Revista Mundo do Leite 88 - Dez 2017/Jan 2018

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Ao leitor

C

Sérgio de Oliveira

Mundo do Leite Diretores

Demétrio Costa Redação

Editor: Sérgio de Oliveira

mais mansas e produtivas

Entrevista

4 Paulo Machado, diretor da Clínica do Leite, da Esalq

Perfil

10 Um comprador de leite que virou produtor e liderança regional

Saúde animal

22 Botulismo, a doença que mata ao menor descuido

Pastagem

24 Adubação na hora certa garante comida o ano inteiro

Produtor Secreto

28 Está chegando a hora da verdade para o rebanho: o pasto vem aí!

Biodigestor

30 Fazenda produz mais da metade da energia que consome

Cooperativas

32 Vale do Rio Doce: um jogo de ganha-ganha com os cooperados

Colunistas 7 Marcelo de Rezende: crise é momento propício para ajuste 8 Christiano Nascif garante: mais é menos! 12 Sérgio Saud aponta o retorno de uma inseminação bem-feita 20 Marcos Veiga ensina como monitorar a qualidade do leite 26 Alexandre Pedroso: o que suas vacas estão comendo? 34 Ismail Ramalho Haddade: vaca não é mulher de malandro

É uma publicação bimestral da DBO Editores Associados Ltda., com circulação em fevereiro, abril, junho, agosto, outubro e dezembro.

Daniel Bilk Costa, Demétrio Costa e Odemar Costa Diretor Responsável

tátil das bezerrinhas e novilhas reduz o estresse, Capa 14 Estimulação diminui a ocorrência de doenças e deixa as futuras vacas

Arte

Editor Edgar Pera

Edson Gonçalves Colaboradores

Fernanda Yoneya, Niza Souza, Roberto Nunes ,Tatiana Souto

Tiragem e circulação auditadas

COMERCIAL/Marketing

Gerente: Rosana Minante

rosana@midiadbo.com.br Executivos de Contas

Edson Alves

Andréa Canal, José Geraldo Caetano, Maria Aparecida de Oliveira, Mario Vanzo, Marlene Orlovas e Vanda Motta

Coordenação Gráfica

São Francisco Gráfica e Editora

EDITORAÇÃO

sergio.oliveira@mundodoleite.com.br CONSULTOR TÉCNICO/ZOOTECNISTA

Luiz Prado

hegamos à edição de virada de ano. Ano difícil para os produtores de leite, que viram os preços do produto caírem ao longo de todo o último semestre. De tantas ações possíveis por parte do poder público para dar mais estabilidade ao setor, a única atitude que vimos foi a suspensão, pelo ministro Blairo Maggi, da Agricultura, das importações de leite do Uruguai. Medida que não teve outro efeito senão o de criar um mal-estar diplomático que o Itamaraty teve de desfazer - e o Brasil voltou às importações sem convencer ninguém de que teve razão em algum momento. Se a produção de leite, com a importância que tem para o país, não for tratada como uma política de Estado, com o propósito de garantir a sustentabilidade da cadeia produtiva, alimento saudável à população e a geração de excedente para exportação, o Brasil continuará a ver escorrer por entre os dedos a oportunidade de firmar-se como um grande player do setor. A entrevista do professor Paulo Machado, da Clínica do Leite, dá algumas pistas de como isso pode ser feito. Continuamos a mostrar as melhores práticas para o desenvolvimento da cadeia produtiva, como a reportagem sobre geração de energia numa propriedade em Carambeí, PR, e o tratamento especial recebido por bezerras e novilhas na Fazenda Boa Fé, em Conquista, MG. Nossos articulistas, com suas análises e orientações sempre relevantes, completam esta edição. Aos leitores, nossos votos de Boas Festas e um 2018 melhor para o Brasil. Até lá!!!

Walter Simões Circulação e Assinaturas

Gerente: Edna Aguiar edna@midiadbo.com.br

Impressão e Acabamento

DBO Editores Associados Ltda.

Rua Dona Germaine Burchard, 229 Perdizes, São Paulo – SP – 05002-900 Tel.: 11 3879-7099 e 3803-5500 - www.portaldbo.com.br e-mail:redacao@mundodoleite.com.br

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Entrevista Paulo Machado

Cinco passos para a qualidade Paulo Machado, engenheiro agrônomo formado pela Esalq/USP, e fundador e diretor da Clínica do Leite, que funciona no campus da universidade, em Piracicaba, SP

O

engenheiro agrônomo Paulo Machado bem poderia dizer que em suas veias corre leite. Desde 1974, quando se formou, pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), fincou pé nos estábulos e de lá não saiu mais, seja atuando na parte financeira, em nutrição do rebanho, em gestão da propriedade ou na qualidade da matéria-prima. Mas seu grande feito foi a idealização e fundação, em 1996, da Clínica do Leite, que funciona na Esalq. Voltada à análise de leite e à capacitação, ela é hoje o maior laboratório do setor no País. Passam por ali mensalmente 300 mil amostras, provenientes de 460 indústrias e fazendas. Tal volume equivale a 35% do leite consumido no Brasil, ou 12 bilhões de litros/ano. Nesta entrevista, vamos conhecer um pouco do trabalho da Clínica e do próprio Paulo Machado, seu idealizador e fundador. Mundo do Leite – Como surgiu a Clínica do Leite? 4

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Paulo Machado – Na década de 1980 eu morei um tempo nos Estados Unidos, onde fiz mestrado, doutorado e livre docência, com temas voltados à pecuária leiteira. Ali, trabalhei em um laboratório de análise de leite. Quanto voltei para o Brasil, já na década de 1990, trouxe a ideia e comecei a procurar recursos, sozinho, para erguer o projeto. Percorri o Brasil inteiro. Uma das primeiras pessoas que me ajudaram foi o dr. Lair Antônio de Souza (já falecido), do Laticínios Xandó, de Araras, SP. Ele doou uma verba para a Esalq para que pudéssemos comprar os primeiros equipamentos de análise de leite e ajudou também na infraestrutura, como móveis, ar condicionado, carteiras para as aulas, Datashow, etc. A Clínica foi montada na própria Fazenda Colorado. Com o tempo, adquirimos mais equipamentos, já com verba proveniente das análises e de cursos, e também construímos outros prédios. Grande parte do dinheiro investido aqui provém de laticínios e do produtor de leite. ML – Não existia nada semelhante no País? PM – Para análise de leite, já havia os laboratórios da Associação Brasileira dos Criadores de Gado Holandês, em Curitiba, PR, e outro em Passo Fundo, RS. Só que não eram muito grandes. Com os recursos da Fapesp e do dr. Lair, montamos o laboratório e assim o País passou a contar com esses três, que deram início à Rede Brasileira de Laboratórios de Controle de Qualidade de Leite (RBQL), ligada ao Ministério da Agricultura, que também contribuiu, posteriormente, para a aquisição de mais equipamentos para a Clínica. Atualmente, nove laboratórios fazem parte da RBQL, que teve origem naqueles três iniciais.

ML – Havia interesse por qualidade de leite naquela época? PM – Muito pouca gente se interessava, até por desconhecimento do que se tratava a análise de qualidade, que envolve a contagem bacteriana total (CBT), a contagem de células somáticas (CCS) e porcentagem de sólidos totais e proteína, entre outros aspectos. Para divulgar a importância disso, eu viajei o País fazendo palestras e tentando mostrar tanto para indústrias quanto para os produtores o que era a qualidade do leite, como um bom leite aumenta o rendimento na indústria, etc. Logo no início conseguimos que grandes laticínios aderissem à Clínica do Leite e passassem a fazer análises conosco. Isso tornou o laboratório viável. ML – Antes da Clínica do Leite, como se faziam análises? PM – As indústrias tinham laboratórios próprios. Elas ainda têm e são obrigadas a isso, aliás. Mas as análises ligadas à qualidade eram mais rudimentares. Não havia, por exemplo, CBT e CCS, como hoje, e que ficaram sendo padrão desde a Instrução Normativa 51, de setembro de 2002, que nasceu a partir do Programa Nacional de Qualidade do Leite (PNQL), iniciativa de produtores, indústrias e laboratórios, que sentiam a necessidade de um programa conjunto que regrasse e desse parâmetros à cadeia leiteira. Depois a IN 51 foi substituída pela IN 62, de setembro de 2011, mas o PNQL continua a existir. Eu participo do programa e nos reunimos sempre em Brasília para discutir a qualidade do leite em nível nacional. ML – A qualidade do leite brasileiro melhorou nesse período, afinal?


5 A 9 De FeVeReIrO De 2018 CaScAvEl-Pr

FaçA AcOnTeCeR O mundo nunca foi dos que ficam parados, dos que fazem aquilo que todo mundo já fez. O mundo é de quem não aceita a derrota, que faz tudo de novo até melhorar.

Porque metas não são aquelas que você escreve num papel são aquelas que você luta para realizar.

FaçA AcOnTeCeR

Sorte? Esqueça, ela logo vai te abandonar. Pra ir mais longe você precisa ter vontade e alguém que te ensine o caminho mais curto pra chegar. Porque quando você pensa que deu tudo de si, já tem alguém conseguindo o dobro. Grandes mudanças não são feitas por quem sonha, são feitas por quem faz.

ShOwRuRaL.CoM.Br


Entrevista PM – Para responder a essa questão, preciso caracterizar primeiro o que é qualidade do leite. Considera-se um leite de qualidade quando ele está dentro de especificações que levam em conta vários parâmetros, como CCS, CBT, gordura, proteína, sólidos totais, resíduos de antibióticos, etc. E, atualmente, 60% do leite produzido no Brasil atende aos parâmetros definidos para cada um desses requisitos na IN 62. Assim, 40% do leite não atende – mas isso não quer dizer que esse leite seja impróprio para consumo, de maneira nenhuma. Só quer dizer que não está atendendo àqueles requisitos. ML – As INs não serviram, então, para a qualidade dar um salto? PM – Não, infelizmente. O que observamos é que há indústrias que melhoraram muito e que contam com uma matéria-prima com qualidade de nível europeu e norte-americano. Mas ainda há leite de qualidade muito ruim. São dois mundos distintos. Um, com leite de excelente qualidade, e outro com uma situação ainda bastante atrasada. Podemos dizer que, na média, não melhorou nada. ML – A indústria consegue segregar este leite bom do ruim? PM – Tem indústrias que separam, outras não. ML – Como melhorar a qualidade? PM – A solução para isso não passa por um único ponto, que deveria ser atacado para melhorar a qualidade. Há, na verdade, cinco pontos que se entrelaçam. O primeiro deles é a regulamentação, que envolve a IN 62, e a legislação referente à questão sanitária, com controle de tuberculose e brucelose. A regulamentação existe, mas precisa ser de fato implementada, fiscalizada e cumprida. Há também necessidade de uniformização de algumas normativas. Hoje, produtos de origem animal contam com selos de inspeção federal, estadual e municipal (SIF, SIE e SIM). São legislações que em muitos casos não conversam entre si. Tem de haver um regulamento único. ML – Qual o segundo ponto? 6

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PM – A comunicação. Todo produtor precisa saber a qualidade do leite que ele produz e também, com base nas análises, poder traçar um diagnóstico, saber se seu rebanho tem algum problema. Se houver, deve saber onde ele está e como proceder. É como receber um exame de sangue ou de pressão. Não adianta a pessoa saber que tem pressão alta e não receber orientação. Então, muitos produtores recebem os relatórios, mas não uma análise desses relatórios e procedimentos. Neste quesito, tem muita indústria que recebe o relatório e não o repassa ao produtor.

ter acesso a informações sobre como fazer para melhorar a qualidade do seu leite. Os quatro pontos anteriores têm o objetivo de fazer com que o pecuarista queira melhorar. Só que ele diz que quer, mas não sabe como. Por isso deve haver uma assistência técnica patrocinada principalmente pelas indústrias. É a indústria que tem de assumir isso, não só os órgãos governamentais. Mas ela não precisa obrigatoriamente ir à fazenda; ela pode terceirizar esse serviço junto a órgãos como Sebrae, Senar e a própria Clínica do Leite, que faz esse trabalho de capacitação.

ML – Vamos ao terceiro ponto. PM – O terceiro é o que eu chamo de pressão social. A população deve começar a exigir um leite de melhor qualidade. Quando a população souber o que é leite de qualidade e começar a demandar isso, haverá uma pressão social muito intensa sobre a cadeia produtiva, o que pode resultar em mudanças substanciais. Mas, para isso, a população tem de ter acesso a leite de qualidade para exigir que todo o produto tenha o mesmo nível. O que deve ser mostrado à população é que é possível tomar um leite mais saboroso, que dura mais tempo e é mais nutritivo do que o atual.

Quando a população souber o que é leite de qualidade, haverá uma pressão muito intensa sobre a cadeia produtiva

ML – E o quarto ponto? PM – Diz respeito à precificação do leite. Há necessidade de um regramento sobre como o leite deve ser pago. Isso diz respeito a contratos entre a indústria e o fornecedor, com previsão de preços futuros, de volume a ser produzido e também um pagamento em função da composição do leite e sua qualidade. O produtor, atualmente, não sabe quanto vai receber e nem quanto vai produzir. Não há segurança porque não há maneira, por exemplo, de travar contratos a preços futuros. Além disso, há poucos incentivos para que ele melhore a composição do leite – um leite com mais proteína, por exemplo, deveria ser mais bem remunerado. ML – Já o quinto ponto... PM – Este é nevrálgico e diz respeito à assistência técnica ao produtor, que precisa

ML – O sr. acentuou que a indústria tem papel preponderante nisso. Por quê? PM – Porque é ela quem compra o leite. Quanto melhor a qualidade desse leite, melhor para ela. O laticínio adquire o leite, portanto tem autoridade sobre o produtor, porque paga o produtor. Assim a indústria tem condição de exigir qualidade pelo que paga. Ninguém tem tanto poder sobre o pecuarista quanto a indústria. Mesmo assim, há alguns laticínios que não têm consciência disso. Por isso a Viva Lácteos, que é a associação das grandes indústrias, está montando um grupo para estudar essas possibilidades e formas de melhorar a qualidade do leite. Na minha opinião, é a indústria que tem de capitanear esses programas de melhoria.


Ação Ideal Marcelo de Rezende

Seja flexível

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Momentos de crise são propícios para a melhoria da qualidade do rebanho através do descarte de vacas com problemas

rande parte das fazendas produtoras de leite passa por dificuldades financeiras, necessitando, portanto, de ajustes que promovam a melhoria na eficiência dos gastos e o aumento das receitas. Apesar de importantes para a condução da atividade, as despesas com investimentos devem ser feitas com muito critério em período de queda nas receitas; a prioridade nesses momentos deve ser o pagamento das despesas operacionais, sem as quais a fazenda não consegue sobreviver no curto prazo. Conviver com a situação delicada de ter despesas maiores que as receitas não é fácil, tal situação exige controle e gestão do processo produtivo, com o produtor atuando para evitar despesas desnecessárias e maximizar a renda. Um diagnóstico da situação, através da avaliação da composição do custo operacional do leite produzido na fazenda é fundamental neste momento. O produtor que tem o saudável hábito de anotar os eventos econômicos e zootécnicos da produção de leite na sua propriedade terá inúmeras vantagens nesse caso, pois terá a sua disposição um importante conjunto de informações que, se bem avaliadas, indicará os principais pontos a serem atacados para a melhoria do desempenho econômico da atividade. Os produtores que não controlam o desempenho econômico da produção serão muito menos assertivos nesse momento, correndo o risco de tomar decisões equivocadas e que podem vir a piorar a situação do seu negócio. Em períodos de menores preços pagos pelo leite é

Engenheiro agrônomo especializado em sistemas intensivos de produção de leite e corte e diretor-presidente da Cooperativa para Inovação e Desenvolvimento de Atividade Leiteira (Cooperideal), e-mail marcelo@cooperideal.com.br

comum o produtor pensar logo na diminuição da quantidade ou da qualidade do concentrado fornecido ao rebanho como forma de redução de despesas, mas dependendo da situação a decisão correta pode ser justamente o inverso, talvez seja o momento de se explorar melhor o potencial dos animais. Esse tipo de análise também vale para os demais itens que compõem as despesas operacionais da fazenda. Para que situações desse tipo não ocorram precisamos entender os parâmetros que definem qual seria a participação adequada de cada item na composição do custo de produção da atividade; a ajuda de um bom técnico é fundamental na definição da estratégia de gestão a ser adotada nesses momentos de ajuste. Pelo lado das receitas, as ações voltadas para o aumento imediato da renda gerada na fazenda normalmente estão relacionadas à identificação e descarte de animais problemáticos ou improdutivos. Momentos de crise são propícios para a melhoria da qualidade do rebanho através do descarte de vacas com problemas reprodutivos, de baixa persistência de lactação, de baixa produção, com problemas recorrentes de mastite, casco etc. Ações relacionadas à estruturação do rebanho, capazes de promover a adequação da quantidade de animais em crescimento em relação ao total de vacas da fazenda, também permitem a imediata geração de renda pela venda do excesso de animais em crescimento e também atuam na redução de custo de produção pela diminuição de gastos com animais que ainda não geram renda para a atividade. A Cooperideal tem buscado cada vez mais atuar na gestão e na aplicação de conhecimento técnico que seja capaz de oferecer solidez e alto desempenho econômico nas fazendas de seus clientes, produzindo e gerando riqueza no campo.

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Gestão Christiano Nascif

Zootecnista, coordenador de assistência do Pdpl-RV do Projeto Educampo/Sebrae e proprietário da Labor rural. E-mail contatos@laborrural.com, tel. (31)3899-5251

Mais é menos!

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m nossos encontros nesta coluna, temos discutido muito sobre a necessidade de alcançar maior eficiência para obter sucesso técnico-econômico na atividade leiteira. Ser eficiente é produzir mais e melhor com menos, ou seja, é preciso aumentar o volume de leite, desde que haja equilíbrio nos custos de produção. Mas como equilibrar os custos de produção quando estamos aumentando a produção de leite, em uma propriedade? Na metodologia que utilizamos, o custo de produção é composto pelos custos fixos, que representa em média 20% do custo total, e pelos custos variáveis (custo operacional efetivo), que representam em média 80% do custo total, portanto é preciso analisar o impacto do aumento de escala tanto no custo fixo quanto nos custos variáveis. Custos fixos são os custos com depreciações somados aos custos de oportunidade da mão de obra familiar e do capital investido na atividade. Se mantidos a mesma estrutura produtiva e investimentos, o custo fixo anual (R$/Ano) se mantém, porém quando analisamos o custo fixo por litro de leite produzido (R$/L), este sofrerá redução, uma vez que será diluído pelo aumento de volume. Portanto ao analisar o custo fixo unitário, o aumento da escala de produção torna a propriedade mais eficiente: consegue-se produzir mais, com menos! Custos variáveis (COE) são aqueles que variam com a produção de leite: custos com concentrado, minerais, mão de obra contratada, volumoso, energia, combustível etc. Quando pensamos no efeito do aumento da escala de produção sobre o custo fixo, o raciocínio é simples: ao aumentar o volume, dilui-se o custo fixo unitário. Porém, qual o efeito do aumento da escala sobre os custos variáveis? O que acontecerá com o custo operacional efetivo, quando aumentarmos a escala de produção?

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Na busca pelo aumento do volume de leite é normal utilizar mais tecnologia e insumos, o que implica aumento do custo operacional efetivo. Essa afirmativa pode ser verdade ou não, depende! Se nos referimos ao custo operacional efetivo total (R$/Ano), é bem provável que seja verdadeira. Porém, se nos referimos ao custo operacional efetivo por litro (R$/L), essa afirmativa poderá ser falsa. Pensemos em um exemplo prático: quando desafiamos uma vaca fornecendo mais concentrado para que ela produza mais e a vaca responde ao desafio, os custos com concentrado (R$/Ano) aumentam; porém, por litro (R$/L), ao invés de aumentar, diminuem. Proporcionalmente o volume de leite aumenta muito mais do que o custo operacional efetivo total. É o ganho marginal, com a lei dos rendimentos crescentes. Portanto, nem sempre aumentar o volume de leite com a utilização de mais tecnologias e insumos leva ao aumento dos custos operacionais efetivos por litro. Daí advém a maior eficiência: produzir mais, com menos! Esta tendência foi confirmada quando analisamos as informações técnicas e econômicas dos produtores de leite que participam do Projeto Educampo, em Minas Gerais. Todos os produtores analisados foram separados em cinco grupos, de acordo com a taxa de aumento de volume de leite, nos períodos de set/15 a ago/16 e de set/16 a ago/17. Analisamos os mesmos grupos e verificamos que cresceram até 10% (grupo 1); de 10,1% a 20% (grupo 2), de 20,1% a 30% (grupo 3); de 30,1% a 40% (grupo 4) e mais de 40% (grupo 5). Apenas no grupo 1 (que cresceu até 10%) houve aumento da produção de leite diária (4,92%) acompanhado do aumento do custo operacional efetivo por litro (0,5%). Os demais grupos aumentaram a escala de produção e reduziram o custo operacional efetivo por litro. O grupo 2 aumentou a escala de produção em 15,12% e o COE/l reduziu em 1,18%. O grupo 3 aumentou a produção em 24,15% e o COE/l reduziu em -3,10%. O grupo


Indicadores técnicos e econômicos conforme percentual de aumento da produção média diária (L/Dia):

Fonte: SEBRAE EDUCAMPO - Dados: setembro/2015 a agosto/2016 e setembro/2016 a agosto/2017, deflacionados pelo IGP-DI de Setembro de 2017.

4 aumentou a produção em 34,50% e o COE/l reduziu em -9,38%. O grupo 5 aumentou a produção em 73,62% e o COE/l reduziu em -5,91%. Assim, podemos afirmar que, em todos os grupos, os custos operacionais efetivos totais (COE) e os custos totais (CT) de produção, por ano aumentaram, mas quando comparamos o COE/l e o CT/l, esses diminuíram, ou praticamente se mantiveram, nos períodos analisados. Como consequência das reduções dos custos unitários, o lucro total e o lucro por litro, no período de set/2016 a ago/2017, comparado com set/15 a ago/16, aumentaram significativamente em todos os grupos analisados. Isso se deveu ao

resultado do maior volume de leite, conjugado com o aumento dos preços e menores custos de produção de leite. Observem a tabela 1. Os gastos anuais com concentrado, mão de obra contratada, volumosos e energia e combustível, aumentaram (custo operacional efetivo). No entanto, quando analisados por litro, o custo de todos esses itens diminuiu. Produzimos mais, com menos! Ganho de eficiência gera lucro e lucro nada mais é do que o resultado das coisas bem-feitas, e, para fazer bem-feito na pecuária leiteira, ao contrário do que estamos acostumados a ouvir, mais é menos!

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Perfil

Nasce um líder Um drama familiar o levou a assumir papéis que não sonhava desempenhar, mas que lhe deram novo sentido à vida

Leomar com os filhos Lucas e Daniela durante a ordenha em um dia chuvoso

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Sérgio de Oliveira

ra 22 de setembro de 2017, festa de encerramento da 1ª Feira do Produtor Rural de Santana do Itararé, PR. Famílias inteiras circulavam pelo recinto. A população da cidade foi em peso prestigiar os shows, as barracas de doces e salgados e os concursos de gado leiteiro. No palco, o presidente da feira, Leomar Melo Martins, 43 anos, agradecia emocionado os produtores que trouxeram seus animais. Sabia a dificuldade que fora promover essa primeira edição. Não queria esquecer o nome de ninguém. Um ruído no fundo do palco o incomodou. Virou-se e identificou alguns políticos que, depois de discursarem, haviam formado uma rodinha de conversa, alheios ao que ele dizia. Chateado, Leomar apontou o dedo na direção deles e disse: “Essa é pra vocês!” E disparou: “Talvez vocês não saibam, mas a pecuária leiteira aqui em Santana do Itararé está movimentando a economia do município. É só ver como fica o movimento no comércio da cidade no dia do pagamento do leite. É um dinheiro que fica aqui. As famílias dos sitiantes não precisam mais sair para colher frutas em outros estados para ter renda. Os produtores apresentaram nesta feira uma pecuária de qualidade, estão se esforçando, mas precisam de apoio técnico e de recursos para melhorar nossa infraestrutura, nossas estradas... Precisamos de ação em favor dos produtores!”, desabafou.

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A história de Leomar pode ser dividida em antes e depois de 11 de setembro de 2001, mesma data em que, nos Estados Unidos, aviões foram arremessados contra edifícios. Até então, ele era gerente de laticínio de uma grande indústria e vivia rodando as principais bacias leiteiras do país para comprar o produto. Tinha um bom salário, carro, e sua mulher, Marisa, funcionária pública concursada, esperava um filho. Naquele dia, ela perdeu a criança. Todo o sofrimento do casal levou a uma decisão: deveriam ficar mais próximos, apoiar um ao outro, tentar reconstruir a vida e superar a perda com o que lhes restava: amor. Leomar resolveu pedir demissão. Considerado excelente funcionário, a empresa propôs um acordo: antes de sair, ele ajudaria a organizar o setor de compras a granel e, em troca, receberia todos os benefícios contratuais. Assim foi feito. Com o dinheiro, Leomar comprou dois “sitinhos” em Santana do Itararé. Com diploma de técnico agropecuário, experiência de anos visitando propriedades leiteiras e o estímulo de produtores da região, foi natural optar pelo leite. No entanto, o dinheiro tinha acabado, não sobrara para o plantel. Mesmo assim, ele foi preparando o terreno em um dos sítios, de 3,8 alqueires (9,12 hectares). Pelo menos no sonho, o Sítio Aliança estava quase pronto para produzir. Notícia luminosa Em 11 de setembro de 2003, exatos dois anos após a interrupção da gestação, uma notícia luminosa chegou até o casal Marisa e Leomar: duas crianças, de 6 meses e 1 ano e meio, estavam à espera de adoção; um casalzinho de irmãos. Foi o que faltava para deixar qualquer receio de lado e lançar-se ao projeto de vida que acalentava com Marisa: adotaram o Lucas e a Daniela, mudaram-se para a casinha do sítio e lá, em dezembro de 2003, com cinco vaquinhas produzindo 32 litros de leite/dia, Leomar deu início à trajetória que o levaria, 14 anos depois, ao palco da 1ª Feira do Produtor Rural de Santana do Itararé, na qualidade de presidente do evento, com direito a passar pito em políticos distraídos. Nesse tempo, os produtores construíram um ambiente de confiança e solidariedade que se traduziu em inúmeros mutirões para arrumar estradas, fazer silagem, realizar a feira. E em um acontecimento recente: um produtor perdeu 20 vacas por intoxicação alimentar. Os


colegas reuniram-se e doaram 19 vacas e algum dinheiro para que a vida do amigo seguisse em frente. Leomar lembra que no começo tirava leite no balde, num ranchinho a que apelidou de Presépio. Tinha uma mula e uma carroça para todas as atividades do sítio. A precariedade das instalações, porém, já contrastava com a pujança dos pastos, bem adubados, divididos em piquetes. “O manejo do capim e a adubação de base são fundamentais, é lavoura!”, diz Leomar, que se orgulha de ter o mesmo pasto há dez, doze anos. Para o inverno, ele faz silagem de milho. Já plantou cana e quer voltar a plantar, por considerar um volumoso mais barato e com maior produção por área. Sempre utilizou inseminação artificial - “escolho sempre os melhores touros” - e dá grande importância ao conforto dos animais, reservando áreas de sombra para o descanso. Diploma de Boas práticas Atualmente Leomar tem um rebanho de 65 cabeças, com 24 vacas em lactação e produção diária de 550 litros. Duas vezes por dia, ele e os filhos Lucas e Daniela dão expediente na sala de ordenha, equipada com quatro jogos de teteiras, e no abastecimento dos cochos de ração. A intenção é incrementar ainda mais a presença da raça Jersey no rebanho e implantar um projeto de irrigação na propriedade, que tem 700 metros de rio numa das divisas. “Assim vamos poder fazer sobressemeadura de aveia e azevém no inverno e bombeamento do esterco para fertirrigação”, diz Leomar. Ele exibe o diploma que acaba de chegar da Capal, cooperativa que coleta o leite da propriedade: juntamente com a Nestlé, a empresa concede ao Sítio Aliança o certificado de conformidade de Boas Práticas na Fazenda - 2017. Além de orgulho, o diploma garante um prêmio de 2,5 centavos por litro. “É possível viver da atividade leiteira na pequena propriedade. A gente vive bem aqui, todos juntos, trabalhando. Dentro da propriedade eu consigo controlar os custos. Eu e a Marisa todo dia repassamos as planilhas, anotamos tudo. Ela trabalha de dia no posto de saúde da cidade, mas quando chega confere tudo”. Foi assim que eles chegaram à conclusão que estavam com muitos animais improdutivos – quase 70% do rebanho –, com mui-

A família preparando-se para levar os animais à Feira do Produtor

tas novilhas que apenas geravam custos. Leomar reuniu um lote e passou adiante, e com o dinheiro foi atrás de embriões sexados de Jersey, para incrementar a genética da raça. “Não é hora de tirar o pé do acelerador”, diz o pós-graduando em Agronegócio pela FAE de Curitiba. Ele confessa que tem sido “assediado” para voltar a comprar leite para a indústria, mas não gostaria de voltar a ser assalariado. “Aqui a gente sempre pode criar coisas novas, experimentar, testar. Além disso, tem a sucessão familiar: meus filhos estão crescendo, estudando, talvez queiram ser outra coisa no futuro, mas se quiserem ficar aqui e continuar o negócio, já está tudo organizado”. Marisa confessa que sozinha não teria coragem de largar o emprego na cidade e apostar no sítio, mas apoia o marido e sempre que preciso também põe a mão na massa: “Quando ele quer ir pescar, distrair um pouco, não tem problema: eu vou pro curral com as crianças e a gente dá conta do recado.” Nos fins de semana, ela começa a ter o tempo ocupado por uma nova atividade: seu queijo meia cura de leite de Jersey tem conquistado mais e mais clientes na cidade e agora o que não falta é encomenda. E a política? Com a liderança que vem conquistando, Leomar não gostaria de se candidatar a vereador, deputado...? Ele dá um sorrisinho maroto, desconversa: “Quando você entra na política, tem de estar de bem com alguém. Se defender seu eleitor, talvez fique mal com o prefeito. Se ficar de bem com o prefeito, fica mal com o eleitor. É difícil as duas coisas combinarem. Prefiro ficar do lado dos produtores, ajudando como presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural e Sustentável. E como presidente da feira recebi uma moção de congratulação da Câmara Municipal, está de bom tamanho. Não penso em política, não.” A conferir.

Da caroça ao mutirão para fazer silagem: a construção de confiança e solidariedade entre os produtores

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Genética Sérgio Saud Presidente da Associação Brasileira de Inseminação Artificial - Asbia

Inseminação bem-feita, retorno garantido

A

Um erro na manipulação do botijão de sêmen, no descongelamento das palhetas ou no momento de introduzir o sêmen na vaca pode afetar significativamente a lucratividade da fazenda

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inseminação artificial vem sendo cada vez mais utilizada nos rebanhos leiteiros e, atualmente, atinge 15,5% das vacas em idade reprodutiva. Em regiões que concentram grandes bacias leiteiras, como o Rio Grande do Sul (segundo Estado com maior produção de leite), esse índice sobe para 33%. A expectativa é de que 2017 seja um ano de retomada do investimento do produtor nesta tecnologia e as vendas de sêmen cresçam em torno de 20%. Com mais propriedades inseminando seus rebanhos, espera-se que 2018 seja um ano de maior eficiência produtiva e reprodutiva para a pecuária leiteira. Mas, para que essa expectativa se concretize, é preciso uma correta aplicação da técnica de inseminação artificial. Atualmente, usa-se quase duas doses de sêmen (1,8), em média, para inseminar uma vaca. O recomendado é que esse índice seja reduzido para 1,2 doses por animal. Por isso, precisamos preparar bem os profissionais que inseminam as fêmeas, pois um erro na manipulação do botijão de sêmen, no descongelamento das palhetas ou no momento de introduzir o sêmen na vaca pode afetar significativamente a lucratividade da fazenda. Existem diversos cursos de IA recomendados pela ASBIA (Associação Brasileira de Inseminação Artificial) no país. Durante as aulas, o inseminador aprende, por exemplo, que existe um momento mais indicado para inseminar as vacas, que é no final do cio, quando a probabilidade de fecundação é maior devido à alta fertilidade da vaca. Vale lembrar que vacas observadas em cio pela manhã deverão ser inseminadas na tarde do mesmo dia. Já as observadas em cio à tarde devem ser inseminadas no início da manhã seguinte. Outra medida importante para o sucesso da técnica é estabelecer uma sequência da inseminação. Além disso, o inseminador deve examinar atentamente a ficha do animal e verificar as últimas ocorrências. Em caso de qualquer anormalidade ou se a vaca pariu há menos de 45 dias, não realize a inseminação. Ao conter o animal no tronco, faça o exame do muco, que deve ser semelhante à clara de ovo. Se detec-

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tar qualquer alteração, não insemine a vaca e anote essa observação na ficha do animal, comunicando o fato ao técnico responsável. Todo o material a ser utilizado deve estar sobre uma mesa ou balcão para aperfeiçoar o serviço. É preciso usar luvas e ter um pedaço de papel para secagem posterior da palheta. O aplicador universal serve tanto para a palheta média quanto para a fina. Verifique se a extremidade está adequada para o tipo de palheta. É muito importante realizar uma higienização da vaca, fazendo a limpeza do reto da fêmea. A vulva deve ser limpa, em seguida, com um papel. O passo seguinte é identificar o sêmen do touro a ser utilizado e retirar a dose com o auxílio de uma pinça. Não ultrapasse 5 segundos para este procedimento. Em seguida mergulhe a palheta com a extremidade da bucha voltada para baixo, em água a temperatura entre 35 e 37° C por 30 segundos. É importante cumprir à risca estas recomendações. Um termômetro deve ser usado para verificar constantemente a temperatura da água para que não ultrapasse os limites especificados acima. Pode-se também utilizar um descongelador eletrônico que mantém a temperatura da água constante. É importante destacar que o sêmen nunca deve ser recongelado. Depois de ser descongelada, a palheta deve ser secada com papel toalha ou higiênico antes de ter a extremidade cortada e ser utilizada para inseminar a vaca. Todos os dados da inseminação devem ser anotados na ficha do animal (Data da inseminação, período, nome do touro, nome do inseminador, etc.). É preciso redobrar os cuidados com a higiene durante todo o procedimento. Periodicamente faça uma limpeza do aplicador universal com álcool. Os materiais não devem encostar nas instalações, roupas, animais e outros objetos que podem contaminar o sêmen. E lembre-se. Quanto mais capacitada é a equipe, maiores as chances de ter melhores índices de prenhez no rebanho. Por isso, vale a pena participar regularmente de cursos de capacitação.



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Um toque especial

Estimulação tátil em bezerras e novilhas ajuda na prevenção de doenças, otimiza a rotina de ordenha e contribui com o desenvolvimento de animais mais tranquilos

A bezerra recebe Fotos Luiz Prado

os estímulos que naturalmente seriam realizados pela mãe

Roberto Nunes Filho

U

m manejo bastante simples e acessível está trazendo resultados satisfatórios para algumas fazendas brasileiras e potencializando os princípios de bem-estar animal nestas propriedades. Trata-se de uma técnica de estimulação tátil em bezerras e novilhas, capaz de melhorar a qualidade de vida do rebanho leiteiro e, consequentemente, a rentabilidade do produtor. A simplicidade mencionada acima, no entanto, esbarra em dois grandes desafios: mudança de cultura da fazenda e capacitação da mão de obra. O comportamento natural das vacas é lamber os bezerros. A técnica de estimulação tátil, portanto, nada mais é do que uma simulação desta conduta, realizada com o auxílio de uma escova ou com as próprias mãos. Tal contato desencadeia importantes reações químicas no organismo do animal que justificam a importância deste manejo. É aí que está o segredo.

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“A estimulação realizada nos mamíferos produz ocitocina e neurotransmissores, que são substâncias químicas que facilitam a transmissão de impulsos nervosos no cérebro. Além disso, amplia a concentração de imunoglobulina, o que melhora a saúde do animal e potencializa o seu ganho de peso”, explica a zootecnista e pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal (Etco), Lívia Carolina Magalhães Silva. “Notamos ainda que essa prática promove o relaxamento das bezerras, viabilizando respostas comportamentais desejáveis, como a docilidade, por exemplo.” Trabalhos conduzidos por Lívia mostram que os ganhos proporcionados ao rebanho por meio da escovação retornam à propriedade. Do ponto de vista de manejo, muitos procedimentos são otimizados, já que o trato de um animal mais tranquilo e saudável facilita a rotina dos funcionários. Em termos financeiros, o retorno também é notável. “A prática regular da estimulação tátil, associada a outros procedimentos em prol do bem-estar animal, reduz a mortalidade e morbidade no rebanho. Custos com medicamentos e perdas de animais, portanto, são


reduzidos. Além disso, quando estas fêmeas são introduzidas na ordenha, elas não mais necessitam da aplicação de ocitocina exógena para estimular a descida do leite. Observamos que o uso deste recurso praticamente zerou nas fazendas que adotaram a técnica.” O procedimento de escovação é bastante simples. Nas bezerras, o recomendado é que aconteça enquanto elas bebem leite. “Cerca de um minuto por animal é o suficiente. O importante, neste caso, é a regularidade. Vale destacar também que um tratador atende bem 50 cabeças”, recomenda a consultora. Já nas novilhas no pré-parto, tal estimulação acontece na sala de ordenha, em um processo de adaptação realizado antes da lactação que está descrito a seguir. Manejo dos bezerros A Fazenda Boa Fé (Conquista/MG), do Grupo Araunah, administrado pela família Ma Shou Tao, implementou a técnica em novembro de 2016. Passado um ano, os resultados já agradam o diretor executivo do grupo, Jônadan Ma. As primeiras bezerras submetidas à estimulação tátil, que hoje estão na fase de recria, tiveram melhoria no desempenho, fato que possibilitou antecipar a desmama e o desenvolvimento de animais que expressarão todo o seu potencial para a produção de leite. Um dos ganhos mais significativos, até o momento, foi a redução da mortalidade, cuja taxa passou de 8% para pouco menos de 2%. “Considerando que desem-

Como tudo começou O manejo de estimulação tátil, dentro de uma metodologia organizada, deu seus primeiros passos no Brasil em 2006, como alvo de uma iniciação científica liderada pela pesquisadora do Grupo Etco, Lívia Carolina Magalhães Silva. O projeto foi inspirado em trabalhos da década de 1950, pautados na ciência de que a infância dos mamíferos é um período bastante sensível para o processo de aprendizagem. O estudo de Lívia aconteceu na Fazenda Germânia (Monte Alto/SP), feito com a participação de 24 bezerras. O resultado foi bem satisfatório: 50% de redução nos custos com antibióticos e queda de 20 pontos percentuais na taxa de mortalidade (passou de 25% para 5%). Em 2013, a mesma tese foi contemplada, agora como um projeto de doutorado da consultora. O trabalho aconteceu na Fazenda Santa Luzia (Passos/MG), cujos resultados também agradaram. Por lá, o re-

bolsamos quase R$ 1,4 mil por bezerro (custo compreendido desde a prenhez até a desmama), temos aí um incremento de receita muito bem-vindo”, observou Ma, que possui 109 bezerras. Outro avanço diz respeito à redução da morbidade, o que também impacta diretamente na rentabilidade do negócio. “Andando entre as casinhas das bezerras, é possível observar que não há manchas brancas no chão, em sinal da incidência de diarreia”, acrescentou Jônadan. De fato, conforme a reportagem de Mundo do Leite constatou na visita realizada à fazenda, foi possível observar apenas a presença de esterco sólido. “Isso mostra que o nível de diarreia e pneumonia diminuiu bastante por causa deste projeto de manejo racional que adotamos. Tais desafios, eventualmente, ainda acontecem, mas a redução foi drástica no último ano.” A escovação das bezerras é um processo relativamente simples, mas requer disciplina para que os efeitos

banho leiteiro obteve melhora na resposta comportamental, queda na mortalidade e a quase eliminação do uso de ocitocina na ordenha. Como a aplicação deste hormônio foi racionalizada, a ordenha passou a acabar uma hora mais cedo. Diante dos bons resultados das pesquisas, Lívia passou a oferecer a técnica para outras fazendas. Hoje, as propriedades que têm o acompanhamento da especialista são a Fazenda Santa Luzia, Agropecuária Irmãos Chiara (Morrinhos/GO), Fazenda Floresta (Lins/SP) e Fazenda Boa Fé (Conquista/MG). De acordo com Lívia, outras várias fazendas estão praticando a escovação de bezerras e novilhas, graças aos cursos ministrados pela especialista. O manejo de estimulação tátil comprovou que dá resultados, mas a consultora faz um alerta: não adianta escovar uma bezerra que está doente, estressada ou subnutrida. “Essa técnica faz parte de um programa de manejo, onde o bezerro precisa estar bem

Jônadan Ma, diretor executivo do Grupo Araunah: “incremento de receita”

colostrado, tem que ter boa cura de umbigo, o aleitamento tem que estar correto, as instalações devem estar sempre limpas e é preciso haver um bom protocolo veterinário”, esclarece Lívia. “Não existe ação isolada quando o assunto é bem-estar animal. Para praticá-lo, a fazenda precisa atender os domínios da saúde, nutrição, ambiente, comportamento e estado mental.”

Lívia Carolina Magalhães Silva, zootecnista do Grupo ETCO, que iniciou o trabalho no Brasil

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Fotos Luiz Prado

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Novilhas no pré-parto se familiarizam com a sala de ordenha: são escovadas...

...passam por algumas situações da ordenha, como o pré-dipping...

apareçam. Por isso, o preparo e a conscientização dos colaboradores são fundamentais para o sucesso deste manejo. Conforme observou Jônadan, a prática não pode ser encarada como uma perda de tempo, até porque isso não acontece. “Na verdade, um manejo é trocado pelo outro. Como os animais estão ficando menos doentes, o tempo dedicado à administração de medicamentos, por exemplo,

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está sendo direcionado para a escovação”, pontua o produtor. “O tratador é uma figura relevante neste processo, ele exerce grande participação na criação da “primeira memória” do animal, aquela que influenciará o seu comportamento futuro. Por isso, vale apostar no preparo da mão de obra, pois estamos falando de uma mudança de cultura, pautada na consciência de que os animais são seres vivos que precisam e merecem carinho e atenção.”


Fotos Luiz Prado

...recebem uma recompensa em ração, por bom comportamento...

Visão semelhante é compartilhada pela pesquisadora do Grupo Etco, que acrescenta que o contato diário dos tratadores com as bezerras viabiliza, ainda, o exercício de um manejo preventivo. “Essa aproximação faz com que o tratador observe melhor os animais e tenha uma percepção mais clara do seu real estado. Caso constate alguma condição suspeita, a tomada de decisão é mais rápida, o que amplia as chances de êxito. Por isso, os tratadores estão gostando deste manejo, pois, no fim das contas, ele facilita o trabalho deles”, acrescenta Lívia. A afirmação da consultora é corroborada pelo tratador da Boa Fé, Mauro Maia, que trabalha há uma década na fazenda e há seis anos é responsável por cuidar das bezerras. “Antes, a bezerrada era mais arisca. Depois da introdução da escovação, elas estão mais dóceis e ficaram menos doentes, o que facilitou o nosso trabalho”. O manejo de escovação das bezerras e novilhas adotado pela Fazenda Boa Fé faz parte de um programa de boas práticas, que levou seis meses para ser implementado. Antes de ele entrar em ação, todo um trabalho de base foi realizado para que os resultados fossem alcançados, como reestruturação da colostragem e do processo de cura de umbigo. O aleitamento das bezerras também foi revisto e, agora, é realizado por meio de baldes com bicos que proporcionam uma mamada lenta e, consequentemente, melhor digestibilidade do leite. “A sucção lenta do leite, semelhante ao que acontece quando o bezerro mama na vaca, evita o acúmulo de leite no rúmen e as chamadas diarreias nutricionais. Consequentemente, o ganho de peso é favorecido”, explica Lívia. Novilhas no pré-parto O processo de estimulação tátil também contempla as novilhas no pré-parto, que estão sendo preparadas para a primeira ordenha. O objetivo é promover a familiarização deste grupo de animais com a sala de ordenha, de modo a minimizar o estresse de uma introdução abrupta quando chegar o momento da retirada do leite.

...e aguardam no compost barn o dia em que serão mamães

Inicialmente as novilhas passam pela área de resfriamento, ficando neste local por cerca de 10 minutos. A partir do quarto dia, vão para a sala de ordenha, onde também ficam por alguns minutos. Lá, elas passam a ter contato com o ordenhador e também são escovadas. Além disso, alguns procedimentos de ordenha são simulados, como o pré-dipping. Por fim, na saída da sala, é oferecida uma ração para os animais, como forma de recompensa. Este manejo tem duração total de 21 dias. A partir daí, as novilhas ficam por uma semana em repouso no compost barn, aguardando o momento da parição. “Esse processo permite que a novilha se sinta bem no ambiente que frequentará nos próximos meses, evitando o trauma de uma inserção repentina, sem um bom preparo”, defende Jônadan Ma. “A ordenha tem que ser vista pelo animal como um ambiente que lhe proporcionará alívio, por permitir o escoamento do leite represado.” Graças a este procedimento, todas as vacas em lactação que passaram pelo processo de adaptação não precisam da aplicação da ocitocina para que o leite desça. Isso permitiu à Boa Fé reduzir em 20% o uso do hormônio. A meta para o futuro, quando todas as vacas terão passado por este processo, é zerar o uso da ocitocina. “A eliminação não apenas traz economia como poupa o animal de um procedimento agressivo. Além disso, é comum nas fazendas a repetição intensa no uso da agulha para aplicação do hormônio, fato que pode contribuir para a proliferação de doenças. O manejo racional dá trabalho, mas quanto custa uma vaca que morre por infecção de agulha?”, questiona o produtor. Com relação ao tempo gasto no manejo, a lógica é a mesma da escovação das bezerras, ou seja, não necessariamente o processo de adaptação das novilhas na sala de ordenha resulta em acréscimo de tempo para os funcionários. Como os animais passam a entrar na sala sem dar trabalho e se sentem mais à vontade no local, a ordenha torna-se mais rápida. É este tempo “poupado” que passa a ser direcionado para o manejo de adaptação.

Lupa A Fazenda Boa Fé possui um rebanho de 1.082 cabeças das raças Girolando e Holandês, criadas em uma área de 3.000 ha. Destas, 348 estão em lactação, com produção média de 25,5 litros/vaca/ dia, totalizando quase 9 mil litros por dia. Todo o leite é fornecido para o laticínio Itambé. A agropecuária tem a meta de alcançar, em 2023, uma produção de 40 mil litros/dia, com 1,2 mil vacas em lactação.

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Qualidade Marcos Veiga Professor Associado da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, campus de Pirassununga, SP.

Como monitorar a qualidade do leite

A Recomenda-se que todos os responsáveis pelas coletas sejam submetidos a um treinamento inicial e que passem por capacitação periódica sobre cuidados e procedimentos de coleta

obtenção de resultados confiáveis de análise do leite depende de dois fatores fundamentais: os procedimentos de coleta de amostras e a análise laboratorial. Estes pontos-chave são necessários para fins de fiscalização, de pagamento por qualidade ou como ferramenta de gestão dentro da fazenda leiteira. Atualmente, os laboratórios que fazem parte da Rede Brasileira de Laboratórios de Controle de Qualidade de Leite (RBQL), criada pelo Ministério da Agricultura, têm bons programas de calibração, controle e aferição de equipamentos utilizados nas análises. Sendo assim, a coleta, o armazenamento e o transporte das amostras até a análise passa a ser fundamental, pois dependendo desses fatores os resultados obtidos podem não retratar a realidade da fazenda e, consequentemente, induzir a tomada de decisão equivocada. Em resumo, os fatores mais críticos para obtenção de uma amostra representativa de leite para análises são: a) capacitacão do responsável pela coleta, b) qualidade de materiais e utensílios utilizados, c) procedimentos de coleta e transporte até o laboratório. Uma boa representatividade da amostra indica que os resultados representam as condições do leite no tanque, e depende muito da padronização de procedimentos. Para tanto, o motorista do caminhão de coleta do leite (transportador) é uma figura-chave para a confiabilidade das coletas. Deve ter constantemente capacitação sobre os procedimentos de higienização de utensílios usados, de medição do volume do leite, coleta, armazenamento e do transporte de amostras. O transportador tem alta responsabilidade sobre a representatividade da coleta, pois dependendo do procedimento pode ocorrer grande impacto sobre o pagamento do produtor. Recomenda-se que sejam submetidos a um treinamento inicial e que passem por capacitação periódica sobre cuidados e procedimentos de coleta. Materiais Com relação aos materiais utilizados nas coletas, os

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cuidados principais são com a correta identificação dos frascos, o manuseio e o uso correto de conservantes, dependendo de cada tipo de análise. Para as análises de composição e CCS, recomenda-se o uso de frasco plástico com capacidade de cerca de 40 ml, com adição do conservante bronopol. Para as análises de CBT, recomenda-se o uso de frascos estéreis e conservante azidiol, cuja função é impedir o aumento da contaminação microbiana do leite durante o transporte e armazenamento da amostra antes da análise. Após a correta agitação do leite no tanque, o transportador deve coletar duas amostras em separado, sendo uma delas para composição e CCS e a outra para CBT. Ambas as amostras devem ser coletadas pela tampa do tanque e não pela válvula de saída, com o uso de uma concha de cabo longo (ou utensílio similar), para mergulhar e coletar amostra representativa de leite. Terminada a coleta, as amostras devem ser agitadas suavemente (inverter o frasco repetidas vezes), de forma a misturar completamente o leite ao conservante. Finalizada a coleta, as amostras devem ser armazenadas em recipiente refrigerado (com gelo reciclável). Os resultados de composição, CCS e CBT são satisfatórios quando a amostra de leite é analisada em no máximo quatro dias entre a coleta a e análise. Coleta de tanques Uma das principais fontes de variação de resultados de composição e contagem bacteriana do leite é a falta de agitação antes da coleta. A agitação é necessária, pois quanto o leite está em repouso há acúmulo de gordura na camada superior, formando a nata. Esta camada apresenta alto teor de gordura, o que afeta os resultados de composição do leite. Além disso, na camada da nata pode acumular as células somáticas, o que também afeta os resultados de CCS. Sendo assim, o objetivo da agitação deve ser o de garantir que o leite coletado represente de maneira homogênea a composição do leite do tanque, sem, no entanto, causar alterações da qualidade


como a ruptura dos glóbulos de gordura – que ocorre sob excessiva agitação do leite. Ainda que seja um ponto crítico na credibilidade e funcionamento de programas de monitoramento e pagamento por qualidade, não existe uma regra universal sobre os procedimentos para agitação do leite antes da coleta de amostras. Muitos países possuem legislações estabelecendo critérios mínimos para agitação do leite nos tanques imediatamente antes da coleta. No Brasil, o Regulamento Técnico da Coleta de Leite Cru Refrigerado e Transporte a Granel (IN 62/2011), apenas indica que, antes do início da coleta, o leite deve ser agitado com utensílio próprio e ter a temperatura anotada. Desta forma, não existe recomendação da legislação para um tempo mínimo de agitação do leite. De acordo com a legislação canadense, o leite deve ser agitado pelo menos por 5 minutos antes da coleta. Para a maioria dos estados do nordeste dos EUA, recomenda-se que o leite deve ser adequadamente agitado antes da coleta (agitação de 5 min para tanques abaixo de 3.800 L e de 10 min para tanques acima de 3.800 L – (Farm Bulk Tank Collection Procedures, Dairy Practices Council). Alguns estados, contudo, seguem as recomendações da APHA (Standard methods for examination of Dairy Produtcts), a qual determina que o leite seja agitado por pelo menos 5 minutos imediatamente antes da coleta da amostra e que tanques acima de 5.700 L tenham agitação de 10 minutos ou de acordo com o fabricante. Na Nova Zelândia, os códigos para coleta de leite determinam que o leite seja continuamente agitado durante o período de armazenamento, sendo que para silos de armazenagem de leite a agitação deve ser suficiente para que a variação do teor de gordura seja menor que 0,1% e que não haja variação de temperatura entre os vários pontos dentro do tanque, além de evitar a ocorrência de alteração dos glóbulos de gordura. Atualmente, a maioria dos tanques de expansão para resfriamento de leite tem uma pá com agitação intermitente (o agitador trabalha durante alguns minutos a cada intervalo de tempo). Esta estratégia reduz a formação da camada de nata, sem causar o rompimento dos glóbulos de gordura. Para garantir a uniformidade das amostras de leite coletadas de tanques recomenda-se que seja aplicada a agitação intermitente a cada hora e que o tempo mínimo de agitação antes da coleta de leite seja de 2 minutos. Em resumo, os vários organismos internacionais apresentam normas gerais para agitação do leite entre 5 e 10 minutos para tanques pequenos e grandes, respectivamente. Quando a agitação intermitente é usada (ciclos de agitação e repouso), a recomendação é de que o tempo de agitação mínimo de 2 minutos é adequado antes da coleta. Como coletar amostras individuais das vacas? A rotina de realização de análises individuais de

CCS de todas as vacas do rebanho é um dos fundamentos de um programa de controle de mastite. Com os resultados de CCS individual pode-se identificar a prevalência da mastite subclínica no rebanho, monitorar a ocorrência dos novos casos e dos casos crônicos, assim como estimar as perdas decorrentes da mastite. Recomenda-se que as vacas em lactação sejam analisadas em relação a CCS uma vez ao mês. Da mesma forma que os procedimentos usados para amostras de tanque, a coleta de amostras individuais pode interferir significativamente na CCS. A amostra de leite para a realização da CCS deve ser composta dos quatro quartos e representativa de uma ordenha completa da vaca. A coleta pode ser feita diretamente do balde, após o término da ordenha, para os sistemas de ordenha manual e balde ao pé. Nestes casos, a amostra deve ser coletada após uma rápida agitação (transferindo-se o leite de um balde para o outro). Com o uso de uma concha higienizada, a amostra pode ser transferida para um frasco com bronopol. Para uma boa homogeneização do conservante, recomenda-se inverter o frasco repetidas vezes. Nos sistemas de ordenha canalizada, a amostra deve ser coletada em amostradores ou medidores de leite, para que represente o fluxo de leite durante a ordenha. Finda a ordenha, recomenda-se agitação manual da amostra ou pela abertura da entrada de ar no medidor, antes de transferi-la para o frasco. A amostra para análise de CCS não deve ser coletada diretamente da vaca por ordenha manual, no início da ordenha. Os resultados dos estudos indicam que para amostras com alta CCS (> 200.000 cel/ml), os dois primeiros jatos de leite apresentam CCS cerca de 5 vezes maior dos que a CCS do leite total. Quando uma amostra é coletada dos primeiros jatos, pode-se ter resultados muitos superiores aos de uma amostra coletada durante toda a ordenha, indicando um resultado erroneamente elevado para aquele animal.

No laboratório determina-se a qualidade do leite, mas é na coleta que mora o perigo

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Saúde Animal

Comida também mata A toxina botulínica pode ser ingerida pelo animal no pasto ou no cocho

Ingestão de

Niza Souza

silagem de milho contaminada dizimou animais de um confinamento em MS

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E

m agosto, mais de mil cabeças de gado morreram em uma fazenda de Ribas do Rio Pardo, em Mato Grosso do Sul. Autoridades sanitárias confirmaram as mortes por botulismo. Apesar de ser uma doença bastante difundida no Brasil, o caso chama a atenção pela grande quantidade de animais mortos de um mesmo rebanho. O botulismo é uma doença grave, uma intoxicação caracterizada pela ingestão da toxina botulínica C ou D, explica o professor da Universidade Federal de Minas Gerais, Francisco Lobato, especialista em clostridium. A bactéria pode ser ingerida pelo animal de diversas formas, no pasto ou no cocho. Antigamente o botulismo era uma doença associada a manejos rústicos com pastagens pobres e com baixa lotação animal/hectare. Atualmente, entretanto, tem um perfil diferente e está também associada a rebanhos com animais precoces, pastagens produtivas e gado confinado. Conforme explica Lobato, no rebanho leiteiro a doença ocorre com mais frequência quando o produtor oferece suplemento alimentar de bai-

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xa qualidade aos animais. “Existem vários relatos disso”, destaca o professor, lembrando que isso ocorria muito quando se usava cama de frango na suplementação alimentar. Atualmente, é mais comum encontrar o problema na silagem de milho. Neste caso, é preciso tomar cuidado com a ensilagem, alerta Lobato. “No momento de fazer a ensilagem do grão, deve-se ficar atento à compactação. Se houver a toxina pré-formada, qualquer problema pode favorecer os esporos do botulismo”, afirma. No caso dos animais mortos em Mato Grosso do Sul, Lobato diz que foram feitas análises tanto dos animais quanto dos alimentos. Segundo ele, foi identificada a presença da toxina botulínica tipo C na alimentação. “O bovino é extremamente sensível a essa toxina, que é a mais potente de origem microbiana identificada até hoje.” A Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), por meio da Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal de Mato Grosso do Sul (Iagro), confirmou que os resultados dos ensaios laboratoriais nas amostras da silagem de milho fornecida aos bovinos do confinamento demonstraram a presença das toxinas botulínicas tipos C e D. O comunicado destaca que não se trata de doença infecto-contagiosa, mas sim de uma intoxicação alimentar. “O Clostridium botulinum, bactéria produtora da toxina, está normalmente presente no ambiente e depende de condições favoráveis para o seu desenvolvimento, tais como matéria orgânica, alta umidade e anaerobiose, o que pode ser evitado com boas práticas e cuidados na formulação, conservação e armazenamento dos alimentos a serem fornecidos aos animais”, afirma o Iagro. Outra forma de contrair a doença é no pasto. Segundo o professor Lobato, quando o animal desenvolve osteofagia (deficiência em fósforo), ele vai buscar suprir essa deficiência no campo comendo ossos ou restos de carcaça de outros animais. “Por isso, é importante oferecer uma alimentação equilibrada ao animal e fazer a suplementação mineral adequada, principalmente de fósforo”, frisa o professor.


Sintomas Nos estágios iniciais, a doença causa fraqueza muscular seguida de paralisia muscular, afetando inicialmente os quartos traseiros, e progredindo para os dianteiros, cabeça e pescoço. Os músculos da língua e do queixo são frequentemente afetados. Os movimentos tornam-se duros, o animal apresenta dificuldade em levantar. Não há presença de febre e o animal mantém a consciência e a sensibilida-

Prevenção Para prevenir a doença, o pecuarista precisa tomar alguns cuidados básicos. A vacinação é o primeiro deles. O professor orienta o uso das vacinas clostridiais a partir dos 4 meses de idade do animal e aplicação de reforço de 30 a 42 dias depois, além da revacinação anual. “Mas se os níveis de toxina da doença forem muito altos, o animal pode morrer mesmo vacinado, pois não existe tratamento. O desafio é grande”, alerta Lobato.

de. A morte ocorre quando há paralisia respiratória. A evolução depende da quantidade de toxina ingerida. Se for muito alta, o animal pode morrer em até 24 horas. Em quantidades menores, pode demorar dias. Nesse caso, existe no Brasil o soro botulínico C e D. Em algumas situações, quando aplicado antes de o quadro da doença evoluir muito, pode funcionar.

Além disso, o produtor deve ter cuidado na suplementação alimentar do gado, usar suplementos de boa qualidade e avaliar o PH do silo, que deve ser em torno de 3,5. Também é preciso evitar que o silo seja contaminado com o solo e fezes de animais. No caso de rebanho que fica no pasto, usar suplementação mineral adequada, principalmente com relação ao fósforo e ao cálcio, para que o animal não vá procurar suprir possíveis deficiências no campo.

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Pastagem

Virada produtiva A análise do solo é o começo de tudo quando se busca um pasto de qualidade

Fernanda Yoneya

H Thiago Rodrigues de Almeida, produtor: “A fazenda prrecisava mudar”

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á quatro anos, o cenário na Fazenda São Domingos, no município de Anicuns, em Goiás, era de uma grande área destinada ao rebanho leiteiro para uma produtividade baixa. As vacas eram criadas a pasto, mas não era adotado nenhum tipo de manejo. A propriedade, que vinha de geração em geração, passou a não dar mais o lucro esperado e o produtor Thiago Rodrigues de Almeida pensou em deixar a atividade leiteira, “uma herança de família. Sou produtor de leite desde que me conheço por gente, mas a fazenda precisava mudar. A área era grande para uma produtividade baixa. O manejo era zero e não estava compensando”, lembra o produtor. Ele conta que buscou informações para tentar melhorar a gestão e o planejamento da propriedade e, ao conhecer o programa Balde Cheio, da Embrapa Pecuária Sudeste, a primeira recomendação dos técnicos do projeto foi investir na adubação da pastagem. “Foi feito um diagnóstico da propriedade, um levantamento das condições da fazenda. Aí entrou a análise de solo”, afirma o

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pecuarista. Atualmente, a análise de solo, realizada pelo menos uma vez por ano, é indispensável na São Domingos. Almeida comemora os resultados: hoje a propriedade mantém rebanho (gado holandês, girolando e jersolando) de 31 animais, sendo 24 vacas em lactação. A produtividade é de 20 litros/animal/dia em área de 2 hectares de pasto - o capim é o mombaça, indicado justamente para áreas de maior fertilidade. A produtividade de matéria seca é de 20 a 23 toneladas por hectare/ano. Quatro anos atrás, diz o pecuarista, a área de pastagem era de 10 a 12 hectares, o rebanho era de 42 vacas em lactação e a produtividade não chegava a 6 litros/animal/ dia. Fazer o planejamento da adubação, de acordo com a espécie forrageira mais adequada e com base na análise de solo, é uma forma de saber o custo-benefício da prática. Com o resultado da análise de solo em mãos, Almeida programa a aplicação de calcário, de adubo orgânico e adubo químico. A propriedade possui 22 piquetes e, no período das águas, ele “roda” as vacas no mesmo piquete por 24 horas, com um intervalo de 21 dias até o retorno dos animais. “A cada saída dos piquetes, aplico ureia, como manutenção. O capim cresce com a folha larga”, explica o produtor. O zootecnista Luizmar Borges de Souza Júnior, técnico de campo do programa Senar Mais Leite, afirma que outra vantagem de uma pastagem bem adubada é a economia com alimento concentrado. “Geralmente, o produtor usa uma ração com 24%, 25% de proteína bruta. Um pasto com uma adubação pesada – associado à lotação adequada e ao respeito à altura correta da planta na entrada e na saída dos animais – apresenta índices de proteína bruta de 15%, 18%, 22%, o que reduz a despesa com concentrado”, diz o técnico. Normalmente, se o pasto estiver em fase de forma-


ção, é preciso investir numa adubação mais pesada no primeiro ano. O nitrogênio é aplicado via ureia. A quantidade de fósforo depende muito da análise de solo: se o teor no solo for alto - daí a importância do resultado da análise - não precisa aplicar. A aplicação de potássio também depende do resultado da análise de solo e da espécie forrageira selecionada. Em áreas nas quais o pasto já estiver estabelecido e se encontrar na fase de “manutenção” da adubação – o que ocorre a partir do segundo ou terceiro ano –, a aplicação de fertilizante tem como objetivo repor as retiradas pelo consumo dos animais, além de perdas por erosão, lixiviação ou evaporação. O técnico Carlos Eduardo Freitas Carvalho, da Cooperativa para a Inovação e Desenvolvimento da Atividade Leiteira (Cooperideal), destaca a importância da “consciência”, tanto do técnico quanto do produtor, sobre a complexidade de um sistema intensivo de pastagem. “É muito complexo fazer manejo e adubação de pastagens, precisa estar tudo muito bem alinhado. É preciso que o clima esteja condizente com o que a planta necessita, é necessário que o manejo de piquetes esteja adequado ao tipo de pastagem que está sendo instalada”, explica. “O tamanho da área exige um planejamento racional, para que o produtor não erre em função de ter uma área muito grande ou muito pequena em relação ao rebanho, justamente para que consiga viabilizar o sistema produtivo.” Carvalho exemplifica: “Um produtor que tem 50 vacas para serem alimentadas no período de um ano não precisa ter uma área de 10 hectares para fazer esse manejo, principalmente se essa área for de apenas um sistema de pastejo.” Isso porque, segundo o técnico da Cooperideial, costuma-se trabalhar com oito a dez unidades animais (UA) por hectare em áreas de manejo intensivo. “Portanto, nesse exemplo, é preciso ter uma área de 5 a 6 hectares para estar condizente. Pode-se manter uma área de pasto extensivo para o caso de um veranico. Ou às vezes até ter uma sobra de silagem de milho ou silagem de sorgo ou qualquer outro tipo de alimento volumoso ou ensilado para que o produtor possa ter um escape caso não haja irrigação e a produção do pasto fique prejudicada.” Para o técnico, elaborar um “cronograma de ação” é fundamental para o direcionamento dos trabalhos. Cumprida esta primeira etapa de “entendimento da complexidade” da adubação de pastagem, o pecuarista pode partir para a análise de solo, afirma Carvalho. No primeiro ano, diz, o ideal é fazer uma análise física do solo, de fertilidade básica. De acordo com o técnico da Cooperideal, uma pastagem bem adubada, com manejo intensivo, costuma dar, mesmo em regime de sequeiro, entre 20 e 25 toneladas de matéria seca por hectare. “As adubações são altas para suprir as necessidades do pasto”, diz Carvalho. Existem forrageiras que respondem mais à adubação que outras, e conhecer a espécie utilizada é essen-

Em áreas de manejo intensivo

cial quando se pretende adubar um pasto. As forrageiras mais exigentes em adubação são aquelas que produzem muita biomassa, como os capins destinados ao corte, entre eles o capim-elefante (Pennisetum purpureum), e as gramíneas do gênero Panicum, como as cultivares mombaça e tanzânia, também muito exigentes em fertilidade. Outro grupo menos usado no Brasil são os capins do gênero Cynodon (tiftons), que também são exigentes. Já algumas cultivares de braquiárias são mais rústicas, sendo menos exigentes. Conforme o técnico, o ideal é fazer a análise de solo entre março e abril para que, com o resultado em mãos, se houver necessidade, a calagem possa ser feita em maio. Dessa forma, quando chegar outubro (início das águas) a área estará pronta para receber fósforo, potássio, nitrogênio e micronutrientes. “Em média, para cada 10 UA/hectare que o produtor almeja na área, são necessários 500 quilos de nitrogênio/hectare/ano (180 dias). Deve-se considerar, porém, que a matéria orgânica do solo já fornece, em média, 50 quilos de nitrogênio”, afirma Carvalho. Segundo ele, a aplicação de nitrogênio, em uma adubação de manutenção, pode ser acompanhada do fornecimento de potássio. Nesse caso, Carvalho destaca a importância do acompanhamento técnico, já que a aplicação de nitrogênio pode ser parcelada por causa do risco de lixiviação. O custo de adubação, por vaca, é de R$ 2 a R$ 2,50 por dia e, pelos cálculos do técnico da Cooperideal, é preciso trabalhar com vacas que tenham uma produtividade mínima de 10 litros/dia. “O mais interessante é ter animais de bom potencial genético, já que o consumo de volumoso por uma vaca que produz 10 litros e uma que produz 20 litros é praticamente o mesmo. Ideal é aliar um manejo intensivo com animais de potencial genético”, diz o técnico da cooperativa.

trabalha-se com oito a dez UA/ha

Fazer o planejamento da adubação, de acordo com a espécie forrageira mais adequada e com base na análise de solo, é uma forma de saber o custobenefício da prática.

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Sustentabilidade Alexandre M. Pedroso Consultor de Bovinos Leiteiros da Cargill Nutrição Animal, e-mail alexandre_pedroso@cargill.com

Você sabe o que suas vacas estão comendo?

U

ma dos temas mais frequentes em minhas reuniões técnicas, visitas a clientes, palestras, cursos ou artigos é a importância de se conhecer detalhadamente a composição dos alimentos que oferecemos aos animais. Esse tema não é novo, já escrevi alguns artigos sobre isso, mas entendo que é mais atual do que nunca! Costumo dizer que formular dietas é muito fácil, o difícil é ter certeza de que a formulação corresponde ao que as vacas estão comendo. Para que sejam eficientes no uso dos alimentos, vacas leiteiras demandam grande consistência no manejo da sua alimentação. É preciso incorporar definitivamente o conceito de que as vacas precisam de nutrientes, e não de alimentos, e a oferta desses nutrientes tem que ser feita de forma uniforme e consistente. A dieta formulada deve ser idêntica à dieta fornecida, que por sua vez deve ser idêntica à dieta ingerida pelas vacas. O que chamamos de Nutrição de Precisão é o caminho mais interessante para se alcançar elevada eficiência produtiva e econômica nas fazendas leiteiras. Esse conceito, acima de tudo, demanda uma mudança de postura das pessoas envolvidas com o manejo alimentar dos rebanhos leiteiros. É necessário elevar os padrões de exigência no dia-a-dia da fazenda, para que seja possível elevar a eficiência de uso dos nutrientes consumidos pelas vacas. É fundamental entender que o leite é sintetizado a partir dos nutrientes ingeridos e não dos alimentos. Para conseguir consistência no manejo alimentar, alguns pontos são fundamentais. O maior desafio dos nutricionistas, para que possam formular corretamente as dietas, é conhecer, de fato, a composição dos alimentos que vão utilizar. E não há outra forma de ter essas informações a não ser através da análise bromatológica dos alimentos. O custo dessas análises é extremamente

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baixo, comparado ao benefício que geram. Sem saber corretamente a composição dos alimentos, não há como formular adequadamente as dietas. Há grande variação na composição dos alimentos, especialmente volumosos, de forma que é extremamente arriscado se basear em valores de tabelas. Mesmo alimentos concentrados, principalmente subprodutos da agroindústria, apresentam variabilidade considerável em sua composição, e devem ser analisados regularmente. Também é importante fazer uma boa seleção de fornecedores, para garantir a qualidade dos alimentos comprados. Nutrientes e digestibilidade No meu trabalho como nutricionista em fazendas leiteiras procuro usar ao máximo as informações que podemos extrair dos laudos de análises bromatológicas. Hoje em nosso país há excelentes laboratórios capazes de fazer análises completas dos alimentos em tempo bastante curto, e a custo totalmente acessível, de forma que não há justificativas para não fazê-las. Ao avaliar o resultado de uma análise, procuro focar nos principais nutrientes e nos parâmetros de digestibilidade. O primeiro parâmetro sempre é a fibra, o teor de FDN da amostra, bem como sua digestibilidade. Trata-se de um nutriente fundamental para vacas leiteiras, necessário para manter sua saúde, e que pode contribuir significativamente com o suprimento de energia da dieta, se tiver elevada digestibilidade. Em nosso país o teor de FDN dos alimentos volumosos varia muito, bem como sua qualidade, dada justamente pelos parâmetros de digestibilidade. Isso representa um dos maiores, senão o maior, desafio para os nutricionistas que trabalham com rebanhos leiteiros. A dificuldade é ainda maior quando se trabalha com pasto, pois a variação na composição bromatológica é ainda maior, especialmente com relação à FDN. Já trabalhei com pastos de 47% a 70% de FDN, ou seja, é impossível formular corretamente sem ter essa informação. E infelizmente ainda há produtores que não se convenceram da absoluta necessidade de realizar as análises bromatológicas. Depois da FDN, os próximos parâmetros a serem avaliados são os teores de proteína e amido, dependendo do tipo de alimento. Se a base da dieta é de forragens verdes (pasto, pré-secados, silagens de capim, etc.), o foco é na proteína, mas não apenas a proteína bruta (PB), é importantíssimo considerar suas frações, como a proteína degradável no rúmen (PDR) e proteína solúvel (PS). Pastos de alta qualidade podem conter até 22-24%


PB, com até 40% de PS, e pastos de baixa qualidade podem apresentar valores de PB tão baixos quanto 8 – 10% com mais de 70% PS, de forma que não é possível formular corretamente uma dieta para vacas leiteiras sem ter essa informação. Com relação ao balanceamento proteico de dietas, cabe enfatizar que a formulação com base no perfil de aminoácidos (AA), já é uma realidade para bovinos leiteiros. Os programas de formulação de dietas mais modernos consideram o aporte de AA digestíveis para as vacas, e com a experiência que já temos por aqui é possível utilizar estrategicamente alguns AA para formular com mais eficiência as dietas e até mesmo reduzir o custo de alimentação das vacas. Se a base da dieta for silagem de milho ou sorgo o foco nessa etapa será no teor de amido, que também pode variar consideravelmente. Como via de regra os grãos de cereais, especialmente o milho, são o principal suplemento energético das rações, e estes são ricos em amido, é fácil entender que em dietas à base de silagem de milho ou sorgo o amido é o grande determinante da disponibilidade de energia. Se quem formula não sabe quanto tem de amido na dieta, o risco de erros é enorme, bem como da ocorrência de problemas de saúde para os animais, uma vez que amido em excesso é a principal causa de acidose ruminal. Depois de avaliar esses nutrientes eu procuro olhar para o teor de cinzas, pois este parâmetro afeta negativamente a qualidade das forragens e a fermentação ruminal em muitos casos. Quanto maior o teor de cinzas, menor o teor de energia dos alimentos; além disso, as cinzas também podem carregar alguns elementos anti-nutricionais do solo, como fungos, bolores ou mesmo microrganismos altamente indesejáveis, como Clostridium. Para silagens de milho valores abaixo de 4-5% são desejáveis, e para pastagens buscamos valores abaixo de 8-9%. Teores de energia Outros parâmetros que são igualmente importan-

tes, mas que até bem pouco tempo eram praticamente ignorados por muitos nutricionistas, são as digestibilidades da FDN e dos carboidratos não fibrosos (CNF), principalmente do amido. Esses parâmetros têm um impacto profundo sobre o desempenho animal. Como a digestibilidade da FDN é mais baixa que dos CNF, normalmente o teor de FDN de uma ração ou alimento é inversamente proporcional a seu teor de energia. A composição da FDN (participação da celulose, hemicelulose e lignina) afeta sua digestibilidade, de forma que rações ou alimentos com o teor de FDN semelhante podem ter teores de energia diferentes. Por exemplo, uma forragem com 5% de lignina e 60% de FDN é mais digestível que outra forragem que tenha os mesmos 60% de FDN, mas 10% de lignina. Esse é mais um exemplo de quão imprescindível é conhecer detalhadamente a composição dos alimentos. Hoje já temos laboratórios no Brasil altamente capacitados para nos fornecer informações bastante precisas sobre esses parâmetros, e cada vez mais eu tenho usado essas informações no meu dia a dia profissional. Uma dificuldade que enfrentamos ao avaliar a digestibilidade dos CHO é a variabilidade nas técnicas de análise. Várias técnicas in vitro são utilizadas para essas determinações, com diferentes tempos de incubação (24, 30 ou 48 horas), que resultam em valores diferentes, de forma que é preciso cuidado ao interpretar os resultados, mas eu recomendo enfaticamente que os valores da digestibilidade das forragens sejam considerados nas formulações. Em resumo, para formular dietas de forma eficiente e consistente, é imprescindível conhecer a composição dos alimentos com que se trabalha. Já perdi a conta de quantas vezes repeti essa frase, mas infelizmente ainda me deparo com situações em que nutricionistas se arriscam a formular no escuro. O custo de uma análise bromatológica completa é irrisório quando comparado ao custo total dos alimentos e ao benefício que essa informação gera. Não há justificativa para não adotar essa prática como rotina nas fazendas.

O maior desafio dos nutricionistas, para que possam formular corretamente as dietas, é conhecer, de fato, a composição dos alimentos que vão utilizar.

MUITO MAIS LEITE. COM MAIS QUALIDADE.

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Capítulo 2 Corrida de obstáculos

Fotos Sérgio de Oliveira

A expressão “órfãos das usinas” tem sido cada vez mais usada nas regiões canavieiras do país. Serve para designar aqueles proprietários de terras que tinham contratos de arrendamento com as usinas e que, de uns anos para cá, pela crise do setor sucroenergético, tiveram os contratos encerrados e têm de se haver com o pedaço de terra. Este é o caso do nosso Produtor Secreto. O contrato com a usina termina agora em dezembro. Como já lidava com vacas de leite em parte da fazenda e contava com o básico em equipamentos e instalações, ele optou por profissionalizar-se na pecuária leiteira. A rebrota do canavial lhe garante comida para as vacas na próxima seca. Em julho deste ano ele deu início, sob orientação de um técnico especializado, ao processo de formação de um sistema intensivo de produção a pasto, que supõe pastejo rotacionado com alta lotação em pequena área.

4a Visita 5/10/17

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Vida dura a de pequen produtor

o momento. • Problemas surgem a tod o serviço de e u A roda do trator quebro ação do form a par preparo do terreno a de cana usin A o. pid rrom pasto foi inte icial e não entrou em recuperação jud promissos do com os deve honrar tão cedo nsais estão me os ent am contrato. Os pag 7 e, com 201 de eiro jan de des atrasados o que rinh a recuperação, aquele dinhei e demais em tag pas da ajudaria na formação s sabe Deu a par u fico ia -a-d despesas do dia ,o rno sto o o tran quando. Não bastasse tod do oga adv ar trat produtor ainda tem de con para tentar receber.

ruim

ia serviço de com trator para terminar o ário cion fun um u - e não • O vizinho mando ado form hectare onde o pasto será nivelamento no talhão de 1,6 cobrou nada por isso. da venda de uma a semente e o adubo veio • O dinheiro para comprar para os planos no rebanho, sem serventia novilha anelorada que estava dutor. de profissionalização do pro

Mas nem tudo foi notíc

A revista Mundo do Leite e seus parceiros estão proporcionando assistência técnica especializada a um produtor de leite com o propósito de mostrar que a atividade é rentável quando gerida de forma profissional. Acompanhe o passo a passo deste projeto pioneiro e inovador nas páginas da revista e no Portal DBO. Inspire-se!

paro • O produtor fez todo o pre das io iníc o ndo do solo, espera e eno terr o ear sem a chuvas par que im cap o o chã do tar bro ver ema é a base sobre a qual o sist ida com a , eiro se constrói. Prim as. para as vac


5a Visita 7/11/17

• Como sempre, encontram os o almoço à nossa espera e um monte de assunto para conversar. • Algumas novilhas pariram e a produção diária de leite voltou a subir, depois de um declínio entre agosto e setembro. Em outubro, a pro dução foi de 1.826 litros, ou 58,9 litros/dia. Com algum a suplementação, duas ou três novilhas exibem bom potencial de produção. • Morreu uma bezerrinha de poucos dias sem que aprese ntasse nenhum sintoma de doença até cair fulmina da por não se sabe o quê.

• Esta era a imagem mais expressiva daquele dia: o mombaçinha começando a brotar. A chuva não tinha dado as caras com a frequência desejada, mas o tempo encoberto dava esperanças ao produtor.

Recomendações do técnico:

• Passar herbicida para folhas largas para combater a emergência de pragas no pasto. • Replantar alguns trechos que eventualmente não apresentem boa formação. • Preparar estacas para marcar as divisões dos piquetes na visita de dezembro. • Verificar se já estão disponíveis os reagentes para os exames de brucelose e tuberculose e realizá-los.

Realização

Apoio

Patrocínio


Instalações

O valor dos dejetos

Fotos Sérgio de Oliveira

Com um biodigestor, fazenda de pecuária leiteira gera até 60% da energia que consome e quase dobra produtividade das lavouras

Tanques recebem 50 mil litros/ dia de dejetos que alimentam o biodigestor (ao fundo)

E

Sérgio de Oliveira

nquanto dirige por estradinhas vicinais do município de Carambeí, PR, um dos mais importantes e avançados polos de pecuária leiteira do país, Roderik Wouter van der Meer – ou Rik, como é conhecido o jovem de origem holandesa - conta como evoluiu a parceria familiar que culminou na Fazenda Vale do Jotuva, uma referência em produção de leite, grãos e gestão ambiental na região. Seu pai, Johannes van der Meer, e o cunhado Jacob Vink uniram terras, forças e habilidades, 45 anos

O começo de tudo: as fezes e urina das vacas são...

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atrás, para formar a propriedade, hoje administrada em sociedade por Rik, 30 anos, e dois primos, os irmãos Robin e Peter Vink, filhos de Jacob. Logo na entrada da fazenda, na parte mais alta do terreno, encontram-se silos bunker e silos-bag, galpão para guardar pré-secados, rações e minerais e um edifício que abriga a sala de ordenha duplo 20, dois tanques de armazenamento, escritório e instalações para funcionários. Alguns metros adiante ficam os barracões onde estão confinadas as vacas em lactação, distribuídas em várias alas de free stall e 1 compost barn. No free stall elas são agrupadas por nível de produção: quem produz mais recebe uma dieta mais reforçada em energia e minerais. No compost barn ficam as vacas primíparas ou com algum problema de locomoção. A uns 200 metros vê-se outro barracão, onde vacas no pré-parto e novilhas estão confinadas. Vacas secas ficam no pasto; as bezerras, em sistema de semiconfinamento. Numa depressão do terreno vê-se um imenso biodigestor e alguns tanques cheios de um líquido escuro. É ali, no processamento dos cerca de 50 mil litros/dia de dejetos produzidos pelos animais confinados, que está o que Rik considera o grande diferencial da fazenda. Com capacidade para 2 milhões de litros, o biodigestor provê 40% da energia gasta na propriedade - um outro gerador foi instalado após nossa visita para elevar a produção de energia própria para 60%. “A ideia do biodigestor veio pela necessidade de que parte da energia fosse gerada na propriedade. Por ser um local afastado, a rede elétrica

canalizadas para um grande tanque, e a seguir bombeadas até...


não suporta toda a demanda. Nos horários de pico precisaríamos de algum gerador. Além disso, há o aspecto ambientalmente correto e sustentável”, diz Rik. Antes de chegar ao biodigestor, as fezes, urina e água de limpeza retiradas do free stall pelo movimento constante do scraper (rodo mecânico) são canalizadas até um tanque menor. Dali, passam por um equipamento de separação dos sólidos, o que gera uma torta – 15 a 20 metros cúbicos/dia - que é distribuída nas lavouras, a cada três anos (10 m³/ha). A torta tem composição equivalente a 3,5,5 de NPK. Só então o líquido resultante, que passa ainda por um tanque de decantação para sedimentação da areia, vai para o biodigestor. Após a fermentação e liberação do metano que segue para os geradores, o líquido remanescente fica armazenado em uma lagoa de contenção com capacidade para 15 milhões de litros e é utilizado na fertirrigação das lavouras (150.000 litros por hectare, três vezes ao ano). Rik explica que faz adubação química nas plantações, e que os efluentes do biodigestor servem para enriquecer o terreno com matéria orgânica, uma vez que o solo, segundo ele, é extremamente pobre. A combinação adubação convencional/fertirrigação tem contribuído para aumentar a produtividade das lavouras: este ano, por exemplo, foram colhidos 5.800 kg de soja por hectare, quase o dobro da média nacional e bem acima da média paranaense, de 3.600 kg. A melhoria do solo também ajuda nas outras culturas: nesta safra, o azevém deu três cortes, aumentando o volume de pré-secado da forrageira.

Rik mostra que na fazenda a gestão é a alma do negócio

Engrenagem O movimento de máquinas e funcionários na fazenda é contínuo. Dezoito funcionários atuam na pecuária, em dois turnos, e cinco na agricultura. Rik explica como funciona a organização das tarefas: ele é responsável pela produção agrícola; o primo Robin cuida da produção de leite; e Peter cuida para que tudo funcione à perfeição - é o responsável pela manutenção das instalações, máquinas e equipamentos, tanto da pecuária leiteira como da agricultura.

A gestão é facilitada pelos vários painéis de verificação de atividades espalhados pelos corredores e no escritório, trazidos por Robin após ter concluído o curso de MDA da Clínica do Leite, da Esalq. Ali, são anotadas todas as ocorrências da fazenda. Os funcionários reúnem-se diariamente para preencher os campos de controle e discutir as atividades. Na falta de um, o outro saberá exatamente o que fazer. Assim também com os três sócios: Robin, por exemplo, estava no Rock in Rio por ocasião de nossa visita, mas Rik sabia exatamente o que fazer para que a produção de leite seguisse sua rotina. Rotina que, no entanto, deve ser alterada em breve. Os primos já projetam a ampliação do negócio. Está nos planos a construção de mais um free stall para elevar o número de vacas em lactação para 950 e atingir a produção de 40 mil litros/dia. Para aumentar a produtividade, pretendem usar sêmen sexado na cabeceira do rebanho, puxando ainda mais a qualidade genética.Também pensam em vender parte do material sólido resultante da separação dos dejetos como adubo orgânico e instalar um filtro para separação do enxofre, que também será comercializado. Mais adiante, querem instalar painéis solares na cobertura dos barracões para tornar a propriedade auto-suficiente em geração de energia. “A pecuária tem um potencial imenso de produzir energia, falta crédito específico para isso”, conclui Rik.

o separador de sólidos. O líquido segue para o biodigestor e...

após a liberação do biogás, é distribuído nas lavouras

Total de animais: 1.100 Vacas em lactação: 530 Produção diária: 19 mil litros de leite Produção média: 36 litros/vaca/dia. Ordenhas: três Atividade agrícola: 670 hectares de lavoura Verão: soja, milho para silagem, feijão e sorgo. Inverno: aveia preta, aveia branca e azevém para fazer présecado.

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Cooperativas

Este time está ganhando

Raio X

Cooperativa Agropecuária Vale do Rio Doce Sede: Governador Valadares, MG Fundação: 1957 Atividade principal: Laticínios Número de associados: 1.300, todos produtores de leite Volume captação de leite em 2016: 90 milhões de litros Captação de leite mensal: 300 mil litros Estrutura: laticínio em Governador Valadares Produtos: Leite UHT Integral, Semi-desnatado e Desnatado Bebida Lactea Achocolatado Bebida achocolatada Vitamina de frutas Vitamina de Morango Creme de Leite Área de abrangência: 58 municípios do leste de MG Mercados: Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia

Guilherme Olinto, presidente

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E

m uma região onde se concentram grandes laticínios e a disputa por fornecedores de leite é acirrada, a Cooperativa Agropecuária Vale do Rio Doce encontrou uma saída bastante eficiente para garantir o abastecimento regular e de qualidade da matéria-prima. Situada no leste de Minas Gerais, em Governador Valadares, a cooperativa preferiu, em vez de sair “à caça” de novos fornecedores, numa estratégia predatória, apostar no seu próprio time, aumentando a capacitação dos produtores e contribuindo para melhorar a genética, a nutrição e a sanidade do rebanho de seus associados. O resultado desse trabalho conjunto, que conta, além da disposição dos produtores, com a parceria de empresas e técnicos externos e de dois engenheiros agrônomos e dois médicos veterinários ligados à entidade, foi o aumento de 30% na captação diária de leite, com o mesmo número de fornecedores, num período de cinco anos. Além disso, 100% da matéria-prima entregue à cooperativa atende aos requisitos mínimos da Instrução Normativa 62, que impõe os parâmetros adequados para que o leite seja considerado de qualidade. Estratégias Quem conta essa história à Mundo do Leite é o presidente da cooperativa, Guilherme Olinto Abreu Lima Resende. “Há pelo menos 30 anos investimos na capacitação. A cooperativa é dividida em 36 núcleos regionais, onde os produtores se reúnem periodicamente, para discutir problemas e debater soluções”, diz Olinto. “A partir daí traçamos estratégias, com base nas necessidades dos cooperados.” Ele comenta que o programa que mais tem dado resultados é feito em parceria com a In Vitro Brasil, empresa ligada à reprodução animal, que promove a melhoria genética do rebanho dos cooperados por meio da técnica de transferência de embriões. “O produtor adquire o embrião, fruto de cruzamento com touro melhorador da raça Holandesa com fêmea Girolando pura”, explica, acrescentando que o preço é praticamente o de custo e o produtor pode pagar o valor em parcelas, descontadas no fornecimento do leite. “Essa iniciativa tem comprovado que, ao conseguir um rebanho de melhor padrão, automaticamente o pecuarista parte para outras melhorias na propriedade, como gestão, nutrição e sanidade”, diz Olinto.

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Para orientar o produtor nesse impulso de investir em melhorias, a cooperativa promove rotineiramente workshops, palestras e dias de campo, com apoio do Projeto Educampo Sebrae e do Projeto Balde Cheio, além, é claro, da valiosa ajuda dos profissionais da cooperativa. “Recentemente tivemos uma palestra do dr. Christiano Nascif, do Educampo, sobre gestão, outro ponto importantíssimo para a propriedade leiteira”, comenta Olinto. Ele acrescenta, ainda, que mais uma empresa, a MSD Saúde Animal, tem parcerias com a cooperativa nesse segmento. Outra forma de apoio é a venda de insumos, como medicamentos, adubos, agroquímicos e ração, a preço de custo. Sobre este assunto, Olinto comenta outra estratégia adotada pela cooperativa e que também é de valiosa ajuda: “Se o preço do litro de leite cai, o dos insumos também cai, só que dentro de um limite, é claro”. Ainda sobre o preço do leite, ele informa que a cooperativa tem por praxe pagar um adicional máximo de R$ 0,15 por litro de leite que atenda a padrões específicos de qualidade. Obstáculos Com tal aparato à disposição do cooperado, Olinto comenta que são principalmente os pequenos e médios produtores, de até 400 litros/dia e que representam cerca de 70% dos cooperados, os que mais se beneficiam dessas políticas. “É mais fácil um produtor saltar de 400 litros para 1.000 litros/ dia do que um outro, de maior porte, sair de 1.000 para 2 mil litros/dia”, compara. De todo modo, o presidente da Cooperativa Agropecuária Vale do Rio Doce reforça que produtores de todos os portes, indistintamente, são atendidos pela entidade. Embora a cooperativa prime por fazer um bom trabalho da porteira para dentro, Olinto lembra de sérios obstáculos encontrados do lado de fora. Um dos mais recentes foi a tragédia do rompimento de uma barragem de rejeitos da mineradora Samarco, há dois anos, que poluiu as águas do Vale do Rio Doce, área de abrangência da cooperativa. Olinto conta que cooperados que têm propriedade às margens do rio foram seriamente afetados. Ele diz que, atualmente, a qualidade das águas melhorou, “mas não totalmente”. Observa, também, que até o momento a Samarco não indenizou apropriadamente a população afetada.


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Seguindo em Frente Ismail Ramalho Haddade

Vaca leiteira ou mulher de malandro?

I O ato de provocar dor para endireitar, persuadir ou direcionar a algo que se queira é uma reação humana comum”

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magine-se no lugar de uma vaca, tendo que ser eficiente na produção de leite em um ambiente estranho, onde haja o medo por não saber a hora em que será agredida, receberá uma agulhada, ou mesmo quando será atacada pelo predador que se encontra à sua volta. Sim, estamos falando da convivência com o seu manejador. Nesta convivência, cabe-nos “vestir a carapuça” em relação à forma de agir: será que essa atitude não se parece com a de um predador? Quando, no contato com o animal, se aposta na dor ou no medo, não há dúvida de que a reação desfavorável seja previsível. É como se eu jogasse uma bola na parede e ela voltasse contra o meu rosto. A intensidade é a mesma, no entanto, o sentido é contrário. Diante disso, mais dúvidas: Quem são os bravos nessa história, a vaca ou o manejador? O que falta para uma boa convivência entre eles? Talvez faltem coisas simples como paciência, calma, melhor entendimento de como a vaca percebe o ambiente, além do investimento de tempo e de boa convivência para que ela se adapte aos novos ambientes. Ou você acha, por exemplo, que para uma novilha a sala de ordenha é igual ao seu ambiente na pastagem? Certamente há de concordar que estes são lugares muito diferentes entre si, tanto para nós quanto para os animais. E queremos que os animais se adaptem ao novo lugar num passe de mágica. Não tenho como demonstrar a reação de um manejador diante dessa situação, mas posso exemplificar por meio de frases comuns utilizadas nesses momentos: - ENTRA DESGRAÇA! ANIMAL DOS INFERNOS! E por aí vai... O ato de provocar dor para endireitar, persuadir ou direcionar a algo que se queira é uma reação humana comum. Principalmente quando não se conhece “o que fazer”, “como fazer”, além de faltar o gosto e a habilidade para desempenhar uma tarefa. É como se nessas situações acendesse uma luz com os dizeres: “Desce a mão que funciona!” Quem nessa vida já não tentou consertar alguma coisa dando uma “pancada” na esperança de que voltasse a funcionar? Sempre que impera a falta de orientação e de treinamento, o uso intencional da força física poderá ser comum e, muitas vezes, visto como

Mundo do Leite – dez/2017-jan/2018

normal, não se percebendo o estresse causado aos indivíduos que dividem o mesmo ambiente. A partir disso, outra pergunta: Qual a importância que se dá ao treinamento das pessoas que praticam a atividade pecuária? A resposta para a grande maioria das situações: Muito pouca ou nenhuma. Aprender sobre os bovinos se torna muito importante, principalmente porque esses animais apresentam muitas diferenças em sua forma de perceber o ambiente, quando comparados aos humanos. Dentre essas diferenças, a dificuldade do bovino em perceber a profundidade de objetos (não possui uma visão frontal como a nossa). Portanto, uma simples sombra, para a vaca, pode ser confundida com um buraco sem fim (muitas vezes, o ato de um bovino baixar a cabeça não é porque ele vai avançar contra você. É para posicionar os olhos e melhor perceber o que está a sua frente). Outra coisa interessante é o fato desse animal ter sensibilidade bem maior que a nossa para os sons agudos (de alta frequência), como o da batida forte de uma porteira de metal ao seu lado (se o susto às vezes é grande para você, imagina para as vacas!). Outra questão é seu olfato mais apurado, sendo capaz de associá-lo ao ambiente estressante. De maneira geral, as vacas não identificam detalhes como o rosto de uma pessoa, porém são muito reativas a lugares, a vozes, a cheiros e, principalmente, a objetos (como aquele “garruchão” pontiagudo que se costuma usar pra fazê-las entrar na sala de ordenha). Muitos estudos são conduzidos para monitorar detalhes comportamentais ligados ao estresse das vacas. Isto, para diagnosticar e amenizar até as situações normais de seus estresses fisiológicos, tendo em vista a comprovada importância do bem-estar na eficiência produtiva da vaca leiteira. Enquanto isso, o que se vê ainda, em muitas propriedades, é o cenário de total desconhecimento e de violência no ato de lidar com as vacas... Engenheiro agrônomo, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo, campus de Santa Teresa



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