Retrospectiva 2018: Revista DBO (pág.75 - ed.451)

Page 1

ESPECIAL Instalações e Equipamentos

Layout de rotacionado pede planejamento Fazenda em Jaú, SP, criou modelo adaptado à topografia declivosa para evitar erosão. Desenho pode deve respeitar condições locais. Renato Villela renato.villela@revistadbo.com.br

N

a hora de escolher o layout (desenho) dos módulos de pastejo rotacionado é preciso deixar de lado preferências pessoais e se guiar por critérios técnicos. No Brasil, predominam dois modelos básicos, com suas diversas variáveis: o tipo pizza, no qual todos os piquetes convergem para uma área de lazer central, e o formato com corredor interno. Nenhum deles constitue figuras geométricas exatas, pois se ajustam às condições

ilus

tra

cõe s: ed

son A

lves

de S ouz a

Mapa dos módulos da Fazenda São Francisco do Barreiro, SP

pré-existentes nas fazendas. Como faltam estudos comparativos entre os vários layouts, é difícil afirmar, com segurança, qual versão garante melhor desempenho animal. O conhecimento que se tem é fruto da experiência de consultores, que se debruçam sobre algumas variáveis, como a topografia, a estratégia de suplementação adotada e o sistema de produção da fazenda (cria, recria ou engorda) para desenhar não o melhor, mas o mais adequado modelo de rotacionado para determinada condição, sabendo que ele, inevitavelmente, terá vantagens e desvantagens. O produtor Jorge Sidney Atalla Júnior, proprietário da Fazenda São Francisco do Barreiro, no município de Jaú, distante 296 km de São Paulo, sempre trabalhou com rotacionados do tipo pizza nas propriedades da família. Em algumas delas, no entanto, a topografia mais acentuada trouxe empecilhos ao formato. Como a área de lazer dos módulos ficava em pontos mais baixos, a água da chuva causava erosão. Além disso, havia maior pressão de pastejo na extremidade afunilada dos piquetes – “a ponta das fatias da pizza” _, que converge para a praça de alimentação. Ela sofria pisoteio mais intenso, por causa da disputa dos animais por alimento e água. O pasto aca-

Animais entram pelo corredor interno que dá acesso à área de lazer.

DBO maio 2018 75


ESPECIAL Instalações e Equipamentos

erosão, as áreas de lazer quadradas, onde ficam os bebedouros, foram posicionadas em pontos mais altos do terreno e os corredores foram construídos em nível, para facilitar o escoamento da água. No rotacionado da Barreiro, que tem até 20% de declividade, foram levantados terraços a cada 6 m nos pontos mais críticos. É importante lembrar que se gasta mais com cerca em áreas declivosas, pois toda vez que se ultrapassa a curva de nível, é preciso instalar um poste no lado esquerdo do terraço, um em cima e outro em seu lado direito (veja figura à pág 78).

bava perdendo parte da cobertura vegetal e ficando “batido”. Isso também favorecia a formação de enxurradas nos piquetes morro acima. “Consequentemente, as chuvas lavavam e descobriam o pé dos cochos e bebedouros”, relembra Atalla. Como a Fazenda São Francisco do Barreiro também tem relevo declivoso, ele decidiu usar um modelo de rotacionado diferente. Auxiliado por André Aguiar, da Boviplan Consultoria Agropecuária, de Piracicaba, SP, investiu em corredores internos para evitar o afunilamento excessivo da maioria dos piquetes, pois eles cortam suas “pontas”, como é possível ver na figura. Além disso, esses corredores funcionam como extensões ou prolongamentos da área de lazer, facilitando o acesso dos animais à água e à comida. Visto de cima, o conjunto – corredor mais área de lazer – lembra uma colher com cabo longo (confira detalhe na ilustração). Atalla também aproveitou o espaço desses corredores para instalar linhas duplas de cocho com 40 m de cumprimento cada. Para evitar fotos renato villela

O produtor Jorge Atalla Jr. vistoria um lote de tourinhos Nelore PO

A topografia manda O controle da erosão não foi o único fator a influenciar na configuração do rotacionado da Barreiro. No mapa, pode-se ver que a pastagem se estende como uma faixa alongada, em torno de duas represas. Se usasse o modelo de pizza tradicional, Atalla teria um problema operacional, pois os piquetes afunilados demais dificultariam, por exemplo, a distribuição de fertilizantes e a aplicação de herbicidas ou inseticidas. “Certamente haveria sobreposição de faixas (de pastagem), já que os piquetes estariam muito próximos entre si”, explica Aguiar, da Boviplan. Outra justificativa para o uso de corredores internos nos módulos da fazenda foi a intenção de, futuramente, irrigar as pastagens para intensificar a produção. “Se escolhêssemos um autopropelido (sistema de irrigação por aspersão do tipo móvel), por exemplo, ficaria mais fácil transferir seu carretel entre piquetes de formato mais quadrado e menos afunilado. No formato de pizza tradicional, teríamos de fazer muitas manobras com o maquinário. Se o sistema fosse de aspersores fixos, teríamos menos pontos de registro e sobreposição da irrigação”, explica o consultor da Boviplan. No dia em que a reportagem de DBO visitou a propriedade, no fim de mar-

Tourinhos recebem ração em dupla linha de cocho no corredor interno

76 DBO maio 2018

Corredor de manejo, que garante acesso aos piquetes (lado esquerdo) é delimitado por alambrado.


Desenho tipo “flex”

Modelos básicos de rotacionado

Módulo com corredor Linha de cocho posicionado na divisa com o corredor facilita o fornecimento de suplemento.

ço, Atalla estava construindo um “corredor de manejo ou tráfego” para servir todos os módulos de pastejo rotacionado, facilitando a distribuição de insumos e a condução dos animais até o curral. “Um funcionário sozinho consegue tocar o lote, em pouco tempo”, garante o produtor. Na Barreiro, não foi possível posicionar esse corredor de manejo entre os módulos, também por causa da erosão. A saída foi construí-lo na parte inferior (veja mapa acima) e criar acessos, em sentido perpendicular, até a área de lazer de cada módulo. Essa alternativa pode não parecer ideal, pois o produtor perde uma parcela de pasto e o gado, que prefere caminhos limpos para chegar aos cochos e bebedouros, pode transformar esses acessos em tri-

Módulo tipo “pizza”

lheiros, mas a topografia novamente deu as cartas. “Nossa ideia inicial era construir o corredor no meio e faríamos isso, se a área fosse plana. Desistimos porque, em função do terreno declivoso, para o corredor passar pelas áreas de lazer dos rotacionados, teríamos de ‘cortar’ os terraços em vários pontos, e estes perderiam a função de segurar a água da chuva”, explica o proprietário Jorge Atalla Jr. Personalização crescente Os modelos com corredores têm ganhado espaço no

Criatório completa 50 anos na seleção do Nelore A Fazenda São Francisco do Barreiro chama a atenção logo na entrada. O trajeto até a sede, onde já funcionou uma central de inseminação, é todo asfaltado. No interior da propriedade, que foi vendida e depois recomprada pela família Atalla em 2010, há uma espécie de arena, coberta e em formato circular, onde os tourinhos Nelore PO desfilavam durante os antigos leilões, que agora são virtuais. A seleção, iniciada por Jorge Sidney Atalla, pai de Jorge Sidney Atalla Jr., completa 50 anos em 2018. A fazenda conta com um conjunto de grandes e pequenas represas, emolduradas pelo belo gramado e paineiras. Uma ponte feita de pedra empresta um ar bucólico à paisagem. Os 264 hectares de pastagens da propriedade estão divididos em 10 módulos de rotacionado, com três a seis piquetes, medindo entre 3 e 5 hectares cada. Há também dois módulos subdivididos em piquetes ainda menores, que servem de show room para compradores de tourinhos – ano passado foram vendidos 180 – ou de cavalos Quarto-de-Milha.

Nos demais módulos de rotacionado, giram machos meio-sangue Angus, vindos de outras duas fazendas da família e, que, neste ano, formam exportados vivos para a Turquia. A intenção de Jorge Sidney Atalla Jr., gestor da fazenda, é intensificar as pastagens para aumentar a produção de tourinhos e cruzados.

Família Atalla vendeu e depois recomprou a São Francisco do Barreiro, sede da família, onde funcionou uma central.

DBO maio 2018 77


ESPECIAL Instalações e Equipamentos

Cerca em terraços

Área de lazer para grandes lotes Nº de animais

Medida

Até 350

0,25 ha

Até 800

0,50 ha

Até 4.000

1 ha

Fonte: Boviplan/Adaptação: DBO

tros, para mais de 400, 8 metros. Também chamados por alguns técnicos de “circuito gerencial de suplementação”, o corredor de manejo precisa ser mantido sempre em boas condições. “Ele deve permitir que o funcionário percorra todo o rotacionado rapidamente, otimizando tempo e mão de obra” explica Paniago.

Brasil, principalmente entre os pecuaristas que fornecem maior quantidade de suplementos ou semiconfinam animais. Estes têm optado por desenhos com corredor central mais largo, para facilitar a passagem dos caminhões. Frequentemente a praça de alimentação é ampliada e os cochos voltados para o corredor, o que favorece o trato (veja o modelo flex, usado para suplementação nas águas e confinamento na seca, objeto de reportagem de DBO em junho de 2015). Além de garantir agilidade ao trabalho e economizar mão de obra, os modelos com corredor são fáceis de instalar, mas podem ter custo maior, por demandarem mais arame, mourões e esticadores. Para rotacionados que não fazem suplementação pesada, o posicionamento dos cochos dentro de áreas de lazer centrais pode ser mais econômico. O investimento é menor, já que uma única linha de cocho atende a todo o lote do rotacionado. Modelos com corredor interno demandam atenção em relação à área de lazer, que deve ter tamanho adequado ao lote (veja medida sugerida na tabela). Mais importante, porém, é a dimensão das porteiras ou colchetes, que devem corresponder à largura dos corredores. “É preciso facilitar o trânsito dos animais, não somente para minimizar o risco de contusão, mas também para que os dominantes não dificultem a entrada e saída dos dominados”, diz Rodrigo Paniago, também da Boviplan. No campo, nem sempre esse detalhe técnico é considerado. “É muito comum o produtor colocar uma cerca de arame ou tábua para economizar no tamanho da porteira ou colchete”, diz o consultor. Quando o corredor de acesso dos animais à área de lazer é o mesmo usado para manejos, como condução dos animais ao curral ou tráfego de veículos, o produtor deve respeitar uma largura mínima, determinada pelo tamanho dos lotes a serem manejados: para 100 animais, mínimo de 4 metros de largura; para 100 a 400, 6 me78 DBO maio 2018

Pizza ou meia pizza O fato de muitos produtores estarem usando modelos de rotacionado com corredor não significa, entretanto, que o “tipo pizza” tenha perdido prestígio e seja contraindicado. Esse desenho, segundo Paniago, é sempre o primeiro que vem à mente quando se projetam módulos de pastejo rotacionado, por ter custo de divisão de piquetes mais baixo e menor perda de área de pastagem. Em geral, ele também permite que os animais percorram distâncias menores entre o fundo do piquete e a área de lazer, que fica no centro do módulo. Segundo o consultor, esse modelo também é mais interessante para vacas de cria, pois, se os bezerros cruzarem a cerca, passando de um piquete para o outro, é mais fácil reconduzi-los até suas mães. Se o módulo tiver corredor interno, podem se distanciar do grupo, ficar perdidos por mais tempo e causar grande alvoroço entre as matrizes. “No modelo tipo pizza, isso dificilmente ocorre, porque o bezerro no máximo fica no piquete ao lado, acompanhando-a, mesmo estando do outro lado da cerca”, explica Paniago. O consultor ressalta, entretanto, que vacas de cria se adaptam bem a qualquer tipo de rotacionado. E se o sistema de produção da fazenda for intensivo? Nesse caso é possível usar uma “derivação” desse modelo: a meia pizza, onde a área de lazer é deslocada do centro para uma das laterais do módulo, de preferência na que faz divisa com o corredor. “Isso facilita muito o fornecimento de suplementos por parte do maquinário e a vistoria em geral”, afirma Paniago. As ressalvas que se fazem para o tipo pizza também valem para esse desenho de rotacionado. Os piquetes não devem ficar muito estreitos e é preciso respeitar a topografia, para minimizar riscos de erosão na área de lazer. Outro aspecto ao qual o produtor deve ficar atento – e isso vale igualmente para os modelos com corredor – é a distância entre o fundo do piquete e a área de lazer. “O ideal é que os animais percorram, no máximo, 500 metros entre um ponto e outro”, afirma. n


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.