Revista ABIPEM – Abril/Maio-2009

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ANO 2 - Nº 6

ANO 2 - Nº 6

O DILEMA DOS JUROS

Redução da taxa Selic dinamiza a economia mas provoca perda de rentabilidade das aplicações do RPPS. Gestores e governo discutem como garantir resultados C&T

Sergio Rezende

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Poder local

Luiz Paulo Vellozo Lucas

Novo modelo Acre

Fernando Pimentel

José de Anchieta Batista

Gente

Marcos Fonseca

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Sumário Edição 6

Capa 22

C&T 40

Queda da taxa Selic gera aumento do consumo, mas reduz a rentabilidade dos títulos públicos. Gestores de RPPS discutem soluções para que investimentos não sejam prejudicados

O ministro Sergio Rezende fala com entusiasmo dos programas que disseminam conhecimento e promovem inclusão digital em municípios

Sumário Carta ao leitor Expediente Governo federal estica prazos para municípios quitarem dívidas previdenciárias Curso para certificação de gestores do RPPS discute situações do dia a dia e atualiza os profissionais Empenho do governo em reduzir o spread bancário choca-se com explicações dos bancos para as altas taxas Crise afeta assistência à saúde nos Estados Unidos e benefícios dos aposentados não cobrem gastos médicos Envelhecimento da população pode acentuar desigualdades caso conquistas sociais não sejam preservadas No Acre, RPPS tem o desafio de eliminar o déficit atuarial sem deixar de investir na qualidade de vida da população

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Falta de familiaridade com a internet faz com que servidores em idade de se aposentar usem pouco sites de institutos Prefeituras de municípios pequenos têm excesso de funcionários porque são importantes empregadoras Luiz Paulo Vellozo Lucas, ex-prefeito de Vitória, defende aumento de poder para municípios em novo desenho institucional Fernando Pimentel, ex-prefeito de Belo Horizonte, critica marco legal que iguala prefeituras com necessidades muito díspares Aumento dos casos de dengue cobra das prefeituras trabalho mais eficaz em saúde e saneamento

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Marcos Fonseca, médico do Rio de Janeiro, fala do que mudou em 30 anos na saúde pública da cidade Lista de entrevistados Agenda da Abipem e da Apeprem

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Carta ao leitor

Na luta para preservar o dinamismo da economia, o governo brasileiro corta impostos, com reflexo imediato nos repasses a estados e municípios. Essa dimensão da crise foi para as manchetes e tirou o brilho da renegociação de dívidas previdenciárias anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em fevereiro, abordada na reportagem Prazo dilatado. O spread bancário voltou a ficar em evidência desde que o Banco Central começou a reduzir a taxa Selic. Em 8 de abril, foi nomeado novo presidente do Banco do Brasil. Segundo o governo, o BB deve dar exemplo na redução do spread. Mas o tema é controverso, como se pode ler em Spread, o vilão da temporada. Cortes de juros, objeto de declarada obsessão do presidente Lula, são bem-vindos para incentivar o consumo e estimular a economia, mas afetam o rendimento das aplicações dos fundos do RPPS. Sugestões de gestores para enfrentar essa situação são abordadas na reportagem Tempo de juros baixos. Duas entrevistas – com os ex-prefeitos de Vitória e de Belo Horizonte, o deputado federal Luiz Paulo Vellozo Lucas e o professor de economia Fernando Pimentel – e uma reportagem, Cofre leve, folha pesada, têm como foco a gestão municipal. O ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, e o secretário de Inclusão Social do MCT, Joe Valle, falam com entusiasmo dos programas de inclusão digital e disseminação de ciência e tecnologia em municípios. O presidente da Acreprevidência, José de Anchieta Batista, relata como o estado procura contornar o déficit atuarial sem sacrificar investimentos vitais para o desenvolvimento. A saúde pública está presente em Sai, mosquito!, conjunto de reportagens sobre o papel dos municípios no combate à dengue, e no perfil de um veterano servidor da PN Prefeitura do Rio de Janeiro, o médico Marcos Fonseca. Cordialmente,

João Carlos Figueiredo Presidente da Apeprem

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Expediente

Abipem (www.abipem.org.br) DIRETORIA Presidente: Demétrius Ubiratan Hintz Vice-Presidente: José Maria Corrêa Secretário Geral: Wellington Costas Freitas Tesoureiro: João Carlos Figueiredo CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO André Luiz Goulart Valnei Rodrigues Moacir Salles Luiz Gustavo Ávila Mendonça Antonio Cezar Leite Lobato CONSELHO FISCAL Roberta Cabral Medeiros José de Anchieta Batista Gláucia Maria Barreto Silva

Apeprem (www.apeprem.com.br) DIRETORIA Presidente: João Carlos Figueiredo Vice-presidente: Jonas Baldissera 1ª Secretária: Lucia Helena Vieira 2ª Secretária: Solange Maria Maximiano de Pádua 1º Tesoureiro: Antonio Corrêa 2º Tesoureiro: Antonio Scamatti CONSELHO ADMINISTRATIVO Titulares André Luiz da Silva Mendes, Alberto Marques Passos, Christian Petterson Antunes Lemos, Eliane Valim dos Reis, Fernando Rodrigues da Silva, Glória Satoko Kono, Kleber Vicente Cavalcante, Marcia Regina Moralez, Marcus Vinicius Esteves Nunes, Moacir Benedito Pereira, Paulo César Pinto de Oliveira, Paulo Henrique Pastori, Roberto da Silva Oliveira, Sebastião Benedito Gonçalves, Sirleide da Silva.

Editora

JB Pátria Editora Ltda.

Presidente: Jaime Benutte Diretor: Iberê Benutte Comercial: Walter Torres Assistente comercial: Stephane Kalline Repórter: Kelly Souza Estagiário: Luan Silva dos Santos

Previdência Nacional Publisher: Jaime Benutte Conselho Editorial: André Luiz Goulart, Demétrius Ubiratan Hintz, Wellington Costa Freitas (Abipem); João Carlos Figueiredo, Lúcia Helena Viera, Magadar Rosália Costa Briguet (Apeprem); Paulo Henrique Pastori (Regime Geral); Jarbas Antonio de Biagi (Previdência complementar) Editor: Trilogia Comunicação e Arte Ltda. - Mauro Malin, MTB 14887-67 Projeto Gráfico e arte: BELATRIX EDITORA LTDA. Diretor de Arte: Marcelo Paton Assistentes de Arte: Gabriel de Moraes Luiz, Júlio Grobel Colaboradores: Américo Gobbo, Ana Linn, Assessoria de Imprensa da prefeitura de Vespasiano, Carlos Avelin, Carlos Vasconcellos, Celso Moraes, Divino Advincula, Emídio Montenegro, Fabio Rodrigues/ ABr, Jorge Félix, José Cruz/ ABr, Lenildo Pedro, Leonardo Furhmann, Nakata, Renata Rondino, Salomão Sobrinho, Sérgio Valle e Victor Soares ACS/MPS. Impressão: IBEP - Tiragem: 50.000 exemplares

CONSELHO ADMINISTRATIVO Suplentes Antonio Carlos Molina, Elisa Maria Rocha, Guiomar de Souza Pazian, Francisco Carlos Conceição, Maria Aparecida Della Villa, Onésimo Canos Silva Júnior, Paulo Vicentino, Vandré Lencioni de Camargo. CONSELHO FISCAL Titulares Edmilso Martins, José Tomaz, Nelson Rodrigues de Mello. CONSELHO FISCAL Suplentes Luiz Roberto Lopes de Souza, Varlino Mariano de Souza.

Empresa filiada à Associação Nacional dos Editores de Publicações, Anatec

A revista PREVIDÊNCIA NACIONAL é uma publicação bimestral da DB2 Editora, localizada na Rua Flórida, 1.703, 11º andar, Brooklin, CEP 04565-001, São Paulo – SP. Tel.: 11 5505-6065. www.patriaeditoria.com.br Dúvidas ou sugestões: previdencianacional@patriaeditora.com.br Os textos assinados são da responsabilidade de seus autores. Não estão autorizados a falar pela revista, bem como retirar produções, pessoas que não constem deste expediente e não possuam uma carta de referência.

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Passo a Passo

Reunião do governo federal com prefeitos

Prazo dilatado Renegociação de dívidas previdenciárias dos municípios, anunciada por Lula em encontro com prefeitos em Brasília, abrangerá os que optaram pelo regime próprio Leonardo Furhmann

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secretário de Políticas de Previdência do Ministério da Previdência Social, Helmut Schwarzer, anunciou na reunião do governo federal com prefeitos em Brasília, no dia 10 de fevereiro, que a renegociação da dívida previdenciária dos municípios deve incluir também os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS). Segundo informação confirmada pela assessoria de imprensa do Ministério, a medida ainda depende da edição de uma portaria, que ainda não havia sido publicada até o fechamento desta edição. Os estados e municípios são responsáveis por manter o equilíbrio financeiro de seus respectivos regimes de previdência, cobrindo eventuais déficits. A renegociação de dívidas com os RPPS exige um equilíbrio mais complicado do que acontece com municípios que fazem parte do Regime Geral de Previdência Social.

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Foto: José Cruz/ABr

Atuário recomenda estudar cada caso para avaliar impacto financeiro no regime previdenciário local Para o atuário Richard Dutzmann, é preciso analisar caso a caso para avaliar qual vai ser o impacto financeiro da renegociação em cada regime previdenciário. — É preciso analisar a situação atuarial de cada regime, saber como está seu fluxo financeiro, para não comprometer sua solvência em uma eventual renegociação — adverte. Ele destaca que, além da situação do próprio sistema previdenciário, é preciso levar em conta o valor da dívida em questão e como este dinheiro será pago, para garantir que não faltem recursos em nenhum momento. — Neste tipo de problema, não faz muita diferença o tamanho do município. Geralmente os casos mais complexos envolvem regimes previdenciários mais antigos, que estão na fase de pagamento e cujo grau de endividamento é maior — afirma.

Governo quer terreno desimpedido para que municípios possam receber obras do PAC Previdência Nacional 11

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Foto: José Cruz/ABr

O ministro José Múcio (à direita) e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), na reunião com prefeitos

A mais recente renegociação dos débitos foi anunciada durante o Encontro Nacional com Novos Prefeitos e Prefeitas, organizado pelo governo federal e que reuniu em Brasília mais de 8 mil pessoas, das quais 3,2 mil eram prefeitos. O governo estima que a repactuação, como está sendo chamada, envolva em torno de R$ 14,5 bilhões, mas evita falar quantas prefeituras poderão ser beneficiadas. A negociação ficará a cargo da Receita Federal. O principal motivo para a renegociação ter sido decidida agora foi a crise econômica mundial. Com a medida, o governo federal espera que os municípios estejam aptos para receber novas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o que poderia garantir mais empregos e um consequente aquecimento das economias locais. É que, para participar de programas federais, a prefeitura precisa ter uma Certidão Negativa de Débitos, que comprova que ela não está inadimplente com a União. O documento é necessário também para pedir empréstimos aos bancos federais.

Na primeira renegociação, em 2005, governo Lula jogou mais duro: só 300 aderiram

Um dos temas do encontro foi como manter as políticas de crescimento para o país e quais os seus impactos nos municípios. Esta é a terceira vez em dez anos que o governo federal oferece às prefeituras a oportunidade de renegociar suas dívidas previdenciárias. Uma medida provisória em setembro de 2000, ainda durante o governo Fernando Henrique Cardoso, deu prazo de 20 anos para o pagamento de débitos previdenciários vencidos até julho daquele ano. Depois, a renegociação foi estendida para valores não pagos até junho do ano seguinte. A correção do valor das dívidas, naquele momento, teve como base a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que hoje está em 6,25% ao ano. Em novembro de 2005, na primeira renegociação de dívidas previdenciárias municipais da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, o governo foi mais duro com os municípios, apesar de conceder o mesmo prazo para o pagamento das dívidas. A correção

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Para José Múcio, medida é maneira de evitar que novos gestores sofram com endividamento No anúncio da repactuação, o ministro das Relações Institucionais, José Múcio Monteiro, afirmou que o governo espera com essa medida ter os prefeitos como parceiros e não punir os novos gestores que encontraram as prefeituras endividadas. Ele lembrou que a medida faz parte de um pacote que chegou a dobrar valores de linhas de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para as prefeituras. As condições desta vez são melhores que na anterior e permitem a participação das administrações municipais que aderiram aos programas anteriores e estão devendo parcelas. Além disso, a correção monetária voltou a ser calculada com base na TJLP. Apesar das facilidades, o presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, considerou a medida insuficiente. “É um remédio para alguém que está com febre alta: soluciona na hora, mas no outro dia a febre volta, maior”, afirmou em entrevista à Agência Brasil. Segundo ele, apesar de o governo federal calcular a dívida em R$ 14,5 bilhões, há estimativas de que o valor total chegue a até R$ 40 bilhões.

Projeto em tramitação na Câmara propunha uso da TJLP, mas fixava prazo de 15 anos “A primeira vez que parcelaram a dívida dos municípios foi em 1997, quando Fernando Henrique Cardoso publicou medida provisória com esse parcelamento. A dívida dos municípios na época somava R$ 4 bilhões. Depois disse, houve mais quatro parcelamentos, e hoje estimase que essa dívida esteja entre R$ 14 bilhões e R$ 40 bilhões”, disse. Ziulkoski defendeu ainda que o governo precisa fazer um encontro de contas, ou seja, descontar da dívida dos municípios com o INSS as dívidas que o próprio INSS tem com os municípios. Ele cita como exemplo as compensações previdenciárias, contribuições que a Previdência Social devolve às prefeituras que criaram regimes próprios de previdência para seus servidores, passando a ter a responsabilidade pelo pagamento das aposentadorias. A renegociação das dívidas previdenciárias dos municípios, que têm ou não Regime Próprio de Previdência Social, já era tema de projetos de lei no Congresso Nacional. Um deles, do deputado Mário Negromonte (PPBA), propunha a volta do uso da TJLP, mas fixava o prazo em 15 anos. Além de permitir a retenção de parcelas do FPM, estipulava que os municípios que aderissem ao programa deveriam se comprometer com o repasse mensal ao INSS de 1% de sua receita corrente líquida mensal, até a quitação de suas dívidas. O projeto – que tramitava pelas comissões de Seguridade Social e Família; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania – valia apenas para municípios que tivessem no máximo 50 mil habitantes ou receita bruta anual menor que R$ 135 milhões. Na justificativa apresentada com o projeto, em dezembro do ano passado, o deputado lembrava que os pequenos municípios são mais de 90% do total de cidades Negromonte do país.

Foto: divulgação

do valor das parcelas tinha como base a taxa Selic, que é praticamente o dobro da TJLP. Além disso, caso a parcela não fosse paga na data de seu vencimento a União podia descontar o valor dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). As dívidas renegociadas eram anteriores a setembro de 2005. As dívidas posteriores podiam ser renegociadas, mas em um prazo máximo de 60 meses, também com correção pela Selic. Desde dezembro do ano passado, para as renegociações destas dívidas era exigido também que fossem quitados 20% do valor total da dívida logo na primeira parcela. Nestas condições, consideradas duras pela maioria dos prefeitos, apenas 300 municípios, segundo o governo federal, aderiram à renegociação.

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Ilustração: Américo Gobbo

Passo a Passo Certificação de gestores

Conhecimento de causa Curso oferecido pela Abipem qualifica responsáveis por institutos para escolher carteiras de investimentos com noções mais sólidas sobre planejamento atuarial

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explica. Di Blasi acredita que a certificação veio para ficar nesta årea, principalmente como uma forma de garantir a qualificação profissional dos gestores.

Paulo di Blasi

Foto: Ana Linn

esde o ano passado, quando foi iniciado, o curso da Abipem (Associação Brasileira de Instituiçþes de PrevidĂŞncia Estaduais e Municipais) de formação de gestores de Regime PrĂłprio de PrevidĂŞncia Social (RPPS) jĂĄ preparou quatro turmas. Outras trĂŞs estĂŁo com o inĂ­cio das aulas programado para março. Segundo o economista e professor Paulo di Blasi, a grande vantagem do curso ĂŠ a sua capacidade de formar gestores de fundos com um viĂŠs especĂ­fico para a administração de regimes prĂłprios. “Tanto os professores como os alunos sĂŁo especialistas neste setor, o que propicia uma discussĂŁo em aula de problemas reais do dia-a-dia desses profissionaisâ€?, afirma. Para ele, a diferenciação ĂŠ importante, pois, alĂŠm de lidar com a administração de um ativo, como os demais gestores de fundos, o administrador de um RPPS precisa de conhecimento especĂ­fico para gerir com eficiĂŞncia os passivos de ordem previdenciĂĄria. â€œĂ‰ preciso entender e saber trabalhar as diferenças entre um plano que estĂĄ em uma fase mais nova, com a captação forte para garantir o futuro dos assegurados, e outro em fase mais madura, com muitos beneficiĂĄrios de aposentadoriaâ€?,

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Foto: Assessoria de imprensa da prefeitura de Vespasiano

Amarildo Cruz, de Vespasiano, agora usa mais critérios próprios para avaliar carteiras de investimento

Amarildo Cruz

Até por isso, além das disciplinas obrigatórias para a formação de gestores do mercado financeiro em geral, o curso tem uma parte específica sobre a gestão de passivo previdenciário, que ensina, por exemplo, análise de cálculo atuarial. O diretor-presidente do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Vespasiano, em Minas Gerais, Amarildo Cruz, fez o curso da Abipem no segundo semestre do ano passado e foi aprovado no curso de certificação de gestores em janeiro deste ano. Ele destaca que, antes do curso, dependia muito de comentários externos e da confiança nos profissionais que lhe ofereciam carteiras de investimentos para decidir pelo melhor negócio no mercado financeiro. — Com o curso, ganhei condições de análise, passei a ter conhecimento para tomar decisões — afirma Cruz, que administra um fundo criado em 2002, com 1.220 segurados, 75 aposentados e 21 pensionistas. Vespasiano tinha 94 mil habitantes em 2007, segundo o IBGE. Cruz diz que, além das vantagens na grade curricular, aproveitou a experiência para trocar conhecimentos com colegas que precisavam tomar decisões em situações parecidas com as que enfrenta. — A discussão sobre a parte de cadastro foi muito importante para mim — afirma. Mas a característica principal para ele foi mesmo o aprendizado relativo aos cálculos atuariais.

— No nosso caso, é preciso ter uma visão de longo prazo, saber interpretar os cálculos atuariais, ser capaz de garantir o pagamento futuro a todos os segurados — explica. Encerrado o prazo para os regimes próprios de previdência social da União, dos estados e do Distrito Federal apresentassem a comprovação de que os responsáveis pela sua gestão foram aprovados em cursos de certificação sobre gestão de fundos, agora é a vez de a exigência valer também para os municípios. Para os RPPS municipais que tinham recursos aplicados superiores a R$ 10 milhões, o prazo vai até o próximo dia 30 de junho próximo. Para aqueles com investimentos inferiores a R$ 10 milhões, a certificação precisa ser apresentada até o dia 31 de dezembro. A data de referência para o cálculo deste valor foi o dia 31 de dezembro de 2007. Os RPPS que não tinham recursos vinculados aplicados naquele dia não precisam apresentar a comprovação. Ainda assim, precisam comunicar à Secretaria de Políticas de Previdência Social que não tinham recursos previdenciários naquela data. Os regimes próprios que começaram a acumular recursos a partir do dia 1º de janeiro de 2008 podem cumprir os prazos dos demais municípios ou apresentar a certificação um ano depois do fechamento do primeiro bimestre em que tiver havido entrada de recursos. A portaria, assinada pelo então ministro Luiz Marinho no dia 15 de maio de 2008, regulamenta dentro da previdência a aplicação da resolução 3.506, de 26 de outubro de 2007, do Conselho Monetário Nacional (CMN), sobre a política de investimentos. No mesmo texto, o Ministério da Previdência Social passou a exigir de todos os RPPS o demonstrativo da política de investimentos para o ano seguinte. Estes dados precisam ficar disponíveis para os órgãos de acompanhamento, supervisão e controle pelo prazo de dez anos.

Portaria de maio de 2008 do Ministério da Previdência exige que RPPS apresentem planos de investimento

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A portaria estabelece que a pessoa que vai assinar como responsável pela gestão dos recursos do regime próprio de previdência social deve ser ligada à prefeitura, ou ao governo estadual, ou a sua unidade gestora do regime, seja como servidor público concursado ou funcionário de livre nomeação e exoneração. Tal profissional deve se apresentar como alguém designado oficialmente para a função. Segundo a portaria, o gestor precisa ter sido aprovado em exame de certificação organizado por entidade autônoma de reconhecida capacidade técnica e difusão no mercado brasileiro de capitais. A entidade certificadora deve atestar a validade e o prazo para a atualização feita pelo profissional.

Abipem oferecerá em 15 cidades curso que dá certificado da Apimec

Pela Internet, o curso oferecido pela Abipem tem duração de 90 horas-aula e pode ser acompanhado pelo computador de qualquer local do país. Para o curso presencial, de 120 horas-aula, é preciso formar uma turma de pelo menos 35 alunos, que devem ainda decidir a periodicidade com que as aulas serão dadas. No fim do curso, os alunos passam por uma prova feita pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) e, caso aprovados, recebem o certificado de gestor da Apimec (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais). Segundo a Abipem, o curso nesta parceria oferece disciplinas específicas para quem já trabalha ou pretende se especializar em RPPS, em que são ensinadas as peculiaridades do equilíbrio financeiro e atuarial de um sistema previdenciário. Trata-se de um diferencial, já que o curso tem o foco específico em um tipo de gestor, enquanto os demais servem para formar gestores de fundos em geral.

Exame importado da Suíça foi substituído, em março de 2008, por prova totalmente elaborada no Brasil O curso presencial custa entre R$ 2.150 e R$ 2.750 conforme a situação do aluno (associado ou não) e a região onde é dado, mais os custos com sala e projetor. No caso do on-line, o valor vai de R$ 1.400 a R$ 1.600. Segundo a Abipem, foram propostas turmas em 15 cidades, das cinco regiões do país. As aulas são dadas por professores com títulos de mestre ou doutor, todos com experiência no mercado financeiro ou de gestão. Os interessados podem fazer sua préinscrição pelo site da entidade (www.abipem. org.br), onde também é apresentado o conteúdo programático do curso. Em 2008, o diretor de Certificação da Apimec, Ronaldo Nogueira, disse à Previdência Nacional (“De igual para igual”, junho/julho de 2008) que a associação com a FGV tinha cinco anos de experiência como certificadora. Em abril de 2003, por meio da Instrução Normativa 388, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) determinou que os analistas de mercado, que produzem recomendações, relatórios e estudos para divulgação ao público com o objetivo de auxiliar na tomada de decisões de investimento, passassem pela certificação. Na mesma época, por meio de outro instrumento, a CVM reconheceu a Apimec como entidade certificadora no mercado brasileiro. A partir daí, a Apimec passou a aplicar exame importado da Suíça para o analista brasileiro, duas vezes ao ano, somente nas próprias regionais: Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte, Fortaleza e Porto Alegre. Dessa maneira, atendia as exigências da IN 388, da CVM. Em 2007, uma parceria da Apimec com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) permitiu o desenvolvimento de um currículo das matérias para a realização dos exames. Em março de 2008 foi realizado o primeiro exame totalmente elaborado no Brasil, dentro do convênio firmado entre Apimec e FGV.

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Ilustração: Américo Gobbo

Investimentos Bancos

Spread,

o vilão da temporada Crédito é arma para enfrentar a crise, mas custo é alto. Enquanto o governo pressiona para obter uma redução e os bancos dizem que taxa tem composição complexa, quem paga o preço é o cliente

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ano começou com um novo capítulo do debate que há anos se trava sobre as altas taxas de juros praticadas no Brasil. O Banco Central reduziu a taxa básica (Selic) de 13,75% para 11,25% ao ano em 2009, para estimular a economia brasileira em meio à crise econômica mundial. Esse ritmo acelerado não encontra paralelo na cobrança de juros aos clientes dos bancos nacionais. Dados do Banco Central mostram que a diferença entre o que as instituições pagam para captar recursos no mercado e o que cobram quando alguém toma esses recursos emprestados – o chamado spread – era em dezembro a maior nos últimos cinco anos. No final de março, o BC informou que o spread para pessoas físicas baixara em fevereiro para 41,5% (43,6% em janeiro). Para as empresas, houve alta de 0,1 ponto percentual. O spread geral caiu no mesmo período de 30,5% para 29,7%. No início de abril, a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) divulgou estudo segundo o qual pessoas físicas e jurídicas pagaram R$ 134,5 bilhões de spread em 2008. A Febraban (Federação Brasileira dos Bancos) contestou a metodologia usada no estudo.

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Diferença entre captação pelos bancos e juros dos financiamentos chegou em dezembro a 30,6 pontos percentuais No início do ano, o BC havia divulgado números segundo os quais, em dezembro, o custo de captação de recursos no mercado financeiro foi de 12,6% ao ano para as instituições financeiras. Mas os juros dos financiamentos feitos por pessoas físicas e jurídicas junto às casas bancárias foram, no mesmo período, de 43,2%. A diferença entre uma ponta e outra chegou a 30,6 pontos percentuais, a mais alta desde 2003, segundo levantamento do próprio BC. É também, provavelmente, a maior diferença cobrada por bancos em todo o planeta. Quando se olha com lupa, percebe-se que é o cidadão comum (a pessoa física) quem sofre mais. Para essa parcela de clientes, o spread cobrado pelos bancos era de incríveis 45,1 pontos percentuais. Em inglês, a palavra spread tem o significado de extensão, abertura. No mundo financeiro, é entendida como margem. Ou, em bom português, o ganho que os bancos têm quando fazem operações de empréstimos. Muita gente fala

Falta informação sobre o percentual que corresponde a cada um dos fatores que entram na composição da taxa que o spread é mesmo o lucro que as instituições financeiras obtêm junto aos seus clientes. Segundo dados de 2008 do BC, citados por Claudia Safatle no jornal Valor, em março, os bancos brasileiros obtêm retorno médio de 23% sobre o patrimônio líquido. Mais do que isso, só na Austrália. Na prática, o spread é como uma caixa preta para quem tenta entendê-lo. As instituições dizem que ele tem uma composição complexa. Embute o risco de um calote do cliente, uma margem para compensar os impostos com que o governo taxa as operações financeiras, além de custos administrativos e dos serviços prestados pelos bancos. Há também um percentual para cobrir os chamados empréstimos subsidiados para agricultura e construção civil, que os bancos são obrigados a fazer. Tudo isso é verdade, mas o que torna o spread um enigma é a falta de informações sobre qual percentual corresponde a cada um desses fatores, principalmente o lucro auferido pelos bancos. É nesse ponto que a discussão sobre o spread se desloca para o campo político. Num momento de crédito escasso por causa da crise econômica, o governo diz que o patamar de dessas taxas no Brasil chegou a um nível inadmissível. Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, esse patamar elevado de juros impede a expansão dos investimentos e o consumo. O governo quer que os bancos públicos, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, baixem seus spreads para forçar os bancos da iniciativa privada a seguir o mesmo caminho. – Com o agravamento da crise econômica, os bancos menores, que emprestavam a pequenas empresas, por exemplo, e eram mais ágeis para conceder empréstimos, ficaram sem funding e não conseguem fazer concorrência para baixar os spreads – explica o professor Ricardo José de Almeida, do Ibmec São Paulo. Em março, o Conselho Monetário Nacional decidiu ajudar bancos Previdência Nacional 19

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pequenos e médios. Criou um Fundo Garantidor de Crédito que vai assegurar depósitos de até R$ 20 milhões por aplicador (por CNPJ ou CPF). Até então, a garantia por aplicador era de R$ 60 mil. Um grupo de técnicos da Fazenda e do BC estuda formas de reduzir o spread. Do lado dos bancos, a Febraban garante que os spreads bancários vêm caindo desde 2003 e atingiram o nível de 22,34% em dezembro de 2007, o mais baixo dos últimos anos. A tendência de queda foi mais forte nos empréstimos para pessoas físicas, segundo o economista, de 59,91%, em março de 2003, para 31,92% em dezembro de 2007. Para pessoas jurídicas, a queda foi de 15,25% (abril de 2003) para 11,89% (dezembro de 2007), o que coloca o Brasil em linha com os spreads praticados em outros países, segundo a Febraban. O economista-chefe da entidade, Rubens Sardenberg, admite que houve uma elevação recente do spread por causa da crise econômica, mas também devido à cobrança de IOF sobre as transações financeiras, além do aquecimento da economia em 2008. De acordo com o economista, o ambiente macroeconômico estável, ganhos de eficiência em função do aumento do volume de operações e avanços no mercado regulatório possibilitaram a

Ricardo José de Almeida

queda dos últimos anos. O volume de crédito no mercado brasileiro saiu de um patamar de pouco mais de R$ 200 bilhões em março de 2003 para R$ 1,23 trilhão, em fevereiro, o equivalente a 41,6% do PIB. A projeção do BC é fechar o ano com o percentual de 44% do PIB e um crescimento de 14% no volume neste ano, em relação ao de 2008.

Em dezembro do ano passado, atrasos de mais de 90 dias nos pagamentos chegaram a 8,1% dos empréstimos – Os spreads também subiram com a expectativa de elevação da inadimplência – diz Sardenberg. Em dezembro, a inadimplência atingiu o mais alto nível desde setembro de 2002. Os atrasos de mais de 90 dias nos pagamentos chegaram a 8,1% dos empréstimos. No fim de 2007, eram 7%. E foi exatamente no segmento de pessoas físicas que a luz amarela acendeu: no empréstimo via cheque especial, a inadimplência subiu de 10% para 10,6% entre novembro e dezembro do ano passado. No de financiamento de automóveis, passou de 4,1% para 4,3%, no mesmo período. Além disso, o economista da Febraban aponta que as operações de crédito usadas pelo Banco Central para medir o spread no país representam menos da metade das operações de crédito – 45,5% – realizadas pelo sistema financeiro. E que as operações com pessoas físicas – que têm os maiores spreads – têm se reduzido nos últimos anos. O que a Febraban quer dizer é que há uma distorção nos dados de spread apresentados pelo Banco Central. Pelas contas da Febraban, o spread consolidado não seria de 30,6 pontos percentuais, como calcula o BC, mas de pontos percentuais.

Rentabilidade sobre o patrimônio é hoje maior na mineração do que no setor bancário, argumenta Federação

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Um dado comparativo apresentado pela Febraban é que a rentabilidade sobre o patrimônio dos bancos, que era a maior do país em 2002, hoje perde para setores como mineração, por exemplo. Em 2007, ela chegou a 23,6% para o setor bancário contra 35,9% para a mineração, segundo a Febraban. Como se vê, o debate é acirrado e há números de ambos os lados para confirmar as teses. Neste ano, quando alguns economistas prevêem um crescimento de apenas 1,5% para a economia brasileira, é consenso que baratear e aumentar a parcela de recursos destinados ao investimento das empresas e consumo das famílias é peça-chave para que o Brasil atravesse o período sem turbulência excessiva. E, de acordo com Almeida, do Ibmec São Paulo, é possível, sim, baixar o spread no país. O governo pode ajudar baixando o imposto embutido nas operações financeiras. As garantias que o banco tem de que vai receber o dinheiro emprestado também são frágeis e o sistema jurídico é lento na cobrança. Para cobrar um crédito

Governo espera que a divulgação das taxas faça cliente migrar para spread mais baixo e acirre a concorrência

atrasado, a Justiça da Nova Zelândia leva sete dias. No Brasil, pode demorar um ano até o devedor ser acionado, porque são levadas em conta questões sociais. A criação de um fundo para cobrir as perdas nos empréstimos certamente ajudaria a reduzir os spreads – analisa Almeida. A divulgação pelo Banco Central das taxas de spread cobradas pelos bancos é comparada pelo governo à divulgação das taxas de juros que essas instituições cobram. Será uma forma de ajudar os clientes a migrarem para spreads mais baixos e acirrar a concorrência. Outra sinalização do governo é a possibilidade de reduzir impostos sobre operações de crédito desde que os bancos se comprometam a reduzir os juros. E a aprovação de um cadastro de bons pagadores pelo Congresso também ajudará a diminuir o custo do dinheiro que é emprestado, porque será uma garantia a mais para os bancos. O certo é que o Brasil fechou 2008 mantendo a incômoda posição de líder no ranking de países que praticam as mais altas taxas de juros reais do mundo. Descontada a inflação oficial medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), de 5,9%, o juro real foi de pouco mais de 7% ao ano. Com um patamar dessa magnitude, certamente a trava ao crescimento sustentado ficará puxada ainda por muito tempo.

O spread subiu após a crise...

Apesar do alto spread, o crédito cresce no Brasil

(em pontos percentuais) Janeiro de 2007 Julho de 2007 Janeiro de 2008 Julho de 2008 Dezembro de 2008 Fonte: Banco Central

27,4 25,1 25,7 25,6 30,6

(Para pessoas físicas e jurídicas)

...Mas a Febraban afirma que a tendência de longo prazo é de queda (Spread para pessoas jurídicas em pontos percentuais)

Março de 2003........... R$ 200 bilhões Março de 2006........... R$ 400 bilhões Dezembro de 2007..... R$ 600 bilhões Dezembro de 2008..... R$ 871 bilhões Janeiro de 2009......... R$ 1,2 trilhão Fonte: Febraban

Março de 2003 15,25 Dezembro de 2007 11,89 Dezembro de 2008 18,33 (Spread para pessoas físicas) Março de 2003 59,91 Março de 2008 31,92 Novembro de 2008 45,03 (Fonte: Febraban)

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Ilustração: Nakata

Investimentos

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Tempo de juros baixos Com queda da Selic, o consumo e o investimento tendem a aumentar, mas a rentabilidade das aplicações financeiras será afetada negativamente

o mais recente encontro do G-20, o grupo de países economicamente mais importantes do mundo, do qual o Brasil faz parte, realizado no início de abril em Londres, o primeiro-ministro da Inglaterra, Gordon Brown, disse uma frase emblemática: — É tempo de baixar juros. É de causar espanto que num país onde a taxa de juros anual está em 0,5% ao ano, o menor patamar desde 1694, quando o banco central inglês foi fundado, o primeiro-ministro ainda enxergue espaço para mais quedas. A taxa básica de juros da Grã-Bretanha nunca havia sido inferior a 2%, nem mesmo durante a Grande Depressão da década de 30 do século passado. Para Gordon Brown e todos os outros presidentes e primeiros-ministros do G-20, baixar os juros virou uma espécie de antídoto contra a crise econômica. E isso inclui o Brasil, um país que se acostumou a conviver com taxas de juros estratosféricas. Em março, o Comitê de Política Monetária (Copom) fez um corte ousado de 1,5 ponto percentual na Selic e a colocou no patamar de

N

11,25% ao ano. Ainda é uma das maiores taxas de juros do mundo, mas para padrões brasileiros os juros começam a encostar em níveis mais civilizados. Descontada a inflação, os juros reais brasileiros ficam próximos de 6% ao ano.

Juros reais entre 4% e 5% são um belo estímulo ao consumo, mas reduzem ganhos de investimentos A cruzada de Brown por juros mais baixos para revitalizar a economia mundial parece que será também a cruzada de Guido Mantega, o minisPrevidência Nacional 23

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Patrimônio dos RPPS, R$ 37 bilhões, tem 98% aplicados em fundos com títulos atrelados à Selic

tro da Fazenda do Brasil. Depois da queda de 1,5 ponto percentual em março, os agentes financeiros consultados pelo Banco Central (BC) preveem uma taxa Selic a 9,75% ao ano no fim de 2009. Descontada a previsão de inflação para este ano, que pode ficar entre 4% e 5%, o Brasil teria juros reais entre 4% e 5%. Do ponto de vista do estímulo à economia, juros mais baixos animam o consumo das famílias. Injetam ânimo também para as empresas, que podem fazer investimentos a um custo mais baixo. A combinação ideal para o Brasil escapar relativamente ileso da crise é exatamente essa: consumo em alta e investimento a todo vapor nas fábricas para suprir de produtos as prateleiras. Mas o presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles, avisa: a redução da taxa de juros também pode incomodar. “Não podemos ter queda para empréstimos e, ao mesmo tempo, dizer que não pode haver queda no retorno de alguns investimentos”, disse ele em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

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Em outras palavras, o mundo de rentabilidades altas sem muito esforço ficará na lembrança se os juros continuarem a cair fortemente, como indicam hoje os mercados futuros e as projeções de analistas. Juros mais baixos tornam menos rentáveis títulos do governo atrelados à taxa Selic. Fundos que, em maior ou menor escala, mantêm em sua carteira esses papéis serão afetados negativamente. O patrimônio dos fundos de previdência do regime próprio, RPPS, atualmente gira em torno de R$ 37 bilhões, dos quais 98% aplicados em investimentos de renda fixa e apenas 2% em renda variável. Se a queda de juros se mantiver em ritmo forte, eles não escapam dessas perdas, e correm inclusive o risco de não alcançar sua meta atuarial este ano, que consiste em oferecer rentabilidade de 6% ao ano mais INPC. Por isso, já existe uma mobilização para discutir a vida nessa nova realidade e o que fazer para melhorar a rentabilidade desses fundos.

Gestores estudam propostas de mudanças na Resolução 3.506 do CMN, que dita regras para aplicações

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Na primeira semana de abril, os gestores do Conselho Nacional dos Dirigentes de Regimes Próprios de Previdência Social (Conaprev) discutiram em Recife medidas para alterar a Resolução 3.506/07, do Conselho Monetário Nacional (CMN), que fixou critérios para a aplicação dos recursos dos RPPS. Foram sugestões para adaptar os investimentos à atual conjuntura econômica mundial, segundo o secretário de Políticas da Previdência Social, Helmut Schwarzer. Um grupo de trabalho composto por integrantes do Conaprev elencou uma série de medidas que foram apresentadas no encontro. Segundo o secretário Helmut, "as propostas buscam reagir ao cenário de mercado financeiro brasileiro, onde a queda da taxa Selic reduzirá a rentabilidade dos títulos públicos ao longo de 2009". — Com as mudanças no cenário econômico, surgem novas oportunidades de investimentos — ressaltou Schwarzer. Uma delas, por exemplo, seria investir em projetos que tenham impacto na economia de estados e municípios, disse ele.

Durante o encontro em Recife, o coordenador-geral da Secretaria de Políticas Econômicas do Ministério da Fazenda, Leonardo Paixão — que já foi secretário da Secretária de Previdência Complementar do MPS — disse que para diversificar as atuais aplicações em renda fixa, os investimentos dos RPPS e fundos de pensão podem buscar ações de empresas privadas e também em seto-

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Foto: Victor Soares ASC/MPS

Ações de retorno demorado e empréstimos diretos para servidores são duas opções cogitadas

Helmut Schwarzer

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Foto: Divulgação

Dácio Rossiter

Precificação dos títulos do governo em carteira pode ser mudada para facilitar cumprimento da meta

res de infraestrutura, como energia, portos e ferrovias. Segundo ele, são investimentos de retorno demorado, mas que apresentam boa rentabilidade, principalmente no longo prazo. Atualmente, pelo menos 30% dos recursos dos fundos podem ser aplicados em ações, segundo a legislação. — Creio que devemos buscar outras oportunidades, porém com muita cautela, principalmente quando o cenário é de incertezas — alertou. O presidente da Fundação de Aposentadorias e Pensões do Estado de Pernambuco, Dácio Rossiter Filho, que também participou do encontro em Recife, afirma que entre as sugestões que serão levadas ao Conselho Monetário Nacional pelo Conaprev estará uma modificação na Resolução 3.506.

— A 3.506 limitou a possibilidade de aplicação dos fundos. Modificá-la será uma forma de abrir o leque de investimentos — diz Rossiter. Segundo ele, uma das ideias apresentadas para melhorar a rentabilidade das carteiras é que os fundos passem a fazer empréstimos diretos aos servidores. Seria uma espécie de empréstimo consignado, com risco de inadimplência inexistente, remunerando os recursos com taxas próximas ou equivalentes às dos bancos. Na média, eles cobram 2% de juros ao mês. — O empréstimo aos servidores viria da poupança dos fundos e aumentaria a rentabilidade da poupança, além de oferecer crédito a muita gente — propõe Rossiter.

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Um mundo de juros baixos Na Europa e nos EUA, os juros estão nos mais baixos patamares da história (ao ano)

EUA

Europa (Zona do euro)

Inglaterra

Japão

China

6,00% 5,00% 4,00% 3,00% 2,00% 1,00%

0,25%

1,5%

Há mais coisas sendo discutidas. Gestores de fundos sugerem uma mudança na precificação dos títulos do governo que compõem a carteira dos fundos de previdência. No jargão técnico dos gestores, há duas expressões que indicam a forma de obter o valor de um título de renda fixa: "marcação a mercado" e "marcação na curva". Os títulos que recheiam as carteiras dos fundos de previdência são atualmente marcados a mercado. Marcação a mercado significa atualizar o preço do ativo para o valor do dia da venda do título. Ou seja, mesmo no caso de aplicação em renda fixa que segue uma taxa de juros determinada (pré ou pósfixada), para saber o valor desse ativo em determinado dia é necessário que seu preço seja atualizado. A marcação a mercado evita que aplicações e resgates de cotas em fundos de investimento sejam feitos com a precificação dos ativos fora do valor de mercado, deixando o lucro ou o prejuízo para os demais cotistas. Essa alternativa é adequada para a hipótese de o título ficar permanentemente disponível para negociação. A marcação na curva, ao contrário, é adequada ao título que ficará em carteira, para ser resgatado somente no seu vencimento. Nesse caso, o valor do título corresponderá ao custo de aquisição, acrescido da atualização pelo respectivo indexador e dos juros, ambos calculados sobre o valor de emissão do título. — Uma forma de otimizar o retorno dos fundos, em tempos de juros mais baixos, seria mudar a marcação a mercado para a marcação na curva. Os fundos têm recursos para manter um título, por exemplo, por 30 anos. O retorno na marcação na curva seria mais interessante — diz Fernando Pérez, responsável pela unidade de investimentos do Funpemg (Fundo de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais).

0,5%

0,1%

5,58%

Ainda haverá mais um encontro dos gestores do Conaprev antes de se bater o martelo. Outras sugestões devem entrar no cardápio. Uma delas seria que o patrocinador do fundo — leia-se governo estadual ou municipal — fosse chamado a socorrer com uma injeção de recursos caso a luz vermelha se acenda em relação ao cumprimento da meta neste ano e no próximo, em caso de a crise ter vida mais longa. Outra medida que poderia ser adotada neste momento é a eliminação do rating obrigatório para os fundos de regime próprio. É uma forma de reduzir custos administrativos.Segundo um gestor, quase todos os ativos que integram a carteira desses fundos já têm avaliação de risco.

Atuário diz que ainda é cedo para saber se a meta dos fundos será ou não atingida neste ano

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Da ótica dos profissionais que fazem cálculos atuariais, ainda é cedo para cravar que a meta dos fundos não será atingida. — Acho que, embora os juros caiam no Brasil, a tendência é ficarem em patamares acima do mercado internacional, já que o país precisa atrair investidores. E mesmo que os fundos fiquem abaixo da meta um ano, não significa que a perda não possa ser recuperada nos anos posteriores — argumenta o atuário Richard Mendes Dutzmann, da consultoria ETAA.

Ele aponta que a taxa de juros é apenas um dos fatores que podem influir no cumprimento da meta. — Há outros fatores que influenciam, como a entrada de novos servidores quando há concurso público. Ou se um beneficiário se separa e se casa com uma mulher mais jovem, por exemplo. Em caso de morte dele, a esposa vai receber o benefício por mais tempo que a antiga mulher. Tem ainda o crescimento da expectativa de vida da população. Tudo isso também influencia no cálculo atuarial do fundo — explica Mendes. Como se vê, a discussão está só começando.

O patamar dos juros no Brasil está mudando (taxa Selic) 2007

12,60% 12,5% 12,40%

12,20%

12,00%

12%

11,80%

11,60% 11,5% 11,40% 11,25%

11,25% 11,00%

10,80%

2008

Junho

Julho

Outubro

Setembro

Dezembro

16,00% 13,75%

14,00%

13% 13,75%

12,00%

13,75%

11,75%

11,25%

12,25% 11,25%

10,00% Janeiro

2009

Março

Abril

Junho

Julho

Agosto

Outubro

Dezembro

14,00% 12,75% 12,00% 11,25%

9,75%

10,00%

8,00% Janeiro

Março

*Dezembro * Previsão * Fonte: Banco Central do Brasil

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Ilustração: Emídio Montenegro

Modelos de Gestão Estados Unidos

Risco velhice Crise iniciada nos mercados financeiros golpeia de maneira cruel milhões de aposentados americanos que tinham aplicações em ações. Há risco de uma catástrofe de saúde Jorge Félix

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ou pequeno demais, mas se ele funciona – se ele ajuda famílias a encontrar trabalho por um salário justo, seguro-saúde que possam pagar e uma aposentadoria digna.” Durante o período no qual, segundo Obama, os Estados Unidos foram governados por “argumentos políticos arcaicos” que os “consumiram por tanto tempo”, a população do país envelheceu mais com a chegada aos 65 anos dos baby-boomers (os nascidos no pós-guerra). Ao mesmo tempo, o sistema de saúde deixou 47 milhões de cidadãos sem cobertura, e a previdência social, baseada no principio da contribuição definida (os chamados planos 401K), demonstrou-se insuficiente para atender às necessidades do trabalhador na fase pós-laboral. O mercado financeiro insinuou à classe média que guardar a poupança para cobertura do risco velhice em ações de empresas seria a forma mais segura e duradoura de garantir o bemestar social que o Estado, há muito, lhe havia negado.

“Wall Street somos nós”, brada o presidente da associação americana dos aposentados

ogo depois de chamar de cínicos aqueles que se aproveitaram do ambiente econômico de livre mercado para auferir lucros exagerados e empurrar o país para uma das maiores crises financeiras da História, depois de alertá-los que, agora, “o contexto mudou totalmente”, o presidente Barack Obama, em seu discurso de posse, enumerou o que realmente interessa aos americanos neste momento e, em três pontos, resumiu o maior desafio de seu mandato: “A questão que lançamos hoje não é se nosso governo é grande

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O que ocorreu de fato é que a crise dos “cínicos”, para usar a palavra de Obama, fez dos aposentados as maiores vítimas do crash da bolsa de Nova York. Antes mesmo de o Congresso recusar-se a aprovar o pacote de George W. Bush, o presidente da American Association of Retired People (AARP), a associação dos aposentados, Bill Novelli, fazia pressão pela ajuda do governo ao mercado financeiro com uma declaração à imprensa que resume a situação dos aposentados e os desdobramentos do estouro da bolha. “Não esqueçam: Wall Street somos nós”, disse ele, dirigindo-se aos parlamentares – uma prova inconteste de que muitos dos bilhões com circulação livre pelo mundo eram recursos de aposentados e de suas poupanças.

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Com alta expectativa de vida e baixa assistência governamental, apelo a “milagres” financeiros A crônica da crise nos jornais americanos tem sido muito mais um relato de aposentados que foram à bancarrota do que até mesmo de trabalhadores desempregados e muito menos de executivos que perderam ou devolveram bônus milionários, ganhos em cima da aplicação da poupança de idosos. Quando o país conquistou uma expectativa de vida média de 78 anos (75 para os homens e 80,9 para as mulheres), a única maneira de substituir a ausência do Estado na saúde e na previdência foi recorrer a supostos milagres financeiros. “O sistema de previdência privada está em crise cada vez maior, como ficaram os sistemas públicos, porque os baby-boomers não pouparam o suficiente para viver seus últimos anos de vida e, agora, os sistemas de contribuição definida ficaram dependentes do mercado de ações e de todos os riscos inerentes a ele”, afirma Robert Butler, diretor do International Logevity Center (ILC, centro internacional de longevidade).

O país tem recursos muito avançados para tratamentos de saúde, mas eles são caros Segundo o Census Bureau, órgão público responsável pelas estatísticas dos Estados Unidos, a população norte-americano está cada vez mais diversificada e envelhecida. Em 2008, a população com mais de 65 anos

atingiu os 38,7 milhões, bem perto dos 14% do total (percentual considerado pela ONU para definir um país envelhecido). Mas em 2030 alcançará 88,5 milhões. Embora vários sistemas de aposentadoria norte-americanos (públicos e privados) garantam a cobertura da maioria da população idosa – com exceção dos imigrantes ilegais que começam a atingir a idade de 65 anos, o valor dos benefícios recebidos pelos americanos dificilmente cobre os custos de saúde. O país vive hoje um paradoxo: oferece os recursos mais avançados, mas também mais caros, para quase todos os tipos de tratamento. Liccardi, um aposentado, tinha fortuna que lhe rendia US$ 130 mil por ano. Perdeu quase tudo, aos 86 anos A crise, portanto, agravou a situação, com as perdas provocadas pela redução do valor das ações e pelos golpes financeiros, como as pirâmides. A história de Thomas V. Liccardi, por exemplo, é apenas mais uma entre tantas contadas pelo jornal The New York Time. Aos 86 anos, era um aposentado milionário sem preocupações financeiras. Juntou uma fortuna que lhe rendia US$ 130 mil por ano. Mais do que suficiente para pagar uma casa de repouso e custos de cuidados de saúde de longa duração para ele e a esposa. Todo mês, um extrato mostrava que ele tinha US$ 2,7 milhões, graças a uma aplicação de parte de suas reservas na pirâmide de Bernard Madoff – agora acusado de golpear 8 mil clientes, entre idosos, celebridades e instituições, com sua promessa de ganho fácil. Liccardi perdeu quase tudo. “Pensei que pudesse estar tranqüilo para pagar minhas contas pelos próximos dez anos”, lamentou.

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Crise faz com que pais passem a morar com filhos, prática incomum no país

Foto: Alexandre Raths / dreamstime

“O mundo inteiro está em recessão. Mas os Estados Unidos são o único país rico no qual a catástrofe econômica também será uma catástrofe de saúde – na qual milhões de pessoas perderão seus seguros de saúde junto com seus empregos e ainda perderão acesso aos cuidados essenciais”, escreveu Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia de 2008, defensor de um programa de seguridade social urgente, paralelo ao plano de socorro aos bancos. A situação se agrava porque, nos próximos anos, o déficit de cerca de US$ 750 bilhões (5% do PIB) limitará as ações do governo. O problema já provoca um fenômeno denominado “boomerang parents” (pais bumerangues), ou seja, a mudança dos pais idosos para a casa dos filhos, algo incomum até hoje no arranjo familiar americano típico. No entanto, para atender sobretudo os aposentados e suas famílias, Tommy Thompson, secretario de saúde do governo Bush, reconheceu à revista The Economist que o cenário é tão ruim que “2009 será o ano de maior transformação no sistema de saúde” do país. Em 1960, a área de saúde consumia 5% do PIB. Em 2025, consumirá 25%. Além deste aumento, Obama gastará outros tantos bilhões para ampliar a cobertura.

Muitos cidadãos não se enquadram nos critérios da previdência pública nem têm dinheiro para a particular Atualmente, o país tem dois programas de saúde. O sistema Medicare, exclusivamente federal, atende a idosos com 65 anos ou mais, salvo casos especiais, de pessoas que contribuíram com 2,9% do salário por ao menos 10 anos durante a fase laboral — esses são atendidos pelas empresas. Em 2007, o programa atendeu a 43 milhões de norte-americanos e a previsão do Department of Health and Human Services (HHS, o Ministério da Saúde) é de um crescimento de 80% até 2030. Por enquanto, apenas o estado

de Massachusetts tornou obrigatório o seguro saúde para todos os residentes. O Medicaid, financiado pelos estados e pelo governo federal em percentuais iguais, adota como critério de elegibilidade a renda familiar. No entanto, na medida em que não cumpre a exigência de acesso nem a um programa público, nem a um segurosaúde privado — por falta de renda suficiente para arcar com essa despesa ou porque o setor privado, com gastos rígidos, demanda rigorosos critérios para fazer frente a custos determinados pela concorrência e pela busca da rentabilidade — , o cidadão encontra-se no limbo.

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Entrevista Jorge Félix

Economia da longevidade Dissertação de mestrado sobre envelhecimento aponta risco de aumento da desigualdade

editor-executivo da revista IstoÉ Jorge Félix, colaborador de Previdência Nacional, diz que a desigualdade pode aumentar no país em função do envelhecimento populacional, “caso a economia mantenha-se dentro dos parâmetros financistas e que têm um impacto na política econômica, sobretudo dos países subdesenvolvidos”. O jornalista concluiu pesquisa sobre o envelhecimento que resultou em dissertação de mestrado apresentada na Economia Política da PUC-SP.

Foto: Divulgação

O

Previdência Nacional – O que marca sua pesquisa? Jorge Félix – O diferencial dela é a sugestão de se construir uma economia voltada para a nova dinâmica populacional. Para isso se faz necessário eliminar o aspecto do capitalismo que principalmente os franceses definem como financeirização. Esse tipo de capitalismo implica crescimento econômico baixo, desemprego e desigualdade social altos. Ainda bem que a crise atual pode alterar alguma coisa, talvez por algumas décadas. A garantia do bem-estar da população idosa depende do capitalismo produtivo e de menor força da finança. O Brasil enfrentará, nas próximas duas décadas, o desafio de garantir não só emprego, mas também aposentadoria digna para uma grande população idosa e com maior expectativa de vida. É isso que sugeri denominar de Economia da Longevidade. Muitos acadêmicos já aceitam minha sugestão como necessária e viável. Previdência Nacional – Que oportunidades e desafios o fenômeno da longevidade oferece para a sociedade e o governo brasileiros? Jorge Félix – Podemos aproveitar a experiência maior de uma mão de obra qualificada por

mais tempo, e um mercado consumidor mais promissor, mas, para isso, não se podem reduzir gastos sociais, nem manter uma gestão da previdência que ignore fraudes e sonegação de fontes de receita, culpando apenas o envelhecimento pelo déficit. A boa situação do idoso de hoje é resultado da presença do Estado em todo o seu ciclo de vida. Mas o pensamento econômico dos últimos anos empurrou o cidadão a aceitar o discurso de que "o Estado não pode assumir tudo" e com o passar do tempo, o Estado passou a não assumir nada — saúde, educação, transporte ficaram sob a responsabilidade do cidadão. Só falta a velhice. Segundo alguns autores, há um processo de privatização da velhice. Depois da educação de qualidade, plano de saúde, carro, é preciso fazer previdência privada. Previdência Nacional – Serão necessárias novas reformas da previdência? Jorge Félix – Elas são necessárias em face da dinâmica de uma população em envelhecimento moderado avançado. Dizem que a Previdência brasileira é "escandinava", mas os benefícios são compatíveis com aquilo que o cidadão não conseguiu receber do Estado durante todo o seu ciclo de vida. Até hoje, as duas reformas, de FHC em 1998 e de Lula em 2003, retiraram direitos, instituíram o fator previdenciário, cobraram contribuição de aposentados, mas não resolveram aquilo que era apontado como o objetivo da reforma: acabar com o déficit.

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Foto: Sérgio Vale

Entrevista José de Anchieta Batista

Vista aérea de Rio Branco

Prioridades realistas Regime Próprio do Acre busca soluções para eliminar déficit atuarial sem afetar investimentos necessários à melhoria das condições de vida da população

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uando a República foi proclamada, o Brasil tinha vinte estados. O Acre não existia. Era terra boliviana e peruana, povoada por brasileiros, terra que, como se sabe, tornou-se brasileira em 1903. Em

1962, o antigo território virou estado e ganhou um quadro próprio de servidores públicos, regido pelo Regime Geral de Previdência Social. Em 1993, uma lei estabeleceu o Regime Próprio, mas, como conta nesta entrevista o presidente do Previdência Nacional 35

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Acreprevidência, José de Anchieta Batista, os recursos previstos para a manutenção do sistema não foram transferidos pelos sucessivos governos até 2005, quando novas leis foram aprovadas, o instituto de previdência do estado foi criado e novos compromissos foram assumidos pelo governo estadual. E, desde então, diz Batista, cumpridos. Ficou, é claro, um gigantesco buraco nas contas. Anchieta calcula o déficit previdenciário do Acre para os próximos 35 anos em mais de R$ 3 bilhões. O governo do estado deveria destinar recursos para eliminar esse déficit? Anchieta acha que não. “Fica difícil, ou mesmo impraticável, iniciar agora a destinação de altíssimo volume de recursos para o regime de previdência do servidor público, cujo contingente soma mais ou menos 5% da população (cerca de 660 mil habitantes), em detrimento das urgentíssimas e inadiáveis necessidades de investimentos para os outros 95% dos acreanos”, diz ele na entrevista abaixo.

José de Anchieta Batista – Não é bem assim. Como as leis previdenciárias do país não blindavam os recursos previdenciários, em outubro de 1996 o fundo previdenciário foi extinto por lei complementar, e as obrigações de aposentadorias e pensões passaram a ser regidas pelo Tesouro estadual. Até então o estado não havia recolhido ao fundo um só centavo dos 13% a que estava obrigado. Naquele momento, somente da parte do servidor migrou para o Tesouro uma reserva da ordem de 34,5 milhões.

Previdência dos funcionários estaduais foi reestruturada em 2005 e saldo mensal agora é positivo

Fundo previdenciário foi extinto em 1996 e Tesouro estadual se encarregou de pagar benefícios

Previdência Nacional – Então, após 16 anos, deve existir volumosa reserva para pagamento de benefícios.

José de Anchieta Batista

Foto: Divulgação

Previdência Nacional – Quais os principais pontos da história da previdência do servidor público do estado do Acre? José de Anchieta Batista – Desde que passou à categoria de Estado, 1962, o Acre teve seu quadro de servidores regido pelo Regime Geral de Previdência Social, o que perdurou até 1993. Naquele ano, a Lei Complementar estadual nº 39 trouxe para o servidor público um regime próprio de previdência, criando também um fundo previdenciário com o objetivo de abrigar os recursos para manutenção do sistema.

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Previdência Nacional – Quantos servidores estão hoje abrangidos pelo sistema? José de Anchieta Batista – Falo só dos servidores do poder executivo, porque os outros poderes, no que diz respeito aos assuntos previdenciários, ainda não migraram para o Instituto de Previdência. A folha de pagamento mensal do Executivo conteve, em dezembro de 2008, 40.510 servidores e benefícios previdenciários e não previdenciários. Desse total, 7.958 são empregados públicos, temporários ou com características excludentes do regime, sendo abrangidos pelo Regime Próprio apenas 32.552, entre civis com cargos efetivos e militares, aí incluídos ativos, inativos e pensionistas. Os ativos vinculados ao regime são 26.956 e os inativos e pensionistas são 5.596. Retrato da folha em dezembro de 2008 Total de servidores e benefícios previdenciários e não previdenciários

40.510

Empregados públicos não abrangidos pelo Regime Próprio

7.958

Servidores incluídos no RPPS

32.552

Inativos e pensionistas

Catedral de Nossa Senhora da Glória, Cruzeiro do Sul, Acre

Previdência Nacional – Qual é a receita de contribuições e quanto soma a folha de benefícios sob responsabilidade do Acreprevidência? José de Anchieta Batista – As contribuições dos servidores e do estado somaram em dezembro de 2008 R$ 11.030.585,70, excluídas as contribuições sobre o 13º salário. Por força de Lei, o Executivo vem contribuindo mensalmente para reduzir o déficit da folha de benefícios dos militares, o que representou um valor adicional de R$ 1.182.278,66, totalizando uma receita global de R$ 12.212.864,36. Considerando que as folhas de aposentados e pensionistas somaram, sem o abono natalino, R$ 10.450.807,01, houve um superávit de R$ 1.762.057,35. Acreprevidência, dezembro de 2008 Contribuições de servidores e do governo

12.212.864,36

Folhas de aposentados e pensionistas (*)

10.450.807,01

Resultado no mês (R$)

Dos quais...

Ativos

Fotos: Sérgio Vale

Previdência Nacional – Como ficou a situação após as reformas iniciadas com a Emenda Constitucional número 20, de 1998? José de Anchieta Batista – Esse sistema iniciado em 1996 perdurou até 8 de dezembro de 2005, quando foram editadas duas leis estaduais. A Lei nº 1.688 tratou da criação do Acreprevidência e da recriação do fundo de previdência social, estabelecendo alíquotas de 11% para o servidor e 11% para o Estado. E a Lei Complementar nº 154 reestruturou o regime próprio, cujas regras estavam totalmente ultrapassadas ante as novas normas em vigor.

26.956 5.596

Fonte: Acreprevidência.

Muitos servidores admitidos na década de 80 já têm ou vão completar logo requisitos para se aposentar

+ 1.762.057,35

(*) Não inclui abono natalino. Fonte: Acreprevidência.

É muito pouco, mas, pelo menos, não estamos ainda no vermelho. Há, contudo, uma preocupação iminente: grande número de admitidos na década de 80, principalmente no magistério, estão completando ou já completaram os requisitos para requerer suas aposentadorias. Previdência Nacional 37

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Passarela Joaquim Macedo, Rio Branco

Não há reserva financeira para cobrir onda de aposentadorias. Cautela guia o governo no estudo de soluções Previdência Nacional – Há alguma reserva financeira ou algum plano para enfrentar este problema? José de Anchieta Batista – O governo aborda internamente a situação, com muita preocupação. Após mais de quarenta anos de administração estadual, esta questão veio cair em nossas mãos. Uma particularidade é que temos tratado os problemas acreanos sem perder de vista o sentido de unidade. Hoje o déficit previdenciário do estado do Acre, para os próximos 35 anos, é de mais de 3 bilhões. Com uma população que atinge hoje algo em torno de 660 mil habitantes, fica difícil, ou mesmo impraticável, iniciar agora a destinação de altíssimo volume de recursos para o regime de previdência do servidor público, cujo contingente soma mais ou menos 5% da população, em detrimento das urgentíssimas e inadiáveis necessidades de investimentos para os outros 95% dos acreanos. Estamos buscando alternativas que sejam compatíveis com o curto, o médio e o longo prazo. Para que todos estejam sempre preocupados com os déficits, fizemos constar de nossa lei que o duodécimo de cada poder suportará as eventuais insuficiências financeiras oriundas da folha de benefícios de seus inativos

e pensionistas. Outra providência é que faremos em breve o aumento da alíquota patronal. Temos também sentido que a reposição de servidores, nos últimos quatro anos, proporcionou o não estrangulamento do sistema. A reserva de recursos é muito pequena, em se tratando de fundo previdenciário, mas fechamos o ano de 2008 com pouco mais de R$ 94 milhões em aplicações.

Servidores estaduais trabalham dentro do TCE para ajudar a acelerar processos de aposentadoria Previdência Nacional – E quanto à compensação previdenciária? José de Anchieta Batista – Nossa relação institucional com o Tribunal de Contas do Estado tem sido exemplar. Depois de algum tempo de esforços conjuntos, estabelecemos procedimentos que facilitaram os registros dos processos de aposentadorias. Temos reuniões periódicas em que discutimos exaustivamente os pontos conflitantes de interpretação das normas, após o que, em última instância, propomos ao governo as alterações necessárias. Uma inovação que deveria ser seguida por todos os Tribunais é a existência de servidores dos Institutos trabalhando dentro do TCE, a fim de agilizar a solução dos problemas. Aqui no Acre nosso Tribunal nos concedeu uma sala devidamente equipada. Tudo isso possibilitou que o TCE conseguisse homologar, até 31/12/2008, 1.276 processos. Recebemos atualmente do INSS uma importância mensal da ordem de R$ 100 mil, referentes à manutenção de 242 benefícios, depositados em conta específica. Nessa conta existe hoje um saldo de mais de R$ 8,500 milhões.

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Previdência Nacional – O Acreprevidência realiza eventos de divulgação de assuntos previdenciários para os servidores públicos? José de Anchieta Batista – Temos realizado algumas palestras na capital e no interior do estado, e cursos direcionados aos servidores. Neste ano realizaremos encontros em todas as regionais do Acre, com o objetivo de difundir para o servidor público seus direitos previdenciários e estabelecer uma aproximação entre eles e nosso Instituto. Também está programado para o mês de dezembro o Seminário Acreano de Previdência, que tem sido promovido anualmente com muito sucesso, desde 2006. O III Seminário, realizado em dezembro de 2008, recebeu o importante apoio da Abipem, na pessoa do presidente da Apeprem, João Carlos Figueiredo, que participou ativamente do evento.

Seminários estaduais e eventos na capital e em cidades do interior ajudam a divulgar assuntos previdenciários Previdência Nacional – Como está o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP)? José de Anchieta Batista – Temos conseguido renová-lo normalmente. Quanto aos aspectos de equilíbrio financeiro e atuarial, em razão das peculiaridades do estado, vamos administrando à medida que os problemas vão surgindo junto ao Ministério da Previdência Social. Previdência Nacional – O Ministério vai exigir que os administradores de recursos sejam certificados, sob pena de haver suspensão do CRP. Como está o Acreprevidência nesse particular? José de Anchieta Batista – Conseguimos capacitar e certificar, em 2008, o diretor de Administração e Finanças, bem como o diretor de Previdência do Instituto. Estamos tranqüilos quanto a isso. Previdência Nacional – Existe algum conselho para acompanhamento da gestão? José de Anchieta Batista – Sim. Dois conselhos têm participação efetiva na gestão do Instituto. O Conselho Fiscal cuida da análise das contas, dos balancetes, dos livros e outros documentos administrativos, emitindo parecer para o Conselho Estadual de Previdência Social, o Ceps, que tem tido fundamental importância nas deliberações sobre assuntos da gestão. O Conselho Fiscal é composto de quatro membros e o Ceps, de 12. Em ambos, a participação é paritária entre representantes do estado e dos servidores.

Quem é José de Anchieta Batista é paraibano da cidade de Teixeira. Formou-se em ciências contábeis em 1985. Foi auditor do INSS e chefe do Serviço de Arrecadação e Fiscalização do Instituto. Mora no Acre há três décadas e desde 1998 exerceu diferentes cargos na administração estadual. Preside o Acreprevidência desde sua criação, em 2005, e é do Conselho Fiscal da Abipem.

Parque da Maternidade, Rio Branco

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Ciência & Tecnologia Sergio Rezende

Conhecimento

disseminado Ministro da Ciência e Tecnologia abre as portas de seu gabinete para parlamentares e prefeitos interessados em programas de inclusão digital e difusão de tecnologia

Foto: Fabio Rodrigues / ABr

Sergio Rezende

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físico Sergio Machado Rezende, ministro da Ciência e Tecnologia, passou a vida na universidade e em instituições de pesquisa. Sua produção científica está entre as mais importantes do país em sua área de especialidade, a física experimental e teórica de materiais magnéticos e propriedades magnéticas. Mas as portas de seu gabinete se abrem regularmente para conversar com parlamentares e prefeitos. Ele reclama da dureza da agenda, mas não dos frutos dessas conversas: está convencido de que a disseminação de conhecimentos científicos e tecnológicos em centenas de cidades traz bons resultados. “Trata-se de colocar mais conhecimento num aprendizado tradicional, transmitido geralmente pelos pais”, diz Rezende nesta entrevista a Previdência Nacional. Ao mesmo tempo, a inclusão digital eleva de maneira sensível o patamar de

O

Foto: Lenildo Pedro

Na expressão atenta dos alunos, a consciência do valor da tecnologia

informação acessível por populações das mais diferentes partes do país.

Um ministério que dependia quase exclusivamente do Orçamento da União passa a receber emendas O relato de Rezende começa com a nomeação pelo presidente Lula, em janeiro de 2004, de Eduardo Campos, hoje governador de Pernambuco, para o MCT. — Ele não era da área. Reuniu a assessoria do Ministério e entidades do setor e durante dois dias conduziu um processo de planejamento estratégico que rePrevidência Nacional 41

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sultou na definição de quatro eixos — conta o atual ministro. — Primeiro, a consolidação e expansão do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. Segundo, a promoção de inovação tecnológica nas empresas. Terceiro, as áreas estratégicas, como Amazônia, Programa Espacial e Programa Nuclear. Quarto, ciência, tecnologia e inovação para inclusão e desenvolvimento social.

Quatro programas Os quatro programas voltados para os municípios são: • Promoção da Pesquisa e do Desenvolvimento Científico e Tecnológico • Ciência, Tecnologia e Inovação para a Inclusão e o Desenvolvimento Social • Inclusão Digital

Campos exercia até então mandato de deputado federal pelo PSB de Pernambuco e constatou que os recursos do MCT vinham quase exclusivamente do Orçamento da União. Uma porcentagem ínfima resultava de emendas parlamentares. — Ele percebeu que o mecanismo das emendas poderia ser mobilizado principalmente para ações locais de inclusão e desenvolvimento social — diz Rezende. Em 2005, o MCT começou a receber emendas de parlamentares. Em julho daquele ano, Rezende, até então presidente da Finep, foi nomeado por Lula para substituir Campos. Ele também é filiado ao PSB e o MCT está dentro da “cota” desse partido desde a formação do primeiro governo Lula. As emendas parlamentares foram se multiplicando. O Ministério percebeu que havia aí uma oportunidade. Levou o assunto tão a sério que preparou um fôlder chamado Ciência e Tecnologia para os Municípios no qual são publicados os enunciados tecnicamente exatos a serem usados por deputados e senadores na redação de suas propostas de emendas (ver Quatro programas).

Reprodução

• Comunidades Tradicionais

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Foto: Lenildo Pedro

Na região de Caruaru formou-se importante pólo de confecção

Inclusão digital e social é ponto forte do ‘PAC da Tecnologia’, mas requer parcerias com estados, municípios e instituições Em 2007, no primeiro ano de seu segundo mandato, Lula lançou o Plano de Ação Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional, apelidado PAC da Tecnologia, com previsão orçamentária de R$ 41 bilhões até 2010. Parte substancial dos recursos foi destinada à inclusão tecnológica. Segundo Rezende, dois programas muito populares são o dos Centros de Inclusão Digital e o dos Centros Vocacionais Tecnológicos (CVTs), “espaços que têm como principal objetivo transmitir conhecimentos e ensina-

mentos tecnológicos simples, voltados para ações práticas”. Já existem cerca de 380 CVTs no país. Rezende exalta as virtudes desses centros com exemplos de setores como laticínios e movelaria. — Trata-se de colocar mais conhecimento num aprendizado tradicional, transmitido geralmente pelos pais — diz o ministro. — E muitos desses centros têm pequenas oficinas de beneficiamento. Previdência Nacional 43

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Mas há um complicador: os recursos do MCT não são suficientes. Ele precisa fazer parcerias com prefeituras, governos estaduais, ONGs e outras instituições.

Gemas e joias na gaúcha Soledade. No Agreste pernambucano, confecções em Caruaru e laticínios em Garanhuns — Em Minas Gerais, o governador Aécio Neves decidiu apoiar o programa comprometendo-se a colocar um real para cada real colocado pelo governo federal. E o secretário de Ciência e Tecnologia, Alberto Portugal, ex-presidente da Embrapa, muito competente, é um entusiasta do programa. Minas é o estado que tem mais CVTs,

cerca de uma centena — comemora Rezende. O ministro se empolga ao falar de alguns casos. Na cidade gaúcha de Soledade, o Centro Tecnológico de Gemas e Joias “está instalado num prédio enorme, com uma oficina para tratamento de pedras, e tem curso de design”, diz ele. “O Agreste pernambucano se tornou um enorme polo de confecção em Caruaru, Santa Cruz do Capibaribe e Toritama. Há dois CVTs nessa área, um voltado para melhorar a qualidade técnica da costura e outro que oferece curso de desenho de roupas. A sofisticação é impressionante. Há centro de exposições e Fashion Week local”. Rezende menciona também as regiões de Garanhuns, onde os programas do MCT ajudam a desenvolver o setor leiteiro, e de Vitória de Santo Antão e Pombos, onde será criado o Museu do Queijo Coalho de Pernambuco. “O queijo coalho, que se comprava na feira e se levava para assar, uma maneira de eliminar as impurezas, teve uma melhora notável e agora chega a supermercados do Recife, com marca”, diz Rezende. Essa visão entusiasmada indica que não faltarão na agenda do ministro horários para receber parlamentares e prefeitos.

Simplicidade high-tech Secretário do MCT diz que até tecnologias aparentemente simples melhoram qualidade de vida, e informação aumenta oportunidades O secretário de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social do MCT, Joe Valle, diz que os programas são importantes para disseminar tecnologias que têm implicações diretas na qualidade de vida das pessoas. Ele exemplifica com tecnologias que aparentemente

são simples, mas a rigor “high-tech”, como o soro caseiro e a multimistura. Destaca também a disseminação de informações que ocorre por meio do acesso à internet, aumentando a igualdade de oportunidades. Além dos 380 Centros Vocacionais Tecnológicos (CVTs), Valle contabiliza algo em torno de 2 mil Centros de Inclusão Digital e o apoio a 800 ar-

ranjos produtivos locais. A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia promoveu, em 450 municípios, 10.900 atividades das quais participaram cerca de 10 milhões de pessoas. Na Olimpíada de Matemática, realizada em parceria com o Ministério da Educação e com o Instituto de Matemática Pura e Aplicada, Impa, inscreveram-se 18,3 milhões de alunos.

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Ministério comemora adesão de estados e municípios a programas de inclusão digital e social Segundo a Folha de S. Paulo (21 de março), os dois grandes programas de inclusão do MCT, digital e social, receberam em média, entre 2006 e 2008, R$ 238,8 milhões por ano. — A adesão de estados e municípios aos programas é tão grande que já perdemos o controle, no bom sentido — diz o secretário. Ele cita alguns exemplos de CVTs bem-sucedidos: — Em Nova Friburgo, Estado do Rio, o polo de moda íntima criou uma demanda de treinamento para 600 mulheres por mês. A dimensão da atividade pode ser medida pela

existência de 900 pequenas empresas. Em São Luis do Maranhão, a escola de construção artesanal de barcos permitiu a transmissão para novas gerações de um saber que estava se perdendo. O ensino da atividade de restauro de obras de arte em Olinda, Pernambuco, levou à instituição de uma Política Nacional de Restauro. Outro exemplo apontado pelo secretário de Inclusão Social do MCT é o Polo Gesseiro do Araripe, também em Pernambuco. Nessa região, que abrange os municípios de Araripina, Ipubi, Ouricuri, Bodocó e Trindade,

está o maior conjunto de jazidas de gipsita em exploração no Brasil. Em 2006, foi criado em Araripina um CVT onde se realizam pesquisas e cursos profissionalizantes. Valle relata que, em recente reunião com 65 prefeitos de cidades pernambucanas, 63 reivindicaram mais recursos para bolsas destinadas à manutenção de telecentros. No orçamento do MCT para este ano, R$ 189 são destinados à inclusão social. Desse total, as principais fatias são R$ 100 milhões destinados a CVTs, R$ 25 milhões para apoio a arranjos produtivos locais e outro tanto para popularização da ciência.

Foto: Lenildo Pedro

Araripina é o grande polo gesseiro do país

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Gestão Internet

Modernidade pouco acessível Institutos de previdência criam sites previdenciários úteis, mas exclusão digital impede que ativos, inativos e pensionistas se tornem usuários dos serviços

P

ara facilitar o acesso dos servidores públicos à informação sobre aposentadoria, governos e prefeituras investem em sites de institutos de previdência. Mas nem sempre as informações e serviços oferecidos pela internet são bem aproveitados. Em parte, porque a maioria do público em idade de se aposentar não domina o uso da internet e prefere receber informações no tradicional papel. Para mudar esta situação, os institutos investem em ações de comunicação que complementam e divulgam os serviços oferecidos pela Web, como seminários e jornais impressos. Um exemplo de site útil é o da Paraíba Previdência (PBPREV). Ele oferece diversas opções de serviços que podem facilitar a vida do servidor, como a simulação de cálculo do benefício on-line. Além disso, divulga logo na página inicial uma lista com telefones de todos os setores e funcionários do instituto. Em muitos sites, mesmo de empresas e instituições importantes, encontrar telefones nem sempre é tarefa fácil.

Site da PBPREV PBPREV, onde é possível fazer o cálculo do benefício

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Ilustração: Nakata

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Rita poderia ter se aposentado antes. Anália soube que o tempo como diretora não entraria no cálculo No site do governo da Paraíba encontra-se a informação que explica o relativamente baixo aproveitamento dos serviços: apenas 12% da população brasileira têm acesso ao computador, e 8% à internet. Rita de Cássia Farias, 57 anos, há três aposentada, faz parte das estatísticas da exclusão digital. Funcionária municipal durante 28 anos na Escola Municipal Maria Pessoa Cavalcante, em Umbuzeiro, Paraíba, nunca soube da possibilidade de utilizar a internet para tirar dúvidas previdenciárias. Para dar entrada na aposentadoria, a auxiliar de serviços gerais utilizou a dedução. — Pensei que já poderia me aposentar. Fui até Campina Grande, onde podemos contar os anos de serviço. Também consideraram a minha idade, e fiquei sabendo que poderia ter me aposentado meses antes — conta Rita. Em outros casos, os serviços oferecidos aos servidores ajudam. A professora Anália Silveira, de 52 anos, coincidentemente é funcionária pública há mais de 28 anos. Desse tempo, passou três anos e meio na direção da Escola Estadual Professor Epaminondas de Oliveira, na cidade de São Roque, em São Paulo. Há cinco anos, descobriu que o tempo durante o qual foi diretora não poderia entrar no cálculo para a aposentadoria, e os sites previdenciários a ajudaram a esclarecer a dúvida. – Quando fiquei sabendo disso, era apenas um boato. Pesquisei e confirmei na internet. Vi também no site do Diário Oficial do estado. Assim, pude planejar melhor os anos de trabalho que ainda teria – diz a professora.

Institutos que não empregam equipes para desenvolver sites podem recorrer a serviços terceirizados

Para atrair servidores na ativa, aposentados e pensionistas municipais e estaduais, os institutos previdenciários precisam adequar o layout dos sites ao público-alvo. O da PBPREV segue um padrão proposto pelo governo do estado. A Secretaria de Comunicação da Paraíba recebeu o modelo, terceirizou o serviço da criação do site, mas ficou responsável pela manutenção, como incluir notícias. Linaldo Guedes, diretor de jornalismo da Secretaria de Comunicação, explica que, embora o site ofereça os serviços necessários, nem sempre é possível fazer a atualização. A troca de governo — em fevereiro, José Maranhão (PMDB) substituiu Cássio Cunha Lima (PSDB), cujo mandato foi cassado — interferiu na manutenção das páginas. — Toda a equipe foi modificada. Isso dificulta o trabalho, pois não temos senhas para acessar os links — queixa-se Guedes. — Podemos apenas atualizar a página principal do site do governo, e não sabemos quando tudo voltará à normalidade.

No Espírito Santo, falta de interesse dos servidores desanima funcionários do Instituto de Mimoso do Sul O site do instituto de previdência de Mimoso do Sul, no Espírito Santo, também é um serviço terceirizado. O contrato com a empresa responsável terminou e não há previsão de renovação. Por isso, está desatualizado. Ao procurar pelo site em um sistema de busca, não foi possível encontrar o endereço oficial. Leonardo Bulus Gomes Barbosa Lima, escriturário do instituto, diz entretanto que a falta de um site relacionado à previdência na cidade não interfere nos serviços oferecidos:

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— A maioria dos beneficiários e servidores não costuma acessar o site, por falta de conhecimento tecnológico. Eles preferem ligar ou vir pessoalmente tirar dúvidas, não procuram informações via rede. Apesar da falta de investimento na manutenção, Leonardo afirma que não faltou divulgação. — Em 2007 fizemos um seminário para aposentados, pensionistas e servidores na ativa para apresentar o site e mostrar que muitas dúvidas poderiam ser solucionadas pela internet. Desde então, nestes dois anos, uma única aposentada se interessou e veio pedir o endereço eletrônico — lamenta. A baixa adesão por parte dos aposentados, segundo Leonardo, tem mais uma explicação, que vai além da tecnologia. “Aposentado ‘gosta de papel’. Quer ver a informação impressa, anotada”. Para Deise de Jesus Marques, coordenadora de Comunicação e Imprensa do Instituto de Previdência Municipal da cidade de São Paulo (Iprem), é essencial que o leitor se sinta à vontade quando acessa a internet. — O site deve ser agradável para aposentados, pensionistas e servidores, informando-os com clareza, objetividade e informações precisas, pois os temas envolvem uma série de leis complexas. As cores também são importantes, bem como o tamanho e a família das letras – recomenda.

Equipe especializada, informações diferenciadas e layout adequado foram as diretrizes na capital paulista

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Além das informações básicas, o site do Iprem divulga algumas estatísticas do relatório de avaliação atuarial, de forma que os internautas entendam o resultado das pesquisas. Isso pode gerar identificação do leitor com alguns dados revelados, ou despertar o interesse de leitura pela curiosidade. Os links mais procurados são justamente as notícias, além dos temas que abordam pensão e legislação. Para complementar as informações on-line, há o jornal Iprem Notícias, distribuído para aposentados e pensionistas. O layout do site é desenvolvido pela Prefeitura de São Paulo, que fornece alguns modelos para o setor de Comunicação. Esta é responsável pelo

site, e deve estar alinhada com a Secretaria de Finanças, à qual é subordinada. Esta equipe, segundo Deise, é ampla e especializada. “O essencial para se fazer esse serviço de comunicação — para qualquer instituto vinculado a um município — é ter um grupo especializado em tecnologia, com webdesigners e programadores; uma boa equipe especializada em comunicação governamental; e buscar informação no próprio Instituto, ou seja, colher as informações dos servidores especializados nos assuntos que compõem o leque previdenciário.” O custo para manter um site previdenciário não é controlado pelos responsáveis, já que são gastos municipais e estaduais, e não dos institutos.

Qualidade e visibilidade O esforço para garantir a qualidade do site previdenciário não depende apenas de boas informações. A visibilidade deles em um sistema de busca também é algo a ser levado em consideração. O professor universitário André de Abreu, gerente de comunicação corporativa da TAM e um dos autores do blogue Intermezzo, explica que, como grande parte da população não sabe o nome das instituições, a busca por informações pode levar a sites não-oficiais. “Quando se faz a busca por ‘aposentadoria São Paulo’, por exemplo, que é como as pessoas fazem buscas — ninguém vai busca por Iprem —, aparecem sites noticiosos ou de classificados; o oficial, da prefeitura, só vai aparecer na segunda página de resultados. Isso é sinal de que os usuários vão referenciar informações previdenciárias em outros sites”, diz André. Para que o aposentado não tenha dificuldades ao acessar um site previdenciário, algumas mudanças podem ser pensadas pelos institutos e pelo internauta. André de Abreu analisou alguns sites previdenciários e dá dicas para que a adaptação à internet não seja um problema. Segundo Abreu, para garantir que um site irá funcionar em qualquer computador, celular ou dispositivo móvel, ele deve estar dentro dos padrões do W3C, órgão que regulamenta a internet. “Não fazendo isso, o órgão exclui uma parcela significativa da sociedade, como deficientes visuais, que acessam a internet por

meio de programas que leem em voz alta o texto dos sites. Considerando que o público desses sites tem idade avançada e problemas de saúde — visão, por exemplo —, é atentado público não atender as boas práticas mundiais”.

Melhorar a visualização do site em sistemas de busca pode evitar que usuário recorra a outras páginas Ao fazer uma busca na internet, a lista de sites aparece de acordo com o número de acessos. Quanto mais acessado, mais visível este site será na busca orgânica – que não é paga. Ao fazer a análise, André constatou que os institutos não têm tanta visibilidade. “Esse é um indício para que os sites previdenciários invistam em conteúdo de qualidade, serviços e materiais relevantes. Com esse trabalho eles passarão a ser a fonte número 1 de busca de informações das pessoas”. Além dos detalhes técnicos, a redação deve ser levada em consideração. Ao utilizar uma linguagem específica do sistema previdenciário, alguns institutos podem dificultar o entendimento do leitor. “Se o usuário comum não conhece as siglas da área, terá bastante dificuldade em encontrar as informações que busca”.

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Ilustração: Nakata

Gestão Municípios

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Cofre leve,

folha pesada Prefeituras pequenas, com falta de recursos, sofrem com excesso de pessoal. Especialistas dizem que alternativas para absorver mão de obra ainda são poucas m sua edição número 5, Previdência Nacional tratou da situação tranquila do RPPS da pequena cidade paulista de Jumirim (“Folga no caixa”). O município é novo e a maior parte dos servidores ainda levará décadas para se aposentar. A reportagem mencionava o número de funcionários: 154, em abril de 2008, para 2.205 habitantes estimados pelo IBGE em 2007. Jumirim, com seus modestos 154 funcionários, tinha, então, um funcionário por 14,3 habitantes. Só para comparar, cidades infinitamente mais complexas, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, tinham respectivamente, em datas próximas a essas (ver “Caminhos que se bifurcam”, Previdência Nacional número 1), um funcionário por 52 habitantes, um funcionário por 40 habitantes e um funcionário por 67 habitantes. Vespasiano, Minas Gerais, citada na reportagem “Conhecimento da causa” (página 24 desta edição), tinha

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um por 77 habitantes. Ou seja: Jumirim tem proporcionalmente 5,4 vezes mais funcionários por habitante do que Vespasiano, ou 3,6 mais do que a capital paulista. Em 2000, os funcionários eram 94 para uma população de 2.196 habitantes, coeficiente de um funcionário por 23,3 habitantes. Em oito anos, foram contratados 60 funcionários, em maioria por concurso público, o que significa que dificilmente poderão ser dispensados. Previdência Nacional quis saber por que cidades pequenas costumam ter um número proporcionalmente alto de funcionários municipais. É o que se lê na reportagem abaixo, de Carlos Vasconcellos, ilustrada por um exemplo clamoroso, o da cidade fluminense de Trajano de Morais, que no final de 2008 tinha um funcionário por grupo de 8,2 habitantes. Previdência Nacional 53

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Foto: Celso Bechara

Vista de área urbana de Trajano de Morais

Em Trajano de Morais, sobram funcionários mas o IDH é baixo e há 700 quilômetros de estradas sem conservação Com pouco menos de dez mil habitantes, a cidade de Trajano de Morais, na Região Serrana do Rio de Janeiro, é exemplo de um mal que afeta centenas de prefeituras em todo o país: o excesso de servidores públicos. Até o fim do ano passado, segundo dados levantados pelo IBGE em 2008, o município fluminense tinha 1.189 funcionários e população de 9.706 habitantes (contagem feita em 2007), ou um funcionário por 8,2 habitantes, tornando-se uma das máquinas públicas mais inchadas do Brasil. Em contrapartida, apresenta um dos menores índices de desenvolvimento humano e é um dos últimos em distribuição de água e tratamento de esgoto no estado (81º lugar no ranking do IDH dos 91 municípios fluminenses). Com tanto

funcionário, Trajano de Morais tem 700 quilômetros de estradas vicinais para conservar e nenhum caminhão funcionando na prefeitura. Para tentar mudar esse quadro, o novo prefeito da cidade, Carlos José de Souza, do PSDB, terá muito trabalho pela frente. Ele venceu a eleição do ano passado contra José Luiz Viana, o vice-prefeito que assumiu a cidade depois que o titular, Sérgio Gomes, do PL, foi preso na Operação Sanguessuga, em 2007, e afastado do cargo por decisão judicial. O primeiro passo é colocar as finanças em ordem. – Nossa dívida chega a R$ 20 milhões, quase um ano inteiro do nosso orçamento – informa o prefeito. Nos dois primeiros meses de gestão, ele reduziu o número de funcionários para um por 10,5 habitantes, cortando celetistas contratados por meio de uma Orga-

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Prefeito quer apenas quem está interessado em trabalhar. No início da gestão, contratou só 11 pessoas nização Social Civil de Interesse Público cujo contrato terminou em dezembro passado. – Queremos ficar apenas com os que estão interessados em trabalhar – diz. Na hora de empregar, Carlos José pisou no freio: fez somente 11 contratações, apenas para ocupar as secretarias municipais. – Devo ser o prefeito que menos contratou no país – especula. De acordo com o prefeito, os funcionários agora são 920, mas cerca de 50 casos ainda estão em estudo, por isso o número pode cair para 870. A redução será considerável, 319 postos, mas a carga continuará muito pesada. O problema de caixa também afeta a previdência do município fluminense. A dívida da prefeitura de Trajano de Morais com o instituto municipal chega a R$ 5 milhões. Felizmente para o prefeito, o prazo de pagamento do débito previdenciário subiu de cinco para 20 anos, graças ao “pacote de bondades” do governo federal para os municípios (ver “Prazo dilatado”, página 16). – Sem isso, seria impossível pagar essa dívida – afirma Carlos José.

Especialista diz que quanto menor a cidade, maior a tendência a usar a máquina para criar empregos Embora extrema, a situação encontrada pelo novo prefeito de Trajano de Morais não é exceção. François Bremaeker, consultor da ONG Transparência Municipal, constata que quanto menor o porte demográfico de um município, maior a tendência de haver alta relação entre população e servidores. – E muitas vezes isto acontece não apenas com o pessoal efetivo, mas também com os contratados para desempenhar tarefas mais simples, como conservação de estradas,

as merendeiras, o pessoal de limpeza – diz. Nos bolsões de pobreza, explica o consultor, as prefeituras são por vezes o único empregador local capaz de absorver mão-de-obra. – Isso acontece porque frequentemente não há outra atividade econômica de peso no município fora do setor rural, muitas vezes de baixo rendimento – especifica. Dessa maneira, Bremaeker acredita que as pequenas prefeituras brasileiras acabam diante de um dilema econômico.

Metade dos municípios brasileiros tem 96% da receita dependente dos governos estadual e federal – Nos municípios com menos de 10 mil habitantes, que representam mais ou menos a metade das cidades brasileiras, os impostos municipais constituem apenas 4% da receita, em média – explica. Ao mesmo tempo, embora essas cidades não sejam economicamente sustentáveis, elas são a garantia mínima de serviços para milhões de pessoas. Outro fator que aumenta a pressão sobre as folhas de pagamento municipais são os serviços atribuídos às prefeituras. Na saúde, por exemplo, o Programa de Saúde da Família estimula a contratação de equipes. Só que, apesar do custo elevado, as prefeituras arcam com pelo menos dois terços do gasto total. – E quanto mais no interior, mais cara é a equipe, pois os médicos têm de ser pagos regiamente para estimular sua permanência – diz Bremaeker. Como se não bastasse, Marcos Flávio Gonçalves, assessor do Instituto Brasileiro de Administração Municipal, Ibam, adverte que muitas vezes os municípios ainda arcam com serviços que seriam de competência da União ou do estado Previdência Nacional 55

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– caso da segurança pública, parcialmente assumida pelas guardas municipais. Além disso, diz ele, é comum as prefeituras cederem funcionários para órgãos de outras esferas, o que realimenta o ciclo de contratações.

Quinhentos servidores classificados na rubrica serviços gerais e nenhum médico na cidade

Foto: Divulgação

– Mas é claro que também ocorrem distorções para atender a critérios ou compromissos políticos – admite Gonçalves, acrescentando que o ponto de equilíbrio administrativo depende de uma análise do perfil do quadro de servidores. – Somente levantamentos individuais podem demonstrar quando há inchaço e quando o número é compatível com a qualidade e quantidade de serviços prestados – diz. Mais uma vez, Trajano de Morais serve de exemplo do que se vê Brasil afora. Lá, Carlos José tenta reorganizar o funcionalismo. Segundo ele, a prefeitura tem cerca de 500 pessoas trabalhando com serviços gerais – “Não sei nem onde colocar essa gente”, diz –, enquanto o município não tem nenhum médico. “Vamos fazer um concurso para contratar um profissional da área”, anuncia. A crise econômica também agrava o cenário para as prefeituras com folha de pagamento inchada. A redução no crescimento diminui a

Marcos Flávio Gonçalves

Crise diminui a arrecadação e os repasses para as prefeituras, que enfrentam aumento do salário mínimo arrecadação e os repasses federais e estaduais para os municípios. O salário mínimo, por sua vez, aumentou 12% em fevereiro, onerando ainda mais os cofres municipais. – Este aumento do salário mínimo impacta não apenas a folha de pagamentos (pessoal e encargos), mas também os prestadores de serviços (pessoa física e jurídica) e a locação de mão-de-obra, despesas que podem facilmente chegar no total a mais de 70% dos gastos da prefeitura – alerta Bremaeker. Diante desse quadro, qual seria a saída? Inchar o quadro de servidores para garantir emprego à população nos locais onde não há atividade econômica suficiente? Ou diminuir o número de funcionários, para evitar o colapso das contas públicas – e por fim, dos serviços municipais?

Localização e outras dificuldades para atrair investimentos podem impedir que se explore vocação econômica – O que o Ibam vem propondo é que se façam pactos entre as esferas de governo de modo a que esses pequenos e pobres municípios sejam apoiados pela União e pelo estado, cabendo a estes assumir certos serviços ou repassar recursos que permitam reverter a situação – defende Gonçalves. Para ele, os municípios deveriam, sempre que possível, explorar suas vocações econômicas. Mas, para Bremaeker, a dificuldade é que a atividade econômica é concentradora. – Para municípios muito distantes, pode ficar difícil atrair empresas e investimentos – diz. Segundo ele, no longo prazo só uma transferência de receitas direcionada aos municípios com piores indicadores econômicos e sociais poderia mudar o quadro. Uma transferência

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Em Trajano de Morais, a placidez da paisagem não dá ideia dos problemas administrativos

controlada e bem fiscalizada, naturalmente. – Não porque os prefeitos mereçam, mas porque a população merece – diz.

Carlos José ganhou a eleição avisando que era necessário fazer cortes no funcionalismo Outra questão delicada é a estabilidade dos servidores contratados por concurso público. Se, por um lado, o sistema pode melhorar a transparência das contratações, por outro ele pode dificultar cortes necessários para o equilíbrio das prefeituras e engessar o quadro de servidores. Gonçalves, do Ibam, defende a realiza-

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ção de concursos, mas ressalva: “Para evitar o engessamento, o município precisa ter planos de cargos, com ênfase no mérito, que motivem o servidor”. Para ele, um sistema de avaliação permanente do funcionário também pode contribuir para que ele atue com eficiência. “Se mais servidores trabalham eficientemente, menos servidores são necessários.” E para quem acha que o custo político de cortes no funcionalismo pode ser alto demais, o prefeito de Trajano de Morais tem um último recado. – Falei o tempo todo da necessidade de cortes durante a campanha e todos diziam que isso não dava voto – diz Carlos José. – Mas fui eleito. Essa postura de contratações exageradas está indo à falência, política e economicamente.

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Fotos: Divulgação

Entrevista Luiz Paulo Vellozo Lucas

Poder local Deputado diz que reforma política só fará sentido quando for promovida mudança institucional que mexa com a administração dos municípios e suas relações com estado e União

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reforma política é reclamada como “a mãe de todas as reformas”. Três senadores com trajetórias políticas diferentes – o veteraníssimo José Sarney (PMDB-AP), outro ex-presidente da República, Fernando Collor (PTB-AL), e Jarbas Vasconcelos (PMDBPE) –, usaram essas exatas palavras para defendê-la, em pronunciamentos recentes. O deputado federal Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES), prefeito de Vitória por dois mandatos consecutivos, de 1997 a 2004, não ousaria contestar seus colegas de Parlamento. Mas, diz ele, a reforma política hoje em discussão passa longe da raiz dos problemas: o “déficit de poder local”. Os 190 milhões de habitantes do Brasil estão divididos política e administrativamente em 5.564 municípios. Luiz Paulo diz que a população está reunida em algo como 50 mil ajuntamentos humanos.

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Cidades com dinamismo demográfico e econômico não chegam a um quinto do total de municípios O referencial, porém, não é numérico. Num certo sentido, o próprio número de 5.564 municípios é excessivo. Segundo Luiz Paulo, pouco mais de 1.000 municípios brasileiros têm arrecadação própria, ou seja, cobram ISS e IPTU. Os outros 4.500 dependem inteiramente de repasses dos governos estaduais e federal. – Temos um caso de sapato de tamanho único para pés

diferentes – compara. – Mas a verdadeira questão não é o tamanho, e sim o dinamismo, a taxa de crescimento demográfico e econômico. Com a atual estrutura, o município ficou caro. Tanto é assim que o processo de emancipação parou. De fato, o ritmo de criação de novos municípios nesta década é idêntico ao da década de 70 do século passado, praticamente nulo, como se vê na tabela abaixo. A redemocratização da década de 80 foi acompanhada de um impulso de criação de municípios, acelerado após a promulgação da Constituição de 1988. Depois, porém, o movimento cessou. Evolução do número de municípios no Brasil Ano

Municípios

Aumento (%)

1970

3952

---

1980

3974

0,05

1990

4491

13,00

2000

5507

22,62

2009

5564

0,01

O deputado, que presidiu a Frente Nacional de Prefeitos no início da década, passou dois anos pesquisando o tema, entre o fim de seu segundo mandato em Vitória e sua eleição para a Câmara, em 2006. Ele se formou em engenharia de produção na UFRJ e desde 1980 é funcionário do BNDES, que fez convênio com o governo capixaba para financiar essa pesquisa, transformada no livro QualiCidades – poder local e qualidade na administração pública, publicado em 2006. Previdência Nacional 59

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Num sistema político mais direto, não haveria nos municípios divisão entre governar e legislar – Minha proposta é que o orçamento de investimentos seja definido por microrregiões homogêneas. No Espírito Santo, por exemplo, em lugar dos 78 municípios do estado, o recorte para definição do orçamento seriam as onze microrregiões (ver mapas). No Brasil, o recorte passaria dos 5.564 municípios para as 600 microrregiões – diz o ex-prefeito. Luiz Paulo escreveu, em artigo recente, que é precondição para formular uma proposta de reforma do sistema político a revisão conceitual do papel da Câmara de Vereadores e de sua relação com o executivo municipal. Segundo o deputado, o governo de cidades exige “um sistema político mais leve, mais direto, onde não deveria existir a divisão entre legislar e executar”. Ele propõe mudar o papel das Câmaras de Vereadores, transformando-as em “Câmaras de Gestão Municipal”. Os vereadores seriam eleitos pelo sistema distrital. “O prefeito, eleito diretamente”, detalha Luiz Paulo, “seria também o presidente da Câmara, e os vereadores, agora com a função de ‘conselheiros de administração’ da cidade, identificados por distrito, deliberariam junto com o prefeito todas as questões operacionais e normativas do município”. O custo do poder político local, Prefeitura e Câmara de Gestão, com os respectivos funcionários, “deveria ser expressamente limitado à arrecadação tributária local”, vedado o uso, para pagamento de despesas com atividades meio, de re-

Racionalidade da divisão política europeia contrasta com demandas isoladas de municípios brasileiros

cursos oriundos de transferência dos estados e da União. O deputado menciona exemplos europeus. Portugal é dividido em 12 Comunidades Urbanas que têm entre 150 mil e 350 mil habitantes, além de duas Grandes Áreas Metropolitanas, Lisboa e Porto. O país tem 151 cidades, que reúnem 308 concelhos (palavra mais usada que o sinônimo município), divididos em 4.275 freguesias. – Na Alemanha, as grandes cidades têm status de estados, mas um conselheiro municipal de Berlim ganha 200 euros mensais de ajuda de custo e não tem assessoria – diz o ex-prefeito. – A França tem 36 mil comunas, mas o governo nacional faz contratos de gestão com grupamentos de comunas. Esses exemplos são apontados para criticar o que ele denomina falta de articulação multimunicipal, conceito disseminado pelo secretário de Saúde de Minas Gerais, Marcus Pestana. – Três ou quatro municípios vizinhos podem colaborar para a criação de um hospital que atenda trauma, o que cada um, isoladamente, não poderia fazer, por falta de demanda – exemplifica Luiz Paulo. – Mas a realidade, hoje, é que cada prefeito quer hospital, não quer aterro sanitário nem presídio, e briga para sediar delegacia, Ministério Público e fórum.

Espírito Santo

Montanha Barra de São Francisco

Nova Venécia

Colatina

São Mateus

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Cachoeiro de Itapemirim

Itaperimim

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Teia de interesses Deputados propõem emendas que lhes permitam fidelizar prefeitos para garantir apoio local à reeleição para a Câmara ou Assembléia A realidade das práticas atuais está a anos-luz do desenho proposto pelo deputado federal Luiz Paulo Vellozo Lucas para uma reforma política de base. “A grande maioria dos deputados trabalha pela renovação de seus mandatos buscando alavancar ‘apoio’ financeiro para as demandas municipais”, critica o ex-prefeito da capital capixaba. As emendas individuais no orçamento de investimentos “são instrumento de fidelização política do prefeito ao deputado autor da emenda e

fonte de recursos para obras locais. Em muitos estados, o mecanismo se repete de forma análoga nas assembléias legislativas”. Qualquer deputado federal eleito com uma bagagem mínima de propósitos cívicos e ideias desanima quando submetido ao massacrante roteiro de salas de espera de ministérios em Brasília. O atentado a identidades programáticas – cada vez mais frouxas – se dá continuamente, porque “os deputados estaduais e federais

empenham-se na captação de recursos para candidatos a prefeito e vereador independentemente da filiação partidária, em troca de apoio nas eleições em que disputarão a renovação de seus mandatos”, afirma Luiz Paulo. Ele julga ter sido “completamente inútil o debate sobre voto distrital, lista fechada, financiamento público e fidelidade partidária” realizado em 2007: não mexeu com esse esquema que faz do parlamentar um despachante de demandas locais.

Proposta substitui as atuais emendas individuais por dotações para microrregiões Castelo Vargem Alta Cachoeiro de Itapemirim Jerônimo Monteiro

Muqui

São José do Calçado Bom Jesus do Norte

Apiaçá

Mimoso do Sul

A alternativa que o deputado propõe é “a criação de um orçamento de investimento consolidado regionalmente segundo as 600 microrregiões homogêneas do IBGE, que agregue os investimentos de cada município com recursos próprios, as transferências do estado e da União e recursos de terceiros, quando houver”.

Atilio Vivacqua

Na microrregião de Cachoeiro de Itapemirim, dez municípios e 34 distritos Fonte: www.ibge.gov.br

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Os deputados estaduais e federais da microrregião trabalhariam em conjunto com os prefeitos para a elaboração desse “Orçamento de Investimentos Regionais (OIR)”. As microrregiões receberiam dotações globais da União e dos estados da mesma forma como hoje são feitas as emendas individuais, e nenhuma outra forma de transferência voluntária (convênios) seria permitida. A meta é buscar “um sentido de prioridade e bom senso no investimento público local”. Dentro da nova sistemática, Luiz Paulo espera que “nunca mais se veja a destinação de recursos federais para se construir uma quadra poliesportiva num lugar sem sistema de drenagem pluvial e sem sistema adequado de destinação do lixo”. Faz sentido evitar a distorção das políticas públicas, mas a proposta

se choca contra a muralha dos interesses estabelecidos. O poder hoje detido pelos deputados se deslocaria para agentes políticos locais.

Manter o sistema proporcional, mas desenhar circunscrições eleitorais menores do que os estados Existe ainda a questão técnica do sistema eleitoral dos deputados. Ele precisaria ser reformado numa direção como a proposta pelo deputado federal Mendes Thame (PSDB-SP), que consiste na adaptação do sistema proporcional vigente para circunscrições eleitorais menores. Luiz Paulo explica: “Trata-se de uma espécie de ‘distritalização’ parcial do sistema proporcional. Ao invés de o deputado disputar a eleição em todo o

estado, ele disputará em circunscrições menores, cada uma das quais elege três ou quatro deputados federais e de nove a doze deputados estaduais”. O desenho dessas circunscrições ficaria a cargo da Justiça Eleitoral e do IBGE. O quadro ficaria assim no Espírito Santo: “O estado possui 78 municípios em 13 microrregiões onde residem cerca de 3 milhões de pessoas, que elegem 30 deputados estaduais e 10 federais. Seriam criadas três circunscrições eleitorais: região sul, região capital e região norte. As regiões sul e capital elegeriam três deputados federais e nove estaduais cada uma e a região norte elegeria quatro federais e 12 estaduais”. Os deputados cuidariam dos OIRs das respectivas microrregiões: cinco no norte, quatro no centro e quatro no sul (vide mapa).

Em Vitória, avanço no IDH Luiz Paulo Vellozo Lucas diz que em seus oito anos à frente da Prefeitura de Vitória – beneficiados, ressalta, por um planejamento que começou com Paulo Hartung, quatro anos antes – a cidade passou a ser a terceira capital brasileira na lista do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). – Conseguimos reduzir para um dígito a mortalidade infantil e promovemos a erradicação das habitações subnormais, o que significa que não há na cidade palafitas, nem casas sem banheiro, nem ruas sem calçadas – afirma. – Na educação, o ensino infantil, para crianças de 6 meses a 6 anos, nos dá uma pontuação elevada no IDI (Índice de Desenvolvimento Infantil) do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância). Entre os pontos menos brilhantes, o ex-prefeito menciona os transportes coletivos, a segurança pública – “só no último ano de mandato criamos a Guarda Municipal” – e a recuperação do centro histórico. “Vitória é a terceira cidade mais antiga do Brasil. É preciso, entre outras coisas, enterrar

os fios elétricos e telefônicos e acertar as calçadas”, propõe. Luiz Paulo atuou nos governos federal e capixaba. Foi diretor do Departamento de Indústria e tério da Economia, Fazenda e Comércio do Ministério 990 a 1992 Planejamento de 1990 cretário de (governo Collor), secretário ões EstraPlanejamento e Ações ecretário tégicas e depois Secretário de Agricultura do Espírito Santo, e secretário de Planejamento quando o atual do, Paulo governador do estado, to o de VitóHartung, era prefeito 996 96,, ria. Entre 1995 e 1996, ger er antes de se eleger rio i prefeito, foi secretário nto nt o de Acompanhamento isis Econômico do Minisotério da Fazenda (governo FHC).

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Foto: Carlos Avelin

Entrevista Fernando Pimentel

Novas ferramentas Ex-prefeito de Belo Horizonte critica regime políticoinstitucional único para municípios com diferenças gigantescas de tamanho e lamenta dificuldade para mudar arcabouço jurídico

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Urbanização da favela do Cafezal

s municípios são uma realidade muito heterogênea no Brasil, mas todos se regem pelos mesmos instrumentos jurídicos, constitucionais e legislativos, critica o economista Fernando Pimentel, prefeito de Belo Horizonte entre 2001 e 2008. — São Paulo tem 11 milhões de habitantes. Serra da Saudade, em Minas Gerais, tem 2 mil. A renda e, portanto, o orçamento do primeiro são muito maiores, mas, em tese, as atribuições e ferramentas das duas prefeituras são as mesmas — diz Pimentel. Para ele, o desafio que o país enfrenta nesse terreno é dotar os municípios populosos de ferramentas mais eficazes de gestão. — As dez Regiões Metropolitanas do Brasil concentram 40% da população. Foram criados novos instrumentos para geri-las, mas essa é uma mudança legislativa que não está madura, pois se questiona se haverá municípios de primeira e de segunda categoria — lamenta.

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Minas Gerais criou Assembleia Metropolitana, mas texto da Carta de 1988 permite contestações judiciais

“Leis e cultura dos operadores da Justiça, desde advogados até desembargadores, não servem para o século XXI” A Constituição de 1988 estabelece, no artigo 25, que “os estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum”. Mesmo dentro desse universo, porém, as disparidades são grandes. A Região Metropolitana de Belo Horizonte engloba 34 municípios, alguns dos quais muito grandes, como a própria capital, com 2,4 milhões de habitantes, Contagem e Betim, com 800 mil cada, mas também cidades bem pequenas, das quais seis têm menos de 10 mil habitantes, entre elas uma com 3,7 mil moradores, Taquaraçu de Minas. Segundo o ex-prefeito, avançou-se um pouco na legislação estadual, com a criação de uma regra diferente para a Assembléia Metropolitana da região de Belo Horizonte, “mas esse avanço está sujeito a contestação judicial, porque é diferente Previdência Nacional 65

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Lula, com Pimentel, se emocionou com o projeto. Sentados na primeira fila, Patrus Ananias (esq.), Aécio Neves e Márcio Fortes, ministro das Cidades

Municípios conseguiram ampliar serviços prestados à população. Agora, é preciso alcançar qualidade

do que está na Constituição”. A nova legislação estadual prevê que empreendimentos de grande impacto serão licenciados pela recém-criada Agência de Desenvolvimento Metropolitano. Pimentel extrai de sua trajetória de 16 anos na Prefeitura de Belo Horizonte (ver A longa experiência) a convicção de que o grande problema brasileiro é a ordem jurídico-institucional. — A cultura jurídica brasileira é muito atrasada, não é adaptada ao século XXI — afirma. — Refiro-me a um conjunto de leis, somadas a práticas arraigadas no Judiciário que envolvem todos os operadores: advogados, procuradores, juízes, desembargadores. E não adianta mudar leis, fazer reforma tributária, reforma trabalhista, enquanto a mudança não alcança essas práticas. O ex-prefeito dá como exemplo a Lei de Licitações (Lei 8.666, de 1993). — O edital precisa ser colocado na rua 90 dias antes da abertura das propostas. Um empreendimento cujo custo supera 10, 12 milhões de reais passa por essa espera de três meses, e está sujeito a um monte de licenciamentos ambientais, urbanos. Isso dificulta a gestão — diz. Pimentel critica a criação, na vigência da Constituição de 1988, de um número de municípios que considera exagerado. Mas tem uma visão positiva da gestão municipal nas últimas décadas.

Foto: Divulgação

Foto: Divino Advincula

— Se comparamos a situação atual com o que existia há 15, 20 anos chegamos à conclusão de que os municípios, tanto os pequenos como os maiores, têm “se virado” — analisa. — Houve melhora na saúde e na educação. O SUS (Sistema Único de Saúde) chegou a todos os municípios. A qualidade é ruim? Muitas vezes, é. Mas existe. A sala de aula da escola é ruim, os alunos são misturados numa mesma classe? Sim. Mas a escola está lá. Segundo o ex-prefeito da capital mineira, quase todos os serviços públicos que atendem os cidadãos são municipais. Ele considera superado o desafio quantitativo: — Ainda que lentos, num país marcado pela desigualdade e com uma história de exclusão, tivemos avanços. Isso nos permite agora discutir a qualidade dos serviços.

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Mãos dadas “Compartilhamento de diagnósticos e soluções permitiu a Belo Horizonte dar um salto em oito anos” Fernando Pimentel coloca o balanço de sua passagem pela Prefeitura de Belo Horizonte nos marcos de uma experiência, iniciada em 1993, que associou o PT a partidos aliados. Ele diz que a capital mineira deu um salto nos últimos oito anos. As grandes obras realizadas — entre elas a recuperação da Avenida Amazonas, a revitalização da Lagoa da Pampulha, a implantação da infraestrutura do Parque Tecnológico, o BHTec, e a recuperação do Anel Rodoviário — seriam apenas a parte aparente. — O que determina se uma cidade vai ter sucesso não é a quantidade de dinheiro, nem de gente talen-

tosa — diz o ex-prefeito —, mas encontrar um método, sempre democrático, para diagnosticar, resolver e implementar as soluções. Em outras palavras, criar na cidade um espírito de compartilhamento dos problemas e das soluções. Pimentel reverencia uma continuidade que completará vinte anos ao final da atual gestão, que faz contrastar com o quadro paulistano: “São Paulo parece não saber direito o que quer”. Ele se refere à oscilação entre direita e esquerda que marca o processo eleitoral da cidade desde a redemocratização, com Jânio Quadros (1986-1988), Luiz Erundina (1989-1992), Paulo Maluf (1993-1996) e Celso Pitta

Grandes obras deram novo alento a Belo Horizonte

(1997-2000), depois Marta Suplicy (2001-2004), depois José Serra (2005-2006) e Gilberto Kassab (desde 2006).

Continuidade permitiu eliminar transportes coletivos ilegais e tirar camelôs das ruas — Belo Horizonte tem uma continuidade de partidos de esquerda. Em outra vertente, mais de centro, menos de esquerda, Curitiba tem continuidade — compara Pimentel. Essa continuidade, segundo o exprefeito, permitiu à capital mineira resolver, durante suas duas gestões, dois problemas importantes. — Primeiro, Belo Horizonte não tem mais transporte clandestino. Não tem mais perueiro. Quando foi preciso usar o enfrentamento, usamos — conta ele. — Mas também incorporamos o segmento dos que queriam se tornar pequenos empresários do setor. Hoje há mais de 300 microônibus regulamentados que fazem transporte suplementar, bairro a bairro. A outra conquista destacada por Pimentel foi a retirada das ruas dos cerca de 2.500 camelôs que atuavam na cidade. — Conseguimos aos poucos, com muita discussão — relembra o exprefeito. — A cidade deve estar convencida de que camelô é problema. Negociamos, evitando conflitos. Criamos no centro, em galpões dePrevidência Nacional 67

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socupados que compramos ou alugamos, shoppings populares.

Orçamento participativo em versão hi-tech aceita voto por telefone celular Pimentel fala das consultas populares em meio digital para definição do orçamento participativo. — Em 2007, pela internet, tivemos 170 mil votos. Foi escolhida a reforma da Praça Raul Soares, já concluída. No ano passado, quando permitimos também o voto por telefone celular, o número de votantes subiu para 220 mil. Para termos certeza de que o votante é morador de Belo Horizonte, ele precisa digitar o número do título eleitoral. Essa, mais do que as tradicionais reuniões e assembleias, é uma modalidade que pode atrair participação jovem — avalia. Na educação, o destaque é o Programa de Educação Infantil. — Foram criadas 44 escolas em

tempo integral para crianças de zero a seis anos. O resultado é fantástico. Quando o aluno entra no ensino fundamental, sente-se que a educação infantil faz uma diferença brutal. As crianças têm mais equilíbrio, mais disciplina, e são mais bem nutridas — afirma.

Lula se encantou com programa de reurbanização de favelas e encomendou a Dilma remoção de obstáculos O entusiasmo maior de Pimentel é reservado para o programa de urbanização de favelas chamado Vila Viva. Belo Horizonte tem 350 mil favelados, distribuídos em quatro grandes aglomerados: Morro das Pedras, Cafezal, Vila São José e Pedreira Prado Lopes. — Foi o piloto do PAC das Cidades, depois que o presidente Lula foi a Belo Horizonte, em 2007, e se emocionou com o que viu no Cafe-

zal — conta o então prefeito. — Ele determinou à ministra Dilma que removesse obstáculos criados pelo BNDES e pela Caixa Econômica Federal em decorrência de uma orientação que vinha do governo Fernando Henrique. Criavam dificuldades para os financiamentos habitacionais, como forma de conter gastos governamentais. Diziam, por exemplo, que obra de saneamento, sempre parte de projetos de urbanização, cabe ao estado, e portanto o município não poderia pleitear recursos; ou negavam financiamento para famílias com renda inferior a três salários mínimos. E quando nós dizíamos que íamos quitá-los, a resposta era “Não podemos financiar a Prefeitura, só o tomador final”. Pimentel diz que antes das determinações dadas por Lula o jeito era contornar a burocracia. — Chegamos a quase fraudar pedidos de financiamento ao BNDES e à CEF, para que fossem aceitos — revela.

Foto: Divulgação

A longa experiência Fernando Pimentel, que pertenceu a um grupo armado e passou três anos e meio preso durante a ditadura militar, é um dos fundadores do PT. Ele é professor de Economia da Universidade Federal de Minas Gerais, da qual se afastou em 1993, quando entrou no governo do também petista Patrus Ananias. Eleito vice na chapa do prefeito Célio de Castro (PSB), em 1996, foi secretário de Governo, Planejamento e Coordenação Geral. Célio de Castro foi reeleito, mas no início do segundo mandato, em 2001, teve um derrame e se afastou (morreu em 2008). Pimentel completou o mandato e foi reeleito em 2004. Apoiou, conjuntamente com o governador Aécio Neves (PSDB), a eleição de Márcio Lacerda (PSB) para sua sucessão. Reintegrado à UFMG, não voltou às salas de aula: tornou-se assessor do reitor, Ronaldo Pena.

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Gestão Combate à dengue

Sai, mosquito! Prefeituras têm que agir contra o Aedes aegypti, que parece ter vindo para ficar. São Paulo e Teresina avançaram. São Sebastião tem dificuldade com casas de praia vazias

Ilustração: Nakata

Renata Rondino Colaborou Kelly Souza

cada ano, crescem os investimentos, estudos, ações e campanhas de combate à dengue em todo o País. Só em 2008, o Ministério da Saúde investiu R$ 1,08 bilhão para tentar conter os surtos da doença, a maior quantia já investida para esta finalidade. As estratégias se multiplicaram. E, mesmo assim, o Aedes aegypti está longe de ser controlado. No primeiro trimestre de 2009, a epidemia castigou Itabuna, na Bahia. Em 2008, o Rio de Janeiro foi palco de uma crise dramática: até abril, houve na cidade 118 mil casos e morreram 95 pessoas. Isso assusta. Londrina, no Paraná, onde as consequências foram muito mais brandas, pune com multa proprietários relapsos.

A

A disseminação da doença em todo o País tornou-se um desafio. As circunstâncias em que o mosquito se reproduz fazem com que não bastem ações federais e estaduais. As prefeituras das cidades afetadas têm que assumir a causa como prioritária. Os resultados estão longe de ser homogêneos: enquanto o número de casos registrados caiu consideravelmente em alguns municípios, como São Paulo – onde a queda foi de 93% – e Teresina – queda de 71,5% –, em outros, como Além Paraíba, Minas Gerais, houve um aumento de 150%, o que levou a administração municipal a tomar medidas para evitar o terceiro surto seguido da doença. Em São Sebastião, no litoral paulista, a dificuldade são as numerosas casas que ficam vazias fora das temporadas de férias.

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Temporada de chuvas atropelou números que indicavam avanço no controle da doença A época de chuvas iniciada tragicamente em novembro de 2008, com enchentes principalmente em Santa Catarina, ameaça seriamente a manutenção das estatísticas positivas divulgadas pelo governo no ano passado, em comparação com dados de 2007, tais como o aumento das áreas com índices de controle satisfatórios, diminuição das áreas com risco de surto e estabilização do percentual das regiões em estado de alerta. No Sudeste e Centro-Oeste, por exemplo, houve aumento do número de municípios em estado de alerta. As campanhas parecem perder o efeito. Além dos fatores climáticos – como o aquecimento global –, o aumento da população e a ocupação desordenada das cidades, associada à carência de condições de saneamento, dificultam as ações para tentar controlar a proliferação do mosquito Aedes aegypti. Para os especialistas, outros fatores, como a realização tardia de campanhas, depois que o problema está instalado, o mau uso dos recursos públicos nas ações de combate e até o fato de a dengue não ser uma doença com alto índice de mortalidade estão entre as causas que, apesar dos esforços da mídia, fazem com que o problema não ganhe o status de prioridade nacional. Paralelamente, existem estudos para a elaboração da vacina que permita conviver com o Aedes sem desenvolver a dengue. De acordo com o Levantamento Rápido do Índice de Infestação por Aedes aegypti (LIRAa) do Ministério da Saúde, divulgado no início do ano, cinco municípios atualmente estão em situação de risco para ocorrência de surto: Epitaciolândia, no Acre, Várzea Grande, em Mato Grosso, Itabuna e Camaçari, na Bahia, e Mossoró, no Rio Grande do Norte. Em estado de alerta, 71 municípios requerem atualmente total atenção. O próprio Ministério da Saúde reconhece que a descontinuidade nas ações de controle da dengue pode alterar o quadro e colocar outros municípios em situação de risco. Como ocorreu no Rio de Janeiro em 2008.

O combate cresce, mas não necessariamente a dengue regride. As regras do jogo são complexas e, o que é pior, podem mudar de uma hora para outra. O agravante é que no verão, devido às altas temperaturas, o ciclo do mosquito pode ser reduzido de 30 dias, como acontece em temperaturas amenas, para 12 dias. Isso representa aumento direto da população do vetor. E é exatamente isso que motiva a principal estratégia de atenção do poder público no combate à dengue. Falta, dizem os especialistas, mais envolvimento da população na eliminação dos possíveis criadouros, ações educativas ininterruptas, ampliação da rede de saneamento básico e, principalmente, intensificação da coleta de dejetos sólidos.

Professor defende educação continuada para que preocupação com o mosquito entre na prática diária da população Para Marcos Boulos, professor titular de moléstias infecciosas e parasitárias da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, a questão da dengue tem de ser analisada de forma individualizada. Cada região ou município precisa de atuação específica. Na capital paulista, por exemplo, as questões climáticas, o calor e as chuvas intensas propiciam o acúmulo de criadouros do mosquito e tornam o combate ainda mais difícil. Previdência Nacional 71

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Fatores políticos podem mudar o foco dos programas de prevenção e comprometer sua eficácia – O aumento das chuvas no verão propicia melhores condições para a procriação do mosquito – explica o professor. – A ação, portanto, tem de ser de duas formas. O poder público precisa atuar imediatamente para evitar o acúmulo das águas, com a limpeza de córregos, drenagem de coleções de água, vistoria em parques públicos e cemitérios, detectar terrenos baldios para evitar acúmulo de lixo. Do outro lado, campanhas educativas precisam mostrar a importância de todos cuidarem de sua casa para evitar focos do Aedes. Boulos considera, no entanto, que o melhor programa é a educação continuada, principalmente nas escolas, para que as pessoas incorporem em sua prática diária a preocupação com a disseminação do mosquito. – Campanhas acabam sempre chegando atrasado, pois elas surgem apenas quando o problema está instalado, e, aí, a dificuldade é maior – diz. Um dos momentos de maior cuidado com a dengue é quando o município atinge o estado de alerta. A população deve intensificar os cuidados para eliminar os criadouros e também evitar o possível contato com o mosquito, não indo a locais em que há ocorrência da doença e também se protegendo com repelentes. Na hora de agir, afirma Boulos, é preciso também considerar questões geográficas, como a manutenção da população próxima de locais onde existe grande possibilidade de proliferação; e questões econômicas, como a falta de suprimentos e recursos humanos que possibilitem o incremento de ações de controle. E, acima de tudo, pesa a prioridade dada pelos governantes ao programa. Se fatores políticos mudarem o foco, o controle da situação pode acabar seriamente comprometido. A crise econômica mundial pode ser um agravante para o controle da dengue. As ações preventivas

correm o risco de ficar comprometidas com a diminuição da arrecadação. O maior investimento vem do repasse de verbas federais, mas muitos municípios não utilizam os recursos para essa finalidade. O curioso sobre o curso da dengue no Brasil é que há duas décadas o mosquito estava erradicado, graças a uma intensa política de saúde adotada nas primeiras décadas do século passado. O objeto da campanha não havia sido a dengue e sim a febre amarela, transmitida no meio urbano pelo Aedes. Os resultados positivos acabaram se misturando. O retorno do mosquito trouxe a dengue para as populações, mas não carreou, como no passado, grande preocupação dos governantes. O motivo, segundo Boulos, é que, diferentemente da febra amarela, a dengue não traz agravantes econômicos. – No passado, o controle do Aedes era prioridade nacional, pois a febre amarela tem alto grau de fatalidade, o que não é o caso da dengue. Não conseguíamos mais exportar o café por causa da febre amarela em Santos e no Rio de Janeiro. Portanto, também havia interesse econômico destaca Boulos. Para ele, atualmente a esperança está no desenvolvimento da vacina para a dengue.

Quando o Aedes ressurgiu, o governo militar tratou o assunto em segredo, como item de “segurança nacional” No artigo “Dengue no Brasil: situação epidemiológica e contribuições para uma agenda de pesquisa”, a médica infectologista Maria da Glória Teixeira e o médico Maurício Barreto, ambos da Universidade Federal da Bahia, afirmam que, se o governo tivesse tomado medidas quando o Aedes voltou a agir no Brasil, em 1976, o quadro atual da dengue seria totalmente diferente.

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O governo militar decidiu tratar da questão quase em segredo, considerando-a um caso de “segurança nacional”. E, para piorar, apenas em 1995 a dengue de fato mereceu a devida atenção do governo federal, com a criação do Plano Diretor de Erradicação do Aedes aegypti (PEAa), quando era ministro da Saúde o médico Adib Jatene. Mas já haviam se passado 17 anos de intensa circulação de pelo menos dois sorotipos do vírus (DEN 1 e DEN 2), e parcelas significativas da população já haviam sido infectadas.

Especialistas consideram eliminação do mosquito quase impossível nas condições atuais Os dois médicos explicam que a alta competência vetorial do Aedes – muito bem adaptado ao ambiente urbano densamente povoado –, somada ao estilo de vida da população, tornam a prevenção da dengue tarefa quase impossível. Para eles, as ações para eliminar o mosquito em suas diferentes fases têm uma efetividade muito baixa. Em 1986, narram os autores, os países americanos decidiram investir no controle da população do mosquito, ao invés de erradicá-lo. Acreditavam que, com menos mosquitos em circulação, a infestação se reduziria ou mesmo cairia para zero. Mas não foi o que aconteceu. “O vírus da dengue tem capacidade de circular mesmo em lugares com baixa densidade vetorial”, diz o artigo. Justamente por isso o PEAa de 1995 era abrangente: além de banir o mosquito, era preciso adotar políticas urbanas que praticamente impossibilitassem que qualquer exemplar dele pudesse se instalar, se reproduzir e voltar a infestar o país. Ou seja, além do combate químico, com o uso de inseticidas e larvicidas, foram estabelecidas estratégias de saneamento ambiental, mobilização social, campanhas de conscientização. “Entretanto, entraves políticos, administrativos e financeiros impossibilitaram a sua execução e,

Foco exclusivo no combate direto ao mosquito resultou em aumento da infestação domiciliar assim, não foi possível verificar se essa proposta traria os benefícios esperados”, lamenta o texto. Em outro artigo, publicado em 2002, Maurício Barreto e Maria da Glória destacam que as críticas ao PEAa estavam centradas basicamente no alto custo do projeto: R$ 4,5 bilhões para quatro anos. “Só o dinheiro gasto (ou melhor, desperdiçado) com as atividades de controle da dengue desde a elaboração do PEAa já ultrapassa mais da metade do orçamento previsto para esse plano”, criticaram os especialistas, na época. O segundo Plano Ajustado de Erradicação do Aedes aegypti (PEAa), que saiu em 1996, por ironia, insistiu em decisões tomadas dez anos antes: estava reduzido apenas ao combate direto ao mosquito. “Durante o período 1997-2001, a execução do PEAa consistiu quase que exclusivamente de combate vetorial químico”, criticam os especialistas. Por isso mesmo, nesse período as áreas habitadas pelo mosquito aumentaram, assim como os níveis de infestação domiciliar. Em 2002, o Ministério da Saúde aumentou os investimentos no combate à doença, descentralizou as ações para os municípios e tentou mudar a estratégia. Mas não adiantou. As epidemias continuaram e ainda foram agravadas por um problema extra: o surgimento de infecções de outro sorotipo (DEN-3), que de 2001 a 2004 se disseminou para municípios de 25 dos 26 Estados brasileiros. Temese agora que um quarto sorotipo, presente em pa-

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População está mais informada, mas mantém antigos hábitos que favorecem a proliferação íses vizinhos, seja trazido ao Brasil. A erradicação do Aedes, única forma efetiva até agora considerada por Maurício Barreto e Maria da Glória para colocar um fim ao pesadelo da dengue, tem longo caminho a percorrer, cheio de ramificações. Que começa por enfrentar a preocupante capacidade do mosquito de se adaptar aos ambientes urbanos. Durante o período em que a fêmea está com os ovos em gestação, ela pode ingerir sangue várias vezes de diversas fontes, o que aumenta as chances de infecção. Depois, no mesmo ciclo, deposita os ovos em diferentes lugares, aumentando as chances de sobrevivência da prole. O artigo considera ainda, além de outros fatores, que a população, apesar de estar mais bem informada a respeito da doença e da necessidade de manter o ambiente limpo de possíveis criadouros de larvas do Aedes, não modifica seus hábitos permanentemente. E o conhecimento médico e científico sobre a doença ainda é limitado. “A literatura atual apenas sugere algumas hipóteses sobre os mecanismos causais (por exemplo, a hipótese de infecções sequenciais) e alguns fatores de risco individuais que aumentariam a chance da sua ocorrência (algumas doenças crônicas, doenças alérgicas, etnia branca, etc.). Porém, o nível de evidências existentes ainda não permite formar um quadro completo do problema, e menos ainda ajudar na prevenção”, explicam, acrescentando que falta preencher algumas lacunas no conhecimento dos fatores que desencadeiam as formas graves da doença.

Enquanto as respostas não chegam, o governo federal tenta jogar com as peças que tem nas mãos. A campanha atual conta até com apoio das Forças Armadas. O investimento recorde anunciado inclui R$ 40,3 milhões em campanhas publicitárias veiculadas em todo o país e R$ 13,3 milhões para a compra de 340 veículos, entre carros e motocicletas, além de 300 máquinas que serão usadas por equipes de vigilância em campo. Há ainda um montante de R$ 128 milhões a serem gastos

Nove órgãos do governo federal e 40 mil agentes comunitários estão envolvidos na campanha atual em municípios prioritários, tais como regiões de fronteira, turísticas ou que integrem regiões metropolitanas. Os agentes de saúde foram reforçados com 2.321 militares das três forças (Marinha, Exército e Aeronáutica), que vão colaborar com eles tanto no combate ao mosquito como em educação e mobilização, além de ajudar na assistência aos pacientes em áreas de risco. Nove órgãos do governo federal estão envolvidos na campanha: os ministérios das Cidades, da Defesa, da Educação, Integração Nacional, Justiça, Meio Ambiente e Turismo, Casa Civil e Secretaria de Comunicação Social. Do outro lado, mais de 40 mil líderes comunitários trabalham de porta em porta ou por telefone. E alguns municípios testam três novas estratégias: testes de sorotipos mais rápidos, captura de mosquitos por armadilha (caso de Teresina) e uso da internet no alerta à população sobre focos do mosquito. A solução para o combate à dengue, com resultados práticos, é uma combinação entre educação, informação e medidas como o abastecimento de água com qualidade e recolhimento do lixo. Não há soluções mágicas afirmou o ministro José Gomes Temporão.

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Pressão benfazeja

Fotos: Divulgação

Visitadores recrutados pela prefeitura de São Paulo induzem moradores a combater sem trégua o mosquito

Cartaz da campanha contra a dengue, da prefeitura de São Paulo

São Paulo pôs um verdadeiro exército nas ruas para enfrentar o Aedes aegypti. Ainda que os números de infestação predial tenham caído em 2008 em relação a 2007, ficando quase zerados – de 0,4% para 0,1% – a Secretaria Municipal de Saúde colocou a dengue entre suas mais absolutas prioridades. A população não tem descanso e já estabelece quase que uma relação de amizade com os agentes da prevenção. Amizade em termos. Os visitadores “pressionam” os moradores para não dar trégua ao mosquito. São 2.500 agentes de zoonoses e outros quase 7.000 agentes comunitários que visitam mensalmente um conjunto de aproximadamente 200 mil famílias.

Alarme soou em 2007 Pressão e reconhecimento: eis a dupla milagrosa que tem feito os números da dengue na capital paulista baixarem numa verdadeira cruzada para banir o mosquito da cidade. O alarme para que a ação de vigilância se intensificasse soou em 2007, conta o secretário municipal de Saúde, Januario Montone. Segundo ele, quanto mais rápido for identificado um caso, mais rapidamente será feita a ação de bloqueio na região onde houve ou pelo menos suspeita-se que houve a contaminação. Em 2008, foram

registrados 216 casos de dengue autóctone. Os números caíram 70% em relação ao ano anterior e refletem a preocupação das autoridades de saúde, diante da notificação, em 2007, de quase 2.700 casos. Ainda que relativamente baixos se se levar em conta a população de 11 milhões de habitantes, causaram reações. – Eu diria que a “mágica” segue a marca permanente do paulistano: muito trabalho, combate permanente à dengue. Alguns diferenciais é que dispomos de uma rede de laboratórios própria para testagem e confirmação dos casos suspeitos, e de um software específico para projeção de risco de propagação – afirma Montone. Mas o grande diferencial mesmo, na opinião do secretário paulistano, foi o ingresso do agente comunitário de saúde do programa Saúde da Família no trabalho de prevenção. – É como uma visita de vizinhos, mas ele está ali para cobrar, para acompanhar os cuidados que as pessoas têm com locais que podem se tornar possíveis criadouros – diz.

Honra ao mérito Os agentes de saúde são moradores de cada região e são responsáveis por uma determinada área de cobertura. Nesses locais, fazem um intenso trabalho de orientação e distribuem cartazes e folhetos com os cuidados recomendados. Mensalmente, ou no máximo a cada dois meses, todas as famílias cadastradas são visitadas. E quem, de fato, mantém as ações de prevenção

Agentes de saúde ajudam a reduzir os casos de dengue em São Paulo

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recebe o selo com os seguintes dizeres: “Eu não deixo a dengue entrar”. O adesivo, geralmente colado na garagem ou na área frontal das casas, é recebido como um prêmio pelos moradores. Com ele, vêm a touca de proteção para a caixa d’água, a areia nos pratinhos, entre outras ferramentas para a missão de acabar com o mosquito da dengue. – O cidadão brasileiro já está razoavelmente bem informado sobre os locais possíveis para o desenvolvimento do mosquito e como prevenir. Ele sabe que 95% dos focos estão dentro das casas, principalmente nas caixas d’água e nos pratinhos dos vasos de plantas. As campanhas estão chegando ao conhecimento da população e são realizadas com frequência – pontua o secretário. O que ocorre, segundo Montone, é que as pessoas acabam se “esquecendo” de olhar o pratinho, relaxando um pouco nos cuidados.

Sindicato dos Motoboys participa da campanha As campanhas da secretaria municipal de Saúde de São Paulo são realizadas com parceiros da iniciativa privada, instituições, ONGs, postos de atendimento público, como rodoviárias, terminais de ônibus, igrejas, centros esportivos da rede Sesc/Senai/Senac. Até o Sindicato dos Motoboys pediu o selo para distribuir para todos os entregadores. Desde 2005 são realizadas campanhas de prevenção em São Paulo. A primeira teve como tema “Faça sua lição de casa”. O resultado do trabalho integrado do poder público e da população foi confirmado pelos índices numa região carente, o Jardim São Luís, no distrito de M’Boi Mirim, Zona Sul da cidade. A área tem 100% de cobertura dos agentes comunitários e todos os moradores são visitados regularmente. Funcionou. Os 246 casos de dengue notificados em 2007 caíram para apenas seis pessoas infectadas em 2008. (R.R.)

Fotos: Celso Moraes - PMSS

O Aedes não tira férias

Vista aérea de São Sebastião. Casas de veraneio dificultam o trabalho dos agentes comunitários

São Sebastião, outro município paulista, no litoral, enfrenta situação inversa. Os números cresceram em 2008 em relação a 2007, mantendo a cidade em estado de alerta, conforme avaliação do Ministério da Saúde. O índice passou de 2, 3% em 2007 para 2,8% em 2008. Isso representa, segundo as autoridades de saúde, que de cada 100 imóveis fiscalizados, em três foram encontradas larvas do mosquito. A cidade conta com um aliado da dengue contra ao trabalho de prevenção: por ser uma cidade praiana, muitas casas de veraneio ficam fechadas. É nesses locais que mora o perigo. Se não houver uma vigilância rigorosa, a água de chuva pode se acumular nos quintais e formar criadouros. Segundo Márcia Saavedra de Souza, enfermeira da Vigilância em Saúde do município, “a dificuldade no controle dos vetores concentra-se basicamente na presença dos criadouros. O trabalho de conscientização da população na eliminação dos criadouros removíveis – latas, garrafas, potes – e no controle dos não removíveis – caixas d’água - é fundamental para nossa ação. Mas o que dificulta o trabalho são as casas fechadas durante a maior parte do ano, abertas somente nos períodos de alta temporada”. (R.R.)

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Armadilhas para fêmeas Teresina combina prevenção e armadilhas que atraem mosquitos para pôr ovos que serão destruídos Em 2008, a Fundação Municipal de Saúde de Teresina reduziu em 70% os casos de pessoas que contraíram a doença, em comparação com o ano anterior. Para chegar a esse resultado, a Fundação uniu duas ações: priorizar a prevenção por meio de agentes comunitários, e combater os mosquitos já existentes através de armadilhas capazes de atrair o Aedes aegypti fêmea. Somadas, as estratégias continuam a mostrar resultados. – Em janeiro de 2008, 165 casos foram diagnosticados em Teresina. Em 2009, o número de ocorrências em janeiro foi de 47 – informa Salomão Sobrinho, assessor de comunicação da Fundação. O principal método utilizado é a visita de agentes da saúde às residências, para verificar se há larvas ou ambientes propícios ao desenvolvimento do mosquito. São 262 equipes de agentes comunitários, que fazem visitas diárias para garantir a prevenção. Se comprovada a existência de larvas, os agentes aplicam produtos químicos para evitar a proliferação. As armadilhas cilíndricas, com compartimentos que atraem mosquitos e os retêm, passaram a ser utilizadas em 2008, o que explica a redução do número de casos de dengue na cidade no último ano.

Adultrap e Ovitrampa, engenhocas do bem – Uma das armadilhas é a Adultrap, que detecta a presença do Aedes aegypti na fase adulta, dispara um elemento químico que o atrai, e assim podemos não apenas eliminar, mas ter uma ideia dos locais onde a presença do mosquito é mais intensa e preocupante – explica Salomão. Para eliminar os ovos, outra armadilha, Ovitrampa, é utilizada: – Ela cria o ambiente com condições ideais para o mosquito procriar. Um local úmido e abafado. Atrai a fêmea, e evita que a desova seja feita em outros lugares. Espalhadas entre os quarteirões, as armadilhas servem também para identificar os bairros onde o risco de contrair a doença é maior, já que captam sinais da presença do mosquito. A cada 15 dias, um diagnóstico a respei-

Foto: Salomão Sobrinho

Kelly Souza

“Aspirador”, um dos modelos da armadilha Adultrap

to da ocorrência de larvas e mosquitos é feito, e quando o índice de determinada região ultrapassa 10% de incidência, o local é considerado de risco. “Um índice abaixo de 10% também nos preocupa, mas é algo que ainda está sob controle”, afirma Salomão. Além disso, todo sábado a Fundação Municipal da Saúde de Teresina promove a Caminhada Contra a Dengue, cada semana em um bairro. Carro de som, pessoas fantasiadas de Aedes aegypti e a presença do corpo diretivo da Fundação para entregar panfletos à população lembram a necessidade de preservar a limpeza nas residências. Como serviço de utilidade pública, as emissoras de televisão divulgam campanhas contra a doença. Se houver dúvidas, os moradores podem ligar para o Disque-dengue, que serve para dar orientação a respeito dos sintomas e dos lugares onde pode ser feito o tratamento. Para Salomão, a prevenção deve ser incessante. “A gente acha que está protegido. Cai uma chuva e não estamos mais”. Previdência Nacional 77

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Gente

Uma vida na

saúde

Fotos: Paula Giolito

O médico Marcos Fonseca passou por diversas funções na Prefeitura do Rio. Ele faz um balanço positivo de seu trabalho e fala de dificuldades que a cidade enfrenta

médico Marcos Loredo Vieira da Fonseca tinha acabado de fazer residência em endocrinologia quando ele e sua mãe encontraram-se à saída de um show de MPB, no Rio de Janeiro, com o pai de um ex-aluno de alfabetização de Dona Neusa, agora médico da Prefeitura, e ela lhe perguntou se haveria lugar para seu filho na saúde pública do município. Corria o ano de 1978. Mário Cardoso Pires, que era o diretor do Programa de Medicina Escolar, disse: “É possível, mas em pediatria.” Marcos argumentou: “Não sei nada de pediatria. Tenho pânico de segurar uma criança pequena.” Mário: “Mas você vai trabalhar com crianças de escolas. São como adultos, com mais de cinco anos de idade.” Assim começou uma carreira na Prefeitura carioca que caminha para o encerramento. Em 1986, por concurso — que haviam sido instituídos em 1982 —, Marcos Fonseca entrou para o quadro da Secretária de Saúde, como médico de saúde pública. Ficou, então, com duas matrículas na Prefeitura. Ele pretende se aposentar dentro de dois anos e trabalhar apenas em seu consul-

O

tório particular de endocrinologia. Seu balanço da vida funcional é centrado no aprendizado obtido. — Sinto muito orgulho de pertencer à Prefeitura do Rio — diz ele. — Fiz pela Prefeitura cursos de extensão e especialização em saúde pública, na Escola Nacional de Saúde Pública, e MBA em gestão da saúde. O serviço público é o maior formador de recursos humanos gabaritados.

Salário no município superou ganho no consultório. E previdência carioca ajuda a comprar imóvel Marcos Fonseca louva também a estabilidade da carreira pública e diz que, ao contrário do que se costuma alardear, sua remuneração como médico da Prefeitura superou o que o consultório particular lhe permitiu ganhar. — Com as gratificações por cargos de direção exercidos e triênios, terei uma boa aposentadoria — calcula o médico.

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— Além disso, o instituto (Previ-Rio) me concedeu duas cartas de crédito para compra de imóveis, e outros benefícios. Marcos Fonseca ocupou cargos em postos de saúde, centros de saúde e hospitais de diferentes bairros e áreas do Rio: Penha, Ramos, Gávea, Centro. Emprestado, coordenou a Vigilância Epidemiológica do Estado do Rio em 1995 e 1996. Voltou à Prefeitura. Em 1999 assumiu a Direção do PAM Oswaldo Cruz (Antigo PAM Henrique Valadares), saindo em 2002, para tornar-se Coordenador de Saúde da área de planejamento que engloba toda a Zona Sul do Rio (AP-2.1). No final de 2003 saiu da Coordenação e assumiu a vicedireção do PAM Antonio Ribeiro Netto, (antigo PAM 13 de Maio). Em 2006, como chefe do Serviço de Epidemiologia, voltou ao Hospital Souza Aguiar, por onde já havia passado na década anterior e onde está hoje. Pertenceu também a uma comissão do Ministério da Saúde encarregada do controle da Febre Amarela e da Dengue, o que o levou a muitas cidades do Nordeste e do Centro-Oeste, e também ao Acre.

Exercer funções diferentes, em lugares variados, alimentou um aprendizado valioso Foi proveitoso ter passado por muitos lugares bem diferentes entre si? — Valeu muito a pena conhecer desde a ponta da unidade básica até a direção de um Centro de Saúde. Eu podia, por exemplo, cobrar de um médico que fizesse investigação epidemiológica dentro de uma favela onde ele dizia ser impossível fazer isso — argumenta Marcos Fonseca (sobre a experiência em favelas, ver Convivência delicada). — Quando visitei o Acre, em princípio eu poderia dizer que a tarefa lá é fácil, porque o estado todo tem 650 mil habitantes e só a região de Bangu, no Rio, tem um milhão. Mas na verdade eu aprendi muita coisa. Cheguei a Rio Branco em período de cheia. Uma viagem até Sena Madureira, que levaria três a quatro

horas de carro, estava levando quatro dias, de barco. Como planejar campanhas de vacinação? E como guardar vacinas em lugares sem luz elétrica? Fui vendo e aprendendo.

Atendimento foi ampliado, mas condições de saúde da população precisam melhorar Marcos Fonseca vê contradições na evolução da saúde pública da antiga capital federal. De um lado, diz, a cobertura do atendimento aumentou bastante: — Em 1978, os postos de saúde só tinham pediatria, ginecologia, clínica médica, tuberculose, lepra e vacinação. Ganharam várias especialidades, como oftalmologia, otorrinolaringologia, neurologia, psicologia, nutrição. Esse aumento dos serviços destina-se a desafogar os hospitais — explica. — A tecnologia também ajuda muito. E a cidade ganhou, nesses trinta anos, dois Centros de Saúde. De outro lado, os problemas continuam agudos. — O sistema cobre totalmente a população? Não. Satisfaz? Não. Faltam unidades de saúde e é necessária uma reorganização do serviço. Tanto que a municipalização da saúde no Rio, dentro do que determina o SUS, foi revertida. O governo federal recebeu de volta hospitais. O que acontecia? O Inamps não repassava verbas para pagamento dos funcionários. Os do município ganhavam gratificação por atendimento, mas não os federais. No PAM Oswaldo Cruz, no Centro, que eu dirigi por três anos, três quartos dos funcionários eram federais e os outros, municipais. Os primeiros não auferiam vantagem por melhoria de atendimento. E, como não eram subordinados ao município, não se submetiam à direção — conta Marcos Fonseca. A gestão pode ter um papel muito importante, diz ele. — Em Ramos, eu constatei que depois das dez da manhã não havia pacientes. Perguntei por quê. “É porque não tem médico, doutor”. “E por que não tem médico?” “Porque não tem paciente”. O fato é que os pacientes não apareciam porque sabiam que não iam encontrar médicos. Determinei que os médicos continuassem lá depois das dez da manhã e começaram a aparecer pacientes. O médico aponta um problema sério surgido nos hospitais, como o Souza Aguiar, unidade de referência para a cidade do Rio e a Baixada Fluminense. — A porta do hospital é totalmente aberta, mas ele tem um afunilamento na saída — afirma. E explica: — Com o aumento da população de rua e das dificuldades Previdência Nacional 79

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econômicas, muita gente fica internada além do tempo necessário. O morador de rua tem casa, comida, banho, limpeza. Em vez de três dias, quer ficar quinze. Ao mesmo tempo, um morador de rua com tuberculose contagiante não segue o tratamento, volta para a rua e infecta outras pessoas. Outro fenômeno de natureza social que interfere no funcionamento do hospital é que, segundo Marcos Fonseca, “muitas famílias deixam lá idosos e pessoas com sequelas de doenças, como amputações de membros, vão embora e nunca mais aparecem para buscar seus parentes”.

— Dão endereço falso, para não ser achados — lamenta. — Esses doentes abandonados vão ficar no hospital até morrer. Se a pessoa não tiver uma doença de base, como câncer, não poderá ser removida para uma clínica. E muitos não têm. As enfermarias ficam cheias. Não há como promover o giro nos leitos que faça a fila andar.

Convivência delicada O Dr. Marcos já tinha visto muita coisa surpreendente desde seu ingresso na Prefeitura do Rio, mas nunca tinha imaginado que poderia ter alguma preocupação específica com a farmácia do Posto de Saúde de Ramos, na Zona Norte, que começara a dirigir em agosto de 1986. Naquela semana, fora avisado de que haveria no sábado uma reunião com moradores do local. Lá foi ele. Terminada a reunião, um rapaz notoriamente enviado pelo chefe local do tráfico de drogas o procurou: — Doutor, o Fulano mandou lhe dizer que nós estamos precisando de quinhentos comprimidos de analgésicos e antibióticos. Marcos Fonseca reagiu com a cautela que o contexto recomendava: — Me procura aqui na segunda-feira. Vou ver o que podemos fazer.

Na segunda-feira, ao chegar, o Dr. Marcos encontrou uma confusão formada. Alguém lhe pediu para ir até a farmácia. Lá, a funcionária disse: — Roubaram quinhentos comprimidos de analgésicos e antibióticos. Vou chamar a polícia. Marcos Fonseca disse-lhe para não fazer isso: — Dê baixa nesse material como se tivesse saído normalmente. — Não posso, doutor. — Pode. Você sabe quem roubou os remédios? Foram traficantes. A funcionária começou a chorar e fez o que o Dr. Marcos recomendou. Dias depois, o médico pediu para ser recebido pelo chefe do tráfico. Após as saudações algo diplomáticas que naquele tempo ainda havia, falou: — Fulano, é um absurdo você mandar roubar os remédios do Posto. Quantas crianças vão ficar sem remédio? Quantas mulheres grávidas? Quantas pessoas de idade? Funcionou. Dias depois, apareceram na farmácia do Posto oitocentos comprimidos. Marcos Fonseca puxa essa história do

seu baú de memórias para sublinhar a diferença que enxerga no comportamento dos traficantes daquele tempo e de hoje. — A violência no Rio está uma coisa inacreditável — diz o médico. — Antigamente havia um chefe do tráfico que morava na favela e tinha algum tipo de compromisso com as pessoas de lá. Mas isso acabou. Foi o Dr. Marcos que diagnosticou aids em Fulano, falecido há mais de vinte anos. Numa das visitas que fez ao chefe do tráfico, esse lhe disse: — Doutor, o senhor já veio aqui várias vezes me examinar e eu nunca lhe paguei nada. Agora quero pagar. E colocou na mão do médico um pacote grande de cocaína. Marcos Fonseca percebeu que havia ali uma linha demarcatória vital. Devolveu o pacote e disse: — O que você está pensando de mim? Nunca mais faça isso. O gesto reforçou sua autoridade moral. Quem alertava o Posto de Saúde para tiroteios iminentes eram os bandidos. A polícia não se preocupava com isso.

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Serviço Lista de entrevistados

Eis os dados para contato com as pessoas entrevistadas nas reportagens desta edição de Previdência Nacional. Se encontrar alguma dificuldade, por favor entre em contato conosco:

55-11-5505-6065

previdencianacional@patriaeditora.com.br

Amarildo Cruz (“Conhecimento de causa”, página 14) Prefeitura de Vespasiano Telefone: (31) 3621-1166

Joe Valle (“Conhecimento disseminado”, página 40) Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social Telefone: (61) 3317 7609

Andre de Abreu (“Modernidade pouco acessível”, página 46) E-mail: ola@andredeabreu.com.br

Jorge Félix (“Economia da Longevidade”, página 34) Revista IstoÉ E-mail: jorgemarfelix@uol.com.br

Carlos José de Souza (“Cofre leve, folha pesada”, página 52) Prefeito de Trajano de Morais Telefone: (22) 2564-1106 Deise de Jesus Marques (“Modernidade pouco acessível”, página 46) Iprem Telefone: (11) 2224 7598 Fernando Pimentel (“Novas Ferramentas”, página 64) P21 Consultoria e Projetos LTDA Telefone: (31) 2535 2338 François Bremaeker (“Cofre leve, folha pesada”, página 52) ONG Transparência Municipal Telefone: (21) 2527-7737 Helmut Schwarzer (“Tempo de juros baixos”, página 23) Ministéria da Previdência Social Telefone: (61) 2021-5236 Januário Montone (“Sai, mosquito!”, página 70) Secretaria Municipal de Saúde - SP Telefone: (11) 3397-2000

José de Anchieta Batista (“Entrevista Prioridades Realistas”, página 10) Acreprevidência Telefone: (68) 3212 7700 Leonardo Bulus Gomes Barbosa Lima (“Modernidade pouco acessível”, página 46) Iprev Mimoso do Sul - ES Telefone: (28) 3555-0065 Linaldo Guedes (“Modernidade pouco acessível”, página 46) Secretaria de Comunicação do Estado da Paraíba Telefone: (83) 3218-4499 Luiz Paulo Vellozo Lucas (“Poder local”, página 58) Deputado Federal PSDB-ES Telefone: (27) 3315 5319 E-mail: gabinete@lpvellozolucas.net

Marcos Flávio Gonçalves (“Cofre leve, folha pesada”, página 52) IBAM – Instituto Brasileiro de Administração Municipal. Telefone: (21) 2536-9797 Paulo Di Blasi (“Conhecimento de causa”, página 14) Ibmec Telefone: (21) 8200 6716 Ricardo José de Almeida (“Spread, o vilão da temporada” Página 10) Ibmec E-mail: ricardoja@isp.edu.br Richard Dutzmann (“Prazo dilatado”, página 10) Telefone: (11) 5055-3077 Salomão Sobrinho (“Sai, mosquito!”, página 70) Fundação da Saúde de Teresina Telefone: (86) 9921 3818 E-mail: salomaosobrinho@uol.com.br Sergio Rezende (“Conhecimento disseminado”, página 40) Ministério da Ciência e Tecnologia Telefone: (61) 3317-7500

Marcos Boulos (“Sai, mosquito!”, página 70) Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Telefone: (011) 3061-7000 Previdência Nacional 81

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Agenda

Agenda de eventos da Abipem e da Apeprem

B) Julho 43º Congresso Nacional da Abipem Brasília

D

A

C) Agosto 5º Congresso Estadual da Apeprem São Bernardo do Campo, SP B

D) Setembro Encontro Regional Norte da Abipem Belém

C

E

A) Junho Encontro Regional Nordeste da Abipem João Pessoa

E) Novembro Encontro Regional Sul da Abipem Santa Catarina

Na ponta mais oriental

Na casa do ex-ministro

O Encontro Regional Nordeste da Abipem será realizado na Estação Ciência, Cultura e Artes de João Pessoa. A obra, projeto de Oscar Niemeyer, inaugurada em 2008, fica ponto mais oriental do Brasil. Porfírio Sousa, da PBPREV diz que, se o cronograma permitir, os cerca de 300 participantes – serão levados a Campina Grande para conhecer “o maior São João do mundo”.

O 5º Congresso Regional da Associação Paulista das Entidades de Previdência dos Estados e Municípios será realizado na cidade que é hoje dirigida pelo ex-ministro da Previdência Luiz Marinho, São Bernardo do Campo. O presidente da Apeprem, João Figueiredo, espera que o evento tenha uma repercussão política marcante. PN

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