Revista ABIPEM – Janeiro/Fevereiro-2009

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ANO 2 - Nº 5

ANO 2 - Nº 5

Previdência Nacional dá boas-vindas aos novos prefeitos e gestores de RPPS

Gestão

Roteiro detalhado para quem começa a administrar

Legislação

Carta de 1998 frusta expectativas para aponsentadoria

Investimentos

Contradições da crise: fundos perdem, aplicações crescem

EM LOUVOR DA COMPETÊNCIA Ministro da Previdência, José Pimentel, elogia avanço da gestão previdenciária em estados e municípios e recomenda busca constante de qualificação

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Sumário Edição 5

Capa 30

Manual do gestor 12

Ministro José Pimentel diz que sucessivos processos eleitorais contribuem para o aprimoramento da gestão dos institutos de previdência e recomenda que sejam formados e preservados quadros técnicos

Previdência Nacional traz roteiro detalhado do que é necessário para iniciar institutos do RPPS. Em oito páginas, o detalhamento técnico e jurídico dos caminhos de uma boa gestão

Sumário Carta ao leitor Expediente Eventos no Acre, em Goiás, em São Paulo e no Rio de Janeiro foram preparação para 2009 Resoluções 402 e 403 do MPS uniformizam administração e buscam garantia de equilíbrio atuarial Contradição entre preceitos constitucionais e expectativa de remuneração de aposentados cria horizonte de conflitos A crise tem duas faces: fundos perdem em 2008, mas crescem aplicações em previdência Após a queda de um Estado onipresente, aposentado russo ganha abaixo do mínimo indispensável

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Advogado diz que mudanças tributárias em discussão estão longe de representar uma reforma Cursos de gestão municipal consideram insuficiente a demanda por qualificação Em Paragominas, combate ao desmatamento provoca reação popular violenta Jumirim, cidade paulista pequena e nova, tem equilíbrio financeiro e atuarial

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Professoras de escola paulistana dão aula de competência com método que une educação e arte Funcionários com longos anos dedicados ao serviço público orgulhamse de suas trajetórias Índice de pessoas entrevistadas Agenda da Abipem

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Carta ao leitor

É uma feliz circunstância que tenhamos a palavra do ministro da Previdência Social, José Pimentel, na primeira edição de 2009, quando se iniciam os mandatos dos prefeitos eleitos – ou reeleitos – em 2008. Pimentel traz uma mensagem de otimismo consistente, ao afirmar que a gestão dos institutos previdenciários nos estados e municípios melhora a cada eleição. E recomenda, com lucidez, que quadros técnicos formados ao longo dos anos sejam mantidos em suas tarefas. A Abipem e a Apeprem orgulham-se de contribuir de maneira expressiva para a disseminação, em todo o Brasil, do conhecimento especializado necessário à boa gestão dos institutos. No final de 2008, por sinal, tivemos proveitosos eventos no Acre, em Goiás, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Previdência Nacional dá também sua contribuição a novos e antigos responsáveis pela gestão previdenciária nos municípios, ao sistematizar as práticas mais recomendáveis. Nesta edição, oportunamente, apresentamos uma recapitulação dos roteiros que publicamos em nossas primeiras edições. Em um só volume, muita informação útil. As disposições introduzidas pelas portarias 402 e 403 do Ministério da Previdência são explicadas na seção Legislação, que aborda também a perspectiva de conflitos entre o que diz a lei e as aspirações de servidores a incorporar em suas aposentadorias vantagens que faziam parte de seu regime de remuneração. Destacamos, na seção Gente, histórias de servidores que se orgulham de suas trajetórias no serviço público. Duas professoras da rede estadual paulista que se aproximam da aposentadoria – Raquel Martins e Lurdes Ribeiro – são responsáveis pelos bons resultados de uma escola pública cujo trabalho é amplamente reconhecido por alunos, PN professores, pais, autoridades e especialistas. Cordialmente,

João Carlos Figueiredo Presidente da Apeprem

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Expediente

Abipem (www.abipem.org.br)

Editora

DIRETORIA Presidente: Demétrius Ubiratan Hintz Vice-Presidente: José Maria Corrêa Secretário Geral: Wellington Costas Freitas CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO André Luiz Goulart Valnei Rodrigues Moacir Salles Luiz Gustavo Ávila Mendonça Antonio Cezar Leite Lobato CONSELHO FISCAL Roberta Cabral Medeiros José de Anchieta Batista Gláucia Maria Barreto Silva

Apeprem (www.apeprem.com.br) DIRETORIA Presidente: João Carlos Figueiredo Vice-presidente: Jonas Baldissera 1ª Secretária: Lucia Helena Vieira 2ª Secretária: Solange Maria Maximiano de Pádua 1º Tesoureiro: Antonio Corrêa 2º Tesoureiro: Antonio Scamatti CONSELHO ADMINISTRATIVO Titulares André Luiz da Silva Mendes, Alberto Marques Passos, Christian Petterson Antunes Lemos, Eliane Valim dos Reis, Fernando Rodrigues da Silva, Glória Satoko Kono, Kleber Vicente Cavalcante, Marcia Regina Moralez, Marcus Vinicius Esteves Nunes, Moacir Benedito Pereira, Paulo César Pinto de Oliveira, Paulo Henrique Pastori, Roberto da Silva Oliveira, Sebastião Benedito Gonçalves, Sirleide da Silva. CONSELHO ADMINISTRATIVO Suplentes Antonio Carlos Molina, Elisa Maria Rocha, Guiomar de Souza Pazian, Francisco Carlos Conceição, Maria Aparecida Della Villa, Onésimo Canos Silva Júnior, Paulo Vicentino, Vandré Lencioni de Camargo. CONSELHO FISCAL Titulares Edmilso Martins, José Tomaz, Nelson Rodrigues de Mello. CONSELHO FISCAL Suplentes Luiz Roberto Lopes de Souza, Varlino Mariano de Souza.

JB Pátria Editora Ltda.

Presidente: Jaime Benutte Diretor: Iberê Benutte Administrativo: Fátima Conceição Estagiários: Marina Beltrame e Luiz Aymar

Previdência Nacional Publisher: Jaime Benutte Conselho Editorial: André Luiz Goulart, Demétrius Ubiratan Hintz, Wellington Costa Freitas (Abipem); João Carlos Figueiredo, Lúcia Helena Viera, Magadar Rosália Costa Briguet (Apeprem); Paulo Henrique Pastori (Regime Geral); Jarbas Antonio de Biagi (Previdência complementar) Editor: Trilogia Comunicação e Arte Ltda. - Mauro Malin, MTB 14887-67 Direção de arte: Belatrix Ltda. Marcelo Paton - Diretor de Arte Gabriel de Moraes Luiz, Evandro Oliveira dos Anjos - Assistentes de Arte Colaboradores: Américo Gobbo, Alexandre Belém, Antônio Cruz, Carlos Lopes, Carlos Vasconcellos, Dalmo Curcio, Érika Bento Gonçalves, Gabriel Luiz, Jorge Felix, Kelly Souza, Leonardo Fuhrmann, Marcelo Spatafora, Marcin Tusinski, Mauro Nakata, Pro Empresa, Sérgio Damasceno, Svilen Mushkatov, Victor Soares, Vladimir Fofanov. Impressão: IBEP - Tiragem: 50.000 exemplares A revista PREVIDÊNCIA NACIONAL é uma publicação bimestral da DB2 Editora, localizada na Rua Flórida, 1.703, 11º andar, Brooklin, CEP 04565-001, São Paulo – SP. Tel.: 11 5505-6065. www.patriaeditoria.com.br Dúvidas ou sugestões: previdencianacional@patriaeditora.com.br Os textos assinados são da responsabilidade de seus autores. Não estão autorizados a falar pela revista, bem como retirar produções, pessoas que não constem desde expediente e não possuam uma carta de referência.

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Fotos: Instituto de Previdência do Estado do Acre

Eventos

Auditório do Teatro Plácido de Castro, Rio Branco, Acre

Hora de resultados Após cursos e seminários de qualificação, os gestores de recursos financeiros dos RPPS devem colocar em prática as metas propostas para 2009 troca de experiências entre os institutos participantes a respeito da política de investimento e da crise mundial foi citada por alguns palestrantes como o destaque dos debates nos eventos realizados entre os dias 2 e 12 de dezembro passado no Acre, em Goiás e nos estados de São Paulo e do Rio de janeiro pela Abipem (Associação Brasileira de Instituições de Previdência Estaduais e Municipais), pela Apeprem (Associação Paulista de Entidades de Previdência do Estado e dos Municípios) e pela Associação das Entidades de Previdência dos Municípios do Estado do Rio de Janeiro (Aepremerj). O receio de que a crise prejudique a economia brasileira e o prazo estipulado pelo governo federal para a entrega dos objetivos a serem cumpridos em 2009 através da política de investimento deram relevância às palestras que abordaram estes assuntos. Com participação de entidades de diversos estados brasileiros, puderam ser discutidas reivindicações,

A

sugestões e propostas para fortalecer o RPPS e ampliar a qualificação de seus gestores.

Instituto da Praia Grande mostra que aliar apoio político e administração permanente pode dar certo Kleber Vicente Cavalcante, membro da administração do Instituto de Previdência Municipal de Praia Grande (IPMPG) desde 2001, acredita que manter a mesma equipe de gestores por um grande período evita que o investimento em cursos e seminários de capacitação se perca devido às trocas de funcionários. Exemplo de administração previdenciária no país, o Insti-

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No Acre, debates para fundamentar futuras decisões no setor e aprimorar as práticas previdenciárias No III Seminário de Previdência do Estado do Acre, que deu início à sucessão de eventos das associações, os participantes puderam debater temas como A Seguridade Social como Fator de Proteção Social e Distribuição de Renda, Competência dos Entes Federativos para Legislar sobre a Previdência Social do Servidor e Pensões e Aspectos Constitucionais do Direito Previdenciário nos Regimes Próprios de Previdência. Promovido pelo governo do estado e pela Acreprevidência, o seminário se realizou no Teatro Plácido de Castro e contou com a participação do conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Acre Antônio Jorge Malheiro, que falou a respeito do papel do Tribunal de Contas na análise dos processos de aposentadoria e pensões dos servidores públicos. – Os debates que mais suscitam a participação da platéia são, sem dúvida, aqueles em que se discutem os direitos do servidor e a aplicação das regras da legislação em vigor – avalia Malheiro. Para Kleber Vicente Cavalcante, o seminário A Crise Mundial – Perspectivas para 2009, animado na Praia Grande por Sérgio Cutolo, diretor do banco UBS-Pactual e ex-presidente da Caixa Econômica Federal, foi relevante, devido à crise econômica. Segundo Cavalcante, a economia brasileira está “blindada”. “O cenário no Brasil ainda está seguro. Esperamos que o perigo da crise passe já no segundo semestre de 2009. É provável que as equipes econômicas sofram uma injeção de ânimo, e a tendência é que a situação melhore a partir da metade do ano que vem”. Maria Verônica Bentinho, membro da diretoria da Fundação de Aposentadorias e Pensões dos Servidores do Estado de Pernambuco (Fundape), acredita que a crise “é um assunto que deve ser tratado com cautela. Não é um tema a ser discutido apenas pelo que aconteceu de um ano para cá”.

No 2º Seminário Centro-Oeste da Abipem, que ocorreu em Goiânia nos dias 10 e 11 de dezembro, a metodologia das palestras permitiu interatividade entre as instituições, que puderam trocar experiências a respeito de temas como evitar fraudes nos sistemas de cadastro de aposentados e pensionistas. Para Maria Verônica Bentinho, mostrar alguns casos e exemplos de trabalho foi a grande evolução no modo como os seminários os quais ela participou vinham sendo realizados. – Gostei muito da apresentação do Instituto de Previdência de Santa Catarina (Ipesc) que mostrou o sistema de recadastramento anual de pensionistas e aposentados através da impressão digital – diz Maria Verônica. – É algo útil, que deu certo lá e poderia haver interação com outras instituições que atuam na mesma área. Exibir essas experiências foi uma evolução nas palestras, e, apesar de ser uma apresentação curta, os estados conseguiram passar a experiência de cada um” (ver Gestão de Qualidade, Previdência Nacional número 4). Para finalizar o ciclo de eventos, a Aepremerj organizou seu 2º Seminário em Sapucaia, no Rio de Janeiro. As palestras viraram mesa-redonda. João Carlos Figueiredo, presidente da Apeprem e ex-presidente da Abipem, e João Luiz Meireles da Conceição, expresidente da Aepremerj, discutiram a questão previdenciária e o aperfeiçoamento dos funcionários junto a cerca de 100 participantes. Evandro Antônio da Silva, presidente da Aepremerj desde setembro de 2008, contabiliza: – Foram quatro eventos desde que assumi a presidência da Aepremerj. Dois regionais e dois nacionais, que reuniram, ao todo, mais de 450 participantes. Em 19 de setembro, quando assuKleber Cavalcante mi o cargo, a Associação tinha 11 institutos filiados. Paguei dívidas trabalhistas, corri atrás de patrocínio e hoje temos 16 institutos filiados. A animação de Silva não se resume ao balanço positivo dos eventos realizados no Rio de Janeiro em 2008. Dentre as propostas para 2009, cinco eventos fazem parte do roteiro da Associação. “Um deles será em parceria com a Abipem, em março, aqui no Rio”, anuncia.

Foto: Imprensa da Prefeitura de Praia Grande

tuto da Praia Grande, através da recuperação de créditos junto ao governo via compensação previdenciária, inicia o ano com a conta da instituição positiva. – Sempre tivemos respaldo da prefeitura, que entende as reivindicações da previdência. Isso não é comum em outros municípios, onde as necessidades das entidades muitas vezes não são tratadas com o devido respeito. Quando entrei na administração da entidade, as contas do Instituto da Praia Grande estavam com saldo positivo de R$ 300 mil, hoje são R$ 68 milhões – diz Cavalcante.

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Passo a Passo

Para começo de conversa Previdência Nacional reúne nesta edição recomendações feitas em 2008 por especialistas para boa gestão dos institutos do regime próprio

No dia 1º de janeiro tomaram posse, ou foram reempossados, prefeitos dos quase 2 mil municípios brasileiros que aderiram ao RPPS. Eles logo nomearam, ou confirmaram em suas funções, administradores das entidades de previdência municipais. Se a taxa geral de reeleição no pleito de 2008 – 60% – serve para os municípios que têm RPPS, em 800 municípios há renovação dos gestores. Alguns são mantidos, ainda que a oposição tenha conquistado o poder na cidade. Em compensação, muitos prefeitos reeleitos trocam os gestores. Ou porque não gostaram do que viram

no primeiro mandato, ou para cumprir acordos eleitorais. Previdência Nacional publicou em suas duas primeiras edições roteiros para montar e desenvolver institutos do RPPS. Novos e antigos gestores dispõem agora desse verdadeiro material de consulta, reunido numa só edição. Mas a revista vai para todos os municípios do país, tenham ou não aderido ao regime próprio. Assim, o material começa indicando critérios para avaliar se vale a pena adotar esse regime. A parte sobre legislação foi escrita antes da edição das portarias 402 e 403 pelo Ministério da Previdência, cuja importância é tratada nesta edição (ver Peças que se encaixam, página 20).

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Ilustração: Nakata

Como montar e sustentar Conhecimento e avaliação pormenorizada dos dados são as bases para a criação do Regime Próprio nos municípios Sérgio Damasceno (Publicada na edição número 1, abril/maio de 2008.)

A adesão ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) demonstra que estados e municípios preferem, cada vez mais, gerenciar localmente os recursos de aposentadoria do funcionalismo público. Mas em que momento um município deve chamar a si a responsabilidade pela gestão da previdência e montar um instituto? Essa montagem deve considerar, no mínimo, três dados: a alíquota, que dimensiona se é mais vantajoso criar o instituto ou permanecer sob a gestão do Instituto Nacional de Seguridade Social; a reserva técnica, que demonstra se o município tem fundos para custear o RPPS; e os custos de implantação da infraestrutura mínima para um gerenciamento próprio. As vantagens de se ter uma admi-

nistração própria, segundo o sócio-consultor da empresa Globalprev, Edevaldo Fernandes da Silva, são várias: “Significa poupança interna para o município porque os recursos não se destinam a abater o déficit do INSS; é um instrumento de ação que permite a alocação de recursos no mercado financeiro local; e permite que se tenha poder de representação, com fiscalização e acompanhamento da destinação dos recursos”.

Análise precisa levar em conta o arcabouço regulatório que rege a cidade e enquadra os servidores O sócio da Globalprev foi superintendente do Instituto de Previdência Municipal de São Paulo (Iprem). Em média, os institutos locais têm uma atuação longa no país: de 30 a 50 anos. O Iprem existe desde 1909. Os textos que regem o RPPS são as leis 9.717/98 e 10.887/04 e as Emendas Constitucionais 20, 41 e 47 (ver, adiante, Bê-á-bá jurídico). Na etapa anterior à criação de um regime próprio, o município deve avaliar o arcabouço regulatório que rege a localidade e regula a contratação, remuneração e organização do servidor. Em geral, de-

vem ser analisados o Estatuto do Servidor Público, a Lei Orgânica Municipal e o Plano de Cargos e Salários. “Deve ser avaliado o que já existe e o que deve ser alterado pelo impacto da previdência para que se saiba se as normas são adequadas às questões previdenciárias”, explica Fernandes. Na metodologia proposta por Fernandes para a criação de um regime próprio de gestão da previdência pública, os pontos principais a serem observados antes da decisão são: análise da estrutura previdenciária municipal, das bases normativas, das bases cadastrais, da base atuarial, diagnóstico da situação do ente e proposta de modelagem. Em geral, isso é feito com o apoio de consultorias ou profissionais que conheçam previdência pública. A tecnologia da informação (TI) ou sistema que controlará o RPPS local é um elemento importante na estruturação do regime. Os bancos de dados, que gerenciam a base de servidores, têm custos mais atrativos atualmente e o RPPS precisa de sistemas parrudos e, consequentemente, de profissionais que entendam de TI e também de previdência pública.

Os custos da previdência própria deverão ser compatíveis com a arrecadação esperada de recursos O mais importante é que o município equacione, desde o princípio, os custos com a previdência própria e os recursos financeiros que suportarão o instituto local. O conjunto de normas que regula o RPPS foi unificado em 1998. Não há benefícios diferentes nas localidades brasileiras. O servidor Previdência Nacional 13

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público, em qualquer município brasileiro, tem os mesmos benefícios assegurados pelo INSS: aposentadoria (por idade, tempo de contribuição, invalidez); pensão, auxílios doença e reclusão (prisão) e salários maternidade e família. Também foram unificados os padrões de permanência no setor público. Com isso, as regras ficaram mais simples e são válidas em todo o território nacional. A lógica do sistema é uma só: o benefício não pode ser concedido ao contribuinte que não contribuiu. O êxito da entidade local dependerá de pessoas que efetivamente detêm o conhecimento da previdência. “Sem se cercar de base técnica e de profissionais qualificados, é complicado criar um ente municipal”, diz Fernandes. O conhecimento sobre previdência pública está bastante disseminado. Para o regime próprio há o intercâmbio entre entidades como a Abipem e associações estaduais, consultorias e escolas de formação técnica.

Usar o conhecimento local para não se enganar a respeito da realidade do quadro funcional Fernandes ressalta que o conhecimento local pode e deve ser largamente explorado. As áreas de recursos humanos das prefeituras detêm todas as informações sobre o servidor público e o setor financeiro, que administra a tesouraria, a contabilidade e as finanças da localidade. São, portanto, peças-chave para o levantamento de informações que subsidiarão a criação do instituto próprio. O consultor sugere que os futuros gestores procurem o Ministério da Previdência e os tribunais de contas municipais. Esses órgãos têm as in-

formações básicas sobre o RPPS. Os dirigentes dos institutos municipais, ao se decidirem pela criação de gestões próprias, devem aproveitar todo o conhecimento local disponível, seja junto ao servidor público mais antigo ou junto a entidades e consultorias. Levantados os dados, definidas as alíquotas, a reserva técnica que viabilizará o RPPS e a gestão da base de dados dos servidores, a cidade estará apta para administrar sua previdência, com os consequentes ganhos para a comunidade local.

Certificado de Regularidade Previdenciária Quem não atende os requisitos legais pode ficar sem CRP e perder repasses voluntários da União Érika Bento Gonçalves (Publicada na edição número 1.)

O Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) completa vinte anos em 2008, mas só dez anos depois de criado ganhou contornos mais definidos. Sofreu emendas, passou por uma reforma, em 2003, e mais dois ajustes. O último foi em 2005. Mesmo assim, ainda hoje sete estados, além do Distrito Federal, não se adequaram à legislação, principalmente na gestão única do sistema. Dúvidas, dificuldades, burocracia e conflitos de interesses fazem com que os administradores fiquem à margem das novas regras, o que pode ser um péssimo negócio. Os administradores que opta-

ram pelo Regime Próprio de Previdência Social têm que manter regularizada sua situação junto ao Ministério da Previdência. Caso contrário, correm o risco de não conseguir a renovação do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP). A validação do certificado se dá a cada três meses e passou a exigir que o Executivo esteja em conformidade com as regras do RPPS. Sem o certificado, os estados ficam proibidos de receber empréstimos da Caixa Econômica Federal, do Banco do Brasil, do BNDES, e repasses voluntários da União.

Municípios não têm autonomia para criar legislação que contrarie regras obrigatórias para todo o país Estar em dia com a Previdência é, primeiramente, possuir uma lei que institua a gestão única do RPPS. Para que esta lei – tanto municipal como estadual – seja reconhecida pela Previdência, ela deve atender aos princípios constitucionais e previdenciários, que consistem, como explica a advogada Magadar Briguet, em “garantir o equilíbrio financeiro, atuarial e da contributividade”, ou seja, estabelecer regras de concessão de benefícios e alíquotas de contribuição baseadas nos cálculos atuariais, além de detalhar a forma de investimento do fundo previdenciário, sempre de acordo com a Constituição. “A autonomia do Executivo na elaboração desta lei é limitada. O município ou o estado podem determinar o percentual da contribuição do servidor, mas têm que respeitar o mínimo de 11%, como manda a Constituição. Eles po-

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Ilustração: Oneo2/Dreamstime.com

marido ou esposa, idade dos filhos, tudo – ressalta o presidente do Instituto de Previdência dos Municipiários de Ribeirão Preto (IPM), Paulo Henrique Pastori [na gestão encerrada em 2008].

dem, também, incluir todos os benefícios previdenciários. Mas não podem, por exemplo, transformar o que era benefício administrativo em benefício previdenciário. A aposentadoria do servidor não pode mais ser superior à remuneração do cargo.” Briguet, que é Conselheira Jurídica da Abipem, diz que antes da Emenda Constitucional 20, de 1998, “a administração incorporava outros benefícios ao salário do servidor” e, ao final, mesmo que oficialmente ele ocupasse um cargo médio, a aposentadoria, não raro, chegava a mais que o dobro do salário de sua função inicial. As horas extras também devem ser destacadas, esclarece a advogada. “Isso depende de cada localidade. É preciso ver se a hora extra agrega-se permanentemente ao salário do servidor e se incidem os 11% da contribuição. A lei deve definir claramente a base da contribuição. Ela deve adaptar as normas constitucionais à realidade de cada município e estado.” (Ver Conflitos à vista, página 26.)

Lista mínima de benefícios é requisito para Ministério da Previdência reconhecer RPPS

Descontar na folha e não repassar para o instituto é expediente condenável

Mestre em Seguridade Social e especialista em regimes próprios, o procurador do Rio de Janeiro André Oliveira diz que “o Ministério da Previdência só reconhece um regime próprio quando a lei que o instituiu garante aos servidores um rol mínimo de benefícios” – pensão por morte, aposentadoria voluntária, compulsória e por invalidez. Além disso, é preciso ficar atento, também, ao prazo de 90 dias entre a criação da lei e o início das contribuições. “Por isso, muitos municípios estabelecem que a lei entrará em vigor 90 dias após a publicação da mesma. É uma saída.” O gestor da previdência própria será refém do que determinar a lei que a instituiu. Por isso, o auxílio de um técnico atuarial é essencial. Quanto mais informações ele tiver, mais eficazes serão os cálculos que vão determinar as contribuições e os benefícios e, por consequência, melhor será a saúde financeira da autarquia ou do fundo responsável pelo sistema. Fazer um levantamento detalhado dos servidores é a base para este profissional. – Não adianta saber apenas quantos ativos e inativos a administração possui. É preciso saber todos os detalhes. Se é casado, solteiro, quantos filhos tem, qual a idade do

O Instituto existe desde 1994 e já se tornou o gestor único das previdências locais. Com 3.400 aposentados e pensionistas e 8 mil servidores ativos, o IPM tem uma despesa mensal de R$ 7,5 milhões com os inativos. Atualmente, a prefeitura de Ribeirão contribui com 22% sobre os ativos e, aos poucos, o IPM está conseguindo equilibrar a situação financeira. “Um dos grandes desafios nesta área é fazer com que o Executivo respeite o repasse ao fundo dos valores previdenciários. Em muitos municípios isso não acontece. Eles descontam na folha, mas não repassam para o gestor corretamente, o que prejudica financeiramente a instituição.” Pastori, que também é vice-prefeito de Ribeirão Preto [mandato encerrado em 2008], ressalta que os gestores e administradores devem obedecer, com rigor, as normas para aplicação dos recursos financeiros, acompanhar as regras do Banco Central e contar com uma boa equipe técnica. Professor de Direito Previdenciário e pós-graduado em Gestão Previdenciária, ele recomenda que o gestor faça novos cálculos atuariais a cada seis meses. Previdência Nacional 15

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Ilustração: Gabriel Luiz

Lei 9.717/98, artigo 10: 9) Em caso de extinção do RPPS, os municípios, estados, Distrito Federal e a União assumirão o pagamento dos benefícios já concedidos e os firmados antes da extinção. Emenda Constitucional 20/98: 10) Cada ente federativo deve ter apenas um gestor do Regime Próprio (parágrafo 20 do artigo 40 da CF, alterado pela EC 20/1998).

Bê-á-bá jurídico Tópicos de legislação cujo conhecimento é indispensável à administração de institutos que aderiram ao RPPS (Publicada na edição número 1.)

Qualquer cidadão brasileiro sabe que a letra da lei, neste país de aparência relaxada mas tradição formalista, é uma barreira ao exercício da cidadania. Nem sempre isso decorre da vontade de criar dificuldades para exercer o burocratismo e dele tirar proveito. Em muitos casos, os legisladores são movidos por intenções perfeitamente magnânimas. Em outros casos, recorre-se a remendos para fazer a transição da situação anterior para a nova sistemática que se pretende instituir. Mas nem sempre o resultado é o almejado. E sempre é difícil identificar o mínimo que se deve saber para agir ao abrigo das normas vigentes. Aqui vai a contribuição de Previdência Nacional, em levantamento feito pela repórter Érika Bento Gonçalves com a colaboração da advogada Magadar Briguet.

Gestão

Contribuição dos ativos

Lei 9.717/98, artigo 1º: 1) Avaliação atuarial inicial e em cada balanço (inciso I); 2) Número mínimo de segurados que garanta a cobertura de todos os riscos (inciso IV); 3) Pleno acesso dos segurados às informações sobre a gestão, além da participação nos colegiados e instâncias de decisão (inciso VI); 4) Registro contábil individual das contribuições de cada servidor e dos entes estatais (inciso VII); 5) Demonstrativos financeiros e orçamentários das despesas fixas e variáveis com os inativos e encargos sobre pensões e proventos pagos (inciso VIII); 6) Sujeito à inspeção e auditorias feitas pelo Ministério da Previdência, Banco Central e outros (inciso IX).

A alíquota da contribuição dos ativos não pode ser inferior à contribuição dos servidores federais (artigo 3 da Lei 9.717/98), que está fixada em 11% sobre a remuneração no cargo efetivo (artigo 4 da Lei 10.887/2004). Acréscimos à remuneração decorrentes de local de trabalho, de função de confiança ou de cargo de comissão não podem ser incluídos no cálculo da remuneração, exceto quando os servidores forem aposentar-se pelas regras do art. 40 da CF (por média) e por expressa opção dos servidores, caso em que essas vantagens poderão ser incluídas na base de cálculo.

Lei 9.717/98, artigo 2º: 7) Insuficiências financeiras deverão ser cobertas pelo respectivo ente federativo (parágrafo I); 8) Publicação de demonstrativo financeiro 30 dias após o fim do bimestre (parágrafo II).

Contribuição dos aposentados e pensionistas A Constituição Federal criou diferentes parâmetros de contribuição para os inativos e pensionistas federais e os dos demais entes federativos. O Supremo Tribunal Federal, porém, determinou que todos os inativos e pensionistas contribuíssem com no mínimo 11% (seguindo o ente federativo)

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sobre a parcela que exceder o limite dos benefícios previdenciários do Regime Geral (R$ 3.038,99). Caso especial – o inativo ou pensionista portador de doença incapacitante só terá que contribuir quando o benefício for maior que o dobro do limite máximo (parágrafo 21 do artigo 40 da CF, alterado pela EC 47/2005).

5)

a)

Contribuição Patronal A contribuição patronal não pode ser menor que a contribuição do servidor (11%) nem superior ao dobro desta (22%) (artigo 2 da Lei 9.717/98).

b)

Benefício da aposentadoria 1) O valor da aposentadoria dos servidores que se aposentarem pelo art. 40 da CF é obtido pela média aritmética simples das maiores remunerações correspondentes a 80% do período contributivo, desde julho de 1994 (ou desde o início da contribuição, se posterior àquela data) até a aposentadoria (artigo 1 da Lei 10.887/2004). 2) O valor da aposentadoria não pode ser menor do que um salário-mínimo e nem maior do que a remuneração no cargo efetivo ocupado pelo beneficiário. 3) A aposentadoria com proventos integrais é concedida apenas aos servidores que ingressaram no serviço público até 31.12.2003 ou que, até essa data, já tinham direito adquirido a se aposentar com integralidade (artigo 6 da EC 41/2003). 4) Os regimes próprios não po-

6)

dem conceder benefícios diferentes dos estabelecidos pelo Regime Geral (RGPS), cujo órgão gestor é o INSS (artigo 5 da Lei 9.717/98). O servidor não poderá receber mais de uma aposentadoria, exceto: Os que ocupam cargos acumuláveis, na forma da CF (parágrafo 6 do artigo 8 da Lei 9.717/98). Há, entretanto, um limite para esses benefícios, previsto no art. 37, inciso XI, da CF; O aposentado em cargo efetivo que retornou ao serviço público por concurso até 16/12/1998 poderá acumular proventos com a remuneração no cargo efetivo, mas não poderá obter uma segunda aposentadoria (artigo 11 da EC 20/98); Os regimes próprios não podem conceder outras aposentadorias especiais afora a dos professores. Somente uma lei complementar (federal) pode garantir aposentadoria especial para outros casos, como servidores que exerçam atividades de risco ou em ambiente insalubre (parágrafo 4 do artigo 40 da CF, alterado pelo artigo 1° da EC 47/2005).

Quem pode ser filiado do RPPS Somente os servidores titulares de cargo efetivo podem ser filiados ao Regime Próprio. O servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão, de livre nomeação e exoneração, assim como de outro cargo temporário ou de emprego público está vinculado ao Regime Geral (parágrafo 13 do artigo 40 da CF, alterado

pela EC 20/98). Cada ente federativo pode incluir como filiado ao RPPS os servidores estáveis – na forma do disposto no artigo 19 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) – e outros servidores que ingressaram no serviço público até a promulgação da CF (1988) e que estavam submetidos ao regime jurídico dos servidores efetivos. O servidor titular de cargo efetivo que for cedido a órgão ou entidade de outro ente da Federação permanecerá vinculado ao regime e origem (artigo 1º-A da Lei 9.717/98).

Fiscalização dos fundos e penalidades Os fundos com finalidade previdenciária, quando constituídos, estão sujeitos às normas, ao controle e à fiscalização do Banco Central. Entre elas, a realização de auditoria como parte do sistema de controle interno, que pode ser feita por equipe interna ou externa, desde que registrada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), pertencente a entidade ou associação de classe ou órgão central a que esteja filiada ou autorizada pelo BC (resolução 3.056 do Banco Central do Brasil). O gestor que descumprir a lei pode ter suspensas as verbas voluntárias da União; empréstimos e financiamentos de bancos públicos; convênios e contratos com entidades vinculadas direta ou indiretamente à União, e pagamentos devidos do INSS (artigo 7º da Lei 9.717/98). Respondem legalmente pelo RPPS os seus dirigentes e os membros dos conselhos administrativo e fiscal do órgão gestor. (E.B.G.) Previdência Nacional 17

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Ilustração: Américo Gobbo

Pisar firme Contratação de pessoal, benefícios, cadastro e recadastramento, saúde financeira e conscientização: segredos para um bom início (Publicada na edição número 2, junho/ julho de 2008.)

Depois de legalizar o Regime Próprio de Previdência Social, o gestor deve estar preparado para enfrentar novos desafios que, embora muitas vezes delicados, não são intransponíveis. Gestores experientes relacionam os principais problemas enfrentados no início da administração e o que pode ser feito para solucioná-los. As primeiras coisas a fazer são: inscrever o regime próprio no CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica), abrir uma conta bancária para receber as contribuições dos servidores e do poder executivo (patrocinador) e firmar um convênio com o Ministério da Previdência Social, para que a compensação previdenciária possa ser feita. Até aí, sem problemas. Em seguida começa a rotina de gestão.

Contratação de pessoal deve ser feita por concurso público autorizado em lei A seleção da equipe poderá ser feita por concurso público, desde que autorizado pela lei que criou o regime próprio. “O que comumente ocorre, entretanto, é que o patrocinador (estado ou município) cede servidor até a formalização deste quadro”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Instituições de Previdência Estaduais e Municipais, Abipem [mandato encerrado em 2008], João Carlos Figueiredo, também previdente da Associação Paulista de Entidades de Previdência do Estado e dos Municípios, Apeprem, e do Instituto de Previdência de Jundiaí. O ideal seria uma equipe especializada, porém “falta massa crítica previdenciária. A maioria desconhece totalmente o sistema de previdência. Por isso, todos os nossos funcionários passam por, no mínimo, três cursos: previdenciário, organizacional e de qualidade”, diz o diretor-presidente da Manausprev (Fundo Único de Previdência do Município de Manaus), Sandro Breval Santiago, que está

no instituto desde a fundação, em 1983. Em 2006, o fundo recebeu o certificado ISO 9001 de gestão de qualidade. A falta de conhecimento das questões previdenciárias também atinge os gestores. “A maioria destes passos [de gestão] é desconhecida dos novos gestores, comumente orientados pelas consultorias que prepararam a lei de criação, o plano de cargos e salários e outras providências”, afirma o presidente da Abipem. Por isso, vale a mesma sugestão: informe-se. Participe de cursos e seminários oferecidos pela Abipem, pela Apeprem e por outras associações estaduais.

Cálculos são muito prejudicados pela falta de padronização na concessão dos benefícios A falta de padronização na concessão das aposentadorias e pensões causa um emaranhado de dúvidas e cálculos. “Para mim, esta é a maior dificuldade.”, afirma Antônio Corrêa, superintendente do Serviço de Previdência e Assistência Social dos Funcionários Municipais de Indaiatuba, São Paulo, Seprev. “São muitas regras e os valores que compõem a base de cálculo e eles dependem da lei que criou o regime próprio”, explica Corrêa. Por isso é importante ter uma equipe sempre bem informada sobre as normas estipuladas pelo Ministério da Previdência Social. “Tem que investir no pessoal para garantir eficiência não só no tratamento com o público como na concessão dos benefícios”, recomenda Corrêa. Além disso, a vasta documentação exigida para a comprovação

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dos períodos de contribuição normalmente causa um enorme transtorno para o instituto e para o servidor. Para simplificar esta questão, a Fundação de Aposentadorias e Pensões dos Servidores do Estado de Pernambuco, Funape, tem como subsídio “apenas a certidão de tempo de serviço/contribuição emitida pelo Estado, inexistindo qualquer informação complementar quanto à efetiva utilização do período então apontado”, afirma o diretor-presidente da fundação, Dácio Rossiter Filho.

Instituto de Manaus oferece cursos gratuitos para atrair o servidor aposentado e atualizar cadastro Um bom cadastro é essencial para o funcionamento do regime próprio. Fazer um recadastramento dos servidores ativos e inativos requer tempo, planejamento e estrutura. O ideal é fazê-lo todos os anos. Mas como? Sandro Breval, da Manausprev, aplica um estratagema. O instituto oferece cursos gratuitos durante o mês de aniversário do servidor. “Assim, ele passa a ter interesse em comparecer ao instituto e, com isso, temos a chance de fazer o recadastramento dessas pessoas.” A eficiência desta ação é de 97%, afirma Breval. E, para os que não têm condições de comparecer pessoalmente, um telefonema resolve o problema. “É antipático pedir para um aposentado ir até o instituto para fazer o recadastramento. Às vezes, ele não tem condições físicas para isso. A nossa função é facilitar as coisas para eles e, ao mesmo tempo, garantir a alimentação do nosso cadastro.”

Saúde financeira e conscientização, ao lado de vigilância para evitar fraudes No Brasil, previdência social quase sempre está associada a déficit, o que gera desconfiança, principalmente para aquele que vai contribuir. “O rombo na Previdência Social está ligado a má gestão e fraude”, afirma Breval. “Para dificultar as fraudes, nós temos uma parceria com uma junta médica que atua com rigor na concessão de aposentadoria por invalidez, por exemplo.” Para garantir a saúde financeira do regime próprio – e consequentemente seu sucesso – o gestor deve, além de pensar nas possíveis fraudes (e como evitá-las), “ter uma boa política de investimentos e conseguir manter um equilíbrio econômico, financeiro e atuarial”, resume João Carlos Figueiredo, da Abipem. Uma consultoria financeira “traz tranquilidade para a diretoria executiva e para os conselhos administrativo e fiscal”, justifica Corrêa, do Seprev, de Indaiatuba. De acordo com o último estudo atuarial, de dezembro de 2007, o instituto, segundo Corrêa, está com um superávit de R$ 25 milhões. “Se todos os nossos servidores se aposentassem hoje, poderíamos pagar as aposentadorias e pensões para o resto de suas vidas e ainda sobrariam estes R$ 25 milhões.” A folga no caixa se deve não só à boa gestão dos recursos mas também a um acordo firmado 15 anos atrás com a prefeitura de Indaiatuba. “Tivemos uma carência de dez anos para começar a pagar os benefícios. Durante esse período, enquanto a prefeitura ar-

cava com as aposentadorias, nós praticamente só capitalizamos.” Estabelecer acordo de custeio de benefícios pode ser de grande valia para a saúde futura do fundo e nem é preciso uma carência de uma década. “Cinco anos são suficientes”, garante Corrêa.

Muitos municípios ainda têm dificuldades para receber em dia, dos estados, repasse de contribuições A parceria entre Executivo e previdência pode não ser tão agradável assim, principalmente quando se trata de previdência estadual. “Tenho conhecimento de muitos institutos que têm dificuldade para receber, do estado, o repasse das contribuições em dia”, afirma Breval, da Manausprev. Por isso, além de medidas práticas são necessárias ações que atinjam a consciência do patrocinador e do próprio servidor. “Não há dúvidas de que se houver meios que garantam a preocupação do servidor público com a segurança e manutenção do regime, e não apenas com sua própria realidade, a maior dificuldade enfrentada pelos gestores, a meu ver, estará sendo vencida, pois já se terá avançado na questão fundamental: cultura previdenciária”, diz Dácio Filho, da Funape, que possui quase 180 mil assegurados. Dácio é também auditor de Contas Públicas do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco e, por isso, sabe da importância de zelar pelo instituto. Um Regime Próprio de Previdência Social baseia-se em três regras fundamentais: equipe bem treinada, cadastro atualizado e uma boa política de investimentos. (E.B.G.) Previdência Nacional 19

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Ilustração: Américo Gobbo

Legislação

Peças que se encaixam Ministério da Previdência Social publica portarias 402 e 403, que uniformizam critérios de administração e regulamentam equilíbrio futuro dos RPPS Leonardo Fuhrmann

Ministério da Previdência Social baixou no começo de dezembro último duas portarias, a 402 e a 403, que tratam do equilíbrio financeiro e atuarial dos regimes próprios de previdência social (RPPS) de estados e municípios. Enquanto o equilíbrio financeiro de um sistema é dado pelo equilíbrio das contas correntes, o atuarial é o que garante que o fundo terá como cumprir seus compromissos no futuro. Segundo o atuário Joel Fraga, da Consultoria e Seguridade Municipal, um dos pontos relevantes da nova legislação é que a escolha das

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hipóteses para o cálculo atuarial deixa de ser uma decisão exclusiva do atuário e a responsabilidade passa a ser dividida também com representantes das unidades da Federação e o gestor do RPPS.

Padronização deverá ajudar institutos a calcular valores necessários para cobertura futura de planos

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Maioria dos RPPS adotavam tábua de mortalidade americana, que não serve para a realidade brasileira – Os agentes interessados poderão e deverão dar sua opinião, e mais: entender um pouco desta questão. As peças começam a querer se encaixar: temos agora a Política de Investimentos, que estabelece a meta atuarial, e esta terá que ser buscada, sob pena de termos que refazer o cálculo atuarial no futuro com outra taxa de juros (a máxima é de 6% ao ano). Há uma tentativa de padronização com a tábua de mortalidade do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) – explica Fraga. Tábua de mortalidade, ou tábua biométrica, é, na definição do IBGE, “um modelo demográfico que descreve a incidência da mortalidade ao longo das idades e resume, numericamente, as condições gerais de saúde de uma população”. Segundo o Ministério, trata-se de “instrumentos

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estatísticos que expressam as probabilidades de ocorrência de eventos relacionados com sobrevivência, invalidez ou morte de determinado grupo de pessoas vinculadas ao plano” de previdência. As tábuas biométricas são usadas por entidades de previdência públicas e privadas. O MPS estabeleceu, por meio da portaria 403, que todos os RPPS deverão utilizar a Tábua de Mortalidade elaborada anualmente pelo IBGE, ou qualquer outra mais avançada. A mudança deve ajudar os RPPS a dimensionar os valores necessários para a cobertura futura de seus planos, levando em conta a expectativa de vida dos participantes ativos e de seus dependentes. O secretário de Políticas de Previdência Social, Helmut Schwarzer, explicou à Agência Previdência que a mudança vai permitir que os regimes façam suas projeções com maior segurança. Ele afirma que 85% dos dois mil regimes próprios existentes no Brasil vinham adotando a tábua de mortalidade americana – AT49 –, que já estava ultrapassada.

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Foto: Divulgação

Joel Fraga

Longevidade é muito diferente em cidades com alta qualidade de vida e em cidades pobres Fraga considera que a utilização da tábua do IBGE traz vantagens em relação à tábua de mortalidade americana, por usar dados nacionais. – Em princípio, a tábua do IBGE deve corrigir problemas, embora, como é sabido, também apresente problemas, especialmente com a mortalidade infantil, em função do não registro dos nascimentos em partes do Brasil. O correto seria fazermos testes com as tábuas (chamados testes de aderência) para se demonstrar qual tábua seria a mais adequada para um determinado grupo de pessoas – propõe. Ele destaca que na previdência privada, por exemplo, não é mais utilizada a AT49, tem que ser a AT83, pois lá foi demonstrado que a mortalidade/sobrevivência se alterou nos últimos anos. Segundo o atuário, em alguns RPPS já é possível se fazer este teste, pois contam com cálculo atuarial há 10 anos. “Na prática, em alguns casos a utilização da tábua do IBGE poderá reduzir as Reservas Matemáticas e, por consequência, o plano de custeio”, acredita. Para ele, com a mudança proposta na portaria, as três partes terão de conhecer um pouco

mais da realidade de cada RPPS. “Não se pode adotar a mesma tábua de mortalidade para o RPPS da cidade gaúcha de Veranópolis, conhecida por ter uma população de alta longevidade, e para os RPPS do Norte e Nordeste do país, onde a realidade é outra. As cidades mudam pelo progresso ou falta dele, pelo nível de investimento do setor público, pelas características geográficas, e isto tem que ser levado em conta na hora do cálculo atuarial,” compara. Segundo o Ministério da Previdência Social, muitas das novas normas já eram usadas desde a portaria 4.992, de 1999. As duas novas portarias servem para consolidar a legislação existente sobre o assunto. O secretário de Políticas de Previdência Social, Helmut Schwarzer, disse à Agência Previdência que a consolidação se fazia necessária por conta das diversas alterações que a portaria original sofreu nos seus quase dez anos de aplicação. Para o coordenador geral de Auditoria do Ministério, Otoni Gonçalves Guimarães, a escolha da tábua biométrica do IBGE como referência mínima é importante também porque os dados são atualizados anualmente e há margens estatísticas para a obtenção de resultados operacionais. O próprio Ministério já a utiliza para fazer os cálculos no caso do RGPS. Segundo Guimarães, foram feitas projeções da mudança de tábuas com dois RPPS, um com 13 mil e outro com 8 mil beneficiados, e o impacto médio no montante de provisões totais foi de 4%. A portaria obriga ainda os RPPS a fazer notas técnicas atuariais que expliquem, com detalhes, os procedimentos adotados para elaboração de suas projeções de longo prazo. A primeira deve ser entregue até o dia 31 de março de 2010. O objetivo é garantir a utilização de critérios profissionais de análise e facilitar a fiscalização da administração dos fundos. A medida também unifica conceitos e procedimentos dos gestores.

Auxílio-doença, saláriofamília e saláriomaternidade terão custos apurados segundo valores efetivamente gastos O ministério decidiu que as hipóteses biométricas, demográficas, econômicas e financeiras adequadas às características da massa de segurados e de seus dependentes devem ser decididas em conjunto pela unidade da Fede-

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Helmut Schwarzer

Foto: Antônio Cruz/ABr

ração, pelo gestor do RPPS e pelo atuário responsável. Segundo Guimarães, a assinatura dos três é importante porque alia o conhecimento técnico do atuário com as informações da realidade específica dos segurados. Os benefícios de auxílio-doença, salário-família e salário-maternidade deverão ter os seus custos apurados a partir dos valores efetivamente despendidos pelo RPPS, não podendo ser inferiores à média dos dispêndios dos três últimos exercícios, exceto quando houver fundamentada expectativa de redução desse custo, demonstrada no Parecer Atuarial. Joel Fraga destaca outros pontos importantes da nova portaria: – a restrição a valores da compensação financeira para o RPPS que possua convênio ou acordo de cooperação técnica em vigor para operacionalização da compensação previdenciária com os regimes de origem; – as reavaliações atuariais com dados cadastrais posicionados entre os meses de julho a dezembro do exercício anterior ao da exigência de sua apresentação; – e a obrigatoriedade de arquivamento da avaliação atuarial na unidade gestora do RPPS. Ele aponta ainda a obrigação do atuário de fazer, nos

Quanto maior e mais antigo o RPPS, maiores são as possibilidades de surgirem problemas atuariais

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Foto: Dalmo Curcio

RPPS já em funcionamento, uma análise comparativa entre os resultados das três últimas avaliações atuariais, no mínimo, e a previsão de que, no plano previdenciário que apresentar resultado superavitário com índice de cobertura superior a 1,25, em no mínimo cinco exercícios consecutivos, poderá ser revisto o plano de custeio. O atuário estima que, apesar de não terem problemas financeiros imediatos, cerca de 95% dos RPPS estão com problemas atuariais (ver Ilusões numéricas, Previdência Nacional número 4). – Os problemas são diretamente proporcionais ao tamanho e à idade do RPPS. Ou seja: quanto maior e mais antigo o RPPS, mais problemas de equilíbrio vamos encontrar. Vide a situação da maioria das capitais e dos estados. Se o RPPS é novo (recém-criado com a onda emancipacionista de 90) os problemas são menores. Por exemplo: o município de São José do Hortêncio (RS) foi criado em maio de 1992 e faz cálculo atuarial desde a sua criação (e cumpre o cálculo). Atualmente, está com superávit técnico de mais de 28% da Reserva Matemática. Significa que tem 28% a mais do que o dinheiro de que precisaria para pagar todos os benefícios atuais e futuros. São 94 servidores ativos e cinco inativos – explica. (Ver Folga no caixa, página 66.) Os dados disponíveis mostram que não há, em geral, problema financeiro nos RPPS. Os gestores fecharam o ano passado com mais de R$ 35 bilhões de investimentos no mercado financeiro. A situação atuarial, no entanto, é bem diferente. Segundo levantamento feito em dezembro de 2007, os sistemas federal e dos estados juntos tinham a necessidade de financiamento externo, que deve ser feito pelo ente federativo.

Otoni Gonçalves Guimarães em palestra

A portaria 402 estabelece que a alíquota cobrada dos servidores públicos municipais e estaduais não pode ser inferior à que é cobrada dos funcionários da União, além de estabelecer que aposentados e pensionistas devem pagar a mesma alíquota que os trabalhadores que estão na ativa.

Só poderá haver um regime próprio para todas as categorias de servidores de um mesmo ente da Federação A portaria estabelece ainda que todas as categorias de servidores do mesmo ente da Federação devem fazer parte de um mesmo RPPS. Em muitos estados, categorias como a dos policiais militares costumavam ter um RPPS exclusivo, que, além de custear pensões e aposentadorias, garantia assistência médica e jurídica para seus associados, por exemplo. Agora, os fundos administrados pelos regimes próprios só poderão ser usados para o pagamento de benefícios previdenciários. As caixas beneficentes das diversas categorias profissionais de servidores podem continuar com os seus trabalhos sociais complementares. A alíquota paga pelo ente federativo também foi estipulada entre um mínimo que é o mesmo valor pago pelo servidor e o máximo de duas vezes a contribuição do trabalhador. A unidade da Federação fica responsável por cobrir eventuais problemas financeiros do RPPS de seus servidores. A portaria estipula ainda que os segurados têm de ter representantes nas instâncias responsáveis pela gestão do plano e autoriza a criação de uma taxa de administração para eventuais despesas, que pode ser de até dois pontos percentuais do valor total das remunerações. Este valor deve ser usado apenas para o pagamento de despesas correntes e de capital necessárias à organização e ao funcionamento da unidade gestora do RPPS, inclusive para a conservação de seu patrimônio. Mesmo que não tenha personalidade jurídica própria, o RPPS deve ter uma escrituração contábil exclusiva. A página do Ministério da Previdência na internet (www.previdencia.gov.br) tem o modelo de declaração que deve ser seguido. Os dados de todos os segurados e de seus dependentes devem ser cadastrados individualmente. O Demonstrativo dos Investimentos e das Disponibilidades Financeiras do RPPS e o Demonstrativo da Política de Investimentos também devem ser enviados à SPS.

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Legislação

Ilustração: Américo Gobbo

o t i fl n Co Advogada Magadar Briguet explica que choque entre expectativas de proventos na aposentadoria e novas disposições legais pode multiplicar ações judiciais s servidores públicos sofrem atualmente duas limitações para a fixação dos valores de aposentadoria nos Regimes Próprios de Previdência Social estabelecidos pela União, estados, Distrito Federal e municípios. Um limite é geral, o chamado “teto” constitucional da aposentadoria. O outro é pessoal, a remuneração no cargo efetivo. Esses limites foram impostos há dez anos pela Emenda Constitucional número 20, de dezembro de 1998, à Constituição Federal de 1988. A EC 20 estabeleceu que os proventos de aposentadoria não podem exceder a remuneração no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria. Na prática, a legislação impede que sejam transferidas para a aposentadoria verbas transitórias, como horas extras. Muitos entes federativos, na hora de instituir leis para os RPPS, acabaram não fazendo distinções entre as parcelas remuneratórias do cargo do servidor e as parcelas transitórias. Com isso, não excluíram da base da contribuição os valores transitórios. Alguns desses entes alteraram a legislação para adequá-la à Constituição. Nesse caso, muitos têm decidido pela devolução das quantias cobradas indevidamente. Outros editaram leis autorizando a incorporação de benefícios na atividade. E há ainda aqueles que

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permanecem com a legislação inadequada, relutando em devolver o que foi cobrado de forma indébita. Como se vê, houve decisões diferentes para o mesmo assunto e os servidores que se sentem lesados recorrem à Justiça. A matéria tem grande potencial para muitas ações judiciais. Em entrevista, a advogada Magadar Rosália Costa Briguet, que é diretora da Associação Paulista de Entidades de Previdência Municipal (Apeprem), fala sobre as polêmicas em torno dessa questão.

Vantagens tornavam ganho na aposentadoria maior do que o da ativa Previdência Nacional – No que se refere ao cálculo de proventos de aposentadoria dos servidores públicos, qual a grande mudança para a previdência social desses servidores trazida pelas emendas constitucionais? Magadar Briguet – A Emenda 20 estabeleceu um limite para a fixação dos proventos dos servidores públicos, ao dispor no parágrafo 2º, introduzido no artigo 40 da Constituição Federal de 1988, que os proventos de aposentadoria não poderiam exceder a remuneração no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria. Assim, hoje, para a fixação dos proventos de aposentadoria, os

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a t s i v t os à servidores públicos sofrem duas limitações: um limite geral, que é o denominado “teto” constitucional, e um pessoal, que é a remuneração no cargo efetivo.

Antes da Emenda 20, aposentadoria tinha natureza administrativa e não previdenciária: Estado bancava Previdência Nacional – Como eram fixados esse valores antes da mudança? Magadar Briguet – A Constituição 1988 não estabelecia nenhum limite individual para a fixação dos proventos de aposentadoria. Era comum que a legislação dos entes federativos – União, estados, Distrito Federal e municípios – estabelecesse incorporações de vantagens pecuniárias quando o servidor se aposentava. Com essa medida, o servidor ia, ao longo do tempo de sua vida funcional, incorporando parcelas remuneratórias, como horas extras, adicionais de insalubridade e periculosidade, adicional noturno, jornadas suplementares, parcelas pelo exercício de cargos em comissão ou função de confiança. Acrescidas na aposentadoria, essas parcelas resultavam em proventos com valores maiores que os vencimentos do servidor no cargo efetivo. Previdência Nacional – E por que agora há essa limitação se antes não era assim? Magadar Briguet – A Emenda Constitucional número 20 instituiu o Regime Próprio de Previdência Social dos servidores públicos, de natureza contributiva, e mediante critérios que preservem o seu equilíbrio financeiro atuarial. Isso significa que o servidor público, assim como o trabalhador da iniciativa privada, deve custear o benefício da aposentadoria que vai adquirir ao fim de sua vida profissional, de forma que as despesas com o regime mantenham, ao longo do tempo, o necessário equilíbrio com as receitas aportadas. Previdência Nacional 27

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Por outro lado, antes da EC 20 não havia essa preocupação, porque as aposentadorias – salvo para aqueles entes que adotavam o regime geral para seus servidores, ou os raros que já haviam instituído contribuição previdenciária –, os benefícios previdenciários eram totalmente custeados e mantidos pelo erário público, o que lhes dava um caráter administrativo e não previdenciário. As despesas dos entes federativos com a folha de inativos cresciam a tal ponto que comprometiam o desempenho da administração pública.

Previdência Nacional – Quer dizer que as horas extras, por exemplo, recebidas pelo servidor durante muitos anos não serão levadas para a sua aposentadoria? Na prática, dá para estimar em termos percentuais de quanto será a redução na aposentadoria do servidor? Magadar Briguet – Em geral, não, porque as horas extras não são pertinentes ao cargo público. Somente quando a lei autoriza a incorporação das horas extras na atividade elas passam a ser vantagens pessoais permanentes do servidor e, então, constituirão base de cálculo permanente da contribuição previdenciária ao regime próprio.

Previdência Nacional – A Constituição Federal ou as emendas constitucionais definiram o que é a remuneração no cargo efetivo? Quais as vantagens pecuniárias que a integram? Magadar Briguet – Não. Essa matéria, que é de natureza administrativa, deve ser disciplinada pela legislação dos entes federativos. Tratase da autonomia garantida a eles pela Carta Magna.

É difícil estimar a redução que as aposentadorias sofrerão, porque as vantagens são pessoais, não do cargo

Constituição não define remuneração. Manda observar custeio do benefício O critério norteador é o custeio do benefício previdenciário. Assim, somente o que constitui a base sempre constante da contribuição previdenciária pode ser levado pelo servidor na sua aposentadoria. Partindo dessa premissa, temos que a remuneração no cargo efetivo é constituída pelo padrão de vencimentos do cargo fixado em lei, acrescido das parcelas permanentes, relativas ao cargo (todos os titulares do cargo recebem) ou pessoais do servidor, adquiridas em sua vida funcional. Por esse conceito, excluem-se as vantagens transitórias, aquelas que o servidor recebe apenas em razão do exercício da função em determinadas situações, por exemplo de risco ou de perigo (adicional de insalubridade ou periculosidade), ou além do horário normal de trabalho (hora extra), ou por exercer cargo em comissão ou função de confiança.

É difícil falar sobre os percentuais de redução do valor dos proventos de aposentadoria, já que cada ente federativo estabelece as escalas de vencimentos de seus servidores e a forma de remuneração. Mas podemos dar um exemplo: suponha um servidor que tem um padrão de vencimentos de R$ 600,00 e recebe 20% em horas extras sobre este valor e mais 40% a título de adicional de insalubridade. Na atividade, ele recebe R$ 960,00. No regime anterior, se a lei local autorizasse a incorporação dessas vantagens por ocasião da aposentadoria, desde que ele as recebesse por, no mínimo, cinco anos, o servidor teria os mesmos R$ 960,00 como proventos. Hoje, esse servidor, receberá proventos de apenas R$ 600,00.

Desde 2004, aposentadoria é calculada pela média simples das maiores remunerações Previdência Nacional – Houve alguma outra alteração no cálculo dos proventos de aposentadoria trazida pela Emenda Constitucional número 41, de dezembro de 2003? Magadar Briguet – Sim. Ela extinguiu a fixação de proventos pela integralidade, para os servidores ingressantes no serviço público a partir de 2004 ou para aqueles que já estão no serviço público, mas se aposentarem com fundamento no artigo 40 da Constituição Federal. Esse critério foi definido em lei federal. O cálculo é feito segundo critério de média simples das maiores remunerações.

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Previdência Nacional – Estados e municípios já adaptaram suas leis a essas regras de cálculo? Existe conflito entre os servidores e os regimes próprios? Magadar Briguet – Embora os entes federativos tenham editado leis instituindo a contribuição previdenciária, muitos acabaram por não fazer distinções entre as parcelas remuneratórias e as transitórias, e acabaram, nessas leis, não excluindo essas últimas da base da contribuição. Ora, se o servidor contribuiu, nada mais justo que ele entenda ser seu direito auferir o benefício sobre o qual ele sofreu o desconto da contribuição. Daí pressionarem, em muitos municípios, para receber essas vantagens em suas aposentadorias ou para solicitar a devolução dos valores das contribuições indevidas. Previdência Nacional – O que têm feito os entes federativos em relação a esse conflito? Magadar Briguet – Alguns entes federativos têm alterado a legislação, para adequá-la à Constituição Federal, e também têm decidido pela devolução das quantias descontadas indevidamente. Alguns resolveram editar leis autorizando a incorporação de benefícios na atividade. Outros permanecem com a legislação inadequada e relutam em fazer a devolução do valor cobrado indevidamente. Assim, os servidores que se julgam lesados recorrem ao Poder Judiciário.

STJ só aceita cobrança de contribuição previdenciária que se converta em benefício Previdência Nacional – E o que tem decidido a Justiça nesses casos? Magadar Briguet – No que diz respeito à devolução do valor cobrado indevidamente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao examinar o artigo 40 da Constituição e a lei que definia a base de incidência da contribuição previdenciária dos servidores públicos federais e o benefício dela decorrente, entende que ela não deve ser cobrada sobre qualquer parcela ou verba que não vá se converter em benefício ao servidor na aposentadoria, sob pena de configuração de violação ao princípio que veda o enriquecimento ilícito. Previdência Nacional – Existe algum estudo ou estimativa de qual seria o impacto no caixa dos entes federativos se as verbas transitórias fossem incorporadas à aposentadoria? Magadar Briguet – A incorporação de verbas transitórias só seria possível se fosse alterado o parágrafo 2º do artigo 40 da Constituição Federal, que determina

que os proventos (e as pensões) não podem exceder a remuneração no cargo efetivo. Não é preciso fazer grandes estudos para saber que, considerando o caráter contributivo e atuarial estabelecido pela emenda constitucional número 20, de 1998, o impacto dessas incorporações nos recursos previdenciários seria grande. Previdência Nacional – Como é possível solucionar esse problema? Incorporar vantagens transitórias na atividade? Magadar Briguet – A meu ver, políticas remuneratórias de incorporação de vantagens pecuniárias na atividade trazem resultados insatisfatórios para o poder público. Em primeiro lugar, há o crescimento das despesas com pessoal. Em segundo lugar, é certo que, incorporadas horas extras, ou outra vantagem, por um servidor, dificilmente ele as realizará após isso. Assim, outro servidor deverá ser convocado para a realização das horas extras, que por sua vez as incorporará, e assim sucessivamente. A solução está em adotar o regime de subsídio ou remuneração única, ou com poucos acréscimos, de forma que se garanta, de um lado, base de contribuição previdenciária certa e determinada, sem exclusões, e, de outro, que o servidor contribua sobre um valor que será a referência limite para o cálculo de seus proventos.

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Fotos: Victor Soares

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Competência permanente Ministro da Previdência, José Pimentel, diz que gestão previdenciária nos estados e municípios, que melhora a cada eleição, deve ter quadro estável, com servidores tecnicamente qualificados Carlos Lopes

boa gestão no regime geral e nos regimes próprios está entre as maiores preocupações do ministro José Pimentel, que assumiu a pasta em junho de 2008 com uma série de desafios. Talvez os de maior vulto sejam a definição do planejamento estratégico até 2015, dividido em dois grandes períodos: o primeiro, de 2009 até a conclusão do governo do presidente Lula. O outro, como política de Estado, corresponde ao Plano Plurianual 2011-2015 e se destina a facilitar o trabalho do futuro governo. O ministro recebeu Previdência Nacional em Brasília, em novembro, e destacou a melhoria significativa do regime próprio dos servidores públicos. De posse de da-

A

dos estatísticos recentemente divulgados por seu ministério, Pimentel constata que, aliado à boa gestão, está havendo um consistente processo de capitalização. Para tanto, cita a evolução dos ativos dos RPPS, que saíram de R$ 21,77 bilhões em 2005 para R$ 31,15 bilhões em 2007. A renovação do quadro de gestores municipais, decorrente das eleições de outubro, não preocupa o ministro, que aponta a melhoria da gestão como uma tendência verificada tanto na eleição de 2000 quanto na de 2004. Pimentel, no entanto, ressalta a necessidade de melhorar não só a qualidade da gestão, mas

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Cobertura previdenciária hoje alcança 65% da população brasileira acima de 16 anos. Em 1991, eram 52% a certificação da capacidade e da qualificação desses gestores, que devem constituir um quadro permanente, técnico e profissional. Confira os principais trechos da entrevista com o ministro da Previdência Social. Previdência Nacional – O Ministério da Previdência divulgou recentemente um quadro estatístico referente ao regime geral e aos regimes próprios de previdência. O que mais chama a atenção nesses dados? José Pimentel – No Regime Geral da Previdência Social, é a ampliação da cobertura previdenciária. Nós temos, hoje, 65% da população brasileira acima de 16 anos de idade com cobertura previdenciária. Se voltarmos a 1991, tínhamos apenas 52%. O outro fator que chama muito a atenção é a ampliação da cobertura dos regimes próprios. Na União, temos 1,118 milhão de ativos, 529 mil inativos e 448 mil pensionistas, totalizando cerca de 2 milhões. Já nos estados nós temos 2 milhões de ativos, 1,144 milhão de inativos e 384 mil pensionistas, totalizando 4,322 mi-

lhões. E 1.900 municípios têm regime próprio, totalizando 2,15 milhões de servidores em atividade, 401 mil inativos e 151 mil pensionistas. Portanto, em junho de 2008 tínhamos 9,128 milhões de trabalhadores com cobertura no regime próprio. Previdência Nacional – Esses dados estatísticos vão nortear a definição de políticas estratégicas para o setor no período de 2009 a 2015. Quais devem ser as linhas mestras da atuação governamental nos próximos anos? José Pimentel – Nós estamos concluindo o planejamento estratégico para 2009-2015 dividido em dois grandes períodos: o atual Plano Plurianual, de 2009 a 2011, e o Plano Plurianual 2012-2015, como política de Estado, para que o governo a assumir em janeiro de 2011 encontre esse planejamento. Esperamos que isso facilite a boa gestão da previdência pública brasileira – o regime geral, um forte posicionamento sobre o regime próprio, a previdência complementar e o regime especial dos servidores militares. Temos três grandes olhares. Um grande olhar é para a boa gestão, seja nos regimes próprios, envolvendo os municípios, os estados e o Distrito Federal, seja no regime geral. Outra grande preocupação é com a previdência complementar, com uma série de regras que assegure a boa governança e, acima de tudo, com a transparência desse sistema. O terceiro olhar é para a ampliação da cobertura previdenciária, com a sustentabilidade do sistema.

‘Regime próprio tem tido melhoria significativa de 1999 para cá e já tem ativos superiores a R$ 31 bilhões’

Previdência Nacional – O senhor tem trabalhado para desarmar verdadeiras “bombas” montadas no Congresso Nacional na forma de projetos relativos ao regime geral. A sua queixa é uma queixa antiga dos governos: aumento de despesas sem as correspondentes verbas de custeio. Como tem se dado o entendimento entre governo e Congresso? José Pimentel – O Congresso Nacional tem todo o direito constitucional de fazer as mudanças que achar razoável no sistema previdenciário, mas tem o dever de

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Formar poupanças em cada ente do pacto federativo e ter servidores especializados na gestão indicar a fonte de custeio desses novos benefícios. Este é o debate que estamos fazendo com o Congresso. Previdência Nacional – Seria, então, fundamental manter o caráter continuado da redução do déficit no regime geral de previdência, beneficiada pelo crescimento do emprego formal, por medidas de formalização do trabalho e por medidas de gestão? José Pimentel – Nós temos feito um conjunto de ações para dar sustentabilidade aos sistemas que compõem a previdência brasileira. A previdência complementar está em um processo bastante avançado de boa governança e de sustentabilidade. O regime próprio dos servidores públicos tem tido uma melhoria significativa de 1999 para cá. Se nós observarmos, eles hoje têm um ativo superior a R$ 31 bilhões. Para se ter uma idéia, em 2005 o ativo dos regimes próprios dos municípios e dos estados somava R$ 21,77 bilhões, e, em 2006, R$ 25,06 bilhões. Portanto, está havendo um processo de capitalização conjugado com uma boa gestão. Já no regime geral, que tem 26 milhões de aposentados e pensionistas, nós estamos fazendo a separação da contabilidade entre o regime urbano e o segurado especial do regime rural. No ano de 2008, o regime urbano deverá ter necessida-

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de de financiamento de mais ou menos R$ 2 bilhões e caminha para ser superavitário. Por natureza, o regime do segurado especial será sempre subsidiado pela sociedade. Previdência Nacional – Que importância o senhor atribui aos regimes próprios de previdência? José Pimentel – A primeira grande importância é a cobertura previdenciária de servidores públicos, sejam eles municipais, estaduais ou da

Grupo de funcionários estáveis, com qualificação técnica, precisa garantir o dia-a-dia dos institutos

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União. O segundo ponto para o qual precisamos chamar a atenção é a formação de poupanças em cada ente do pacto federativo que permita gerir recursos aplicando em títulos públicos ou em ações definidas previamente pelos órgãos controladores. O terceiro aspecto é a formação de servidores públicos especializados em gestão previdenciária. É importante a ampliação da consciência da necessidade da boa gestão da previdência com repercussão no regime próprio e no regime geral.

tor é a constituição de um grupo de servidores públicos estáveis para conduzir o dia-a-dia desse sistema. Isso porque o prefeito ou a prefeita muda e nós precisamos de um quadro permanente, técnico e profissional, para administração e condução dos regimes próprios. Esse sistema tem melhorado muito, mas precisamos continuar essa forma de especialização.

Teto máximo de remuneração, agora de R$ 24,5 mil, vinha sendo tentado desde a Constituição de 1824

Previdência Nacional – Diante do universo de municípios brasileiros, como é visto pelo Ministério da Previdência o fato de haver 1.900 municípios com regime próprio. É um número razoável? José Pimentel – Nós temos 5.564 municípios no Brasil. O constituinte de 1988, ao definir o sistema previdenciário brasileiro, assegurou o regime geral, o regime próprio, a previdência complementar e a previdência dos militares. Portanto, é um mandamento constitucional e fica a critério de cada gestor público municipal optar pelo regime próprio ou pelo regime geral. Previdência Nacional – Na sua avaliação, o que precisaria ser melhorado no âmbito dos regimes próprios? José Pimentel – A melhoria da qualidade da gestão e a certificação da capacidade e da qualificação dos gestores para gerirem bem o regime próprio da Previdência. O segundo fa-

Previdência Nacional – Agora mesmo, com a realização das eleições municipais, vamos ter muitas mudanças no comando dos municípios. José Pimentel – Esse sistema foi constituído, em sua ampla maioria, a partir de 1999. Agora, estamos tendo a terceira eleição – anteriormente tivemos 2000 e 2004. Nesse processo, o que temos visto é uma melhoria na gestão. Previdência Nacional – O senhor foi relator na Câmara da Reforma da Previdência em 2003 e em 2005. Que lições o senhor tirou do encaminhamento da reforma da Previdência? José Pimentel – O primeiro registro foi a criação de um teto máximo nacional de remuneração. Isso vinha sendo tentado no Brasil desde a Constituição de 1824 e somente com a Emenda Constitucional 41, de 2003, foi

Futuros servidores públicos terão teto de aposentadoria igual ao do regime geral

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possível fixá-lo. Hoje, o teto é de R$ 24,5 mil. A segunda questão é a diminuição do déficit dos regimes próprios, em especial da União. Estamos tendo uma redução significativa desse déficit ano a ano. Em terceiro lugar eu citaria o aumento da idade média de aposentadoria no regime próprio. No caso concreto da União, em 2003 os homens se aposentavam, em média, aos 57 anos de idade. Hoje, a média está em 61 anos. As mulheres, que se aposentavam, em média, aos 54 anos, hoje estão em 58 anos. Quando se pega o fator previdenciário, no regime geral, a idade média para receber 100% da média das 80 maiores remunerações, de 1994 para cá, está em 63 anos de idade para os homens e 59 anos para as mulheres. Previdência Nacional – Qual foi a redução do déficit obtida? José Pimentel – Em 2003 estávamos comprometendo 2,7% do PIB nos regimes próprios, índice que caiu para 2,2% em 2007. O regime geral correspondia a 1,6% do PIB em 2003, foi para 1,75% em 2007 e deve ser reduzido a 1,5% em 2008. Previdência Nacional – Que outros objetivos foram atingidos com a reforma? José Pimentel – Nós estamos trabalhando para a implantação do fundo de previdência complementar do servidor público, que é o projeto de lei 1.992 de 2007. O projeto está na Câmara e é relatado pelo deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP). O que estamos fazendo é uma aproximação do regime próprio com o regime geral, para que as regras sejam semelhantes. O projeto vem nesse sentido e deve colocar as balizas para estados e municípios.

Cresce o recolhimento das contribuições patronais e dos trabalhadores, no regime próprio e no regime geral Previdência Nacional – Implantada a previdência complementar, o Poder Público pode limitar as aposentadorias ao teto do regime geral, não é isso? José Pimentel – Isso vai valer para os futuros servidores públicos, que terão as mesmas regras do regime geral.

Gerações atuais precisam entender que o número de filhos por família caiu muito, enquanto aumenta a longevidade Previdência Nacional – O senhor acredita que tenha melhorado a compreensão das empresas, dos governos estaduais e das prefeituras a respeito da necessidade de cumprir seus compromissos previdenciários, do ponto de vista da melhoria do ambiente de negócios e do desempenho administrativo do Poder Executivo em seus diferentes níveis? José Pimentel – Sim. Se observarmos a empregabilidade, o recolhimento das contribuições patronais e dos trabalhadores, no regime próprio e no regime geral, é crescente. Tanto é verdade que se tem, no caso do regime próprio, o aumento das reservas, e, no regime geral, a diminuição da necessidade de financiamento. Ao lado disso, temos feito um conjunto de ações no sentido da educação previdenciária. O Simples nacional, que foi implantado em julho de 2007, tem contribuído bastante para esse processo, até porque desonera em 100% a contribuição patronal sobre a folha e traz para um percentual sobre o faturamento. Agora, estamos criando a figura do MEI (microempreendedor individual). Com isso, queremos trazer para a formalidade algo em torno de 10 milhões de empreendedores – o feirante, o pedreiro, o encanador, etc. – que estão na informalidade. Eles terão um cadastro único nacional, valendo para municípios, estados e União. Têm imposto zero para o governo federal e contribuirão com R$ 1 a título de ICMS para os estados. E têm cobertura previdenciária com aposentadoria por idade, licença-saúde e licençamaternidade, além de a família ficar protegida com pensão por morte e auxílio-reclusão. Para isso eles

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contribuirão com 11% sobre o salário mínimo. Esse benefício é de um salário mínimo. Previdência Nacional – Como transpor a distância existente entre aquilo que se supõe hoje serem as necessidades e os direitos das futuras gerações de trabalhadores, de um lado, e, de outro, as resistência a mudanças oferecidas pelos grupos de segurados que têm alta capacidade de defender seus interesses presentes? José Pimentel – Existem dois temas que precisamos sempre observar. Um é a diminuição da quantidade de filhos nas famílias. Nas décadas de 40, 50 e 60 nós tínhamos uma média de seis filhos por família. Em 2008, temos em torno de

dois filhos por família. A tendência é continuar diminuindo. Os dados estatísticos demonstram que, a partir de 2030, a população brasileira começa a encolher. O segundo tema é a longevidade, seja em função do aspecto alimentar, das prevenções, saúde publica, saneamento básico... Isso está levando o homem, onde há melhores condições de vida, para uma vida média de 83 anos e a mulher para 87 anos. Hoje, essa idade é de 79 anos para o homem e de 82 anos para a mulher. Atualmente, o sistema que temos compromete 7,1% do PIB com os benefícios previdenciários de 26 milhões de pessoas no regime geral e 3,8% do PIB nos regimes próprios, para três milhões de beneficiários. Isso precisará ser compreendido por todas as famílias brasileiras para que possamos, regularmente, fazer esse planejamento.

Tesoureiro do PT, relator do Orçamento da União O ex-ministro Waldeck Ornélas (governo FHC, 19982001) criticou a alta rotatividade dos ministros da Previdência desde que ele mesmo deixou o cargo (Sem continuidade, Previdência Nacional número 3). Até a posse de José Pimentel, mais de um ministro por ano, em média, ocupou a pasta. Ao convidar Pimentel, o presidente Lula procurou assegurar-se de que ele ficará até o fim do mandato presidencial, que termina em 2010. Lastro político não falta a Pimentel. No auge da crise do mensalão, em 2005, foi a ele que o Partido dos Trabalhadores recorreu para substituir o tesoureiro da agremiação, Delúbio Soares, depois que, acusado de ser um dos principais operadores do “valerioduto” – suposto esquema de financiamento irregular de atividades políticas –, Delúbio se afastou. Pimentel ficou no cargo alguns meses, até que Delúbio foi expulso do partido e um novo tesoureiro, Paulo Ferreira, foi nomeado. Pimentel exercia o quarto mandato consecutivo de deputado federal pelo PT do Ceará quando assumiu o Ministério. Em 2007, foi o relator-geral do Orçamento da União para 2008. Em 2003 e 2005, foi relator da Comissão Especial de Reforma da Previdência. Nascido em Picos, no Piauí, em 1953, José Barroso Pimentel é advogado, sindicalista e bancário do Banco do Brasil.

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Investimentos

Duas faces da mesma crise Fundos de investimento tiveram perda de janeiro a novembro, mas aplicações em previdência aumentaram e as reservas podem passar de R$ 145 bilhões em 2008

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á duas formas de observar os fundos de previdência neste momento de crise econômica. Do ponto de vista do desempenho, dificilmente eles devem atingir sua meta de rentabilidade este ano. Da perspectiva da captação, no Brasil eles vêm andando na contramão da turbulência que espanta os investidores das bolsas de valores pelo mundo e espalha o temor de uma recessão global. É isso que mostram os números. Enquanto a indústria de fundos de investimento como um todo amarga saques de R$ 31 bilhões de janeiro a novembro, os fundos de previdência aberta tiveram no mesmo período uma captação positiva de R$ 22,6 bilhões. É um aumento de 19% em relação ao mesmo período do ano passado.

H

Campanhas convencem poupadores a ter objetivos mais demorados e engordam, entre outros, planos para crianças Tome-se a captação desse tipo de investimento apenas no mês de setembro, período em que a crise mundial se aprofundou. Segundo dados da Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), os 9 milhões de brasileiros que possuem uma previdência complementar depositaram R$ 2,4 bilhões nos fundos de previdência aberta. É um crescimento de 23,2% sobre os R$ 1,9 bilhão captados no mesmo mês do ano passado. Com esse desempenho, os fundos de previdência aberta acumulam reservas de R$ 136 bilhões até novembro, um crescimento de 20,6% em relação a 2007. E como nos últimos dois meses do ano a tendência histórica é

de um aumento de captação, por causa do décimo terceiro salário ou dos bônus recebidos das empresas, a expectativa é que as reservas cheguem a R$ 145 bilhões, ou um pouco mais, em 2008. Mas o que explica o comportamento dos aplicadores que continuaram depositando nos fun-

Mesmo diante de boas oportunidades criadas pela desvalorização de ações promissoras, muitos se abrigam na cautela dos de previdência aberta nesse período de mercado nervoso? Há algumas razões. Uma delas é que os administradores intensificaram as campanhas de conscientização dos investidores desde que a sangria financeira começou. A idéia é mostrar que um fundo de previdência é diferente de uma aplicação qualquer, voltada para objetivos mais imediatos, de curto e médio prazo. A previdência, explicam, é uma reserva que vai ajudar o investidor a realizar seu sonho no futuro. Pode ser a compra de uma casa na praia, a viagem dos sonhos ou ter uma aposentadoria mais tranqüila. Por isso, é essencial ter uma reserva sempre, seja em tempos de turbulência ou quando a maré financeira está mansa, explicam. Previdência Nacional 39

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bons ganhos obtidos na Bolsa nos últimos anos –, essa proporção está mudando nos últimos meses. Na Icatu Hartford, no primeiro semestre, aproximadamente 75% dos aportes em fundos iam para carteiras com ações. Agora, só 45% estão indo para fundos com este perfil. – Apesar das boas oportunidades na Bolsa nesse momento de baixa, são poucos os que arriscam colocar

– A idéia de ter uma reserva financeira explica o crescimento dos aportes nos fundos de previdência. É um tempo de insegurança. Por isso, a pessoa sabe que precisa poupar para obter algo no futuro. A crise acentua esse sentimento – diz o consultor Miguel Ribeiro de Oliveira. Esse tipo de campanha surtiu resultado. Bradesco, Itaú, Brasilprev, HSBC tiveram captação expressiva no mês de outubro. Algumas foram até recorde. Os planos destinados a crianças, por exemplo, foram uma das fatias que mais cresceram no bolo.

Fundos de previdência privada e de regime próprio também sofrem com a crise. Volatilidade derruba metas de rentabilidade

Depois de período longo com alta rentabilidade, temporada de oscilação não é o melhor momento para realizar perdas novos recursos em ações agora. As notícias de perdas tornam o investidor mais conservador – diz Oliveira. É no desempenho dos fundos previdência privada e nos do regime próprio que a crise econômica mostra sua cara. Eles também foram apanhados pelo furacão que sacode a praça financeira mundial. Principalmente as aplicações que têm um pé na Bolsa de Valores. Segundo a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), os fundos de previdência com ações acumulam, em média, rendimento negativo de 12%, enquanto os que aplicam em renda fixa estão no azul: apresentam rentabilidade de cerca de 10% no mesmo período. A volatilidade do mercado vai fazer com que os fundos com ações deixem de bater a meta de rentabilidade para o equilíbrio atuarial. Para isso, seria preciso ter em 2008 uma rentabilidade de 13,1%, que é o resultado do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) mais 6%. O último ano em que os fundos não bateram a meta de rendimento foi 2002, quando o INPC mais 6% chegou a 21,6%, comparado a uma rentabilidade de 16,5%.

Outra explicação para o crescimento das reservas de previdência privada é o próprio perfil desse tipo de investidor. É gente que quer fugir da gangorra das bolsas neste momento, mesmo que os analistas digam que há boas oportunidades no mercado de ações depois de uma desvalorização excessiva. Quando se olha com lupa para onde vão os depósitos de quem aplicou em previdência privada em meio ao turbilhão econômico, percebe-se que 90% dos recursos foram para a renda fixa, segundo os dados da Anbid. Embora no ano a captação dos fundos de previdência com recursos em ações esteja bastante positiva – reflexo dos 40 Janeiro/fevereiro 2009

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O Economus, fundo de previdência dos func cionários da Nossa Caixa, não teve grandes i impactos com a queda das bolsas de valores.

Merrill Lynch constatou que até 346 fundos de empresas americanas correm risco de não honrar compromissos

De acordo com o presidente da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), José Mendonça de Souza, as perdas são equivalentes à desvalorização das ações de companhias onde os fundos têm recursos aplicados. – Passamos muito tempo tendo retorno considerável. Investimentos em renda variável oscilam. O que não é recomendável é realizar a perda neste momento – diz ele. Para se ter idéia do impacto da turbulência econômica nas aplicações dos fundos de previdência, até outubro houve perda de R$ 20 bilhões sobre o total de ativos (de R$ 440 bilhões). Só na Previ, o fundo de previdência do Banco do Brasil, que tem 60% de seus recursos em ações,o impacto foi entre R$ 10 bilhões e R$ 15 bilhões sobre o ativo de R$ 128 bilhões. O Petros, fundo de previdência da Petrobras, com patrimônio de R$ 40 bilhões e 125 mil participantes, dificilmente cumprirá

Quem tem parcela pequena investida em ações está conseguindo preservar resultados de longo prazo sua meta de rentabilidade. Houve uma redução de R$ 1,5 bilhão entre o primeiro trimestre e o terceiro. Mas o fundo vem diminuindo sua exposição à renda variável. No começo do ano, 31% dos recursos eram aplicados em ações. Agora são 28%. Nos últimos cinco anos, o Petros rendeu, em média, inflação mais 12%, bem acima de sua meta de rentabilidade anual. O Petros já está comprando ações de empresas mais sólidas, como Vale, Petrobras e empresas do setor de energia, aproveitando a queda de preços no pregão.

O fundo tem 10% de seu patrimônio em rend variável. Em época de crise, as perdas não da comprometem os resultados de longo prazo. No Brasil, os fundos de previdência podem aplicar até 49% de suas reservas em ações. Mas dificilmente chegam a esse nível, o que acaba sendo uma prevenção contra perdas muito elevadas em época de turbulência. Nos EUA, onde os fundos podem aplicar até 100% em papéis negociados na Bolsa na busca de um retorno melhor do que o obtido com juros, o impacto da crise foi terrível. Um levantamento da consultora Merrill Lynch aponta que até 346 fundos de empresas americanas correm o risco de não ter dinheiro para honrar os compromissos com os participantes por culpa da queda das ações das companhias em que investiram. No total, segundo a Merrill Lynch, poderiam faltar US$ 640 bilhões aos fundos de pensão. Um abismo se considerados os superávits obtidos por esses fundos em 2000 e 2001, de US$ 215 bilhões e US$ 500 bilhões, respectivamente. Mais de 470 mil trabalhadores já perderam as Previdência Nacional 41

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suas aposentadorias. No Brasil, não há sinais de uma situação como essa. Nos fundos de previdência brasileiros, 60,5% dos recursos estão em renda fixa, 33% em renda variável, outros 2,7% em imóveis, 2,4% em empréstimos aos próprios participantes, e 1,4% em outras modalidades. A renda

variável leva R$ 145,4 bilhões dos R$ 440 bilhões. Se a economia crescer entre 3,5% e 5% em 2009, como apontam as previsões dos economistas, a tendência é que as ações voltem a ganhar brilho e a fatia dos fundos de previdência aplicada em renda variável tenderá a crescer. Quem tiver comprado na baixa, como agora, poderá se dar bem.

Desencontros Fundos mostram captação positiva e desempenho negativo

Previdência referenciado DI Patrimônio Líquido R$ 1,3 bilhão Rentabilidade no ano 9,68% Captação no ano -35,87% Previdência renda fixa Patrimônio Líquido R$ 94,9 bilhões Rentabilidade no ano 10,15% Captação no ano 3.020% Previdência renda fixa (médio e alto risco) Patrimônio Líquido R$ 83 milhões Rentabilidade no ano 10,66% Captação no ano 29,4% Previdência balanceados Patrimônio líquido R$ 5,5 bilhões Rentabilidade no ano -19,17% Captação no ano 1.041% Previdência multimercado sem renda variável Patrimônio líquido R$ 80 milhões Rentabilidade no ano 9,73% Captação no ano -91,77% Previdência multimercado com renda variável Patrimônio líquido R$ 4,1 bilhões Rentabilidade no ano -12,01% Captação no ano 2.194% Previdência cambial dólar Patrimônio líquido R$ 5 milhões Rentabilidade no ano 21,64% Captação no ano -4,36%

(Até 17 de novembro, dados da Associação Nacional dos Bandos de Investimento - Anbid)

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Ilustração: Américo Gobbo

Modelos de Gestão Rússia

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O gosto amargo do desamparo Num país em que o Estado foi tudo durante sete décadas, debilidade crescente da previdência faz com que velhice jogue muitos russos abaixo da linha da pobreza Jorge Félix

esmo em dias de muito frio, é comum ver nas ruas de Moscou – e de outras cidades russas – idosos vendendo especiarias típicas, como pasta de cogumelos negros ou caviar. Eles não montam barracas, como camelôs brasileiros. Em geral, ficam em pé e seguram suas escassas mercadorias expostas a poucos interessados. Este fenômeno começou após o colapso da União Soviética, no início da década de 1990, com a crítica falta de alimentos e produtos básicos, e perpetuou-se até hoje menos por culpa da oferta – apesar de ela ser ainda inferior à demanda – e muito por imposição de uma renda em acelerado declínio. Embora a Rússia amargue uma expectativa de vida só verificada em países nada emergentes – na última década, na contramão da tendência mundial, caiu de 64 anos para 58, com peso maior para os homens devido à elevação do número de suicídios, assassinatos e alcoolismo –, alguns desses idosos têm, às vezes, mais de 75 anos e nunca imaginaram continuar trabalhando na velhice. No entanto, com um sistema de previdência social debilitado após a transição para o capitalismo, envelhecer, para os russos é, cada vez mais começar a viver abaixo da linha da pobreza. – Dado o aumento dos custos e do número de idosos, é muito difícil desenvolver um sistema que seja acessível e

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Pela primeira vez na história, aposentados russos têm benefício abaixo do nível de subsistência também garanta um padrão de vida adequado – diz John Round, doutor em Economia, professor da Universidade de Birmingham, na Inglaterra. Round entrevistou aposentados em várias cidades e constatou que o problema do sistema russo, com cobertura bastante ampla, é o baixo valor dos benefícios pagos. – Na maioria dos casos, a aposentadoria não reflete os custos do dia-a-dia e assim os aposentados precisam continuar a trabalhar – afirma. Previdência Nacional 45

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Redução da demanda por petróleo e gás, cujas exportações financiam déficit da previdência, cria problemas De acordo com estudo de Evsey Gurvich, do Ministério da Fazenda da Rússia, o valor real dos benefícios em 2001 era 47% daquele de 1990. Essa perda excedeu, de longe, constatou Gurvich, a queda da renda disponível no país (38%), embora tenha ficado abaixo da redução real dos salários dos trabalhadores ativos (53%). Entre os fatores causadores do encolhimento estão a crise financeira do final da década de 1990 e a inflação persistente, ainda em seus 9,8%. Os aposentados russos entraram no século XXI com um benefício, pela primeira vez na história, abaixo do nível de subsistência, conforme Gurvich destaca em seu texto. Segundo Round, a crise financeira mundial deve agravar ainda mais o problema previdenciário na Rússia em alguns aspectos, sobretudo com a

recessão nos Estados Unidos e na Europa diminuindo a demanda por petróleo e gás – commodities que representam quase metade das exportações russas e, até agora, custeavam o déficit do sistema de previdência, equivalente a 1,5% do PIB. De 2001 a 2006, a economia russa cresceu em média 6,2 % ao ano, 43,5 % em termos acumulados. (No Brasil, o crescimento médio no mesmo período foi de 2,90 %, e o acumulado, de 18,7%.) Essa pujança econômica conseguiu mitigar algumas deficiências, embora o desemprego ainda permaneça em torno de 7%. O fenômeno do envelhecimento populacional tem sido mais agudo na Rússia, entre todos os países do grupo Bric, já impondo uma relação de dependência de um aposentado para cada 1,3 trabalhador e com 17% da população acima dos 60 anos. Diferentemente de Brasil, Índia e China, a Rússia apre-

Em 2007, menos 7 milhões de habitantes do que em 1990. Incentivo ao segundo filho ainda não deu resultado

A catedral de São Basílio, na Praça Vermelha, em Moscou

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Governo distribui remédios para aposentados, mas muitos pagam máfia de intermediários para recebê-los tavam à espera do resultado das urnas. A reforma de 2002 introduziu três pilares: básico (igual para todos), pilar de contribuição (com desconto de 28% para sustentar o pilar básico) e um pilar mandatário, no qual o contribuinte escolhe sua forma de aplicação – onde o governo esperava a migração para o setor privado. Como isso não ocorreu, a dinâmica demográfica servirá de desculpa, acreditam os especialistas, para Putin elevar as regras de elegibilidade e aumentar a idade mínima, já que 27% dos aposentados russos conseguem o benefício com cerca de 40 anos de idade – como é o caso dos militares e de outras profissões de risco. Tanto Gurvich quanto Round destacam alguns aspectos positivos do sistema previdenciário russo, como a cobertura abrangente e a idade

Foto: Vladimir Fofanov/sxc.hu

senta queda na taxa de fecundidade há muitos anos e sua população caiu de 148 milhões em 1990 para 141 milhões em 2007. Até 2025, as projeções indicam que a população de 15 a 64 anos, padrão mundial para a idade economicamente ativa, diminuirá em 16%. A mortalidade aumentou de 13,6 por mil em 1998 para 16,4 em 2003, reduzindo-se em 2006 para 15,2. O governo russo, recentemente, adotou ações de incentivo ao segundo filho, mas ainda sem resultado significativo. Esses índices, segundo especialistas como Round e outros acadêmicos, são os principais resultados da política contracionista verificada na fase pós-soviética. Em 1998, o total de gastos do governo chegava a 42,5% do PIB, mas em 2006 caiu para 35,4%, atendendo às regras de equilíbrio fiscal impostas por organismos multilaterais como o FMI e o Banco Mundial. A restrição implicou corte de investimentos em saúde e educação e uma reforma da Previdência, em 2002, com a intenção de incentivar a poupança privada. No entanto, o país criou o sistema privado com uma lei de duas páginas assinada por Boris Yeltsin em 1992, sem oferecer nenhuma segurança. Resultado: mesmo com a reforma, 98% das aposentadorias ainda são administradas pelo Estado. A imprensa russa tem previsto que, com a vitória eleitoral que deu a presidência a Dmitri Medvedev e garantiu a manutenção do poder nas mãos de Vladimir Putin, o governo tratará de adotar medidas impopulares que es-

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Sistema se tornou mais heterogêneo e acentuou diferença entre elite e marginalizados no período pós-soviético Um dos maiores problemas do sistema de previdência russo é estar baseado no conceito de renda de subsistência. Segundo Round, um conceito bastante vago. Outro problema é que após a reforma de 2002 o governo criou vários tipos de pensionistas, tornando o sistema muito mais heterogêneo em todos os aspectos, sobretudo em termos de valores e regras de elegibilidade. “Isso acentuou a diferença entre os vencedores e os perdedores da fase pós-soviética, ou entre a elite e os marginalizados”, afirma Round. Como em outros sistemas reformados, os militares conseguiram conservar intactas suas regras soviéticas. Em seu trabalho “A construção da pobreza na Rússia pós-soviética”, o economista sustenta que atualmente 20% da população russa, segundo os dados oficiais, estão na linha de pobreza, ou seja, cerca de 30 milhões de russos. Porém, se for levado em consideração que, mesmo ainda sendo importante para a sobrevivência da população mais pobre, a previdência social passou a dar benefícios muito baixos, o número de pobres seria acentuadamente maior. “É necessária uma reconfiguração da construção do Estado e uma nova quantificação da pobreza

Incentivo do governo à informalidade só faz agravar a questão previdenciária a médio e longo prazo para que o crescimento econômico possa levar à meta de redução da pobreza no país”, diz Round, que destaca em seu estudo a grave situação dos idosos residentes nas áreas rurais e o incentivo do governo à economia informal, que só faz agravar a situação da previdência a médio e longo prazo. Round cita outros economistas e acadêmicos que consideram o crescimento da economia russa nos últimos anos como uma “economia virtual”, “uma involução econômica” e um “capitalismo caótico”. Na visão do professor inglês, as ações do governo no campo social – incluindo a previdência – têm colaborado para quebrar as relações do indivíduo com o Estado e agravado a percepção da crise demográfica

Foto: Marcin Tusinski/sxc.hu

relativamente baixa para eleger-se à aposentadoria: 60 anos para homens e 55 para mulheres. No entanto, o governo considera que o benefício pago é suficiente porque parte do pressuposto de que muitos serviços estão disponíveis para os aposentados, sobretudo o fornecimento de remédios gratuitos. “Esses subsídios, como os de transporte e telefone, são um vestígio do período soviético e não são feitos testes para saber quem pode recebê-los. O sistema é ineficiente e o idoso precisa, como muitos entrevistados nos falaram, pagar propina para receber medicamentos de uma chamada máfia dos medicamentos”, conta Round.

Estátua de Lênin, fundador do Estado soviético

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Entrevista Roberto Pasqualin

Roberto Pasqualin

Colcha de retalhos Advogado diz que propostas de mudanças tributárias não têm envergadura de reforma e que tramitação legislativa sempre provoca deformações

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Em 2003, governo Lula fez a primeira tentativa de aprovar uma reforma tributária e obteve resultados pálidos Previdência Nacional – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está de fato empenhado em promover uma reforma tributária? Roberto Pasqualin – O governo Lula quer muito fazer essa reforma. Em 2003, na primeira tentativa, só conseguiu prorrogar a CPMF (extinta pelo Congresso no final de 2007) e a DRU, e introduzir algumas autorizações para cobrança do PIS e da Cofins em importações. Naquela ocasião, não conseguiu aprovar um ICMS nacionalizado. A tentativa de 2008 foi costurada durante um ano e meio por Bernard Appy, que nesse meio tempo (desde julho de 2008) deixou de ser secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e passou a ser assessor especial do ministro Guido Mantega para reformas

econômico-fiscais. Appy apresentou um projeto inicial de grande envergadura. Previa a unificação do IPI, do PIS, da Cofins e da Cide, na esfera federal, e, na esfera dos estados e municípios, a unificação do ICMS e do ISS. Isso mexia com prefeitos e governadores. Appy percorreu o país apresentando as propostas em Power Point. Daí nasceu a brincadeira de que nos diversos grupos com os quais ele debateu eram feitas “emendas ao Power Point”. Ele foi à Amcham-SP logo no começo de sua missão.

Primeiro caiu a mudança do ISS. Depois, a do ICMS. No final, expectativa se reduziu a tributos federais Previdência Nacional – Como evoluíram as expectativas, ao longo dessa peregrinação? Roberto Pasqualin – No começo, Appy dizia: “Acho difícil passar o ISS unificado”. Depois, passou a dizer: “Acho difícil passar o ICMS nacionalizado”. Nos últimos tempos, havia reduzido

Bernard Appy apresenta seu Power Point em outubro de 2008

Foto: Antônio Cruz/ABr

proposta de reforma tributária mais uma vez adiada, agora para 2009, é uma “colcha de retalhos”, na opinião do advogado tributarista Roberto Pasqualin. Entre outras razões porque, durante a tramitação, esse tipo de legislação sempre sofre profundas alterações. “Uma medida provisória na área tributária chega ao Congresso com três artigos e, quando se transforma em lei de conversão, tem 60 artigos”, diz Pasqualin. E isso não acontece apenas porque parlamentares, para atender a diferentes interesses de instâncias da administração pública, introduzem novos dispositivos. O setor privado também interfere. (Ver, adiante, Imposto é política.) Na entrevista abaixo, Pasqualin, que dirige o Grupo de Trabalho da Reforma Tributária da Câmara Americana de Comércio de São Paulo, Amcham-SP, explica por que, na sua opinião, o atual esforço legislativo não irá muito longe. Ele enxerga modestas possibilidades de melhoria para a arrecadação dos estados e municípios se o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e a CSLL, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, vierem a ser unificados sob o nome de Imposto sobre Valor Adicionado, IVA. Os impostos têm que ser repartidos entre os entes federativos, ao contrário das contribuições, que vão todas para a União.

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as expectativas: “Vamos ficar só com a reforma do que é federal, unificar esses tributos”. Mas, aí, alguém disse: “As mudanças no IPI terão um efeito devastador na Zona Franca de Manaus”. E saiu fora o IPI. Ficaram o PIS, a Cofins, que já têm uma legislação praticamente unificada, e a Cide cobrada sobre combustíveis, que não é muito relevante.

Existe uma perspectiva de simplificação, mas é preciso saber até que ponto é simplificação relevante Para isso, não precisa ser feita uma reforma constitucional. Tirando o IPI, os tributos federais já são praticamente um só. A CSLL e o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica coexistem, sob uma legislação praticamente igual, e o mesmo ocorre com PIS/Cofins. Do ponto de vista do contribuinte, não se trata de reforma, mas de dar um nome novo. Previdência Nacional – Mas isso não muda nada? Roberto Pasqualin – Se tivermos um IVA federal que substitua o Imposto de Renda e a CSLL, o que isso muda? Talvez a repartição da arrecadação. Quando o tributo tem o nome de “imposto”, ele é repartido com estados e municípios. Quando se chama “contribuição”, a arrecadação vai toda para a União. Então, teoricamente, isso melhoraria as coisas para estados e municípios. Digo “teoricamente” porque uma série de disposições infraconstitucionais pode-

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riam mudar o resultado, como aumento de alíquota, ou mudança da base de cálculo. Previdência Nacional – Por que o senhor diz que não se trata de reforma constitucional? Roberto Pasqualin – Porque para isso basta legislação ordinária. Quando Bernard Appy diz que “pelo menos a parte federal sai”, não propõe uma reforma tributária no sentido de mudar o sistema tributário como um todo. Melhora, sim, na medida em que simplifica a legislação. Mas eu pergunto: até que ponto essa simplificação é relevante? Previdência Nacional – O que o governo pretendia em 2003? Roberto Pasqualin – Dotar o ICMS de uma legislação única para todos os estados, editada pela União, com um regulamento único editado pelo Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária). Já se tem aí uma excrescência técnica, porque esse é um fórum de secretários estaduais de Fazenda. Ou seja: o regulamento para todo o país seria feito por um colegiado de pessoas mais focadas em interesses regionais. E, em geral, os estados mandam para as reuniões alguém abaixo do secretário. Havia a proposição de unificar as alíquotas, adotando cinco para o país todo. E a cobrança de todo o imposto no destino, não no local de produção. Perderiam os estados produtores que não são grandes importadores. Se o estado é também grande importador, ou seja, grande consumidor, não perderia tanto.

Reforma do ICMS, imposto que mais arrecada no país, acabaria com a guerra fiscal entre estados

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Previdência Nacional – Como é feita a cobrança hoje e como seria com a nova legislação? Roberto Pasqualin – Hoje há uma antecipação para o estado produtor. Tomando-se um imposto médio de 17%, o produtor retém na origem de 7% (Norte e Nordeste) a 12% (Centro-Oeste, Sudeste e Sul). A diferença é cobrada no destino. O que se propõe é que sejam cobrados 2% na origem e o resto no destino. Não se sabe quanto, porque a alíquota ainda não foi definida – embora não se acredite que ela seja modificada. Previdência Nacional – Essa mudança não seria importante? Roberto Pasqualin – Seria. É uma reforma tributária para o ICMS, o imposto que mais arrecada no país. Acaba com a guerra fiscal, ao circunscrever a 2% a margem de manobra dos estados para conceder isenções ou outros benefícios. Mas é a mesma que deixou de ocorrer em 2003. Trata-se do mesmo conceito geral.

Na segunda metade do mandato de Fernando Henrique houve uma grande discussão sobre reforma tributária Previdência Nacional – E como se chegou às proposições de 2003? Roberto Pasqualin – Ao longo do governo de Fernando Henrique Cardoso houve uma grande discussão de reforma tributária que não chegou a termo. Durante cinco, seis anos se fizeram extensos trabalhos no Congresso, liderados pelos deputados Mussa Demes – que morreu recentemente – e Germano Rigotto (depois governador do Rio Grande do Sul). Do meio para o final

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Proposta do governo para o ICMS deixa muitos pontos na sombra. E o prazo de adaptação é longo demais do governo FHC, trabalhou-se muito. Era um assunto “quente”. Se Lula tivesse conseguido fazer uma reforma tributária em 2003, isso representaria um grande cacife político para o presidente. Além disso, era um assunto que aparecia como primeira ou segunda prioridade nas enquetes feitas junto a empresas. O PT tem um projeto de reforma tributária e era uma promessa de campanha. Previdência Nacional – E por que não se aprova a mudança? Roberto Pasqualin – Dizem que são os governadores que barram. Essa mudança implica retirar do Executivo estadual – e das Assembléias Legislativas – o poder de legislar sobre ICMS. Os governadores ficariam só com a arrecadação. Hoje, cada estado tem seu próprio regulamento do imposto. Previdência Nacional – Mas a proposta do governo tem boa qualidade legislativa? Roberto Pasqualin – Tem problemas. Por exemplo, a substituição tributária na origem determinaria que, numa alíquota de 17%, 2% ficariam para o estado onde se dá a produção e 15% para o estado onde se dá o consumo. Esses 15% seriam calculados sobre o

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preço presumido de venda. Haveria um fundo de compensação para esses 15%. Seriam criadas câmaras de compensação entre estados. Quem vai gerenciar? Que poder teria o gestor dessas câmaras? Seria criada uma única câmara ou seriam criadas diferentes câmaras para compensar as transações de cada estado com os demais? Isso está derrubando a proposta. Previdência Nacional – O fato de se propor um período de 12 anos de implantação progressiva não ameniza os problemas? Roberto Pasqualin – Não. Cria um risco enorme de insegurança jurídica. Em tese, em 12 anos podem passar pelo poder três presidentes da República e três governadores diferentes... É um período muito longo. A transição deveria ser mais rápida.

“A verdadeira reforma tributária brasileira foi feita em 1965. Não tinha penduricalhos”, diz Pasqualin Previdência Nacional – Na sua opinião, já houve uma reforma tributária digna do nome no Brasil? Roberto Pasqualin – A verdadeira reforma tributária brasileira foi feita em 1965-66. Era fácil. Regime militar. Convocaram equipes competentes. O governo aprovava o que queria. Saiu a Emenda Constitucional nº 18 [à Constituição de 1946], em 1965. Uma legislação rígida. Sem penduricalhos. O Código Tributário de 1966 está em vigor até hoje. Previdência Nacional – Por que o quadro se deteriorou? Roberto Pasqualin – Começaram a colocar penduricalhos. A Constituição de 1967 deu a primeira abertura.

Vieram outras com a Constituição de 1969 [na verdade, uma emenda à Carta de 1967 que incorporava ao texto constitucional toda a legislação repressiva decretada sob a vigência do Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968]. A Constituição de 1988 também permite a incorporação de vários penduricalhos, como, por exemplo, Cide e CSLL. São figuras tributárias que reduzem a qualidade do sistema. Hoje, temos vários impostos inci-

Incidência múltipla de tributos sobre a mesma riqueza seria eliminada com imposto único para cada fato gerador dindo sobre a mesma coisa. Previdência Nacional – O senhor pode dar exemplos? Roberto Pasqualin – O imposto é um pedaço da riqueza do contribuinte que vai para o Estado. Ele é cobrado sobre a propriedade, a renda ou a venda. A propriedade é uma fonte secundária. Para que a propriedade tenha sido comprada, alguma atividade precisou gerar a renda. Mas temos IPVA, IPTU, ITR. A renda de quem adquiriu patrimônio já foi tributada antes. O mesmo acontece na venda: ISS e/ou ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide sobre combustíveis. IR da Pessoa Jurídica sobre a receita e CSLL sobre a receita com base em lucro presumido. Há uma incidência múltipla de tributos sobre a mesma riqueza. Nada mais múltiplo do que uma CPMF. Isso seria eliminado com um imposto único para cada fato gerador de imposto.

Cipoal de siglas Conheça os nomes de batismo dos principais tributos. • • • • • •

Cide: Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico. Cofins: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social. CPMF: Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (extinta). CSLL: Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. DRU: Desvinculação de Recursos da União. ICMS: Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação.

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IPI: Imposto sobre Produtos Industrializados. IPTU: Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana. IPVA: Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores. IR: Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza. ITR: Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural. IVA: Imposto sobre Valor Adicionado (por enquanto, apenas uma proposta) ISS: Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza. PIS: Programa de Integração Social.

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Imposto é política Por trás de enunciados técnicos estão a representação e o choque de interesses de grupos sociais, empresas e indivíduos

O que está por trás das discussões teóricas de economistas e advogados sobre a reforma tributária? Política. Isto é: a representação e o conflito de interesses, sejam eles de regiões, de classes e estratos sociais, de categorias profissionais, de empresas ou segmentos econômicos. Nas últimas décadas, poucos exemplos deixam mais clara a natureza política dos impostos do que a reforma do imposto municipal (poll tax) promovida pela primeira-ministra britânica Margaret Thatcher em 1990. Os protestos contra a medida – considerados os mais violentos em Londres em um século, com 113 feridos e 341 pessoas presas – custaram à Dama de Ferro o cargo, que exercia desde 1979.

Quase no mesmo dia, ao terminar 2008, Lula e Serra anunciaram redução de impostos para facilitar vendas de carros Impostos podem ser o combustível para batalhas de imagem, que nada mais são do que disputas pelo voto do cidadão na eleição vindoura. Na segunda semana de dezembro, diante do agravamento dos reflexos da crise financeira e econômica mundial, o presidente Lula e o governador de São Paulo, José Serra, anunciaram quase ao mesmo tempo medidas tributárias para facilitar a vida das montadoras de automóveis – e de quem os compra.

A maneira como se aprovam as leis no Brasil permite que, nos meandros da tramitação, se introduzam distorções As ambições de Lula e Serra são legítimas na medida em que fazem parte da política concebida dentro de padrões democráticos. Mas nem sempre é assim. Outros interesses frequentemente se misturam com formulações pomposas sobre os interesses da nação. No livro A arte da política: a história que vivi, o expresidente Fernando Henrique Cardoso diz da reforma tributária e da reforma do Judiciário que são “espécies de panacéias com as quais todos se dizem de acordo no genérico mas divergem no específico”. Essa é uma das dificuldades para a tramitação de uma efetiva reforma tributária. Mas há outra, mais ampla, relacionada com o modo como se aprovam as leis no Brasil. O mesmo FHC, que teve larga experiência como senador, escreve, em outra passagem: “Muitas vezes os obstáculos criados pelo jogo de interesses estritamente parlamentares se somam aos que decorrem dos interesses organizados da sociedade… Nos escaninhos do processo legislativo, os interesses estabelecidos vão se entrincheirando nas várias comissões e desfigurando as propostas do Executivo. Em plenário, para obter as maiorias nePrevidência Nacional 55

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cessárias, principalmente para as emendas constitucionais, novas negociações (a imprensa as chamará sempre de ‘barganhas’, e às vezes o são realmente) adulteram ainda mais o propósito inicial”.

“Regionalismo oligárquico foi o pecado original do federalismo brasileiro”, escreveu socióloga Não se pode, entretanto, isentar de responsabilidade os proponentes das medidas, como se os governos fossem anjos e os parlamentares, demônios. Mais do que procurar culpados pelas distorções e pelos entraves a um funcionamento mais racional da esfera pública, importa entender as raízes da atual situação. Há no Brasil uma tensão permanente entre centralização e descentralização. Durante o período colonial, as unidades administrativas – fossem estados ou capitanias

– tinham muito contato direto com Lisboa e quase nenhum entre si. “Brasileiro” foi de início, pejorativamente, o português que havia retornado rico à terra natal. O gentílico para nascido no Brasil – e a identidade que ele traduz – não é muito anterior à independência. A República estruturou o federalismo – hoje cláusula pétrea da Constituição, o que não é o caso do próprio regime republicano, submetido a plebiscito em 1993 –, mas um federalismo a léguas de distância do modelo utilizado, o dos Estados Unidos. Como escreveu Aspásia Camargo, socióloga e historiadora, hoje vereadora do Partido Verde no Rio de Janeiro, em Brasil: um século de transformações, livro publicado em 2001: “Sem dúvida, o pecado original do federalismo brasileiro foi o regionalismo oligárquico, que acabou debilitado por ciclos sucessivos de centralismo intervencionista, embora, como Fênix, esteja sempre pronto a renascer das cinzas, cada vez que tem início um novo ciclo de abertura política. Tais condições irão perdurar enquanto os bolsões de pobreza do mundo rural e urbano forem capazes de alimentar um eleitorado socialmente carente e politicamente passivo”.

Do clientelismo à corrupção Municipalista critica mecanismo usado pela União para devolver fatias de tributos e diz que proposta de reforma não toca no essencial, o pacto federativo Em entrevista dada ao Jornal do Comercio do Rio de Janeiro no início de novembro passado, o presidente da Confederação Nacional dos Municípios, Paulo Ziulkoski, afirmou que em 2007 os brasileiros pagaram R$ 948 bilhões em impostos, dos quais 60% ficaram com o governo federal, 25% com os estados e 15% com os municípios. E argumentou: “Ora, tudo foi produzido no município e pago ali. O dinheiro é retirado e levado para Brasília. A União cria programas para devolver parte desse dinheiro. E aí nasce todo o problema. Há um clientelismo que facilita a corrupção. Todas as denúncias, como as das operações Navalha [maio de 2007] e Sanguessuga [maio de 2006], surgem nesses programas”. Ziulkoski opinou que a reforma tributária em discussão não toca no pacto federativo e na redistribuição dos recursos. “Todo mundo está enganado, ela é neutra”, disse. “Não mexe na questão federativa. Ela realinha os tributos,

mas troca seis por meia dúzia”. A proposta do dirigente municipalista é “envolver a sociedade brasileira para discutir o que se quer para o Brasil. Isso não está sendo feito. A mãe das reformas é o pacto federativo. Vamos discutir o Estado, que está quebrado há 20 anos e continua numa situação de penúria, vamos discutir a União, o custo de uma Câmara de Vereadores, se é preciso ter tantos secretários. Isso tem que se discutir. Essa é a reforma da Federação. Vamos discutir qualidade do ensino, saúde. Mas hoje, o que vemos, por exemplo, são candidatos a prefeito discutindo segurança. Isso tem cabimento dentro da ótica federativa? Quando o prefeito cuida da segurança, que não é responsabilidade dele, está tirando dinheiro da creche, que é só dele”. O presidente da CNM considerou ideal “definir as atribuições proporcionalmente ao recurso. Até 1988, tínhamos 11% do bolo nacional. Com a Constituinte, fomos para 19,5%. Hoje estamos com 15% da arrecadação”, com despesas aumentadas, como no caso da saúde, por exemplo: “Os municípios tinham 42 mil servidores na saúde em todo o Brasil. A União tinha 250 mil. Vinte anos depois, estamos com 830 mil funcionários na saúde e a União com menos de 80 mil”.

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Ilustração: Nakata

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Formação deficiente Aumenta a demanda por capacitação de servidores públicos das prefeituras, mas a procura ainda está longe do ideal Carlos Vasconcellos

Em 2007, segundo dados do IBGE, os municípios brasileiros tinham mais de cinco milhões de servidores públicos. Um verdadeiro exército de trabalhadores a serviço das prefeituras. No entanto, um dos maiores problemas dessa tropa é sua falta de preparo, um foco permanente de ineficiência na administração dos municípios. Para Francisco Barone, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, o momento é propício para discutir o tema. “Com a renovação dos prefeitos cria-se um efeito-cascata de mudança para a base da pirâmide na máquina pública”, diz. Mário Pascarelli, coordenador do curso de Pós-Graduação em Gerente de Cidades da Fundação Armando Alvares Penteado, confirma que a demanda por capacitação cresceu neste ano. “A evidência disso é que

em 2008, ano eleitoral, completamos três novas turmas envolvendo setenta e cinco alunos, sendo uma turma no nosso campus de São Paulo, uma no nosso campus de Ribeirão Preto e outra em Santana de Parnaíba, todas em andamento”, informa.

Quem mais procura aprimorar-se são secretários municipais ou funcionários de primeiro escalão Segundo ele, o curso de pós-graduação da Faap já formou cerca de 2.500 profissionais em 19 cidades brasileiras. O trabalho para convencer os Previdência Nacional 59

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Fotos: Divulgação

Não adianta realizar um curso agora e outro daqui a vinte anos. A formação deve ser contínua

Mário Pascarelli

municípios a investir na formação dos servidores é árduo. “Realizamos seminários e workshops, ressaltando a necessidade da profissionalização da administração pública”, conta, destacando o lobby da equipe de professores do curso, “todos ou com passagem por cargos públicos, ou consultores em administração municipal.” Pascarelli aponta, no entanto, que a maior procura pelo curso não vem exatamente das prefeituras, mas de secretários municipais ou funcionários de primeiro escalão das prefeituras. “Há um processo seletivo, no qual focamos o público-alvo dos nossos cursos – prefeitos, secretários, gestores, vereadores, candidatos a cargos eletivos municipais e prestadores de serviços públicos. A faixa etária, em média, é de 38 anos, com destaque para a grande participação de mulheres.”

Apesar da empolgação de Pascarelli, o aumento da demanda pelos cursos de formação nos municípios precisa ser relativizado. Para que ele tenha um efeito profundo e duradouro sobre as administrações municipais, esse crescimento deve ser permanente e ganhar muito mais escala, pois a defasagem de formação de quadros é muito grande. “Para cada aluno do nosso curso de administração pública, dez se matriculam na administração de empresas”, compara Barone, da Ebape/FGV. Ele lamenta que não haja uma cultura permanente voltada para a formação da força de trabalho nos diversos níveis da máquina pública. “Não adianta realizar um curso hoje e outro depois de vinte anos. A formação precisa ser contínua”, propõe Barone. “Fora de grandes capitais como São Paulo, Rio de Janeiro ou Belo Horizonte, o investimento em capacitação é pequeno, em cursos seja de curta ou longa duração.”

Cumprir compromissos com aliados de campanha, mas sem paralisar a máquina pública Segundo o professor da Ebap, embora os prefeitos eleitos ou reeleitos tenham de cumprir promessas de campanha e compor a ocupação de cargos com seus aliados, a máquina pública não deveria parar. Mas ela emperra constantemente por causa da má formação da mão-deobra. “Especialmente nos quadros técnicos”, diz Barone, que aponta os setores de responsabilidade social, ética na administração pública e finanças como falhas importantes na formação dos servidores. Pascarelli também aponta problemas na capacitação dos funcionários na área financeira – o que pode custar caro em tempo de crise. E acrescenta que há grandes carências em outras áreas, como o planejamento de políticas públicas e as ligadas ao campo das ciências humanas,

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Francisco Barone

tais como formação gerencial e em recursos humanos. Por outro lado, afirma que a carência em conhecimentos jurídicos é bem menor. E se a demanda cresce – embora menos do que seria desejável – a oferta de cursos específicos na área aumenta. Mas serão suficientes? Os cursos de graduação em administração pública podem ser contados nos dedos. A oferta em pós-graduação, no entanto, cresce mais rápido. “São cursos de menor duração, mais ágeis e adaptáveis às demandas dos municípios”, especifica Barone, da Ebape/FGV, o mais antigo curso de graduação do país na área. Ainda assim, em cada 20 MBAs tradicionais há apenas um voltado para o setor público, aponta o professor.

Faltam recursos para pagar os cursos. Os programas federais de ajuda não são exclusivos para formação Outro obstáculo para a capacitação permanente da mãode-obra municipal é a falta de recursos específicos para esse fim. Claro, há programas como o Pmat (Programa de Modernização da Administração Tributária e Gestão dos Setores Sociais Básicos) e o PNAFM (Programa Nacional de Apoio à Gestão Administrativa e Fiscal dos Municípios Brasileiros), com recursos de organismos como o BNDES e o Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Mas não são linhas de financiamento exclusivas para formação profissional. “A maioria dos municípios tem problema de caixa e não possui recursos próprios para isso”, lamenta Barone. “Com tantas demandas, é difícil – especialmente para as pequenas prefeituras – criar programas de capacitação sem ajuda federal.” “Poderíamos criar um Fundeb (fundo federal destinado à educação básica) para a formação dos servidores”, sugere o professor. Para evitar mal-entendidos, no entanto, Barone se apressa a dizer que isso teria de ser feito com dotação orçamentária de algum ministério, provavelmente o das Cidades. “Criar um imposto, uma ‘CPMF’ para isso é que não pode ser”, pondera. Apesar de todas os percalços, o fato é que pouco a pouco as prefeituras despertam para a importância da formação profissional do funcionalismo (ver Competência permanente, entrevista do ministro da Previdência Social, José Pimentel, página 30). “O preparo dos gestores tem forte impacto para uma administração pública eficaz, eficiente e efetiva”, diz Pascarelli. “Deste modo, as prefeituras podem maximizar a utilização dos recursos humanos, materiais e financeiros das cidades.” E se essa idéia finalmente pegar nos municípios brasileiros, cidadãos, cofres públicos e servidores serão profundamente gratos. Previdência Nacional 61

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Gestão

Fúria em Paragominas Violência em cidade do Pará indica que a proteção da floresta amazônica ainda é uma intenção em busca de políticas consistentes Previdência Nacional celebrou no número 4 (Horizonte promissor) a pujança do desenvolvimento de Paragominas, Pará, em entrevista do presidente de seu Instituto de Previdência, Ráulison Dias Pereira. Logo em seguida, porém, no dia 23 de novembro, a cidade foi sacudida por uma onda de violência contra a apreensão de 400 m3 de madeira considerada ilegal pelo Ibama, Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais Renováveis. Os fiscais suspeitavam que a madeira, carregada em 14 caminhões, havia sido extraída de uma reserva indígena. Cerca de três mil manifestantes foram até o escritório do Ibama e depredaram o prédio, atearam fogo na garagem e tentaram agredir os fiscais do instituto responsáveis pela operação, chamada Rastro Negro. O hotel em que eles estavam hospedados chegou a sofrer uma tentativa de ataque por tratores. A Polícia Militar conseguiu impedir o pior, mas para isso foi preciso até mesmo o uso de bombas de gás lacrimogêneo.

Ibama diz que área florestal certificada do município, a maior do país, troca espécies nativas por monocultura No dia 27 de novembro, os fiscais apreenderam mais 7,9 mil m³ de madeira em uma serraria no nordeste do Pará. De acordo com o Ibama, havia evidências de que as toras de ipê,

maçaranduba e jatobá encontradas na serraria teriam sido retiradas da terra indígena Alto Rio Guamá, da tribo dos Tembés. Na reserva, os fiscais constataram nas árvores marcas feitas por uma serra encontrada dentro da serraria. Em 12 de dezembro, o Ministério Público Federal no Pará entregou à Justiça um pacote de ações contra 107 empresas e 202 pessoas por irregularidades ambientais – no caso, o desvio de 1,7 milhão de m³ de madeira. Paragominas possui a maior área florestal certificada do Brasil, que corresponde a mais ou menos metade da área florestal certificada de toda a Amazônia. O Projeto Verde, desenvolvido pela prefeitura, já plantou mais de 50 milhões de árvores e deve plantar mais 50 milhões nos próximos cinco anos. Realiza ainda monitoramento via satélite do desmatamento, com foco no manejo florestal legal e desmate zero. Marco Vidal, coordenador da Operação Rastro Negro no estado, afirma entretanto que, da lista dos 100 maiores desmatadores do Ministério Público, a maior parte age em Paragominas. “A região é formada por reservas indígenas e áreas de reserva legal permanente. Mas essas duas áreas são atacadas constantemente por madeireiros ilegais”, diz. O fiscal do Ibama contesta as ações ambientais da prefeitura de Paragominas. “As grandes forças de reflorestamento são para o plantio de eucaliptos, pínus e paricás, que serão utilizadas posteriormente para a produção de celulose”, critica. “O que eles chamam de reflorestamento é, na verdade, troca de floresta nativa por monocultura”. A violência da reação popular no final de 2008 em Paragominas sugere que as autoridades ainda estão distantes de uma política florestal que seja entendida e acatada. Para muitos habitantes da Amazônia, a mata é um obstáculo a ser vencido – quase sempre, a ferro e fogo.

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Entrevista Greliz Silvestrin

Paisagem de Jumirim vista da prefeitura: região de suaves colinas

Folga no caixa Jumirim, uma das menores e mais novas cidades de São Paulo, é também uma das raras do país cujo Regime Próprio de Previdência Social tem superávit atuarial 64 Janeiro/fevereiro 2009

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Greliz Silvestrin

os 2 mil municípios brasileiros que aderiram ao RPPS, só 5% têm superávit atuarial. Jumirim é um deles. A cidade emancipou-se de Tietê em 1996 e começou vida própria no ano seguinte com o prefeito Tadeu Fávero, do PSDB, eleito novamente em outubro passado. É, portanto, nova, e pequena (2.205 habitantes em 2007, segundo o IBGE, e 57 quilômetros quadrados). A cidade adotou o RPPS. Até prova em contrário, a previdência local tem vida mansa, disse no final de 2008 o contador da prefeitura Greliz Silvestrin, que adminis-

D

trava o Fumap – Fundo Municipal de Aposentadoria e Pensão do Município de Jumirim – na gestão do antecessor de Fávero, Darci Schiavi, PMDB, prefeito por oito anos. Silvestrin enumerou: 154 funcionários ativos em abril de 2008, apenas três beneficiários de aposentadorias. O fundo de Jumirim, relatou Silvestrin, foi constituído em 1997, mas suas contas não eram separadas das da Prefeitura. Em 2004, devido à Emenda Constitucional número 41, aprovada em 2003, o fundo foi obrigado a ter Previdência Nacional 65

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Um núcleo urbano pequeno, mas ordenado

contabilidade separada. Começaram a ser feitos relatórios para o Ministério da Previdência Social e os cálculos atuariais passaram a ser levados em conta. Naquele ano, a prefeitura contribuiu com 11% para o fundo, mesma contribuição de ativos, aposentados e pensionistas. Segundo Silvestrin, as projeções determinaram que essa contribuição tenha sido elevada para 13% em 2008. Ela deverá crescer meio ponto percentual adicional até 2017, e mais um pouquinho, 0,19%, até 2018, quando chegará a 16,69% e poderá se estabilizar. A empresa Actuarial, de Curitiba, é responsável pela mais recente avaliação atuarial do fundo de Jumirim, concluída em junho. Fez projeções que vão até o ano de 2083, baseadas no atual grupo de funcionários. Essas projeções são feitas sem o que os técnicos chamam “reposição de massa”, ou seja, como se a prefeitura não fosse contratar mais ninguém até o último servidor hoje em atividade se aposentar, em 2045. Isso, é claro, desde que a projeção de longevidade e de vida ativa não seja truncada por invalidez ou morte. Nesse contexto, o plano de custeio vigente indicou que o saldo financeiro do exercício de 2045 seria de R$ 20.575.648,19.

Fundo tem aplicação de R$ 3,5 milhões na única agência bancária da cidade, a do Banco do Brasil A tabela abaixo contém os elementos iniciais em que se baseia o cálculo. Médias gerais dos servidores ativos Item Nº de servidores

Masculino

Feminino

Total

60

94

154

39,2

37,5

38,2

Tempo de INSS anterior

2,2

1,9

2,0

Tempo de serviço público

4,4

5,0

4,8

Tempo de serviço total

6,6

6,9

6,8

Idade média

Diferimento (*) médio Remuneração média (R$)

24,4

19,4

21,4

866,2

939,55

910,97

(*) Diferimento: tempo que falta para o servidor cumprir chegar à aposentadoria Fonte: Actuarial

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“Na média, os servidores ativos já contribuíram com 6,8 anos, ou 24,1%, do tempo médio total necessário para a aposentadoria, aproximadamente 28,1 anos no geral, sendo 26,3 anos para as mulheres e 31,0 anos para os homens”, lê-se no relatório da Actuarial. A partir desses dados básicos se constata como o cálculo atuarial é complexo. Porque eles dão um retrato da situação atual sem qualquer “desvio”. Como se o quadro atual pudesse permanecer estático. Se, por hipótese, houvesse na cidade um surto de doença que incapacitasse um número considerável de funcionários, aumentaria subitamente a despesa com benefícios, sem aumento correspondente da receita do fundo de previdência. Imagine-se uma situação oposta: todos com boa saúde, o município vive cinco ou dez anos de desenvolvimento econômico contínuo, a arrecadação aumenta e a prefeitura precisa contratar, por concurso, novos funcionários. E esses novos funcionários efetivados são relativamente jovens – vão demorar a se aposentar. A base de contribuintes crescerá, enquanto o número de beneficiários evoluirá como anteriormente previsto. Ou seja, a situação financeira do fundo permanecerá largamente superavitária.

Silvestrin informou que o fundo tem hoje uma aplicação de R$ 3,5 milhões, em números redondos, na agência do Banco do Brasil da cidade – a única de Jumirim. Trata-se de um fundo de renda fixa composto em 95% por títulos do Tesouro Nacional. Criado para atender a legislação que rege as aplicações de fundos de previdência do regime próprio (ver Para começo de conversa, página 12). É uma das maiores somas de investimentos dessa agência. Por isso, ele sempre pede alguma reciprocidade do gerente. “No ano passado o banco doou um notebook que está patrimoniado no fundo. Agora, os funcionários da prefeitura pensam em criar um clube. Provavelmente o fundo vai pedir ajuda para a construção de uma sede, ou de uma quadra esportiva”, disse Silvestrin. As relações são boas também com o Tribunal de Contas do Estado: “Nenhum apontamento relativo ao fundo”, comemorou o contador.

Mulheres em vantagem As mulheres são mais numerosas e ganham mais do que os homens, em média, na administração municipal de Jumirim. A vantagem numérica se explica pelo fato de que a maior parcela de servidores municipais, cerca de 40%, é da educação, que emprega poucos homens. E a vantagem salarial média é devida ao fato de que praticamente todos os funcionários englobados na categoria “serviços gerais” – trabalhadores manuais, serventes, varredores, etc. – são homens. Formam a categoria que tem a menor remuneração média. A remuneração média dos funcionários de Jumirim, como se vê na tabela da página 66, era de R$ 910,97 no final de 2008. A dos homens, de R$ 866,20. A das mulheres, de R$ 939,55. Entre os salários mais elevados estavam os dos médicos: R$ 3.100 por 20 horas semanais. As professoras, que são quase 19% do total, aposentam-se mais cedo do que as demais mulheres. E mulheres aposentam-se mais cedo do que homens, como se vê na tabela ao lado.

Item

Masculino

Feminino

Geral

Idade média de ingresso

34,8

32,5

33,4

Tempo médio de contribuição

31,0

26,3

28,1

Idade média de aposentadoria

65,8

58,8

61,6

Fonte: Actuarial

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Compromisso com o país

Fotos: Marcelo Spatafora

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Professoras estão entre servidores para quem a missão pública tem primazia. Usam a arte como método pedagógico para manter em patamar invejável escola pública paulistana 68 Janeiro/fevereiro 2009

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revidência Nacional procura mostrar, edição após edição, diferentes aspectos da vida dos funcionários públicos brasileiros. É um campo vastíssimo, daqueles que só podem ser expostos por meio de sínteses. Nas duas reportagens a seguir, de Renata Rondino, a revista captura o trabalho de uma estirpe de servidores sem nenhuma identificação com o estereótipo do funcionário público que povoa o imaginário brasileiro e que entrou para o anedotário com a pejorativa definição de barnabé: o homem de gabinete, pouco comprometimento com o trabalho, preguiçoso, e que sempre dá um jeitinho de tornar as coisas mais fáceis para ele, mesmo que fiquem mais difíceis para os outros cidadãos. Duas professoras da rede paulista e seus comandados na Escola Estadual Bibliotecária Maria Luisa Monteiro Costa, na capital, Lurdes Ribeiro e Raquel Martins, fazem parte desse contingente, felizmente numeroso em todo o país. São pessoas que desafiam a visão negativa ancorada, muito objetivamente, na deficiência da prestaçã de serviços essenciais em todas as esferas da mátação quina quin estatal brasileira. Num país em que, como dizia I da Itália o antigo político Pietro Nenni, o Estado é “forte dian dos fracos e fraco diante dos fortes”. diante Lurd foi de oposição nos anos do regime militar. AfirLurdes ma que seu compromisso com a educação pública vem “de uma postura política, mas não partidária”. “É o compromisso com o país”, diz. (Leia mais sobre a trajetória de Lurdes Ribeiro em Da sociologia à educação artística, abaixo.)

P

Antes de começar o dia de aulas, a tarefa dos alunos é cantar. Aquecer a alma prepara a mente Eis a reportagem. Quando o sinal bate para o começo das aulas do dia, as crianças têm uma tarefa a executar antes de abrir livros e cadernos. Todas a postos, começam a cantar. Por alguns minutos, elas se entregam às notas musicais de canções adaptadas para as vozes infantis, que variam desde o folclore popular até música popular brasileira. Se for algo temático, melhor. Como foi o caso dos Jogos Olímpicos realizados na China, quando os alunos se divertiram cantando a marchinha de Oswaldo Santiago e Paulo Barbosa Lig, lig, lig, lé: “Lá vem o seu china na ponta do pé! Dez tões, vinte pratos, banana e café!”. Somente depois de cantar – algumas vezes batendo palmas ou executando coreografias – é que a aula efetivamente começa. E se algum aluno chegar atrasado, não tem problema: antes de entrar em sala, senta em algum lugar do pátio e também canta. É a melhor maneira de alimentar a alma antes de aprender na escola. Assim começa o dia-a-dia da Escola Estadual Previdência Nacional 69

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Bibliotecária Maria Luisa Monteiro da Cunha, no Rio Pequeno, zona oeste de São Paulo. Com 20 anos de história, 720 alunos que estudam da 1ª à 4ª série, a instituição se tornou um referencial para as redes de ensino, pela sua proposta de articular educação e arte. “Acreditamos que a arte é o que cria o entusiasmo do aluno por qualquer assunto, mesmo que seja matemática ou geografia”, explica a coordenadora Lurdes Ribeiro, que, ao lado da diretora, Raquel Martins, garante que o projeto dá certo.

Um método pedagógico: combinar ética e estética para mostrar o que liga beleza e verdade Em relação ao método usado na EE Bibliotecária Maria Luisa, Lurdes explica: – Nosso trabalho é baseado em dois conteúdos: arte e movimento. Queremos trabalhar com o corpo, pela manifestação artística. Misturamos ética e estética e mostramos que beleza e verdade estão ligadas. A escola já ganhou prêmios e costuma ser bemrecebida quando busca parcerias que contribu-

am para os projetos de Lurdes e Raquel. A Nespresso, por exemplo, trouxe ao Brasil em 2008 um dos oito exemplares do novo lançamento mundial da empresa – a máquina de café Le Cube – autografados pelo ator George Clooney, para fazer um leilão: seria presenteado com a máquina quem fizesse a maior doação para o programa Parceiros da Educação, voltado para a formação integral de alunos da rede pública por meio de parcerias que ajudem a melhorar a qualidade do ensino. A soma, R$ 17 mil, foi conseguida pela Associação G12, grupo de 12 jovens empresários presidido por Marcos Andrade. A entrega do prêmio, destinado à escola do Rio Pequeno, foi feita a Raquel Martins pelo ator Rodrigo Santoro, em São Paulo, no Shopping Iguatemi. Um dos integrantes do G12, André Skaf, que visitou a escola, mostrou-se surpreendido com as idéias adotadas na EE Bibliotecária Maria Luisa. A empresária Ana Ruas, outra participante do G12 que foi conhecer de perto os métodos de Raquel e Lurdes, avaliou: – Nunca vi um trabalho tão bom sendo realizado em uma escola estadual.

Os professores lêem para as crianças, todos os dias, seja qual for a matéria que ensinam

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Para encerrar as atividades de 2008, os alunos da 1ª e da 2ª série fizeram, na manhã de sábado, 6 de dezembro, apresentações natalinas que incluíram corais, jograis, dramatização e apresentação de uma “banda” cujos sons eram produzidos por chocalho, triângulo, casca de coco duro e outros materiais improvisados. O presépio vivo encantou alguns pais presentes. Outros se comoveram ao ouvir as vozinhas infantis entoando canções de natal.

Em agosto, a cantora Paulah Gauss, participante da G12, realizou na loja feminina Claudeteca o show de lançamento do seu CD Vou Livre. Parte da renda do evento foi em prol da EE Bibliotecária Maria Luisa.

Os alunos são zelosos guardiães dos livros. Por semana, são emprestados 700, que voltam intactos Na escola, o desenvolvimento artístico tem um foco inicial: leitura. É ela a peça fundamental de todo o projeto. – Queremos que os alunos se apropriem da cultura. Nós temos que garantir o contato deles com as letras. Se a criança é defasada culturalmente, é responsabilidade da escola mudar este quadro, e não cruzar os braços – defende Lurdes. E na escola, de fato, a leitura é intensa. Primeiro porque todos os professores lêem para as crianças todos os dias. Essa é uma atividade permanente, não importa a matéria que esteja sendo dada em sala de aula. Depois, todos os alunos são frequentadores vorazes da biblioteca da escola. Frequentadores e administradores. Na EE Bibliotecária Maria Luisa são os alunos que controlam os livros, dão indicações de leitura, cuidam do acervo e

garantem a integridade de cada livro. – Daquela biblioteca saem 700 livros por semana emprestados. E os alunos controlam tudo com um esquema extremamente simples e prático. Os livros não somem, não são estragados e são lidos, de fato – orgulha-se Raquel, a diretora. E não se trata de livrinhos simples. Os alunos da 3ª e 4ª séries devoram livros de Arthur Conan Doyle (o “pai” do detetive Sherlock Holmes), Monteiro Lobato, livros de mitologia e clássicos como a Odisséia e A Saga de Gilgamesh. – Esta é uma idéia que dá certo, tem custo zero, mas ninguém faz. Ninguém confia. Mas quando se tem confiança, o projeto tem sucesso – avalia Lurdes. – Por motivos como esse, aqui a leitura é puro prazer.

O que pode parecer improvisação segue uma linha de trabalho firme. E os mestres têm liberdade para se expressar Todas as idéias desenvolvidas na EE Bibliotecária Maria Luisa, que carregam charme artístico

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e podem parecer até, muitas vezes, improvisadas, apóiam-se numa linha de trabalho seguida à risca. Toda semana, a direção do colégio se reúne com professores para discutir metodologia de ensino, didática, atuação do professor, ideias que foram aplicadas em sala e os resultados de cada uma delas. A intenção é que, além de discutir a questão pedagógica, os professores troquem experiências sobre o que encontram em sala de aula: as dificuldades dos alunos, a maneira como a so-

Equipe docente é pequena, mas há pouca rotatividade, o que permite realizar passo a passo o planejamento

lução foi empregada, a resposta do aluno, o rendimento de cada um. – Eles precisam vivenciar situações no papel de professor e no papel de aluno. A reflexão tem que partir de como os professores percebem tanto as dificuldades como o encantamento do aluno. Há a liberdade de se debater tudo isso – diz Lurdes. – O professor encontra aqui espaço para o protagonismo.

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– É importante ter em mente a valorização de cada indivíduo e também do coletivo. Aqui todas as crianças têm nome e uma história, assim como funcionários e professores. Desenvolvemos a idéia de que precisamos formar cidadãos críticos, íntegros e colaborativos, e não apenas ensiná-los a ler e escrever, ou a contar – especifica Raquel. Alguns fatores, é claro, contribuem para que o projeto continue a todo o vapor na escola. Um deles, diz Lurdes, é o fato de haver pouca rotatividade de professores.

Isildinha, mãe de aluno, elogia evolução e lamenta que a escola não vá além da 4ª série – Isso nos ajudou a implementar o trabalho passo a passo, o que já dura 15 anos. Nosso grupo é pequeno, mas permanece. Os professores da rede estadual de ensino escolhem vir para cá. Sabem que aqui se trabalha muito, mas que há a valorização do profissional – afirma. Mas, afinal, como se dá a autonomia da EE Bibliotecária Maria Luisa em relação às tradicionais fórmulas aplicadas na rede pública de ensino? – Não temos contraposições com o poder público – diz

Raquel. – Na rede pública, aliás, como diretora ou coordenadora, temos mais autonomia do que alguém com cargo semelhante em uma escola privada. Cumprimos todas as diretrizes dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), mas vamos além. Nesses 15 anos, tivemos a convicção firme de que nossa tarefa é fortalecer as crianças, e temos certeza de que nossa metodologia não vai sobrepujar a essência do ensino. Os pais aprovam. “Essa é a melhor escola pública da região”, diz Isildinha Malagodi de Oliveira, mãe de Breno, de 10 anos, que estudou no local desde a 1ª série. Ela, aliás, lamenta o fato de 2008 ter sido o último ano do filho na Maria Luisa, pois agora ele está na 5ª série. – A escola tem problemas, não dá pra negar. Mas de um tempo para cá eles vêm desenvolvendo trabalhos muito bons, parcerias muito boas – elogia Isildinha. Ela destaca que a direção da escola está sempre aberta a ouvir os pais dos alunos: – Nem sempre eles conseguem resolver tudo rapidamente, como foi o caso de uma professora que estava sempre doente e faltava muito, mas estão sempre acompanhando e mostrando interesse em nos ouvir e nos ajudar.

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Dia da Consciência Negra “Esse fui eu que fiz. Eu ajudei bastante na exposição”. Foi o que Breno Malagodi de Oliveira, de 10 anos, aluno da 4ª série da Escola Estadual Bibliotecária Maria Luisa Monteiro da Cunha, apressou-se em dizer ao fotógrafo que registrava os trabalhos feitos pelos alunos para homenagear o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro. Entre bonecos, desenhos, pintura em tecido, mapas e outros trabalhos, ele sabia dizer quais foram os alunos que fizeram cada um deles. Por lei, todas as escolas públicas precisam dedicar um espaço especial em seus currículos para falar sobre a questão da consciência e a cultura dos negros. – Mas nós, em especial, achamos que não se trabalhava com profundidade a cultura

Conduzir os alunos a um mergulho profundo em tudo que se refere à África do povo africano. Nos acostumamos a falar apenas sobre a escravidão ou sobre o preconceito – diz a coordenadora pedagógica da escola, Lurdes Ribeiro. – Parecia um tabu falar de mitologias, lendas e religiões, além de toda a riqueza geográfica da África. Decidiu-se, então, fazer diferente. Os alunos foram convidados a mergulhar profundamente em tudo aquilo que se referia à África.

– Começamos com a literatura. Fomos descobrir o máximo possível sobre o continente. Cada um foi atrás de um assunto. E isso despertou um entusiasmo ímpar. As crianças se apaixonaram a tal ponto que os pais também se dispuseram a participar – conta a coordenadora. De livro em livro, de pesquisa em pesquisa, foram saindo histórias, lendas, a familiarização com os elementos geométricos que formam a estamparia dos tecidos, ilustrações muito bonitas, fotos, filmes, música, danças, simbologias. – E tudo isso também estava relacionado aos rios, montanhas, desertos, climas, vegetações, pois tudo está contado nas histórias – argumenta Lurdes. – Eles ficaram maravilhados ao saber que em um mesmo continente temos florestas, um deserto árido e montanhas com neve. Esses assuntos estavam ligados às crenças, às danças, aos rituais e até mesmo às ilustrações. Foi uma descoberta muito importante para eles, pareciam estar resgatando suas próprias histórias, falando de seus ancestrais. Por causa dos trabalhos, com a proximidade da data comemorativa os cantos das crianças antes do início das aulas eram todos africanos. E, em muitos momentos,

Sempre que se compartilha há uma experiência enriquecedora

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incluíam danças também. De todo o processo de aprendizado nasceu a Vó Nhã Nhã, uma boneca feita pelos pais dos alunos, com base em uma personagem do livro A Galinha de Angola escolhida pelos alunos. A boneca é puramente maternal, pois está abraçada a várias crianças. “Na história, a Vó Nhã Nhã tem um baú, de onde ela tira histórias da África para contar para as crianças. Os alunos acabaram adotando a vovó”, diz Lurdes, divertida, ao lado da boneca feita de meias pretas, enchimento e tecidos. “Essa não fui eu que fiz, mas todo mundo gosta dela”,

vibra Bruno. Mas ele não fez um trabalho específico, e sim vários. Lurdes conta que os alunos circularam por diferentes projetos. Cada aluno fazia um pouco e passava para outro acrescentar, mexer, dar uma visão nova: – A idéia era o trabalho individual com interferência do coletivo. Sempre que se divide, há uma experiência enriquecedora. O aluno aprende a prestar atenção no que o outro tem a acrescentar. (Ver Justo orgulho, página 76.)

Da sociologia à educação artística A trajetória da professora Lurdes Ribeiro tem as marcas da epopéia metropolitana brasileira das últimas décadas. Filha de operário e de dona de casa, nascida em Santo André, Grande São Paulo, estudou da 1ª à 4ª série em escola pública. Depois ficou sem estudar. Aos 14 anos, foi trabalhar num escritório imobiliário e estudar à noite numa escola particular. Fez escola normal enquanto trabalhava em banco, até entrar para Ciências Sociais na USP, em 1967. Morava em república estudantil e dava aula em cursos supletivos e preparatórios de vestibular. Em época de forte repressão política, não concluiu Ciências Sociais na USP. Cantar no Coral da universidade a havia inspirado a estudar educação artística na Faap (Fundação Armando Álvares Penteado), mas não aguentou pagar as mensalidades e acabou se formando pelo Instituto Musical de São Paulo, hoje extinto. Foi a partir dessa formação que estruturou sua proposta pedagógica. Em meados da década de 80 fez concurso para o magistério estadual paulista, onde atua como coordenadora há dez anos.

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Justo orgulho

Ilustração: Américo Gobbo

Quatro veteranos do funcionalismo revêem trajetória profissional que deixou boas lembranças e sentimento do dever cumprido

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esta segunda reportagem, Renata Rondino entrevista um dirigente do Ibama, Antônio Carlos Hummel, um funcionário aposentado do município de São Paulo, José Wladimir Klein, uma também aposentada inspetora federal de ensino do Ministério da Educação, Geninha da Rosa Borges – atriz em atividade, aos 86 anos –, e a assistente social Celi Barone, que trabalhou num hospital psiquiátrico da cidade paulista de Adamantina. Em comum, o orgulho que têm de sua atividade profissional.

Para Hummel, diretor do Ibama, só no serviço público teria sido possível realizar as conquistas acumuladas Quando subiu ao palco para receber o prêmio Top of Mind na categoria meio ambiente, em outubro de 2008, o diretor de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas (DBFLOR) do Ibama, Antônio Carlos Hummel, resolveu dedicá-lo a todos os servidores do instituto, incluindo os analistas ambientais que combatem crimes contra a natureza nos locais mais remotos do país. “Tenho muito orgulho de ser integrante de carreira do instituto”, afirmou o engenheiro florestal, que há 28 anos se dedica a proteger e a desenvolver a fauna e a flora do Brasil. O prêmio foi merecido: o Ibama é a marca mais lembrada quando se fala em meio ambiente, mesmo que o instituto não faça uso de estratégias de marketing e nem de agên-

Hummel

Foto: Divulgação

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cias de propaganda. “O marketing do Ibama é o seu próprio trabalho”, diz Hummel. Ele é um profissional de ponta, que qualquer grande empresa gostaria de ter em seus quadros. Como ele, há muitos outros, gente que derruba o velho mito do servidor público. O diretor é funcionário de carreira do Ibama e se orgulha em afirmar que em nenhum outro lugar fora do serviço público teria sido possível realizar toda a sua lista de conquistas. “Na iniciativa privada, nada do que eu fiz seria possível”, afirma Hummel. Previdência Nacional 77

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Em mais de duas décadas, especialista testemunhou muitos avanços no controle do desmatamento Hummel está em Brasília desde 2002, após passar muitos anos na Amazônia, cuidando de um projeto de cooperação internacional de manejo florestal. Durante todos esses anos no instituto, pôde presenciar e participar de uma série de avanços no que se refere ao controle do desmatamento, ordenação da atividade madeireira, combate ao comércio de animais silvestres, além do atual trabalho de educação ambiental para pequenos pescadores, de forma consciente e não depredatória. Hummel, a exemplo de milhares de servidores públicos federais, estaduais ou municipais, sempre remou contra a idéia pejorativa que boa parte da população faz da categoria. Ele se inclui entre as pessoas que apreciam o trabalho e que sempre buscaram maneiras de implantar projetos e trazer novas idéias, porque estabilidade não significa acomodação, nem estagnação. E ficam felizes quando seus esforços dão resultado.

Se fosse para começar tudo de novo, Klein voltaria à CMTC, onde passou mais de 32 anos – Se eu pudesse recomeçar minha vida profissional do zero, teria trabalhado exatamente onde trabalhei – diz José Wladimir Klein, que se aposentou pela antiga Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC). Ele passou 32 anos e quatro meses na Tesouraria da empresa pública, sucessora da Light.

– Não consegui estudar. Mas consegui me preparar e pude dar conta de todas as minhas responsabilidades. Tanto que nos últimos dez anos fui chefe da seção – destaca. Klein praticamente saiu do curso primário para ajudar nas despesas da casa. Perdeu o pai antes dos 15 anos e sua mãe passou a trabalhar como cozinheira. O único diploma de que dispõe é do Grupo Escolar Paulo Eiró, onde fez até a quarta série do primeiro grau. – Trabalhei em escritório de despachante, casa de móveis, oficina mecânica, empresa de produtos alimentícios, em tudo quanto é lugar – relembra o aposentado. – Em uma delas, eu saía de casa às seis da manhã para viajar 45 minutos de bonde. Descia na Praça da Sé e ia a pé até a Rua Vitória, onde tomava café da manhã, sentado na calçada, e iria jantar às nove da noite, quando chegava em casa. Mas isso foi até começar a trabalhar na Light, de onde eu passaria para a CMTC. Klein, aos 80 anos, mora em São Bernardo do Campo e dedica-se a escrever livros. – Sempre fui muito ligado às pessoas. Em nosso trabalho, o relacionamento humano era estreito. Hoje, esse contato eu estabeleço através dos livros. Nunca deixamos de sonhar, porque as pessoas não são unicamente forjadas nas universidades, mas também nas adversidades. Se soubermos colher em nossas atividades os ensinamentos que a vida poderá nos fornecer, poderemos vencer – filosofa o autor de 14 livros, contente por ter se casado novamente em 2008.

Geninha estudou nos Estados Unidos e no Japão sistema de teleducação que aplicou na volta a Pernambuco Toda vez que, ao final de uma peça, a pernambucana Geninha – Maria Eugênia – da Rosa Borges agradece ao público pelos aplausos, ela diz que o faz por 68 mulheres. São elas todas as personagens que viveu durante os 67 anos que respirou o teatro. Os atuais 86 anos não lhe tiraram a disposição, mostrada novamente em janeiro numa participação na novela A Favorita, da TV Globo, como mãe do personagem Silveirinha. Mas não foi nos palcos que Geninha construiu todas as suas buas histórias. Formada em línguas anglo-germânicas nos anos 1950, ela prestou concurso para inspetora

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federal de ensino do Ministério da Educação. Aprovada, foi para os Estados Unidos e para o Japão fazer cursos e estágios sobre uma nova forma de ensinar: o sistema teleducativo, que ministraria aulas pelo rádio e pela televisão. Numa época em que a internet estava fora dos planos de qualquer vidente e uma parcela significativa da população vivia em áreas rurais, seria praticamente uma revolução.

Entusiasmada, Geninha voltou para Pernambuco e cuidou de aplicar o projeto. – Foi uma maravilha ver pessoas do campo aprendendo, fazendo as provas. Viajei o estado todo para acompanhar esse trabalho. Eles se tornavam engenheiros, médicos... e eu era a madrinha de formatura de todos. Eu vibrava com eles, como se fosse a própria professora – entusiasma-se. Geninha perdeu a conta de quantos alunos foram beneficiados à distância, mas os tem a todos eternamente como seus “meninos”. O projeto foi desenvolvido na época em que a política cultural era atribuição do Ministério da Educação e Cultura (MEC). Anos depois, separaram-se: MEC de um lado, Ministério da Cultura (Minc) de outro. “Me lotaram no Minc, onde me aposentei”, diz Geninha, que ainda não pretende aposentar-se do teatro. Ela ocupa a cadeira de número 33 da Academia de Letras e Artes do Nordeste.

Foto: Alexandre Belém/JC Imagem

Trabalhadores do campo que nem tinham passado direito pela escola se tornaram engenheiros e médicos

Geninha

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A atriz e servidora pública descobriu o palco em 1941, quando se preparou para encenar a peça Noite de Estrelas junto com um grupo de moças da sociedade recifense. A finalidade era arrecadar fundos para um hospital. – Mas elas mal apareciam nos ensaios. Estavam todas preocupadas com seus namorados. E eu, que era a mais dedicada, acabei me destacando – diz. Na platéia, o médico e dramaturgo Waldemar de Oliveira gostou do que viu e levou Geninha para integrar o grupo fundador do Teatro de Amadores de Pernambuco (TAP), por ele criado. Além das dezenas de peças, ela já atuou com diretora e participou de curtas e longas no cinema, incluindo Paraíba, Mulher Macho, de Tizuka Yamasaki. Em Pernambuco, Geninha ocupou diversos cargos na área da educação, como a Diretoria do Departamento de Recursos Tecnológicos para a Educação. Foi diretora de Eventos do Museu da Cidade do Recife e supervisora de Artes Cênicas no Instituto de Assuntos Culturais da Fundação Joaquim Nabuco.

Celi conseguiu parceria com promotoria pública e prefeitura para ajudar internos em hospital psiquiátrico O resgate da dignidade foi o caminho escolhido pela assistente social Celi Barone no hospital psiquiátrico de Adamantina, interior de São Paulo, onde trabalhava pela prefeitura da cidade. O hospital operava pelo SUS e sempre ia mal das pernas, com muita dificuldade para atender a população de baixa renda. Celi, junto com a equipe de médicos, professores de educação física, psicólogos, enfermeiros e outras assistentes, conseguiu uma parceria entre a promo-

Foto: Reprodução

Estréia no palco foi em 1941. Arte e vida profissional continuaram em paralelo

Celi Barone

toria pública, a assessoria jurídica do hospital e a prefeitura para garantir o sustento de 60 pacientes adultos com deficiência mental profunda e cujas famílias eram carentes, ou que eram totalmente sozinhos. A parceria permitiu que esses pacientes obtivessem o Benefício de Prestação Continuada – pagamento de um salário mínimo pelo INSS –, dinheiro que começou a propiciar-lhes um mínimo de qualidade de vida.

Alguns pacientes nem tinham certidão de nascimento. Ajuda lhes permitiu comprar comida e roupa – Alguns não tinham nem certidão de nascimento. Conseguimos tudo através dessa parceria. E então eles puderam comprar alimentos, roupa e calçados, ir a excursões ou festas – conta Celi. O convênio também permitiu que alguns deles fizessem tratamentos odontológicos ou pudessem cuidar da saúde em outras cidades. Resultados como esse acabaram inspirando a filha de Celi, Carol Barone, que decidiu seguir os passos da mãe e tornar-se assistente social, ainda que tenha escolhido trabalhar no setor privado. “Sempre a admirei profissionalmente, a forma como ela se dedicava ao trabalho, como apreciava o que fazia”, diz Carol. “E eu percebia os benefícios diretos e indiretos que a profissão poderia ter na vida de outras pessoas.” (Ler também Compromisso com o país, página 68.)

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Serviço Lista de entrevistados

Eis os dados para contato com as pessoas entrevistadas nas reportagens desta edição de Previdência Nacional. Se encontrar alguma dificuldade, por favor entre em contato conosco:

55-11-5505-6065

Antônio Carlos Hummel (“Justo orgulho”, página 76) IBAMA E-mail: antonio.hummel@ibama.gov.br Evandro Antônio da Silva (“Hora de resultados”, página 10) Aepremerj Telefone: (24) 9212-4899 Francisco Barone (“Formação deficiente”, página 59) FGV Telefone: (21) 2509-5399 (Assessoria de Comunicação) Greliz Silvestrin (“Folga no caixa”, página 50) Telefone: (15) 3286-8072 E-mail: contabilidadepmj@fasternet.com.br Helmut Schwarzer (“Peças que se encaixam”, página 20) Ministério da Previdência Social Telefone: (61) 3317-5873 Joel Fraga (“Peças que se encaixam”, página 20) CSM Consultoria Telefone: (51) 3212-9917 E-mail: csn@qnet.com.br

previdencianacional@patriaeditora.com.br

José Mendonça de Souza (“Duas faces da mesma crise”, página 38) Abrapp Telefone: (11) 3043-8745

Maria Verônica Bentinho Fundape (“Hora de resultados”, página 10) Telefone: (81) 3183-3849 E-mail: veronica@fundape.pe.gov.br

José Pimentel (“Competência Permanente”, página 56) Ministro da Previdência Telefone: (61) 3317-5102 (Assessoria de Comunicação)

Mário Pascarelli (“Formação deficiente”, página 59) FAAP Telefone: (11) 3662-7270 (Assessoria de Comunicação)

José Wladimir Klein (“Justo orgulho”, página 76) E-mail: wladimirk@ig.com.br Kleber Vicente Cavalcante IPMPG (“Hora de resultados”, página 10) Telefone: (13) 3476-1500 E-mail: kleber@ipmpg.com.br Lurdes Ribeiro (“Compromisso com o país”, página 68) Telefone: 11-3782-6691

Otoni Gonçalves Guimarães (“Peças que se encaixam”, página 20) Ministério da Previdência Social Telefone: (61) 3317-5776 Raquel Martins (“Compromisso com o país”, página 68) Telefone: 11-3782-6691 Roberto Pasqualin (“Para come;o de conversa”, página 12) Amcham-SP Telefone: (11) 3055-6700

Magadar Briguet (“Conflitos à vista”, página 26) APEPREM Telefone: (11) 4586-0203

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