Retrospectiva 2018: Revista DBO (pág.52- ed.452)

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Eventos

ESPECIAL

SUPLEMENTAÇÃO

Boi 7-7-7: a equação que turbinou a pecuária Conceito criado pelos pesquisadores Flávio Dutra e Gustavo Resende, da Apta-Colina, tem feito diferença no campo ao criar diretrizes de produtividade para produtores. Maristela Franco

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ete anos após ter sido “batizado” de Boi 7-7-7, pelos pesquisadores Flávio Dutra Resende e Gustavo Siqueira Rezende, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta), unidade de Colina, SP, o conceito técnico mais famoso do Brasil continua colecionando adeptos e plantando metas onde havia apenas “desejos” de intensificação. Seu diferencial está na objetividade. O Boi 7-7-7 forneceu diretrizes aos pecuaristas: produzir 7@ na cria (até os oito meses de idade), mais 7@ na recria em no máximo 12 meses e outras 7@ em 100120 dias de engorda. Não são números aleatórios. Os três “7s” foram referendados por pesquisas científicas. Trabalhos conduzidos por Flávio e Gustavo confirmaram ser perfeitamente possível produzir 7@ em cada fase da vida do animal, ao invés de seis como eles haviam pensado anteriormente. “Se a pesquisa mostrava isso, por que não lançar a ideia aos produtores?”, salienta Gustavo. Dizem especialistas que as metas devem ser, ao mesmo tempo, exequíveis e desafiadoras, para motivar quem as persegue. Os pesquisadores da Apta acertaram no alvo. Para alcançar os três “7s” e produzir novilhos de 21@ aos 22-24 meses, é preciso reestruturar todo o sistema de produção, quebrar paradigmas e investir em tecnologias. A proposta é motivadora, pois tira a pecuária da inércia, elevando seus índices de produtividade e até sua “autoestima”. Pela contribuição que tem dado ao setor, o Boi 7-7-7 foi escolhido (merecidamente), para abrir o Especial de Suplementação de DBO neste ano. Trata-se também de uma homenagem a seus idealizadores e “garotos-propaganda”. Os pesquisadores Flávio Dutra e Gustavo Rezende têm percorrido o País inteiro, orientando os produtores interessados na produção deste “novo boi” brasileiro: mais jovem, pesado e bem acabado, como anseiam as indústrias (veja reportagem à pág 46).

flávio semilha

Gustavo Rezende e Flávio Dutra: incansáveis “garotospropaganda” do Boi 7-7-7

maristela@revistadbo.com.br

Trajetória do conceito Zootecnista formado pela Universidade de Viçosa, MG, Flávio Dutra trabalha na Apta desde 1994. “Meu ca-


Sem “receita de bolo” “A partir daí o produtor passou a pensar mais na composição do ganho”, explica Gustavo, ressaltando que o conceito surgiu e foi lançado dentro do Projeto Pecuária do Conhecimento, uma série de cursos de dois dias para produtores e técnicos, desenvolvido pela Apta em parcei-

ra com a Phibro, a partir de 2011. Os produtores testavam as técnicas nas fazendas e nos traziam informações, que alimentavam nossas pesquisas. Em 2015, o Circuito Feicorte foi todo baseado no Boi 7-7-7, que ganhou maior visibilidade. As primeiras 7@ até os oito meses de idade não são fáceis de produzir: é preciso investir em genética, boas práticas reprodutivas, nutrição da vaca (bons pastos) e do bezerro (creep). Porém, o maior desafio do Boi 7-7-7 continua sendo ganhar 7@ na recria em um ano. Primeiro, porque isso exige bons pastos (calcanhar de Aquiles da pecuária); segundo, porque demanda infraestrutura e estratégias de suplementação adequada. A recria é a etapa mais longa da produção pecuária, podendo durar mais de dois anos em sistemas convencionais. Encurtá-la para 1012 meses permite giro rápido do gado, aumenta da lotação e a produtividade, mas é tarefa difícil, ainda mais carregando uma meta de 7@ (média de 580 g/cab/dia). Como nossos leitores poderão constatar nas páginas seguintes, cada fazenda desenvolveu estratégias específicas para enfrentar esse desafio, inclusive ajustando metas. Os “7s” do conceito não são obrigatórios, mas indicativos. Constituem pesos-referência, que, inclusive, já está sendo ultrapassados por alguns. “Tem produtor fazendo Boi 8-7-8 e até 8-8-8, o que é fantástico”, dizem os pesquisadores da Apta, “porque as metas não devem se cristalizar, mas avançar. Temos a opção de elevar o peso do animal, chegando a 23-24@ em 24 meses, ou fazer 21@ em menos tempo, desde que a conta feche”. Para quem ainda está produzindo bois de 18@ aos 36 meses, contudo, o Boi 7-7-7, pode ser uma meta transformadora.

No primeiro dia de campo da Apta-Colina, em 2011, do qual DBO participou, bases do conceito já estavam presentes.

Livro detalha conceito Lançado no dia 23 de maio, durante o Confinar, em Campo Grande, MS, com direito a seçao de autógrafos, o livro “Entendendo o conceito Boi 777”, editado pelos pesquisadores Flávio Dutra, Gustavo Rezende e Ivanna Moraes de Oliveira, da Apta-Colina, tem por objetivo detalhar as estratégias para se obter 7@ na cria, 7@ na recria e 7@ na engorda. São 254 páginas divididas em três capítulos, ricos em informações técnicas, tabelas e experiências de campo. O livro foi elaborado com a colaboração de mais de 50 pessoas. Custa R$ 100 e pode ser encomendado pelo telefone: (17) 3341-1332. A obra estará à venda durante o BeefDay, evento anual da Apta-Colina, que ocorrerá dia 15 agosto. Mais informações em www.facebook.com/beefday2018.

ariosto mesquita

minho foi meio torto: fiz mestrado em bovinocultura de corte, mas fui contratado para trabalhar com equinos em Colina”, brinca. Como havia um plantel leiteiro na unidade, Flávio foi puxando seus trabalhos para a pecuária e, depois, para o gado de corte. “As primeiras pesquisas que fizemos foram com boi orgânico, que estava em alta no início dos anos 2000. O protocolo desse tipo de produção era, entretanto, muito restritivo. Não podíamos usar grãos transgênicos, nem ureia. Isso dificultava nosso trabalho. Quando o projeto terminou, começamos as pesquisas com suplementação. Foi assim que tudo começou”, conta o pesquisador, hoje diretor da Apta-Colina. Seu companheiro, Gustavo Rezende, também é mineiro, de Conselheiro Lafaiete. Formou-se em zootecnia pela Universidade Federal de Lavras e estava fazendo mestrado na Unesp-Jaboticabal quando passou em um concurso na Apta, onde começou a trabalhar em 2005. “Sempre quis fazer pesquisa”, garante. Várias parcerias público-privadas, firmadas ao longo dos últimos anos, viabilizaram esse sonho. “Os primeiros trabalhos, em 2006, foram apoiados por Marcos Balsalobre, então presidente da Bellman (hoje Trouw Nutrition). Testamos três estratégias de suplementação na seca e três nas águas, terminando metade dos animais cruzados a pasto e metade em confinamento. Queríamos montar os caminhos de um boi mais produtivo”, diz. Após várias pesquisas, Flávio e Gustavo conseguiram gerar dados inéditos, que ajudaram a consolidar o conceito do Boi 7-7-7. “Descobrimos não somente que um bezerro desmamado com 210-220 kg ganhava facilmente 7@ na recria com suplementação, mas que também era possível terminá-lo a pasto em quatro meses, com concentrado no cocho”, lembra Flávio, referindo-se ao sistema de “confinamento expresso” desenvolvido na Apta e atualmente chamado de TIP (terminação intensiva a pasto). “Vimos que era possível produzir um boi de 21@ em 24 meses porque havia alta repetitividade de resultados nas pesquisas”, salienta. O TIP foi uma grande novidade: “Ninguém pensava em dar 8-10 kg de ração para bois a pasto”. Mais tarde, começaram a fazer abates para investigar a dinâmica da engorda e passamos a trabalhar não com GMD (ganho médio de diário), mas com ganho em carcaça, outra base teórica que deu lastro ao Boi 7-7-7.

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Meta dá “norte” às fazendas Projetos no Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Rondônia mostram que conceito do Boi 7-7-7 baliza decisões e estimula avanços tecnológicos Brasil afora. Ariosto Mesquita,

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de Bandeirantes, MS.

m 2015, o médico veterinário Gabriel Junqueira, hoje com 35 anos, foi convidado pelo sogro, o pecuarista Higino Hernandes Neto, a assumir a gestão da Fazenda Três Muchachas, que faz recria/engorda em Bandeirantes, 140 km ao norte de Campo Grande, MS. Era sua chance de colocar em prática as premissas do Boi 7-7-7, que ele conhecera em 2012, durante uma visita às instalações da Apta-Colina, SP, quando o conceito mal havia nascido. Era um grande desafio intensificar uma propriedade já organizada, “que caminhava com as próprias pernas”, como ele gosta de observar. Junqueira não de-

Gabriel Junqueira junto ao lote de “cabeceira” da fazenda, que atinge 21@ aos 19-20 meses.

cepcionou “Seu” Higino. Em três anos (2015/2017), a taxa de desfrute da propriedade passou de 40% para 80%, a lotação subiu de 0,81 para 1,7 UA/ha, a idade de abate caiu de 36 para 25 meses e o peso das carcaças, de 17 para 21@. Com isso, a produção saltou de 7,49 para 16,44@/ha/ano. A explicação para tamanho sucesso está nos investimentos feitos em infraestrutura e na adoção de tecnologias nutricionais adequadas, mas outra coisa fez total diferença: o estabelecimento de metas de ganho na recria, fase mais crítica da produção pecuária. O produtor, que trabalhou três anos com originação de gado e exportação de carne na JBS, explica que seu foco é produzir boas carcaças: “Apesar de conter metas-referência por etapa produtiva (7@

“Boi não gosta de pasto, gosta de folha”, lembra criador. Para acumular 7 @ na recria é imprescindível que haja boa oferta de massa forrageira o ano todo. A Fazenda Abacaxi, sediada no município de Pimenta Bueno, RO, não está sujeita aos longos períodos de estiagem que costumam castigar regiões do Brasil Central. Mesmo assim, o cuidado com o manejo da pastagem é redobrado no começo da estação seca, quando se dá início a essa etapa da criação. “Nosso maior desafio na primeira fase da recria é garantir reserva de capim. Boi não gosta de pasto, gosta de folha”, brinca o zootecnista Alexandre Foroni, que administra a propriedade com o pai, Euvaldo Foroni, e os irmãos, Daniel e Marco Antônio. A estratégia da

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fazenda, que faz ciclo completo e vende genética, é aliviar a taxa de lotação em maio, quando ainda há umidade no solo para a rebrota do pasto, retirando os bois magros da área para o primeiro giro do confinamento, feito em uma chácara próxima à cidade de Pimenta Bueno. Os garrotes Nelore recriados na Fazenda Abacaxi vêm de outra propriedade – a Bacuris – e são desmamados aos 7-8 meses, com peso médio de 230 kg. “Nossa meta é fazer os machos atingirem 420 kg em 12 meses, para estar prontos para o confinamento ou ser vendidos como tourinhos. Mas temos de lutar muito para conseguir”, admite. Até a última safra, a recria se iniciava com

suplementação proteica de 0,1% do peso vivo (PV), mas, a partir deste ano, a desmama receberá, no cocho, o equivalente a 0,2% do PV. “Queremos aumentar o percentual de machos que atingem as 7@ ao final da recria”, justifica. Em 2017, 40% dos bezerros atingiram 7@ ou mais, 41% ganharam entre 6 e 7@ e 19% ficaram abaixo de 6@. Na estratégia nutricional da fazenda, a proporção de suplemento fornecida é a mesma o ano todo, mas a composição do produto muda. “Nas águas trabalhamos com 2530% de proteína, enquanto, no pico da seca, chegamos a 45%”. A calibragem é feita mês a mês, de acordo com a consistência das fezes dos animais. “Se es-


tão muito secas, é sinal de que a digestibilidade está baixa e temos de corrigir, aumentando o teor de proteína”, ensina o zootecnista. Além da garrotada crioula, a propriedade recria animais de compra, que adquire nos meses de seca, principalmente entre agosto e setembro. Neste caso, o desafio é ainda maior. “Não é fácil encontrar bezerros com mais de 200 kg no mercado. Temos conseguido colocar entre 5,5 e 6@ nesses animais em 10 meses”, diz. Segundo o zootecnista, a fazenda pretende aumentar a suplementação na recria, dos atuais 0,1% para 0,2% do PV, para acelerar o ganho de peso da categoria. O novo plano nutricional, no entanto, depende de um ajuste na infraestrutura que muitas vezes os produto-

Animais entram no confinamento com 440 kg e são abatidos após 3,14 meses de engorda.

tejo rotativo. Em 2017, adubou mais 30% da área, estruturou outros dois módulos de rotacionado, elevou a capacidade do confinamento para 60% dos abates anuais (perto de 600 cabeças), construiu uma fábrica de rações e montou quatro módulos para terminação intensiva a pasto (TIP), seguindo orientação técnica da Apta. Cada módulo tem 10 ha e capacidade para alojar 400 animais. Com essa estrutura, Junqueira se sentiu seguro para seguir a “rota” do Boi 7-7-7, mas à sua maneira. Passou a engordar apenas bezerros mais pesados (média de 8 @), priorizando o gado próprio trazido de outra propriedade de “Seu” Higino, a Fazenda Baia Grande, que é especializada em cria e fica em Rio Verde, no Pantanal sul-mato-grossense. Hoje, 50% dos

renato villela

Investimentos Ainda em 2015 (seu primeiro ano na fazenda), Junqueira montou um confinamento com capacidade estática para 200 cabeças (400 em dois giros), o correspondente a 25% dos abates anuais da propriedade. Em 2016, ele investiu na adubação de 30% dos 1.300 ha de pastagens, formados principalmente com braquiarão. Além disso, construiu dois módulos de pas-

ariosto mesquita

na cria, 7@ na recria e 7@ na engorda), o conceito do Boi 7-7-7 não é estático. O importante é obter um produto final dentro do padrão pré-estabelecido, no nosso caso 21-22@ aos 24-25 meses. Quando o animal entre na fazenda mais pesado, pode ganhar menos arrobas na recria do que na engorda, por exemplo. As metas são ajustadas conforme o tipo de gado, os recursos da fazenda e as condições de mercado”, explica. Antes de intensificar a recria na Três Muchachas (nome que faz referência às três filhas de “Seu” Higino: Ana Maria, Ana Verena – esta casada com Junqueira – e Manuela), era preciso melhorar a infraestrutura e o manejo de pastagens, base do Boi 7-7-7. Até então, a propriedade trabalhava com lotação contínua. Nos cochos, apenas sal mineral. Somente alguns meses antes de Junqueira assumir a gestão dao negócio, os animais haviam passado a receber proteinado. “Para reposição, comprávamos bezerros (Nelore ou cruzados), que ficavam na fazenda por três anos, e bois magros, que lá permaneciam dois. Apenas os animais de cabeceira morriam aos 2,5 anos, com 525 kg e 53% de rendimento de carcaça, em média. A fazenda podia produzir mais, aumentar seu desfrute e abater bois mais pesados”, diz.

Alexandre Foroni (à esq.) com a equipe da Fazenda Abacaxi. res negligenciam. “Temos de aumentar o tamanho dos cochos”, diz. De acordo com Foroni, o espaço linear recomendado para essa quantidade de suplemento é de 10 cm/cab. A recria na Fazenda Abacaxi ocupa uma área de 368 ha de

pastagem rotacionada, formada com braquiarão e dividida em nove módulos, com quatro piquetes cada. De maio de 2017 a abril de 2018, a lotação média da fazenda foi de 1,4 UA/ha com produção de 12@/ha no período.

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Boi 8-7-6 do Grupo Três Muchachas Fases

@ ganhas

@ acumuladas

Meses

Cria*

8,13

8,13

8

Recria

6,73

14,87

13,4

Engorda

6,25

21,12

3,14

* A cria é feita na Fazenda Bahia Grande, MS

Resultados excelentes Os primeiros resultados consolidados vieram em 2017. “Já conseguimos abater 80% dos animais (2.000 cabeças) na idade e peso final estipulados”, informa o gestor. Apesar dos gastos com infraestrutura (R$650.000 nos últimos três anos), a fazenda obteve lucro líquido de R$ 450/ha, em 2016, e R$ 550/ha, em 2017. Pode-se considerar o sistema de Junqueira, portanto, como uma variação do Boi 7-7-7, adaptada à realidade da empresa. Como “Seu” Higino já produz bezerros de alta qualidade, a ideia é fazer um Boi 8-76 (8@ na cria, 7@ na recria e 6@ na engorda), de forma a acelerar as duas primeiras etapas de produção e encurtar a terceira (confinamento), o que reduz custos. Naturalmente, nem todos os bezerros chegam à fazenda com 8@ ou ganham 7@ na recria, mas Junqueira tem investido em nutrição para que pelo 80% deles atinjam 21@ aos dois anos de idade. Na chegada à fazenda, geralmente entre maio e junho, a bezerrada é apartada para formação de lotes e definição de estratégias nutricionais conforme seu peso. “Nessa triagem, também são considerados outros fatores, como a disponibilidade de pasto. O mais importante é formar lotes homogêneos”, expliDesempenho dos lotes da Fazenda Três Muchachas na engorda Tempo de médio engorda diário (meses)

Arrobas Produzidas

Peso Entrada (kg)

Peso Saída (kg)

Total de kg ganhos

Ganho

Cabeceira

450

590

140

1,414

3,3

6,63

21,63

Meio

440

580

140

1,414

3,3

6,60

21,27

Fundo

460

550

90

1,200

2,5

4,83

20,17

Média

446

576

130

1,371

3,14

6,25

21,12

Tipos de lote

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por animal

Arrobas Vendidas

ariosto mesquita

animais vêm de lá. Os demais 50% são adquiridos na região, onde há boa oferta desse tipo de animal. A Três Muchachas fica a 6 km de Camapuã, município famoso pela produção de bezerros de qualidade. O projeto considerou a meta de produção da Fazenda Bahia Grande (2.500 bezerros/ano), já com peso 1@ acima do proposto pelo Boi 7-7-7 para a cria.

Medeção da altura do pasto usando régua desenvolvida pela Embrapa ajuda a calibrar manejo.

ca o produtor. Os bezerros chamados de “cabeceira” (em média, 20% da reposição) ficam 12-13 meses na fazenda. Chegam bem pesados (cerca de 300 kg ou 10@), engordam mais 150 kg na recria (cerca de 500 g/cab/dia) e, em abril do ano seguinte (10 meses depois) entram no confinamento para ser abatidos em julho, com 590 kg (21,63@), aos 20-21meses. Esse lote de ponta tem ritmo acelerado, por isso suas metas na recria e na engorda são menores (5@ e 6,63@, respectivamente). São “Bois 10-5-6”, pois partem de uma base de cria excelente. Já os bezerros do “meio” (60% do gado) percorrem caminho um pouco mais longo, permanecendo entre 16 e 17 meses na fazenda. Chegam com 240 kg e permanecem a pasto por 13 meses – cinco de seca (maio a setembro), mais oito de águas (outubro a abril). Nesse período, ganham cerca de 200 kg, o equivalente a 6,67 @ (média de 513g/cab/dia) e seguem para terminação em agosto para abate em dezembro com 580 kg (+ 6,6@ na engorda), totalizando 21,27@ aos 24 meses de idade. Já os animais de “fundo”, apresentam em média 200 kg na desmama e são os 20% fora da meta. Ficam na fazenda pouco mais de 20 meses. A recria compreende dois períodos de seca e um de águas (18 meses), ao longo dos quais ganham em média 481 g/cab/dia, totalizando 260 kg (8,67@). Sua engorda dura 2,5 meses e é feita nas águas do segundo ano. Em média, esses animais de fundo ganham 4,83@ na terminação, sendo abatidos


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Nessas áreas, a correção e a manutenção da fertilidade são feitas por meio da aplicação de calcário, gesso, cloreto de potássio (KCI), ureia, MAP (fertilizante fosfatado) e MIB (micronutrientes). No cocho, os animais em recria recebem sal mineral aditivado nas águas e suplementação proteica (com 25% de proteína bruta), na proporção de 0,2% do peso vivo, nos meses secos. “Eu nunca havia feito recria com sal mineral. Mas conversando com o pessoal da Apta, passei a entender que diante de um pasto rico, bem adubado, com folhas largas e boa oferta de proteína nos meses chuvosos, posso abrir mão do proteinado e usar apenas o sal no cocho. Gostei e abracei essa ideia”, conta.

Animais de recria recebem sal aditivado nas águas e proteinado durante a seca

com média de 550 kg (20,16@) aos 24 meses de idade. Todos os cálculos consideram um rendimento de carcaça de 55%. Manejo nutricional Como Junqueira consegue abater 80% dos animais com 24 meses e média de 21@, em sistema de recria a pasto, enfrentando um período de cinco meses de seca? “O desafio é grande”, admite. A implantação do confinamento convencional e do projeto de terminação intensiva a pasto (TIP) foi fundamental para se destinar mais área à recria, intensificada em quatro módulos de pastejo rotacionado (com quatro piquetes cada), que totalizam 400 ha (cerca de um terço da fazenda). Nestes módulos, o foco é qualidade de forragem. “Se esses pastos são bons para engorda, imagine para recria”, defende. Junqueira fez ajustes finos no manejo do capim Marandu, usando uma régua desenvolvida pela Embrapa para medir a altura adequada de entrada e saída dos animais, e, diante de um solo predominantemente arenoso (20% de argila), não pensou duas vezes em investir em adubação nos rotacionados. Somente em 2015, desembolsou R$ 600/ha. Nos anos seguintes (2016 e 2017), fez duas manutenções (R$ 200/ha cada), tudo obedecendo a uma análise de precisão feita por empresa especializada. Desempenho na recria varia bastante em função do lote Qtde (%)

Peso Entrada (kg)

Peso Saída (kg)

Peso Ganho (kg)

Ganho

Cabeceira

20

300

450

150

Meio

60

240

440

Fundo

20

200

Média

100

244

Tipo de lote

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Tempo (meses)

Arrobas Produzidas

0,5

10

5

200

0,513

13

6,67

460

260

0,481

18

8,67

446

202

0,504

13,4

6,73

diário (kg)

Lotação alta Todo este trabalho permitiu a Junqueira trabalhar com alta carga nos piquetes. “Em 2017, os módulos sustentaram 4 UAs/ha, em média”, garante. Nos meses secos, a estrutura de recria vem permitindo, segundo ele, ganhos diários de 200 g/ cab/dia. “Também não dá pra fazer milagre. Posso garantir que a maioria dos pecuaristas não consegue resultado semelhante em seus pastos, durante a seca, com suplementação mais leve”, observa. No confinamento, os animais recebem uma ração à base de silagem de grão úmido de milho, feita na própria fazenda após a compra da matéria prima. A última carga foi produzida e ensilada (em silos bag) em setembro de 2017. Em maio deste ano, Junqueira ainda contava com cerca de 15.000 sacas (de 60 kg) de silagem, quantidade suficiente para terminar cerca de 1.000 animais. Entre maio e setembro do ano passado, Junqueira testou a técnica do “sequestro” na seca em um lote de recria. Colocou 50 animais em apenas 16 ha e aumentou a suplementação proteica de 0,2% para 1% do peso vivo. Durante 150 dias, cada animal comeu 525 kg de suplemento. “Isso significou R$ 288/ cab no período. Acrescentando-se mais R$ 135/cab de custo variável, foram gastos R$ 423/cab. Olhando esses números, pensei: será que fiquei maluco?”, relembra. A surpresa positiva veio ao pesar o lote na saída do “sequestro”. Cada animal ganhou 4,75@ nos cinco meses de seca. “Diante do desembolso de R$ 423/cab, o sequestro me permitiu produzir 1@ de carne na seca, ao custo de R$ 89. É sensacional! Um bezerro que iniciou a seca com 10@ vai entrar nas águas com 15@, podendo ser abatido em fevereiro ou março”, projeta. Independentemente de permanecer ou não na gestão da Fazenda Três Muchachas, Gabriel Junqueira está disposto a compartilhar sua experiência na forma de consultoria: “Estou me preparando para ajudar a levar este conceito de produção para outras propriedades”.


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Múltiplas estratégias na recria

renato villela

Fazenda Brasil adota três estratégias diferentes para recria dos bezerros

Renato Vilela

A

renato.villela@revistadbo.com.br

Fazenda Brasil, localizada no município de Barra do Garças, região leste do Mato Grosso, trocou a tradicional recria a pasto, baseada no fornecimento exclusivo de sal mineral, por um conjunto de estratégias que congregam suplementação proteico-energética e confinamento de sequestro, em pastagens de sequeiro e de safrinha (áreas de integração lavoura-pecuária). A mudança foi motivada pela pressão para o aumentar a produtividade nesta etapa da criação e começou a ser adotada gradativamente, a partir do final de 2011. A despeito de o conceito do boi 7-7-7 estar inserido no sistema de produção da fazenda, que prevê o abate dos bois com 21@ até os 24 meses, a meta para o ganho de peso na recria precisou ser reajustada. Ao invés das 7@ preconizadas, os garrotes ganham, em média, 5,5@ no período de 10-12 meses. “Estamos em uma região de seca muito prolongada, o que torna difícil colocar essas sete arrobas durante a recria”, afirma Otto Magalhães Franco, gerente de pecuária da propriedade. Os quilos que faltam na balança nesta fase são compensados na cria e no confinamento. “Nosso boi é o 8-5-8”, diz. Para Franco, no entanto, ainda há espaço para avançar. “Somos muito eficientes na cria e na terminação e temos muita oportunidade de crescimento na recria”, afirma.

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Para vencer o desafio de “encorpar” a recria em uma região assolada pela estiagem severa, a propriedade, que tem área total de 8.902 ha, elabora anualmente suas metas para ganho de peso. Nesse planejamento, os lotes são formados por peso e raça: Nelore, meio-sangue Angus e tricross (Nelore-Angus-Bonsmara) de até 200 kg, 201-250 kg, 251-300 kg e acima de 300 kg, respectivamente. Os níveis de suplementação variam de acordo com a época do ano (águas/seca) e a qualidade das forrageiras. A recria começa com os bezerros “do cedo”, que nascem entre setembro e outubro e são desmamados entre abril e maio – a desmama vai até julho. Apartados com peso acima de 250 kg, esses bezerros formam a “cabeceira” e vão direto para as pastagens de safrinha, nas áreas outrora ocupadas pela soja, que nesse período estão prontas para serem pastejadas. Recebem sal proteico-energético (0,2% do peso vivo) com 20-25% de PB (proteína bruta) durante a seca. Para esta safra a fazenda projeta ganho de peso de 500 g/cab/dia durante o período de pastejo, que se estende até 15 de setembro, quando a área é devolvida para o cultivo da soja. Ao longo de 150 dias a expectativa é alcançar, nessa pastagem de boa qualidade, 2,5 @ (500 g x 150 dias). Ao fim desse período a estratégia muda. Como nesse época do ano ainda não começou a chover para recuperar as pastagens e os garrotes se encontram em curva ascendente de ganho, a fazenda lança mão do confinamento de sequestro. “Nosso


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objetivo é manter o ritmo de crescimento. Planejamos para essa safra um ganho diário de 700 g por cabeça”, diz o gerente. O período de permanência dos animais no cocho é, em média, de 85 dias – um pouco mais ou menos em função da seca. Desse modo, a expectativa é que somem mais 1, 9 @ (700 g x 85 dias), totalizando 4,4 @ na seca. Com a volta das chuvas e a recuperação das pastagens, os garrotes retornam às áreas de sequeiro. A suplementação muda para 0,1% do peso vivo de sal proteico. Nesse período, que compreende 181 dias, o ganho médio diário é de 644 g, totalizando 3,85 @. Cerca de 9.500 cabeças estão nesse regime. Como os 2.924 ha de pastos de integração são insuficientes para receber toda a recria – são desmamados 9.000 bezerros/ano, provenientes de três fazendas de cria do grupo –, uma vez fechada a lotação nas pastagens de safrinha, outros lotes vão sendo direcionados para os pastos diferidos de sequeiro, em um total de 2.300 garrotes. Nessa estratégia, estão os animais “intermediários”, com peso de desmama entre 200-250 kg. Como a forragem perde a qualidade nessa época do ano, os bovinos recebem suplementação de 0,2% do peso vivo com aporte maior de PB (50%). O ganho de peso projetado é de 226 g/dia. Ao longo dos sete meses de estiagem, a expectativa é agregar 1,58@ (200 g x 210 dias). No período das águas, a suplementação muda, em quantidade e composição. Com as pastagens em melhores condições, os garrotes recebem 0,1% do peso vivo de um suplemento com 20-25% de PB. O ganho salta para 644 g/dia ou 3,2@ durante a estação (640 g x 150 dias). Somando seca e

renato villela

SUPLEMENTAÇÃO

águas, a fazenda espera que esses animais alcancem 350 kg, estando prontos para entrar na terminação. O custo da @ produzida na recria é de R$ 90. Até este ano, a fazenda adotava ainda uma terceira estratégia: a recria sob pivot central. Para as pastagens irrigadas e adubadas eram direcionados os garrotes mais leves. Oferecer os melhores pastos da seca para o lote “de fundo” tinha por objetivo elevar o ganho médio diário (GMD) na estiagem para “turbinar” essa fase da recria, para que os animais tivessem condições de entrar no segundo giro de confinamento, garantindo 100% de desfrute. No entanto, a boa produtividade que a fazenda vem alcançando com a soja e os preços atrativos da commodity fizeram com que essa área, de 100 ha, fosse entregue ao cultivo da oleoginosa a partir dessa safra. “Para substituir essa estratégia, pretendemos aumentar as áreas de pastejo na safrinha e também construir novas áreas para intensificação, com suplementação pesada de 1% do peso vivo para a recria”, diz Franco. Também está prevista a ampliação do confinamento de sequestro para 2.000 animais. n

Garrotes meio-sangue em piquete rotacionado

Boa genética é fundamental Além da oferta de forragem e uma boa estratégia de suplementação, o caminho para se chegar até as 7 @ na fase de recria passa pela genética. Um estudo conduzido pela Fazenda Mata Verde, localizada no município de Terra Nova do Norte, MT, mostra o quanto a recria de animais geneticamente superiores pode fazer a diferença ao final dessa etapa. No experimento, foram comparados todos os machos da propriedade nascidos de 13 de agosto a 13 de novembro de 2015 (intervalo de 90 dias), num total de 450 animais, agrupados da seguinte forma: negativos para DEP (Desempenho Esperado de Progênie) em ganho de peso pós-desmame (GPD), positivos para essa mesma DEP e os Top 4% para a característica. Os bezerros, criados a pasto sem creep-feeding, receberam suplementação

62 DBO junho 2018

proteica com consumo de 0,3% do peso vivo (cerca de 600 g/cab/dia) até outubro de 2016. Depois foram suplementados com proteico energético na proporção de 0,5% do peso vivo – iniciou-se com 1 kg/dia até chegar a 2 kg/dia, em abril de 2017. Veja as diferenças no ganho de peso: os animais negativos para DEP de GPD pesavam 180 kg aos sete meses, quando foram desmamados, e 375 kg aos dezoito meses, no final da recria; os garrotes positivos para essa característica, por sua vez, saíram de 190 kg para 415 kg, respectivamente. Já os 15% superiores (Top 4%), que desmamaram com 204 kg, alcançaram 444 kg. O ganho de peso dos animais geneticamente superiores na recria foi de 700 g/dia, contra 550 g/dia dos negativos, diferença de 27%. “Se considerarmos

um rendimento de carcaça de 52%, a diferença que, aos sete meses era de 0,8@ entre os melhores e os piores animais para DEP de GPD, sobe para 2,4@ ao final da recria. Algo extremamente impactante, se considerarmos um período de menos de um ano”, afirma Leonardo Souza, diretor do Qualitas, que presta assistência à fazenda. O ganho superior persistiu na terminação, que durou 80 dias. Os animais foram abatidos com 21 meses de idade. “Os melhores alcançaram 900 g/cab/dia e foram abatidos com 516 kg (19,6@), enquanto os piores ganharam 625 g/dia, abatidos com 425 kg (16,2 @)”, afirma. O rendimento de carcaça foi de 56,9%. O ganho adicionou de 3,4@ representou R$ 425 a mais por animal no bolso do produtor, com a arroba a R$ 125.


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