia Rabello

mas para a melhoria da qualidade do leite paulista?

Mundo do Leite – São Paulo foi o único Estado produtor de leite entre os principais cuja produção leiteira caiu entre 2000 e 2013. Segundo o IBGE, a queda foi de 10,1%. A Ocesp/ Sescoop-SP está atenta a este movimento? Flávia Sarto – Sim, estamos muito atentos, tanto que, há pelo menos seis anos, promovemos programas de treinamento às cooperativas voltados à integração e à organização em redes, cujo objetivo é juntar esforços para que, unidas, elas consigam fazer frente ao mercado. Em 2013, por exemplo, promovemos o Intercâmbio Operacional das Cooperativas Agropecuárias de São Paulo, onde levamos 20 cooperativas paulistas de diferentes segmentos para conhecer as maiores cooperativas agropecuárias norte-americanas. Entre elas, visitamos a Land O’Lakes, a segunda maior cooperativa central de leite e derivados lácteos do país, com plantas industriais em praticamente todas as regiões dos Estados Unidos e distribuição idem. Lá vimos que uma grande cooperativa central não se constrói da noite para o dia, mas sim com a integração e a cooperação de várias cooperativas locais, que,

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Mundo do Leite jun-jul/2015

unidas, conseguem oferecer um produto de ponta, tanto ao cooperado como ao consumidor final, e, assim, dar um retorno qualitativo e econômico muito maior ao cooperado.

Vemos o incremento da produção com aumento da produtividade, e estes são resultados diretos do desenvolvimento da gestão da cooperativa, objetivo maior da Ocesp/Sescoop-SP. Além disso, oferecemos cursos de capacitação e treinamento às cooperativas, cooperados e a seus funcionários por meio do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo do Estado de São Paulo (Sescoop-SP). No rol de cursos do Sescoop-SP, temos treinamentos específicos para melhoria da qualidade do leite, tanto na fazenda, para o cooperado produtor rural, como dentro da cooperativa, na usina de beneficiamento do leite. Nossas cooperativas são responsáveis por 20% do leite produzido em São Paulo, temos 1.940 cooperados produtores de leite e 17.000 funcionários envolvidos com o leite nas cooperativas (diretos e indiretos). Mas, com assistência técnica, sanidade e boa administração da cooperativa, com ganhos de escala e economia dos processos, podemos aumentar ainda mais a produção de leite por meio das cooperativistas, bem como sua qualidade.

A Ocesp/Sescoop-SP atua de alguma maneira no sentido de trabalhar, junto com as cooperativas, progra-

As cooperativas Colaso, Capal, Batavo e Castrolanda firmaram recentemente a intercooperação, para


reativar e profissionalizar a produção leiteira no sudoeste de São Paulo. A Ocesp/Sescoop-SP apoia este tipo de iniciativa? Participou de alguma maneira? Sim. A Ocesp/Sescoop-SP há mais de cinco anos promove eventos e treinamentos visando à intercooperação e à organização em redes das cooperativas paulistas, entre elas e com as cooperativas de outros Estados, caso da intercooperação acima citada. Tanto que estamos levando, agora em junho, as cooperativas de São Paulo para um intercâmbio técnico no Estado do Paraná, para que nossas cooperativas conheçam as paranaenses e o sistema de gestão compartilhada com mais detalhes. A Colaso foi uma das cooperativas que participaram dos nossos programas de capacitação e integração, esteve conosco no intercâmbio aos Estados Unidos, em 2013, e sempre foi uma das precursoras deste novo tipo de organização.

No início de junho, provavelmente o Plano de Safra terá sido recém-anunciado. O que a Ocesp/Sescoop-SP espera do plano? Consideramos a agropecuária um setor altamente estratégico para a segurança de um país, tanto segurança alimentar como segurança pública. O atual Plano Safra, com expectativa de aumento das taxas de juros, e o plano de seguro agrícola infelizmente não parecem levar isso em conta. Defendemos que o setor, responsável pelos últimos superávits da balança comercial, receba um montante maior de recursos, com taxas mais atraentes e um seguro agrícola sobre a renda, com o qual o produtor rural consiga produzir.

Sobre o Cadastro Ambiental Rural, a entidade tem alguma política para auxiliar os produtores a preencherem o cadastro? A Ocesp/Sescoop-SP e as cooperativas participaram efetivamente das discussões a respeito da aprovação do Código Florestal.

A ordem este ano é de cautela. Recomendamos às cooperativas que ajam com parcimônia” Após a sua aprovação, nós assinamos um Acordo de Cooperação com a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, com a qual promovemos reuniões regionais, com a presença do Secretário de Meio Ambiente e técnicos da Secretaria, onde levamos orientação técnica e jurídica a respeito do Novo Código. Além disso, organizamos palestras, workshops, orientação durante as feiras que participamos (Agrishow e Agrifam), com distribuição de cartilhas de orientação; acompanhamos todas as discussões sobre a adoção do código nas Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente, principalmente na formatação do sistema do CAR estadual. Hoje podemos afirmar que todas as cooperativas agropecuárias estão colaborando com os seus cooperados na confecção deste cadastro, seja com disposição de advogados e técnicos para tirar dúvidas, preencher as informações pertinentes ao cadastro, até o fornecimento de imagens de satélites para o georreferenciamento das propriedades.

E sobre o Programa de Regularização Ambiental (PRA), quais os passos que estão sendo seguidos pela entidade? Estamos em fase de desenvolvimento de um projeto para implementação do PRA, no qual ofereceremos aos cooperados de dez cooperativas, num projeto piloto, um plano para a regulamentação de sua propriedade perante o Estado, com demarcações de área de Reserva Legal (se necessária) e de Área de Preservação Permanente (APP), sem custo nenhum ao associado. Isso demonstra o grau de envolvimento e de interesse da organização neste assunto. Nós nos pronunciamos oficialmente diver-

sas vezes em Brasília para a aprovação do Código e presenciamos as regulamentações estaduais e não podemos nos afastar dos cooperados neste momento crucial de aplicação do Novo Código Florestal nas propriedades.

E quanto ao total de cooperados já inseridos no CAR? Bem, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo aponta que 35% dos produtores paulistas já preencheram o cadastro. Calculamos que, nas cooperativas paulistas, o índice de produtores que já fizeram o CAR deve chegar a 40%, numa estimativa de abril de 2015.

Quais as expectativas da Ocesp/Sescoop-SP em relação ao desempenho das cooperativas voltadas ao agronegócio este ano, tendo em vista o ano de retração econômica? A ordem deste ano é cautela. O recado às cooperativas é que ajam com parcimônia, revejam seus investimentos e tentem, o máximo possível, manter os postos de trabalho, pois sabemos que as cooperativas possuem um papel econômico e social importante nos municípios nos quais atuam.

Na sua opinião, quais políticas agrícolas teriam ainda de ser tomadas para estimular mais ainda o cooperativismo no País? Acreditamos que o incremento das atuais políticas de compras de alimentos pelo Estado e municípios para merenda escolar (PNAE), amparadas pelo governo federal, já seriam de grande interesse ao cooperativismo de forma geral, porque estes programas beneficiam principalmente os produtores familiares organizados em cooperativas. As cooperativas são fundamentais para esses produtores familiares, pois possibilitam que beneficiem e agreguem valor à sua produção agropecuária e, assim, consigam acesso aos recursos do governo, levando produtos saudáveis e de qualidade para todas as escolas do Estado. n jun-jul /2015 Mundo do Leite

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Mercado O leite nas pistas

Mesmo com maior produção no Sul projeção é de alta

Preços médios dos leilões de gado leiteiro¹ Faturamento (em R$)

Praça²

Total de animais vendidos

MG

1.429

13.161.310

9.210

SP

362

2.365.930

6.536

GO

-

-

-

Preço médio (em R$)

Comparação entre 2014 e 2015 2 (Até 21/5 de cada ano) 2014

2015

Média de preços (em R$)

9.557

8.670

Total de animais vendidos no País

1.994

1.791

(1) Período de 21/4/2015 a 21/5/2015; (2) Nas três principais praças de comercialização

Variação do preço do leite ao produtor Média nacional ponderada - em R$/litro

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Entressafra traz preços melhores ao produtor

Mundo do Leite jun-jul/2015

Tânia Rabello Pelo segundo mês consecutivo os preços do leite pago ao produtor subiram. No caso, o pagamento feito em abril para o leite entregue em março. Até o fechamento desta edição, em 25 de maio – quando ainda não se tinha o balanço dos preços pagos em maio em relação ao leite entregue em abril –, a tendência altista permanecia. Isso por causa da entressafra e a redução natural da produção. Segundo a Scot Consultoria, de Bebedouro, SP, para o próximo pagamento, 52% dos laticínios pesquisados acreditavam em alta dos preços e 48% falam em manutenção. Já para junho, referente ao leite entregue em maio, o cenário também é de mercado firme e preços em alta. “Para este ano, porém, acreditamos em valorizações mais comedidas em curto e médio prazos”, atenta o analista Rafael Ribeiro, da Scot, em seu relatório mensal sobre a matéria-prima. A produção em queda na Região Sudeste e no Brasil Central dá sustentação aos preços do leite na fazenda.

Por outro lado, outra grande região produtora, o Sul do País, eleva sua captação justamente nos meses mais frios do ano porque alimenta seus rebanhos com pastos cultivados de inverno – aveia e azevém que, altamente nutritivos, refletem na maior produção. Assim, a consultoria comenta que a pressão sobre os preços pode vir do Sul daqui para a frente, embora 80% dos laticínios da região acreditem em alta de preços, mesmo com o incremento da produção, diz a Scot.

Segundo a consultoria, considerando a média nacional, o produtor recebeu R$ 0,914 por litro em abril (leite entregue em março), alta de 2,3% em relação ao pagamento anterior. A consultoria adverte, entretanto, que, apesar das recentes altas, em valores nominais, os preços pagos aos produtores caíram 7% em relação a abril de 2014 – ano de cotações recordes para a matéria-prima. Outro fator a colaborar com preços firmes é o movimento de laticínios do Sudeste em busca do leite no mercado spot no Sul do País, que vem aumentando desde março. n


Palavra da Indústria O fenômeno uruguaio Conaprole Geraldo Hasse

P

restes a completar 80 anos (em 2016), a Cooperativa Nacional de Produtores de Leite (Conaprole), do Uruguai, sobrevive à tradicional volatilidade do mercado internacional de produtos lácteos. Sua resistência e estabilidade espantam quem se habituou a ver multinacionais como Nestlé, Danone e Parmalat dominarem os mercados latino-americanos enquanto os grupos nativos vão se fundindo para não se atolar em brejos financeiros. “Nossos associados estão acostumados com as oscilações do mercado”, disse no segundo semestre de 2014 o presidente da Conaprole, Álvaro Ambrois, ao justificar um rebaixamento na remuneração dos seus 2.500 leiteiros, que fornecem 3 milhões de litros/dia a dez plantas industriais localizadas em cidades próximas de Montevidéu.

Dadas as pequenas dimensões do mercado consumidor uruguaio – 3,4 milhões de habitantes –, a Conaprole foi obrigada a exportar. É um protagonismo que vem de longe. Se na década de 1950 o Uruguai era comparado à Suíça, hoje em dia se equipara à Nova Zelândia, um país pecuarista que lidera a produção mundial de leite. Embora não esteja entre os grandes players mundiais de laticínios, a Conaprole coloca no mercado internacional mais de 50% de sua produção. Em 2014, o pequeno país sul-americano, que exporta um total de US$ 10 bilhões por ano, faturou US$ 620 milhões com as vendas de lácteos para 60 países. Deste total, a Conaprole foi responsável pela metade. Seu maior cliente é a China. Outros compradores são México, Venezuela e Argélia. O Brasil, maior parceiro comercial do Uruguai, tem sido um dos cinco maiores compradores dos produtos Conaprole. Destaca-se o leite em pó, num volume

que oscila de 15.000 a 20.000 toneladas por ano. Além de leite UHT, manteiga, soro e queijos, o Brasil importa também o doce de leite que se tornou conhecido graças às “formiguinhas” do comércio da fronteira uruguaia-brasileira, onde a iguaria pode ser comprada a US$ 3 por quilo, no más. Foi a partir das compras de turistas que a Conaprole foi ficando conhecida como uma das grandes marcas do país vizinho. Em lácteos, a maior. Basta lembrar que hoje as duas maiores redes de supermercados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina – Zaffari e Angeloni – importam o seu doce de leite. Depois de trabalhar por anos no mercado brasileiro com importadores regionais, a Conaprole decidiu abrir em 1999 uma filial brasileira com foco no abastecimento do mercado varejista. Não deu certo, tanto que a partir de 2003 passou a trabalhar com o chamado mercado institucional. Operando um escritório comercial em São Paulo e um depósito em Ivoti, RS, a Conaprole brasileira fornece leite em pó a grandes indústrias. “A Nestlé é nossa cliente no Brasil e nossa concorrente no mercado internacional”, diz Renato Lyttes, supervisor de Vendas da Conaprole brasileira. Apesar da volatilidade dos preços e das oscilações do abastecimento do mercado lácteo brasileiro, a Conaprole chegou a projetar a construção de uma fábrica em território brasileiro. Emissários da cooperativa concluíram que havia boas perspectivas em Minas, Goiás e Rio Grande do Sul. Em Porto Alegre houve duas rodadas de negociações em 2008 com a Secretaria do Desenvolvimento para discutir incentivos fiscais e outros aspectos do investimento, que poderia se concretizar mediante a compra de uma fábrica já existente ou a instalação de uma planta no terreno de Ivoti. O projeto foi engavetado no segundo semestre de 2008, quando eclodiu a crise internacional que até agora paralisa empreendedores conservadores, como os uruguaios. n jun-jul /2015 Mundo do Leite

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Gestão Christiano Nascif

O impacto da assistência técnica para a economia nacional

E

stamos vivenciando no Brasil uma intensa discussão sobre a necessidade de reforma fiscal, além, claro, de reforma política. Ao mesmo tempo, é de se esperar um debate sobre a alta carga de impostos a que todo brasileiro é submetido. Há outra discussão, sobre a legitimidade dos investimentos no setor agropecuário, com recursos provenientes do recolhimento de impostos dos outros setores, como serviços, comércio e indústria. Assim, vamos refletir sobre os ganhos diretos e indiretos que a busca pela eficiência técnica e econômica da atividade leiteira pode proporcionar a todos os setores. Já discutimos nesta coluna os bons resultados para os produtores de leite que uma competente assistência técnica e gerencial pode proporcionar. Esta ideia é válida para qualquer setor agropecuário. Da mesma forma, todos sabem o quanto são importantes para a economia brasileira os resultados da nossa agricultura e pecuária em relação à geração de emprego, renda, aumento do PIB e garantia de uma balança comercial positiva.

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Mundo do Leite jun-jul/2015

Melhoria dos resultados da fazenda leiteira resulta em ganhos não só para a propriedade, mas para o País

Quanto de fato, porém, a melhoria dos resultados técnicos e econômicos da pecuária leiteira nacional pode resultar em ganhos diretos e indiretos para o Brasil? Para responder a esta pergunta, vamos utilizar os resultados dos produtores de leite mineiros que participam do Projeto Educampo/Sebrae. Analisaremos os ganhos diretos e indiretos sobre os resultados alcançados, comparando os produtores de leite quando estão no início dos trabalhos com assistência técnica (um a dois anos), com os resultados dos produtores do Educampo quando estão com oito a nove anos de assistência técnica e gerencial. Para calcular esses ganhos, utilizaremos a teoria da Matriz Insumo-Produto desenvolvida pelo economista Wassily Leontief, que permite a identificação das relações de compra e venda entre atividades produtivas – no nosso caso, a pecuária leiteira. Nas Matrizes Insumo-Produto, além da mensuração do Produto e da Renda, é possível identificar as relações de interdependência entre atividades econômicas distintas, que, algumas vezes, não possuem relação aparente. Isto é devido ao fato de que a metodologia não considera apenas os gastos dos fornecedores imediatos, mas também o caminho que os insumos percorrem até chegar ao fornecedor.

A Matriz Insumo-Produto constitui uma ferramenta importante para a avaliação de impactos econômicos, já que permite indagar as repercussões setoriais frente às variações que são consequência das decisões do setor privado ou dos responsáveis pela definição da política econômica. Esta contribuição de Leontief à teoria econômica lhe rendeu o Prêmio Nobel de economia de 1973. A Matriz Insumo-Produto utilizada nesta análise foi calculada pela Fundação João Pinheiro, especificamente para a economia mineira, e contempla 35 setores econômicos. Os setores foram agrupados de acordo com as semelhanças na utilização de insumos e produtos. O trabalho


1. Impactos diretos e indiretos na melhoria da atividade leiteira em Minas Gerais Especificação

apresentado pela FJP tem 2005 como ano-base, e foi publicado em 2009. Em média, os produtores do Educampo, quando começam no projeto, (um a dois anos de assistência técnica), produzem 1.480 litros por dia, têm, respectivamente, produtividade das vacas em lactação, mão de obra e área para pecuária leiteira de 14,5 litros por dia; 363 litros/dia/homem e 6.000 litros de leite/hectare/ano. O custo total da atividade leiteira destes produtores, em média, é de R$ 671.440,61/ano/fazenda. A renda bruta da atividade é de R$ 718.183/ano/fazenda; a margem líquida total da atividade é de R$ 93.458/ano/fazenda e a rentabilidade média das empresas de 5,65% ao ano.

Atualmente, em média, os produtores participantes do Educampo Leite em Minas têm de oito a nove anos de assistência técnica e gerencial. Desta forma, conseguiram expressivas melhorias técnicas e econômicas, quando comparados com os produtores iniciantes no projeto. A produção média de leite deste grupo é de 1.900 litros por dia; a produtividade das vacas em lactação, mão de obra e área para pecuária leiteira são, respectivamente, de 18,57 litros/dia; 450 litros/dia/homem e 8.400 litros por hectare/ano. O custo total da atividade leiteira desses produtores é de R$ 786.936/ano/fazenda. A renda bruta da atividade, de R$ 898.245/ano/fazenda; sendo a margem líquida total por ano por fazenda de R$ 166.917. Desta forma, a taxa de retorno sobre o capital empatado na atividade é de 8,05% ao ano. É válido lembrar que os dados utilizados nestas análises são referentes ao período março/2014 a fevereiro/2015, corrigidos pelo IGP-DI de março/2015. Notem que há clara tendência por uma melhoria técnica e econômica da atividade leiteira pelo produtor que está há mais tempo recebendo assistência técnica e gerencial de qualidade, no caso, do Projeto Educampo. Desta forma, não é difícil entender a lógica da análise da Matriz Insumo-Produto, pois sabemos que o dinheiro arrecadado por produtores e funcionários, direta ou indiretamente, é gasto em muitas atividades relacionadas ou não com a produção de leite. Como exemplo, vamos imaginar um funcionário de uma fazenda que tem família sob sua responsabilidade financeira. Ao fim ou início de cada mês, ele receberá seu salário e realizará compras em farmácias, supermercados, lojas de vestuário, de eletrodomésticos e eletroeletrônicos e em vários outros estabelecimentos. Todas essas compras geram receita para

Impactos diretos

Impactos indiretos

Total

Incremento na renda bruta (R$)

127.504

169.129,16

296.633,16

Impostos (R$)

1.949,38

6.595,73

8.545,11

Incremento no resultado financeiro (R$)

34.555,51

32.331,52

66.887,03

os empresários donos de cada um desses negócios e também para os governos, por meio dos impostos embutidos nessas transações. Pois bem, concluímos então que o salário desse funcionário vai compor o salário e o faturamento de diversas outras empresas e funcionários, em diferentes setores da economia. O impacto dessa movimentação é chamado de “atividade econômica”, que é diferente do PIB, que considera a receita bruta do produto final, sem levar em conta os insumos durante o processo produtivo. Por exemplo, para produzir o milho o produtor comprou adubo, fungicida, semente, calcário e vários outros insumos, mas para o cálculo do PIB somente o valor da venda do milho é considerado. Para o cálculo da atividade econômica considera-se o valor de venda de todos os insumos utilizados durante o processo produtivo, inclusive o do milho.

Com o objetivo de avaliar o impacto na atividade econômica mineira, por intermédio de variações nos valores de renda na pecuária leiteira dos produtores participantes do Educampo, fizemos uma análise de qual é o incremento para a economia quando um produtor de leite inicia a sua participação em um programa de assistência técnica e, após um determinado tempo, alcança resultados médios semelhantes aos dos produtores que estão há mais tempo participando do mesmo programa. Por produtor que ingressa no Educampo, quando ele atinge o resultado técnico e econômico médio atual, comparado com os resultados médios de antes da assistência técnica, o incremento médio direto para a propriedade participante é de R$ 127.504/ano na renda bruta (faturamento). O aumento na arrecadação de impostos para as três esferas do poder (municipal, estadual e federal) é de R$ 1.949,38, com incremento médio no resultado financeiro da propriedade (sobras) de R$ 34.555,51/ano. Nos demais setores da economia ligados à atividade em questão, a renda bruta (faturamento) é incrementada na sua totalidade em R$ 169.129,16/ ano. A arrecadação de impostos tem incremento de R$ 6.595,73/ano e aumento nos resultados financeijun-jul/2015 Mundo do Leite

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Gestão ros (sobras), considerando os impactos indiretos em todos os setores interligados à melhoria dos resultados da atividade leiteira da fazenda em questão, de R$ 32.331,52/ano. Esses resultados nos mostram que a renda bruta das atividades interligadas, após a melhoria técnica e econômica de um produtor participante de um programa de assistência técnica, no caso o Educampo, é, em determinado período de tempo, de R$ 296.636,16/ano; um total de R$ 8.545,11/ano em arrecadação de impostos diretos e indiretos, e um total nos resultados econômicos (sobras) de todos os setores interligados de R$ 66.887,03/ano. Imaginem se multiplicarmos esses resultados por, no mínimo, 300.000 produtores de leite no Brasil capazes de serem transformados por meio da assistência técnica e gerencial eficiente, associada aos incentivos de políticas públicas econômicas?

Devemos lembrar que este é o resultado médio de um produtor com as características de perfil de entrada do Projeto Educampo e não deve ser adaptado de forma semelhante para outros produtores de leite. O mais importante dessa análise é a lógica do resultado, que pode causar impactos positivos, direta e indiretamente na economia, independentemente do tamanho dos produtores. Cabe aqui uma discussão quanto ao tempo que os produtores levam para evoluir. Quanto mais rápida for a resposta do pro-

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Mundo do Leite jun-jul/2015

dutor às corretas provocações da assistência técnica, mais rápido e melhor será o impacto na economia. Pois se o incremento na produção, na parte técnica e econômica das propriedades demorar muito, os efeitos positivos serão diluídos no longo prazo, não causando o impacto esperado na economia. Portanto, o binômio melhor resultado em menor tempo é fundamental para a avaliação da eficiência de um programa de assistência técnica e gerencial. A credito que esses números deixam clara a viabilidade de se investir em projetos de assistência técnica, e o quanto os incrementos gerados superam os valores investidos pelos produtores e empresas públicas e privadas. Queremos evidenciar a relação benefício/custo positiva para todos os setores da economia nacional que um programa eficiente de assistência técnica e gerencial para a pecuária leiteira pode proporcionar. Não é coincidência que o Senar está propondo o desenvolvimento de um robusto programa de assistência técnica destinado a transformar a realidade da classe média produtora de leite do Brasil. Este programa causará grande impacto positivo em todos os setores econômicos interligados aonde ele for desenvolvido, assim como o Educampo causa em Minas. Portanto, quando as dúvidas pairarem sobre a viabilidade de se investir no desenvolvimento amplo e sustentável do produtor de leite brasileiro, aí estão os números para esclarecê-las. Contra fatos, números e resultados bem embasados, não há argumentos. n



Nutrição

Seja de milho, cana ou sorgo, silagem deve ser bem feita. Nesta época do ano é que o rebanho começa a se alimentar do volumoso conservado, em substituição ao pasto.

Fernanda Yoneya

À base de cana. No Sítio Santo Agostinho, no Espírito Santo, o produtor Gustavo Lívio dá cana ensilada às vacas.

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esta época do ano, em que o pasto rareia – nas Regiões Sudeste e Centro-Oeste, o período crítico para pastagens por causa da seca vai de maio a outubro –, os produtores têm como opção para compor a dieta do rebanho as silagens. Tradicionalmente feito de milho, cana, sorgo ou capins, esse tipo de alimento, quando bem produzido e, principalmente, bem conservado, ajuda o pecuarista a suprir a falta de pasto fora da época das águas e a manter a produtividade e o bom desempenho dos animais. Na ensilagem, as plantas passam por uma fermentação natural, mantendo seus nutrientes preservados. Estima-se que no Brasil mais de 1,5 milhão de hectares sejam usados para produção de silagens, de acordo com dados do

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Centro de Pesquisas em Forragicultura, vinculado ao Departamento de Zootecnia da Universidade Federal do Paraná. O CPFOR é coordenado pelo professor Patrick Schmidt e mantém o Portal Acadêmico da Ensilagem, que difunde informações sobre as diferentes etapas do processo de conservação de alimentos. Embora as alternativas mais comuns sejam silagem de cana, silagem de milho, silagem de sorgo ou silagem de capim, a primeira recomendação de especialistas em nutrição animal é que o produtor consulte um técnico. Esse profissional vai visitar a propriedade, conhecer a área e auxiliar o pecuarista na hora de decidir pela melhor opção para as condições do local. “Itens como tamanho do rebanho, topografia da área, tipo de gerenciamento da propriedade e mão de obra disponível devem ser levados em conta ao decidir o tipo de silagem”, diz o pesquisador André de Faria Pedroso, da área de Produção Animal da Embrapa Pecuária Sudeste, de São Carlos (SP). Pedroso explica que, de maio a outubro, a produtividade e a qualidade da pastagem caem e, muitas vezes, é preciso adotar a suplementação na época da seca. “O produtor deve trabalhar para manter a lotação e a produtividade obtidas no verão, mas é preciso se planejar.” O pesquisador da Embrapa destaca que não existe uma “receita pronta” para o fornecimento desse tipo de alimento para o gado. “Cada produtor deve, com base nas informações de sua propriedade, ter um acompanhamento técnico e, assim, definir a quantidade fornecida para os diferentes lotes de animais.” Para isso, diz Pedroso, há algumas tabelas de exigência nutricional e de referência que podem ser usadas. “Quanto à recomendação de volumoso mais ração para as categorias animais, não acho apropriado fazer. As vacas deverão receber o concentrado conforme peso, condição corporal, número de parições e produção de leite”, diz o pesquisador, dando alguns exemplos de critérios que devem ser considerados.


“O fornecimento de concentrado para novilhas depende da idade e do peso. Para vacas secas, depende da proximidade do parto e da condição corporal.” Pedroso pondera que, melhor do que abranger todos os casos de categorias animais, mais útil é ressaltar a necessidade de o produtor procurar a orientação de um técnico capacitado para fazer também o balanceamento da dieta, já que, se o nível de concentrado for muito alto, pode haver problemas como laminite (inflamação nos cascos) e acidose, que afeta a produção de leite e o desempenho do animal. “Se souber os fundamentos básicos, aí sim pode utilizar tabelas já existentes”, afirma Pedroso, citando uma bastante utilizada por especialistas em nutrição animal, a Nutrient Requirements of Dairy Cattle (disponível em www.nap. edu/catalog/9825/nutrient-requirements-of-dairy-cattle-seventh-revised-edition-2001). O professor Marcos Neves Pereira, da área de Nutrição de Gado Leiteiro da Universidade Federal de Lavras, reforça a necessidade de o produtor, antes de tomar qualquer decisão relativa à alimentação do rebanho, avaliar as condições da propriedade e contar com ajuda profissional. “Costumo dizer que a produção de silagem, ou de qualquer outro tipo de alimento, afeta o dia a dia da fazenda, por isso o produtor tem de ajustar essa necessidade ao seu estilo de vida. Ele tem que se perguntar e colocar no papel: ‘Tenho ensiladeira? Tenho terra? Tenho equipamentos? Tenho mão de obra? Vou ter que terceirizar o maquinário? Vou fazer plantio direto? Tenho carroça para transportar cana? Tenho picadeira? Como fazer para ter um volumoso bom e produtivo?”’, enumera Pereira. Segundo ele, o custo de produção de forragem é baixo, representa de 10% a 15% do custo total da fazenda, mas afeta diretamente uma das despesas que mais pesam no bolso do produtor, que é a ração. “Tendo forragem, volumoso de boa qualidade, gasta-se menos com ração, este sim um item de alto custo. Se o produtor não tiver um acompanhamento de um nutricionista e inventar nessa parte, ele quebra.” De modo geral, o plantio de cana (para silagem ou produção de cana fresca) tem como vantagens em comparação com a silagem de milho o fato de ser mais barato e seguro e ter alto teor de açúcar (40% a 50% de açúcares na matéria seca). Isso porque, uma vez formado o canavial, o produtor pode fazer cortes durante cinco, seis anos, além de ser uma cultura mais resistente à seca e a pragas. A produtividade por área também é maior: são,

em média, produzidas 100 toneladas por hectare ante 50 toneladas por hectare para o milho. Se o canavial tiver manejo intensivo, obtém-se, conforme Pedroso, de 150 a 200 toneladas por hectare. “Com a cana, bem manejada e bem conservada, produtores conseguem uma produção diária de 30 quilos de leite por animal. Mas tudo vai depender do manejo e de todas as condições da propriedade”, diz Pedroso. Ele acrescenta que a cana fresca, cortada diariamente para ser fornecida aos animais, é mais prática, mas é preciso ter mão de obra disponível para esse manejo diário. Além da mão de obra disponível para uma colheita de alta frequência, o professor Marcos Neves Pereira, da Ufla, lembra que o plantio da cana, no primeiro ano, é caro, mas que os custos de instalação do canavial se diluem durante os anos seguintes, até renovação da lavoura.

Redução de custos. Nahiara conta que as despesas com mão de obra ficaram inviáveis e aí partiu-se para a ensilagem

Já a cana ensilada demanda cuidados na

colheita e na conservação _ para evitar, por exemplo, a fermentação alcoólica é necessário utilizar um aditivo. “Aqui um técnico também deve ser consultado para indicar a dosagem e o aditivo adequados, pelo menos na primeira vez”, diz Pedroso. O produtor tem como opção um inoculante bacteriano e ou aditivos químicos, como cal e ureia. Para suprir a falta de proteína e mineirais (cálcio e fósforo) da cana, é preciso corrigi-la com ureia, a 1%. “Com essa correção básica, o teor de proteína chega a 12%, 13% e o alimento torna-se suficiente para a manutenção de uma produção satisfatória por animal.” A silagem de milho, apesar de ser mais cara – as despesas incluem plantio, insumos (sementes, adubos e fungicidas), maquinário e transporte e a lavoura é anual, ou seja, tem de plantar todo ano, tem como vantagem a alta qualidade nutricional, bem superior em relação à cana, com alto teor de energia e bom nível de digestibilidade. Pedroso, da Embrapa, cita índices de produção de leite com a silagem de cana de até 40 quilos, 50 quilos de leite por animal/dia. “Muitos projun-jul/2015 Mundo do Leite

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Nutrição dutores reservam a silagem de milho, que é mais cara, para animais de alta produção.” No Espírito Santo, onde atua o engenheiro agrônomo Lúcio Antonio Oliveira Cunha, a taxa de lotação de pastagens cai, em média, de 10 a 12 unidades animais (UA) por hectare no verão para 6 a 8 UA por hectare no inverno, daí a necessidade de o produtor fornecer um volumoso a partir de maio. “O objetivo é manter a lotação do verão também no inverno, acompanhando esse período de transição de queda da lotação e suplementando com base nas condições da fazenda e nas características dos animais”, explica Cunha, que atua como consultor e técnico do Programa Balde Cheio, da Embrapa Pecuária Sudeste, no Espírito Santo e em Minas Gerais. Na região, além da cana fresca, as opções mais comuns são a silagem de milho, sorgo e cana. Se o produtor tem disponibilidade de água na fazenda, opta pelo milho ou pelo sorgo; quem não tem água para irrigar, vai de cana de sequeiro, já que, no Estado, as chuvas são mal distribuídas, conta o agrônomo. “Muitos produtores preferem o sorgo à cana, porque o sorgo tem rebrota e rende pelo menos três cortes durante um ano, o que diminui os custos operacionais. Mas tudo depende do que cada produtor tem à disposição.” Segundo Cunha, um dos critérios que os pecuaristas levam em conta é o teor de proteína e de energia de cada volumoso. “A silagem de milho, por exemplo, tem 9% de proteína e 67% de energia; a silagem de sorgo, 10% de proteína e 60% de energia; a cana, 2% de proteína e 60% de energia.”

Com a experiência no acompanhamento técnico de produtores de leite, Cunha afirma que os erros mais comuns na hora de fazer silagem de cana ou de milho estão relacionados ao ponto de corte e ao tamanho das partículas, que, em média, devem ter de 2 centímetros a 3 centímetros de comprimento para garantir uma compactação e uma conservação melhores. “O ponto de colheita é fundamental para a boa qualidade da silagem, pois afeta diretamente a compactação e a conservação do material.” Na cana, afirma o agrônomo, as principais perdas acontecem por má eficiência da colheita, com o uso de equipamentos mal regulados, e também pelo corte “fora do tempo”, quando já há excesso de palha na lavoura. No Sítio Santo Agostinho, em Nova Venécia, Espírito Santo, o produtor de leite Gustavo Frigério Lívio, há 15 anos na atividade, investe na cana ensila-

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Dieta balanceada. Vacas pastam em piquetes e depois alimentação é complementada com silagem

Proteína X energia nas silagens Milho 9% X 67% Sorgo 10% X 60% Cana 2% X 60%

da para garantir uma boa alimentação do rebanho no inverno. Na propriedade, de 12 hectares e com 47 animais – 40 deles em lactação _ , ele reserva 1 hectare para uma lavoura de cana irrigada, que serve para suplementar a dieta do rebanho a partir de maio até o fim de agosto. No ano passado, em 1 hectare, produziu cerca de 90 toneladas de cana. “Coloco tudo na ponta do lápis: os custos com a mecanização, o combustível do trator, a mão de obra, análise de solo, calagem e adubação nitrogenada e de cobertura. Gasto, em média, cerca de R$ 100 por tonelada de cana.” O custo, segundo o produtor compensa, já que a silagem de cana pura ajuda as vacas a produzir a mesma quantidade registrada no verão e não compromete o desempenho reprodutivo dos animais.

Em relação aos custos de alimentos volumosos, em especial de silagens, é preciso levar em conta que eles variam conforme vários aspectos, como produtividade da cultura forrageira, ponto de corte, tamanho da área de produção, tipo de equipamento utilizado para colheita, transporte e compactação, tipo de silo, entre outros. “Produzir uma boa forragem está, 100%, nas mãos do produtor, daí a importância de ser coerente com o tipo de gestão que ele adota na fazenda”, diz o professor da Ufla. No Santo Agostinho, o fornecimento de cana ensilada é direcionado principalmente para as vacas em fim de lactação e vacas que estão no pré-parto, a 60 dias da parição, explica Lívio. “Divido os animais em lotes e cada lote, conforme suas condições e necessidades, recebe uma quantidade balanceada de alimento. É indispensável ter acompanhamento técnico, para orientar o produtor desde o balanceamento da dieta até os cuidados na hora de ensilar a cana.” Os animais em lactação produzem, segundo Lívio, cerca de 660 litros de leite por dia, em média, e, para manter essa produtividade, complementar a produção a pasto


com a silagem de cana. A falta de mão de obra fez, por exemplo, a Fazenda Pirschner, de Aldecyr Pinto Pirschner, em Vila Valério, ES, migrar da cana fresca para a silagem de cana. A filha de Aldecyr, Naihara Pirschner, que é veterinária e gerente de Pecuária da fazenda, conta que a cana era fornecida fresca, picada, corrigida com ureia a 1% e dada no cocho. Essa cana, diz Nahiara, era cortada à mão, picada na picadeira no trator e jogada na carroceria, todos os dias, mas essa rotina se tornou inviável na propriedade. A área de cana tem pouco mais de 3 hectares, não irrigados. “A mão de obra é um fator importante e, no nosso caso, passou a coincidir com a colheita do café, que temos na propriedade. O custo ficou muito alto e nos levou ao processo de ensilagem, que estamos adotando pela primeira vez.”

A quantidade, de acordo com a veterinária, vai variar conforme a lotação animal e a oferta de capim, chegando a 30 quilos por animal quando necessário. “A dieta também é composta por alimentos concentrados, à base de milho e soja, durante todo o ano, va-

riando a quantidade e a formulação conforme cada categoria animal e sua produção de leite.” A fazenda possui, hoje, 80 animais em lactação, com produção de 1.100 litros por dia. A produção dos lotes varia de 8 a 25 litros/animal/dia. Nahiara diz que tem acompanhamento técnico para essa sua “primeira experiência” com a silagem de cana. A cana é colhida madura, picada em partículas de 1 centímetro e compactada em silos, que, após o enchimento, são vedados. Dentro do silo, a forragem sofre fermentação por bactérias. “Se bem feita e conservada, a silagem de cana pode ser utilizada por tempo indeterminado na alimentação dos animais”, garante o pesquisador da Embrapa. A cana ensilada apresenta uma maior duração no cocho se comparada à cana in natura. A única limitação está em seu alto potencial de produção de álcool, que é prejudicial aos animais e age como inibidor de consumo. Por isso, recomenda-se usar um inoculante, como os que contêm a bactéria Lactobacillus buchneri, cuja formulação rica em bactérias e enzimas reduz as indesejáveis leveduras alcoólicas. n

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Cooperados

União de produtores em torno de cooperativas garante mais tecnologia, aumento na produção e permanência na atividade 18

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lucram em grupo Ivaris Júnior

C

om o desmantelamento substancial das estruturas de extensão rural do País – só recentemente retomadas com a criação da Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (Embrater), reativada no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff e ainda em implementação –, a iniciativa privada ganhou, nos últimos anos, protagonismo na transferência de tecnologia para o produtor. Neste segmento, as cooperativas se sobressaem, principalmente as que captam e trabalham com leite. A transferência de tecnologia no segmento leiteiro entre as cooperativas é destinada principalmente para os pequenos produtores – aqueles que tiram até 100 litros de leite por dia e que representam pouco mais de 15% do total de leite captado no País, mas 60% dos pecuaristas de leite no País. Isso porque são justamente estes que têm maior importância quanto ao aumento do potencial de produção leiteira no curto, médio e longo prazos. Independentemente do serviço ou produto, certo é que a carência desta classe de pecuaristas ainda é tão grande que todos cantam em verso e prosa qualquer ajuda que chega em casa. Melhor ainda se for da cooperativa das quais são membros e entregam o leite. Esta merece o café de fazenda, o carinho da família e a atenção de quem vê na visita do técnico o único caminho para o alcance de dias de prosperidade e fartura, mesmo com a falta de recursos, formação e até fé.

Pago com o leite. O produtor Marcílio Almeida financia a aquisição de equipamentos, como este trator recém-adquirido

FOTOS: LUIZ PRADO

na cooperativa

O cooperado Marcílio de Almeida, do Sítio do Raé, produz por volta de 180 litros/dia. Ele é membro da Comevap (Cooperativa de Laticínios do Médio Vale do Paraíba), em Taubaté, SP, e está muito feliz pelo fato de ser membro da cooperativa. Ele fez um trabalho meticuloso de instalar pastagens e recuperar áreas de aguada, desde quando adquiriu a propriedade, em 1997. Somente no fim de 2013 é que comprou 20 novilhas. Hoje, 12 delas estão em lactação. Por ocasião desta reportagem, Almeida estava bastante entusiasmado, pois está de trator, vagão forrageiro e misturador de concentrado “novinhos

em folha”. Com os novos equipamentos, o pecuarista passou a ser mais eficiente, melhorando a produtividade e diminuindo uma série de tarefas. Ele toca o sítio com a ajuda esposa e de um colaborador. A aquisição foi possível graças a linhas de crédito que a Comevap oferece diretamente, onde o cooperado pode pagar seus débitos com leite em até seis vezes com juros de 2% ao mês, sem grandes burocracias. “O montante de crédito está condicionado ao volume de leite produzido mensalmente”, explica o diretor de Produção da Comevap, Expedito Ibraim Viterbo. Além disso, a cooperativa possui acesso diferenciado ao Sicredi e ao Banco Mercantil, onde o cooperado pode contratar outras linhas de crédito, com prazos mais extensos, porém com taxa de juros de mercado, que vão até 5% ao mês.

A Comevap também orienta quando é possível utilizar linhas de crédito governamentais, como o Pronaf, que contam com taxas de juros a partir de 1,5% ao ano, dependendo do montante financiado, além de longos prazos de carência. Aliás, ela também socorre seus cooperados em caso de aperto no fluxo de caixa, com crédito pessoal. Tudo é pago com leite, o que aumenta o engajamento dos produtores com o “saber fazer”. Almeida fez curso de inseminador e frequenta todas as palestras que a cooperativa e o sindicato rural do município oferecem. Ele recebe atualmente R$ 1,20 por litro produzido, incluindo bonificação por qualidade. “A gente

A gente aqui procura trabalhar bem certinho e ter credibilidade na cooperativa, pois é motivo de grande satisfação integrar o seu quadro” Marcílio de Almeida, pecuarista e cooperado da Comevap

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O braço direito do produtor rural Em 2012, por ocasião do Ano Internacional do Cooperativismo, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO/ONU) lançou um estudo no qual apontava a importância das cooperativas para a agricultura familiar, intitulado: “Cooperativas agrícolas: a chave para diminuir a fome e a pobreza”. Segundo a instituição, as cooperativas agrícolas são importante mecanismo de garantia da segurança alimentar e redução da pobreza. Elas beneficiam diretamente o pequeno agricultor, ao aumentar o seu poder

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Na cooperativa. Comevap é essencial, no Vale do Paraíba, para manutenção da atividade leiteira

reforça Pereira, considerado de médio porte em um universo superior a 400 cooperados. Ele cita como exemplo o trabalho de um veterinário chamado para fazer um parto. Dos R$ 250 que teria de pagar, com o apoio da Comevap esse valor caiu para menos de R$ 50. Apesar de ser filho de produtor de leite, Pereira entrou para a atividade apenas em 2013, quando se aposentou e decidiu tocar o sítio. Começou produzindo 90 litros/dia e multiplicou por seis vezes sua produção em 24 meses. Sua meta é chegar aos 1.500 litros, faixa que ele avalia como estável para a estrutura que tem (dois funcionários). Para tanto, melhora seu plantel com inseminação artificial. A cooperativa oferece o curso de inseminador de tempos em tempos, e palestras sobre diversos temas da produção são mensais.

de negociação e a capacidade de compartilhar recursos. Fortalecidos dentro um grupo maior, os agricultores têm condições de negociar contratos melhores a preços mais justos para insumos como sementes, fertilizantes e equipamentos. Além disso, as cooperativas oferecem condições que os agricultores dificilmente aproveitariam individualmente, como a garantia do direito à terra e melhores ofertas de mercado. Elas oferecem, ainda, oportunidades de mercado ao pequeno produtor, formação na gestão de recursos naturais, acesso à informação, tecnologia, inovação e serviços de extensão agrária. Em muitos países, a FAO oferece

sementes de qualidade e fertilizantes aos produtores e cooperativas agrícolas e trabalha em conjunto na aplicação de práticas agrícolas mais sustentáveis e produtivas. Desde associações de pequeno porte até em contratos milionários em escala global, as cooperativas operam em todos os setores da economia, contam com mais de 800 milhões de associados e garantem 100 milhões de empregos no mundo - 20% a mais do que as empresas multinacionais. Em 2008, as 300 maiores cooperativas do mundo movimentaram cerca de U$ 1,1 trilhão, cifra comparável ao PIB (Pruto Interno Bruto) de muitas economias de grande porte.

FONTE: OCB

aqui procura trabalhar bem certinho e ter credibilidade na cooperativa, pois é motivo de grande satisfação integrar o seu quadro. A Comevap foi decisiva em tudo de bom que tem acontecido por aqui”, reforça. O pecuarista Francisco de Barros Pereira é outro membro da Comevap. Ele produz 550 litros de leite por dia no Sítio São José, em Tremembé, a partir de 38 fêmeas em lactação e 22 hectares. A base do volumoso é a silagem de capim napier plantado no próprio sítio. Pereira entende que, “se não fossem as cooperativas, a região já tinha abandonado a produção de leite”, afirma, com todas as letras. “Nosso negócio, hoje, só é viável pelo suporte que a cooperativa dá em vários setores. Não teríamos como contratar assistência técnica diretamente”,


O diretor de Produção da Comevap, Expedito Ibraim Viterbo, explica que a assistência oferecida aos 450 cooperados tem como ponto de partida o leite entregue no laticínio. Todo pecuarista tem seu leite analisado em laboratório, duas vezes por mês. De posse dessas análises, o corpo técnico sabe onde tem de intervir. A cooperativa identifica qual produtor está precisando de ajuda e qual deve receber assistência apenas para manter o que já conquistou. As mesmas análises podem bonificar o produtor ou puni-lo com descontos. Então, muitas vezes, a assistência chega à porteira mesmo sem ser requisitada, pois problemas foram identificados com o leite entregue à indústria. Viterbo, no entanto, reconhece que há pontos para serem melhorados no suporte oferecido. “Estamos em negociação com a Universidade de Taubaté (Unitau) e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) para incrementar a assistência agronômica e zootécnica. A ideia é contar com os laboratórios da Unitau e seus alunos para aumentar a presença técnica nas fazendas. O Sebrae, por sua vez, entraria com um modelo de gestão para incrementar a parceria. Temos de melhorar a produção de volumoso dos nossos cooperados. Fazendo isso, melhoramos o potencial produtivo e conferimos mais qualidade ao leite captado.” A cooperativa, a exemplo de outras estruturas do gênero, possui loja para o fornecimento de insu-

Intercâmbio. O pecuarista Francisco Pereira (à dir.) está sempre em contato com Viterbo, da Comevap, que trabalha para ampliar a assistência técnica aos produtores

mos diversos, de semente de forrageira a sal mineral, de misturador de ração a tanque de resfriamento. Esta também é uma forma de transferir tecnologia, já que a concorrência entre os produtos agrega inovações importantes. Viterbo afirma que “no balcão, os preços ficam mais em conta em torno de 5% a 10%. Porém, em caso de compra de caminhões fechados, os descontos são maiores e a Comevap só cobra o custo financeiro da operação”. Nestes tempos de alta do dólar, alguns desses insumos terão altas significativas, principalmente aqueles que dependem de importação, como é caso de fertilizantes. Todo o aumento será integralmente repassado aos produtores, a exemplo do que já está acontecendo em diversos setores da economia.

AS COOPERATIVAS E O LEITE 367 cooperativas trabalham com lácteos no Brasil

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154 estão no Sudeste, das quais

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105 estão em Minas Gerais

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104 estão no Sul, das quais

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61 no Rio Grande do Sul, onde 74%

dos municípios têm cooperativas leiteiras

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64 estão no Centro-Oeste

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18 estão no Norte

FONTE: OCB

27 estão no Nordeste

Do Centro-Oeste do País, em Goiás, vem outro exemplo do cooperativismo. Trata-se da Cooperativa Mista dos Produtores de Leite de Morrinhos (Complem), atualmente com 1.200 cooperados, que entregam uma média de 200 litros/dia/pecuarista. O técnico agrícola e geógrafo Jurandir Cardoso de Oliveira é um dos seus diretores. Em meados de maio, ele ajudava na realização da Tecnoleite Complem, importante feira do setor na região promovida pela cooperativa. Aliás, várias são as agremiações do gênero que fazem este tipo de evento, uma ferramenta comercial e de intercâmbio de informações e conhecimento. A Complem possui um centro de treinamento que oferece cursos em várias áreas da pecuária leiteira. De pastagens ao manuseio da sala de ordenha, sempre em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) e Sebrae. Pequenos produtores, com menos de 100 litros, representam 40% jun-jul/2015 Mundo do Leite

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Capa dos cooperados e são bastante estimulados a participar, mesmo demonstrando bastante resistência. “Gostaríamos de manter essas parcerias com mais efetividade, pois todos ganham com elas. Esta é a grande luta do nosso corpo técnico”, diz Oliveira. A exploração leiteira da região se dá muito em regime de pastagens. Em função disso, a Complem possui modelos de pastejo rotacionado, assessoria agronômica para adubação e uso de sementes, além de orientação técnica para manejo. Essa assistência praticamente está sendo bancada pela cooperativa, para fomentar a atividade leiteira na região. Mesmo assim, não tem sido fácil o trabalho de convencimento. “Como em todos os setores, há os mais empreendedores, que buscam a inovação o tempo todo; outros que esperam dar certo para o vizinho para depois aderir, e, por fim, aqueles que estão acomodados. Estes demoram muito ou acabam até saindo do negócio”, justifica.

Na hierarquia da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), a Castrolanda Cooperativa Agroindustrial, que completará no ano que vem 75 anos, é um dos destaques, ranqueada entre as cinco mais importantes no setor lácteo. Possui quase 800 cooperados e capta 700.000 litros de leite por dia na região de Castro, PR. No universo de seus produtores há vários perfis: pequenos, com produção de até 120 litros/dia, e grandes, que entregam quase 40.000 litros por dia. A média per capita é de 25 litros/dia. Mas, pequenos ou grandes, todos os produtores se valem dos inúmeros benefícios que a cooperativa oferece. O gerente da Área de Negócios Leite, Henrique Costales Junqueira, explica que a assistência técnica oferecida está baseada em cinco pontos: qualidade do leite, não só por questão de rendimento industrial e diferenciação dos produtos finais, mas por ele me-

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Pastagem. Este é um dos focos da assistência técnica prestada por cooperativas

recer melhor remuneração (o preço base em abril foi de R$ 0,82 ante R$ 1,17 para um leite com baixíssima presença de bactérias, células somáticas e alto teor de sólidos); produção e conservação de forragens e nutrição animal; gestão zootécnica e econômica (números que ajudem os pecuaristas e técnicos na tomada de decisões); planejamento (para evolução do próprio negócio, com dimensionamento e oferta de linhas de crédito), e, por fim, melhoramento genético (indicação de touros para qualidade do leite, longevidade e produção). Em cinco anos, a cooperativa subiu sua produção de 166 milhões de litros/ano para 280 milhões, em 2014.

Junqueira destaca como pontos importantes para o desempenho da Castrolanda parcerias como a com a Fundação ABC, uma entidade mantida por cooperativas da região que testa as tecnologias a serem introduzidas nas fazendas, como novas variedades de milho, gramíneas e outros insumos. Ressalta também a parceria com a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Holandesa (ABCBRH), responsável por controle leiteiro, melhoramento genético e análise do leite. Além disso, possui setores específicos para incrementar o diálogo e o apoio aos cooperados. Um deles é o de comercialização de animais (ajuda para compra e venda de animais); outro de controle sanitário e gestão; setor de lojas agropecuárias para fornecimento de insumos oferecidos com base na avaliação de um comitê técnico – pois a cooperativa entende que seu negócio é produzir leite e não revender produtos – e também um setor de assistência médico-veterinária. Mais recentemente, ainda em processo de instalação e aperfeiçoamento, há o setor para recria de novilhas, onde criadores especializados nesta tarefa, em cinco propriedades, já trabalham com 550 animais. O objetivo é garantir que elas cheguem com o máximo de vigor e desenvolvimento no período reprodutivo.


Recria eficiente de novilhas A recria de novilhas tem desafiado produtores em várias regiões. Assim, muitas vezes, até mesmo o laticínio, não necessariamente uma cooperativa, também assume o papel de transferidor de tecnologia. Um exemplo vem das unidades da empresa goiana Piracanjuba, que criou o Piracanjuba Pró-Campo, programa de apoio técnico ao produtor de leite, que tem como principal objetivo oferecer melhores condições práticas e de conhecimento para que os produtores possam alcançar a excelência em sua atividade. Nesse contexto, um dos maiores obstáculos relacionados à pecuária leiteira, atualmente, diz respeito à alta mortalidade de bezerras, com um impressionante percentual, que chega a 25% dos animais jovens. A perda é alta e seu controle gera custos significativos e exige mão de obra especializada, solução que não é acessível a todos os produtores. Então, o Piracanjuba Pró-Campo lançou em abril o Projeto de Recria de Fêmeas, que visa à formação de produtores, técnicos e funcionários interessados no assunto para reduzir a mortalidade de bezerras, garantir maior tempo de vida produtiva, diminuir custos de mão de obra e aumentar a produtividade nas propriedades rurais. Para tanto, instalou um Centro de Recria de Fêmeas para desenvolver técnicas e repassá-las aos produtores. O centro está recebendo animais dos fornecedores de leite de Bela Vista de Goiás, GO, com propriedades no entorno.

leite e/ou sucedâneo, para posteriormente seguir para a fase de adaptação.

O consumo de concentrado terá início no terceiro dia de vida, por volta de 50 gramas/ dia, para estímulo do consumo. A disponibilidade será aumentada de acordo com o desenvolvimento da bezerra. Até os 56 dias, a bezerra deverá ter dobrado o peso vivo em relação ao peso ao nascer. A partir do nascimento até a cobertura, a bezerra deverá ganhar, em média, 700 gramas/dia. A oferta de volumoso terá início aos 35 dias de vida. Na fase reprodutiva (acima de 10 meses de idade), a bezerra não poderá ganhar peso médio diário acima de 900 gramas/dia. Em todos os lotes, deverá ser observada a existência da diferença de desenvolvimento e tamanho dos animais, de forma a evitar a competição desigual por alimento e, assim, obter o desenvolvimento esperado. n

Bezerras. Programa foca na redução do alto índice de mortalidade

Segundo a cartilha publicada sobre o projeto, as bezerras chegarão ao centro após a colostragem. Na fase inicial terão dieta à base de leite (6 litros/dia) ou sucedâneo (de acordo com recomendações do fabricante) fornecido em duas vezes, concentrado e água à vontade, e volumoso (preferencialmente feno) a partir de 35 dias de idade. A duração poderá ser de 60 a 90 dias, determinada pelo ganho de peso, idade e consumo de concentrado. Após o desmame, a bezerra permanecerá na mesma estrutura por 14 dias, sem o fornecimento de jun-jul/2015 Mundo do Leite

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Sustentabilidade Alexandre M. Pedroso

LUIZ PRADO

Qual o papel do nutricionista?

Alexandre M. Pedroso Consultor em Nutrição e Manejo de Bovinos Leiteiros Cowtech Consultoria e Planejamento

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No meu trabalho como consultor em nutrição para fazendas leiteiras, muitas vezes recebi solicitações de produtores para avaliar as formulações das dietas na fazenda. Quando eu visitava a propriedade, comumente encontrava diversos problemas além da formulação das dietas, e, em algumas oportunidades, não havia nada de errado com elas. Nesses casos, senti que vários produtores ficaram incomodados com o fato de eu lhes dizer que o problema não estava nas dietas, mas nas práticas de manejo relacionadas à alimentação. Quando trabalhamos dentro dos conceitos da nutrição de precisão como uma ferramenta para alcançar a verdadeira sustentabilidade, o papel do nutricionista vai além da formulação das dietas. Costumo dizer que formular é a parte mais fácil do processo, o complicado é fazer com que as vacas efetivamente consumam o que foi formulado. E aí entram questões de manejo, qualidade dos alimentos, conforto, sanidade, etc. E me surpreende o fato de encontrarmos um número expressivo de técnicos e produtores que ainda acreditam que a formulação da dieta é a salvação da pátria, e acabam por negligenciar aspectos fundamentais para conseguir eficiência produtiva elevada.

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Obviamente todo nutricionista deve ser um bom avaliador e formulador de dietas. Isso deve ser cobrado dele. Esse profissional, seja autônomo, seja um técnico de alguma empresa fornecedora de insumos, deve ter formação técnica sólida e atualizada para oferecer ao produtor a melhor solução em termos de formulação. Porém, como eu disse, essa é a parte fácil do processo. Um bom nutricionista deve oferecer mais do que isso para o produtor de leite. Deve apresentar soluções para que o manejo alimentar do rebanho seja um processo eficiente, e isso vai muito além da formulação. Não adianta o produtor investir em alimentos de alta qualidade, se estes não forem bem utilizados. Numa fazenda há diferentes pontos possíveis de perda desses alimentos, desde o armazenamento até o fornecimento, e o nutricionista precisa se envolver nesse tema, mesmo não estando no dia a dia da fazenda e nem tendo papel operacional no negócio. A redução das perdas no armazenamento pode ter um impacto econômico positivo bastante significativo.

Um aspecto muito importante é o recebimento de alimentos comprados. Infelizmente é bastante comum ver caminhões sendo descarregados sem que nenhum funcionário da fazenda acompanhe o processo. Supervisionar as descargas é importante para conferir quantidades, garantir o correto armazenamento, e coletar amostras quando for o caso. Isso garante um controle de qualidade muito mais rígido. Obviamente não é o nutricionista quem vai fazer isso, mas ele pode, e deve, conhecer como esse processo se dá na fazenda, e se necessário fazer as recomendações necessárias para que o trabalho seja executado da melhor forma. Também é altamente recomendável coletar amostras de todos os alimentos que chegam à fazenda, armazenando-as adequadamente para que possam ser analisadas caso haja algum problema de refugo pelos animais ou suspeita de intoxi-


cação. Esse é um cuidado que pode ajudar muito a identificar precocemente a causa de eventuais problemas, acelerando a solução, o que também pode ajudar a reduzir as perdas relacionadas à alimentação. Outra coisa simples, mas muitas vezes negligenciada, é a limpeza e a organização dos galpões de armazenamento de alimentos. Isso é uma coisa que todo mundo sabe, mas infelizmente ainda vemos em diversas fazendas galpões com goteiras no teto, infiltrações nas paredes, infestação de insetos e roedores. O prejuízo pode ser enorme. Sem mecanismos de checagem e controle, pode chegar facilmente a mais de 15% do total estocado. Uma goteira sobre uma pilha de grãos de milho pode fazer um estrago enorme. Além da perda direta, o desenvolvimento de fungos com propagação de toxinas pode ser desastroso. Um dos conceitos da nutrição de precisão é não deixar que isso aconteça, e o nutricionista pode muito bem fazer um planejamento para verificação e controle dessas fontes de perdas. Outra área essencial é o manejo dos volumo-

sos. Quem me conhece sabe o quanto eu destaco o impacto da qualidade da forragem sobre a rentabilidade dos sistemas de produção de leite. Produzir um volumoso de qualidade superior é fundamental para melhorar a eficiência de uso desses alimentos, e não implica maior custo de alimentação. No caso de sistemas baseados em pastagens, o que determina a qualidade da forragem ingerida pelas vacas é, em grande parte, o manejo do processo de pastejo. Além disso, pastos mal manejados podem necessitar de reformas, o que tem um impacto muito grande nos custos de produção, pois pastagens bem manejadas são perenes. No caso das forragens conservadas, as fontes de perdas são enormes. Em muitas fazendas que produzem silagens, via de regra os animais ingerem não mais de 80% do que foi plantado. Condução correta da cultura e manejo adequado do processo de ensilagem e da retirada do material do silo são imprescindíveis para reduzir essas perdas. Não é o objetivo deste artigo discorrer sobre as técnicas para fazer uma boa

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Sustentabilidade

Logicamente não se pode cobrar do nutricionista que ele saiba agronomia, mas ele pode ajudar muito no controle de perdas de forragens conservadas

silagem, mas isso deve ser uma preocupação constante dos produtores de leite. Silagens mal feitas e silos mal manejados podem resultar em perdas quantitativas acima dos 15%. Dá pra ter uma ideia do que isso significa? Colher 1.000 toneladas de silagem e só utilizar 850? Repetindo o que já citei anteriormente, outro conceito da nutrição de precisão é não deixar que isso aconteça, e novamente aqui o nutricionista pode e deve se envolver. Logicamente não se pode cobrar do nutricionista que ele tenha conhecimento agronômico (caso não seja um engenheiro agrônomo), mas ele pode ajudar muito no controle das perdas durante o processo de conservação e utilização de forragens conservadas. A terceira área a ser trabalhada para reduzir as perdas é o processo de alimentação propriamente dito, envolvendo a formulação e fornecimento das dietas. As palavras de ordem são precisão, consistência e muita atenção aos detalhes. Vacas leiteiras, para que sejam eficientes no uso dos alimentos, demandam grande consistência no manejo da sua alimentação. É preciso incorporar definitivamente o conceito de que as vacas precisam de nutrientes, e não de alimentos, e a oferta desses nutrientes tem que ser feita de forma uniforme e consistente. Os responsáveis pela alimentação do rebanho podem trabalhar com elevada flexibilidade em relação aos ingredientes que compõem a ração das vacas, mas jamais podem aceitar elevada variabilidade na composição nutricional da dieta ingerida pelas vacas.

A meta é que a dieta formulada seja idêntica à fornecida, que por sua vez deve ser idêntica à ingerida pelas vacas. Especificamente nesse ponto o nutricionista pode se envolver muito, orientando o pessoal responsável pelo trato dos animais, e estabelecendo processos para verificação e controle, de forma a garantir a consistência necessária para que se consiga elevada rentabilidade no processo. Esses são alguns exemplos de como o nutricionista que atende uma fazenda produtora de leite pode se envolver profundamente nos processos associados ao manejo alimentar do rebanho, indo muito além da formulação, como destacado anteriormente. E é muito importante que todo produtor converse com o nutricionista para que ele tenha essa postura. É só desta forma que esse profissional, classe da qual faço parte, poderá fazer a diferença e efetivamente gerar valor e contribuir para melhorar a rentabilidade da fazenda. n

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Sanidade

Cerco total à saúde do úbere A mastite é a principal preocupação do produtor, mas não deve ser a única Marcela Caetano

Já a varíola é uma doença infectocontagiosa que se caracteriza por lesões cutâneas em vacas lactantes e bezerros. Vânia explica que as lesões se mostram bastante resistentes, mesmo quando já estão secas. Em vacas lactantes as lesões estão principalmente nos tetos e eventualmente no úbere.

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FOTOS: LUIZ PRADO

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mastite é a maior inimiga do produtor de leite, mas não é só ela que preocupa quando o assunto é saúde do úbere. Outras doenças têm o potencial de afetar a produção. “Cistos, lesões e edemas, por exemplo, podem levar à perda de tecido especializado na produção de leite, ou até do quarto mamário”, afirma o veterinário e consultor comercial da empresa fabricante de equipamentos para o setor leiteiro Sulinox, Lissandro Stefanello. Entre as doenças as quais o produtor deve ficar atento está a papilomatose. Também conhecida como verrugose ou figueira, essa doença infectocontagiosa é causada pelo papilomavírus bovino (BPV) e se caracteriza por lesões na pele. Conforme a pesquisadora da Embrapa Gado de Leite Vânia Maria de Oliveira, quando o úbere e/ou tetos de novilhas ou vacas são afetados pelos papilomas, as perdas por infecções secundárias, principalmente a mastite, são significativas. Além disso, a doença dificulta a ordenha e também a amamentação.

Vaca saudável. Garantia de qualidade e produção de leite

Já nas bezerras são verificadas na boca, no focinho e na gengiva. Segundo a pesquisadora, a pseudovaríola é mais frequente do que a varíola propriamente dita e também é provocada por um vírus. A doença causa lesões nos tetos dos bovinos e mais raramente no úbere. As lesões se caracterizam por bolhas doloridas, com edemas, progredindo para eritema (uma espécie de inflamação na pele), que afeta principalmente os tetos de animais em lactação, podendo também atingir o úbere e a boca. Já a estefanofilariose é causada por um nematoide do gênero Stephanofilaria, responsável por lesões nos bovinos ao redor do olho, na papada, nos ombros, na parte ventral do abdômen e no úbere. Ocorre mais durante

períodos chuvosos, tendo como vetor a mosca-dos-chifres. O manejo inadequado durante a fase de bezerra também pode fazer com que muitas novilhas percam um ou mais quartos mamários, explica a pesquisadora da Embrapa Vânia. “Nesta fase alguns animais têm por hábito mamar uns nos outros, seja em razão do pequeno espaço que às vezes ocupam ou pela proximidade dos bezerros nessas instalações. Este hábito, porém, pode causar danos irreversíveis à glândula mamária, como, por exemplo, destruição de parte interna da glândula, com redução da capacidade produtiva do animal.” Conforme a pesquisadora, alguns animais já têm este hábito na fase de bezerra e outros o adquirem imediatamente após o desmame.


O excesso de animais em um mesmo espaço também pode causar danos ao úbere, como ferimentos provenientes de pisoteio, cerca de arames e objetos pontiagudos. Outra lesão comum em animais de produção são rachaduras decorrentes do uso inadequado de desinfetantes cáusticos e também pelo frio excessivo. As lesões nos tetos causadas por equipamentos de ordenha mal regulados, sub-ordenha, ordenhadores, força excessiva na manipulação de tetos e remoção das teteiras sem desligar o vácuo podem gerar uma reação chamada hiperqueratose, que deixa a pele espessa, e prejudica o fechamento do canal dos tetos. Em condições normais, o esfíncter permanece aberto entre 40 minutos e uma hora após a ordenha, razão pela qual se recomenda alimentar os animais após a ordenha, para que permaneçam em pé até o fechamento do esfíncter. Se os tetos estiverem lesionados, esse período aumenta, favorecendo a entrada de bactérias no canal do teto. Prevenir essas doenças passa por adotar medidas para impedir que micro-organismos (germes como fungos e bactérias) contaminem a superfície dos tetos, prejudicando o leite e a saúde dos animais. Manter esses agentes infecciosos longe das vacas depende de deixar em dia a higiene das instalações e também durante a ordenha. No caso das instalações, tanto a sala de ordenha quanto galpões ou estábulos devem ser arejados, com boa claridade, e possuir pisos que favoreçam uma boa limpeza, evitando o acúmulo de esterco nestes locais e a presença de moscas.

permanecer desregulada por mais de três dias há grande risco de isso afetar as vacas, que terão de ser tratadas com antibióticos. Com isso, o produtor pode perder até cinco dias de leite”, acrescenta o veterinário da Sulinox. O cuidado deve começar pela pressão. Cada sistema tem a sua pressão indicada. Se for de balde ao pé, deve ser de 44 a 50 kpa (quilo-pascal), conforme o Conselho Brasileiro de Qualidade do Leite. Acima disso, a pressão pode agredir demasiadamente os tetos, causando edemas, inversão, problemas de formação e anéis arroxeados nos tetos. Se for no sistema canalizado, há duas orientações: caso seja um sistema de linha média – em que todas as tubulações estão acima do dorso da vaca, a pressão deve ser de 44 a 50 kpa. Quando a tubulação estiver abaixo da linha do dorso, caso da canalização baixa, a gravidade faz a sua parte e ajuda o leite a descer. Portanto, a pressão pode ser menor, de 42 a 46 kpa.

Entre as duas opções, Stefanello salienta que a linha baixa é a mais indicada para a preservação da saúde do úbere, por exigir menos pressão. Contudo, ele reconhece que o sistema pode ser até três vezes mais caro, o que faz com que 80% dos produtores optem pelo sistema de linha média. A pressão é regulada por uma bomba de vácuo, que produz litragem de vácuo suficiente para o número de conjuntos de ordenhadeiras que estão no sistema. A recomendação é de 110 litros por conjunto. Para cinco conjuntos, por exemplo, são necessários 550 litros de vácuo. “Um dos principais problemas na venda de ordenhadeiras hoje é que são vendidas bombas subdimensionadas para a necessidade do sistema. É uma economia que sai caro”, esclarece Stefanello. Sem a pressão necessária, as teteiras caem e, se colocadas de volta sem serem limpas, podem contaminar os tetos com sujeira. Além disso, se a bomba de vácuo estiver desregulada, muito leite deixa de ser co-

A manutenção de ordenhadeiras também é fundamental para evitar doenças. A regulagem dos equipamentos pode fazer a diferença para a saúde do úbere e a boa produção. “Se a máquina

Ordenhadeira. Se o equipamento permanece desregulado por três dias já pode afetar os tetos

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Sanidade letado, o que pode gerar inflamações. “Se o nível de vácuo for inferior ao recomendado, o animal fica mais tempo na ordenha do que o necessário. Esse excesso de exposição causa stress, dor e machuca os animais, podendo levar a um prolapso de esfíncter (quando o anel muscular que controla a saída de leite fica para fora do teto), deixando o local suscetível à entrada de bactérias. Já se o nível for maior do que o recomendado, causa dor ao animal e a liberação do leite não ocorre com facilidade”, explica o gerente de equipamentos de ordenha com automação João Alves Salgado Neto, da DeLaval, outra fabricante de equipamentos para leite.

O pulsador também precisa estar bem regulado. É ele que gera a “batida” para fazer com que a teteira aperte e relaxe o teto. “Muitas vezes o produtor acha que, acelerando o pulsador, vai tirar mais leite, mas só vai machucar a vaca”, garante Stefanello, da Sulinox. Por outro lado, se o pulsador estiver desacelerado, a vaca ficará exposta à pressão por muito tempo, quando o ideal é que cada ordenha leve entre cinco e oito minutos. A troca periódica de peças também é importante para o bom funcionamento da ordenhadeira. As teteiras devem ser trocadas após 2.500 ordenhas ou a cada seis meses, o que chegar primeiro. Caso sejam de silicone, o período dobra para 5.000 ordenhas. “Se a troca não for feita no tempo certo, a borracha da teteira perde a elasticidade, o que causa falhas na massagem e vai provocar machucados ou não retirar o leite”, alerta Stefanello. Um sinal comum de que há problemas na ordenhadeira é a formação de um anel arroxeado no teto. “Isso indica a sub-ordenha ou a sobreordenha”, diz Salgado Neto. A primeira ocorre quando o ordenhador inter-

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A MASTITE PODE REDUZIR EM ATÉ

rompe o processo de ordenha antes de ele estar completo e, a segunda, quando o conjunto de ordenha da vaca fica mais tempo do que o necessário ligado à vaca e o leite já foi todo extraído. A regra para a troca das mangueiras de leite é a mesma: seis meses. Com o uso, ocorre a formação de sedimentos que podem contaminar o leite. A limpeza do equipamento também merece destaque. “O leite é rico em gordura e proteína, um substrato ideal para bactérias”, diz Salgado Neto. Ele orienta os produtores a verificar a limpeza de componentes, como o copo coletor, por exemplo, que pode ser identificada pela análise visual. “Ele precisa ser tão limpo quanto um copo d’água que bebemos em casa. Se houver um aspecto viscoso ou uma camada seca de sedimentos, precisa ser limpo”, recomenda. Para Salgado Neto, a manutenção preventiva é de extrema importância. “Muitas vezes, existem pequenas ineficiências que só o técnico consegue identificar. Há resistência dos produtores quanto a isso, mas uma manutenção emergencial é muito mais cara”, garante. Antes da ordenha, é preciso limpar os tetos, mas sem limpar o úbere todo, ressalta Stefanello. A limpeza pode ser feita tanto com água quanto com clorexidina. Depois da limpeza, os tetos devem ser enxutos com um papel toalha individual para cada teto. “Ordenhar as vacas com tetos sujos e úmidos, além de ser uma das principais causas de contaminação do leite, provoca o aparecimento de mastite nas vacas em lactação”, pondera Vânia, da Embrapa. Depois da ordenha, a alimentação das vacas é recomendada para que elas se mantenham em pé e o teto possa fechar, evitando a entrada de bactérias. Também deve ser usado ácido lático ou iodo cosmético para este mesmo fim.

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Queda da produção de leite.

Descarte do leite.

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Diminuição do preço recebido por litro de leite.

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Sanidade Mastite afeta a maioria dos rebanhos

A

s doenças descritas também podem abrir as portas para a mastite, que ainda é o principal motivo de descarte entre vacas leiteiras e causa perdas de 30% a 40% da renda do produtor e afeta, em média, 30% do rebanho nacional. A forma subclínica da mastite, que pode ser até 40 vezes mais frequente do que a forma clínica, causa as maiores perdas econômicas e a redução da produção de leite por rebanho pode chegar a 71%. “A doença tem uma prevalência bastante alta e há espaço para redução. Para isso, é necessário adotar um programa de controle”, diz o professor da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP e presidente do Conselho Brasileiro de Qualidade do Leite (CBQL), Marcos Veiga, colunista de Mundo do Leite. Ele salienta que, por ter diferentes agentes causadores e pela produção se dar em condições diversas em cada propriedade, não é possível indicar um meio universal de lidar com a doença. “Isso ocorre principalmente em função das distintas realidades relacionadas aos sistemas de produção; à produção e genética dos rebanhos e à condição social, econômica e cultural dos produtores”, salienta a pesquisadora da Embrapa Gado de Leite, Vânia Maria de Oliveira. Mas é fundamental que o produtor tenha meios para diagnosticar a doença. Para auxiliar nessa tarefa, a Embrapa Gado de Leite deve lançar em julho cartilhas que orientam os produtores a fazer o diagnóstico e o tratamento da doença. Veiga explica que o CMT (California mastitis test) é uma forma simples de diagnosticar a doença e que os produtores devem lançar mão do exame. Depois da limpeza dos tetos, os primeiros três jatos de leite de cada teto devem ser tirados, para estimular a produção de ocitocina e também realizar o exame para mastite. Esse leite é colocado em um recipiente com

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Cuidados. Antes do teste da caneca de fundo preto, só os tetos são lavados

O teste. Jorram-se os três primeiros jatos na caneca de fundo preto

Desinfecção. Em seguida, tetos são desinfetados com iodo


reagente e, se apresentar aspecto gelatinoso, indica que há problemas. “O ideal é que seja feito todo dia, no mínimo duas vezes, para que se tenha um controle da saúde dos animais. Outra maneira de se fazer esse controle é ter um protocolo estabelecendo quando o exame será feito”, afirma Paulo Fernando Machado, diretor da Clínica do Leite da Esalq/USP. “Muitos produtores não fazem o exame porque estão preocupados com reprodução, custo de alimentação e preço do leite, por exemplo, e não dão prioridade a este problema”, acrescenta.

Há também o teste da caneca telada ou de fundo escuro, que consiste na eliminação dos três primeiros jatos de leite em uma caneca com fundo escuro e permite a detecção do leite visivelmente alterado. “Muitas vezes o produtor não faz o CMT nem o teste da caneca, e quando identifica o problema já é tarde demais”, acrescenta Vânia. Como boa parte das propriedades não faz esses exames de rotina, a contagem de células somáticas do tanque de refrigeração é a informação mais utilizada para identificar casos de mastite. Para Vânia, porém, não apenas a fal-

Doença pode se manifestar de forma clínica ou subclínica A mastite é uma inflamação da glândula mamária que pode surgir na forma clínica _ em que os animais apresentam sinais clínicos como secreção de leite com grumos, pus ou aspecto aquoso, tetos e úberes com vermelhidão, edema e áreas endurecidas _, ou subclínica, ou seja, sem alterações visíveis no leite e no úbere. Há outros sintomas, como febre, perda de apetite e úberes quentes e doloridos. Em mais de 95% dos casos, a mastite tem como causa uma infecção bacteriana, causada por Streptococcus agalactiae, S. aureus, S. dysgalactiae, S. uberis e Escheria coli. O resultado dessa infecção é a destruição das células epiteliais, responsáveis pela síntese dos principais componentes do leite (proteína, gordura e lactose), explicam José Reinaldo Brito e José de Oliveira Sales, no artigo Saúde do úbere: uma revisão, publicado na “Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal” em

2007. Há dois tipos de mastite: a ambiental, na qual a vaca é contaminada por um agente encontrado no ambiente da fazenda (água, fezes, materiais usados como cama, pele dos animais e úbere); e a contagiosa, que é transmitida entre as vacas e que não tem cura. A contaminação ocorre entre animais ou quando visitantes trazem a doença. Caminhões de coleta, por exemplo, podem ser vetores da doença, pois transitam em diversas propriedades e podem trazer as bactérias de uma propriedade para outra. A disseminação dos micro-organismos contagiosos no rebanho ocorre sobretudo na ordenha, através de equipamentos contaminados ou pelas mãos de ordenhadores. No caso da mastite ambiental, geralmente a bactéria fica no piso da sala de ordenha ou da sala de espera. Higienizando o ambiente em que a vaca se encontra, geralmente o problema se resolve.

ta de diagnóstico, mas o tratamento das vacas infectadas, constitui um grande problema da pecuária leiteira. Ela alerta para a possibilidade de desenvolvimento de resistência em bactérias que causam doenças. “Isso ocorre quando os

antibióticos são utilizados de forma inadequada, como sem prescrição médica ou por períodos de tempo insuficiente, o que pode levar à seleção de linhagens de bactérias resistentes, dificultando a cura de várias infecções.” n

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Qualidade Marcos Veiga

Mastite também pode provocar problemas reprodutivos Ambos são os principais motivos que afetam o lucro

A

Marcos Veiga Professor Associado da Faculdade

Tradicionalmente, a mastite é reconhecida

de Medicina

como uma doença que afeta o bem-estar, a produção e a qualidade do leite. No entanto, ainda é pequena a percepção por parte dos produtores de que a mastite também está associada com problemas

Veterinária e Zootecnia da USP, campus de Pirassununga, SP.

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mastite e a infertilidade estão entre os principais problemas que afetam a lucratividade da fazenda, além de serem considerados as principais causas de descarte involuntário dos rebanhos. Os custos mais conhecidos da mastite são os associados à mastite subclínica (redução da produção e da qualidade do leite; perda de bonificação do preço do leite) e clínica (redução da produção de leite antes e após o caso clínico; descarte de leite com resíduos de antibióticos, medicamentos, custo de mão de obra, descarte e perda do valor da vaca). O custo dos casos clínicos de mastite depende da gravidade, que pode ser classificada em (1) Leve (somente alterações do leite), (2) Moderada (alterações do leite e inchaço do quarto mamário afetado) e (3) Grave (quando há comprometimento sistêmico da vaca, além dos demais sintomas de alteração do leite e do quarto mamário). Contudo, pouca ênfase tem sido dada aos efeitos indiretos da mastite, entre os quais o risco de transmissão de mastite para as vacas sadias e a redução do desempenho reprodutivo. Além da mastite, outras doenças comuns na fase inicial da lactação podem afetar a reprodução. As doenças mais associadas com a redução de desempenho reprodutivo são os problemas de locomoção, a metrite, o aborto, os cistos ovarianos, os quais afetam negativamente os principais índices reprodutivos: dias até o primeiro serviço, dias em aberto, número de serviços/concepção. A interrelação entre a ocorrência de doenças do período pós-parto, reprodução e mastite se dá principalmente em razão das consequências do balanço energético negativo no início da lactação, o que afeta o sistema imune e endócrino da vaca.

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reprodutivos. Estudos realizados na última década indicam que tanto a mastite clínica quanto a subclínica podem ter efeitos negativos sobre o desempenho reprodutivo das vacas. Isso ocorre em parte porque a incidência de mastite clínica é maior no início da lactação, justamente o período no qual as vacas leiteiras encontram-se vazias e em fase de manejo reprodutivo. A maioria dos estudos sobre a relação entre mastite e reprodução foi baseada em dados retrospectivos de fazendas comerciais, o que pode resultar em diferenças entre os resultados obtidos.

Alguns estudos indicam que a mastite clínica afeta de forma negativa o desempenho reprodutivo de vacas leiteiras. Por exemplo, vacas com mastite clínica podem ter aumento de cerca de 22 dias do intervalo parto até a primeira inseminação e de até 44 dias de aumento até a concepção, em comparação com vacas sadias. Por outro lado, mesmo as vacas com mastite subclínica nas quais somente ocorre aumento de CCS (maior do que 200.000 células por mililitro), mas sem a presença de sintomas clínicos evidentes, sofrem os efeitos negativos sobre a reprodução. Quando ocorre aumento da CCS próximo ao dia da inseminação artificial, as vacas têm redução da probabilidade de concepção. Cerca de 30% das vacas com mastite crônica (elevada CCS por mais de dois meses consecutivos) apresentam demora da ovulação, baixa concentração de estradiol, além de ter uma onda de hormônio luteinizante mais baixa ou atrasada. Desta forma, considerando que a mastite subclínica pode atingir em média cerca de 30% a 40% das vacas de um rebanho, pode-se estimar que o efeito negativo da mastite é altamente relevante. Os efeitos negativos da mastite sobre a reprodução dependem do momento em que ocorrem as infecções em relação à inseminação artificial ou à cobertura. Pode-se dividir estes efeitos negativos da mastite em três momentos: antes, próximo e após a


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Qualidade inseminação artificial. Ainda que ocorra certa variação nos resultados dos estudos realizados, quando a mastite clínica ocorre entre 14 dias antes e 35 dias após a inseminação artificial, os resultados indicam uma menor probabilidade de concepção, sendo que o período mais crítico se dá na semana anterior ao início do caso clínico. Desta forma, a ocorrência da mastite clínica antes da inseminação artificial tem menor impacto negativo do que quando ocorre após a inseminação. Por exemplo, vacas com mastite clínica antes da inseminação apresentaram intervalo de parto até a primeira inseminação de 93 dias (a mais ou menos cinco dias), enquanto vacas com mastite após inseminadas apresentaram este mesmo índice de cerca de 71, mais ou menos dois dias. Por outro lado, em relação ao número de serviços/concepção, vacas com casos de mastite clínica depois da inseminação apresentaram 2,9 serviços/concepção, enquanto vacas com casos clínicos antes da IA ou depois do diagnóstico de prenhez apresentaram 1,6 serviço/concepção.

O número de dias do parto até a concepção em vacas com mastite clínica antes da primeira inseminação foi de 113, mais ou menos dez dias, enquanto nas vacas com mastite clínica após a primeira inseminação este índice foi de 136, mais ou menos 13 dias, e, para as vacas sadias ou com casos clínicos após a confirmação da prenhez, foi de 92, mais ou menos quatro dias. Além dos efeitos negativos sobre a taxa de concepção, vacas com casos clínicos de mastite nos primeiros 45 dias de gestação apresentam 2,7 vezes mais risco de abortarem do que vacas sadias Considerado um custo médio de cerca de R$ 6 por dia vazio e que em média pode ocorrer aumento de aproximadamente 26 dias no intervalo médio entre o parto e a prenhez, o custo da ocorrência de mastite sobre a reprodução pode ser estimado em aproximadamente R$ 156 por vaca com mastite durante o período reprodutivo. Não foram ainda elucidados de forma completa os mecanismos pelos quais o desempenho reprodutivo (concepção e manutenção da gestação) é reduzido pela mastite. No entanto, a mastite afeta a função endócrina e aumenta a liberação de mediadores anti-inflamatórios, tais como as citocinas, as interleucinas e a prostaglandina F2α. Sendo assim, antes da cobertura da vaca, a mastite pode causar desarranjo do perfil de hormônios, como a diminuição da produção de estradiol e o atraso na liberação da onda de

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LH. Estas alterações afetam diretamente o funcionamento folicular em razão de baixas concentrações de estradiol e baixa secreção de hormônio luteinizante, o que resulta em demora da ovulação. Um estudo indicou que a vacas sadias ficam prenhes 25% mais rápido do que vacas com mastite clínica. Por outro lado, considerando o momento próximo da inseminação artificial, a mastite afeta a maturação do oócito e a fertilização. Após a inseminação, os efeitos negativos da mastite estão associados com interferência na formação do corpo lúteo, na secreção de progesterona, nas funções endometriais e desenvolvimento do embrião. A ativação da resposta inflamatória na glândula mamária pode resultar em morte embrionária, em razão da liberação de lipopolissacárides e outras toxinas de origem bacteriana e da produção local de citocinas. A mastite apresenta uma ampla variedade de potenciais micro-organismos causadores. Uma das mais simples classificações desses agentes é a divisão em dois grupos: gram-negativo e gram-positivo. A principal diferença entre estes grupos está na composição e organização da parede celular, a qual é mais complexa nos agentes gram-negativos, o que resulta em diferenças marcantes na sintomatologia clínica, gravidade dos sintomas e nos protocolos de tratamento. Os estudos mais recentes indicam que a mastite clínica causada tanto por gram-negativos quanto gram-positivos afeta de forma similar os índices reprodutivos. Resultados de um estudo indicaram que a taxa de concepção foi de 78% em vacas sadias e de apenas 42% em vacas com mastite clínica causada por Escherichia coli e de 38% em vacas com casos clínicos causados por estreptococos ambientais. Em resumo, a mastite clínica e subclínica no período pós-parto afeta negativamente o desempenho reprodutivo de vacas leiteiras. A mastite pode afetar a manifestação do estro, prolongar a fase luteínica do ciclo estral, interferir na função endócrina, no desenvolvimento folicular e na ovulação. Tais efeitos resultam em aumento do período de serviço, do período do parto até a primeira inseminação artificial, assim como aumento do número de serviços/concepção e redução da taxa de concepção. Desta forma, a redução e o controle da mastite clínica e subclínica deveria ser um objetivo dos produtores não somente para melhoria da qualidade do leite e redução dos custos diretos, mas para reduzir os custos indiretos associados à perda de desempenho reprodutivo. n

Um estudo indicou que a vacas sadias ficam prenhes 25% mais rápido do que vacas com mastite clínica.



Fazenda

Leite que sai de pedra FOTOS: TAO HASSE

Família Vedana, no oeste catarinense, segue à risca mandamentos do Balde Cheio e tira, por animal, a média de 16 litros por dia.

Vaca Jersey. Rebanho dos Vedana tem produção média de 16 litros por cabeça.

Família reunida.

C

omo milhares de pequenos agricultores do Sul, a família Vedana sempre teve suas vaquinhas para garantir o leite das crianças, bater uma manteiga ou fabricar queijo para consumo doméstico. De rotina, era apenas meia dúzia de litros por dia até que, na entrada do século 21, o patriarca Hermes Vedana, a esposa, Inês, e os filhos Fabiano e Renato decidiram “produzir leite para vender” a um laticínio que abrira uma linha de coleta da matéria-prima na estrada entre os municípios de Coronel Freitas e União do Oeste, na região de Chapecó, SC. Aposta arriscada, mas valeu a pena. Uma década e meia depois, o leite é o principal produto da propriedade rural de 50 hectares, situada na Linha Roncador, a cerca de 500 quilômetros de Florianópolis, Curitiba e Porto Alegre. “No começo, eram só uns 40 litros por dia”, conta o chefe da família, lembrando que toda manhã era preciso deixar os tarros de leite na porteira, conforme o costume das pequenas propriedades, na época. Com o tempo, tudo foi mudando. “Hoje, são pouco mais de 600 litros que o caminhão tem de buscar todo dia, pois nosso resfriador só comporta 1.080 litros.” A essa grande diferença de produção corresponde uma revolução tecnológica que percorre de alto a baixo a cadeia produtiva da pecuária leiteira, modernizada de ponta a ponta. No topo, estão a Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos, SP, criadora da metodologia do Balde Cheio, que há menos de 20 anos sistematizou uma série de práticas agropecuárias aplicáveis a várias regiões do Brasil.

Da esq. para a dir.,

Na base, estão milhares de produtores

seu Hermes; Inês, a

assistidos por uma rede de assistência técnica e extensão rural que conta com o apoio do sistema oficial de crédito agrícola, de prefeituras, sindica-

pequena Ana Carloina, Ione e Fabiano.

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Geraldo Hasse

Mundo do Leite jun-jul/2015


tos rurais, cooperativas e empresas particulares. Na ponta do consumo, milhões de consumidores ávidos por experimentar o que a indústria láctea oferece, de leite pasteurizado e UHT a a queijos, iogurtes e outras iguarias. É uma revolução mercadológica abalada de dois anos para cá, porém, por práticas fraudulentas detectadas pelo Ministério da Agricultura e comprovadas pelo Ministério Público Federal. Por isso, mesmo sítios bem-sucedidos, como o dos Vedana, passam por um momento de incerteza. “A gente ouve falar que os pequenos serão excluídos da cadeia produtiva do leite”, como aconteceu na suinocultura e na avicultura”, diz seu Hermes. Será mesmo?

Com 37 vacas mestiças (Holandesas e Jersey) em lactação, os Vedana alcançaram a produção média diária de 16 litros por cabeça nos primeiros meses de 2015, patamar altamente satisfatório para uma pequena propriedade tocada sem estresse para os membros da família ou o rebanho. A vaca mais produtiva é a mestiça Holandesa Lolita: com 6 anos de idade, passou de 10.300 litros na última lactação (305 dias), correspondente à quarta cria. Outras três matrizes a seguem de perto, formando o quarteto que tem o privilégio de pastar nos melhores piquetes de gramínea tifton irrigada, conforme a norma alimentar número 1 do Balde Cheio: “As vacas que mais produzem consomem o pasto que se encontra no pico da proteína”, explica Fabiano Vedana, 33 anos, que faz o rodízio dos animais nos piquetes a cada 24 horas e, sucessivamente, vai roçando manualmente o capim não tocado pelos animais – a roçada é fundamental para que a gramínea cresça por igual até chegar à altura ideal (25 a 30 centímetros) para o novo pastejo após 21 dias.

Piquetes e bem-estar. Vacas mestiças das raças Holandesa e Jersey aproveitam o pasto de tifton e são tocadas pela neta de seu Hermes, Ana Carolina, de 7 anos.

“Se não for roçado, o tifton segue crescendo, mas a folhagem engrossa e endurece, e assim as vacas não querem”, diz seu Hermes, explicando que elas preferem o pasto tenro, que comem fresquinho ao amanhecer, antes de se porem à sombra para ruminar tranquilamente. Quanto mais bem tratadas, mais as vacas elevam a média produtiva do sítio. O rebanho dos Vedana é dividido em cinco grupos de pastejo, separados pelo nível de produção. As vacas secas e as novilhas ficam isoladas na pastagem mais distante das casas. Formada por capim mombaça, essa área é roçada com o trator por seu Hermes, de manhã cedo, antes que o sol pese na moleira. Tudo muito funcional, bem de acordo com o Balde Cheio, que preconiza uma combinação de manejo racional de pastos, melhoramento genético, gestão e investimentos em infraestrutura como o caminho mais seguro para aumentar a produção leiteira. Apesar de possuir um nome antiquado – o balde caiu em desuso com a difusão da ordenha mecânica e o emprego do resfriador nos sítios mais humildes –, a tecnologia difundida pela Embrapa é mais facilmente absorvida se o sitiante tiver um computador para ir enchendo as planilhas de dados e, assim, controlar numericamente a evolução do trabalho. No caso da família Vedana, o aprendizado veio graças a uma parceria com a Cooperideal (Cooperativa de Inovação e Desenvolvimento da Atividade Leiteira), com sede administrativa em Londrina, PR, e uma rede de técnicos atuantes em 12 Estados. Fundada em 2009, a Cooperideal é uma bem-sucedida experiência privada de assistência técnica e extensão rural – um dos principais gargalos da agricultura brasileira, cujas bases familiares, em grande parte, não têm acesso ao conhecimento técnico estocado nos órgãos de pesquisa.

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Fazenda Leiteira

Manejo do pasto.

O trabalho na Linha Roncador foi orien-

Piquetes de mombaça

tado pelo agrônomo paranaense Caciano Mafiotelli, 31 anos, que tem base operacional em Xanxerê, uma das principais cidades do oeste de Santa Catarina. Cinco anos atrás, ele foi contratado pela prefeitura de Coronel Freitas para dar assistência técnica a sitiantes de algumas comunidades rurais do município. Os primeiros a toparem a parceria foram os Vedana. “No começo me chamaram de louco, por pagar cachê fixo por visita técnica e mais dois centavos por litro de leite produzido”, diz seu Hermes. Diante dos resul-

já pastejados são rotineiramente roçados para garantir qualidade da gramínea

“Mandamentos” do Balde Cheio 1 – Sem comida farta, nenhuma vaca dá bastante leite; 2 – Pastos de tifton e mombaça no verão; aveia e azevém no

inverno (para o Sul);

3 – Plante cana e faça silagem de milho para suprir os vazios forrageiros; 4 – Ofereça água limpa à vontade perto de cada piquete de 280/300 metros quadrados;

5 – Roce a sobra do pastejo para manter a vegetação homogênea;

6 – Instale, quando possível, sistema de irrigação dos pastos

7 – Faça melhoramento genético com inseminação artificial;

assim se pode otimizar o rodízio dos piquetes a cada 21 dias; para suprir a falta de chuvas: irrigue à noite para desfrutar da tarifa reduzida de eletricidade; é bobagem manter touro na propriedade;

8 – Bezerros devem ser descartados ao nascer, não vale a pena criar; 9 – Bezerras, desde o nascimento, devem ser tratadas com mamadeira

por cerca de 80 dias; depois, pasto até o primeiro parto;

10 – Melhor deixar a ordenha, a guarda do leite e a higiene dos aparelhos aos cuidados das mulheres.

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tados iniciais, porém, outras famílias se dispuseram a encarar o desafio de saltar do balde para o resfriador. Todos melhoraram, até mesmo vizinhos que, sem participar diretamente da parceria com a Cooperideal, absorveram as novidades por curiosidade, imitação e cópia, como é usual em comunidades isoladas da zona rural brasileira. No fim do ano passado, convicta de que fez a lição de casa, a família Vedana dispensou a visita periódica do técnico e declarou independência. Por coincidência, no início do ano, ao receber a visita do técnico do laticínio que há dois anos compra sua produção, os Vedana ficaram sabendo que, na sua microbacia (de um dos afluentes do Rio Chapecó, que passa perto, roncando, antes de se diluir no Rio Uruguai), nenhum leiteiro teve custo mais baixo nem remuneração mais alta – em torno de 60% do valor médio recebido, R$ 1 por litro. Palavra da Nestlé, que orienta a alimentação do plantel, interessada num produto acima da média. Orgulhoso com a avaliação, seu Hermes se lembrou dos pais, que chegaram de Casca, RS, nos anos 1960, para abrir roça no meio dos tocos e das pedras. O pai morreu cedo, mas a mãe aposentada ainda mora na vizinhança com um dos seus sete irmãos. A maioria da família original não escapou da sina migratória. O irmão mais distante mora no Acre. Quando Hermes e a esposa começaram, há mais de 30 anos, eram somente 12 hectares. Onde foi possível, eles abriram roça. Durante anos criaram suínos, negócio cheio de altos e baixos. Chegaram a ter 40 matrizes, entregando periodicamente centenas de leitões à indústria integradora. Hoje a pocilga vazia está transformada em depósito, só hospeda um solitário porquinho “para a linguiça”. Dos dois filhos, no correr dos anos, só ficou Fabiano, aplicado no fazer, mas sem gosto pelo estudo. O caçula Renato, hoje com 31 anos, foi-se embora – trabalha numa indústria em Chapecó, estuda engenharia, está encaminhado na vida urbana.

Com a estabilidade trazida pela receita do leite, foi possível aos Vedana o que antes parecia impossível: comprar retalhos de terra de vizinhos que foram desistindo da vida rural. Antes situado numa das divisas, o córrego agora fica no meio da propriedade – a nascente, no alto, está


protegida por 5 hectares de mata nativa. Não falta água. O que deu mais trabalho, por anos a fio, foi remover as pedras que despontavam na superfície do solo – foram enterradas junto às cercas (de pedra e arame), abrindo espaço para pastos e roçados de milho e soja onde não se faz economia de fertilizantes orgânicos e químicos. Altos resultados. O milho colhido cedo, em fins de fevereiro, rendeu 200 sacas por hectare, sinal de manejo adequado e boa fertilidade do solo. Parte foi vendida a R$ 23 por saca, o restante está à espera de melhor preço num ano em que a maioria dos agricultores sulinos, mais uma vez, apostou mais na soja – no sítio do Roncador, foram plantados 20 hectares, o que garante uma receita segura. É claro que o silo-trincheira de milho já está feito, mas para qualquer emergência a família mantém um talhão de 0,5 hectare de cana-de-açúcar, uma poupança alimentar muito mais barata do que qualquer silagem. A madeira

para o dia a dia vem de 2 hectares de eucaliptos cultivados em áreas inviáveis para lavoura nas quebradas de Chapecó. Ao contrário de outros tempos, em que o sítio produzia várias coisas mas vivia num aperto constante, agora o dinheiro pinga todo mês. Pagas todas as despesas, incluindo a provisão para cobrir os financiamentos do Pronaf, as sobras são distribuídas entre os quatro adultos da família, enriquecida com a adesão de Ione de Carli, esposa de Fabiano e mãe de Ana Carolina, de 7 anos, a neta querida dos Vedana. A prosperidade é visível. Na primeira visita do agrônomo Caciano Mafioletti, só havia uma única casa no sítio. Agora são duas, dois carros, uma moto, um trator e vários implementos. Com a troca já negociada do trator de 60 cv por outro de 75 cv, será ainda menos necessário recorrer aos serviços da patrulha mecânica comunitária, integrada por 37 sitiantes das comunidades vizinhas.

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Fazenda Leiteira Bacia leiteira é mais recente na região

C

ontada assim a história dos Vedana, parece fácil. No entanto, basta observar a topografia regional para concluir que, na realidade, esta família tira leite de pedra, como a maioria dos pequenos produtores do oeste catarinense, quase todos descendentes de colonos que migraram do Rio Grande do Sul a partir dos anos 1930 em busca de glebas maiores e mais férteis. Se a extração de madeira propiciou o capital para a arrancada econômica inicial, a continuidade veio com a agricultura (milho) e a criação animal (aves e suínos), bases da dinâmica agroindústria de Santa Catarina. Fora a soja e a fruticultura, que avançaram nas últimas décadas, a pecuária leiteira representa o ciclo mais recente da economia rural sulina. Entre grandes, médios e pequenos, são 70.000 leiteiros em Santa Catarina, Estado que produz 2,2 bilhões de litros por ano e disputa um lugar no pódio leiteiro ao lado dos principais produtores – Minas, Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo e Goiás. Tinha razão o engenheiro Mafioletti, ao indicar o sítio Vedana como um caso de sucesso do sistema Balde Cheio. Lá é tudo limpo, cada coisa no seu lugar, paredes pintadas de branco. Galinhas, nem sombra. “Só atrapalham”, diz Hermes, ressaltando a divisão de tarefas no sítio: enquanto os homens cuidam dos pastos e roças, as mulheres zelam pela alimentação familiar e a ordenha animal. No galpão novo (construído há três anos), há espaço coberto para as vacas esperarem o momento da ordenha (seis boxes) e, após a entrega do leite, acessarem os cochos onde recebem 5 quilos diários de silagem enriquecida com uma fórmula de ração indicada pelo laticínio do momento. É uma situação privilegiada que não encontra paralelo na vizinhança. Sem citar nomes, Hermes Vedana menciona vizinhos penalizados com remuneração baixa, até R$ 0,60 por litro, enquanto outros foram vítimas de calote de caminhoneiros e/ou laticínios mal geridos ou pegos fraudando o produto em diligências do Ministério Público Federal. Para se recuperar, os flagelados da pecuária leiteira precisarão contar com ajuda externa, via parceiros do Balde Cheio, prefeituras, sindicatos rurais, cooperativas, etc. “Um dos agravantes da situação é que mais de 70% dos habitantes rurais

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têm mais de 40 anos”, diz o técnico Caciano Mafioletti. Ao que completa Hermes Vedana: “De cada dez jovens que moram no campo, nove não querem essa vida”. Ele mesmo admite que não foi fácil “segurar o Fabiano”, que acabou se tornando um profissional do leite, com pleno domínio da tecnologia disponível, sem risco iminente de queda da produção nem ansiedade de se tornar um grande produtor. “No leite, a experiência indica que, quanto maior a escala, menor a eficiência” – eis uma das lições deixadas no Roncador pelo técnico da Cooperideal. Situados num patamar muito eficiente e desfrutando de boa qualidade de vida, os Vedana não premeditam mudanças em seu status operacional, por ora. Sabem que, se resolvessem dobrar a produção de leite, por exemplo, teriam de investir em novos pastos, mais animais, infraestrutura maior e contratar mão de obra externa – esta, uma fonte constante de sobressaltos para o segmento, ainda majoritariamente concentrado em pequenas e médias propriedades administradas por famílias. Por isso, não é possível afirmar que a produção de leite marche inexoravelmente para um processo de concentração semelhante ao registrado com aves e suínos. Mais do que uma encruzilhada tecnológica, a pecuária leiteira vive um dilema sociológico que depende da sobrevivência da agricultura familiar. n

Nem sempre foi assim. Na propriedade dos Vedana, além de terreno declivoso, pasto era repleto de pedras, retiradas “na mão”.


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Infraestrutura

No meio do caminho... não pode haver pedras Manutenção dos corredores de passagem são fundamentais não só para o conforto animal, mas até para prevenir doenças. to bem barriga, úbere e tetos da vaca a fim de evitar a mastite e outras doenças. Assim, é importante manter um piso adequado para a movimentação do rebanho, para que as vacas se sintam seguras, caminhem mais rapidamente e não sofram nenhum tipo de distúrbio metabólico causado pelo estresse. Pesquisas comprovam que as vacas leiteiras reconhecem lugares onde sofreram experiências ruins e que essa memória pode provocar queda na produção leiteira. A manutenção periódica e o uso de tecnologias que mantenham o local seco e seguro são fundamentais, para que os corredores sejam uniformes, com boa drenagem e livres de pedras para suportar a passagem de animais, que pesam mais de 500 quilos, em média. Nunca deixe de observar o comportamento das vacas ao caminhar. Se houver alta ocorrência de escorregões e quedas ou quando as vacas caminharem com passos muito lentos, provavelmente o piso é inadequado.

Mônica Costa

O Corredor de passagem. Ele divide os piquetes e é de uso frequente por isso deve ter manutenção constante

s corredores de passagem permeiam a arquitetura de toda fazenda. Na pecuária leiteira esses acessos são usados para o deslocamento das vacas dos piquetes para os currais de manejo, sala de ordenha, praças de alimentação ou áreas de descanso. Esta área, entretanto, nem sempre recebe a atenção que merece. Por ser o caminho das vacas, não pode ser escorregadio ou enlameado, pois dificulta a locomoção do rebanho e ainda apresenta riscos não só ao bem-estar, como à sanidade. O acúmulo de lama nas áreas de trânsito é um dos problemas mais comuns, principalmente durante a estação de chuvas. Nestas condições os animais andam mais lentamente, quando não emperram ou atolam, o que obriga o vaqueiro a redobrar os esforços para retirar o animal da lama e ainda lavar mui-

LUIZ PRADO

“Os corredores de passagem devem ser pla-

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nejados para reduzir as distâncias e facilitar o deslocamento de forma rápida e segura”, aponta o médico veterinário Marco Aurélio Bergamaschi, pesquisador da Embrapa Pecuária Sudeste. Ele explica que todos os anos, de preferência no período seco do ano _ entre os meses de maio e novembro _, os corredores devem passar por manutenção. “No redimensionamento destes espaços é importante que sejam abaulados e sempre em nível superior aos piquetes, além de contar com um sistema eficiente de escoamento da água”, elenca Bergamaschi. Quanto mais largo o corredor, menor o risco de formação de lama. Entretanto, o pesquisador pondera que este não é o ponto mais importante. “Nem sempre é possível fazer corredores muito largos, mas a dimensão deve ser suficiente para permitir a pas-


sagem eventual de tratores. Três metros, portanto, é adequado.” Em geral, as vacas leiteiras são dóceis e passam por locais mais estreitos sem se machucar. Mas, se o rebanho for de raças de origem zebuína, os corredores mais largos podem ser uma estratégia para evitar a troca de coices e pisadas entre estes animais, que tendem a ser mais arredios. A compactação da terra, misturada ao calcário, é o método mais comum usado pelos pecuaristas nos corredores de passagem. Misturados à água, os produtos formam uma camada que reduz a incidência de buracos e evita a formação de poças de lamas e, consequentemente, lesões nas patas dos animais.

“Cuidado com os corredores em curva em nível, porque nestas situações geralmente há acúmulo de água e problemas com o rebanho”, diz Bergamaschi, que sugere que o criador planeje as pastagens para evitar que os animais acessem topografias íngremes. Mas, se não houver outra saída, o criador precisa caprichar no processo de drenagem para direcionar a água da chuva para as áreas de poços ou outras pastagens da fazenda. Outra estratégia sugerida por pesquisadores é a manutenção de caminhos alternativos para serem acessados pelas vacas leiteiras durante os períodos chuvosos, para evitar a sobrecarga em determinadas áreas de trânsito e a consequente formação de atoleiros. Na Região Nordeste as condições de solo são muito variadas, o que exige do criador cuidado redobrado no trato com o solo. “Em regiões com solo argiloso, sugerimos a aplicação de areia e cal virgem para evitar a formação de lama e reparar os buracos. Já nas áreas mais secas, onde o solo é arenos, a reposição da areia levada pelos cascos dos animais é suficiente”, diz o zootecnista Tiago de Medeiros Silva, gerente técnico da Leite e Negócios, consultoria que atende fazendeiras leiteiras no Semiárido.

Piso irregular. Área

Na região hidrográfica do Baixo Jaguaribe,

sem manutenção e

no município de Russas, a 172 km de Fortaleza, está a Fazenda Ibiporã, propriedade com 110 hectares de terra que se beneficia das águas do açude Santo Antônio de Russas, para irrigar a pastagem e manter um rebanho de 220 vacas Girolando. O conforto e a sanidade das matrizes sempre foram preocupações do gerente Alex Farley Chaves da Silva, que, embora disponha de uma terra arenosa, que é sempre mais adequada para o rebanho, sabe que o bem-estar dos animais depende de outros cuidados. “Aqui sofremos com os formigueiros e as raízes das árvores”, afirma. A fazenda foi aberta há quatro anos, e a atividade leiteira começou há apenas um ano no local. Por isso são comuns o aparecimento de raízes de árvores e formigueiros no meio das estradas, que devem ser arrancados para não ferir os cascos dos animais. A atividade é mantida graças ao sistema de irrigação das pastagens. Um pivô central irriga uma área com 40 hectares e dois aspersores mantém outros 16 hectares de pastagem. As três áreas são divididas e só podem ser acessadas por estradas que passam por revisão constante dos funcionários. As vistorias são feitas de duas a três vezes por semana para retirar os restos de árvores e também combater os formigueiros que aumentam os buracos, tão perigosos para as vacas, no meio das estradas. “Não pode haver declives ou materiais pontiagudos. Essas situações assustam as matrizes, que podem bater em outras e até cair, provocando lesões que afetam a saúde e a produtividade dos animais”, continua o gerente. Todo este cuidado já rende bons frutos para os criadores. O rebanho formado por matrizes em sua maioria novilhas primíparas (90%), mantém uma produção diária de 18 litros por cabeça. n

estreita eleva riscos de ferimentos nos animais

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eventos André Nassar vai ao Interleite 2015

Agenda

O 15o Simpósio Internacional sobre Produção Competitiva de Leite _ Interleite Brasil 2015 será realizado entre 4 e 5 de agosto, em Uberlândia, MG, com promoção do Milkpoint. No evento, oportunidade para toda a cadeia leiteira se reunir e trocar experiências, várias palestras estão programadas, entre elas a do secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, André Meloni Nassar, que falará sobre “A visão do governo”, no dia 4 de agosto. Além dele, o Rodrigo Alvim, da Confederação da Agricultura e

Academia do leite – A Cargill, por meio de sua divisão de Nutrição Animal, começou a promover, em abril, em Toledo, PR, a Academia do Leite, evento destinado aos técnicos de cooperativas (zootecnistas, veterinários e agrônomos) e profissionais autônomos ligados à produção e saúde animal que atuam no mercado de bovinos de leite no oeste do Estado. O encontro é realizado na Pontifícia Universidade Católica do Paraná Campus Toledo. Os encontros ocorrem uma vez por mês, na última terça-feira, até dezembro de 2015. Informações, www.nutron.com.br

Pecuária do Brasil (CNA), abordará o tema “As demandas dos produtores de leite”. Outros palestrantes de renome, da Embrapa Gado de Leite, do Viva Lácteos, da Esalq/USP e também da Kansas State University, nos Estados Unidos, participarão. Mais informações e inscrições em www.interleite.com.br

Megaleite vai reunir 2 mil bovinos A 12ª Exposição Brasileira do Agronegócio do Leite (Megaleite) será entre 25 de junho e 4 de julho de 2015, em Uberaba, MG. A mostra, organizada pela Associação Brasileira dos Criadores de Girolando, terá as principais raças leiteiras criadas no País – Girolando, Gir Leiteiro, Holandesa, Pardo-Suíço, Simental, Guzerá Leiteiro, Sindi e Indubrasil. Em

2015, o tema é o mercado internacional e a expectativa é a de que participem mais de 2.000 animais. A programação terá julgamentos, torneios, leilões, feira de negócios, shoppings de animais, debates e atividades socioeducativas e exposições nacionais ou estaduais de várias raças leiteiras. Informações, www. girolando.com.br/megaleite/

Simpósio do Leite de Erechim Entre 23 e 24 de junho vai ocorrer em Erechim, no norte gaúcho, a edição 2015 do Simpósio do Leite. Entre os temas debatidos estará a competitividade do leite produzido no Brasil. Quem vai abordar o tema é o presidente da Câmara Setorial do Leite na Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil, Rodrigo Alvim. Ele será também mediador do Fórum Nacional de Lácteos, que abre a programação do simpósio, no dia 23. O segundo dia de simpósio contará com palestra de nosso colunista, o professor Marcos Veiga,

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que abordará o tema “Estratégias de tramento de mastite na lactação e secagem”. A raça Girolando estará presente no evento e uma palestra sobre as vantagens zootécnicas e econômicas da raça será ministrada pelo presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Girolando, Jônadan Ma. Mais informações podem ser obtidas no site oficial, ou também pelos telefones (54) 9691-8408 e 9680-1635. O Simpósio do Leite é organizado pela Associação dos Médicos Veterinários do Alto Uruguai (Amevau).

Minas Láctea – A Minas Láctea, marca que engloba quatro dos principais eventos do setor laticinista na América Latina, será de 14 a 16 de julho, em Juiz de Fora, MG. A feira é referência em difusão de tecnologias sobre leite e derivados e na apresentação de novos produtos, equipamentos e maquinário. As atividades, bienais, ocorrem no Expominas e no Instituto de Laticínios Cândido Tostes. Entre os destaques, está a 41a Expolac _ Exposição de Produtos Lácteos, que apresentará as novidades do setor. São cerca de 50 indústrias do País participantes. Informações sobre a Minas Láctea em www.minaslactea.com.br. Superleite – A SuperLeite 2015 ocorrerá entre 15 e 19 de julho em Pompéu, no centro-oeste mineiro., com promoção do Sindicato dos Produtores Rurais de Pompéu. Vão estar reunidos toda a cadeia produtiva do leite, os principais criadores das raças Gir Leiteiro, Girolando e Guzerá Leiteiro, além de representantes das indústria de laticínios, insumos, laboratórios e equipamentos agrícolas. Mais informações sobre o evento e inscrições, www.superleitepompeu.com.br.



EMPRESAS E PRODUTOS Guabi

Linha GuabiNúcleo foca no aumento de desempenho A Guabi acaba de lançar a linha GuabiNúcleo Lactage, voltada exclusivamente para atender as exigências nutricionais de bovinos de raças leiteiras de alto potencial genético. A GuabiNúcleo Lactage Pré-Parto é destinada às novilhas e vacas secas, no período pré-parto (somente nos 21 dias que antecedem o parto). Destaque para a composição enriquecida de enxofre, cloro e monensina. A GuabiNúcleo Lactage 50 TPRM BIO é indicada para bovinos de leite de alta produção, nas diferentes fases de lactação. Contém potássio; biotina; bicarbonato de sódio e monensina sódica (melhora a eficiência alimentar por alterar o perfil de fermentação ruminal). Já a GuabiNúcleo Lactage 75 TPVM GP BIO é para

bovinos de leite de alta produção nas diferentes fases de lactação. Contém potássio; biotina; bicarbonato de sódio; gordura vegetal e virginiamicina (aditivo que aumenta a eficiência alimentar). Informações em www.guabi.com.br.

Phibro

Empresa apresenta OmnGen-AF no PR Em evento em abril, na Castrolanda, Paraná, a Phibro, multinacional fabricante de aditivos para saúde e nutrição animal, apresentou, durante o Phibro Dairy Solutions, os resultados obtidos com a utilização do OmniGen-AF no Brasil e nos Estados Unidos, onde o produto já foi avaliado em mais de 500 fazendas. O produto permite que os animais mantenham nutrição adequada e apresentem maior produtividade e mais saúde por meio da redução de casos de mastite, na contagem de células somáticas do leite, menor número de vacas enfermas e na redução de casos de retenção de placenta e metrite. Para falar sobre o OmniGen-AF, foi escalado o professor doutor da Texas A & M University e gerente técnico de bovinos de leite da Phibro Animal Health nos EUA desde 2013, Glenn Holub. Na ocasião, ele abordou o tema “Avaliação do uso de OmniGen-AF em vacas em lactação em condição de estresse térmico”. Mais informações em www.phibro.com.br

TIROL

Novos iogurtes gregos no mercado A Laticínios Tirol está lançando sua linha especial de iogurtes gregos, nos sabores morango, morango com mirtilo e frutas verdes em embalagens individuais de 100 gramas. Aliando a delícia dos sabores, a nova linha está disponível nas versões tradicional e zero lactose. Como é característico do iogurte grego, a nova linha tem consistência cremosa, ideal para ser consumido puro ou acompanhado de frutas ou cereais. Ele possui um alto valor protéico, sendo considerado uma importante fonte de energia, conforme a empresa. O iogurte grego tradicional pode ser encontrado nos sabores morango e morango com mirtilo e na versão zero lactose. Além destes dois sabores, o consumidor também encontra disponível o sabor de frutas verdes. De acordo com o diretor de Mercado da Tirol, Edson Martins, o lançamento chega para reforçar o crescimento da marca no cenário nacional. “Lançar o iogurte grego intensifica o fortalecimento da Tirol em todo o Brasil. Isso é prova da confiança dos nossos consumidores que preferem a nossa marca em razão da qualidade empregada em todo o

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processo produtivo”, comenta. Sobre a linha zero lactose, o diretor afirmou que “a Tirol está cada vez mais atenta às necessidades do mercado consumidor e, por esse motivo, está desenvolvendo produtos específicos que atendem às segmentações de mercado como é o caso dos intolerantes à lactose”, destaca. A Tirol tem 40 anos de mercado e foi fundada em Treze Tílias, SC. Informações, www.tirol.com.br.


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Seguindo em Frente Ismail Ramalho Haddade*

A comunicação eficiente para transferir tecnologia

D

e maneira simples, a palavra “comunicação” é traduzida pelas variadas formas com que se efetua o intercâmbio de informações, merecendo destaque, atualmente, a velocidade com que estas podem ser divulgadas. Assim, cada vez mais as instituições detentoras do conhecimento, quando interessadas em fazê-lo chegar a quem o utilizará, se encarregam de apresentá-lo da forma mais completa possível, pelo fato de que as possibilidades de resolver determinados problemas devam ser divulgadas na íntegra. Neste ponto salienta-se que, mesmo com a posse de toda a informação por parte do extensionista rural, isto não significa que a comunicação entre ele e o produtor será eficiente, sendo fundamental a necessidade de quem recebe a informação entender o recado. Assim, a habilidade em fazer do diagnóstico prévio de cada situação definirá a facilidade de o técnico filtrar a informação e comunicar o que for apropriado para cada caso diagnosticado.

Outra questão que pode ajudar neste processo é o fato de que quem recebe a mensagem aceita com mais facilidade aquilo que já conhece ou já viu. Com isso, transferir conceitos e propostas por meio de modificações mínimas no processo produtivo, de forma que o produtor aprenda com suas experiências, parece ser uma forma excelente de o técnico se fazer entender. Um exemplo disso é o da pastagem manejada de forma intensiva. A introdução desta técnica pela primeira vez não deverá ser executada em áreas extensas (superiores a meio ou a um hectare), o que facilitará o aprendizado e a visualização dos seus benefícios. Ao longo do tempo, os conceitos e as informações vão evoluindo a ponto de, cada vez mais, o produtor entender e assimilar facilmente o que será melhor para o caso dele. Outro item que facilita a comunicação é o fato de informar ao produtor quais os benefícios de

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Mundo do Leite jun-jul/2015

cada técnica proposta no aumento da sua renda. Aqui, destaco um comentário do professor Vidal Pedroso de Faria: - Quando o indivíduo adquire a cultura da renda, não precisa de o técnico tentar convencê-lo de nada. Este ponto talvez seja o determinante de uma comunicação bem-sucedida, o da iniciativa de o técnico demonstrar quais benefícios virão se suas propostas forem adotadas.

Ainda neste assunto, destaco o fato de que, em um diálogo, quem pergunta domina a conversa. Neste item, são constantes as situações em que a melhor opção seria fazer o produtor raciocinar para a solução do problema, diante de coisas que já estejam acontecendo em sua propriedade. Como no caso de um produtor que, por meio de um diálogo com o técnico que o assistia, entendeu que a área de pastejo que ele havia construído merecia animais melhores: O técnico: - O que o senhor acha dessas vacas aqui? Estão comendo o mesmo pasto, ambas saudáveis, recebendo as mesmas condições. Uma chegou a produzir 17 litros por dia e a outra, desde que pariu, não passa dos 8. O que a gente pode fazer? Depois disso, instaura-se o silêncio, aguardando a resposta do produtor: - É, preciso retirar essa vaca de 8 e colocar outra de 17. Por mais óbvio e simples o exemplo, o fato de que a melhor solução vista pelo técnico tenha partido do produtor, significa que a comunicação foi bem-sucedida. Não se busca aqui receita de como se comunicar. Porém, que sirva para refletir sobre uma coisa: o diagnóstico prévio e falar menos e escutar mais devem ser os princípios da comunicação. Isso, pois não adianta sabermos o que é pra fazer se isso não for feito por falta de entendimento. n *Engenheiro agrônomo, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo, câmpus de Santa Teresa.



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