Retrospectiva 2018: Revista Mundo do Leite (pág.34 - ed.90)

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Seguindo em Frente Ismail Ramalho Haddade

Você conversa com suas vacas todos os dias?

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Devemos estar prontos para ouvi-las e respondêlas o quanto antes (a resposta, no caso, seria a correção do que seja necessário para melhor atendê-las)”

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procura por “respostas mágicas” que facilitem o planejamento e a condução da atividade leiteira é uma ação comum por parte de muitos produtores e técnicos. É como se estas respostas fossem únicas, independente das diferenças entre cada região ou propriedade envolvida no processo produtivo. Nos tempos de universidade, esta era uma das expectativas quando participávamos de Congressos ou de Simpósios na área de produção animal: a de que obteríamos “respostas únicas” que pudessem ser usadas sempre, sem que fosse necessário analisar a situação para o seu uso. Dentre os muitos exemplos, queríamos saber sobre: o número de animais que caberiam em cada hectare de pastagem; a distância mais adequada entre a área de sombra e a área de pasto; a quantidade e o tamanho dos bebedouros que deveriam ser instalados em cada área; a quantidade de ração concentrada que cada vaca deveria consumir conforme a sua produção; a quantidade de adubo que deveríamos colocar por piquete; e por aí vai... Especificamente em um desses Simpósios, com palestrantes de diversas regiões do Brasil, chamou minha atenção o fato de que, em duas palestras realizadas no mesmo dia, alguns dos valores citados como referência divergiam de maneira impressionante. É claro, devo ressaltar aqui, que nenhum dos palestrantes devia estar equivocado em suas colocações. O erro, ou talvez a inocência, era tratarmos, como iguais, tipos de sistemas, propriedades, ou mesmo regiões com características extremamente diferentes. Partindo deste ponto, destaco uma frase de Artur Chinelato de Camargo (pesquisador da Embrapa) que demonstra uma boa maneira de percebermos quais seriam as melhores respostas diante de situações individuais observadas em cada propriedade, manejo ou sistema produtivo: “O que vocês precisam é conversar mais com as suas vacas”. Um dia desses, lembrei-me imediatamente desta frase ao falar da importância dos padrões de comportamento dos animais de pro-

Mundo do Leite – abr/mai 2018

dução para um grupo de estudantes de Zootecnia. “Mas como é possível conversar com as vacas?”, perguntou um dos alunos. A ideia é que grande parte das informações que precisamos para entender o que seja necessário para melhorar o manejo ou corrigir falhas na infraestrutura do sistema passa pelo reconhecimento do que seja normal nas sequências de movimentos, nas posturas, nas mudanças de aparência, ou, mesmo, nas diferenças produtivas dos animais (controles leiteiros, parições, coberturas, etc). Como exemplo de padrão comportamental em condição de conforto pleno (elevada disponibilidade de forragem, distância adequada entre a área de sombra com bebedouro e a pastagem, corredores bem dimensionados, ausência de lama, dentre outros), o esperado seria a permanência das vacas no piquete por períodos em torno de 50 minutos após o início do pastoreio no final da tarde, até que se deslocassem em busca de água. Partindo-se desta informação, que pode ser flexível diante de cada situação, a permanência das vacas por mais ou por menos tempo do que o habitual, ou o menor trânsito pelos corredores, significará que elas desejam nos dizer algo. Devemos estar prontos para ouvi-las e respondê-las o quanto antes (a resposta, no caso, seria a correção do que seja necessário para melhor atendê-las). Assim, vamos criando as nossas próprias respostas para cada condição estabelecida. E, à medida que observamos mais as nossas vacas, mais rápido e melhor vamos percebendo o que elas querem nos dizer. Com esse pequeno texto, a forma mais oportuna de finalizarmos é afirmando que, quanto maior e melhor seja o diálogo, mais eficiente será a comunicação. Portanto, fica a pergunta: você tem conversado todos os dias com as suas vacas? Engenheiro agrônomo, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo, campus de Santa Teresa


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