Tributação em Revista 54

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ributação T em revista

Ano 14

N° 54

Abril–set 08

Uma publicação do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil – Unafisco Sindical

R$ 7,00

ISSN 1809-3426

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Sistema tributário: qual é a saída?

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35 anos sem Gérson Augusto da Silva

Entrevista com Marcos Cintra, vice-presidente da FGV

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Editorial Entrevista Marcos Cintra Professor da FGV avalia a proposta de reforma tributária e fala sobre a criação do Imposto Único.

Homenagem Apresentação Gerson Augusto da Silva. (Tarcízio Dinoá Medeiros)

Reforma aduaneira no Brasil (Gerson Augusto da Silva)

Artigo de opinião

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Tributação da prestação de serviços intelectuais no Brasil. Considerações jurídicas e econômicas O autor analisa as regras relativas à tributação da prestação de serviços intelectuais no Brasil e as compara com paramêtros apresentados por Richard Posner (Danilo Augusto Barboza de Aguiar)

A instrumentalização do combate à sonegação fiscal como um meio de defesa do contribuinte que paga seus tributos – algo precisa ser feito Artigo faz um contraponto aos estudos do Direito Tributário no Brasil (Hélio Silvio Ourem Campos)

Questões polêmicas de direito tributário Cobrança de COFINS de profissionais liberais (Anderson Nakamura e Natalie Cevallos Mijan)

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O que é o SPED? Autor explica o Sistema Público de Escrituração Digital (Nivaldo Cleto)

A Organização Mundial do Comércio e o Sistema Geral de Preferências – aspectos tarifários No artigo, a autora avalia o contexto da criação da OMC em substitução ao GATT (Cácia Pimentel)

Fiscus, ascensão e declínio Artigo conta desenvolvimento do Fiscus e sua estrutura (Por Foch Simão Júnior)


Tributação em Revista é uma publicação do sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil – Unafisco Sindical.

Diretoria executiva nacional (den) Presidente Pedro Delarue Tolentino Filho

Diretor de Defesa Profissional Rafael Pillar Junior

Diretor de Assuntos Parlamentares Eduardo Artur Neves Moreira

1º Vice-Presidente Gelson Myskovsky Santos

Diretora-Adjunta de Defesa Profissional Renata Lobo Rossetto

Diretor-Adjunto de Assuntos Parlamentares João da Silva dos Santos

2º Vice-Presidente Ildebrando Zoldan

Diretor de Estudos Técnicos Luiz Antonio Benedito

Diretor de Relações Intersindicais Dagoberto da Silva Lemos

Secretário-Geral Rogerio Said Calil

Diretor-Adjunto de Estudos Técnicos Roberto Barbosa de Castro

Diretor de Relações Internacionais Robson Canha Ferreira

Diretor-Secretário Ricardo Skaf Abdala

Diretor de Comunicação Social João Ricardo de Araujo Moreira

Diretor de Finanças Luiz Gonçalves Bomtempo

Diretor-Adjunto de Comunicação Social Alcebíades Ferreira Filho

Diretores-Suplentes Claudio Marcio Oliveira Damasceno Renato Augusto da Gama e Souza Agnaldo Néri

Diretor-Adjunto de Finanças Iran Carlos Toneli Lima

Diretor de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões Clotilde Guimarães

Diretora de Administração Ivone Marques Monte Diretor-Adjunto de Administração Mauricio Gomes Zamboni

Diretor-Adjunto de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões Amilton Paulo Lemos

Diretor de Assuntos Jurídicos Wagner Teixeira Vaz

Diretor de Seguridade Social Carlos Antonio Lucena

Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos Kleber Cabral

Diretor-Adjunto de Seguridade Social Jesus Luiz Brandão

Conselho Fiscal Membros Titulares Henrique Gehrke Humberto Guedes Acioli Toscano Benedito Giovaldo Freire Membros Suplentes Almerindo Arruda Botelho Domiciano de Oliveira Neto Valmir da Cruz

Tributação em revista

Conselho Editorial Pedro Delarue Tolentino Filho, Hélio Socolik, Luiz Antonio Benedito, Roberto Barbosa de Castro. Diretor Executivo da TR Roberto Barbosa de Castro Coordenação Executiva Alvaro Luchiezi Jr.

Diagramação Fabrício Martins Fotolito e Impressão Kaco Gráfica e Editora Tiragem 3 mil exemplares Produção Editorial

Revisão Luciana Melo Edição Patrícia Cunegundes Projeto Gráfico Erika Yoda

Diretor Patrícia Cunegundes (61) 3349 2561

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Colaboração: Os artigos, inéditos, devem ser enviados para Tributação em Revista – Unafisco Sindical, Departamento de Estudos Técnicos, SDS, Conjunto Baracat, salas I e II, Brasília-DF, CEP 70.392-900 ou para o e-mail estudostecnicos@unafisco.org.br. Os textos serão submetidos ao Conselho Editorial quanto à conveniência de publicá-los, poderão sofrer revisão e, se necessário, serão devolvidos ao autor com sugestões de mudanças ou solicitação de informações. Nenhuma modificação de estrutura ou conteúdo será feita sem consentimento do autor. As matérias publicadas por Tributação em Revista só poderão ser reproduzidas mediante autorização do Unafisco Sindical. Os originais devem ser apresentados em disquetes, CD-ROM ou enviados por email, em arquivos do Word e Excel (tabelas), corpo 12, até 15 páginas e deverão conter: Página inicial abordando os principais tópicos do artigo; Notas e referências bibliográficas; Currículo do autor (máximo 5 linhas);


e ditorial

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ste ano é marcado pela efeméride relativa ao trigésimo quinto aniversário da morte de Gerson Augusto da Silva, ocorrida em 5 de julho de 1973. Quando se escrever a história do Ministério da Fazenda, forçosamente aparecerá em relevo a figura desse notável brasileiro que, de maneira brilhante e persistente, organizou o sistema tributário e modernizou da administração tributária em nosso País. Não obstante a sua formação acadêmica em Medicina, graças à extraordinária capacidade de compreensão dos fenômenos econômicos e administrativos ligados tributação, aliado ao constante exercício de imaginação criativa, logrou inaugurar, praticamente, o uso do instrumental tributário mais adequado para a implementação da estratégia geral do desenvolvimento econômico e social. Merecem destaque em sua obra a Reforma Aduaneira de 1957 que introduziu a tributação ad valorem e a adoção da Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas. Criou o Conselho de Política Aduaneira, do qual foi Presidente, e como Diretor de Rendas Internas empreendeu estudos e encaminhou a reforma do antigo Imposto de Consumo (depois transformado no Imposto sobre Produtos Industrializados) e do Imposto do Selo. Teve participação ativa e liderança na Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, da qual resultaram o Código Tributário Nacional e a Reforma Tributária, consubstanciada na Emenda Constitucional nº 18, de 1965. Foi fundador e primeiro Presidente do Conselho de Administração do Serviço Federal de Processamento de Dados – SERPRO. TRIBUTAÇÃO EM REVISTA presta, a Gerson Augusto da Silva, pequena homenagem. Primeiro, lembrando sua contribuição para o aperfeiçoamento das instituições tributárias brasileiras. Segundo, republicando um de seus “Estudos Aduaneiros”, justamente a propósito da Reforma Aduaneira de 1957, marco inicial da evolução que resultou no atual modelo de Administração Aduaneira no Brasil. Dentre todos os seus trabalhos, esse foi o escolhido a propósito da outra efeméride que se comemora neste ano: o ducentésimo ano da aduana brasileira. Os leitores da TRIBUTAÇÃO notarão que a tradicional seção dedicada à análise da arrecadação foi bastante reduzida neste número. Está sendo publicada uma pequena resenha da arrecadação federal no ano, até o mês de agosto. Nas próximas edições, pretendemos retornar ao tradicional formato de análise completa e minuciosa dos dados. Entre outros assuntos que julgamos importantes e interessantes para nossos leitores, estamos introduzindo, nesta edição, matéria relativa à administração tributária das mais importantes, enfocando o Sistema Público de Escrituração Digital e, em particular, da nota fiscal eletrônica. Dada a sua significância para a evolução de todo o ambiente administrativofiscal e do relacionamento fisco-contribuinte, esse tema deverá freqüentar nossas páginas com bastante assiduidade. Por último, cabe registrar que, por dificuldade de editar trimestralmente nossa TRIBUTAÇÃO EM REVISTA, como seria desejável, esta edição cobre o período abril/setembro de 2008.

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Arquivo Pessoal

e ntrevista

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professor Marcos Cintra é economista, doutor e mestre pela Universidade de Harvard. É professor titular da Fundação Getúlio Vargas, da qual é, atualmente, vice-presidente. É articulista do jornal Folha de São Paulo e Gazeta Mercantil e colaborador nas áreas de política e economia de mais de 300 jornais em todo o país. Autor de 10 livros e inúmeros artigos especializados sobre finanças públicas, teoria econômica e agricultura, no Brasil e no exterior, é o idealizador da proposta do Imposto Único, projeto que defende desde 1990, e que o tornou um debatedor assíduo sobre reforma tributária no Brasil. É um crítico ferrenho do atual sistema tributário brasileiro. Foi Secretário de Planejamento do município de São Paulo em 1993. Foi eleito vereador por São Paulo, cargo que ocupou até 1996 e para o qual foi novamente eleito em 2008. Exerceu o mandato de deputado federal entre 1999 e 2003 e presidiu a Comissão de Economia, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados em 2001. Foi membro da Comissão Especial de Reforma Tributária, Comissão de Finanças e Tributação e da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização. Foi secretário de Finanças da prefeitura de São Bernardo do Campo entre 2003 e 2006. É membro do Conselho Superior de Economia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), do Conselho de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio) e presidente do Conselho de Economia da Federação de Serviços do Estado de São Paulo (Fesesp). 6

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O que pensa a respeito da atual proposta de reforma tributária? A proposta de reforma tributária tem um defeito de fundo: não contribui para aumentar o número de contribuintes e assim reduzir a carga tributária individual. Ela centraliza a legislação do ICMS e quase cria um imposto único federal sobre valor agregado. Isto simplifica, unifica e poderá resultar em economias operacionais e administrativas importantes para o governo federal. Mas, por outro lado, cria para o governo central um grande imposto cujos fatos geradores serão em grande parte coincidentes com a base do ICMS (a única exceção são os serviços que serão tributados pelo novo IVA-F, e não pelo ICMS, com algumas exceções). Os fatos geradores sofrerão tributação dupla, estadual e federal, cujas alíquotas devem ser somadas para caracterizar a carga tributária total incidente sobre eles. Com certeza será superior a 20-22%, o que deverá estimular a evasão e a sonegação. Quais os problemas que o senhor identifica? A proposta é limitada. Ela silencia sobre importantes tributos. Há inúmeros detalhes, alguns oportunisticamente inseridos em meandros pouco explícitos do projeto e que demandarão análise detalhada. Mas chamo atenção inicialmente para alguns aspectos gerais. 1 – A reforma é parcial. Não abrange tributos como o IR, o IPI e os impostos municipais, contemplando apenas tributos sobre o consumo. É perfunctório quanto à desoneração da folha de pagamentos; 2 – Não há indicações quantitativas sobre os impactos das medidas, e nem sobre alíquotas, bases e formas de cálculo. Convém lembrar que em matéria tributária o diabo mora nos detalhes; 3 – Altera critérios de partilha fiscal. Como ponto positivo inclui novos tributos federais nos mecanismos de divisão da arrecadação. Por outro lado, dificulta a apuração para saber se Estados e municípios receberão mais ou menos recursos; 4 – Desconstitucionaliza critérios de partilha do ICMS. Isso vai prejudicar as capitais e os grandes municípios brasileiros; 5 – Critérios de partilha incertos. Os métodos de enforcement não estão claramente definidos, principalmente

A proposta de reforma tributaria que aí está é limitada. Silencia sobre importantes tributos

porque os repasses não serão de cima para baixo (União para Estados e Municípios). As transferências serão laterais (entre Estados). Não se sabe quanto vai custar a estrutura de fiscalização, quem irá fiscalizar e nem se os mecanismos de punição de estados que não repassarem o ICMS serão eficazes; 6 – Incertezas dos impactos do ICMS no destino. As compensações pelo Fundo de Equalização são incertas e subjetivas, não dando garantias seguras aos estados perdedores; 7 – Reforma protelatória. O governo pressupõe que governadores e prefeitos só pensam em seus respectivos mandatos e que aceitarão azedumes se ocorrerem daqui a dez ou vinte anos; 8 – Nota fiscal eletrônica. É uma medida ingênua e de difícil execução já que gera custos para sua instalação, não considera o ambiente sócioeducacional da população e nem que a informalidade é quase uma regra no Brasil. Será uma “espada de Dâmocles” sobre a cabeça dos estados na medida em que sua não implementação fará com que eles não participem do Fundo de Equalização. Se o governo acha que ela resolve o problema da sonegação, é bom lembrar que basta tirar o aparelho da tomada que a operação não será registrada; 9 – Abertura para a multiplicação de alíquotas. Os especialistas em IVA consideram ideal a existência de apenas uma alíquota ou no máximo duas ou três. O senhor tem abraçado causas polêmicas como o Imposto Único. Por que o imposto único? A idéia de um imposto único sobre as movimentações financeiras nos bancos representa uma revolução na estrutura tributária e fiscal do País. A idéia é simples: eliminar

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A redução do custo tributário para as empresas e a classe média alavancará o mercado consumidor e os investimentos. todos os tributos arrecadatórios e substituí-los por um tributo sobre movimentação bancária, semelhante à CPMF, que foi um tributo testado e que funcionou bem e barato, insonegável e justo para todos, pois se todos pagam, cada um paga pouco. O Imposto Único foi idealizado visando combater a principal anomalia do sistema que é a sonegação, reduzir o custo para o governo e para o contribuinte e simplificar nossa caótica estrutura de impostos. O projeto que cria o Imposto Único Federal (PEC 474/01) foi aprovado por unanimidade por uma Comissão Especial criada para analisá-lo na Câmara dos Deputados e hoje está em condições de ser votado. Como se enquadraria o Imposto Único dentro da atual proposta do governo federal de uma reforma tributária? A reforma tributária vai voltar a ser debatida e o projeto do imposto único é a alternativa viável para o País racionalizar a estrutura de impostos. É o projeto que a sociedade deseja, conforme apuraram 3 pesquisas de opinião. Os institutos Datafolha, CNT/Sensus e Cepac divulgaram levantamentos nos últimos anos que mostram que duas em cada três pessoas que conhecem o projeto do imposto único são favoráveis a ele. O imposto único é uma proposta que beneficia tanto o governo como os contribuintes. O poder público vai arrecadar de forma automática, rápida e barata e os trabalhadores e as empresas terão uma carga tributária menor em relação à atual por causa da expansão da base de cobrança. Quem paga pouco imposto sonegando vai começar a pagar mais e quem é sobretaxado para compensar essa situação vai recolher menos. A redução do custo tributário para as empresas e a classe média alavancará o mercado consumidor e os investimentos e, assim, a economia poderá crescer a taxas mais elevadas por um período longo.

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Como o senhor recebeu a notícia da rejeição da CPMF? Por que o senhor defendia esse imposto? A abrupta redução de R$ 40 bilhões do orçamento foi um ato demagógico e irresponsável. Alertei que a queda da CPMF seria compensada aumentando outros tributos e cortando despesas, o que penalizaria os mais necessitados. Não é por meio de atos como a extinção da CPMF que a carga tributária será reduzida e a estrutura será racionalizada. Ademais, foi lamentável que se tenha extinguido um tributo simples e barato como a CPMF. Eu jamais defendi a CPMF como um imposto a mais. Sou favorável à técnica de arrecadação dela. Aliás, ela surgiu a partir da proposta do imposto único em 1990, mas, infelizmente, acabou se tornando mais um imposto que contribuiu para o aumento acelerado do ônus tributário imposto à sociedade nos últimos anos. A CPMF provou que o imposto único é viável no Brasil. Críticos dizem que a CPMF era injusta porque o pobre pagava mais. O que o senhor pensa sobre isso? Sem o tributo os que ganham menos serão beneficiados? É mais um mito que se criou na esfera tributária e muitos passaram a repetir isso sem qualquer embasamento técnico. Alguns estudos foram realizados para apurar se a tributação sobre a movimentação financeira é regressiva e o resultado desmente essa tese. Com base na POF (Pesquisa de Orçamento Familiar) e na matriz interindustrial, ambas do IBGE, apurei que a CPMF representa 1,6% para uma pessoa que ganha um salário mínimo e 1,4% para outra de recebe mais de 20 salários mínimos, ou seja, é praticamente um imposto proporcional. No estudo “Parâmetros Tributários da Economia Brasileira”, publicado na revista Estudos Econômicos da FEA/USP (out./dez. 2006), os autores concluem que a CPMF é o tributo mais harmonioso da estrutura brasileira. Já a professora Maria da Conceição Tavares afirmou que é falso o argumento de que o imposto sobre circulação financeira penaliza os mais pobres, uma vez que em seus exercícios se constatou que as alíquotas efetivas são maiores para os mais ricos. Portanto, é falsa a afirmação que a CPMF é um imposto injusto porque o pobre é mais penalizado. O tributo é proporcional. O maior beneficiado pela sua extinção será o sonegador.


Arquivo Pessoal

O senhor acredita que os parlamentares que votaram contra a CPMF se basearam em pesquisas que apontavam que a sociedade era contra o tributo? Será que se fizesse uma pesquisa de opinião perguntando se o povo era contra ou a favor o imposto de renda, o ICMS, a Cofins, ou qualquer outro tributo, o resultado seria diferente? Será que a maioria diria que é a favor de algum tributo? Ninguém gosta de pagar imposto, seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. Porém, esse é o preço que pagamos para viver numa sociedade civilizada. O povo não era contra a CPMF especificamente, mas contra a opressão tributária que assola nosso país, contra a complexidade que impõem pesados custos ao setor produtivo e contra a injustiça que obriga a classe média arcar com um elevado ônus para compensar por aqueles que sonegam. O que a sociedade deseja na verdade é um sistema simples e barato, situação que só a CPMF poderia proporcionar. Se tivesse que escolher entre acabar com a CPMF e manter impostos como o IR, o ICMS e a Cofins, por exemplo, ou mantê-la e utilizá-la para substituir outros tributos, o resultado seria parecido com um levantamento que fiz no ano passado onde 95% das pessoas disseram que preferiam a CPMF no lugar de outros impostos. O senhor disse que a CPMF provou que o imposto único é viável para o Brasil. Como ele poderia ser implantado? O ponto de partida poderia ser a PEC 474/01 que está no Congresso. Poder-se-ia acabar aos poucos com alguns tributos federais. A idéia é começar aliviando o ônus sobre a classe média assalariada, que é quem mais paga imposto no País. Seria extinto de imediato o imposto de renda das pessoas físicas e em seu lugar seria criado um IMF. Para estimular o aumento da oferta de empregos e a formalização de postos de trabalho, poderia ser extinto também os 20% de INSS cobrados sobre a folha de pagamento das empresas. São duas medidas que causariam um forte impacto positivo sobre os ganhos da classe média e sobre o mercado de trabalho. Depois outros impostos caros e complexos como a Cofins, o IPI e outros poderiam ser substituídos pelo IMF. Qual seria a alíquota do imposto único? O conceito de imposto único é um ideal a ser atingido. Idéia debatida há séculos. O problema é que nunca se

conseguiu identificar um fato gerador que fosse suficientemente forte e amplo para permitir que com apenas um imposto o Estado Moderno arrecadasse o que ele necessita hoje para manter o seu nível de atividade. O grande problema sempre foi como identificar a base tributária, com alíquota baixa para evitar evasão fiscal e manter a carga tributária em 20%, 25% do PIB. E nunca se conseguiu isso. Eu já fiz o cálculo. Se eliminarmos todos os impostos no Brasil e ficarmos com apenas um tributo sobre movimentação financeira, a alíquota seria de 5,3% – 2,65% no débito bancário e 2,65% no crédito bancário – para mantermos a carga tributária em 36% do PIB, como é hoje. O senhor acha que podemos caminhar para uma contribuição financeira que financie a Previdência brasileira? Sim. Acho que vamos caminhar para isso. Essa proposta foi feita pela primeira vez em 1993 na famosa Comissão Ariosvaldo Mattos, presidida por Ariosvaldo Mattos Filho, diretor da escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas. Ele presidiu, a convite do então presidente da República, Itamar Franco, uma comissão composta pelos mais importantes tributaristas brasileiros. E uma das propostas que saiu naquele período foi exatamente esta. O sistema previdenciário brasileiro deve ser custeado com um tributo primeiro testado, com um tributo que incida sobre toda a sociedade. Porque o nosso sistema previdenciário não é um sistema de capitalização, é de repartição, é quase uma obrigação. É uma política pública de garantia de aposentadoria até o teto do governo.

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Há viabilidade para se chegar a esse cenário? Há interesse do governo em caminhar no sentido da chamada desoneração da folha de salário das empresas, que é a redução da contribuição patronal à Previdência, principal mecanismo de custeio do sistema previdenciário. A idéia seria desonerar, reduzir o imposto sobre a folha de pagamento e substituir isso por um tributo sobre movimentação financeira. Esta é uma questão interessante, pois todas as conexões que tentam fazer, entre fato gerador e benefícios da Previdência Social, são abstratas. Como seria a alíquota desse imposto? Seria um tributo com base ampla, de alíquota de 0,5% – ou 0,25% na entrada e 0,25% na saída –, que arrecadaria o mesmo montante de recursos que a contribuição patronal das empresas ao INSS, cuja alíquota é de 20% sobre a folha de pagamento. O mais importante é que não é apenas o Brasil que tem problemas de financiamento da Previdência. Porque essa vinculação entre a Previdência e o trabalho assalariado, ou folha de salários, está se desfazendo no mundo moderno. Hoje em dia, devemos levar em conta os processos de terceirização, autonomização no trabalho, auto-emprego, poupança de mão-de-obra nos processos de produção. O que está acontecendo? A base tributária sobre a qual hoje se assenta o financiamento da Previdência está encolhendo em todo o mundo. E é uma base profundamente instável, varia de acordo com a conjuntura econômica. A Europa está discutindo essa questão ativamente – encontrar uma nova base de financiamento da Previdência que não seja a folha de salários das empresas, que está encolhendo. E, na medida em que encolhe, aumenta a base de cálculo, incentivando a economia informal. No Brasil há um estudo do professor (Celso) Pastore que mostra que a cunha fiscal sobre o trabalho é de 100%. Ou seja, o trabalhador assalariado leva para casa hoje 50% daquilo que está custando para a empresa. Não é possível um sistema deste. Conversando um pouco sobre desenvolvimento. Gostaria que o senhor comentasse sobre a relação, hoje, do desenvolvimento com o desenvolvimento das instituições. Uma abordagem interessante é discutir tributação e desenvolvimento, como o professor Eurico Santi está fazen-

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do na FGV. Essa interdisciplinaridade é importante, essa preocupação em romper barreiras e analisar fenômenos como um complexo social. E a área do desenvolvimento econômico hoje está passando por um processo semelhante. Hoje, os grandes teóricos do estudo do desenvolvimento econômico no mundo todo não estão mais seguindo a linha clássica, que era analisar taxa de poupança, taxa de investimento, relação capital-produto, porque se tinha a concepção de que o desenvolvimento econômico era o resultado direto da poupança. Isso não é necessariamente verdade – há países que poupam muito e crescem pouco e vice-versa. Porque existem outros mecanismos que permitem o financiamento do desenvolvimento econômico. Aí se passou a um estudo de outras variáveis. Durante as décadas de 1940, 1950, 1960 e 1970 discutiu-se a questão da inovação tecnológica. Aí então o economista começou a concentrar sua preocupação não mais na poupança, mas no desenvolvimento tecnológico como o grande motor do desenvolvimento econômico. Mas esta tendência também está sendo superada. Hoje, quando se discute desenvolvimento econômico ele tem uma visão muito mais institucional e discute segurança jurídica, estabilidade institucional, boas instituições, boa educação, segurança, saúde, como componentes importantíssimos na definição de potencial de crescimento de uma economia. É essa visão interdisciplinar que está presidindo a preocupação com o tema desenvolvimento. O senhor fala que hoje os economistas estão preocupados com as instituições, com a segurança jurídica, entre outros assuntos. Podemos passar para a discussão do gasto público e da reforma do Estado? O Estado brasileiro hoje não é transparente. Não sei se em outros países poderíamos dizer a mesma coisa. Mas o Poder Público é muito transparente. Ocorre que ele tem regras de proteção, de autodefesa que acabam tirando a transparência do sistema. Só que o mundo moderno está ficando cada vez mais sofisticado. A globalização está fazendo com que conceitos antigos percam a validade. O Estado está perdendo capacidade até de tributar seus entes nacionais. A incapacidade de o administrador público entender o que se passa no mundo globalizado acaba tornando menos transparente o


Poder Público. Hoje a proliferação de normas que regem a questão de preço de transferência é tão absurda que vai nos levar a uma Torre de Babel. Novos conceitos surgem a cada momento. Os dogmas tributários refletem ainda uma economia do século XIX. Hoje as empresas produzem de maneira descentralizada no mundo inteiro. No Brasil temos um problema muito sério. A sociedade brasileira é profundamente estadista. Ela adora o governo. O povo brasileiro depende do governo. É uma concepção diferente de Estado, por exemplo, dos povos anglo-saxões. Mas estamos vivendo um processo no Brasil, apesar de todas as críticas que fazemos ao Estado, no fundo, estamos avançando. Acredito que o Brasil, apesar de todas as dificuldades que vivemos, finalmente está a ponto de crescer como uma grande sociedade. Finalmente conseguimos nos inserir na comunidade financeira internacional como um país sério, do ponto de vista econômico, como uma alternativa de investimento confiável. E à medida em que isso acontece, as instituições vão melhorando. Aliás, este é um debate. São as instituições que geram crescimento ou o crescimento que gera boas instituições? A segunda hipótese parece mais provável. À medida que o Brasil cresce, vamos aperfeiçoando as nossas instituições e começamos a ter uma perspectiva de sermos uma sociedade mais progressista e de realizarmos uma sociedade mais justa, mais igual, mais igualdade de distribuição de renda. O Brasil vai melhorar.

incentivo fiscal orientado para o desenvolvimento da Região Nordeste, que não gerou absolutamente nada do objetivo a que se propunha. Muito pelo contrário, houve desvio e má aplicação de recursos. Outro exemplo é a Zona Franca de Manaus, que tem profundas distorções econômicas. As empresas se instalam lá unicamente porque têm isenção do IPI, mas há um aumento de custos com deslocamentos. O incentivo fiscal é a maneira mais ineficiente de o Estado promover desenvolvimento econômico. Acho que tributação tem de ser universal em função da capacidade contributiva efetiva e que a transação financeira é a melhor maneira de se medir isso. Tem de ser um sistema que não puna o sucesso. Sistemas excessivamente progressivos no mundo globalizado induzem à fuga de capitais. Hoje a Europa está reduzindo as alíquotas máximas e uniformizando impostos para evitar esse fenômeno. Um sistema razoavelmente proporcional, ligeiramente progressivo e universal, para mim, é a melhor maneira de arrecadar. Com isso, o Estado pratica política social e de desenvolvimento via gastos públicos, o que efetivamente transfere renda. Desse modo, você consegue orientar melhor os recursos em vez de de uma política de incentivos que é muito abrangente, apesar de o Estado não ser eficiente no direcionamento desses recursos. Portanto, isso é mais eficiente do que atirar com chumbo grosso em incentivos fiscais, que acaba não tendo controle de quem se beneficia.

Há um senso comum de que o sistema tributário funcionaria como uma “mão invisível” que regula a economia, cuidando da igualdade entre as pessoas. Mas, há também especialistas que defendem a tese de que esta “mão invisível” pode não agir por meio do sistema tributário, mas por via de incentivos financeiros. Qual é a opinião do senhor sobre essas diferentes posições? Incentivo fiscal como instrumento de desenvolvimento econômico e de política pública é profundamente ineficiente. Os exemplos que temos no Brasil são gritantes e o mais impressionante de todos eles é a questão da Sudene. Esse órgão foi responsável por um grande programa de

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h omenagem

Foto:: M. Mackenzie; Montagem: Erika Yoda

Em Memória de Gerson Augusto da Silva Tarcízio Dinoá Medeiros 1 Nesta homenagem a Gérson Augusto da Silva, TRIBUTAÇÃO EM REVISTA traz, abaixo, a apresentação do ilustre tributarista preparada por Tarcízio Medeiros e, na seqüência, reproduz um de seus mais basilares artigos versando sobre a Reforma Aduaneira.

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omemora-se, neste ano do bicentenário da trasladação da família real para o Brasil, com sua corte e sua burocracia, a instalação, no Rio de Janeiro, da alta administração fazendária e dos serviços alfandegários, respectivamente o Erário Régio e a Superintendência Geral dos Contrabandos. Insere-se nas comemorações a reabertura dos portos a navios de outros paises, pelo que representou para a incipiente economia local e para o bom relacionamento com as chamadas nações amigas. A mudança da direção aduaneira de Lisboa para o Rio de Janeiro, aliada à reabertura dos portos, forçosamente redundaria em alterações na legislação que regia as alfândegas. O próprio ato que decretou o acesso de navios estrangeiros aos portos do Brasil (Carta Régia de 28 de janeiro de 1808) já estabeleceu as primeiras alterações. Daí, alguns historiadores terem este ato como o início efetivo da história da instituição alfândega brasileira. Sem dúvida alguma, aquela Carta Régia fez a primeira reforma da legislação alfandegária em solo brasileiro, e a partir daí, surgiram, ainda que muito espaçadamente, outras alterações mais, ou menos, abrangentes.

Com referência a esse assunto, a TRIBUTAÇÃO EM REVISTA está dando a lume um trabalho de Gerson Augusto da Silva sobre a evolução da legislação aduaneira brasileira, originalmente uma conferência publicada em espanhol, reunida com outros escritos seus, pela Organização dos Estados Americanos, sob o título Política y Administración Tributarias. Recopilación de ensayos escritos por el Doctor Gerson Augusto da Silva. Em 1983, a ESAF publicou essa coletânea, traduzida para o português, como um volume intitulado Estudos Aduaneiros, parte da Coleção Gerson Augusto da Silva. O documento que está sendo publicado neste número da revista é A reforma aduaneira no Brasil. Para quem não acompanhou ou estudou a evolução da administração tributária ou do sistema tributário nos últimos cinqüenta anos no Brasil, Gerson Augusto da Silva, falecido em 1973, antes de atingir a chamada terceira idade, é desconhecido. Mas a partir de meados da década dos anos cinqüenta e até falecer, ele esteve envolvido em todos os eventos que significaram modernização tributária em nosso país. Só para situar o leitor, principalmente se da geração mais nova, traça-se aqui um ligeiro esboço da

1 Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil (aposentado). Sócio (titular) do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, e (correspondente) do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba e do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

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atuação desse homem, dotado de grande inteligência, facilidade de expressão, simplicidade nas exposições e visão integral dos problemas que abordava. Ele foi levado para o Ministério da Fazenda, em 1952, por Otávio Gouveia de Bulhões, contratado como auxiliar de contabilidade para estudar balanços financeiros dos estados e rapidamente demonstrou sua capacidade analítica. Logo em 1954 passou a integrar a Comissão de Revisão da Tarifa e também, no ano seguinte, a comissão para elaboração do Código Tributário Nacional (nesta última, com os juristas Gilberto de Ulhoa Canto, Aliomar Baleeiro e Rubens Gomes de Souza). Da primeira comissão surgiu a apresentação do projeto transformado em Lei 3.244, de 1957, o qual estabeleceu a substituição da tarifação pelo regime ad valorem e induziu a utilização da classificação de mercadorias segundo a Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas – sobre o primeiro destes dois itens, o Brasil foi pioneiro na América Latina, e sobre o segundo, em toda a América. Da segunda comissão, surgiu em 1957, um projeto de Código Tributário cuja aprovação não progrediu no Congresso. Em 1956, Gerson Augusto assumiu a Diretoria de Rendas Internas e logo iniciou sua modernização. Havia, então, tabela específica de classificação de produtos para cobrança do Imposto de Consumo. Sua medida simplificadora e prática: adotou a mesma classificação da Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas. Em 1962, o Ministério da Fazenda fez um contrato com a Fundação Getúlio Vargas, renovado em 1964, que propunha diretrizes e providências para uma reforma da administração fazendária. Foi constituída uma Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, vinculada à Fundação e dirigida por Gerson Augusto da Silva. Nos próximos quatro anos aconteceriam as grandes reformas no sistema tributário e, também, na sua administração. Já em 1962, por sugestão da comissão, foi instituída, a partir do exercício de 1963, a Declaração de Bens como parte integrante da Declaração do Imposto de Renda (Lei 4.069). Naquele mesmo ano, foram redefinidas as áreas do contencioso fiscal (Decreto 54.767, de 1964), ficando atribuído ao 1º Conselho o Imposto sobre a Renda; ao 2º, o Imposto sobre Produtos Industrializados; e ao 3º, os tributos estaduais e municipais atribuídos à União nos Territórios e os demais tributos federais não compreendidos nas competências dos outros dois conselhos. Estabeleceu-se (Lei 4.502, de 1964) que o Imposto de Consumo passaria a incidir sobre o va-

lor agregado aos produtos industrializados, nos processos de produção, transformação e beneficiamento (que fez o Brasil ser o segundo país no mundo a adotar o sistema de imposto sobre valor agregado, antecedido, somente, pela França); transformou a Diretoria de Rendas Internas em Departamento de Rendas Internas e alterou a denominação do cargo de Agente Fiscal do Imposto de Consumo para Agente Fiscal de Rendas Internas. A abrangente Lei 4.503, de 1964, criou o Departamento de Arrecadação, que assumiu as competências arrecadatórias exercidas até então pelas Alfândegas e Mesas de Renda, instituiu o Cadastro Geral de Pessoas Jurídicas e autorizou a implantação da arrecadação das rendas federais pela rede bancária. Pela Lei 4.506, transformou a Divisão do Imposto de Renda em Departamento do Imposto de Renda. Para encerrar 1964, foi criado o Serviço Federal de Processamento de Dados – SERPRO (Lei 4.516). Em 1965, para racionalizar a administração das repartições dos vários Departamentos subordinados à Direção Geral da Fazenda Nacional, fez-se (Decreto 55.770) a divisão do País em dez Regiões Fiscais. Depois, autorizou-se a implantação, nas Delegacias do Imposto de Renda, do Registro das Pessoas Físicas, para inscrição dos contribuintes pessoas físicas obrigados à apresentação de declaração de rendimentos (Lei 4.862). E o ano se encerrou com a promulgação da Emenda Constitucional 18/65, de 1º de dezembro, que reformou todo o Sistema Tributário Nacional nas esferas federal, estadual e municipal. O sistema tributário adotado por aquela reforma, cujas linhas gerais foram incorporadas à Constituição de 1988, ainda é considerado por tributaristas e estudiosos do assunto como o melhor de que já dispôs o Brasil. Em 1966, pelo Decreto-Lei 37, foram reorganizados os serviços aduaneiros e a Diretoria de Rendas Aduaneiras foi transformada em Departamento de Rendas Aduaneiras (este decreto-lei, moderno, revogou a legislação antiga e totalmente antiquada, inclusive a Nova Consolidação das Leis das Alfândegas e Mesas de Renda, de 1895, e decretos de 1916 e 1931, ainda em pleno vigor).

Em 1956, Gerson Augusto assumiu a Diretoria de Rendas Internas e logo iniciou sua moderninzação

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Ainda nesse ano de 1966, considerando que se havia implantado um novo sistema de tributação, Gerson Augusto da Silva e sua equipe reviram seu antigo projeto de código tributário, de 1957 e fizeram a atualização conforme disposto na Emenda Constitucional 18/65. O projeto foi transformado na Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – é o Código Tributário Nacional vigente até nossos dias. Em 1968, a Comissão propôs a reforma da estrutura do Ministério da Fazenda, que foi implantada por seu integrante e então Diretor Geral da Fazenda Nacional, Antônio Amílcar de Oliveira Lima; extinguiu-se a Diretoria Geral e seus Departamentos de Arrecadação, de Rendas Aduaneiras, de Imposto de Renda e de Rendas Internas, criando-se a Secretaria Geral e a Secretaria da Receita Federal. Mas Gerson Augusto da Silva não teve papel relevante só no Brasil. Em toda a América Latina sua influência se fez sentir, a tal ponto que é considerado o principal ideólogo da antiga Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC, transformada em Associação LatinoAmericana de Integração (ALADI) em 1980. Convidado,

foi para a Organização dos Estados Americanos, onde assumiu a missão de modernizar os sistemas tributários dos países latino-americanos, nos quais deixou sua marca de eficiência. Para facilitar o intercâmbio entre as administrações tributárias latino-americanas e homogeneizar o entendimento sobre tributação, fundou, sob patrocínio da OEA e administração da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, a Escola Interamericana de Administração Pública – EIAP, que, por quase vinte anos, formou, em grau de pós-graduação (lato sensu) funcionários no Curso de Política e Administração Tributária e no Curso de Política e Administração Aduaneira. Só merece encômios, portanto, esta iniciativa de a TRIBUTAÇÃO EM REVISTA publicar A reforma aduaneira no Brasil, tanto pela oportunidade do momento, como pelo reconhecimento que merece Gerson Augusto da Silva – médico, por formação acadêmica, auxiliar de contabilidade, pelo cargo no serviço público, mas reconhecidamente o grande mentor da modernização do sistema tributário e de sua administração no Brasil.

A REFORMA ADUANEIRA NO BRASIL Gerson Augusto da Silva *

I – INTRODUÇÃO No presente trabalho procuraremos expor, em grandes traços, os antecedentes históricos e as características gerais das reformas introduzidas no sistema aduaneiro no Brasil nos últimos anos. Evitamos deliberadamente nos estender em considerações de índole doutrinária e procuraremos orientar o trabalho dentro das características de um documento informativo, já que, dessa maneira, cremos servir melhor aos estudiosos que se disponham a efetuar uma comparação das experiências brasileiras com os demais países latino-americanos. Várias dessas informações nos foram proporcionadas pelo Conselho de Política Aduaneira e pelo Serviço de Estatística Econômica e Financeira do Ministério da Fazenda. Utilizamos também, amplamente, dados e citações do estudo de Nícia Vilela Luz sobre A Luta pela Industrialização do Brasil e do Relatório da Comissão Mista da Câmara dos Deputados, encarregada do exame do Projeto de Reforma Tarifária compreendida na Lei n. 3.244, de 14 de agosto de 1957.

Em diversas oportunidades nos vimos obrigados a entrar na análise dos instrumentos de política cambial e de outras restrições não-tarifárias aplicadas às importações. Procuramos, contudo, limitar tais incursões ao que nos pareceu estritamente indispensável para a melhor compreensão da evolução da política aduaneira, entendida, em sentido amplo, como um conjunto de medidas tendentes a disciplinar as estruturas das importações. Esperamos que este trabalho possa representar uma pequena contribuição aos esforços em favor da integração econômica latino-americana. E que a descrição da experiência brasileira chegue a ser de alguma utilidade para outros países do continente, pelo menos para evitar o alto preço que o Brasil teve de pagar pelos graves erros que cometeu.

II – ANTECEDENTES HISTORICOS a) A primeira Tarifa brasileira (1808-44) Em novembro de 1807, horas antes que entrassem em Lisboa as tropas napoleônicas, o príncipe-regente de Portu-

* Publicado originalmente em Estudos Aduaneiros / Gerson Augusto da Silva; Brasília, ESAF, 1983 p. 181 - 227

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gal – depois D. João VI – embarcava com a corte real para o Brasil, para onde seria então transferida a sede do Reino. A Carta-Régia de 28 de janeiro de 1808, ao abrir os portos brasileiros ao comércio internacional, instituiu um imposto de 24% ad valorem sobre as importações em geral, com o que se iniciou a história aduaneira do Brasil. Quase imediatamente se seguiram várias medidas complementares com o objetivo de estimular a industrialização do País. Eliminaram-se os impostos que vinham do regime colonial, ao tempo em que se concedeu uma série de privilégios às indústrias nacionais1. O caráter protecionista dessas medidas provocou, contudo, uma imediata reação por parte dos países mais diretamente interessados no mercado brasileiro e, por Decreto de 11 de junho de 1808, reduziu-se a tarifa que incidia sobre as mercadorias procedentes de Portugal. Dois anos mais tarde, o Tratado de 19 de fevereiro de 1810 outorgava aos produtos ingleses uma tarifa preferencial de 15%, inferior, portanto, à que prevalecia para as mesmas mercadorias portuguesas. Como conseqüência do clima reinante nas relações entre o Brasil e Portugal, em seguida à Declaração de In-

dependência (7 de setembro de 1822), D. Pedro I, por decreto de 30 de dezembro desse mesmo ano, restabeleceu, para as mercadorias portuguesas, uma tarifa de 24% aplicada à generalidade das nações. E só três anos mais tarde, depois da assinatura do Tratado de Paz e Aliança, as mercadorias procedentes de Portugal tornaram a ser equiparadas às de origem inglesa. Essa equiparação foi estendida a cada um dos países que reconheceu o Brasil como país soberano, até que, por lei de 24 de setembro de 1828, por iniciativa do ministro Pereira de Vasconcelos, a Tarifa de 15% passou a ser aplicada sem discriminação a todos os países do mundo. Contudo, só em 1843 – quase vinte e dois anos depois de se haver declarado independente de Portugal – o Brasil pôde livrar-se da dependência econômica que lhe impunha o Tratado com a Inglaterra, celebrado em 1810 e prorrogado em 1827, por mais quinze anos. Dois anos antes de sua expiração, a Assembléia-Geral2 autorizou o Poder Executivo a elaborar uma Tarifa Aduaneira com os direitos variáveis entre 2% e 60%, que seria aplicada aos produtos importados, pelo País, de todas as procedências.

1. Cartas-Régias de 1º a 8 de abril de 1808 2. Resolução de novembro de 1841

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Por decreto de maio de 1863, o ministro Manuel Alves Branco estabeleceu as linhas mestras da política aduaneira que deveriam presidir a elaboração da nova pauta tarifária. E, finalmente, aprovada pelo Decreto nº. 376, de 12 de agosto de 1844, entrava em vigor a que se pode considerar como primeira tarifa aduaneira do Brasil. A tarifa Alves Branco foi à sua época fortemente combatida por gregos e troianos e os livre-cambistas, apoiados pelos representantes da agricultura, consideravam-na “atentatória contra os saudáveis princípios da livre concorrência”, criando privilégios injustificáveis para certos produtores. Em contrapartida, os industriais acusavam-na de não conferir suficiente proteção à indústria nacional, já que a maioria das manufaturas assim produzidas no País estava tributada com uma alíquota média de apenas 30%, considerada absolutamente insatisfatória. Apesar de suas alegadas funções protecionistas, em verdade a tarifa Alves Branco, como quase todas as reformas posteriores, esteve inspirada basicamente pela preocupação de fornecer ao Tesouro os recursos financeiros de que necessitava. b) Predomínio da corrente liberal (1845-89) Desde o advento da tarifa Alves Branco, até o fim do período monárquico, em 1889, foram realizadas numerosas reformas aduaneiras no Brasil, e cada uma delas variou de acordo com sua maior ou menor amplitude ou em função das tendências protecionistas de seus inspiradores. Nos anos seguintes, as reformas estiveram marcadas por nítida tendência antiprotecionista. Sob pressão dos liberais, aliados aos interesses agrícolas, então dedicados à monocultura do café3 , foram feitas várias reformas à tarifa Alves Branco, reduzindo direitos, criando isenções e eliminando vários privilégios concedidos a certas indústrias. Essa tendência liberalizante prolongou-se até a segunda metade da década de 1860, quando as dificuldades financeiras do Tesouro, agravadas por despesas surgidas da guerra do Paraguai (1865-70), provocaram novas exigências à elevação dos direitos aduaneiros e à cobrança de 15% de sua importância em ouro4. Terminada a guerra, tornaram a predominar os interesses antiprotecionistas, culminando com uma votação, em 1874, da tarifa Rio Branco5, de acentuado cunho liberal.

O desarmamento tarifário resultante dessa reforma foi agravado, nas décadas seguintes, pela intensa tecnologia em grandes centros industriais. A introdução de novos meios de produção apressou a obsolescência tecnológica da incipiente indústria nacional6. O desenvolvimento das linhas ferroviárias e da rede telegráfica, acelerado a partir de 18807, contribuiu também para apressar a liquidação de muitas indústrias dispersas no interior do país e que sobreviviam em função do elevado custo dos transportes e da precariedade dos meios de comunicação então existentes. Em 1879, uma revisão tarifária, realizada por proposta da Comissão presidida por Costa Pinto, assinalou um triunfo ligeiro da corrente protecionista, anulado em grande parte pela crescente desvalorização e pelas reformas introduzidas, dois anos depois, por pressão da corrente liberal. O período monárquico termina em meio a uma forte crise do café, com taxas de câmbio sujeitas a intensas oscilações e a indústria do país em graves dificuldades. Durante todo esse período a Tarifa Aduaneira se caracteriTABELA 1 Período

Anos

Taxa média de pennies por mil Réis

D. João VI

1809-14

73

1815-19

62

1820-22

49

Primeiro Império (D.Pedro I)

18233-27

46

1825-31

26

Regência

1832-40

29

Primeiro Império (D.Pedro II)

1841-45

26

1846-50

26

1851-55

28

1856-60

26

1861-65

25

1866-70

20

1871-75

25

1876-80

22

1881-85

20

1886-89

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3. A produção agrícola, representada pelo café, estava orientada para a exportação. A importação de alimentos representava, nessa época, mais de 20% do total das importações. 4. Medida autorizada pela Lei Orçamentária nº. 1.507, de 26 de setembro de 1876. 5. Tarifa aprovada com a orientação do Visconde do Rio Branco (Decreto nº. 55.580, de 31 de março de 1874), caracterizada por uma redução geral do nível de direitos. 6. Em relatório publicado em 1877, o ministro Coelho de Almeida, da Agricultura, assinalava a existência, no País, de indústrias de produtos químicos, instrumentos óticos e náuticos, guarda-chuva (39 fábricas), sapatos e outros artigos de couro, vidros, papel, charutos e cigarros, fundições de ferro e aço, tecidos (30 fábricas), cerveja e vários outros produtos. 7. Em 1885, a rede ferroviária do país alcançava 7.062 km, dos quais 3.778 km foram construídos entre 1880 e 1885.

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zou por ser um instrumento básico de política financeira e de comércio exterior, em torno da qual giravam as mais importantes decisões do Governo, no plano econômico. No período que precedeu a tarifa Alves Branco, os esforços no sentido de promover o desenvolvimento industrial do País tropeçaram sempre com o antiprotecionismo de certos grupos, fortemente apoiados pelos interesses ligados ao comércio exportador da Inglaterra. Nos quarenta e cinco anos restantes do período monárquico, os adeptos e opositores do protecionismo continuaram lutando dentro e fora do Parlamento, sucedendo, alternativamente, as fases de predomínio de uma ou outra corrente. A tendência antiprotecionista se apoiava no liberalismo econômico então em voga, reforçado pela luta em favor da liberação de escravos. A pregação dos liberais, de conteúdo meramente doutrinário, foi habilmente explorada pelos interesses ligados ao comércio e à agricultura, basicamente representada pelo café. Em contraposição com a intensa pregação da corrente liberal, os esforços em favor de uma melhor proteção aduaneira só encontravam apoio nas vozes de alguns estadistas, como Alves Branco e Rodrigues Torres e na ação isolada de certos industriais. Somente depois da criação da Associação Industrial, em 1881, seus membros começaram a atuar um pouco mais organizadamente, sob a liderança do comendador Malvino Reis e de Antonio Felício dos Santos. Mas, seja pela prédica dos estadistas ou o clamor da classe interessada, em verdade o que em diversas oportunidades impediu que a indústria do país fosse destruída pela concorrência estrangeira foram as dificuldades financeiras do Tesouro, obrigando a elevação dos direitos aduaneiros, então a mais importante fonte de receitas do País8. c) Fortalecimento do protecionismo (1889-1930) A primeira fase do período republicano prolongou-se até a Revolução de 1930, ano que assinala, ademais, o começo dos efeitos depressivos sobre a economia do País, conseqüência da grande crise mundial de 1929. Durante os quarenta anos dessa fase prosseguiram as lutas em torno da tarifa aduaneira, agora com maiores possibilidades para os defensores do protecionismo.

Um ano depois da Proclamação da República, Rui Barbosa, à frente do Ministério da Fazenda, obteve aprovação de uma nova Tarifa, de tendência nitidamente protecionista, e instituiu a cobrança, em ouro, dos direitos aduaneiros9 a fim de preservar seus efeitos das fortes flutuações cambiais. Em defesa da reforma proposta, Rui Barbosa afirmava que “a Tarifa Aduaneira não deve e não pode ser conformada sobre princípios de escola, sobre leis abstratas; ela pertence ao número dos fatos de ordem positiva que têm que obedecer, em sua execução, às questões práticas que está chamada a resolver ou regular”. E, referindo-se aos exageros da prédica livre-cambista, afirmava que sua influência levou “nosso sistema fiscal a repousar unicamente sobre a renda das Alfândegas; a encerrar a riqueza em mãos de terras-tenentes, que tinham o monopólio do café; a matar a indústria e a privar o País da classe industrial, que não podia sobreviver em nosso meio asfixiante, e que tanta falta nos tem feito no mecanismo político da sociedade”10. Os dez anos seguintes se caracterizaram por fortes desequilíbrios que ficaram assinalados na História do Brasil com a denominação de “encilhamento”. A inflação interna e a especulação desenfreada se refletiram no comportamento da taxa cambial que, desde 1889 até 1899, se elevou de 13 a 34 mil réis por libra esterlina. Nesse período introduziram-se várias reformas no regime aduaneiro do país, sendo as mais importantes as de 1896 a 1897. A primeira teve como pretexto a correção das incongruências na fixação dos níveis tarifários, resultante, segundo seus autores, da “pressão de grupos interessados” 11. A reforma de 189712, promovida pela Comissão presidida por Leopoldo de Bulhões, provocou a forte reação dos setores industriais em virtude de sua orientação nitidamente livre-cambista. Ao se iniciar o século XX, Joaquim Murtinho, então ministro da Fazenda, promoveu uma nova revisão geral da tarifa13, elevando os direitos aduaneiros e uma quota cobrada em ouro, que chegou até 25%14. Tais alterações não tiveram, contudo, inspiração protecionista alguma. Seus objetivos eram de caráter estritamente financeiro. A economia do País experimentou certo grau de recessão, mas o equilíbrio financeiro foi restabelecido e fortalecida a posição cambial, reduzindo a respectiva taxa, no quadriênio

8. Nas últimas décadas do período monárquico, os direitos aduaneiros contribuíram com mais de 60% dos recursos orçamentários. 9. Decreto nº. 391 C, de 10 de março de 1890, modificado posteriormente pelo Decreto nº. 804, de 4 de outubro do mesmo ano. 10. Relatório apresentado ao Presidente da República, Marechal Deodoro da Fonseca. 11. Relatório da Comissão Mista do Congresso, da qual faziam parte Serzedelo Corrêa e Leite e Oiticica, este último como relator. 12.Decreto nº. 2.743, de 17 de dezembro de 1897. 13. Decreto nº. 3.617, de 19 de março de 1900.. 14. Abolida em 1891, a quota-ouro foi restabelecida pela Lei nº. 559, de 31 de dezembro de 1898, na base de 10%, elevada a 15% pela Lei nº. 581, de 20 de junho de 1899.

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Campos Sales, de 34 para 22 mil réis por libra esterlina. Nos quadriênios Rodrigues Alves (1903-6) e Afonso Pena (1907-10), prosseguiram os esforços de consolidação da situação financeira e cambial do País. Em 1903 uma tentativa de reforma tarifária, de caráter protecionista, tropeçou com a tenaz oposição de Leopoldo de Bulhões, agora à frente do Ministério da Fazenda. E em 1906 a quota-ouro foi novamente elevada de 25 para 35%. No período seguinte, ocorre a depressão mundial de 1913. Os preços do café e da borracha sofrem um violento declínio no mercado internacional. O mercado interno se contrai. A indústria, especialmente a têxtil, entra em crise. Sobrevém, em seguida, a I Guerra Mundial. A conjuntura obriga uma forte redução das importações, ocasionando o declínio equivalente das rendas aduaneiras. Em compensação, se expande o parque industrial do País, que faz crescer, paralelamente, a renda proveniente dos impostos internos15. TABELA 2 Períodos

Nº Total Nº de Itens de Itens Ad-Valorem

Nível mais elevado em termos Ad-valorem

1 – Monárquico 1844 – Dec. 376, de 12-8 Manuel Alves Branco

2.162

46

60%

1857 – Dec. 1914, de 28-3 J. M. Wanderley

1.704

75

50%

1860 – Dec. 2004, de 3-11 A. M. da Silva Ferraz

1.530

313

50%

1869 – Dec. 4343, de 22-3 Visconde de Itaboraí

1.275

236

50%

1847 - Dec. 5580, de 31-3 Visconde de Rio Branco

1.277

215

50%

1881 – Dec. 8360, de 31-12 J.A. Saraiva

1.129

88

50%

1887– Dec. 9746, de 22-4 J. Belisário S. de Sousa

1.104

91

60%

1890 – Dec. 836, de 11-10 Rui Barbosa

1.085

89

60%

1896 – Dec. 2.261, de 8-4 Rodrigues Alves

1.085

89

84%

2 – Republicano

1897 – Dec. 2743, de 17-2 Bernardino de Campos

1.071

116

200%

1900 - Dec. 3617, de 19-3 Joaquim Murtinho

1.070

114

100%

15. Renda, em mil réis: `

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Impostos Importação Consumo

1914 150.548 52.223

Em 1919, o ministro Homero Batista apresentou ao Congresso um projeto de Reforma Tarifária, que contou com forte oposição do setor industrial. A Câmara, sob a pressão do grupo liderado por Paulo de Frontin, aprovou uma alternativa de caráter protecionista que, sem embargo, ficou detida no Senado Federal. Como no Império, a tarifa aduaneira continuou no centro dos debates políticos durante toda a primeira fase do período republicano. Com o correr dos anos, os direitos de importação foram perdendo sua antiga preeminência como fonte de recursos para o Tesouro. As crescentes dificuldades, porém, do balanço de pagamentos mantiveram a tarifa no primeiro plano das decisões econômicas. Eminentes estadistas de formação liberal, como Leopoldo Bulhões, continuaram a se opor tenazmente às elevações dos direitos aduaneiros. A corrente protecionista, agora reforçada, no plano doutrinário, pelos conceitos de Frederico List e Alexandre Hamilton, ganhava, entretanto, novos adeptos. A persistência da crise do café e a ampliação do mercado interno obrigaram a diversificação da produção agrícola, fazendo surgir, ao lado dos industriais, uma nova corrente protecionista representada pelo movimento ruralista, que teve em Alberto Torres um de seus grandes líderes. Essa mudança de tendência se tornou nítida depois da conclusão da I Guerra Mundial. Nos dez anos que se seguiram, os níveis médios da tarifa efetivamente aplicada no país foram os seguintes: 1919 – 21,8% 1924 – 32,1% 1920 – 24,0% 1925 – 32,1% 1921 – 39,0% 1926 – 35,0% 1922 – 27,0% 1927 – 35,1% 1923 – 31,5% 1928 – 35,7% Os industriais prosseguiram com seu esforço de organização, fundando, em 1928, o Centro das Indústrias de São Paulo, com a presidência de Roberto Simonsen. E finaliza a Primeira República no Brasil sob o impacto da grande crise mundial de 1929-30.

III – O PROCESSO DE MARGINALIZAÇÃO DO SISTEMA ADUANEIRO – (1930-1957) Com a queda do regime constitucional em outubro de 1930, iniciou-se o período arbitrário do Governo de Vargas, que se prolongou até 1945. Restabelecida a normalidade constitucional, seguiram-se os períodos presidenciais do Marechal Dutra, 1917 91.980 93.514


Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, em cujo Governo se realizou a grande reforma tarifária de agosto de 1957, que assinala o término deste segundo período da história aduaneira do Brasil. a) A grande depressão e a tarifa de 34 (1930-1939) O primeiro decênio dessa fase esteve marcado pelos efeitos da grande depressão mundial sobre o comércio exterior do País, substituídos, a partir de 1939, pelas perturbações ocasionadas pela II Guerra Mundial. Com um pequeno interregno no biênio 46-47, todo o resto do período esteve caracterizado por uma inflação de ritmo crescente e por profundas transformações estruturais. Ao iniciar-se essa nova fase, a tarifa aduaneira aplicada no País era, todavia, com pequenas alterações, a aprovada em 1900, segundo a orientação do ministro Joaquim Murtinho. Em 1931, o Decreto nº. 29.380, de 8 de setembro, autorizou uma revisão geral da tarifa em vigor, fixando os critérios que deveriam orientá-la. A reforma, entretanto, somente foi levada a cabo em 1934, durante a gestão do ministro Oswaldo Aranha. Entre as alterações introduzidas no regime aduaneiro do País16, se destacam as seguintes: a) Atualização da nomenclatura, aumentando o número dos itens, de 1.070 a 1.897; b) Redução para 7 das posições com direitos ad valorem; c) Instituição duas modalidades de direitos: gerais e mínimos; e GRÁFICO 1 0%

10%

20%

30%

40%

1823 a 1832 1833 a 1842 1843 a 1852 1853 a 1862 1863 a 1872 1873 a 1882 1883 a 1892 1893 a 1902 1903 a 1912 1913 a 1922 1923 a 1932 1933 a 1942 1943 a 1950 1951 1952 1953 1954 1955

GRÁFICO 2 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

1823 a 1832 1833 a 1842 1843 a 1852 1853 a 1862 1863 a 1872 1873 a 1882 1883 a 1892 1893 a 1902 1903 a 1912 1913 a 1922 1923 a 1932 1933 a 1942 1943 a 1950 1951 1952 1953 1954 1955

d) Extinção da cobrança dos direitos em ouro. A supressão dos direitos ad valorem teve como objetivo, entre outros, preservar as rendas aduaneiras frente à tendência declinante dos preços no mercado internacional. Sem embargo, a tarifa Oswaldo Aranha somente se aplicou quando esses preços já se encontravam novamente em ascensão, com a economia mundial em plena fase de recuperação. Não obstante, mais grave do que a generalização do sistema de direitos específicos, foi a supressão da chamada taxa-ouro, que assegurava, parcialmente, o reajuste automático de seu valor real em vista da crescente desvalorização da moeda nacional. A partir da Reforma de 1934, a Tarifa foi perdendo importância gradualmente, já como fonte de recursos para o Tesouro, já como instrumento de política de comércio exterior. No decênio anterior à grande crise, as rendas aduaneiras contribuíram com quase 40% da renda global do País. No período de vigência da tarifa Oswaldo Aranha, essa participação foi declinando, até chegar a 3,24%, em 1956. O nível médio de proteção dos direitos aduaneiros decresceu paralelamente, baixando de 35% em 1934, até menos de 5%, em 1956. Ao contrário do que ocorreu no período monárquico e na primeira fase do período republicano, a partir da reforma de 1934, a tarifa aduaneira ficou inteiramente marginaliza-

16. Tarifa aprovada pelo Decreto nº. 24 343, de 9 de junho de 1934.

T ributaç ã o em revis ta

19


da como instrumento de política econômica, sendo substituída por restrições administrativas e controles cambiais, manipulados diretamente pelas autoridades monetárias. Essa marginalização proveio da extrema rigidez do instrumento aduaneiro, inteiramente incompatível com a rapidez de soluções exigida pela conjuntura, caracterizada por violenta alterações na estrutura do comércio internacional. Na década de 1930, essas alterações refletiram os efeitos depressivos da grande crise de 1929, conforme se observa na seguinte tabela: TABELA 3 Ano

Exportações US$

Ano

Exportações US$

1928

474.133

1937

397.694

1929

461.577

1938

295.643

1930

319.959

1939

305.357

1931

241.111

1940

263.432

1932

179.403

1941

352.128

1933

222.244

1942

392.955

1934

285.750

1943

444.258

1935

372.804

1944

577.026

1936

372.815

1945

657.307

De US$ 474 milhões, em 1928, as exportações declinaram a US$ 179 milhões em 1932, e só depois de 1941 chegaram a recuperar os níveis anteriores à crise. Essa queda de 63% na capacidade de importar do País determinou, desde o começo, uma violenta elevação da taxa de câmbio que, de 1929 a 1931, sofreu uma desvalorização de 75%, passando de Cr$ 8 a Cr$ 14 por dólar. Para prevenir novas desvalorizações cambiais e assegurar a importação de produtos essenciais à economia nacional, o Governo, “atendendo à anormalidade da atual situação e à necessidade de centralizar as operações de aquisição cambial a fim de evitar especulações danosas aos interesses do país”, pôs em vigor o Decreto nº. 20 451, de 8 de setembro de 1931, que estabelecia o monopólio da compra de divisas pelo Banco do Brasil e que determinava a forma de sua transferência aos bancos para a cobertura das importações. Esse decreto instaurou, no País, um regime de controle cambial que, com pequenas interrupções, perduraria durante mais de 30 anos. Em maio de 1939, cinco meses antes da declaração do conflito mundial, o Governo, por Decreto-Lei nº. 1.201, restabeleceu parcialmente a liberdade de compra de divisas pelos bancos, que ficavam, contudo, obrigados a transferir 30% ao Banco do Brasil segundo as taxas fixadas por este, restabelecendo o regime de mercado duplo de câmbio-oficial e livre – que perdurou até 1946.

20

T ributação e m re v i s t a

b) Auge e decllnio da licença prévia Mas as perturbações do comércio exterior obrigaram, já em 1941, a criação, no Banco do Brasil, da Carteira de Exportação e Importação, com o fim de pôr em prática um sistema de licença prévia que progressivamente fosse se tornando mais rígido. Terminada a guerra, o Brasil havia acumulado no exterior volumosos saldos em divisas. Com o desejo de combater a inflação e estimular a entrada de capitais estrangeiros no País, o Governo estabeleceu, por Decreto-Lei nº. 9 025, de 27 de fevereiro de 1946, que as operações de câmbio se realizariam pelo mercado livre, ficando o mercado oficial limitado somente aos serviços governamentais e a 20% das importações. Essas medidas de liberação do comércio exterior, ampliadas por atos posteriores, trouxeram como resultado o esgotamento, em pouco mais de um ano, das reservas em dólares do País, permanecendo unicamente os saldos em moedas inconversíveis, bloqueados em poder dos países europeus. Essa situação se agravou, a partir de 1947, com a decisão do Governo, por meio da Resolução da SUMOC, de suprimir o mercado livre e passar a operar em um regime de taxa única de câmbio, declarada ante o Fundo Monetário Internacional na base Cr$ 18,50 por dólar. A rigidez da taxa de câmbio, aliada ao completo desarmamento tarifário do País, contribuiu para incrementar as importações e desestimular as exportações e a entrada de capitais estrangeiros, dando como resultado uma crescente acumulação de atrasados comerciais. À medida que a situação se ia agravando, foram estabelecidos, por Resolução da SUMOC, certos controles cambiais até que, por Lei nº. 262, de 23 de fevereiro de 1948, foi reimplantado no País um sistema de restrições administrativas diretas, a cargo da antiga Carteira de Exportação e Importação. Nesse mesmo ano, a Lei nº. 313, de 30 de julho de 1948, ratificou a adesão do Brasil ao Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT), aprovando a Lista III, anexa a esse Acordo, pela qual se congelavam os níveis tarifários correspondentes a mais de 70% das importações brasileiras. Com essa medida, se completou o processo de marginalização do sistema aduaneiro, no quadro dos instrumentos de política financeira e econômica do país. Prorrogado, sucessivamente, pelas Leis nº. 752 e 842, de 30 de junho e 4 de outubro de 1949, o regime instituído pela Lei nº. 262 se prolongou até 1951. Nesse ano, o conflito da Coréia, ao ameaçar se estender, levou as autoridades mone-


tárias a liberar as importações, com receio de deixar o País privado de matérias-primas, equipamentos e outros produtos estrangeiros essenciais à sua economia. Em conseqüência, o total das importações se elevou, entre os anos 1950 e 1951, de 1085 a 1987 milhões de dólares. No biênio 1951-1952, apesar do notável incremento das exportações, o déficit da balança comercial foi da ordem de U$ 780 milhões. Em janeiro de 1953, a Lei 1807 introduziu novas reformas no sistema cambial. O mercado livre foi restabelecido para certas operações. As importações, porém, continuaram sendo processadas, no mercado oficial, pela taxa de câmbio declarada ante o FMI. A forte discrepância existente entre essa taxa e a paridade real do cruzeiro provocou a violenta ampliação da demanda de toda a gama de produtos estrangeiros. E o sistema de licençaprévia, a cargo da antiga Carteira de Exportação e Importação, que devia ser aplicado a produto por produto, em cada operação, começou a sucumbir ante as pressões, provocando intensa corrupção nas altas esferas administrativas, ademais da grave distorção nas correntes de importação do País. TABELA 4 Taxas de Câmbio (Cr$ por dólar ) ANO

OFICIAL

LlVRE

ANO

OFICIAL

LIVRE

1928

8,3

-

1943

16,5

19,6

1929

8,4

-

1944

16,5

19,6

1930

9,2

-

1945

16,5

19,5

1931

14,2

-

1946

16,5

19,4

1932

14,1

-

1947

18,73

1933

12,7

-

1948

18,72

1934

12

14,9

1949

18,72

1935

11,9

17,4

1950

18,72

1936

11,8

17,2

1951

18,72

1937

11,4

16

1952

18,72

1938

-

17,6

1953

18,72

43,32

1939

16,6

19,2

1954

18,72

62,18

1940

16,6

19,8

1955

18,72

73,54

1941

16,6

19,7

1956

18,72

73,54

1942

16,6

19,6

1957

18,7 2

68,99

c) O regime de leilão de divisas (1953-1957) Nesse mesmo ano, a Instrução da SUMOC, nº. 70, de 9 de outubro, seguida pela Lei nº.2 145, de 29 de dezembro, instauram no País um novo regime de comércio exterior. A antiga Carteira de Exportação e Importação foi dissolvida e, em substituição, se criou a Carteira de Comércio Exterior, cuja atribuição seria a de administrar o sistema a ser inaugurado.

A dualidade dos mercados de câmbio foi mantida, ademais da taxa de paridade declarada ante o FMI. As divisas provenientes das exportações eram adquiridas pelo Banco do Brasil em regime de monopólio, segundo a taxa oficial, acrescentada, não obstante, de uma bonificação fixa por dólar ou seu equivalente em relação a outras moedas. Os produtos de importação foram distribuídos em cinco categorias, conforme graus decrescentes de prioridade. A quinta categoria estava constituída por todos os produtos não especificados nominalmente nas quatro categorias anteriores. Salvo uns poucos produtos, como o petróleo e o trigo, sujeitos a um regime especial de quotas, todas as demais importações passaram a ser efetuadas pelo sistema de leilão de divisas, realizado semanalmente pelas Bolsas de Valores do País. Conhecidas as disponibilidades cambiais, se procedia, desde o começo, à reserva do montante destinado aos serviços governamentais e a outras operações consideradas de alta prioridade. O resto era, então, dividido pelas autoridades monetárias em quotas correspondentes a cada uma das cinco categorias de importação, que deviam ser licitadas, em pequenos lotes, mediante o pagamento, pelo importador, de um ágio ou sobretaxa, que variava, em cada leilão, segundo a lei da oferta e da procura. O mecanismo de licença prévia, que deveria ser concedido em cada operação, foi assim substituído por um sistema de contingenciamento global de quotas por grupos de produtos. A única atribuição da autoridade consistia na determinação prévia do montante de divisas que devia ser oferecido em licitação dentro de cada categoria. Daí em diante, a seleção dos importadores e dos produtos que deviam ser importados era automática e estritamente impessoal. A distribuição das disponibilidades cambiais era realizada, tentativamente, pela autoridade monetária a fim de produzir ágios médios crescentes a partir da primeira até a quinta categoria, como se pode observar na tabela 5. TABELA 5 Ágios Médios Ponderados – Cr$ por US$ Anos

Total

Categorias 1ª

1954

41,25

26,48

33,55

63,44

83,85

133,35

1955

93,66

68,88

86,41

157,18

204,34

284,72

1956

91,71

64,23

92,28

131,17

200,76

290,46

1957

67,33

43,13

64,29

89,19

135,94

296,55

T ributaç ã o em revis ta

21


Quando a diferença entre uma e outra categoria tendia a se afastar dos limites considerados desejáveis, bastava alterar a distribuição das divisas que deviam ser leiloadas nas próximas licitações. A combinação da taxa fixa de câmbio com o ágio médio, variável por categoria, correspondia a um sistema cambial de taxas múltiplas e flutuantes. Até certo limite, o ágio funcionava como um corretivo da taxa oficial de câmbio, mantida desde 1947, na base artificial de Cr$ 18,50 por dólar, não obstante a crescente perda de poder aquisitivo interno da moeda. Acima desse limite, o ágio passava a ter uma função protecionista, em substituição aos direitos aduaneiros, totalmente erodidos pela inflação. A quinta categoria correspondia a uma quase proibição de importar, em virtude de serem extremamente reduzidas as quotas de divisas que lhe eram atribuídas. Não obstante sua nítida superioridade em comparação com o regime anterior, caracterizado por taxas de câmbio e licenças prévias para cada importação, em pouco tempo começaram a acumular queixas contra o novo sistema, que foi estabelecido com caráter provisório, e funcionou somente durante dois anos. Sem embargo, o regime instituído pela Lei nº. 2145 foi prorrogado sucessivamente até 1957, agora cada vez com maiores dificuldades17. d) A ponte para a reforma tarifária Em conseqüência, já em 1954, o ministro Oswaldo Aranha, pela segunda vez à frente do Ministério da Fazenda, determinou que fossem acelerados os trabalhos relativos à reforma aduaneira, confiando-nos a coordenação geral da excelente equipe técnica incumbida de sua execução. A obsolescência da tarifa de 1934 acentuou-se sobremaneira a partir de 1953. Sua nomenclatura, que não havia acompanhado a evolução tecnológica, ficou completamente desatualizada. Corroídos pela inflação, os direitos específicos haviam perdido toda a importância como instrumento de proteção do trabalho nacional e inclusive como simples fonte de receita. Disso resultaram algumas conseqüências de alta significação. Se, por um lado, a reforma tarifária não encontrou apoio algum na experiência anterior; por outro lado, ela pôde ser realizada com inteira liberdade de concepção com relação ao sistema aduaneiro então vigente.

Na fixação das alíquotas correspondentes a cada produto o projeto se apoiou, fundamentalmente, no que se conveio em designar como “componente tarifário” implícito nos ágios cambiais. Para tal fim, se partiu da concepção de que, na primeira categoria, os produtos estavam submetidos a um tratamento, equivalente às posições livres de direitos aduaneiros. O ágio correspondente atuava, de maneira exclusiva, como fator de correção da taxa de câmbio. A partir desse limite, a parte excedente dos ágios das demais categorias era considerada como um componente de efeito protecionista. A tabela 6, com os dados relativos ao exercício de 1954, ilustra numericamente o mecanismo antes descrito. TABELA 6 Categ.

Tarifa Oficial de câmbio Cr$

Ágio Médio Cr$

Total Cr$

Taxa corrigida de câmbio Cr$

18,72

26,48

45,20

45,2

18,72

33,55

52,27

18,72

63,44

82,16

T ributação e m re v i s t a

0

0

45,2

7,07

15

45,2

36,96

82

18,72

83,85

102,57

45,2

57,37

126

18,72

133,35

152,07

45,2

106,87

237

Essa deformação do ágio da quinta categoria se foi acentuando com o correr dos anos, conforme se pode observar na tabela 7. TABELA 7 CATEGORIAS ANOS

%

%

%

%

%

1954

-

15

82

126

237

1955

-

20

101

112

246

1956

-

34

81

164

272

1957

-

34

75

149

409

Partindo dos níveis reais de proteção implícitos no mecanismo dos ágios cambiais, fixaram-se as alíquotas para os diversos produtos, levando em conta, ademais: a) O grau de elaboração do produto; e b) A existência, ou não, de produção nacional. A combinação desses critérios resultou, afinal, na

17 .Essas prorrogações, que se constituíram em verdadeiras batalhas dentro do Congresso, foram as seguintes: Lei Data Prazo de Prorrogação 2140 29 de janeiro de 1955 18 meses 2807 28 de junho de 1956 6 meses 3053 22 de dezembro de 1956 6 meses 3187 28 de junho de 1957 30 meses

22

Componente tarifário Cr$ %


distribuição dos níveis tarifários por categoria, segundo a tabela 8. TABELA 8

de tão marcada influência na história recente da vida econômica e administrativa do Brasil.

IV – A REFORMA ADUANEIRA DE 1957

NIVEIS TARIFÁRIOS CATEGORIAS

ATÉ 10%

MAIS DE 10% ATÉ 30%

MAIS DE 30%

TOTAL

Primeira

72%

19%

9%

100

Segunda

74%

19%

7%

100

Terceira

36%

33%

31%

100

Quarta

12%

33%

55%

100

Quinta

5%

9%

86%

100

Por esse artifício de raciocínio – representado fundamentalmente pela decomposição dos ágios em dois componentes, um cambial e outro tarifário – o projeto de reforma aduaneira pôde estabelecer uma ponte entre o regime resultante da Lei nº. 2145 e o que lhe seguiu. Com o suicídio de Vargas, em agosto de 1954, Oswaldo Aranha deixou o Ministério da Fazenda, porém os trabalhos da reforma tarifária prosseguiram sem interrupção durante os Governos transitórios de Café Filho e Nereu Ramos que, em 27 de dezembro de 1955, enviou uma mensagem ao Congresso Nacional com o projeto de lei que dispunha sobre uma nova tarifa aduaneira do Brasil. Durante 18 meses o Projeto de Tarifa foi objeto de intensos debates nas Câmaras do Congresso. Era a primeira vez, nesse século, que o Parlamento brasileiro tinha oportunidade de discutir uma reforma aduaneira. Chegou a se criar no País a convicção de que inclusive seria impossível fazê-lo por via legislativa. A participação do Congresso, porém, foi altamente construtiva, neste caso, contribuindo inclusive para o aperfeiçoamento da proposta original do Poder Executivo. Esse fato se deveu ao notável esforço de um excelente grupo de parlamentares integrantes da Comissão Mista presidida pelo deputado Brasílio Machado Neto, que contou, em todo o transcurso dos trabalhos, com a estreita colaboração da equipe técnica responsável pela elaboração do anteprojeto. Concluída sua votação pelo Congresso, em 14 de agosto de 1957, o Presidente Juscelino Kubitschek sancionou a Lei nº. 3244, que punha em vigor a nova tarifa aduaneira,

A Lei nº. 3244 determinou uma completa reformulação das linhas diretivas e dos instrumentos da política de comércio exterior do país, destacando-se os seguintes pontos: a) Instituição de uma nova tarifa aduaneira e estabelecimento de normas para disciplinar sua aplicação; b) Criação do Conselho de Política Aduaneira e definição de suas atribuições; e c) Adaptação das normas cambiais então vigentes. a) Características gerais da Tarifa A nova tarifa representou, na época de sua instituição, uma iniciativa precursora dentro do esforço de modernização dos sistemas aduaneiros da América Latina. Foi a primeira a utilizar a Nomenclatura elaborada pelo Conselho de Cooperação Aduaneira – Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas18. Somente depois da criação da ALALC, em 1960, foi ela também adotada por outros países da área. Lamentavelmente, a nomenclatura brasileira não foi inteiramente fiel ao padrão de Bruxelas, afastando-se dele, parcialmente, em dois ou três capítulos. Essa discrepância se explica pelo fato de que a NAB, então recentemente publicada19, todavia, não tinha inspirado a confiança que logrou conquistar um pouco mais tarde. Não tanto singular, porém muito mais dramática foi, além disso, a decisão de estruturar a tarifa inteiramente sobre a base de direitos ad valorem. Dezenas de anos de tradição de Tarifa totalmente específica haviam marcado, profundamente, a mentalidade do pessoal aduaneiro, ao qual se juntava a circunstância de que, por falta de experiência, os serviços aduaneiros não estavam preparados para exercer, em condições satisfatórias, o controle de preços nas mercadorias. Em razão disso, foi necessário apelar, pelo menos durante certo tempo, para os serviços da Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil que, no exercício de suas atribuições, havia acumulado apreciável experiência em matéria de verificação de preços20.

18. Hoje é denominada Nomenclatura do Conselho de Cooperação Aduaneira. (N. do R.) 19. O projeto básico de reforma foi elaborado entre 1954 e 1955. 20. No sistema então implantado e ainda em vigor, o controle de preços se realiza antes do desembarque da mercadoria no porto de destino. Sobre a base de uma declaração prévia de importação, a Carteira de Comércio Exterior procede à análise dos preços indicados pelo importador e remete o resultado de suas investigações à Alfândega em que se deu seu despacho.

T ributaç ã o em revis ta

23


A definição de valor que serve de base ao cálculo do imposto foi estabelecida pela Lei nº. 3244, nos seguintes termos: “Art. 5º – O imposto ad valorem será calculado com base no valor externo da mercadoria, aumentado com os gastos de seguro e frete (valor CIF). Parágrafo único – Considera-se valor externo da mercadoria o preço, ao tempo da exportação, pelo qual ela, ou uma mercadoria similar, é normalmente oferecida à venda no mercado atacadista do país exportador...” Como na Definição de Valor de Bruxelas, o conceito adotado pela Lei nº. 3244 se apoiava, também, na idéia de um valor normal que pode não coincidir com o preço real constante da fatura. Ademais, a forma de determinar o que se deve entender por valor normal apresenta, entre as duas definições, algumas diferenças fundamentais, resumidas no quadro 1. QUADRO 1 DEFINIÇÃO DE BRUXELAS 1. Compreende todas as parcelas que integram o preço da mercadoria até sua colocação no ponto de entrada do país importador (valor CIF). 2. Toma como base o preço corrente no mercado mundial. 3. O preço corrente corresponde ao vigente no momento da importação. DEFINIÇÃO DA LEI Nº. 3244 1. Restringe-se ao valor externo da mercadoria (valor FOB). As despesas de frete e seguro, ainda que integrem o valor aduaneiro, não estão incluídas no conceito de “valor normal”. 2. Toma como base o preço corrente no mercado atacadista do país exportador. 3. O preço corrente corresponde ao vigente no momento da exportação.

A Definição de Valor de Bruxelas é, sem dúvida, mais completa e de aplicação mais universal, com o que apresenta uma nítida superioridade sobre a adotada pela Lei nº. 3244. As diferenças se explicam, não obstante, pela necessidade, então perfeitamente compreensível, de conferir-lhe maior facilidade de aplicação, pelo menos na fase de implantação da reforma aduaneira. A Tarifa de 1957 compreendia mais de 6.000 itens, com alíquotas variáveis entre 0 e 150%, distribuídas segundo a tabela 9. As alíquotas até 10% foram as únicas incluídas na Tarifa com finalidade estritamente financeira. O Grupo 3 compreende os direitos aos quais se atribuiu função normal de caráter protecionista. Não obstante, se tornou in-

TABELA 9 GRUPOS I

ALÍQUOTAS Livre

T ributação e m re v i s t a

%

124

1,9

II

Até

10%

1 953

30,3

III

Entre

15 e 60%

2701

41,9

IV

Entre

70 e 150%

1 665

25,9

Total

6443

100

dispensável estabelecer uma nova zona de alíquotas entre 79 e 150%21, em virtude da situação de fato existente em funçãp da reforma tarifária. As dificuldades geradas pela guerra e, posteriormente, o desequilíbrio crônico do balanço de pagamentos impuseram, a partir de 1940, fortes limitações ao fornecimento de produtos estrangeiros necessários à economia nacional. Em conseqüência, a substituição de importações passou a se constituir no principal mecanismo propulsor da industrialização do País. Na ausência de programação adequada, esse processo se desenvolveu um tanto anarquicamente, gerando desvios na composição dos investimentos, ademais de novas pressões sobre o balanço de pagamentos. As restrições impostas à importação de bens não essenciais exerceram um forte efeito promocional, estimulando sua produção interna com custos sociais elevados e com prejuízo de outros investimentos de mais alta essencialidade. Por não poder correr o risco de provocar desinvestimentos nesse setor, a reforma tarifária optou pela alternativa de sustentar tais produções, inclusive com direitos elevados, pelo menos durante o tempo necessário para sua adaptação a novos padrões de produtividade. Daí a presença, na Tarifa de 1957, de alíquotas de 70% até 150%, raramente justificáveis, inclusive em uma economia em processo de desenvolvimento como a do Brasil, uma vez que é dotada de uma estrutura produtiva mais racionalmente orientada. b) Negociações internacionais A fim de assegurar a plena aplicação do novo instrumento, fazendo desaparecer completamente todos os vestígios da tarifa anterior, a Lei nº. 3244 estabeleceu o seguinte: “Art. 62 – O Poder Executivo deverá, no prazo de um ano, a contar da data de publicação desta lei: [...] II. Promover as gestões necessárias para a atualização

21. O limite de 150% foi estabelecido um tanto arbitrariamente. Correspondia, em termo médio, ao componente tarifário da quarta categoria

24

Nº. DE ITENS


dos acordos internacionais em matéria de tratamento aduaneiro e que importem na aplicação de imposto diferente do estabelecido na Tarifa.” Nessa época, o Brasil mantinha dois tipos de acordos comerciais com listas de concessões aduaneiras baseadas nos direitos específicos da antiga Tarifa: a) Um acordo multilateral com os países-membros do GATT; e b) Acordos bilaterais com a Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai e Bolívia, dependendo ainda este último da ratificação por parte do Congresso Nacional. Em fevereiro de 1958, iniciaram-se em Genebra as prolongadas e difíceis negociações com as Partes Contratantes do GATT, as quais culminaram com a substituição da antiga Lista III – Brasil, anexa àquele Acordo, por uma nova lista baseada nos direitos constantes da tarifa já em vigor. Apesar de serem também membros daquele organismo, os entendimentos com o Chile e com o Uruguai ficaram para ser realizados em conjunto com os demais países sulamericanos, com os quais o Brasil estava ligado por acordos tarifários bilaterais. Esses entendimentos apresentavam, não obstante, sérias dificuldades. Em virtude da cláusula incondicional de nação mais favorecida, as concessões aduaneiras constantes desses acordos se estendiam, automaticamente, a todas as Partes Contratantes do GATT, retirando-lhes qualquer caráter de tratamento preferencial. O intercâmbio comercial entre os países do chamado “cone sul” vinha sendo mantido, com grande irregularidade, a custo de preferências geradas artificialmente pelos acordos bilaterais de pagamentos. Sem embargo, nessa época, o mundo já retornava ao regime de plena conversibilidade monetária, e nossos países eram fortemente pressionados, nesse mesmo sentido, pelo Fundo Monetário Internacional. O abandono do bilateralismo, sem outras medidas compensatórias, poderia, sem embargo, representar o colapso de parte substancial do comércio da área. E o mercado comum latino-americano, já proposto pela CEPAL, parecia um sonho de concretização, todavia remota. Para um exame geral da situação, Raul Prebisch convocou em Santiago, em agosto de 1958, os diretores de

política comercial da Argentina, Brasil, Chile e Uruguai. Ficou então acordado solicitar do GATT, na reunião de outubro do mesmo ano, uma cláusula especial de salvaguarda que preservasse os acordos tarifários latino-americanos do principio de nação mais favorecida, por considerar-se todavia não viável a utilização de qualquer das duas formas de associação econômica – união aduaneira ou zona de livre comércio – previstas no Artigo XXIV do GATT. As Partes Contratantes, porém, entenderam que a solicitação importaria na criação de uma nova preferência, somente possível mediante emenda ao Acordo Geral, firmada e ratificada pela unanimidade de seus membros, o que tornava impraticável a medida, pelo menos a curto prazo. Sem embargo, pressionada pela exigência da Lei nº. 3244, a delegação brasileira propôs, já em Genebra, com o apoio das Representações do Chile e Uruguai, que, sem prejuízo do prosseguimento dos estudos em torno do projeto de mercado comum latino-americano, se tentasse a celebração entre os países do “cone sul” de um acordo de zona de livre comércio, dentro do qual o Brasil pudesse reorganizar, sobre novas bases, as concessões tarifárias constantes dos acordos bilaterais, todavia, vigentes. Dessa semente resultou mais tarde a ALALC22. E, em janeiro de 1962, entrava em vigor a Lista Nacional que continha uma centena de reduções de direitos da nova Tarifa, outorgadas pelo Brasil às demais partes contratantes do Tratado de Montevidéu. Extinguiram-se, em conseqüência, os últimos vestígios do regime implantado, no país, com a reforma aduaneira de 1934. c) o Conselho de Política Aduaneíra23 Tão importante quanto a reforma do instrumento tarifário foi a instituição do mecanismo capaz de assegurar sua permanente atualização frente à rápida transformação da estrutura econômica do País, assim como também de sua posição no quadro do comércio internacional. A tradição do sistema presidencialista brasileiro havia consagrado uma interpretação demasiado restritiva do princípio constitucional da não-delegação de competências privativas de cada um dos três Poderes da República. E entre

22. Já em dezembro de 1958, em uma reunião do Conselho de Política Aduaneira, realizada no Rio de Janeiro, expusemos a Raul Prebisch as bases de um acordo de zona de livre comércio que nos pareceu perfeitamente viável. Em janeiro de 1959, a pedido de Prebisch, participamos, com outros técnicos da CEPAL, na elaboração de um primeiro esboço de convenção. Depois de um novo encontro em Santiago, realizaram-se as reuniões em Rio, Uma e Montevidéu, onde finalmente foi assinado o Tratado, em 18 de fevereiro de 1960. 23. Inicialmente o Conselho de Política Aduaneira teve alterada sua organização pelo Decreto-lei nº. 730, de 5 de agosto de 1969. Nessa ocasião, sob a presidência do ministro da Fazenda, passou a ser integrado por outros ministros de Estados, dirigentes e órgãos públicos, assim como por representantes das classes produtoras e dos trabalhadores. Mais tarde. foi ele extinto pelo Decreto nº. 83 955, de 12 de setembro de 1979, transferida sua competência para o Conselho Nacional do Comércio Exterior. E a Comissão Executiva do extinto Conselho de Política Aduaneira passou a denominar-se Comissão de Política Aduaneira, para a qual se transferiu sua competência. (N. do E.)

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as competências privativas do Congresso figurava a de votar leis sobre a criação, extinção ou reforma dos tributos. O rigor com que tradicionalmente se vinha aplicando essa norma jurídica conferia ao instrumento aduaneiro extrema rigidez, impossibilitando sua adequada utilização como instrumento de política de comércio exterior e de desenvolvimento econômico. Ao lado da natureza específica de suas alíquotas, essa inflexibilidade se constituiu em um dos fatores de progressiva obsolescência da tarifa de 1934. Ainda que baseada em direitos de caráter ad valorem, a tarifa de 1957 corria também o risco de se tornar rapidamente desajustada frente às reais necessidades da economia nacional. E, em conseqüência, o País ficaria impossibilitado de eliminar as demais restrições de ordem não-tarifária, inclusive depois de haver alcançado uma relativa normalização da conjuntura, nos campos da política cambial e monetária. Para evitar tais inconvenientes, a Lei nº. 3244 instituiu o Conselho de Política Aduaneira e o dotou de poderes necessários para o permanente ajuste da Tarifa às exigências do processo econômico. O Conselho de Política Aduaneira é constituído por um colegiado (Plenário) com representação paritária dos órgãos governamentais e do setor privado. Seus membros são designados pelo Presidente da República com mandato fixo de quatro anos, renovando sua composição pela metade a cada dois anos. Como membro nato do Conselho, o diretor do Departamento de Rendas Aduaneiras atua, por um lado, como elemento de união entre o órgão normativo e de formulação de política e, por outro lado, o órgão incumbido da aplicação da tarifa e da supervisão geral dos serviços aduaneiros do País. O Conselho dispõe de uma Secretaria Técnica, integrada por um corpo de engenheiros, economistas e outros funcionários especializados, dirigida por um Secretário Executivo que participa das reuniões do Plenário, sem direito a voto. A Lei nº. 2344 conferiu ao Conselho de Política Aduaneira uma série de atribuições da mais alta importância, destacando-se a atualização da nomenclatura e a reforma

da base de cálculo e do nível dos direitos aduaneiros. A possibilidade de efetuar todos esses ajustes por simples resoluções do Conselho, além de lhe assegurar maior rapidez e evitar os lentos trâmites do processo legislativo, contribuiu também para conservar seu caráter técnico, retirando a medida da influência deformante das pressões políticas. A faculdade de introduzir correções na nomenclatura permite mantê-la sempre atualizada, inclusive quanto aos desdobramentos que forem necessários para acompanhar a diversificação da estrutura produtiva do País. Com o fim de encontrar a saída para situações que tornam difícil a identificação do valor normal da mercadoria, o Conselho de Política Aduaneira pode utilizar dois mecanismos: 1) estabelecer, para o produto, uma pauta de valor mínimo como base de cálculo dos direitos aduaneiros; 2) converter qualquer alíquota ad valorem em seu equivalente em termos de direitos específicos. Nessa segunda hipótese, a alíquota deverá ser reajustada, semestralmente, a fim de manter sua equivalência exata com os direitos ad valorem correspondentes. De todas as atribuições que lhe foram conferidas pela Lei nº. 3244, a mais importante, sem dúvida, consiste na faculdade de elevar ou reduzir os direitos constantes da Tarifa. A fim de que essa atribuição não se caracterizasse como uma delegação ilimitada de poderes privativos do Congresso a um órgão do Poder Executivo, a lei estabeleceu os limites dentro dos quais se poderiam efetuar as reformas de alíquotas24, além de outras exigências, com o objetivo de assegurar a ampla participação dos interessados na defesa de seus direitos25. As reformas de alíquotas deverão ser precedidas pela publicação de ato para conhecimento público. No período de instrução do processo pela Secretaria Técnica, ou na fase de deliberação do Plenário, os interessados poderão, verbalmente ou por escrito, expor suas razões contra ou a favor da reforma pretendida. Aprovado pelo Conselho26, o projeto de resolução é submetido à homologação do ninistro da Fazenda, que tem um prazo de trinta dias para emitir sua decisão. Se for favorável, a resolução entra em

24. No caso de tais modificações, deverão ser observados cumulativamente os seguintes limites:

1 - Níveis máximo e mínimo de cada capítulo; e

2 - Trinta pontos para mais ou menos.

Dessa maneira, uma alíquota de 50% poderia ser elevada até 80% ou reduzida até 20%, se as alíquotas máxima e mínima, existentes no mesmo capítulo da Tarifa, fossem iguais ou superiores a 80% ou iguais a 20% ou então menores. 25. Não obstante, essas atribuições do Conselho de Política Aduaneira foram questionadas ante o Poder Judiciário, mantendo-se por decisão do Supremo Tribunal Federal, e sendo, posteriormente, consagradas por norma expressa da Constituição de 1967. 26. As resoluções são aprovadas por maioria simples de votos. Sem embargo, mais de 90% têm sido aprovadas por unanimidade, não obstante a heterogeneidade dos interesses representados no Plenário. Esse fato se deve, em grande parte, ao aperfeiçoamento da metodologia e ao crescente vigor técnico das análises efetuadas pela Secretaria, na instrução prévia do procedimento.

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vigor quinze dias depois de sua publicação. Caso não seja homologada, o projeto de resolução, acompanhado das razões do veto, é submetido a nova deliberação do Conselho, que, por voto da maioria de dois terços de seus membros, poderá recusá-lo, enviando o ato à publicação, independentemente de novo pronunciamento ministerial27. Relacionadas, todavia, com a reforma do montante dos direitos devidos, sem afetar por isso as alíquotas constantes da tarifa, figuram as seguintes atribuições conferidas ao Conselho de Política Aduaneira pela Lei nº. 3244: a) Conceder o regime de admissão temporária ou de drawback para a importação de matérias-primas e semimanufaturas, que tenham de ser empregadas na fabricação do produto destinado à exportação; b) Conceder redução ou isenção de direitos para a importação de matérias-primas e outros produtos básicos, destinados a complementar a produção interna, vinculada com a obrigatoriedade de aquisição de determinada percentagem do mesmo produto fabricado no País; c) Conceder redução de até 50% dos direitos de importação de equipamentos destinados à produção agrícola e industrial, com relação a modelos, dimensões ou tipos, todavia não fabricados no País; e d) Declarar a inexistência de produto similar produzido no país, condição necessária para o efeito de gozar de isenção concedida a qualquer entidade, pública ou privada. Mais relacionada ainda com os objetivos da política cambial, a transferência de produtos de uma ou outra categoria de importação foi igualmente incluída pela Lei nº. 3244 entre as atribuições do Conselho de Política Aduaneira28. O Conselho constitui um órgão com características singulares em relação com as instituições do gênero, não só na América Latina, senão que em todo o mundo. Os dez primeiros anos de seu funcionamento demonstram que se trata, realmente, de uma experiência bem lograda, com assinalados serviços já prestados ao país.

V – AÇÃO PARALELA DAS RESTRIÇOES NÃO-TARIFÁRIAS Uma inflação de ritmo crescente e o desequilíbrio do

balanço de pagamentos, agravados pelas convulsões sociais e políticas do quadriênio 1961-1965, fizeram com que se perpetuassem, durante quase dez anos, os controles cambiais e as restrições administrativas impostas ao comércio exterior do País, perturbando com isso, gravemente, o normal funcionamento da Tarifa e o cumprimento, por parte do Conselho de Política Aduaneira, da plenitude de suas atribuições. Enquanto o Conselho de Política Aduaneira promovia, com firmeza e prudência, o lento e difícil processo de ajuste do sistema aduaneiro, as autoridades monetárias introduziam, a cada passo, bruscas mudanças de orientação na política cambial do País, em uma sucessão de marchas e contramarchas que são resumidas nos parágrafos seguintes. a) Permanência do sistema de leílão de divisas (1957-1960) A entrada em vigor da nova tarifa aduaneira, em agosto de 1957, deveria haver sido acompanhada de uma total simplificação do mecanismo cambial do País. Lamentavelmente, a conjuntura econômica e, sobretudo, política, então prevalecente, impediu que essa simplificação se realizasse, pelo menos no limite em que havia sido desejável. Inclusive elevados até o nível de 150%, os direitos aduaneiros eram impotentes para conter a demanda de produtos externos dentro de limites compatíveis com a capacidade de importar do país. Em conseqüência, a Lei nº. 3244, em seu artigo 48, estabelecia: “Enquanto for indispensável conjugar a Tarifa com medidas de controle cambial, objetivando selecionar as importações em função das exigências do desenvolvimento econômico do País, as mercadorias serão agrupadas em duas categorias: geral e especial.” O sistema cambial instituído pela Lei nº. 2145, de 1953, foi mantido quase integralmente. Ao lado de diversas taxas de câmbio aplicadas às exportações e das taxas vigentes no mercado livre (reservado, basicamente, às operações financeiras e movimentos de capitais), continuou em funcionamento o sistema de leilão de divisas para a cobertura das importações. A única reforma realmente importante consistiu na fusão, na categoria geral, das quatro primeiras categorias do sistema anterior. A antiga 5ª categoria passou praticamen-

27. Em dez anos de funcionamento, uma única Resolução do Conselho de Política Aduaneira deixou de ser homologada pelo Ministro da Fazenda e, ainda assim, por motivos alheios ao seu mérito. 28. O Conselho de Política Aduaneira efetuou numerosas transposições da categoria especial para a geral, no sentido de liberar as importações. Contudo, nunca efetuou transferências em sentido contrário.

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te a constituir a categoria especial, cujos produtos, apesar de representarem uma elevada percentagem dos itens da tarifa, continuaram recebendo nos leilões uma quota extremamente reduzida de divisas, equivalentes a uma quase proibição de importar. Esse regime se manteve sem alterações até 1960, durante o Governo de Juscelino Kubitschek. Acrescentandose à taxa oficial de câmbio o ágio médio obtido nos leilões, nesse período, o custo real do dólar para a importação dos produtos classificados nas categorias geral e especial era o que aparece na tabela 10.

gatáveis em 150 dias e com juros de 6% anuais; b) Aquisição de divisas por parte de cada importador, limitada a um máximo de US$20 mil dólares semanais; e c) Licitação, nas Bolsas de Valores, de certificados de “promessas de licenças”, tratando-se de produto de categoria especial29. Em junho do mesmo ano, a Instrução 208 eliminou a obrigatoriedade da subscrição das letras de importação, com relação a alguns produtos, inclusive todos os originários dos países da ALALC, e transferiu ao mercado livre aqueles que haviam sido excluídos pela 204. Completava-se, assim, o processo de unificação da taxa de câmbio aplicável a todas as importações.

TABELA 10 CATEGORIA GERAL Taxa Oficial

CATEGORIA ESPECIAL

Ágio Médio

Total

Taxa Oficial

Ágio Médio

Total

1957

18,82

61,47

80,29

18,82

160 ,85

179,67

1958

18,82

130,53 149,35

18,82

281,54

300,36

1959

18,82

182,93 201,75

18,82

347,06

365,88

1960

18,92

203,87 222,79

18,92

504,45

527,37

A conversão, em cruzeiros, dos valores em moeda estrangeira, para efeito do cálculo dos direitos aduaneiros, se fazia tomando como base uma taxa equivalente ao custo médio do câmbio na categoria geral. O excedente do custo do dólar na categoria especial constituía um componente considerado de natureza não-cambial. b) Tentativa de restabelecimento da verdade cambial (fevereiro a agosto de 1961) Com a instalação do Governo de Jânio Quadros se iniciou uma política de gradual unificação dos mercados, em busca de uma taxa aplicável a todas as operações e que expressasse o que então se costumava chamar de “verdade cambial”. O marco inicial dessa nova tendência esteve representado pela Instrução nº. 204, de 13 de março de 1961, da antiga Superintendência da Moeda e do Crédito. Excetuados o petróleo, o trigo, os fertilizantes e o papel de imprensa, todas as demais importações foram transferidas para o mercado livre, ficando, assim, sem efeito a taxa de paridade oficial declarada ante o FMI. Foram suprimidos os leilões de divisas, ficando, não obstante, as importações sujeitas às seguintes restrições não-tarifárias: a) Subscrição compulsória, pelo importador, de letras equivalentes a 100% do valor do contrato de câmbio, res-

c) Recrudescimento das restrições cambiais (agosto de 1961 a março de 1964) Depois da renúncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, iniciou-se o tumultuoso Governo de João Goulart, encerrado violentamente, em 31 de março de 1964, com a vitória da revolução que colocou na chefia do governo o Marechal Castello Branco. As convulsões sociais e políticas que marcaram esse período, com graves reflexos na situação econômica do País, determinaram um retrocesso na tendência liberalizante em matéria de controles cambiais, inaugurada com a Instrução nº. 204. O limite semanal de aquisição de divisas e os leilões de “promessas de licenças” para as importações dos produtos da categoria especial foram mantidos durante todo o período. Os depósitos prévios exigidos aos importadores e convertidos em letras do Banco do Brasil experimentaram sucessivas elevações, como se observa no tabela 11. TABELA 11 Depósito prévio Instrução da Sumoc

Depósito sobre o Valor da importação

Prazo de devolução

Condições

204

3/13/1961

100%

150 dias

Juros de 6%

218

10/9/1961

150%

150 dias

229

4/22/1963

80%

150 dias

Sem juros

254

10/11/1963

100%

180 dias

256

10/29/1963

100 e 200%

180 dias

263

2/19/1964

100 e 200%

180 dias

A Instrução 208, de junho de 1961, eliminou o depósito prévio para todos os produtos procedentes da ALALC, hou-

29. A licitação foi suprimida para os produtos de categoria geral. No caso da categoria especial, o leilão de divisas foi substituído pelo leilão de licença de importação. No caso de possuir o respectivo certificado, o importador se dirigia ao Banco para efetuar o contrato de câmbio pela taxa vigente no mercado.

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vessem ou não sido objeto de negociações. Essa concessão unilateral aos demais participantes do Tratado de Montevidéu provocou, no entanto, certos abusos, gerando diversos casos de operações triangulares, com simples simulação de origem zonal para escapar ao pagamento do depósito. Em virtude desse fato, em outubro de 1963, a Instrução 256 restringiu o benefício aos produtos constantes da Lista Nacional do Brasil. Porém, em compensação, eliminou para a importação desses mesmos produtos o limite semanal da compra de divisas, elevado, pela Instrução nº. 229, de abril de 1963, para US$ 30 mil dólares por firma. A unidade, pelo menos formal, da taxa de câmbio aplicável às importações não pôde, tampouco, ser assegurada por muito tempo. Em 1962, a Instrução 228

restabeleceu parcialmente o monopólio de compra de divisas pelo Banco do Brasil, que havia sido suprimido, em junho de 1961, pela Instrução 208. Até setembro de 1962 as importações estiveram sujeitas a um regime de taxas cambiais realmente livres, flutuando conforme as condições do mercado. Daí em diante, o Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito passou a determinar a taxa pela qual deveria operar o Banco do Brasil, taxa que em razão da Instrução 230, de 22 de abril de 1963, se converteu em obrigatória também para os demais bancos. Em conseqüência, a taxa chamada livre de câmbio passou a experimentar desvalorizações periódicas, em intervalos, nas datas e limites detalhados na tabela 12.

TABELA 12 Taxa de intervalo Datas

Cambio por Us$

Nº de meses

desvalorizações no período média mensal

Cr$ 9 – 62

475

%

%

4 – 63

620

7

30,5

4,3

3 – 64

1200

11

93,5

8,5

9 – 64

1610

6

34,1

5,7

12 – 64

1850

3

14,9

4,9

11 – 65

2220

11

20,0

1,8

2 – 67

2715

15

22,2

1,5

TABELA 13 Taxa efetiva de câmbio parcelas competentes

1961 abril a dezembro

1962

1963

janeiro

fevereiro

1 – Taxa do mercado livre

286,12

389,83

575,08

620,00

1.090,00

2 – Deságio na colocação das letras do Banco do Brasil30

39,52

93,74

136,82

149,30

282,96

3 – “Boneco Total

11,92

55,83

264,00

289,00

325,64

495,50

767,77

1.033,00

1.661,96

Como essas taxas não correspondiam às reais condições do mercado, a correção se fez por meio de um agregado, chamado “boneco”, ajustado entre os exportadores e importadores e os bancos, sem a aprovação, porém com pleno conhecimento das autoridades monetárias. Esse era, em linhas gerais, o contexto dentro do qual se desenvolveram os primeiros anos de aplicação da nova tarifa. Impossibilitado de promover uma revisão, em profundidade, das alíquotas fixadas em 1957, a fim de eli-

minar erros e corrigir distorções, o Conselho de Política Aduaneira teve que limitar-se ao exame casuístico das numerosas proposições que eram submetidas a seu exame pelos próprios interessados. d) Extinção dos artifícios cambiais (março de 1964 a dezembro de 1966). A partir de março de 1964, começou a se inverter a posição dos saldos resultantes do comércio exterior do País.

30. Pela Instrução 233, de 7 de novembro de 1962, as letras do Banco do Brasil foram substituídas por letras do Tesouro, série B.

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Aos déficits da balança de serviços, normalmente desfavorável ao Brasil, se somaram os sucessivos déficits na balança comercial, que alcançaram o montante de US$ 399 milhões no triênio 1961-63. Nos anos seguintes, a melhoria das exportações, por um lado, e a contenção das importações, por outro, provocam o surgimento de superávit na balança comercial, que se elevaram a US$ 911 milhões, no triênio 1964-66. TABELA 14 Comércio exterior do Brasil ANOS 1957

VALOR EM US$ 1.000,00 1 392

1 489

-

97

1958

1 243

1 353

-

110

1959

1 282

1 347

-

92

1960

1 269

1 462

-

193

1961

1 403

1 460

-

57

1962

1 214

1 475

-

261

1963

1 406

1 487

-

81

1964

1 430

1 263

+

167

1965

1 595

1 096

+

499

1966

1 741

1 496

+

245

Esse desafogo na situação do balanço de pagamentos tornou possível a execução de uma política de gradual extinção dos artifícios introduzidos no sistema cambial do Brasil. Sob a influência dos ministros Roberto de Oliveira Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, retomou-se à tendência inaugurada no governo de Jânio Quadros, pela Instrução nº. 204, da Superintendência da Moeda e do Crédito,31 interrompida nos anos seguintes. Os depósitos prévios de 100 a 200% foram reduzidos a 60 e 50% e a 100 e 90%, respectivamente, pelas Instruções 275 e 277, de agosto e setembro de 1964. E em novembro de 1965, foram totalmente abolidos pela Resolução nº. 9, do Conselho Monetário Nacional 32. De acordo com deliberações desse Conselho, em maio de 1966, o Banco Central do Brasil suprimiu o limite semanal de compra de divisas por parte de cada importador (Resolução nº. 23, de 31 de maio de 1966) e, em novembro do mesmo ano, extinguiu os leilões de promessas de licenças para a importação de produtos da categoria especial. Infelizmente, várias dessas restrições já haviam sido eliminadas anteriormente para produtos originários da

ALALC, por meio de negociações ou em virtude de concessão unilateral do Brasil. A extensão da medida ao resto do mundo importou, assim, na supressão de uma preferência que vinha beneficiando o comércio intrazonal. Isso trouxe reclamações das quais o governo brasileiro se defendeu afirmando que, nos termos da Resolução 53 da Conferência das Partes Contratantes, não cabe exigência de compensação pela eliminação de preferências provenientes de restrições de caráter não permanente, impostas por força de desequilíbrios conjunturais. Não obstante, se dispunha a oferecer tais compensações, com relação a quaisquer correntes de comércio, efetivamente geradas por aquelas preferências. À medida que esses inconvenientes para a posição do Brasil na ALALC encontrem uma saída por meio de entendimentos com as demais Partes Contratantes, lograr-se-ão tão somente os efeitos benéficos, emergentes da simplificação do mecanismo cambial do país. Com a eliminação das demais restrições impostas ao comércio exterior, a Tarifa Aduaneira foi, finalmente, recolocada em sua função de instrumento básico da política de disciplina das exportações e de proteção ao trabalho nacional.

VI – REFORMAS COMPLEMENTARES DE 1966-67 A limpeza efetuada na área cambial foi seguida de uma série de atos com o fim de atualizar e complementar, em alguns de seus aspectos básicos, a reforma aduaneira de 1957. Entre novembro de 1966 e fevereiro e 1967, o Governo brasileiro expediu quatro decretos-leis que dispunham, especificamente, sobre matéria aduaneira: - Decreto-Lei 37, de 18 de novembro de 1966 - Decreto-Lei 63, de 21 de novembro de 1966 - Decreto- Lei 169, de 14 de fevereiro de 1967 - Decreto-Lei 264, de 28 de fevereiro de 1967 Desses atos, o primeiro dispõe sobre aspectos gerais do sistema aduaneiro, e os três últimos introduzem uma série de modificações na Tarifa. a) Complementação da legislação aduaneira. Depois de dez anos de aplicação, diversas normas estabelecidas pela Lei nº. 3244 careciam de atualidade. Ademais, alguns aspectos fundamentais do sistema aduaneiro, que haviam sido deixados à margem pela reforma de

31. Por coincidência, era então superintendente da Moeda e do Crédito o professor Octávio Gouvêa de Bulhões. 32. Nesse ano, a Superintendência da Moeda e do Crédito e o seu Conselho foram substituídos pelo Banco Central e pelo Conselho Monetário Nacional, respectivamente.

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1957, exigiam uma nova regulamentação. Esses objetivos foram reunidos no Decreto-Lei nº. 37, de 18 de novembro de 1966, resultante de um extenso trabalho realizado, sob nossa orientação, por uma equipe de técnicos da Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda. Suas disposições compreendem, entre outros, os seguintes pontos: - normas de aplicação da Tarifa; - isenções e reduções de direitos; - normas complementares da legislação aduaneira; - reestruturação dos órgãos de administração dos serviços aduaneiros. Dentro das normas diretamente relacionadas com a aplicação da Tarifa pelo Decreto-Lei 37, figuram a caracterização do fato gerador e da base de cálculo do imposto. De conformidade com o preceito estabelecido pelo Código Tributário Nacional33, o conceito de valor aduaneiro foi integralmente ajustado à Definição de Valor de Bruxelas, cumprindo, assim, a recomendação expressa da Conferência das Partes Contratantes do Tratado de Montevidéu. A reforma de 1957 havia deixado praticamente intacta a legislação anterior referente às isenções e reduções de direitos aduaneiros, regulados, todavia, em seus aspectos normativos, pelo Decreto-lei nº. 300, de 24 de fevereiro de 1938. Toda essa legislação foi revista e atualizada pelo DecretoLei 37, no Capítulo III, de seu Título I. Também foram reformados o conceito de produto similar fabricado no País e as normas para sua seleção34. Ademais, foram grandemente ampliadas as atribuições do Conselho de Política Aduaneira, ao qual foi outorgada a faculdade de conceder, diretamente, isenções de direitos para a importação de bens de capital (sem produção similar no país), considerados essenciais para o processo de desenvolvimento econômico35. Outro aspecto importante, não tratado pela Lei nº. 3244, relacionava-se com as normas disciplinadoras dos serviços aduaneiros que continuavam regulados pela chamada Nova Consolidação das Leis das Alfândegas e Mesas de Rendas, cujo texto básico datava ainda do século passado. O Decreto-Lei nº. 37, em seus títulos II e III, atualizou essas normas, fornecendo uma base legal para a elaboração de um Código Aduaneiro, a ser aprovado por simples

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decreto do Poder Executivo, ajustado às recomendações dos órgãos técnicos da ALALC e inspirado nas lições da moderna experiência internacional. Finalmente, o Decreto-Lei nº. 37 se preocupou também com a reestruturação e reorganização dos órgãos da administração dos serviços aduaneiros. Criaram-se condições para permitir o reforço de recursos materiais e humanos que possibilitaram ao Conselho de Política Aduaneira o cabal cumprimento de suas atribuições. Além disso, foi prevista uma completa remodelação dos órgãos de direção superior e de execução dos serviços aduaneiros. E, para assegurar a permanente atualização e maior difusão do conhecimento da Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas e de seus desdobramentos, foi instituído o Comitê Brasileiro de Nomenclatura36. b) Modificação da tarifa aduaneira Nos meses finais de seu período de governo, o presidente Castello Branco, por proposta de seus ministros da Fazenda e do Planejamento, decidiu usar dos poderes excepcionais de que se achava investido para introduzir na tarifa vigente uma série de reformas. Tais medidas se inseriram no contexto geral da política de estabilização monetária do governo, com o objetivo de lograr a eliminação das pressões inflacionárias provenientes das restrições impostas às importações por meio de tarifas e outros tributos mais além dos limites compatíveis

33.A partir de janeiro de 1967, entrou em vigor, no Brasil, uma profunda reforma de toda a estrutura do sistema tributário nacional, consubstanciada na Lei nº. 5 172, de 25 de outubro de 1966. 34. O chamado princípio da similaridade, que constitui uma peculiaridade da legislação aduaneira do Brasil, foi regulado pelo Decreto nº. 61 574, de 20 de outubro de 1967. 35. Até novembro de 1966, tais isenções só podiam ser concedidas por lei. 36. Além de determinar o perfeito ajuste da nomenclatura tarifária às disposições da Nomenclatura Aduaneira de Bruxelas, o Decreto-lei nº. 37 foi obrigatório para vários outros fins.

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com uma política racional de proteção aduaneira. Além da redução dos níveis tarifários, funcionaria como fator de estímulo para a melhoria da produtividade e da composição dos investimentos internos. A execução de uma política orientada nesse sentido se fez finalmente possível em virtude da situação excepcionalmente favorável de um balanço de pagamentos, que havia permitido ao país acumular, no exterior, reservas superiores a U$ 500 milhões. A revisão tarifária se fazia ademais recomendável por outros fatores: 1º – A eliminação dos leilões de promessas de licenças, determinada pela Resolução nº. 41 do Banco Central, exigia ajustes compensatórios nas alíquotas aplicáveis a alguns produtos, então pertencentes à categoria especial de importação; 2º – As negociações efetuadas em 1958 com os paísesmembros do GATT impediam o desenvolvimento ou a implantação de novos ramos industriais por haver congelado, em níveis excessivamente baixos, o tratamento aduaneiro com relação a numerosos produtos que nessa época não eram fabricados no País ou o eram incipientemente. Pretendendo alcançar esses objetivos, o Decreto-Lei nº. 63, de 21 de novembro de 1966, determinou uma revisão geral do nível dos direitos em vigor, incluindo 31% dos itens da Tarifa, dos quais 6% tiveram suas alíquotas elevadas e 25%, reduzidas. As elevações corresponderam, em sua maioria, às alíquotas inferiores a 30%, com a finalidade de proporcionar melhores níveis de proteção, especialmente à indústria química e à produção nacional de equipamentos. As reduções se distribuíram da seguinte forma: Alíquotas Itens reduzidos Menos de 30% ..........................13% Entre 30 e 60% .........................36% Entre 70 e 160% ...................... 51 % Essa revisão dos níveis tarifários afetou diversas concessões negociadas pelo Brasil no seio do GATT e com os países da ALALC. No primeiro caso, o mesmo Decreto-Lei nº. 63 revogou, expressamente, a Lista III – Brasil, anexa àquele Acordo, recomendando ao Poder Executivo empreender os entendimentos que fossem necessários para recompor, no futuro, essa lista.

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Em relação com as repercussões da reforma no seio da ALALC, estando em fase adiantada de deliberações o VI Período de Sessões da Conferência, a Delegação do Brasil apresentou uma exposição sobre a matéria, em que reafirmou sua disposição de cumprir seus compromissos com as demais Partes Contratantes, restaurando as margens de preferências negociadas. As reformas de alíquotas determinadas pelo DecretoLei nº. 63 deveriam entrar em vigor somente a partir de 19 de março de 1967. E, como sua elaboração havia sido um tanto apressada, estabelecia que antes dessa data o Conselho de Política Aduaneira deveria efetuar as correções que fossem necessárias. Em fevereiro de 1967, as autoridades monetárias reformavam a taxa de câmbio de 2,20 a 2,70 cruzeiros novos por dólar. E, sob o pretexto de compensar os efeitos dessa desvalorização, foi expedido o Decreto-Lei nº. 169, de 14 de fevereiro de 1967, reduzindo em 20% as mesmas alíquotas da Tarifa ainda não vigente. Para evitar o fracionamento de alíquotas, o Decreto-Lei nº. 264 determinou quatorze dias mais tarde que permanecessem inalteradas as alíquotas até 10% e arredondou as demais alíquotas resultantes da aplicação da percentagem de redução prevista no Decreto-Lei nº. 169, que quase ficou sem efeito. Com as modificações introduzidas pelos DecretosLeis nº. 63 e 264, reformou-se sensivelmente a estrutura geral da Tarifa brasileira, conforme se aprecia no resumo da tabela 15. TABELA 15 números de ítens da tarifa alíquotas

lei nº 3.244, de 1957

decreto-lei nº 264, de 1967

Livre

124

148

2 - 4 - 5 e 7%

363

360

10 - 12 e 15%

1743

2396

20 - 25 e 28%

503

705

30 - 32 e 35%

580

407

40 - 45 e 50%

723

1234

55 - 60 e 65%

737

484

70 e 80%

574

359

90 e 100%

423

381

120 e 150%

654

0

Total

6424

6474


Além da redução do limite superior de 150% a 100%, se observava uma rebaixa geral dos níveis tarifários, tal como se aprecia perfeitamente no resumo oferecido na tabela 16. TABELA 16 Lei nº 3.244, de 1957

decreto-lei nº 264, de 1967

alíquotas

nº de itens

%

nº de itens

%

Até 50%

4.036

62,8

5.250

81,1

Total

2.388

37,2

1.244

18,9

6.424

100,0

6.474

100,0

Essa foi a rebaixa nominal efetuada nas alíquotas da tarifa. A redução efetiva dos níveis reais da proteção aduaneira conferida à indústria nacional se viu, em verdade, acentuada dali em diante, se se leva em conta a orientação que presidiu a política de reajuste das taxas cambiais nos últimos anos. TABELA 17 variação dos poderes aquisitivos externo e interno do cruzeiro Datas

NC$ por us$

Índice

preços no mercado atacadista

custo de vida

Dezembro de 1964

1.85

100

100

100

Dezembro de 1965

2.20

119

152

165

Março de 1967

2.70

146

207

234

Uma confrontação entre as curvas de variação dos poderes aquisitivos externo e interno do cruzeiro põe de manifesto uma nítida supervalorização da taxa de câmbio que contribui, enquanto perdure a situação criada em março

de 1967, para uma queda adicional do nível real dos direitos aduaneiros. Ainda que o ritmo de inflação se mantenha fortemente atenuado a partir de março, a defasagem entre as duas curvas de variação se irá alargando até que a taxa de câmbio seja reposta, finalmente, em seu valor real. VII – CONSIDERAÇOES FINAIS A partir das medidas adotadas para enfrentar a violenta queda das exportações proveniente da grande crise mundial de 1929, o Brasil viveu quase quarenta anos de artifícios e improvisações no campo da política de comércio exterior. Somente agora, transcorridos quase dez anos da reforma tarifária de 1957, puderam ser criadas no País as condições mínimas indispensáveis para a execução de uma política aduaneira racionalmente orientada. Os possíveis erros cometidos na última revisão dos níveis tarifários, em virtude da pressa com que foi efetuada, poderão ser facilmente corrigidos pelo Conselho de Política Aduaneira que, para tal fim, conta com poderes sensivelmente ampliados. Recomposta, em toda sua plenitude, a margem de preferência resultante das concessões anteriormente negociadas no seio da ALALC, estamos convencidos de que o esforço realizado pelo Brasil, no sentido da progressiva racionalização da tarifa aduaneira e de sua colocação como instrumento único de orientação das importações, constitui uma contribuição da mais alta importância às etapas futuras do processo de integração das economias latino-americanas.

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a rtigo de opinião

Montagem: Fabrício Martins

Tributação da prestação de serviços intelectuais no Brasil Considerações jurídicas e econômicas Danilo Augusto Barboza de Aguiar1

R

ichard Posner defende que um sistema tributário eficiente deve apresentar as seguintes características: a) gerar receita suficiente (função arrecadadora); b) distorcer o mínimo possível a alocação ótima de recursos (neutralidade fiscal); c) ter efeitos redistributivos; e d) apresentar baixo custo de administração2. Ao tratar os impostos isoladamente, o autor alerta também que eles devem ter uma base ampla de contribuintes e não devem favorecer o aumento da desigualdade nem ofender a eqüidade3. O tamanho da base não nos interessa nesse artigo, em que já se toma como objeto de análise uma parcela restrita de contribuintes. Quanto aos efeitos sobre a desigualdade e ofensa à eqüidade, será estudado em conjunto com os efeitos redistributivos, pois nos afigura tratar de conceitos correlatos. O objetivo do presente artigo é analisar as regras relativas à tributação da prestação de serviços intelectuais no Brasil e compará-las com os parâmetros apresentados por Posner. Em seguida, serão analisados os efeitos, imediatos e mediatos, sobre os cidadãos e empresas atingidos pelas regras atualmente vigentes. Por fim, serão expostas as

medidas legais e administrativas que tentaram aproximar as regras vigentes dos parâmetros de eficiência defendidos pelo autor do texto. Em primeiro lugar, cumpre definir serviços de natureza intelectual, ao menos para os fins do tema em análise. Embora não haja conceito legal específico, para fins tributários, a prestação de serviço intelectual compreende as atividades relativas a profissões regulamentadas (advogados, engenheiros, etc.) ou a serviços em que predomina o conhecimento técnico ou a capacidade pessoal do prestador, como nos serviços artísticos e culturais (ator, apresentador de telejornal, etc.). Para quem pretende prestar serviços dessa natureza, apresentam-se duas opções. O indivíduo pode prestá-los diretamente, como autônomo, ou constituir uma sociedade para fazê-lo por meio de uma pessoa jurídica. Exclui-se a hipótese de serviço prestado como empregado, pois a tributação é semelhante àquela incidente sobre a pessoa física autônoma, mas sua análise faria surgir questões relacionadas à possibilidade jurídica de optar entre prestar um serviço como empregado ou como prestador de serviços autônomo.

1. Consultor Legislativo do Senado Federal, mestrando em Direito Constitucional (IDP/DF). E-mail: dbaguiar@senado.gov.br 2. POSNER, Richard A. Economic Analysis of Law. 7. ed. Austin: Wolters Kluwer, 2007, p. 512. 3. Ibidem, 521.

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A opção deve ser feita, de forma racional, pela modalidade que maximize seu próprio bem-estar, isto é, pela economicamente mais eficiente. Assim, se o indivíduo prefere trabalhar sozinho, com menor custo de administração e mais liberdade, optaria por trabalhar como autônomo. Por outro lado, se prefere trabalhar em conjunto com outras pessoas, com limitação de responsabilidade e compartilhamento de riscos e acredita, por exemplo, que um pessoa jurídica daria mais segurança a sua clientela, deveria optar pela constituição de uma sociedade. Existe, portanto, algum custo de substituição entre uma e outra opção. Ocorre que, como se demonstrará, a diferença de tratamento tributário entre uma e outra modalidade é tamanha que, a despeito desse custo, o efeito de substituição gerado pelas regras tributárias é bastante elevado. Passemos, então, a descrever a forma como a prestação de serviços de natureza intelectual é tributada pela atual legislação brasileira, o que será feito de maneira sintética, sem detalhamento de regras especiais aplicáveis a determinadas atividades (como serviços hospitalares, por exemplo). Quando prestado por pessoa física, de maneira autônoma, sem vínculo empregatício, os valores recebidos como pagamento pelo serviço prestado são considerados rendimentos tributáveis. Para calcular sua renda tributável, o contribuinte pode deixar de valer-se de seus gastos dedutíveis em troca de um desconto-padrão de 20%, até o máximo de R$ 11.669,724. Feito o desconto, chega-se à base de cálculo. O valor do tributo decorre da aplicação, de maneira progressiva (progressão graduada), das alíquotas de 15% e de 27,5%5. Ao prestar serviços como autônomo, o contribuinte se torna segurado obrigatório da Previdência Social. Deve, pois, passar a contribuir6. Desde o ano de 2007, é permitido que o trabalhador autônomo opte por uma contribuição de apenas 11% (onze por cento) sobre o valor correspondente ao limite mínimo mensal do salário-de-contri-

Quando prestado por uma sociedade simples, as receitas passam a ser auferidas pela sociedade, que sofre a incidência de impostos e contribuições diversas buição, que equivale ao salário mínimo7. Como contrapartida, abre mão do benefício da aposentadoria por tempo de serviço, e os demais benefícios serão calculados com base no salário mínimo. Adotamos, como premissa, que o contribuinte, visando reduzir sua carga tributária, optaria por essa contribuição. Quando prestado por uma sociedade simples, as receitas passam a ser auferidas pela sociedade, que sofre a incidência de impostos e contribuições diversos. A sociedade poderá optar por apurar seus impostos segundo o lucro real ou segundo o lucro presumido8. No caso presente, considerou-se que o mais racional seria a opção pelo lucro presumido, pois tem custo de administração menor. Tendo em vista o perfil de atividade de que tratamos no presente caso prático, implicaria menor incidência tributária. Além disso, permite-nos calcular a incidência tributária sem considerar custos particulares de cada pessoa jurídica. Ao optar pelo regime de apuração segundo o lucro presumido, terá 32% de sua receita tributada à alíquota de 15% referente ao imposto de renda9 e 12% de sua receita tributada à alíquota de 9%10, a título de contribuição social sobre o lucro líquido. Além disso, a sociedade pagará, sobre a receita bruta de sua atividade, a contribuição social para o PIS/PASEP e a COFINS, que incidem às alíquotas de 0,65% e 3%, respectivamente, para sociedades que apuram seus tributos segundo o lucro presumido11. Por fim, cumpre observar

4. Foi utilizado o desconto-padrão para fins de uniformização, pois o imposto devido pelos contribuintes pessoa física é variável em função das despesas com educação, saúde e outros descontos previstos em lei. 5. Lei nº 9.250, de 26 de dezembro de 1995, combinado com art. 1º da Lei nº 11.482, de 31 de maio de 2007 6. Art. 12, V, g, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. 7. Art. 21, § 1º, da Lei nº 8.212, de 1991. 8. No lucro presumido, a base de cálculo do imposto é presumida em função da lucratividade média de determinada atividade. Para as prestações de serviços em geral, supõe-se que o lucro seja de 32%, sobre o qual incide a alíquota do imposto. Desconsideram-se, nesse caso, as despesas incorridas pela pessoa jurídica para auferir a receita. Trata-se de regime semelhante ao já mencionado desconto simplificado do imposto de renda das pessoas físicas. 9. Art. 3º, combinado com art. 15, § 1º, III, a, da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. 10. Art. 20 da Lei nº 9.249, de 1995, em combinação com art. 17 da MPV nº 413, de 3 de janeiro de 2008 11. Art. 10, II da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, combinado com art. 8º da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998, para a COFINS e art. 8º, II, da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, combinado com art. 8º, I, da Lei nº 9.715, de 25 de novembro de 1998, para o PIS/Pasep.

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que, ao distribuir os lucros entre os sócios da empresa, os dividendos ingressam no patrimônio dos sócios como rendimento não-tributável. Toda a tributação, portanto, dá-se sobre a pessoa jurídica.

A tabela abaixo demonstra, com números, a diferença de tratamento que o sistema tributário dá a uma e outra forma de prestação de serviço de natureza intelectual. Os cálculos se referem ao ano-calendário de 2007.

TABELA 1 A Rendimento Anual

B Tributação Pessoa Física1

C Alíquota Efetiva (B/A)

D Pessoa Jurídica2

E Alíquota Efetiva (D/A)

F Diferença (B/D)

15.000,00

R$533,50

3,56%

R$1.699,50

11,33%

0,31

50.000,00

R$5.231,18

10,46%

R$5.665,00

11,33%

0,92

200.000,00

R$46.022,00

23,01%

R$22.660,00

11,33%

2,03

600.000,00

R$156.022,00

26,00%

R$67.980,00

11,33%

2,3

1.000.000,003

R$266.022,00

26,60%

R$113.300,00

11,33%

2,35

1. O valor do salário mínimo para cálculo da contribuição para a Previdência: R$ 350,00, de janeiro a março, e R$ 380,00, de abril a dezembro (mais uma contribuição a título de décimo terceiro); 2. Foram desconsideradas as taxas decorrentes da expedição de alvarás e licenças de funcionamento, bem como o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza que, em princípio, incide igualmente nas duas modalidades; 3. A parcela do lucro presumido que excede R$ 240.000,00 sofre um adicional de imposto à alíquota de 10% (Art. 3º, § 1º da Lei nº 9.249, de 1995).

Na primeira faixa, o regime tributário “empurra” o contribuinte para atuar como autônomo. Nas três últimas, por outro lado, essa opção se torna economicamente inviável, pois elevaria em aproximadamente duas vezes e meia o custo tributário. Somente na faixa de R$ 50.000,00, a opção entre um e outro caminho se daria por critérios de eficiência alocativa estranhos à questão tributária. Tem-se, nesse caso, um regime tributário que distorce a alocação ótima de recursos, gerando enorme efeito de substituição. Por conseqüência, reduz-se a arrecadação potencial, pois cada contribuinte termina por buscar a forma menos custosa do ponto de vista tributário. Além disso, carece de efeito redistributivo, uma vez que quanto mais alta a renda, maior o estímulo para abandonar o regime progressivo (presente apenas no Imposto

Quanto ao custo administrativo, deve-se lembrar que ele abrange também o custo para o contribuinte manter sua situação regular com o Estado

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de Renda das pessoas físicas) em favor do proporcional. Além disso, o sistema alivia preponderantemente as faixas mais altas de renda, favorecendo, assim, a desigualdade. Quanto ao custo administrativo, deve-se lembrar que ele abrange não só o custo de fiscalização da administração pública, mas também o custo para o contribuinte manter sua situação regular perante o Estado. Nesse caso, é bem mais oneroso para o contribuinte atuar por meio de pessoa jurídica, pois exige celebração de contrato social devidamente registrado, registros contábeis mais complexos e pagamento de uma variedade maior de espécies tributárias, o que exige prestação de contas mais completa para o Fisco. Também em razão do maior número de tributos, é de se estimar que o custo de fiscalização também para o Estado seja maior. Como conseqüência de médio/longo prazo, tem-se um contingente enorme de pessoas constituindo-se em sociedades, sem que outras razões o impelissem a tanto, muitas vezes com a utilização de sócios meramente formais (cônjuge ou filhos, por exemplo), incorrendo em gastos desnecessários, apenas para reduzir seu custo tributário. Opta-se pela solução menos eficiente em razão do regime tributário. Consegue-se, pois, com essas regras, desatender a todos os critérios estabelecidos por Posner como necessários a um bom sistema fiscal.


Esse problema não passou despercebido pela Administração Tributária, que já tentou resolvê-lo de várias maneiras. Com efeito, até 2007 a distorção era ainda maior, uma vez que o autônomo deveria recolher à Previdência Social 20% do salário de contribuição até o teto máximo de contribuição. A tributação da pessoa física, na faixa de R$ 50.000,00, portanto, seria de aproximadamente R$ 11.200,00. A medida, estabelecida pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, visava à inclusão previdenciária de pessoas de baixa renda, mas indiretamente teve efeito positivo no desequilíbrio da tributação das pessoas físicas prestadoras de serviços. Em outra oportunidade, tentou-se resolver a questão elevando a tributação das pessoas jurídicas (Medida Provisória nº 232, de 30 de dezembro de 2004). Se havia alguma lógica econômica na medida (igualar o custo tributário para que a opção entre uma e outra modalidade voltasse a se dar por critérios de eficiência econômica), do ponto de vista político, foi um desastre. Como a maior parte dos contribuintes estava, pelas razões expostas, sob o regime de pessoa jurídica, o efeito prático e imediato da medida seria a elevação brutal da carga tributária sobre o setor. As resistências opostas contra a medida resultaram na rejeição, pelo Congresso Nacional, dos dispositivos da medida provisória que majoravam a tributação.

Tentou-se, também, por meio da atuação dos órgãos fiscais, impedir que certos serviços de natureza intelectual, especificamente aqueles prestados em caráter personalíssimo (atores, apresentadores de programa televisivo, entre outros), pudessem ser prestados por meio de pessoa jurídica. Alegou-se que não poderia constituir renda de pessoa jurídica uma prestação de serviço que se dá por meio da atuação pessoal e insubstituível de um determinado indivíduo. O fato gerador, portanto, seria o do Imposto de Renda das pessoas físicas12. Do ponto de vista econômico, buscou-se restringir, ao menos para esse subgrupo dos prestadores de serviços intelectuais, o efeito substitutivo que a tributação majorada da pessoa física gerava. Do ponto de vista jurídico, vale mencionar que essa interpretação nunca chegou a ser definitivamente decidida no âmbito do Poder Judiciário, mas o Poder Legislativo rechaçou-a ao aprovar o art. 129 da Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005. Do ponto de vista econômico, a solução deveria aproximar a carga tributária entre ambas as modalidades de prestação de serviços, reduzindo uma ou aumentando a outra, até o ponto em que seu peso se tornasse irrelevante na escolha entre uma e outra forma, anulando, assim, o efeito de substituição.

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12. Cf. Decisão em Recurso Voluntário nº 127793, da Quarta Câmara, de Carlos Roberto Massa (Ratinho): <http://www.conselhos.fazenda.gov.br/domino/Conselhos/SinconWeb.nsf/numRecurso/E92E9FCC5A8AD53203256B850008D2E9?OpenDocument&posicao=DADOS432F5E>. Acesso em: 11 de abril de 2008.

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Montagem: Fabrício Martins

A instrumentalização do combate à sonegação fiscal como um meio de defesa do contribuinte que paga os seus tributos – algo precisa ser feito Hélio Silvio Ourem Campos1.

E

ntre as questões de massa, aquelas que surpreendentemente mais mereceram destaque neste primeiro estágio da pesquisa foram a sonegação seriada que vem ocorrendo no Brasil e o tratamento gradualmente abrandado que provoca uma preocupante sensação de que nada há a fazer. A jurisprudência precisa indagar-se se não poderia estar sendo forte com o fraco e fraca com o forte. Dizer que um processo de crime contra a ordem tributária transitou em julgado pelo fato de a denúncia não haver sido suficientemente específica, de modo a permitir o amplo direito de defesa, jamais poderia trazer como conseqüência a impossibilidade de aditamento da mesma; e, agora, especificados os fatos, e antes que a prescrição os socorra, o processo deveria ter o seu recomeço. Talvez isto sequer merecesse ser entendido como relativização da coisa julgada. Contudo, pode não ser inco-

mum cobrir com o manto da impunidade a extensão de uma coisa julgada que, na realidade, não há. Este exemplo, por si só, já demonstra as dificuldades que serão enfrentadas. Assim, nesta primeira etapa, pois há um objetivo de consolidação do grupo de pesquisa no tempo, apresentouse como desafio central a aparente precariedade da jurisprudência brasileira sobre a sonegação e a impunidade quanto aos crimes fiscais. A coisa julgada em favor da pretensão dos sonegadores foi surpreendentemente a descoberta principal do começo das pesquisas. Eis o ponto de partida: processos findos e transitados em julgado, permitindo-se acompanhá-los nas suas razões e contra-razões o mais possível completas. A procura das causas desta constatação consumiu a maior parte do tempo, tendo havido a necessidade de buscar-se a integração endógena e exógena dos órgãos e

1. Doutor e Mestre pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Juiz Federal. Professor Titular em Direito Processual e Tributário da Universidade Católica do Estado de Pernambuco. Ex-procurador judicial do município do Recife. Ex-procurador do Estado de Pernambuco. Ex-Procurador Federal. www.ourem.cjb.net.

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Sanja Gjenero

entidades públicas, por meio de reuniões e seminários dentro e fora do ambiente universitário. Foram muitos os encontros buscando aproximar as esferas municipal, estadual e federal. Esse esforço não se restringiu ao Estado de Pernambuco, pois buscou contactos e participações efetivas em Brasília, Sergipe, Alagoas, Mato Grosso do Sul, etc. Ministros, juízes, desembargadores, auditores e procuradores das entidades federativas, professores universitários não apenas da área jurídica, mas também da econômica e contábil, orientandos de pesquisa, jornalistas, meios de imprensa em geral foram mobilizados de modo a se engajarem num verdadeiro movimento que procuramos construir. Não foi fácil, pois houve reação dos setores que se julgaram atingidos. Contudo, após tantos anos lecionando Direito Tributário e Processual, busquei realizar algo que tivesse efeitos concretos, uma espécie de contribuição mais direta em favor da sociedade na qual vivo. Isto porque sempre considerei necessário aliar teoria e prática. A teoria sem a prática, pedindo desculpas a quem pense o contrário, aproxima-se da inutilidade ou quase isto. Assim, coloquei-me em confronto com a minha prática profissional, onde já trabalhei como advogado, consultor, procurador, juiz, professor etc. Passei a discutir o lugar-comum de que se pagam muitos tributos e se recebem poucos e ineficientes serviços no Brasil. Essa seria a nossa justificativa para a evidente aceitação dos crimes de sonegação fiscal. O contribuinte pobre, de classe média, o micro, o pequeno e médio empresários, e mesmo o grande empresário que opta pelo crescimento à custa da sonegação, justifica-se moral e socialmente com este argumento: não é irregular deixar de pagar os tributos. Acho preocupante essa aceitação da sociedade. É necessário refletir sobre ela. Primeiramente, se parece consensual que no Brasil existam escolas de ótima e de péssima qualidades; hospitais excelentes e terríveis e que, para a população mais carente, quase sempre sobram as piores alternativas, por que se pensar que o tratamento fiscal é isonômico? Ou seja, que todos os contribuintes recebem um tratamento equilibrado.

Portanto, se é verdade que para alguns há uma carga tributária escorchante e serviços sofríveis de retorno, não se deve generalizar também com isto. O nosso sistema tributário é duplamente regressivo. Explico melhor. Proporcionalmente, paga mais tributos quem tem menos; e recebe mais do Estado, quem tem mais. Basta ver que considerando como bases de imposição tributária o patrimônio, a renda e o consumo, é sobre o consumo onde se intensifica a tributação. E é de se preocupar com o fato de que uma pessoa humilde compromete a maior parte do que tem no consumo (alimentos, material de higiene e limpeza, etc.). Logo, a lógica fiscal de optar pelo consumo como base de imposição tributária preferente é algo que não pode ser esquecido, e em qualquer reforma tributária precisa ser levado em conta. Quanto ao retorno do dinheiro público, os benefícios e incentivos fiscais são práticas que exigem uma fiscalização eficiente, haja vista o triste passado de fraudes em instituições como a Sudene e a Sudam. Ocorre que no Brasil, exatamente em função da visão distorcida de que todos os contribuintes estariam, na prática, merecendo o mesmo rigor de tratamento, a sociedade em geral trata o grande fraudador até com certa admiração, como alguém de sucesso, que soube lidar com o sistema. O grande fraudador não é tratado como um criminoso. Logo, ele não se sente como tal. Aliás, já cheguei mesmo a escutar em um debate que também o sonegador tem as despesas decorrentes da sone-

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Montagem: Fabrício Martins

gação que, algumas vezes, passa pelo pagamento da propina ou pela transferência de prestígio social. Afora as despesas provenientes da sua defesa em juízo ou fora dele. Isso estimula a impunidade, que pode ocorrer pela mera ausência de fiscalização eficiente ou pela interpretação dos órgãos julgadores administrativos e judiciais. E note que se trata de um encontro de contas. Se há, ou não, vantagem em sonegar. Logo, se realmente se pretende reduzir a sonegação no Brasil, faz-se necessário tornar desvantajosa a postura do sonegador, não se permitindo, por exemplo, que faça jus a parcelamentos que excluam a sua punibilidade. Afora o fato de que o instituto do parcelamento não implica senão em suspensão da exigibilidade da dívida, não fazendo surgir uma nova; pois em nada se confunde com o instituto jurídico da novação. Estender-lhe ao sonegador, retira a atitude de respeito que é preciso ter diante do sistema jurídico, premiando-se o sonegador, que adquirirá uma vantagem concorrencial perante aquele que paga os seus tributos em dia. Afinal, desvio de dinheiro público dá-se tanto quando o dinheiro se encontra nos cofres públicos e é utilizado para finalidades privadas quanto quando o dinheiro se-

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quer ingressa nos cofres públicos pela via da sonegação. Aqui vale lembrar que não basta punir os corruptos, pois estes, embora devam ser punidos, virão a ser substituídos até com alguma facilidade, dentro de uma cultura como a nossa que aceita e admira a postura do grande sonegador. Faz-se imprescindível identificar o corruptor. E parece que isso é ainda mais difícil. A dificuldade decorre de questões sociais gerais, mas também de problemas bem específicos. Falta-nos integração entre os órgãos públicos. Essa ausência é tanto endógena, quanto exógena. Explico melhor. As Auditorias Públicas (municipais, estaduais, distritais e federais), as Procuradorias, o Ministério Público, o Poder Judiciário, as polícias (tantas vezes subdivididas em locais e regionais), etc. possuem uma estrutura interna que ainda exige uma aproximação bem maior. E se é assim internamente, muito mais difícil será a integração entre os órgãos públicos. Neste ciclo de estudos sobre isonomia, sonegação fiscal, processo e coisa julgada, procurei exatamente aproximar esses órgãos e a sociedade para que se comece a entender que cobrar as dívidas fiscais é um dos caminhos para se reduzir a carga tributária daqueles que efetivamente a pagam.


No percurso dos nossos estudos, pareceu-me também surpreendente a questão do medo. Isto porque se, de um lado, o cidadão comum tem certo receio de passar por uma auditagem, passei a considerar a possibilidade de os auditores terem receio do grande sonegador, não apenas no que se refere a atentados físicos, mas também porque a sonegação organizada, e realizada sistematicamente, quando surpreendida nos seus esquemas, reage. E a reação não se trata apenas de se defender material ou processualmente, mas inclusive adotar uma postura de ataque, processando os fiscais que não têm a mesma estrutura judicial, buscando com isso atemorizálos e evitar que a perquirição continue. Logo, se é preciso impedir o abuso da fiscalização; por outro, faz-se necessário fornecer-lhe tranqüilidade, de modo que se possa agir com o equilíbrio e a firmeza que a função exige. Tudo isto faz crer que seja imprescindível estabelecer um contraponto nos estudos do direito tributário no Brasil. Nos congressos, seminários etc., se deve haver de um lado a exposição dos advogados tributaristas, tão brilhantes e com tantas teses bem desenvolvidas; de outro, também precisa haver expositores que defendam o Fisco e a sociedade que não costuma contratar, até porque não tem recursos para tanto, os grandes juristas da área fiscal, que se encontram entre os maiores expoentes nacionais. Só assim é que a juventude jurídica universitária, ainda em formação, conseguirá encontrar o justo meio termo. É preciso entender que assim como os grandes devedores têm o direito de contratar advogados sérios e competentes para fazerem as suas defesas; a Fazenda Pública tem o dever de também proceder às sustentações orais, sobretudo naquelas causas que repercutem bilhões. Não se trata de interferência do Executivo no Judiciário, mas de exercício regular de um direito-dever em benefício de toda a sociedade, pois é necessário ter em conta que o que é público é de todos nós. Até porque, acaso a inconstitucionalidade seja declarada, o normal seria que o dinheiro fosse devolvido para aquele que realmente pagou o tributo maior, o contribuinte que pagou de fato. Isto só não ocorreria em duas situações: a) quando aquele que pagou de fato, no preço, autorizar o contribuinte de direito a recolher aquilo que foi indevido; b) quando o contribuinte de direito comprovar que efetiva-

mente arcou com os custos do tributo, sendo ele também o contribuinte de fato. Evidentemente que, nesta segunda hipótese, haveria de abrir os seus livros à fiscalização. Insisto que se reflita sobre o que digo. Se algum tributo pago for havido posteriormente como inconstitucional, quem deveria haver de volta o indevido seria aquele que efetivamente pagou. É por isso que toda vez que se diz que as mercadorias, os produtos e os serviços estão bem mais caros porque é alto o valor do tributo, é preciso refletir. Ora, é direito do consumidor não apenas saber quanto de tributo há no preço daquele produto; mas também deve ser informado se aquela empresa efetivamente recolhe os valores fiscais embutidos no preço. Assim como a empresa acessa (SPC, Serasa, Cadin) os dados do seu consumidor, o consumidor também deveria ter a informação sobre os dados da empresa onde opta comprar. É uma questão de responsabilidade fiscal. Quem sabe um selo identificando a empresa que cumpre com a sua função social de pagar tributos. As informações precisam ser de mão dupla. É nessa linha que encontro o art. 198, § 3º, do CTN. Não é vedada a divulgação de informações relativas a representações fiscais para fins penais; inscrições na dívida ativa da fazenda pública; parcelamento ou moratória.

Svilen Mushkatov

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Quando se diz que há preferência em relação aos créditos da Fazenda Pública, também creio que isto seja uma aparente ilusão. Afinal, se a opção de inadimplência for em direção a clientes e fornecedores, eles logo cortarão o fornecimento ou resistirão em comprar. Quanto ao Fisco, aquele que trabalhar com execução fiscal verificará que a recuperação de ativos é muito baixa, pouco freqüentando a preocupação do devedor inadimplente que, com um mandado de segurança, objetivará atingir a certidão negativa que faltava, muitas vezes até sem a necessária garantia de pagamento, haja vista uma parte do setor da construção civil, que resiste dizendo que os seus empreendimentos são desligados das dívidas da empresa. Mas se poderia dizer que as estratégias jurídicas são meios lícitos, às vezes, apelidados de planejamento tributário ou elisão. Talvez em alguns casos. Mas veja os que vão a seguir, e diga se esses são meios lícitos ou meras dissimulações: 1. Formações de sociedades com posterior dissolução com redistribuição de capital de modo a não pagar o ITBI. Explico melhor. Se duas pessoas forem comprar um apartamento de poucos mil reais, certamente encontrarão dificuldades de pagar o dito ITBI, quando da transferência de propriedade por meio do registro. Isto porque, em relação ao poder aquisitivo dos adquirentes, ele será inegavelmente alto. Contudo, se a unidade imobiliária atingir alguns milhões, não seria razoável que comprador e devedor simulassem uma sociedade integralizando o capital com o dito apartamento e o seu valor correspondente, para logo a seguir dissolvê-la, agora invertendo o capital integralizado. Aquele que inicialmente ofereceu a unidade imobiliária sai da sociedade com o dinheiro, e aquele que inicialmente ingressou com o dinheiro, sai dessa com o imóvel. Isto tudo para fugir do tributo, ITBI, menosprezando toda a fiscalização. 2. Dissimulações de pro labore na forma de aluguel de bens próprios – casas, automóveis etc. Se a empresa vai mal, e não se pode justificar uma retirada alta de pro labore, supera-se o problema na forma seguinte. A casa (ou as casas), o automóvel (ou vários deles) que são da propriedade do sócio, são alugados à sociedade, que passa a pagar os ditos “aluguéis”. Seria esta uma forma inteligente de dizer que não se paga pro labore, mas meros aluguéis? Que a sociedade em geral, mas melhor informada, responda.

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3.Parcelamentos como formas de extinção de punibilidade e não de suspensão. Utilização de laranjas (funcionários da própria empresa ou não) e fantasmas para depósito do faturamento. Com isso, reduz-se o faturamento real e se paga menos tributos. Pego o esquema, busca-se socorrer-se de parcelamentos especiais, e com isso não apenas suspender o pagamento imediato da dívida, mas até extingui-la, afirmando-se que a dívida parcelada em nada se confunde com a original decorrente de fraude ao faturamento. A novação funcionaria aí como uma forma extraordinária de perdão ou de impunidade. Note-se que se defende o parcelamento da dívida decorrente do ilícito fiscal não como uma forma de suspensão da exigibilidade, ou mesmo da punibilidade; mas como uma maneira inteligente de extinguir a própria punição. 4.Cisões de empresas de modo a pagar o parcelamento com base no faturamento da empresa cindida, e que praticamente não mais funciona, pois toda a atividade passou para a empresa conseqüente da cisão. Assim, a empresa-mãe tem a dívida, que costuma ser bem alta, mas detém um faturamento quase inexistente, e é com base nele que se pretende pagar o débito mediante módicas prestações, calculadas à base de um faturamento artificialmente esvaziado. 5. Off shores e preços de transferência. Valores vultosos são encaminhados para o exterior a pretexto de comprar desde jogadores de futebol até produtos de luxo. O valor do produto ou do jogador é menor, mas assim se promove evasão de divisas. Por outro lado, quando uma nova mercadoria estar para chegar, diz-se que vale bem menos, pois se paga menos tributos (sonegação). Via de regra, notas fiscais são lançadas no estrangeiro com valores relativos ínfimos, bastante distantes daqueles apontados pelo Banco do Brasil, no Siscomex. Salvo melhor juízo, o encaminhamento criminal não é uma opção para o juiz, mas uma obrigatoriedade. 6. Más concessionárias de veículos ou empresas de faturização, compras e vendas de notas fiscais, notas fiscais calçadas, exercício irregular no setor de combustíveis, construção civil, usinas, estivas, bandas musicais, atividades financeiras suspeitas, especialmente junto a pequenos e médios bancos etc.


Aqui, abro destaque:

Sufi Nawaz

a. Para os pseudoprocuradores com poderes mais amplos que os dos próprios pseudo-sócios de empresas. Parece incrível observar que pessoas modestas aparecem como sócias de empresas; e outras, bem menos modestas, surjam como procuradores destas primeiras, com amplos poderes para realizar todos os tipos de negócios em nome dos proprietários. Às vezes, os sócios diretores, por cláusula contratual, são obrigados a assinar, em nome das empresas, em conjunto, para que o negócio jurídico tenha validade; enquanto, ao “procurador”, basta que assine isoladamente; b. Sobre os pseudo-restaurantes, quando atividades de fachada, caberia um capítulo em separado; afinal, com os cerca de 8% de ICMS, poderiam emitir desbragadamente notas fiscais de venda e, com isso, lavar dinheiro “sujo” a um custo de branqueamento bem em conta. O dever de sinceridade fiscal, como se observa, é um déficit alto no Brasil e vem retirando a paciência do pagador adimplente, que fica cada vez mais onerado com a atitude do mau cidadão e da má empresa (concorrência desleal), que agem pela via dissimulada e estão demonstrando um resultado de sucesso nos processos findos (coisa julgada), ainda não sendo desvantajoso deixar de adimplir com as obrigações tributárias. Poderia-se dizer: nada há a ser feito. Penso que não. O nosso ciclo de estudos vem buscando encontrar soluções. Entre aquelas possíveis, cito duas por enquanto: a) Buscando a integração entre os órgãos, sugerese a criação de Coafs (Conselho de Controle de Atividades Fiscais) regionais. O art. 16, da Lei 9613/03, de março de 1998, prevê a sua composição, que não vai além de 15 pessoas. É muito pouco para um país continental como o nosso. Daí, a necessidade de Coafs regionais; b) A melhor fiscalização do financiamento das campanhas políticas. Ao Tribunal Superior Eleitoral caberia não apenas indicar o valor real que

cada candidato a deputado federal, estadual, senador, prefeito, governador, presidente da República haveria despendido nas suas campanhas; mas também deveria disponibilizar para todo cidadão brasileiro os nomes dos financiadores: empresas e instituições. Afinal, se é um direito de uma empresa financiar um candidato que irá representar os seus interesses, é também direito da sociedade em geral o de estar informada do financiamento. Talvez assim se comece a pensar que alguns representantes não são tão omissos como parecem; afinal, é preciso fixar quem na verdade ele estará representando. Com isto, não apenas os problemas de sonegação, dificuldade de fiscalização e efetiva cobrança poderiam ser melhor enfrentados; mas, quem sabe, inclusive os vícios em licitações poderiam ser reduzidos. (vide: os sites “políticos do Brasil” e “transparência Brasil”) É bem verdade que comparar países diferentes é uma atitude de risco, mas vale observar os parâmetros norteamericanos de enfrentamento à sonegação fiscal, não se esquecendo de que, nos EEUU, há um adágio que diz “só duas coisas são certas na vida: a morte e pagar impostos” (tradução livre). Eis os parâmetros: 1) possibilidade de prisão perpétua, a depender do montante sonegado; 2) a desvantagem de sonegar deve ser superior à vantagem; 3) a sanção deve desestabilizar o criminoso; 4) a sanção deve amedrontar as suas pessoas próximas; 5) deve haver efetividade na punição. É de se recordar Al Capone e Pete Rose (o maior reba-

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tedor de beisebol de todos os tempos). Presos, independentemente do prestígio. Saúde, educação, segurança pública, reforma agrária, construção de estradas, aposentadorias e pensões. Tudo isso, e muito mais, o Estado depende dos tributos para custear. Eis o que ataca a supressão dos recursos públicos pelos chamados “ricos-pobres”, aqueles cujas empresas vão economicamente mal, mas em suas vidas particulares não se ruborizam de andar de helicópteros, carros de extremo luxo, com verdadeiros palácios à beira-mar, viagens constantes ao estrangeiro com estadias em hotéis refinadíssimos, etc. Embora haja quem diga que a riqueza seja igual em qualquer parte, e a pobreza possa ser diferente, ao menos, no Brasil, é necessário distinguir a origem do dinheiro. E não se fala aqui da informalidade da microempresa, que precisa do apoio do Estado mediante uma tributação reduzida, de modo a permitir que cresça e concorra, não permitindo o monopólio ou oligopólio de nenhum setor, de modo a promover o controle de preços pelo setor privado. É necessário estimular a micro e a pequena empresa; é necessário estimular a concorrência. É necessário permitir à grande empresa que possa manter-se no mercado sem a deslealdade na concorrência. Afinal, quanto maior a carga tributária, mais elevada será a deslealdade em benefício do sonegador. Impunidade. Esse é um incômodo que a sociedade precisa afastar. Não vai ser fácil. Afinal, não são apenas leis que podem ser alteradas, mas depende principalmente de uma mudança de mentalidade da sociedade e dos seus juízes.

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Talvez os números da inadimplência estimulem o cidadão a entender do que, na verdade, se estar a falar. Valores inadimplidos, por órgão de controle (números apresentados pelo Governo Federal na Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 303/2006, a regulamentadora do então denominado REFIS 3 ou PAEX): 1. Procuradoria Geral da Fazenda Nacional: R$ 343 bilhões. 2. Receita Federal: R$ 260 bilhões. 3. Previdência Social: R$ 160 bilhões. 4. REFIS (parcelamento – recuperação fiscal): R$ 52 bilhões. 5. PAES (parcelamento – parcelamento especial): R$ 60 bilhões. 6. Parcelamento Ordinário: R$ 7 bilhões. Nesse período, final de 2006, o Estado de Pernambuco possuía em execução fiscal aproximadamente R$ 7,5 bilhões. Pois bem, este foi um abreviadíssimo resumo do ciclo de estudos que vem sendo desenvolvido desde o ano de 2006, a partir do Mestrado da Universidade Católica de Pernambuco, contando com a colaboração do TRF da 5ª Região e de tantos outros órgãos públicos e da sociedade em geral. Benefícios previdenciários e remunerações de servidores públicos são repetidamente apontados como culpados pelo déficit fiscal. Mas, por que não cobrar de quem deve? E deve tanto? Montagem: Fabrício Martins


Fotos: Joana Franca

q uestões polêmicas de direito tributário Cobrança de COFINS de profissionais liberais Anderson Nakamura Natalie Cevallos Mijan

Número do Recurso:

132081

Câmara:

PRIMEIRA CÂMARA

Número do Processo:

10840.000211/00-14

Tipo de Recurso:

VOLUNTÁRIO

Matéria:

RESTITUIÇÃO/ COMPENSAÇÃO COFINS

Recorrente:

PEREIRA ADVOGADOS

Recorrida/Interessado:

DRJ – RIBEIRÃO PRETO/SP

Data da Sessão:

20/09/2007

Relator:

Fernando Luiz da Gama Lobo D’Eça

Decisão:

Acórdão 201-80610

Resultado:

DPM – DADO PROVIMENTO POR MAIORIA

Texto da Decisão:

Por maioria de votos, deu-se provimento ao recurso. Vencidos os Conselheiros Walber José da Silva e Maurício Taveira e Silva e Josefa Maria Coelho Marques.

Ementa:

COFINS. ISENÇÃO. SOCIEDADE CIVIL DE PROFISSÃO REGULAMENTADA. RECOLHIMENTO INDEVIDO. RESTITUIÇÃO DEVIDA. SÚMULA Nº. 276 DO STJ. PRECEDENTES DA CSRF. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais estavam isentas de Cofins, nos termos do art. 6º, II, da LC nº. 70, de 1991, portanto, irrelevante o regime tributário de IR adotado pela pessoa jurídica. Recurso provido

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C

oloca-se em análise o processo acima transcrito da Primeira Câmara do Conselho de Contribuinte, de novembro de 2007, a respeito da cobrança da Cofins a profissionais liberais. Em 17 de setembro de 2008 foram julgados na Suprema Corte os Recursos Extraordinários nº. 377457 e 381964, que trouxeram novamente à baila a discussão a respeito do tema. Faz-se necessário entender alguns conceitos preliminares antes de se discutir o assunto. COFINS é a sigla para Contribuição para Financiamento da Seguridade Social. Trata-se de uma contribuição federal de natureza tributária e incide sobre a receita bruta das empresas em geral. São contribuintes as pessoas jurídicas de direito privado, inclusive as pessoas a elas equiparadas, com exceção das empresas que aderiram ao regime do SIMPLES. A isenção da cobrança da Cofins para profissionais liberais se baseava na Lei Complementar nº. 70, de 30 de dezembro de 1991, que em seu artigo 6º, inciso II previa a isenção de tais profissionais: “são isentas da contribuição, as sociedades civis de que tratam o artigo 1º do DecretoLei nº. 2397/87”. O referido Decreto-Lei inclui nessa categoria as sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País. Evidente que essa lei protege os profissionais citados. Contudo, a Lei nº. 9.430, de 27 de dezembro de 1996, com seu artigo 56, veio encerrar tais benefícios: “as sociedades civis de prestação de serviços de profissão legalmente regulamentada passam a contribuir para a seguridade social com base na receita bruta da prestação de serviços, observadas as normas da Lei Complementar nº. 70, de 30 de dezembro de 1991”. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), à época, com a intenção de pacificar entendimento a respeito do tema, editou a Súmula 276 com o seguinte texto: “as sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas de Cofins, irrelevante o regime tributário adotado”. A partir de sumulado o entendimento pelo STJ, a grande maioria das sociedades de profissionais liberais cessou o recolhimento de COFINS, pois se criou uma expectativa de segurança jurídica.

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Toda a discussão foi recentemente levada ao Supremo Tribunal Federal (STF), que, por 8 votos a 2, decidiu que devem os profissionais liberais pagar o tributo. Decidiu, ainda, pela retroatividade da cobrança dessa contribuição à edição da Lei nº. 9430/96, a qual revogou a Lei Complementar 70/91, que tratava do assunto. O argumento defendido pelos advogados que interpuseram os Recursos Extraordinários supracitados é o de que é ilegítima a revogação de uma lei complementar por uma lei ordinária, devido à complexidade que envolve a promulgação da primeira ser maior que a segunda. A maioria dos Ministros do STF entende que não existe hierarquia entre leis, apenas competências determinadas a cada espécie e, sendo a Cofins uma contribuição prevista no artigo 195 da Constituição Federal, poderia ser naturalmente regulamentada por lei ordinária. Analogamente, aceitar que uma lei com um trâmite legislativo mais complexo tenha prevalência sobre as demais seria como aceitar que uma sentença de rito ordinário tivesse mais peso ou importância que uma sentença de rito sumário ou sumaríssimo. Os ministros vencidos, Marco Aurélio e Eros Grau, entendem que, por possuir maior complexidade em sua elaboração, a lei complementar não poderia ser revogada por lei ordinária. Esse entendimento está em consonância com a posição do Superior Tribunal de Justiça, cujo juízo é o de que apenas leis da mesma espécie poderiam revogar outra. O Plenário, conforme sugestão do ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, ainda reconheceu a repercussão geral da matéria debatida e agora todos os Tribunais Regionais Federais poderão aplicar esta decisão aos demais recursos extraordinários que estavam aguardando a decisão. Há, ainda, uma grande polêmica neste caso, qual seja a retroatividade da cobrança desse tributo, tendo em vista que essa decisão pode gerar efeitos muito danosos, principalmente aos pequenos contribuintes. A partir de agora todas as pessoas afetadas pelo julgado, incluindo os advogados, que foram os motivadores de tal decisão, terão de acertar contas com a União. Não se sabe ainda como será feita a cobrança. Entretanto, espera-se bom senso de ambas as partes para que não haja prejuízo nem dos profissionais afetados e nem da Administração.


Airon Balogh

O que é o SPED?* Nivaldo Cleto 1

O

Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) é um projeto implantado por meio de um acordo nacional das autoridades tributárias, visando integrar os dados dos contribuintes aos fiscos municipais, estaduais e federal, mediante o compartilhamento das informações contábeis e fiscais. Por esse processo haverá uma sensível melhora do controle tributário pelo cruzamento de dados contábeis e fiscais com a auditoria eletrônica, eliminando informações redundantes dos contribuintes às autoridades tributárias. O SPED é dividido em três grandes subgrupos: SPED Contábil, SPED Fiscal e Nota Fiscal Eletrônica.

I - SPED Contábil O SPED Contábil foi regulamentado pela Instrução Normativa RFB nº 787, de 19 de novembro de 2007, que instituiu a Escrituração Contábil Digital (ECD); estabelecendo a sua obrigatoriedade e aprovando o Manual de Orientação do Leiaute para geração de arquivos.

A partir da escrituração contábil de janeiro de 2008, as empresas sujeitas ao acompanhamento tributário diferenciado, de acordo com as Portarias RFB nº 11.211 e nº 11.213, deverão elaborar o Livro Diário na forma digital, denominado ECD – Escrituração Contábil Digital, nos termos estabelecidos na referida Instrução Normativa. Essas empresas diferenciadas estão recebendo uma Notificação das Delegacias da Receita Federal informando sobre o programa de acompanhamento econômicotributário diferenciado e informando sobre a entrega obrigatória da Escrituração Contábil Digital a partir de janeiro de 2008. Em breve, estará disponível pela Receita Federal (PVAECD – Programa Validador e Assinador da Escrituração Contábil Digital) um programa que fará a importação dos arquivos eletrônicos referentes aos lançamentos contábeis das empresas, validando-os por meio do leiaute previsto no Manual de Orientação, anexo à IN 787.

* Publicado originalmente na Revista IBEF News, edição nº 121, Agosto 2008, São Paulo, Instituto IBEF 1. Nivaldo Cleto é contador; sócio da Clássico Consultoria, Auditoria e Tecnologia Contábil; coordenador do Projeto Nova Identidade do Profissional Contábil pelo Conselho Federal de Contabilidade - CFC; vogal da Jucesp – representando a União; conselheiro do Comitê Gestor da Internet do Brasil - CGIbr.

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Ao invés de a fiscalização emitir a intimação para a empresa apresentar os livros diários em papel, a intimação informará que eles serão acessados pelo SPED

No mês de junho de 2009, ocasião em que as empresas deverão entregar a Declaração de Imposto de Renda Pessoa Jurídica, será também o prazo para entregar a ECD do ano base 2008 – empresas de grande porte, sob pena de sofrerem uma multa de R$ 5.000,00 por mês de atraso (artigo 10º da IN RFB 787/2007). É facultada a todas as empresas a adesão imediata à ECD - Escrituração Contábil Digital, independente do Regime de Tributação.

II - SPED FISCAL - Escrituração Em seguida o contador e o responsável legal assinam eletronicamente com a Certificação Digital. Depois de assinado pelas partes, o arquivo ECD – que nada mais é do que o Livro Diário em papel, na forma eletrônica – será enviado juntamente com o requerimento de registro na junta comercial ao Ambiente Nacional do SPED, gerenciado pela RFB. Paralelamente, a empresa recolhe os emolumentos para registro da ECD nas juntas comerciais. Por meio de um link dedicado ou um aplicativo Web entre o SPED e as juntas comerciais será feito o controle de registro dos livros diários, isto é, da ECD. As juntas comerciais acessam os dados da ECD (antigo Livro Diário) e o seu conteúdo para constatar se as formalidades legais foram cumpridas (são elas: termo de abertura, termo de encerramento, assinatura do representante legal e do contabilista). Depois de validado pela junta comercial, será atribuído o número de registro do Livro, que será acessado via Web pelo empresário interessado. Pronto! O Livro Diário Eletrônico ou a ECD está registrado(a) e armazenado(a) no Ambiente Nacional SPED para que as autoridades – como a Receita Federal, Previdência Social, Secretarias da Fazenda, Secretarias Municipais de Finanças, Ministério do Trabalho e Banco Central do Brasil – acessem, a partir de um procedimento fiscal determinado na legislação. Portanto, ao invés da fiscalização emitir a intimação para a empresa apresentar os Livros Diários em papel, a intimação será apenas para informar que o livro diário ou a ECD, daquele ano calendário será acessado junto ao Ambiente Nacional SPED, dentro do previsto na legislação, respeitando o sigilo fiscal.

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Fiscal Digital O SPED Fiscal - EFD foi instituído através do Convênio ICMS 143, de 15/12/2006, estabelecendo a sua obrigatoriedade, e aprova o Manual de Orientação do Leiaute para geração de arquivos. Os arquivos de texto gerados pelos contribuintes, relativos aos livros fiscais de entradas, de saídas, apuração do ICMS, IPI e Inventário, obedecendo a um leiaute unificado, serão importados e validados através de um aplicativo fornecido pelo SPED-EFD (aplicativo multiplataforma, independente do sistema operacional por ora chamado de PVA-EFD - Programa Validador e Assinador da Escrituração Fiscal Digital). Da mesma forma que o SPED Contábil, o validador deverá ser único (padronizado), contendo as mesmas regras em âmbito nacional, o que não impedirá que os fiscos façam outras verificações posteriores para auditoria ou até exigir a substituição das escriturações. A Escrituração Fiscal Digital será de uso obrigatório para os contribuintes do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS ou do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, a partir de janeiro de 2009. O contribuinte poderá ser dispensado da obrigação estabelecida, desde que a dispensa seja autorizada pelo fisco da unidade federada do contribuinte e pela Secretaria da Receita Federal. A Legislação do Simples Nacional excetua os contribuintes enquadrados nesse regime da entrega da EFD. Após a validação por meio do programa PVA-EFD em fase de publicação, os arquivos serão assinados pelo re-


presentante legal de pessoa jurídica ou do seu procurador, com a Certificação Digital e-PJ ou e-CNPJ, e em seguida serão enviados para o SPED ambiente nacional. Quando o sistema entrar em prática, significará o fi m dos livros fiscais do ICMS e IPI em papel.

III - Nota Fiscal Eletrônica - NF-e O projeto que mais evoluiu no SPED foi o da Nota Fiscal Eletrônica, que está funcionando desde novembro de 2006. Trata-se de um modelo nacional de nota fiscal eletrônica que serve para transporte - de mercadorias, por meio de um sistema integrado entre as empresas e os fiscos estaduais e federais. No momento em que este artigo estava sendo escrito, os Estados da BA, ES, GO, MA, MS, MG, SC, RS, SP e SE já haviam emitido 3.2 milhões de notas fiscais eletrônicas. Há uma confusão generalizada sobre a Nota Fiscal Eletrônica do SPED, pois a NF-e vinculada ao SPED é apenas a Nota Fiscal de circulação de mercadorias, independente das Notas Fiscais Eletrônicas de Serviços da Prefeitura de São Paulo e da Nota Fiscal Paulista. Para maiores detalhes sobre esse projeto, vocês podem acessar o Portal da Nota Fiscal Eletrônica, no endereço www.nfe.fazenda.org.br As autoridades tributárias estão firmando acordos para integrar em breve as informações das NF-e de Serviços e o SPED NF-e. Os contadores terão que abandonar os seus sistemas de escrituração fiscal e contábil e serão obrigados a utilizar o SPED, ou esses sistemas terão que passar a exportar um arquivo padrão para ser validado pelo SPED? Os sistemas de escrituração tanto fiscal como contábil continuam os mesmos, mas ao invés de imprimir os arquivos eletrônicos nos papéis (livros fiscais e contábeis) esses arquivos serão exportados, num leiaute definido pela regulamentação, para os programas validadores ECD e EFD. Feita a importação pelos programas, após assinado com os e-CPFs dos responsáveis, serão enviados para o ambiente SPED.

Paweł Zawistowski

Com o SPED, os livros contábeis e fiscais passarão a ser eletrônicos? Como será o processo de autenticação desses livros pelas juntas comerciais e pelos registros civis de pessoas jurídicas? A regulamentação da IN sobre o SPED Contábil está bem clara quanto ao registro nas juntas comerciais. Já quanto aos livros gerados pelo SPED Fiscal, não há mais motivos para o registro nas juntas comerciais, pois a assinatura digital, a validação e envio para o ambiente SPED, substituem essa exigência, a qual já foi abolida por muito Estados. Como está o interesse pela nova tecnologia? Há aceitação em massa ou algumas empresas ainda se mostram resistentes e por quê? Para as grandes empresas, que dispõem de departamentos de tecnologia de ponta ou têm recursos suficientes para contratar os grandes especialistas em software, creio que haverá um ganho expressivo no controle dos processos fiscais e contábeis, além de agilidade no trânsito das mercadorias (Nota Fiscal Eletrônica). Prova disto é que várias empresas querem aderir ao programa de notas fiscais eletrônicas estaduais (ICMS) e estão na fila aguardando a autorização, pois o SPED Nota Fiscal Eletrônica é um sucesso para as empresas da fase piloto. Para as pequenas e microempresas, que representam a grande maioria dos contribuintes, creio que será um trabalho de transição mais lento, visto que além das dificulda-

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des financeiras para investir em equipamentos e sistemas modernos, demandará um tempo para capacitação dos usuários dos sistemas. Exemplo real ocorre com o Emissor de Cupom Fiscal, em que os arquivos do pequeno comerciante não conseguem integrar com a escrituração contábil para atender a 100% das exigências do Sintegra. Que benefícios imediatos sentirão os empresários contábeis com o uso dessa nova tecnologia? Podemos dizer que o benefício será a adaptação imediata a um novo processo de desmaterialização dos livros contábeis e fiscais, eliminando gastos com impressão e ocupação de espaços para armazenar os livros. Os empresários, queiram ou não, deverão rever todos os processos de informática nas suas empresas, pois desde já os arquivos eletrônicos deverão ser mantidos dentro de servidores internos ou externos (data centers), com banco de dados atualizados para atender à nova demanda digital do governo eletrônico. Finalmente, esperam-se benefícios decorrentes da agilização dos processos, de maior segurança na circulação das informações e, acima de tudo, a grande expectativa

quanto à desburocratização nas relações do contribuinte com o Fisco. Com a Entrada em Vigor do SPED, como fica a IN 86/2001 da SRF, o Manad da Previdência Social e o Sintegra nos Estados? Em breve o Sintegra será substituído pelo SPED Fiscal, pois segundo o Convênio ICMS 143 na cláusula terceira, parágrafo 2º, o contribuinte obrigado à entrega da EFD, a critério da Unidade Federada, ficará dispensado das obrigações de entrega dos arquivos estabelecidos pelo Convênio ICMS 57/95. Quanto à IN 86/2001, a IN 787/2007 no seu art. 6º reza que a apresentação dos livros digitais (ECD) supre, em relação aos arquivos correspondentes, a exigência contida na IN nº 86/2001 e na Instrução Normativa MPS/SRP nº 12, de 20 de junho de 2006. Quanto ao Manad, que trata de folha de pagamento e de lançamentos contábeis, todas as informações contábeis que já foram entregues pela ECD, no meu entendimento, não serão exigidas pela Previdência Social; porém, não houve um pronunciamento legal pelas autoridades tributárias da Previdência Social a respeito do assunto. Ronnie Bergeron

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A Organização Mundial do Comércio e o Sistema Geral de Preferências – Aspectos Tarifários Cácia Pimentel 1

A organização mundial do comércio

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o decorrer do século XX, alguns países em desenvolvimento, como a Coréia do Sul, escolheram um caminho de rápida industrialização exógena, por meio do investimento tecnológico e mão-de-obra especializada. Outros, como o Brasil – adotando o programa de Substituição de Importações, que não fomentava vínculos comerciais com atores externos – mantiveram-se principalmente na rota da baixa-rentabilidade da exportação agrícola (FURTADO, 2006, p. 274-285). No entanto, a vulnerabilidade de se apoiar na agricultura como principal fonte de recursos contrasta fortemente com a riqueza gerada pela exportação de produtos de alta concentração tecnológica, que permitem à população níveis mais altos de conforto (GUIMARÃES, 1999, p. 52). Nessa lógica é que a Organização Mundial do Comércio (OMC) foi lançada em 1994 pela conhecida Rodada do Uruguai, em substituição à Organização GATT. A proposta deste breve estudo é a de, após uma ligeira introdução à OMC, oferecer algumas constatações tarifárias sobre o Sistema Geral de Preferências. Ao final, o estudo apresenta

algumas considerações prospectivas sobre o cenário internacional, especialmente a Rodada de Doha. A constituição da OMC repousa, em síntese, sobre a intenção de ajudar os governos a consolidarem políticas de expansão econômica baseadas em mercados competitivos, concedendo a países em desenvolvimento um tratamento preferencial para compensar o fosso existente entre os países industrializados e os países de economia baseada na agricultura. A OMC conta hoje com 153 membros e apóia-se em um conjunto de regras chamadas GATT 1994. A principal delas, subsidiada na reciprocidade e não-discriminação, é o Princípio da Nação Mais Favorecida (artigo I). Essa regra impõe que uma liberalização de mercado acordada entre duas nações deve ser estendida a todos os demais Estados-membros2. As normas do GATT visam fortalecer as exportações dos países menos desenvolvidos e em desenvolvimento, por meio de regras antidumping e medidas compensatórias e de salvaguardas. Tome-se como exemplo o artigo XVIII do GATT, que permite aos países em estágio inicial de desenvolvimento a adoção de medidas restritivas de im-

1. A autora é graduada em Direito pela Universidade de Brasília e Master of Laws (LL.M.) pela Cornell University Law School, New York; pós-graduada pela FGV-DF em Direito Econômico e das Empresas; Pesquisadora na Cornell University desde junho/2007, nas áreas de Comércio Internacional e Arbitragem. Email: ccp25@cornell.edu 2. Para mais informações sobre a OMC, ver http://www.wto.org/

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portação, exceção que claramente auxilia no desenvolvimento de um seguimento industrial. Aliás, um importante objetivo da OMC é justamente o de melhorar a aplicação das regras do GATT em setores como o agrícola e o têxtil, que são áreas de maior interesse aos países de baixa renda. Esse é um modelo de assistência reconhecido pela Agenda de Doha, na forma de ‘capacity-building’ ou desenvolvimento de capacidades (CHO, 2003, p. 164-165). Outro papel da OMC é o de providenciar normas que conduzam à redução de tarifas sobre mercadorias. Os Estados-membros são encorajados a expressar o comprometimento por meio de um cronograma de redução tarifária, chamada de “Schedule of Commitments”. De acordo com o artigo II do GATT, esse cronograma é mandatório, criando a proibição de se aplicar tarifa mais alta do que a registrada. No entanto, as regras do GATT não proíbem que um Estado-membro aplique tarifa menor do que a prevista no cronograma. Na verdade, os membros da OMC muitas vezes concedem tarifas mais baixas por meio de acordos regionais ou bilaterais, como os previstos no artigo XXIV do GATT ou mediante um tratamento preferencial, como o SGP - Sistema Geral de Preferências.

Sistema geral de preferências O SGP é uma exceção ao princípio da Nação Mais Favorecida, conferido pelos países industrializados aos países em desenvolvimento e às nações menos desenvolvidas. Seu principal objetivo é diminuir ou mesmo eliminar tratamento o discriminatório aos países menos favorecidos. Várias nações industrializadas mantêm programas de SGP. Os beneficiários e produtos variam de acordo com as regras estabelecidas pelo país benfeitor. A Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento – UNCTAD3 assinala que os seguintes países e regiões con-

cedem regime preferencial de SGP: Austrália, Bielorrússia, Bulgária, Canadá, Estônia, União Européia, Japão, Nova Zelândia, Noruega, Rússia, Suíça, Turquia e os Estados Unidos. O Brasil está relacionado como beneficiário por todos esses países, à exceção da Austrália4. Os Estados Unidos acordaram por um programa de SGP em 1970, mediante um tratado assinado sob a égide da UNCTAD. O SGP americano isenta quase cinco mil produtos originários de nações consideradas menos desenvolvidas ou em desenvolvimento.5 Esse programa foi implantado em 1974 para um período de dez anos e vem sendo renovado desde então.6 A legislação do SGP americano autoriza o presidente a conceder acesso ao mercado interno de forma diferenciada ou mesmo sob o regime de isenção para os países designados. Essa escolha segue critérios econômicos e políticos, como ilustra o receio de que os benefícios do SGP americano sobre os produtos brasileiros fossem suspensos em retaliação, até que as leis internacionais de patentes (Acordo TRIPS/OMC) fossem devidamente aplicadas no Brasil (MITCHELL, 2005, p. 62). Os milhares de produtos e os diversos países beneficiários podem ser verificados nas listas de classificação tarifária americana chamada HSTSUS – Harmonized Tariff Schedule of the United States7. Essas listas incluem os produtos manufaturados e semimanufaturados elegíveis ao SGP, bem como alguns itens de agricultura, pesca e produtos primários que de outra forma seriam passíveis de tributação. A classificação dos produtos é baseada no sistema global de nomenclatura (International Harmonized System). Os produtos beneficiados pelo SGP americano somam cerca de US$ 30 bilhões/ano8 e os países que mais comercializam neste programa são Angola (US$ 6,2 bi), Índia (US$ 4,7 bi), Tailândia (US$ 3,8 bi) e Brasil (US$ 3,4 bi, cerca de 13% do total comercializado com aquele país).

3. http://www.unctad.org/en/docs//tdbgspform1_en.pdf (acesso em 01/09/08). 4. http://www.unctad.org/en/docs/itcdtsbmisc62rev2_en.pdf (acesso em 01/09/08) 5. De acordo com o UNCTAD, cerca de 200 países podem ser classificados como em desenvolvimento ou menos desenvolvidos. http://www.unctad.org/en/docs/itcdtsbmisc62rev1_en.pdf (acesso em 01/09/08). 6. Titulo V do Trade Act of 1974, emendado pelo 19 U.S.C. 2461 et seq. 7. http://www.ustr.gov/assets/Trade_Development/Preference_Programs/GSP/asset_upload_file890_8359.pdf (acesso em 01/09/08). http://www.ustr.gov/Document_Library/Press_Releases/2008/June/Bush_Administration_Completes_2007_Annual_Review_of_Generalized_System_of_Preferences_Program.html (acesso em 01/09/08). A legislação autorizativa 19 USC 2461-2467 pode ser acessada via http://www.ustr.gov/assets/Trade_Development/Preference_Programs/GSP/asset_upload_file151_8358.pdf (acesso em 01/09/08). Demais regulamentos e listas SGP USTR 15 CFR Part 2007 no endereço http://www.access.gpo.gov/nara/cfr/waisidx_05/15cfr2007_05.html (acesso em 01/09/08). As normas de alfândega 19 CFR Part 10.171-10.178 e orientações e formulários para exportadores usando o programa SGP, no endereço http://www.customs.gov ou www. cbp.gov (acesso em 01/09/08). 8. http://dataweb.usitc.gov

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Montagem: Fabrício Martins

Lacunas do sgp é importante registrar que a classificação dos produtos sujeitos a tarifas ou a isenções deve estar em harmonia com o princípio da Nação Mais Favorecida e deve servir tanto para produtos similares, quanto para os Estados-Membros considerados em desenvolvimento. Não obstante essa determinação, persistem as críticas ao SGP, à medida que o sistema tem a sua eficácia comprometida: em primeiro lugar, pela sua natureza unilateral e condicional; e ainda, por seu caráter político, ou seja, sujeito aos termos impostos pelo país donatário (BHALA, 2003, p. 152; CHO, 2003, p. 163). Como ilustração, lembre-se a petição apresentada pelo Brasil perante o antigo GATT. O caso ficou conhecido como “Caso do Café Espanhol”. A Espanha introduziu em seu SGP a distinção entre “café não-torrado tipo arábico suave” e “café não-torrado tipo arábico”, de modo a conceder isenção ao primeiro tipo (beneficiando a Colômbia), ao passo que impunha aos demais tipos de café uma tarifa de 7%, incluindo o café brasileiro. Inconformado, o Brasil assinalou que havia uma negativa do princípio da Nação Mais Favorecida, uma vez que o café brasileiro deveria ser classificado como similar e, portanto, alcançar a benesse. O Painel do antigo GATT acatou as razões do Brasil (SpainTariff Treatment of Unroasted Coffee L/5135, adotado em 11 de junho, 1981 BISD 28S/102).

Essa orientação foi mantida na OMC com uma importante modificação, presente na decisão OMC WT/ DS246. A Índia sustentou serem discriminatórios os benefícios adicionais concedidos pela União Européia em seu programa SGP apenas a países com programa de combate a drogas (Ex. Colômbia). Em linhas gerais, o Órgão de Apelação efetivou o entendimento de que tratamento idêntico deve ser disponibilizado para todos os beneficiários de SGP, desde que disponham de necessidades similares de desenvolvimento, financeiras e de comércio (interpretação da Enabling Clause/ Footnote 3). Note-se que a controvérsia foi solucionada em favor da Índia, tão-somente por não ter a União Européia apresentado fundamentos suficientes para autorizar a discriminação9. Quer isso dizer que a OMC sinaliza, de forma singular, com a possibilidade de no futuro autorizar preferências adicionais e discriminatórias a países em desenvolvimento considerados com necessidades distintas. Caberá à comunidade internacional observar a desenvoltura da OMC em afastar a subjetividade inerente a esse tipo de avaliação, qual seja, a de identificar as necessidades distintas a justificar um tratamento preferencial e exclusivo.

9. WTO Analytical Index: Guide to WTO Law and Practice, 2007, p. 120-121.

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Cenário atual A Agenda de Doha divide-se hoje em dois grandes subconjuntos: o NAMA (Acesso ao Mercado Não-Agrícola)10 e as negociações agrícolas. Apesar da ausência de avença quanto ao pacote NAMA, há convergências pontuais entre os países do chamado G-7 (Austrália, Brasil, China, União Européia, Índia, Japão e Estados Unidos). Mantendo-se a linha panorâmica do presente trabalho, o pacote NAMA consiste na adoção de uma fórmula de redução tarifária dos produtos não-agrícolas, com coeficientes diferenciados para países desenvolvidos e em desenvolvimento11. Paralelamente às negociações agrícolas da Agenda de Doha, têm-se concentrado esforços para a adoção do Mecanismo Especial de Salvaguardas (SSM), com aguerridas disputas entre os Estados-Membros do G-7. Esse mecanismo poderá permitir aos países em desenvolvimento um aumento tarifário temporário em caso de prejudicial demanda por importações. O impasse reside no SSM admitir um aumento tarifário acima dos níveis previstos no Cronograma pré-Doha (Schedule of Commitments)12.

Montagem: Fabrício Martins

Em síntese, o peso político e os termos condicionais impostos pelo país anfitrião do sistema SGP são condições que influenciaram os países em desenvolvimento em insistir por regras mais efetivas e menos assimétricas na OMC, ou seja, normas que gerem benefícios reais e perenes, preservem suas vantagens comparativas e diminuam a sujeição a tratamentos preferenciais unilaterais. Espera-se que o presente trabalho estimule a produção de análises mais aprofundadas desses mecanismos internacionais e suas distorções, pois a absorção desses conceitos se torna cada vez mais importante para a consolidação do Brasil no núcleo da dinâmica econômica mundial.

Referências BHALA, Raj. Trade, Development and Social Justice. Carolina Academic Press, Durham, North Carolina, 2003. BHALA, Raj. International Trade Law. Michie Law Publishers, Charlottesville, Virginia, 1996. CHO, Sungjoon. Free Markets and Social Regulation: A Reform Agenda of the Global Trading System, Kluwer Law International, 2003.

INGCO, Merlinda; NASH, John. Agriculture and the WTO – Creating a Trading System for Development. World Bank and Oxford University Press, 2004. MITCHELL, Andrew. Challenges and Prospects for the WTO. Cameron May, 2005. VERMULST, Edwin & GRAAFSMA, Folkert. WTO Disputes Anti-Dumping, Subsidies and Safeguards. Cameron May, 2002.

FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. Companhia das Letras, 2006.

PALMETER, David & MAVROIDIS, Petros. Dispute Settlement in the World Trade Organization. Cambridge, Second Edition.

GALLAGHER, Peter. Guide to the WTO and Developing Countries. Kluwer Law International, World Trade Organization, 2000.

WEISS, Friedl. Improving WTO Dispute Settlement Procedures. Cameron May, 2000.

GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos Anos de Periferia. Contraponto, 1999.

WTO. Analytical Index: Guide to WTO Law and Practice, Cambridge University Press, 2007.

10. Disponível em: http://www.wto.org/english/tratop_e/markacc_e/markacc_chair_texts07_e.htm (último acesso em 05/09/2008) 11. Esses percentuais e tabelas tarifarias podem ser encontrados em http://www.wto.org/english/tratop_e/agric_e/guide_agric_safeg_e.htm (Acesso em 05 de setembro de 2008). 12. Disponível em: http://www.wto.org/english/tratop_e/agric_e/agchairtxt_july08_e.doc (Acesso em 05 de setembro de 2008).

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Divulgação

Fiscus, ascensão e declínio Por Foch Simão Júnior 1

N

o período republicano da História Romana, o Estado era designado pelo termo Aerarium e estava sob o controle do Senado, desta forma, este era visto como uma entidade detentora das propriedades públicas, as quais eram mantidas com receitas obtidas a partir da coleta de tributos. Com o estabelecimento do poder imperial, houve a divisão das províncias e do poder entre o Senado Romano – representante da velha ordem republicana – e César, havendo consequentemente a divisão dos mais importantes ramos das receitas públicas e dos gastos correspondentes. As propriedades e receitas sob o controle do Senado permaneceram com o nome de Aerarium, e aquelas sob o controle de César receberam o nome de fiscus. As propriedades e as receitas privadas exclusivas de César (res privata Principis, ratio Cesaris) tinham certa diferenciação do que se denominava Fiscus. A palavra Fiscus deriva da denominação dada à cesta de vime. Além do pão, os romanos tinham o costume de ocasionalmente carregar dinheiro em moedas, quando o montante era de larga soma. Com a popularização desse procedimento, os coletores de impostos romanos adotaram-no em seu serviço de coleta de tributos. Mais tar-

de, essa denominação expandiu-se para a instituição coletora e para qualquer agente do tesouro público. Com a concentração do poder imperial através do tempo, a importância do Fiscus aumentou, de forma que abarcou não só o erário público, Aerarium, como também as propriedades privadas de César, e a palavra Fiscus firmou-se, sem nenhum adjunto, como sendo o Tesouro Imperial. Enquanto durou a distinção entre o Aerarium e Fiscus houve certa distinção entre a legislação relativa a cada instituição, jus populi e jus fisci, revelando a diferença de origem das instituições. A primeira controlada pelo Senado Romano, representava o povo e a outra, controlada por César, representando o Estado Imperial. O Fiscus tinha sua existência legal e personalidade jurídica calcadas em legislação própria a qual não contemplava nenhuma restrição perante as demais legislações, ou seja, tinha o condão de ser uma legislação superior às aplicadas ao povo, Populus, assim como aos Municípios, Municipium, como fontes do Direito Coletivo. A administração da instituição Fiscus comportava várias carreiras: Procuratores, Advocati, Patroni, e Praefecti.

1 Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil (aposentado). Sócio (titular) do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal, e (correspondente) do Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba e do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

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A estrutura logística e funcional do fiscus era de uma soberba sofisticação legal, de forma a torná-lo eficiente em grande parte da História Durante o período imperial de Nerva foi criado o cargo de Praetor Fiscalis, que tinha a incumbência de administrar as leis tributárias, e era de fato a instituição do juizado tributário. Em geral, as propriedades administradas pelo Fiscus eram terras devolutas ou estabelecimentos públicos que geravam algum tipo de renda. Porém, havia outras propriedades, originalmente de caráter privado, que passavam ao domínio público por meio de seqüestro, tendo como causa alguma infração penal. Dessa forma, se algum cidadão fosse levado a cometer suicídio em conseqüência de infração à legislação criminal – ato definido legalmente como flagitium – ou em caso de ação de contrafação de moeda, suas propriedades eram sujeitas ao confisco por parte do Fiscus. Alcançava também o quinhão oficial qualquer tesouro que fosse encontrado nas terras do Império. Mesmo os botins, fruto das conquistas militares dos soldados de Roma, não escapavam à administração tributária, sendo taxados em dez por cento do seu valor. A estrutura logística e funcional do Fiscus era de uma soberba sofisticação legal, de forma a torná-lo eficiente em grande parte da História do Império. Os agentes do Fiscus, em sua ação institucional, valiam-se de informações fornecidas pelos indivíduos sobre a possível ocorrência de fraudes fiscais em troca de recompensas. Esse instituto da delação premiada era conhecido como nunciationes, dando ao Fiscus uma vantagem estratégica em seu campo de ação, que envolvia todo Império Romano. A decadência do Império Romano inicia-se com as reformas de Diocleciano, centralizando a administração e aumentando a burocracia estatal sem o aperfeiçoamento das instituições, atribuindo aos senhores de terras e aos apaniguados políticos o controle de órgãos de Estado em várias províncias, o que elevou sobremaneira os gastos públicos. Essas reformas coincidem com

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o desmantelamento da máquina fiscal romana, quando várias operações da alçada do Fiscus são repassadas a terceiros em uma tentativa desesperada e politiqueira de garantir o aumento do recolhimento de tributos, notadamente por atribuir aos grandes latifundiários regionais o encargo da coleta de tributos em natura e a sua conversão em pecúnia. Dessa atividade oficial, por parte dos senhores de fazenda privada, adveio a designação de fazenda pública até hoje utilizada para denominar a administração tributária estatal. Com o esgotamento dos meios de produção necessários para fazer a economia funcionar, visando ao atendimento das necessidades mínimas de consumo da sociedade romana e atender às despesas públicas pelo pagamento dos impostos, o Estado tornou-se cada vez mais intervencionista, restringindo drasticamente a liberdade de todos, tornando a terra e o escravo indissociáveis; os pequenos proprietários tiveram sua liberdade restringida ao ficarem proibidos de deixar a sua aldeia; os artesãos foram reunidos em corporações (collegia), tornando-se obrigatório ao filho seguir a profissão do pai, criando-se um regime característico de castas em que, assim como os comerciantes, ficaram presos à sua atividade e impedidos de se transferirem para o campo. O aumento da despesa pública somada à decadência e à ineficiência das instituições do Império, a perda do sentimento cívico dos cidadãos e a concentração de riquezas nas mãos da classe dirigente, permeada pela ação corrupta de seus membros, terminaram por inviabilizar a manutenção do Estado na sua forma original, dando início a um círculo vicioso em uma economia arruinada e decadente. Em longo prazo, a reorganização do Império em bases materiais tão debilitadas não poderia ter outro resultado senão o de enfraquecer o próprio Estado, tornando-o cada vez mais vulnerável aos ataques externos.

Referências ADAMS, Charles. For good and evil. Madison Books: Lanham, MD,1999. GALBRAITH, John Kenneth. Moeda: De onde veio, para onde foi. Ed Pioneira: São Paulo, 1997. GIBBON, Edward. Declínio e queda do império romano. Companhia das Letras, 2005.


Arrecadação das Receitas Federais Janeiro a agosto – 2008/2007 (preços correntes) UNIDADE: R$ MILHÕES

RECEITAS

2008

2007

VAR. (%)

PARTICIPAÇÃO (%)

[A]

[B]

[A]/[B]

2008

IMPOSTO SOBRE IMPORTAÇÃO

10.292

7.725

33,23

2,32

2007 2,02

I.P.I-TOTAL

25.285

20.722

22,02

5,7

5,43

I.P.I-FUMO

2.126

1.648

28,96

0,48

0,43

I.P.I-BEBIDAS

1.690

1.599

5,7

0,38

0,42

I.P.I-AUTOMÓVEIS

4.026

3.159

27,45

0,91

0,83

I.P.I-VINCULADO À IMPORTAÇÃO

6.116

4.803

27,34

1,38

1,26

I.P.I-OUTROS

11.326

9.513

19,06

2,55

2,49

IMPOSTO SOBRE A RENDA-TOTAL

126.800

102.259

24

28,59

26,8

I.RENDA-PESSOA FÍSICA

10.642

9.232

15,27

2,4

2,42

I.RENDA-PESSOA JURÍDICA

59.938

46.007

30,28

13,51

12,06

ENTIDADES FINANCEIRAS

10.438

8.987

16,14

2,35

2,36

DEMAIS EMPRESAS

49.500

37.019

33,71

11,16

9,7

I.RENDA-RETIDO NA FONTE

56.221

47.021

19,57

12,67

12,32

I.R.R.F-RENDIMENTOS DO TRABALHO

32.882

26.285

25,1

7,41

6,89

I.R.R.F-RENDIMENTOS DE CAPITAL

14.195

12.755

11,29

3,2

3,34

I.R.R.F-RENDIMENTOS DE RESIDENTES NO EXTERIOR

5.382

4.786

12,47

1,21

1,25

I.R.R.F-OUTROS RENDIMENTOS

3.761

3.195

17,71

0,85

0,84

IOF - I. S/ OPERAÇÕES FINANCEIRAS

13.219

4.979

165,48

2,98

1,31

85

72

18,25

0,02

0,02

CPMF - CONTRIB. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA

1.104

23.523

-95,31

0,25

6,17

COFINS - CONTRIB. P/ A SEGURIDADE SOCIAL

78.431

65.353

20,01

17,68

17,13

ITR - I. TERRITORIAL RURAL

ENTIDADES FINANCEIRAS

3.940

3.544

11,16

0,89

0,93

DEMAIS EMPRESAS

74.492

61.809

20,52

16,79

16,2

CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP

20.491

17.191

19,2

4,62

4,51

789

704

12,06

0,18

0,18

DEMAIS EMPRESAS

19.702

16.486

19,5

4,44

4,32

ENTIDADES FINANCEIRAS

CSLL - CONTRIB. SOCIAL S/ LUCRO LÍQUIDO

30.437

22.522

35,14

6,86

5,9

ENTIDADES FINANCEIRAS

4.366

3.224

35,44

0,98

0,84

DEMAIS EMPRESAS

26.071

19.298

35,09

5,88

5,06

CIDE-COMBUSTÍVEIS

4.358

5.214

-16,42

0,98

1,37

159

237

-33,06

0,04

0,06

4.092

4.850

-15,63

0,92

1,27

SUBTOTAL [A]

314.754

274.648

14,6

70,96

71,99

RECEITA PREVIDENCIÁRIA [B]

111.681

94.963

17,6

25,18

24,89

PRÓPRIA

100.382

86.094

16,6

22,63

22,57

DEMAIS

11.299

8.869

27,4

2,55

2,32

RECEITA ADMINISTRADA PELA RFB [C]=[A]+[B]

426.434

369.611

15,37

96,14

96,88

CONTRIBUIÇÃO PARA O FUNDAF OUTRAS RECEITAS ADMINISTRADAS

DEMAIS RECEITAS [D]

17.128

11.900

43,93

3,86

3,12

TOTAL GERAL DAS RECEITAS [E]=[C]+[D]

443.562

81.512

16,26

100

100

T ributaç ã o em revis ta

57


Arrecadação das Receitas Federais Janeiro a agosto – 2008/2007 (a preços de agosto/08 - IPCA) UNIDADE: R$ MILHÕES 2008

2007

VAR. (%)

[A]

[B]

[A]/[B]

2008

2007

IMPOSTO SOBRE IMPORTAÇÃO

10.480

8.292

26,39

2,32

2,02

RECEITAS

PARTICIPAÇÃO (%)

I.P.I-TOTAL

25.749

22.243

15,76

5,7

5,43

I.P.I-FUMO

2.166

1.770

22,37

0,48

0,43

I.P.I-BEBIDAS

1.724

1.719

0,28

0,38

0,42

I.P.I-AUTOMÓVEIS

4.099

3.389

20,95

0,91

0,83

I.P.I-VINCULADO À IMPORTAÇÃO

6.226

5.154

20,79

1,38

1,26

I.P.I-OUTROS

11.535

10.211

12,96

2,55

2,49

IMPOSTO SOBRE A RENDA-TOTAL

129.281

109.812

17,73

28,6

26,81

I.RENDA-PESSOA FÍSICA

10.828

9.900

9,37

2,4

2,42

I.RENDA-PESSOA JURÍDICA

61.153

49.435

23,7

13,53

12,07

ENTIDADES FINANCEIRAS

10.691

9.655

10,73

2,37

2,36

DEMAIS EMPRESAS

50.462

39.779

26,86

11,16

9,71

I.RENDA-RETIDO NA FONTE

57.299

50.477

13,52

12,68

12,32

I.R.R.F-RENDIMENTOS DO TRABALHO

33.534

28.220

18,83

7,42

6,89

I.R.R.F-RENDIMENTOS DE CAPITAL

14.439

13.689

5,48

3,19

3,34

I.R.R.F-RENDIMENTOS DE RESIDENTES NO EXTERIOR

5.494

5.138

6,94

1,22

1,25

I.R.R.F-OUTROS RENDIMENTOS

3.831

3.430

11,71

0,85

0,84

IOF - I. S/ OPERAÇÕES FINANCEIRAS

13.455

5.345

151,72

2,98

1,3 0,02

87

77

12,22

0,02

CPMF - CONTRIB. MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA

ITR - I. TERRITORIAL RURAL

1.143

25.256

-95,48

0,25

6,17

COFINS - CONTRIB. P/ A SEGURIDADE SOCIAL

79.893

70.168

13,86

17,68

17,13

ENTIDADES FINANCEIRAS

4.016

3.805

5,54

0,89

0,93

DEMAIS EMPRESAS

75.877

66.363

14,34

16,79

16,2

CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS/PASEP

20.876

18.460

13,09

4,62

4,51

804

756

6,34

0,18

0,18

ENTIDADES FINANCEIRAS DEMAIS EMPRESAS

20.071

17.704

13,37

4,44

4,32

CSLL - CONTRIB. SOCIAL S/ LUCRO LÍQUIDO

31.023

24.197

28,21

6,86

5,91

ENTIDADES FINANCEIRAS

4.466

3.465

28,89

0,99

0,85

DEMAIS EMPRESAS

26.558

20.732

28,1

5,88

5,06

CIDE-COMBUSTÍVEIS

4.455

5.599

-20,44

0,99

1,37

162

255

-36,42

0,04

0,06

CONTRIBUIÇÃO PARA O FUNDAF OUTRAS RECEITAS ADMINISTRADAS

4.167

5.206

-19,96

0,92

1,27

SUBTOTAL [A]

320.769

294.909

8,77

70,97

71,99

RECEITA PREVIDENCIÁRIA [B]

113.765

101.950

11,59

25,17

24,89

PRÓPRIA

102.237

92.425

10,62

22,62

22,56

DEMAIS

11.528

9.526

21,02

2,55

2,33

RECEITA ADMINISTRADA PELA RFB [C]=[A]+[B]

434.534

396.860

9,49

96,14

96,88

DEMAIS RECEITAS [D]

17.441

12.791

36,35

3,86

3,12

TOTAL GERAL DAS RECEITAS [E]=[C]+[D]

451.975

409.651

10,33

100

100

Fonte: SRFB, Análise da Arrecadação das Receitas Federais, Agosto 2008

58

T ributação e m re v i s t a


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