Retrospectiva 2018: Revista Agro DBO (pág.32 - ed.101)

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Solo

Plantas indicadoras A percepção humana da Dra. Ana Primavesi, em observação da natureza, indica que as plantas “falam” sobre a sua existência.

Cravo-de-defunto (Tagetes erecta): Indica nematoides que ele consegue matar com suas excreções radiculares

A

* o autor é engenheiro agrônomo e pesquisador aposentado da Embrapa, doutor em Solos e Nutrição Vegetal.

caba de ser relançado um livro de Ana Primavesi, sobre uma ferramenta técnica para identificar, de modo visual, se está ocorrendo algum manejo deficiente do solo, para se alcançar produtividade contínua e sustentável da cultura econômica; a interpretação da ocorrência de “Algumas plantas indicadoras: como reconhecer os problemas de um solo”. Este texto, embora tenha sido escrito inicialmente nos anos 60 e 70, relançado de forma ampliada em 2004, para identificar problemas de solo em pastagens naturais e lavouras conduzidas de maneira tradicional, no início da revolução verde, também tem sua validade atualmente, na agricultura conservacionista, agricultura de precisão ou digital, desde que se utilize solo como substrato, em sistemas de agricultura familiar ou em agricultura de escala.

32 | Agro DBO – julho 2018

JOÃO MEDEIROS/CC-BY 2.0

FOREST & KIM STARR/CC-BY-3.0

PSUMUSEUM/CC-BY-SA 4.0

Odo Primavesi *

Amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla): deficiência de molibdênio

Joá-bravo (Solanum palinacanthum e S.viarum): deficiência de cobre

Assim como a identificação visual de deficiências agudas de nutrientes nas folhas de plantas (texto relançado: Deficiências minerais e culturas, junto com “A Biocenose do solo na produção vegetal”), e que posteriormente podem ser confirmadas de maneira mais exata por análises de solo ou foliar, a identificação da ocorrência de plantas indicadoras pode ser um procedimento rápido para tomada de decisões. Tem-se notícia de as plantas indicadoras serem as próprias culturas de valor econômico, como a de cevada que produzia bem em áreas de plantio de trigo, degradadas pela salinização por causa do processo de irrigação no tempo dos babilônios, no Oriente Médio. Conhece-se a escada decrescente de exigência de forrageiras, iniciando pelo napier e colonião (com necessidade saturação por bases em torno de 60%), caindo para braquiária (com

saturação por bases em torno de 40%), capim gordura, e finalmente sapé e samambaia (condições ácidas e álicas), indicando o grau de fertilidade do solo ou seu pH (grau de acidez). Assim, além do grau de fertilidade, as plantas indicadoras podem apontar a deficiência de algum nutriente essencial, por carência real (como de boro, por falta de matéria orgânica) ou induzida (por adubação unilateral de algum nutriente, como de cobre, por excesso de N, ou de manganês por excesso de calagem, ou de zinco por excesso de fósforo). Assim, a deficiência de micronutrientes e também de magnésio e de enxofre pode ser induzida por aplicações unilaterais de NPK e calagem. Esses problemas podem ser mais comuns em nossas condições onde os solos, por natureza mais antigos e lixiviados (exceto os de altitude e os da região árida do nordeste), e


ODO PRIMAVESI

PICCOLONAMEK/RASBAK/CC-BY-SA 3.0 CC-BY-SA 3.0

Corda-de-viola (Ipomoea purpurea): demonstra baixo teor de K e relação K/B (entre 50 a 100)

que tinha a vantagem de romper o encrostamento superficial (permitindo a entrada de água das chuvas e de ar; o que os herbicidas não fazem), e atualmente pelo controle químico que vem resultando na resistência às moléculas mais utilizadas e eficazes inicialmente. Procurando-se pelas características ecofisiológicas de cada uma das invasoras resistentes a herbicidas, encontram-se alternativas de mane-

to ou de compactação superficial e subsuperficial, neste caso limitando ainda o desenvolvimento radicular (o intestino e os pulmões das plantas) em profundidade. As plantas indicadoras em geral são nativas ecótipos, mais adaptadas às condições do solo natural, podem transformar-se em plantas chamadas invasoras, que antigamente se combatia com o cultivo mecânico ou escarificação do solo, J. M. GARG/CC-BY 3.0

HUGO.ARG/GFDL

Picão-branco (Galinsoga parviflora): nitrogênio em relação a cobre, e falta de cálcio em solo arenoso

Caruru (Amaranthus viridis): presença de matéria orgânica (e boro)

“Algumas plantas são indicadoras de como reconhecer os problemas de um solo”.

CWMHIRAETH/CC-BY-SA 4.0

os arenosos, apresentam deficiência multielementar, agravado pela deficiência de matéria orgânica no solo (que provê o solo com nutrientes e com cargas elétricas que podem reter os cátions, ou com quelados, que facilitam a absorção pelas plantas). As deficiências específicas de nutrientes também podem ser geradas ou agravadas por monocultivos (plantas são especializadas em extrair determinados nutrientes, que depois vão faltar para o mesmo cultivo seguinte, como falta de cálcio e de magnésio e excesso de potássio após soja, com CTC de raiz maior; condição melhor para gramíneas, com CTC de raiz menor, mais especializadas em absorver potássio; assim, as rotações de cultivos evitam excessos e deficiências extremas, e que prejudicariam os cultivos comerciais, beneficiando assim as invasoras). As plantas indicadoras também revelam a presença ou não de matéria orgânica, essencial para elevadas produtividades e maior eficácia dos insumos aplicados, bem como condições de aeração (oxigênio) do solo, importante para o aproveitamento adequado da energia disponível, e que pode ser limitada por má drenagem ou água estagnada continuamente ou periodicamente, ou por condições de adensamen-

Nabiça (Raphanus raphanistrum): indica deficiência em boro e manganês

Carrapicho-de-carneiro (Acanthospermum hispidum): indicam baixos teores de cálcio

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ODO PRIMAVESI

RASBAK/CC-BY-SA 3.0

ODO PRIMAVESI

Solo

Humidícola (Brachiaria humidicola): indicam baixos teores de cálcio

Capim amargoso (Digitaria insularis): indica erosão subterrânea, com água estagnada após chuvas

jo ambiental similares aos que os textos de Ana Primavesi, sobre plantas indicadoras, que originalmente era um capítulo da Cartilha do solo, ou melhor, “Manual do solo vivo”, recomendam para o manejo adequado do solo, para ser vivo e mais eficiente nos processos envolvidos de produção agrícola. São práticas conservacionistas, práticas de revitalização do solo com vida (micro, meso e macro) diversificada e de seus resíduos, além da diversificação preconizada de moléculas herbicidas. Desta forma, confirma-se que o dilema da resistência de invasoras poderia ser amenizado e mesmo eliminado se o produtor rural tivesse paciência e uma visão mais integrada e de longo prazo do manejo adequado de seu sistema de produção.

Excesso de minerais e deficiência induzida: samambaia (Alumínio em relação a cálcio); picão branco (nitrogênio em relação a cobre, e falta de cálcio em solo arenoso); nabiça indica deficiência em boro e manganês; braquiária humidícola e carrapicho-de-carneiro indicam baixos teores de cálcio; corda de viola demonstra baixo teor de K e relação K/B (entre 50 a 100); capim-colchão revela baixo teor em potássio, joá bravo a deficiência de cobre; caruru indica presença de matéria orgânica (N e B).

No caso de compactação ou adensamento de solo aparece guanxuma, grama-seda, capim-carrapicho. Em solos adensados e secos: capim-favorito. Indica solo lavrado recentemente: capim-marmelada. Recomenda-se: rotação de culturas (diversificação de culturas); uso de plantas de cobertura; cobertura permanente do solo (4 a 6 cm de espessura com resíduos de gramíneas, ou 8 a 12 t/ha; para abafar a sementeira e evitar aquecimento do solo ou seu ressecamento superficial), além da rotação e diversidade de mecanismos de ação de herbicidas; manejo de plantas daninhas na entressafra; e outras. Certamente a nutrição adequada da cultura econômica para que tenha um sistema radicular saudável e vigoroso e para ter desenvolvimento rápido é desejável. O sistema Plantio direto na palha, com rotação de culturas ou culturas de cobertura, seriam os manejos mais exitosos, podendo estar embutida a Integração Lavoura Pecuária, ou Integração Lavoura Pecuária-Floresta. O livro “Algumas plantas indicadoras: como reconhecer os problemas de um solo” foi reeditado pela Editora Expressão em 2017 – mais informações no site www. expressãopopular.com.br

Para exemplificar Picão preto (Bidens pilosa): indica presença de matéria orgânica; leiteiro ou amendoim-bravo (Euphorbia heterophylla): deficiência de molibdênio; Capim-amargoso (Digitaria insularis): indica erosão subterrânea, com água estagnada após chuva; Capim-pé-de-galinha (Eleusine indica): solos adensados, embora férteis; Caruru (Amaranthus palmeri): indica presença de matéria orgânica (e boro). 34 | Agro DBO – julho 2018

FOREST & KIM STARR/CC-BY 3.0

Capim-colchão (Digitaria sanguinalis): revela baixo teor em potássio

Capim-pé-de-galinha (Eleusine indica): solos adensados, embora férteis


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