Tributação em Revista 58

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ributação T EM REVISTA

Ano 17

N° 58 Jan–Mar 11

Distribuição Dirigida

Uma publicação do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil – Sindifisco Nacional

ISSN 1809-3426

Entrevistas

ADUANA fator de soberania nacional

Fausto Coutinho - A RFB e a Aduana Páginas 6 a 13

Marcos Valadão - A RFB e o Comércio Exterior Páginas 14 a 20

Vito Tanzi - Tributação e Crise Econômica Páginas 34 a 37


Política de Distribuição - Tributação em Revista é uma publicação periódica do Sindifisco Nacional - Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil. A revista tem acesso livre e é divulgada eletronicamente no endereço http://www.sindifisconacional.org.br, no link publicações. Havendo interesse em receber um exemplar da publicação, entre em contato conosco pelo email: estudostecnicos@sindifisconacional.org.br. Política Editorial - Tributação em Revista é um veículo de divulgação de ideias que explora temas tributários com ênfase em Economia e Direito Tributário; Política e Administração Tributária, Previdenciária e Aduaneira. Constitui-se num campo democrático aberto a discussão e a colaborações. Os artigos aqui divulgados são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião da entidade. Os autores interessados em publicar suas reflexões neste espaço devem remeter seus artigos para editor.revista@sindifisconacional.org.br. Os artigos devem ser inéditos e estruturados segundo as normas técnicas da ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas.


sumário 5 6 14

EDITORIAL

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ARTIGO

ENTREVISTA

Fausto Vieira Coutinho ENTREVISTA

Marcos Aurélio Pereira Valadão

A Guerra Comercial Foch Simão Jr.

ARTIGO

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A Aduana e o Combate a Lavagem de Dinheiro em Operações de Comércio Internacional

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ENTREVISTA

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ARTIGO

45 53 59 61

Gerson José Morgado de Castro

Vito Tanzi

Introdução do Operador Econômico Autorizado no Sistema Aduaneiro Brasileiro Antonio Cesar Bueno Ferreira e Jorge Alberto Teixeira

ARTIGO

A Fiscalização nas Zonas de Processamento da Exportação (ZPE) da Aduana Brasileira: novas obrigações tributárias acessórias Albino Carlos Martins Vieira

ARTIGO

Valoração Aduaneira e Legitimidade das Transações Foch Simão Jr.

ARTIGO

Centro Regional Conjunto de Capacitação Aduaneira em Brasília: Aperfeiçoando e Fortalecendo as Administrações Aduaneiras Patricia Prisco Paraiso Barreto de Andrade

QUESTÕES POLÊMICAS EM DIREITO TRIBUTÁRIO

Tribunal Regional Federal da Terceira Região modifica seu posicionamento a respeito da aplicabilidade do art. 12, § 11, da IN 243, de 2002


Tributação em Revista é uma publicação do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita !"#"$%&'#(')$%*+&','-+.#+/*0('1%0+(.%&2

DIRETORIA EXECUTIVA NACIONAL (DEN) Presidente Pedro Delarue Tolentino Filho 1º Vice-Presidente Lupércio Machado Montenegro 2º Vice-Presidente Sergio Aurélio Velozo Diniz Secretário-Geral Claudio Marcio Oliveira Damasceno Diretor-Secretário Mauricio Gomes Zamboni Diretor de Finanças Gilberto Magalhães De Carvalho Diretor-Adjunto de Finanças Agnaldo Neri Diretora de Administração Ivone Marques Monte Diretor-Adjunto de Administração Eduardo Tanaka Diretor de Assuntos Jurídicos Sebastião Braz da Cunha Dos Reis 1º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos Wagner Teixeira Vaz 2º Diretor-Adjunto de Assuntos Jurídicos Luiz Henrique Behrens Franca Diretor de Defesa Profissional Gelson Myskovsky Santos 1ª Diretora-Adjunta de Defesa Profissional Maria Cândida Capozzoli de Carvalho

2º Diretor-Adjunto de Defesa Profissional Dagoberto da Silva Lemos Diretor de Estudos Técnicos Luiz Antonio Benedito Diretora-Adjunta de Estudos Técnicos Elizabeth de Jesus Maria Diretor de Comunicação Social Kurt Theodor Krause 1ª Diretora-Adjunta de Comunicação Social Cristina Barreto Taveira 2º Diretor-Adjunto de Comunicação Social Rafael Pillar Junior Diretora de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões Clotilde Guimarães Diretora-Adjunta de Assuntos de Aposentadoria, Proventos e Pensões Aparecida Bernadete Donadon Faria Diretor do Plano de Saúde Carlos Antonio Lucena Diretor-Adjunto do Plano de Saúde Jesus Luiz Brandão Diretor de Assuntos Parlamentares João Da Silva dos Santos Diretor-Adjunto de Assuntos Parlamentares Geraldo Marcio Secundino Diretor de Relações Intersindicais Carlos Eduardo Barcellos Dieguez

Diretor-Adjunto de Relações Intersindicais Luiz Gonçalves Bomtempo Diretor de Relações Internacionais João Cunha da Silva Diretora de Defesa da Justiça Fiscal e da Seguridade Social Maria Amália Polotto Alves Diretor-Adjunto de Defesa da Justiça Fiscal e da Seguridade Social Rogério Said Calil Diretor de Políticas Sociais e Assuntos Especiais José Devanir De Oliveira Diretores-Suplentes Eduardo Artur Neves Moreira Kleber Cabral Conselho Fiscal Membros Titulares Ricardo Skaf Abdala Jose Benedito de Meira Maria Antonieta Figueiredo Rodrigues Membros Suplentes Iran Carlos Toneli Lima Norberto Antunes Sampaio José Yassuo Hashimoto

Tributação EM REVISTA

Conselho Editorial Lupércio Machado Montenegro, Elizabeth de Jesus Maria; Kurt Theodor Krause; Tarcízio Dinoá Medeiros; João Cunha da Silva; Hélio Socolik, Roberto Barbosa de Castro e Luiz Antonio Benedito.

Projeto Gráfico Erika Yoda

Tiragem desta edição 3.200 mil exemplares

Fotolito e Impressão Kaco Gráfica

Coordenação Executiva Álvaro Luchiezi Jr.

Capa Núcleo Cinco

Produção Editorial Publicação Dirigida. Acesso livre no seguinte endereço eletrônico http://www.sindifisconacional.org.br , link publicações. Para receber um exemplar da publicação, entre em contato pelo email: estudostecnicos@sindifisconacional.org.br

Revisão Ana Carolina Pinheiro da Silva

Diagramação Washington Ribeiro (wrbk.com.br) 4613-DF

Edição Álvaro Luchiezi Jr.

Redação e correspondência SDS, Conjunto Baracat – 1º andar, salas 1 a 11 BrasíliaDF - CEP 70392-900 Fonefax: 61 3218-5255

Colaboração: Os artigos devem ser enviados para Tributação em Revista – Sindifisco Nacional, Departamento de Estudos Técnicos, SDS, Conjunto Baracat, salas 1 a 11, Brasília-DF, CEP 70.392-900 ou para o e-mail estudostecnicos@sindifisconacional.org.br. Os textos serão submetidos ao Conselho Editorial quanto à conveniência de publicá-los, poderão sofrer revisão e, se necessário, serão devolvidos ao autor com sugestões de mudanças ou solicitação de informações. Nenhuma modificação de estrutura ou conteúdo será feita sem consentimento do autor. As matérias publicadas por Tributação em Revista só poderão ser reproduzidas mediante autorização do Sindifisco Nacional. Os originais devem ser apresentados em disquetes, CD-ROM ou enviados por email, em arquivos do Word e Excel (tabelas), corpo 12, até 15 páginas e deverão conter: Página inicial abordando os principais tópicos do artigo; Notas e referências bibliográficas; Currículo do autor (máximo 5 linhas).


e DITORIAL O sentido dicionarizado do termo Aduana, cujo primeiro verbete de referência sinonímica é “alfândega”, geralmente diz respeito à cobrança de taxas por uma repartição pública pela entrada e saída de mercadorias de um estado ou país. Segundo o comando expresso no artigo 237 da Constituição Federal, “A fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, são exercidos pelo Ministério da Fazenda”. Cabe, assim, à Receita Federal do Brasil promover o controle e a fiscalização dos fluxos internacionais de bens e mercadorias. Este comando, necessariamente conciso, mandato, contudo, não encerra em si todo o significado e extensão da atividade aduaneira. Mais do que uma atividade do Estado, de competência constitucional, ela envolve enorme responsabilidade econômica e social. O controle de fluxos comerciais estende-se para além da fiscalização tributária e alcança os efeitos que eles exercem sobre a sociedade. A correta formulação e implementação de políticas aduaneiras contribui para que a política comercial do País seja bem sucedida e sua inserção no comércio internacional se transforme em fator de desenvolvimento econômico. Mas não para aí a missão aduaneira. Como bem o ressalta o artigo “ A Guerra Comercial” de Foch Simão Jr, ela é de “defesa da terra”. Sua localização em pontos estratégicos de entrada no território nacional, torna-a um símbolo da própria soberania da Nação. A diminuição da importância arrecadatória dos tributos aduaneiros, fenômeno mundial, possibilitou que a arrecadação assumisse uma função extrafiscal, de ordem regulatória. As Aduanas passaram a exercer, então, funções não menos importantes do que a arrecadação tributária. Aduanas modernas são órgãos de proteção dos interesses nacionais, de defesa da economia, das riquezas e da sociedade. Neste sentido, o combate ao tráfico, à pirataria e ao

contrabando, presentes no cotidiano do Auditor-Fiscal que atua em áreas aduaneiras, é elemento decisivo na promoção da segurança e na defesa dos interesses nacionais. É toda a sociedade que se beneficia quando estas ações protegem: a indústria nacional, atribuindo ao nosso produto maior competitividade, coibindo o dumping e o subfaturamento; o patrimônio cultural, impedindo o tráfico do acervo cultural e de sítios arqueológicos; a fauna e a flora, combatendo a biopirataria e o tráfico ilegal de animais e plantas; a saúde, evitando a entrada de medicamentos falsos e promovendo o controle de licenciamentos; o trabalho nacional, naqueles setores de importância estratégica e/ou de grande potencial competitivo internacional. Ora, para que esta missão seja cumprida é mister que os serviços aduaneiros sejam priorizados e a Aduana seja dotada dos recursos necessários para tanto. Lamentavelmente, não tem sido este o enfoque. Nossa estrutura alfandegária carece de: equipamentos modernos; maior quantitativo de pessoal frequentemente submetido a ações de capacitação; normas e procedimentos administrativos mais rigorosos e abrangentes; melhoria da cooperação internacional etc., Neste número, Tributação em Revista chama a atenção para a relevância da Aduana Brasileira na promoção da soberania nacional. As entrevistas e os temas dos artigos - lavagem de dinheiro, guerra comercial, procedimentos operacionais na linha azul e fiscalização em Zonas de Processamento de Exportações trazem à reflexão alguns aspectos da questão aduaneira. Antes de pretender esgotar um assunto de tão grande relevância e abrangência, ao mesmo tempo em que prestamos uma homenagem ao valoroso trabalho exercido por Auditores-Fiscais aduaneiros, convidamos nossos leitores à reflexão sobre o tema, na esperança de que políticas a serem implementadas nesta área possam restituir à Aduana seu papel histórico e prepará-las para desempenhar com eficácia o moderno papel que lhe reserva a sociedade.

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e ntrevista Fausto Vieira Coutinho “Várias diretrizes para a RFB para 2011 têm grande relevância para a área aduaneira. Dentre elas, a implementação de uma política permanente de adequação dos quadros funcionais.”

O

Auditor-Fiscal Fausto Vieira Coutinho, economista de formação, exerce com mérito a Subsecretaria de Aduana e Relações Internacionais da Receita Federal do Brasil, pois adquiriu ampla experiência na área aduaneira e de comércio internacional em sua atuação profissional na RFB. Nesta entrevista ele fala a TRIBUTAÇÃO EM REVISTA sobre os planos e diretrizes da RFB para a área aduaneira, cooperação internacional, agilização de processos aduaneiros, combate à interposição fraudulenta, segurança do exercício profissional, capacitação de recursos humanos e precariedade das instalações físicas em áreas de fronteira.

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Tributação em Revista – Indique os resultados recentes mais significativos em termos de desempenho e de fiscalização aduaneira. Como o Sr. relacionaria a questão da capacitação do Auditor-Fiscal com estes resultados. Há espaço para, melhorando e tornando mais freqüente as iniciativas de capacitação, também obter melhorias nestes resultados? Fausto Vieira Coutinho – No ano de 2010, a fiscalização aduaneira apresentou um desempenho melhor que em anos anteriores em vários aspectos. Nossos principais indicadores apontam, por exemplo, para uma melhora no número de fiscalizações pós-despacho realizadas (aumento de 7% em relação a 2009) e na produtividade da fiscalização aduaneira. Além disso, houve um crescimento de 13% em relação a 2009 nos valores lançados por Auditor-Fiscal, o grau de eficácia atingiu o patamar de 87% em 2010 e o tempo médio para conclusão de uma fiscalização foi reduzido. Isso significa que obtivemos resultados positivos nessa área. No despacho aduaneiro também temos indicadores positivos, sendo que o tempo médio dos despachos de importação e exportação foi reduzido em aproximadamente 16 % em 2010, em ambos os casos. Esses resultados estão alinhados com nossos objetivos estratégicos e demonstram que nossa Aduana está executando o controle aduaneiro com segurança e agilidade e, com isso, contribuindo para o fortalecimento do comércio exterior brasileiro. Com relação à questão da capacitação, não tenho a menor dúvida de que uma melhor qualificação dos servidores tem relação direta com os resultados positivos alcançados no nosso trabalho. A esse respeito, quero lembrar que a Organização Mundial de Aduanas, a OMA, escolheu, para comemorar o dia internacional das aduanas, o tema “Conhecimento, um catalisador para a excelência aduaneira”. Nessa mesma linha, o Secretário da RFB, Auditor-Fiscal Carlos Alberto Freitas Barreto, em nota divulgada a todos os servidores da RFB, reconheceu tal fato e destacou que um dos elementos-chave para

“Houve um crescimento de 13% em relação a 2009 nos valores lançados por Auditor-Fiscal, o grau de eficácia atingiu o patamar de 87% em 2010 e o tempo médio para conclusão de uma fiscalização foi reduzido.”

alcançar essa excelência é o desenvolvimento e capacitação de seus servidores. Em 2010, foram realizados diversos treinamentos nacionais, dos quais destaco os treinamentos para utilização do Contágil na área aduaneira, especificamente para melhorar nossa eficiência em gestão de risco, seleção e programação e fiscalização aduaneira, além de treinamentos para utilização de ferramentas de gestão de risco no Siscomex Carga. Assim, entendo que há não apenas espaço, mas uma necessidade de a Administração investir cada vez mais na capacitação de seus servidores. Por fim, quero ainda destacar que conseguimos trazer para o Brasil um Centro Regional de Treinamento da OMA, o qual tem como escopo principal o fortalecimento de capacidades, a chamada “capacity building”, ou seja, a disseminação do conhecimento – não apenas de capacitação – aos servidores que atuam na área aduaneira. É nessa linha que iremos lançar ainda neste mês de março o curso de práticas aduaneiras internacionais. TR – A Aduana Brasileira completou no último dia 28 de Janeiro 203 anos de existência, contados desde a abertura dos portos por D. João VI. O ano de 2011 inicia-se com uma nova administração na Receita Federal do Brasil. Em linhas

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“O mais importante projeto voltado ao aprimoramento da fiscalização aduaneira é a criação de um Centro Nacional de Gestão de Risco Aduaneiro. Essa iniciativa é fundamental para a modernização da nossa Aduana.” gerais, quais são as novas diretrizes e os planos para a modernização da Aduana Brasileira? FC – O Secretário da RFB recentemente apresentou em linhas gerais as diretrizes da Casa para o ano de 2011. Várias delas têm grande relevância para a área aduaneira, como a implementação de uma política permanente de adequação dos quadros funcionais, a intensificação da aplicação de medidas que contribuam para a defesa comercial, o aperfeiçoamento dos mecanismos de gestão de risco visando garantir a agilidade e a segurança do comércio exterior, a intensificação do uso da tecnologia na seleção, programação, acompanhamento e fiscalização de contribuintes e o fortalecimento do uso da inteligência fiscal e de técnicas modernas de fiscalização nas atividades de vigilância e repressão, no combate ao contrabando e descaminho. É seguindo essa linha que a Aduana Brasileira deu início a diversos projetos com o objetivo de se modernizar, preparando-se para enfrentar os desafios que se apresentam no Século XXI. Aproveito esta oportunidade para dar um destaque especial a alguns deles. Em primeiro lugar, chamo a atenção para os projetos voltados ao aprimoramento da fiscalização aduaneira. O mais importante deles é a criação de um Centro Nacional de Gestão de Risco Aduaneiro. Essa iniciativa é fundamental para a modernização da

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nossa Aduana, além de seguir as recomendações do Marco Normativo SAFE da OMA, o qual se baseia na aplicação de quatro elementos básicos: a Transmissão Antecipada de Informações, o Gerenciamento de Riscos, a Inspeção não Invasiva e o Operador Econômico Autorizado, para aprimorar o trabalho da fiscalização aduaneira. Nosso objetivo neste caso é aprimorar nossas ferramentas e técnicas de gestão de risco e assim fortalecer a fiscalização aduaneira no combate às fraudes do comércio exterior e à burla às medidas de defesa comercial. Em complementação, estamos construindo o Sistema de Seleção por Aprendizado de Máquina, o SISAM, que irá aprimorar e modernizar sobremaneira a nossa Seleção Parametrizada do Siscomex. Da mesma forma, queremos concluir o projeto de implementação do Siscomex Carga, nos módulos Aéreo e Terrestre, além de aprimorar o módulo marítimo, que já está em produção. Para complementar, é necessária a adoção de um novo modelo de Operador Econômico Autorizado, ou OEA, em substituição ao Linha Azul. O Centro Nacional certamente nos permitirá maior eficiência, eficácia e efetividade na verificação das operações consideradas de maior risco, sem comprometer a agilidade que o comércio exterior tanto necessita, além de possibilitar um uso mais racional de nossa força de trabalho. Outra iniciativa que merece destaque especial é o aprimoramento das atividades de vigilância e repressão, principalmente nas zonas de fronteira terrestre, no combate ao contrabando, descaminho e tráfico de drogas. Nosso objetivo é o desenvolvimento de projetos que intensifiquem o emprego de inteligência fiscal e de técnicas modernas de fiscalização. Alguns dos projetos vinculados a essa iniciativa são o desenvolvimento do Sistema de Apoio às Atividades de Retenção e Apreensão (SAARA), a criação dos Centros de Cães de Faro na RFB, a Aquisição de Armamentos Institucionais e a utilização de modernos equipamentos no apoio à fiscalização, tais como Leitores Automáticos de Placas (LAP), VANS Scanners e Equipamentos de Radiocomunicação. As-


sim, resumidamente, podemos concluir que as principais diretrizes são: intensificar a fiscalização aduaneira no combate às fraudes do comércio exterior, à burla às medidas de defesa comercial, ao contrabando, descaminho e tráfico de drogas. TR – Quais são as áreas prioritárias (zonas primárias: Portos, Aeroportos e Pontos de fronteira alfandegados, fronteiras terrestres; zonas secundárias: portos secos, fiscalização aduaneira) para a implementação destas novas políticas? FC – Conforme podemos observar dos meus comentários na pergunta anterior, as diretrizes fixadas são abrangentes e permeiam todas as atividades aduaneiras. Assim, entendo que não há área ou áreas prioritárias para implementar as medidas propostas. Como eu mencionei anteriormente, a criação do Centro Nacional de Gestão de Risco irá abranger todas as atividades da fiscalização aduaneira, pois terá reflexos na zona primária, tanto no pré-despacho como no curso do despacho, e, ainda, alcançará os Portos Secos. Da mesma forma, haverá reflexos na zona secundária, nas fiscalizações pós-despacho e no monitoramento dos OEA. Por outro lado, o fortalecimento e aprimoramento das atividades de vigilância e repressão necessitam ações tanto nas zonas de fronteira como nos Portos e Aeroportos, assim como nos grandes centros consumidores. Dessa forma, as diretrizes da RFB para o ano de 2011 na área aduaneira trarão reflexos no nosso quadro funcional, na fiscalização aduaneira de zona primária e secundária, passando pelo aperfeiçoamento dos mecanismos de gestão de risco visando garantir a agilidade e a segurança do comércio exterior e o fortalecimento das atividades de vigilância e repressão, no combate aos ilícitos aduaneiros. TR – Uma forma de tornar o controle aduaneiro mais efetivo é interligando nossos sistemas com os de outros países. Fale sobre a inserção brasileira neste contexto, os avanços registrados e

“A troca de informações é essencial no combate às fraudes aduaneiras. Os Acordos de Assistência Mútua Administrativa em Matéria Aduaneira são um dos principais instrumentos neste sentido.” planos futuros em cooperação aduaneira internacional. FC – A economia brasileira tem-se internacionalizado intensamente nas últimas duas décadas, aumentando o volume de importações e exportações em todas as modalidades, seja carga aérea, terrestre e especialmente via portos. O comércio hoje tende a ser global mesmo para consumidores e comerciantes de pequeno e médio porte. Assim, a inserção internacional é inevitável. Uma aduana moderna tem que estar preparada para isto. Neste sentido, a troca de experiências é fundamental, no jargão do meio é utilizada a expressão inglesa “best practices”, ou melhores práticas em português, ou seja, as experiências de outras aduanas que são comprovadamente eficientes e eficazes e que possam ser adaptadas à nossa realidade devem ser utilizadas por nós. Vários dos projetos citados anteriormente têm como fundamento as melhores práticas internacionais. Além disto, a troca de informações é essencial no combate às fraudes aduaneiras. Um dos principais meios de se obter informações é por meio dos denominados Acordos de Assistência Mútua Administrativa em Matéria Aduaneira, que possibilitam a troca de informações e cooperação mútua. Por outro lado, nós também temos melhores práticas que são utilizadas por outros países. Em relação a acordos desta natureza, o Brasil firmou cerca de nove tratados multi-

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laterais ou bilaterais envolvendo 27 países (incluindo os EUA), mais sete acordos bilaterais em tramitação no Congresso e tem negociado intensamente com nossos principais parceiros comerciais com os quais ainda não temos tratados com este objetivo, como é o caso do Japão e da China. Apenas para citar um exemplo, o acordo com o Japão está em fase final, próximo ao seu encaminhamento para assinatura. O tema de cooperação internacional é de fundamental importância e nossas ações são orientadas com este objetivo. Assim, estamos seguindo no sentido de alavancar parcerias internacionais, fortalecendo o combate aos ilícitos adu-

e de aperfeiçoamento dos mecanismos de gestão de risco, por mim comentadas anteriormente, a proposta permitirá à RFB maior otimização na alocação dos escassos recursos, uma vez que possibilitará concentrar seus esforços na fiscalização das operações consideradas de maior risco. Há expectativa de resultados

TR – Especificamente, no segundo semestre do

mais efetivos na atuação decorrentes de uma parametrização feita em bases mais inteligentes, mesmo tendo em conta um universo de menor seleção. Do ponto de vista do trabalho diário, em verdade o que se espera é a percepção, pelo servidor, de um aumento dos resultados advindos de seu trabalho, decorrente de um grau de acerto maior a partir de uma carga menor de declarações selecionadas, uma vez que o Auditor-Fiscal que atua na área aduaneira terá à sua disposição mecanismos mais eficazes para atuar no combate às fraudes do comércio exterior e à burla às medidas de

ano passado a RFB iniciou uma consulta pública

defesa comercial.

aneiros, o que direta e indiretamente contribui para melhorar a fluidez do comércio exterior e o ambiente de negócios do País.

visando à criação do Programa Aduaneiro de Segurança, Controle e Simplificação – PASS, como o programa brasileiro de Operador Econômico Autorizado (OEA) da OMA. Em que aspectos o PASS agilizaria os procedimentos aduaneiros?

Como

a implantação deste programa afetaria a vida profissional do Auditor-Fiscal que atua em áreas aduaneiras? FC – O Programa Aduaneiro de Segurança, Controle e Simplificação (PASS) foi concebido tendo como fundamento a recomendação de implementação, pela Aduana, do conceito de OEA, constante do Pilar II do Marco Normativo SAFE da OMA, mencionado anteriormente. A medida permitirá que seja dada maior agilidade ao fluxo comercial das empresas consideradas idôneas em suas operações de comércio exterior, reduzindo a seleção para os canais amarelo e vermelho operações consideradas de baixo risco. Essas ações fazem com que a Aduana seja mais ágil em relação às operações regulares, beneficiando o comércio legítimo.Do ponto de vista do controle aduaneiro, sendo associada aos projetos de fortalecimento da fiscalização aduaneira

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TR – A atuação aduaneira vai muito além da simples arrecadação de tributos. Uma das funções que se tem evidenciado nos últimos tempos, devido ao crescimento dos fluxos de comércio internacional, é o combate à interposição fraudulenta, artifício por meio do qual se insere no país dinheiro ilícito. Estes crimes estão relacionados a complexos esquemas de sonegação fiscal de tributos internos. Como a RFB tem se preparado e coordenado as atividades das áreas aduaneira e de tributos internos para enfrentar este desafio? FC – O combate à interposição fraudulenta tem sido objeto de diversas ações da fiscalização aduaneira ao longo dos últimos anos e, de fato, a coordenação da atuação da fiscalização aduaneira com a fiscalização de tributos internos pode aprimorar a eficácia das ações promovidas pelas duas áreas. Nesse sentido, é importante destacar que está sendo implementado um projeto de atuação conjunta da Subsecretaria de Fiscalização (Sufis) com a Subsecretaria de Aduana e Relações Internacionais (Suari) e


não apenas na área aduaneira, mas em toda a RFB. Por

“A RFB necessita dotar o seu corpo funcional com poderes executivos, ferramentas e informações apropriadas para combater o crime organizado com mais eficácia, dando atenção especial à segurança de seus servidores.” suas respectivas projeções, visando a atuação conjunta no que se refere a procedimentos fiscais de interesse mútuo, ou seja, aqueles executados sobre sujeitos passivos que, em face dos indícios apurados, ensejam a instauração de procedimentos fiscais aduaneiros e de tributos internos. O projeto prevê a criação de um fluxo específico para o intercâmbio de informações durante a fase de seleção e programação e durante a fase de execução da ação fiscal, bem como sobre as regras de execução dos procedimentos fiscais em conjunto. Um dos principais focos desse projeto é o combate mais eficaz à interposição fraudulenta. TR – Muitas áreas alfandegadas são bastante sensíveis em termos de segurança, deixando os Auditores-Fiscais que ali atuam à mercê da atuação de indivíduos e grupos organizados criminosos. Quais instrumentos a RFB disponibiliza para a segurança do exercício profissional de seus servidores e como pretende incrementar a sua proteção? FC – É cediço que a cadeia logística do comércio internacional é vulnerável à exploração por grupos criminosos que enxergam nela uma grande possibilidade de expansão de suas atividades. Além disso, temos que reconhecer que nós exercemos uma profissão de risco,

outro lado, é dever da instituição dar a seus servidores o maior grau de segurança possível. Neste cenário adverso, a RFB necessita dotar o seu corpo funcional com poderes executivos, ferramentas e informações apropriadas para combater o crime organizado com mais eficácia, dando atenção especial à segurança de seus servidores. Nesse ponto, destaco que pela primeira vez na história da RFB, a nossa instituição está entregando armamento institucional a seus servidores e os capacitando no seu uso, por meio de uma doutrina séria e profissional. Além disso, estamos buscando uma maior integração com as outras instituições de Estado que atuam no combate ao crime organizado, desenvolvendo importantes ações, podendo ser citada, como exemplo, a assinatura de convênio de cooperação técnica com a Polícia Federal que permite, além da realização de operações conjuntas, o desenvolvimento de projetos institucionais comuns voltados para as áreas de recursos humanos, inteligência, tecnologia da informação, entre outros. Além disso, destaco ainda a participação nos comitês de gestão integrada de fronteiras, o que permite aprimoramento na troca de informações, integração no planejamento e na coordenação nas ações, com efetivo aumento da segurança de todos os envolvidos. No que diz respeito especificamente às áreas alfandegadas, algumas medidas merecem destaque. No final do ano passado, por meio de uma alteração da base legal do conceito de alfandegamento, buscou-se fortalecer a segurança nas áreas alfandegadas, dando melhores estruturas e condições de trabalho aos servidores que atuam nesses locais. É o caso da nova Portaria de alfandegamento, publicada em dezembro do ano passado. A Portaria RFB no 2.438, de 21/12/10, estabeleceu vários requisitos técnicos e operacionais para o alfandegamento de locais e recintos. Esses requisitos irão trazer maior segurança ao exercício da atividade fiscal. Como exemplo posso citar a exigência de disponibilização e manutenção de instrumentos e aparelhos de inspeção não invasiva de

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ção com o Ministério do Planejamento, Orçamento e

“A nossa instituição está entregando armamento institucional a seus servidores e os capacitando no seu uso, por meio de uma doutrina séria e profissional.”

Gestão no intuito de aprovar a contratação de Agentes Técnicos Administrativos, os ATA, como medida complementar dessas iniciativas. Por fim, com relação à capacitação, conforme eu já comentei, temos agora um Centro Regional de Treinamento da OMA, com o qual pretendemos reverter o quadro atual, atuando no mapeamento das lacunas existentes na área aduaneira e preenchendo-as com treinamentos os mais abrangentes possíveis, como por exemplo, por meio do uso de ensino à distância, como será o caso do mencionado lançamento neste mês de março do curso de práticas aduaneiras internacionais.

cargas e veículos e de sistemas para utilização pela fiscalização aduaneira, tais como a vigilância eletrônica do recinto, o registro e controle de acesso de pessoas e veículos e das operações realizadas com mercadorias. TR – O setor aduaneiro ressente-se da falta de recursos humanos e de ações de capacitação para cumprir suficientemente sua missão maior de proteção da sociedade. Quais são as perspectivas de curto prazo para solucionar estas questões? FC – Exercer o controle aduaneiro das operações de comércio exterior e, assim, garantir a defesa dos interesses do Estado e da sociedade, é uma missão que requer atuação eficiente e eficaz. Neste sentido, a busca pelo desenvolvimento e implementação de um conjunto integrado de políticas e procedimentos que possam garantir o cumprimento dessa missão com segurança e fluidez tem sido o nosso grande desafio, como já salientei em vários pontos desta entrevista. Com relação especificamente à falta de recursos humanos, tenho a dizer que o novo estudo de lotação desenvolvido na RFB concluiu pela necessidade de

TR – A diretoria do Sindifisco Nacional visitou recentemente algumas áreas de fronteira e constatou o estado de abandono e de precariedade das instalações físicas de algumas delas, especialmente as da 2ª Região Fiscal. Há alguma previsão de soluções emergenciais para este problema? E a longo e médio prazo, quais são os planos da RFB a respeito? FC – A garantia de fronteiras seguras é uma das mais antigas responsabilidades do Estado. Notadamente em um mundo globalizado este aspecto ganha especial relevância. Nesse sentido está a importância de uma Aduana forte e estruturada nas zonas de fronteira. O Governo Federal, aí incluída a RFB, está ciente dessa deficiência. A própria Presidente Dilma, após a sua posse e em vários momentos, se posicionou no sentido de que devemos fortalecer nossas fronteiras terrestres. A solução para essa questão passa pela integração dos esforços das diversas instituições do Estado que exercem suas atribuições nessas regiões. Por parte da RFB,

Aduana. Tal estudo deverá nortear a política de lotação da instituição daqui para frente e isso significará um aumento real de servidores trabalhando nas uni-

além dos projetos que eu já citei anteriormente, como o novo plano de lotação e o uso da inteligência fiscal e de técnicas modernas de fiscalização nas zonas de fronteira, quero ressaltar que ainda existem outras iniciativas com o objetivo de estimular a permanência

dades aduaneiras. Ademais, a RFB está em negocia-

dos servidores aduaneiros nas fronteiras. Desta forma,

aumento do número de servidores com exercício na

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importantes projetos como a criação de indenização

matização também traz a possibilidade de descompas-

de fronteira, o estabelecimento de projetos-padrão de infraestrutura nas unidades de fronteira e a construção de residências funcionais deverão ser conduzidos em

so com as demais normas e procedimentos aduanei-

parceria com as demais instituições que também estão presentes nas zonas de fronteira. TR – Por fim, na área de manualização de procedimentos, quais medidas deveriam ser tomadas a fim de assegurar o cumprimento efetivo da missão da Aduana, garantindo a segurança fiscal?

ros vigentes. Para resolver esse problema, a Suari está estruturando um projeto de consolidação e aprimoramento de normas que permitirá a consolidação das mais de 300 Instruções Normativas que tratam de matéria aduaneira em vigor para algo próximo de 50 atos. Propõe-se também a elaboração de um cronograma de trabalho que considere as prioridades estabelecidas, o trabalho conjunto com as unidades descentralizadas e a construção de um fluxo de procedimentos asso-

FC – A necessidade de consolidação e aprimoramen-

ciado ao trâmite normativo, de forma a possibilitar a

to organizado da legislação aduaneira já havia sido constatada em diversas ocasiões, mas nunca havia sido objeto de planejamento estruturado visando à sua

agilização do processo de análise, desde a elaboração inicial da minuta de norma até sua assinatura pelo Secretário. Ademais, um trabalho normativo estrutura-

concretização. Tem sido observado que a realização

do, feito com base no levantamento das necessidades

do trabalho normativo sem planejamento e com al-

e sugestões apresentadas pelas unidades locais e dos

terações pontuais constantes traz como conseqüência

questionamentos e dúvidas relativas à aplicação dos

a ploriferação de normas em todas as áreas de inte-

procedimentos ou à interpretação das normas vigen-

resse da Administração Aduaneira, o que gera, como

tes permitirá o aprimoramento da legislação aduaneira como um todo e, sem dúvidas, contribuirá para o

principais reflexos negativos diretos, a diminuição do cumprimento voluntário das normas por parte dos operadores de comércio exterior e o desconhecimento

exercício de nossa missão de exercer a administração tributária e o controle aduaneiro, com justiça fiscal e

da legislação pelos servidores da RFB. A falta de siste-

respeito ao cidadão, em benefício da sociedade.

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e ntrevista Marcos Aurélio Pereira Valadão “Com a internacionalização da economia brasileira, a demanda aumentou bastante nas áreas tributária e aduaneira.”

O

Auditor-Fiscal da Receita Federal, Marcos Aurélio Pereira Valadão, exerce atualmente a função de coordenador-geral de Relações Internacionais (CORIN) da Receita Federal do Brasil. Com vasto conhecimento teórico e prático, especializou-se em direito tributário e tributação internacional. Valadão concedeu a entrevista a seguir para Tributação em Revista abordando assuntos como: os desafios recentes da área internacional da RFB, as atuais diretrizes da RFB na área internacional, a necessidade de constante atualização do Auditor-Fiscal que atua na área aduaneira, a atenção da RFB às relações comerciais do Brasil com países do Mercosul, os benefícios da cooperação internacional na área aduaneira e os instrumentos colocados em prática pela RFB para combater práticas desleais no comércio internacional.

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cooperação administrativa em matéria aduaneira (troca

“A cooperação técnica ocorre tanto na busca da cooperação quanto na ajuda a outros países. A área comercial e de investimento internacional passaram a ser cada vez mais demandas.”

de informações e cooperação técnica). A cooperação técnica ocorre tanto na busca da cooperação quanto na ajuda a outros países. Também a área comercial, i.e., a área das relações de comércio (bens, serviços e direitos) e de investimento internacional, que têm repercussões

TR – A expansão do comércio internacional tem

muito relevantes. Este aspecto é importante, considerando a inserção cada vez maior do Brasil no comércio internacional e também das demandas que o Brasil apresenta contra outros países, como os EUA (aço, algodão, etc). Todo este contexto demandou a criação da

chamado a RFB a desempenhar uma função mais ativa na área externa. A criação da Corin - Coordenação-Geral de Relações Internacionais, em substituição à Assessoria de Assuntos Internacionais – Asain é uma resposta interna aos desafios que se apresentam. Gostaríamos que o Sr. indicasse os principais desafios recentes, interna e externamente à RFB, tanto no relacionamento com outros órgãos de governo como na cooperação internacional, destacando o papel que o Auditor-Fiscal, atuando na área de aduana e comércio exterior, exercerá neste contexto. MV – A Asain (Assessoria de Assuntos Internacionais) era até 2008 uma assessoria, mas mesmo nesta época já contava com uma estrutura com divisões, ou seja, já tinha funções operacionais, portanto, não era mais uma assessoria “típica”, que viria a se tornar a Coordenação-Geral de Relações Internacionais (Corin). A mudança estrutural aconteceu um pouco antes. Anteriormente, a Asain contava com quatro ou cinco funcionários e cuidava apenas das negociações de tratados internacionais tributários e troca de informações em matéria tributária – I.R., com um pequeno número de pedidos e também das questões tributárias dos acordos de natureza comercial. Com a internacionalização da economia brasileira, a demanda na área aumentou bastante nas áreas tributária e aduaneira, ocorrendo a expansão de acordos de

tributárias, passaram a ser cada vez mais demandadas. É esta área da Corin que auxilia o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e o Ministério das Relações Exteriores (MRE) no Trade Policy Review brasileiro, e em demandas comerciais internacionais na OMC, onde os aspectos tributários são

estrutura da Corin como hoje se encontra. Além disso, existem as negociações internacionais no âmbito da Comissão de Comércio do Mercosul (CCM), mais precisamente no Comitê Técnico Nº 2 - Assuntos Aduaneiros, que trata de áreas relacionadas à administração e aos controles aduaneiros do Estados Partes do MERCOSUL, tais como: legislação aduaneira, informática aduaneira, valoração aduaneira, procedimentos aduaneiros, controles e operatória em fronteira e prevenção e luta contra ilícitos aduaneiros. A coordenação das negociações no âmbito do CT-2 está a cargo da Corin, por meio de uma de suas divisões (Dasad). Assim, a Corin conta com quatro divisões: A Dirin, que cuida da negociação dos tratados de cooperação aduaneira e das relações institucionais; a Dasad, que cuida da troca de informações em matéria aduaneira, negociação de acordo fronteiriços e a representação junto ao Mercosul; a Datin, a divisão mais tradicional que cuida das negociações de tratados tributários – dupla tributação e troca de informações, e da própria troca de informações em relação ao imposto de renda; e a Dacoi, que cuida dos assuntos comercias internacionais em suas repercussões tributárias, sendo que a Corin também coordena as ações

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de nossos adidos aduaneiros e tributários, que têm uma relação direta com a administração tributária e com as aduanas dos países onde estão atuando. Neste contexto, o Auditor-Fiscal que atua na área aduaneira e comércio exterior é da maior relevância, pois o reflexo das ações anteriormente enumeradas é parte cotidiana do seu trabalho, tanto na implementação como nas demandas que partem dos setores de ponta, especialmente a troca de informações, em relação às informações que são solicitadas aos outros países e aquelas que somos instados a fornecer. Outro aspecto é o das negociações em si,

“O Auditor-Fiscal que atua na área aduaneira e comércio exterior é da maior relevância, pois o reflexo das ações anteriormente enumeradas é parte cotidiana do seu trabalho.”

tanto dos acordos de cooperação aduaneira, quanto no âmbito do Mercosul, e com os outros países vizinhos

nização Mundial de Aduanas (OMA), onde a RFB tem

não membros do Mercosul. Há diversas situações que devem ser equacionadas, e mesmo tendo outros minis-

uma participação histórica efetiva e tem uma presença cada vez mais marcante. Podemos citar como exemplo

térios como condutor das negociações, especialmente

a criação do centro regional de treinamento da OMA

o MRE, o papel da RFB, na pessoa do Auditor-Fiscal, é

no Brasil em 2009, em conjunto com a ESAF, mais precisamente denominado Centro Regional Conjunto de

central, em virtude da precedência da atuação da RFB nas operações comerciais internacionais, no controle aduaneiro de nossas fronteiras e nos pontos de entrada e saída do País, a teor do art. 37, inciso XVIII da Constituição. No que diz respeito especificamente aos desafios internos e externos, eu diria que em relação aos desafios internos eles já estariam em parte superados, em que pese um espaço para aperfeiçoamentos que são necessários, restando, talvez um melhor entendimento do papel da Corin, no sentido de que poderia ser melhor utilizada a atual estrutura para a troca de informações,

Capacitação Aduaneira. Neste sentido, registro também a participação da RFB em outros Fóruns e organismos internacionais, nos quais ela se faz ouvir e ser respeitada, o que é consequência da melhoria da imagem do Brasil no exterior de maneira geral. Um exemplo disto é o Centro Interamericano de Administrações Tributárias (CIAT), cujo Diretor-Geral é um Auditor-Fiscal da RFB. A participação mais efetiva nos diversos fóruns se alinha com o papel que o Brasil vem assumindo no cenário internacional.

tanto em matéria do imposto de renda quando em matéria aduaneira. No que diz respeito aos desafios externos, está a ampliação da rede de tratados de cooperação aduaneira e de troca de informações tributárias, pois isto implica um aumento da eficiência da fiscalização nesses setores. No que diz respeito à cooperação stricto sensu, creio que os patamares existentes são muito bons. O relacionamento com outros órgãos internos (do País) é feito de maneira harmoniosa e construtiva, o que não significa que não ocorram debates. Isto também se aplica ao relacionamento com os outros países e com as organizações internacionais, especialmente a Orga-

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TR – Já no contexto de uma nova administração da RFB a partir deste ano, quais são as diretrizes e planos para a atuação institucional em comércio exterior? MV – Creio que esta pergunta tem dois escopos. Um é a aduana em si, e creio que na entrevista do Sr. Subsecretário de Aduanas e Relações Internacionais este aspecto já tenha sido explorado. Porém, com relação ao escopo da Corin, um adendo talvez se faça necessário em relação às diretrizes que dizem respeito à contínua expansão das negociações de cooperação aduaneira, a


“No que diz respeito aos desafios externos, está a ampliação da rede de tratados de cooperação aduaneira e de troca de informações tributárias, pois isto implica um aumento da eficiência da fiscalização nesses setores.” qual inclui troca de informações em matéria aduaneira, especialmente com os parceiros comerciais importantes do Brasil, com os quais ainda não temos esses acordos. Faz parte desse escopo a continuidade das negociações do Mercosul, no âmbito do CT-2, de forma a evoluir consistentemente, dinamizar a implementação das ACIs (áreas de controle integrado) e aprimorar as já implantadas, continuando as negociações em relação às atividades transfronteiriças que envolvem questões nacionalmente relevantes como rodovias e ferrovias internacionais que darão acesso à costa do pacífico. TR – Os Auditores-Fiscais, assim como outras carreiras típicas de Estado, necessitam de uma constante atualização de conhecimentos e práticas para atender adequadamente aos desafios que os desenvolvimentos sociais, políticos e econômicos recentes lhes apresentam. Indique como o Centro Regional de Capacitação da Organização Mundial das Aduanas, e outras ações de mesma natureza podem contribuir neste sentido. MV – Há diversas iniciativas de capacitação como: as visitas técnicas, treinamentos oferecidos pelas outras aduanas e aqueles no âmbito da OMA. Neste sentido, a criação do Centro Regional Conjunto de Capacitação Aduaneira RFB/ESAF/OMA no Brasil (CRC-Brasil),

a partir de um memorando de entendimento entre a ESAF a RFB e a OMA, e estabelecido oficialmente em dezembro de 2009, cumprirá o importante papel de desenvolver a capacidade dos agentes aduaneiros para promover o aperfeiçoamento e fortalecimento das Administrações Aduaneiras dos países das Américas e do Caribe. O Brasil, como país sede, tem maior facilidade para atender aos cursos a serem programados. Ressalta-se que o CRC-Brasil tem como meta trabalhar fortemente com aprendizagem em ambiente virtual (AVA), ofertando cursos e-learning – o que facilita o acesso de todos. O CRC-Brasil tem realizado diversas atividades e tem se associado a outros centros de excelência (por exemplo, a parceria com o CEDDET–Espanha e a FGV) para diversificar os treinamentos, na busca de seus objetivos. No que diz respeito às ações desenvolvidas especificamente pela Corin, no âmbito dos acordos de cooperação administrativa em matéria aduaneira e das ações de cooperação técnica, firmadas por meio de memorandos (MOU), temos acordos já negociados com: Estados Unidos, França, Holanda, Israel, Rússia, Países Baixos, Reino Unido e COMUCAM, que engloba os principais países da América Latina, Portugal e Espanha. Estão pendentes de aprovação pelo Congresso Nacional, os acordos com África do Sul (2007), Angola (2008), Índia (2007), Noruega (2009), República Tcheca (2009), Turquia, Moçambique e Japão (2010), este último ainda pendente de assinatura. E estão em negociação: China, Canadá, Polônia, Geórgia, Ucrânia, Bulgária, Itália e Coréia do Sul. Esses acordos possibilitam a troca de experiências de forma que possamos implementar práticas já comprovadamente eficazes utilizadas em outros países. Isto também implica a capacitação dos colegas aduaneiros da RFB, com treinamentos nestes países, bem como a visita de aduaneiros de outros países ao Brasil. Tais trocas foram e estão sendo muito importantes em alguns projetos como o Operador Econômico Autorizado (OEA), os centros de cães de faro, o centro nacional de análise de risco (targeting center). E decorrente de ações no âmbito do IBAS também foi

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aberta a possibilidade de trabalhar com a aduana da África do Sul para absorver conhecimento em relação à sua experiência com a Copa do Mundo de 2010, que nos será útil na nossa Copa de 2014. TR – Temos fronteiras terrestres com quase todos os países do América do Sul, com fluxos comerciais diferenciados que requerem uma atenção especial. Que pontos específicos das relações comerciais do Brasil com países do Mercosul requerem maior atenção da RFB? Destaque o papel do Auditor-Fiscal neste contexto. MV – O Brasil tem fronteiras terrestres com todos os países do Mercosul. Os Estados Partes do Mercosul representam um dos principais mercados de destino das exportações brasileiras, com participação de 11,2 % sobre o total das vendas nacionais para o exterior, em 2010. Dessa participação, cerca de 93% foram de produtos industrializados, manufaturados ou semimanufaturados, frente a apenas 7% de produtos básicos. Tendo em vista a importância do Bloco Econômico como parceiro comercial do Brasil, a atenção da RFB e o trabalho dos Auditores-fiscais devem estar focados na agilidade e na harmonização dos procedimentos aduaneiros adotados nos pontos de fronteira terrestre. Visando alcançar tais objetivos, os Estados Partes do MERCOSUL, a partir do protocolo de Recife, acordaram implementar, em determinadas fronteiras terrestres, as Áreas de Controle Integrado (ACI), locais onde todos os organismos intervenientes de ambos os países (RFB, ANTT, ANVISA, DPF e MAPA no caso brasileiro) exercem seus controles de despacho aduaneiro de forma única e integrada. Ressalte-se que pelo lado brasileiro, os Auditores-Fiscais, no âmbito de sua competência, têm precedência sobre os demais setores administrativos, conforme o art. 37, inciso XVIII, da Constituição Federal. Por outro lado, a extensa linha de fronteira terrestre que separa fisicamente o Brasil desses países dificulta o controle aduaneiro, tornando fundamental a eficiência do trabalho dos Auditores-Fiscais, com foco

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“Há uma intensa cooperação entre os países emergentes (caso do IBAS, que congrega o Brasil, a África do Sul e a Índia) a qual tem dado resultados específicos, como a criação de um centro trilateral de troca de informações.” nas áreas de repressão e vigilância, no combate ao tráfico de drogas e ao contrabando e descaminho, especialmente de armamentos e produtos falsificados. Em suma, o grande desafio para a RFB, e para a Aduana em particular, é ser uma instituição que fiscalize com eficiência os ilícitos tributários e aduaneiros, sem prejudicar o fluxo do comércio legítimo. TR – Muito tem sido destacado quanto aos benefícios de uma cooperação com as empresas no sentido de agilizar e aprimorar os procedimentos em portos, aeroportos e áreas de fronteiras terrestres, sem a perda das prerrogativas do estado brasileiro na fiscalização. Gostaríamos que o Sr. destacasse e comentasse os principais benefícios nesta área. MV – Há um aspecto a destacar em que há uma cooperação intrínseca. São os chamados operadores econômicos autorizados (OEA), um sistema que agiliza os procedimentos para as empresas que seguem determinados critérios de transparência e cumprimento da legislação aduaneira e tributária. Nesse caso o ganho em eficiência e agilidade está acompanhado da segurança no processo, com benefícios mútuos. TR - A cooperação tributária e aduaneira do Brasil com outros países emergentes também é um ponto


“As cogitações de retirar a aduana do controle da RFB, que volta e meia se ouve, seria um retrocesso. Os países que não adotam este modelo têm reconhecidamente perda de eficiência.” relevante nas nossas relações comerciais. Estratégias mais uniformes entre os países trariam benefícios mútuos em termos de eficiências nas ações de fiscalização. O que há de novo nesta área? MV – Este ponto é muito importante no que tange às atividades da Corin. Já foi mencionado que estamos nos esforçando para expandir a rede de acordos de cooperação aduaneira com os principais parceiros comerciais brasileiros. Porém, isto não se restringe a esses acordos. Há uma intensa cooperação entre os países emergentes (caso do IBAS, que congrega o Brasil, a África do Sul e a Índia) a qual tem dado resultados específicos, como a criação de um centro trilateral de troca de informações que agilizará muito as trocas de informações aduaneiras entre os três países. O movimento neste sentido também ocorre com países em menor grau de desenvolvimento, e neste caso há especial interesse em visitas de cooperação técnica que estes países fazem, bem como capacitação técnica promovida por eles próprios, como é o caso de Moçambique, e mais recentemente Angola. Essas ações todas trazem benefícios em termos de melhoria na eficiência nas ações de fiscalização. Informação é uma ferramenta fundamental nesses casos. O combate às fraudes em operações de comércio internacional é fundamental e é parte importante do trabalho da RFB. Tais tratados servem de mecanismos de controle dessas transações no combate à evasão fiscal internacional

na área aduaneira. No que diz respeito à cooperação tributária, no sentido dos chamados tributos internos, e especificamente o imposto de renda, devemos considerar que os nossos 29 tratados de dupla tributação em vigor têm cláusula de troca de informações, observando que se pode utilizar também os tratados de cooperação judicial (MLAT) em determinadas situações, tanto em matéria aduaneira como tributária. Além disso, o Brasil aderiu ao Fórum Global sobre Transparência e Troca de Informações Tributárias em 2009, passando a integrar seus órgãos de decisão e de revisão. Com a importância do Brasil hoje no G20, o país não poderia deixar de participar de um órgão como o Fórum Global, já que o próprio G20 apontou a falta de transparência como uma das causas da crise econômica recente. O Fórum é um órgão da OCDE e suas posições seguiam as orientações da OCDE. Em 2009 ele passou a ter um orçamento próprio e a tomar suas decisões com a participação de todos os membros em pé de igualdade, sendo eles membros ou não da OCDE. É bom destacar que mesmo antes de entrar no fórum o Brasil já atendia os padrões internacionais de transparência, tanto que após a adesão o país passou a integrar a “lista branca” da OCDE de países que seguem os princípios internacionais de transparência. Na verdade, se tivermos uma convenção para evitar a dupla tributação da renda e a evasão fiscal com o artigo 26 do Modelo OCDE e ONU (“Troca de Informações”) em funcionamento, ele vai ter a mesma função de um tratado especifico. O tratado para troca de informações só vai trazer normas procedimentais mais detalhadas, embora o núcleo seja o mesmo. Nos casos em que for mais complicado ter uma convenção contra bitributação, sendo possível ter um tratado de troca informações, é bom que tenhamos este último, principalmente quando existirem fluxos comerciais relevantes entre os dois países, como no caso de Brasil e Estados Unidos. A RFB tem demandado e temos sido demandados em relação à troca de informações, tanto na área aduaneira como na tributária, com resultados expressivos.

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Deve ser observado que a OMA e acordos com o Mercosul levam a ter procedimentos aduaneiros mais parecidos, tendendo a uma uniformização, o que evidentemente aumenta a eficiência. Os tratados de troca de informação tributários ou aduaneiros, ainda que em menor grau, também tem este efeito, especialmente no que diz respeito a procedimentos de fiscalização de ilícitos aduaneiros. TR – O fato de termos a aduana integrada aos chamados tributos internos é eficiente? MV – Sim. Penso que é eficiente tanto para a fiscalização e controle dos tributos internos, como para a fiscalização e controle das atividades aduaneiras. A fusão das duas áreas no Brasil, que resultou na estrutura que conhecemos atualmente, deu-se quando da criação da SRF hoje RFB, em 1968, embora as atividades já antes

mete fraude aduaneira pode estar também cometendo fraude em preços de transferência, caso típico em operações de exportação (subfaturamento). Contudo, as trocas de informações são conduzidas sob o amparo de tratados específicos das respectivas áreas, pelo menos por enquanto. TR – A Aduana tem sido um fator de defesa da soberania nacional. Importações consideradas desleais prejudicam a indústria nacional. Alguns instrumentos, como a verificação das regras de origem, podem ser utilizados para combater estas práticas desleais. Faça um apanhado geral sobre o tema. MV – A aduana é, de fato, um importante fator de defesa da soberania nacional. Na verdade, no que diz respeito ao comércio exterior, é a aduana que está na linha de

estivessem sob a responsabilidade do Ministério da Fazenda, na Direção Geral da Fazenda Nacional, constituída pelos Departamentos de Rendas Internas, Rendas Aduaneiras e Imposto de Renda. Essa integração induz um ganho de eficiência, que passa pela unificação da base de dados dos contribuintes e vai até o conheci-

frente. Qualquer tipo de fraude aduaneira, como fraude de valor, burla as regras de origem, seja diretamente seja através da chamada “circumvention” (utilização de um terceiro país não sujeito às regras de origem, para burlar o controle), tem uma atuação direta da aduana, embora o MDIC tenha também uma participação no

mento organizacional, prevenção de conflitos e ação sinérgica do pessoal da instituição, os Auditores-Fiscais. Daí que as cogitações de retirar a aduana do controle da RFB, que volta e meia se ouve, seria um retrocesso. Os países que não adotam este modelo têm reconhecidamente perda de eficiência, às vezes até porque o foco da aduana é centrado em outros aspectos, como a segurança (caso dos EUA), mas esse trade off pode sair caro. No sentido do aumento da eficiência, tem-se notícia de países que estão promovendo a junção das duas áreas como o Reino Unido, por meio do HM Revenue & Customs – HMRC, resultante da fusão, em 18 de abril de 2005, do Inland Revenue and HM Customs and Excise Departments. Em outros países europeus o controle de tributos indiretos é feito pela mesma administração aduaneira e tributária. Mas a questão não se

que diz respeito à questão das regras de origem. O arcabouço legal utilizado pela RFB no combate a essas

restringe a tributos indiretos. O contribuinte que co-

cimento do comércio exterior brasileiro.

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fraudes envolve não só a legislação interna, consolidada no Regulamento Aduaneiro, mas também tratados aduaneiros e comerciais, como por exemplo, o acordo do GATT/OMC, no qual está prevista a valoração aduaneira e o acordo do Mercosul, e sua regulamentação, a qual prevê normas de verificação de origem. Para melhorar a eficiência na implementação deste arcabouço é necessário evoluir e aprimorar as técnicas, com medidas como: a criação do Centro Nacional de Avaliação de Risco e a utilização de modernas ferramentas de informática e mão-de-obra especializada. Assim, a fiscalização antecipa-se à ação do fraudador, agindo de maneira mais eficiente e eficaz, executando o controle aduaneiro com mais segurança e agilidade, contribuindo para o fortale-


a RTIGO A Guerra Comercial Foch Simão Jr.1

1 – Introdução Na avaliação de Welber Barral ex-Secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, a falta de acordo em torno da questão cambial por parte dos países do G20 reunidos na Coréia do Sul pode levar a uma “guerra comercial”, com aumento de protecionismo em desrespeito a regras da OMC. Esta opinião foi também manifestada pelo ex-Secretário da Receita Federal, Otacílio Dantas Cartaxo, por ocasião da inauguração da Delegacia Especial de Maiores Contribuintes em São Paulo. A “guerra comercial” envolve primordialmente a utilização de mecanismos de confronto econômico fortemente focados nos subsídios comerciais e nas barreiras alfandegárias. O resultado deste tipo de confronto repercute em médio prazo na capacidade de transação econômica do

país refletida no Balaço de Pagamentos. O Balanço de Pagamentos de um país apresenta, na forma de um plano de contas, as relações de troca com o resto do mundo durante um determinado período. Sinteticamente o Balanço de Pagamentos é composto principalmente pelo montante de Transações Correntes e pela Conta de Movimento de Capitais. O item das Transações Correntes por sua vez é composto pelos subgrupos Balança Comercial, Balança de Serviços e das Rendas Recebidas e Enviadas ao Exterior, além das Transferências Unilaterais Correntes. Basicamente, quando se fala em “guerra comercial” compreende o equilíbrio da conta do Balanço de Comercial onde se registram os valores das importações e exportações entre os países. Quando um país importa mais do que exporta, ele não recebe este excedente de bens e serviços gratuitamente, ao contrário, ele abre mão de seus ativos em retribui-

1- Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.

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ção. Inicialmente estes ativos são materializados em moeda local, mas os investidores rapidamente utilizam este dinheiro para adquirir empresas e papéis governamentais, gerando obrigações futuras, transformando o país, em curto período, em exportador natural de ativos. O desequilíbrio na Balança de Pagamentos acaba por demandar poupança externa, que se manifesta em déficit em conta corrente, que termina por exigir o aumento dos juros pagos aos capitais compensatórios. Esta escalada dos juros aumentará a dívida do governo, evidenciando o excesso de investimento privado em relação à poupança. A escassez de poupança privada interna aumenta a percepção de riscos dos credores externos, indicando que os seus recursos estão financiando parcelas expressivas de enormes déficits públicos. Em vista deste cenário de instabilidade econômica, estes investidores, para continuarem a cobrir os déficits, acabam exigindo remuneração mais elevada para os seus capitais. Dada a alta relação entre as taxas de juros e a evolução do PIB, razão dívida líquida/ PIB, há o aumento da demanda por superávit primário a fim de se estabilizar esta relação, prevenindo o descontrole do endividamento público o que fatalmente desencadearia uma crise de credibilidade. Os superávits primários, por sua vez, requerem uma política fiscal mais austera, reduzindo ainda mais a escassa poupança privada interna pelo aumento da tributação e pela estagnação do investimento nacional, deprimindo a poupança como um todo, com reflexos negativos no investimento interno e nas exportações, nesta última por causa da redução dos valores agregados. Isto, como se percebe, aumenta o déficit da Balança de Pagamentos tornando crônico o processo iterativo de endividamento público, onde o déficit comercial aumenta o déficit público, criando um fluxo evasivo de ativos. 2 – Defesa Comercial Do ponto de vista do comércio global, as condições internacionais de custos e de demanda poderiam levar os países que comerciam entre si a alcançarem integralmente os benefícios proporcionados pelo comércio multilateral totalmente livre. Mas, a realidade que se apresenta é bem

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diferente, as pressões internas de certos setores econômicos nos países desenvolvidos os levam a adoção de práticas, muitas vezes sutis, de protecionismo com a aplicação de barreiras não tarifárias, o emprego de subsídios e outros mecanismos de embaraço às exportações provenientes dos países em desenvolvimento e por outro lado, no tocante às suas exportações, estimulam a prática de dumping, subvaloração e outros recursos predatórios às economias dos demais países. A atuação de um governo na defesa comercial do país e os limites de sua aplicação é pautada pela legislação internacional, em particular, nos acordos multilaterais e bilaterais recepcionados pela legislação interna. Por defesa comercial entendem-se medidas que podem ser impostas pelo país importador quando verificadas determinadas condições descritas em acordos internacionais, onde qualquer prática estranha às normas acordadas pode e deve ser combatida precavendo o dano à indústria doméstica e à cadeia de produção do país. No tocante ao controle dos fluxos do comércio internacional, a instituição precedente na defesa dos interesses nacionais e do bem estar dos seus cidadãos é o Sistema Aduaneiro, composto pelas Alfândegas e Inspetorias. Observa-se, portanto, que no âmago da questão “guerra comercial“ encontra-se o controle aduaneiro que por sua característica histórica é por si só uma barreira institucional às atividades de trocas comerciais. A função das Instituições Aduaneiras é a de assegurar que todos os bens, objeto de comércio internacional, circulem pelas fronteiras do país em consonância com os mandamentos legais vigentes e em condições econômicas compatíveis com a do mercado interno, preservando a sua capacidade econômica e a segurança dos seus cidadãos através da execução do controle físico e documental eficaz e eficiente, que não interfira substancialmente nos custos logísticos das transações. Compreende esse controle, visando a defesa econômica da nação, os procedimento de inspeção pré-embarque, auditoria dos fluxos de importação em zona primária, valoração aduaneira, auditoria de zonas secundárias, operações de busca e repressão e outros recursos


dispostos pela legislação à competência da Aduana. Desta forma, seria de maior importância para a nação a formulação de uma estratégia de defesa comercial de longo prazo, empregando os serviços de controle aduaneiro de forma ativa. A visão de “coletoria tributária” que hoje domina a administração da Receita Federal não se coaduna com a missão precípua das Alfândegas. Na historiografia nacional as Alfândegas foram instrumentos de defesa da terra desde as expedições guarda-costas de Cristóvão Jacques no combate à pirataria até o emprego da divisão dos Guardas da Alfândega na aguerrida luta em campos paraguaios. A disposição do governo de empregar de forma eficiente a instituição aduaneira em defesa da nação deve levar em conta a estrutura funcional hoje minguada, mas, de alta competência e elevada instrução. Nesta perspectiva de política pública há estratégias primorosas que permitem ao Brasil preservar o seu parque manufatureiro e manter o bem estar dos seus cidadãos. A cabeça de ponte do sistema de defesa comercial teria como base a ação dos agentes aduaneiros colocados nos principais pontos de exportação de mercadorias para o Brasil, com a determinação de vistoria sobre certas mercadorias sensíveis ao nosso interesse econômico e alvos de práticas comerciais predatórias, envolvendo a qualidade (classificação NCM), quantidade e o valor das mercadorias (valor aduaneiro, sub-faturamento, dumping), utilizando-se da oportunidade de lançar mão do instrumento derivado do Acordo do GATT, Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio ou Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, na rodada do Uruguai, conhecido como INSPEÇÃO PRÉ-EMBARQUE. Note que o procedimento proposto pelo acordo do GATT/ OMC permite, quando da ação aduaneira, detectar fraudes financeiras cometidas através do comércio de bens como a lavagem de dinheiro, além de agilizar o desembaraço aduaneiro nas Alfândegas no território nacional através de informações antecipadas por parte do exportador. Isto se traduz em ganho econômico para o país, redução do tempo de desembaraço e segurança das transações transnacionais. Esta nova estratégia de controle aduaneiro só pode

ser implementada com uma profunda reestruturação da instituição Aduana, de forma a criar uma cultura proativa contando com a colaboração da sociedade. A autoridade nunca deve partir do princípio universal da suspeita na sua atuação profissional. A ação aduaneira, ao nosso ver, deve possuir as seguintes vertentes: 1) 2) 3) 4) 5)

busca de informações; processamento de informações e de cadastros; auditoria de procedimentos; inspeção de cargas e documentos; vigilância e patrulha ostensiva de portos, aero-

portos e pontos de fronteira; 6) poder de polícia judiciária, reduzindo o tempo do trâmite coercitivo; 7) operações de busca e apreensão; 8) programa permanente de educação e orientação dos cidadãos; 9) controle sobre circulação e a admissão de bens e direitos de propriedade intelectual. A questão da coleta de informações é vital para o sucesso do trabalho aduaneiro. O caráter voluntário da ação do contribuinte, procurando prestar com antecedência todo o tipo de informação sobre a transação comercial, subsidia o caráter investigativo da Aduana de apurar a exatidão e complementar o processo de instrução da transação, tornando-a compatível com a legislação vigente no país. Deve-se notar, neste particular, o emprego de adidos aduaneiros como: consultores, certificadores e inspetores que contribuirá para que não haja a interrupção no fluxo de deslocamento do comércio exterior, em virtude do rápido acionamento de seus serviços em caso de dúvida sobre uma transação comercial ou sobre a carga que lhe é fruto. No que tange à coerção legal ao descaminho, contrabando, tráfico de drogas ilícitas e de armas, evasão de divisas, controle sobre a evasão de patrimônio nacional, etc., a missão da Aduana envolve o lado eminentemente policial judiciário. Em quase todas as Aduanas dos países desenvolvidos estas instituições possuem a prerrogativa de

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polícia judiciária, contando com guarda armada para exe-

3 – Conclusão

cutar missões de repressão e apreensão. Curiosamente, o Brasil até 1964 possuía a Guarda Aduaneira para este fim, sendo extinta pelo governo militar. Não há como reprimir e controlar os ilícitos aduaneiros sem uma estrutura de polícia judiciária compatível, contando com aparelhos e instrumentos necessários à ação da coerção legal. De outra forma, como podemos verificar diariamente nas ruas do país, estaremos vivendo uma ficção institucional que presta um desserviço à nação e trabalha predatoriamente com o suor, sangue e lágrimas do brasileiro arrancados compulsoriamente através do artifício da tributação. Este

A soberania do Estado é manifestada na forma de governo que tem sob a sua responsabilidade os mais diversos encargos, espelhando os anseios e o caráter da sociedade dos seus cidadãos. O grau de comprometimento de uma sociedade com o Pacto Social firmado não é necessariamente aquele que, designado pela Carta Magna, propaga-se pelas cantilenas públicas, mas, sim aquele que extraído da experiência vivida por seus cidadãos revela a realidade da sua lida diária. Se a sociedade não se organiza para atribuir e controlar as

da economia do país as suas riquezas através da insidiosa

funções a serem desempenhadas por um governo que a representa, não pode esperar que este exerça com competência as suas funções básicas de alocar e distribuir recursos, e moderar as relações sociais. Enfim, as características de um Estado expressas pelo desempenho de suas instituições revelam o verdadeiro caráter dos seus cidadãos e o governo que estes

evasão de riquezas da terra.

elegem reflete os seus mais profundos anseios.

arremedo de Aduana, que hoje vige impotente, é permissivo e pernicioso; permissivo porque dá cada vez mais oportunidade ao crime organizado a capitalizar-se através do contrabando e descaminho, pernicioso porque drena

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a RTIGO A Aduana e o Combate a Lavagem de Dinheiro em Operações de Comércio Internacional1 Gerson José Morgado de Castro2

1 – Introdução O fenômeno conhecido vulgarmente como lavagem de dinheiro surgiu em tempos imemoriais, havendo notícias de sua prática na China, 4.000 anos atrás, quando mercadores se utilizavam de métodos semelhantes aos atuais para proteger seu patrimônio dos governantes, fugindo à tributação3. Suas técnicas evoluíram ao longo da história, passando pela Idade Média e seu uso

dinheiro para, tanto quanto possível, esconder a origem ilícita de seus ganhos. Mas, sem dúvida, foi a partir do chamado fenômeno da globalização que esta atividade criminosa ganhou a dimensão que apresenta nos dias atuais, com o incremento da atividade bancária transnacional e o aumento da informatização nesse setor, o aumento e liberalização dos fluxos internacionais de capitais e mercadorias e o

punições da Igreja pela prática de usura, pelo uso de “paraísos” pelos piratas do século XVII e em especial durante os anos 20 e 30 do século passado, nos Estados Unidos, quando os “gangsters”, após a prisão de Al

enfraquecimento do Estado, decorrente de políticas de redução de gastos públicos e de redução da participação estatal na economia dos países, adotadas principalmente a partir do final da década de 80. A abordagem aqui proposta para o tema parte de

Capone, passaram a utilizar-se de métodos mais sofisticados e internacionalizar a atividade de lavagem de

uma reflexão sobre as preocupações do Grupo de Ação Financeira Internacional – GAFI/FATF, em seu rela-

por prestamistas e mercadores que buscavam fugir às

1. Artigo originalmente apresentado como tese ao CONAF 2010 – Congresso Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil. 2. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, bacharel em Ciências Contábeis e Direito, mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos – UNIMES. 3. Seagrave, S., Lords of the Rim: The Invisible Empire of the Overseas Chinese, Putnam Publishing Group, 1995, apud Jaime Jamarillo-Vallejo, Lavado de activos: temas de política pública.

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tório intitulado “Trade based money laundering”, no qual buscou-se analisar a utilização de operações de comércio internacional como meio para a lavagem de

dificultar a vinculação entre os recursos e os crimes pelos quais foram obtidos. Em breve definição, podemos dizer que:

dinheiro. Aponta o GAFI que ainda não é dada a devida importância às tipologias envolvendo o comércio internacional voltadas àquela prática criminosa, razão pela qual é essencial a conscientização e o treinamento constantes destinados a dotar os Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil dos conhecimentos e instrumentos legais necessários ao seu combate. Pretende-se demonstrar a ameaça representada por esse crime ao território e à economia nacional, pelo volume de recursos movimentados e pela origem dos recursos “lavados”, umbilicalmente ligados ao crime organizado. Além disso, busca-se apresentar, de forma simplificada, as principais tipologias ligadas ao fluxo internacional de mercadorias e indicadores da ocorrência desse crime, fornecendo ao leitor um contato inicial com essas técnicas, a fim de possibilitar sua identificação no quotidiano das unidades aduaneiras e servir de subsídio para o aprofundamento no estudo desse tema, ainda pouco explorado pela literatura nacional. Como consequência, ficará demonstrada a importância de uma fiscalização alerta e ciente da utilização de operações de comércio internacional como técnica de lavagem de dinheiro, tanto para a prevenção e o combate direto e imediato a essa atividade, quanto como meio de obtenção de informações sobre a atuação de quadrilhas especializadas, permitindo a atuação conjunta com os demais órgãos responsáveis pela repressão a esse crime. 2 - A Lavagem de Dinheiro 2.1 - Breves Considerações Sobre Essa Atividade Criminosa A chamada lavagem de dinheiro consiste num processo composto por etapas, destinado a introduzir na economia formal recursos obtidos em atividades criminosas e dar-lhes aparência de legalidade, objetivando impedir ou 4. Gerson José Morgado de Castro. O combate à lavagem de dinheiro, p. 14.

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‘Lavagem’ de dinheiro é o processo pelo qual se busca introduzir na economia bens, direitos ou valores originados na prática de crimes, ocultando ou dissimulando sua origem delituosa4.

O termo utilizado usualmente se refere à prática dos gangsters norte-americanos, que utilizavam lavanderias para a atividade de “legalização” dos recursos obtidos ilicitamente, embora só tenha sido usado, pela primeira vez, pela imprensa daquele país, na década de 70, por ocasião do escândalo denominado Watergate. Diversas expressões são utilizadas para intitular tal atividade criminosa ao redor do mundo, mas a mais popular é, sem dúvida, a aqui utilizada. Todavia, necessário se faz constatar que o tipo legal utilizado no Brasil não adotou integralmente tal denominação, referindo-se a “crimes de ‘lavagem’ ou ocultação de bens, direitos e valores”. 2.2 – Fontes Normativas da Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro Embora a legislação pioneira remonte a 1978 (na Itália) e normas no sentido de criminalizar essa atividade tenham sido publicadas na Alemanha em 1981, na Inglaterra em 1982, nos EUA em 1986 e na França em 1987, o principal incentivo ao combate a essa prática foi, no plano internacional, a Convenção de Viena de 1988, celebrada no âmbito da Organização das Nações Unidas, inicialmente objetivando o combate ao tráfico ilícito de drogas. O Brasil foi signatário desse ato, ratificado pelo Decreto Legislativo n.º 162, de 14 de junho de 1991 e promulgado pelo Decreto n.º 154, de 26 de junho de 1991, mas a conduta só foi tipificada por meio da Lei n.º 9.613/98. Referida lei introduziu no ordenamento jurídico nacional diversas figuras penais, visando punir as condutas tendentes à integração à economia do produto de deter-


minados crimes antecedentes, considerados mais graves

bens, direitos ou valores provenientes de qualquer dos

pelo legislador, ocultando-lhe ou dissimulando-lhe a origem criminosa. Optou a lei brasileira por eleger tais crimes antecedentes em rol taxativo, indo além da mera criminalização da “lavagem” dos ganhos provenientes somente do

crimes antecedentes previstos pelos incisos da cabeça daquele artigo. As tipologias que serão abordadas mais adiante se referem, em sua maioria, à prática desse tipo penal. Todavia, como será possível perceber ao final, o uso de ativi-

tráfico de drogas, mas adotando postura mais tímida que outras legislações mais avançadas, que optam por não “engessar” o combate à “lavagem”, punindo a legitimação do produto de todo e qualquer crime, ou de “crimes graves”, assim entendidos os que apresentem punição a partir de determinado nível.

dades de comércio internacional na atividade de lavagem de dinheiro não se restringe a esse tipo penal, transitando pelas demais modalidades instituídas pelo legislador.

A esse respeito, tramita atualmente pela Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n.° 6577/2009, que entre outras modificações à Lei n.° 9.613/98, pretende alterar a redação da cabeça de seu Art. 1.°, para abranger as condutas de lavagem de dinheiro proveniente de qualquer infração penal. Tal modificação representa um significativo avanço, em especial no que se refere à repressão da lavagem de dinheiro ligada à sonegação fiscal, hoje não abrangida entre os crimes antecedentes5, embora, com frequência, os crimes fiscais estejam associados a outros que já figuram na atual lista, como a evasão de divisas e os crimes praticados por organizações criminosas, acabando por dar origem à punição por lavagem de dinheiro. A lei brasileira traz, em sua redação atual, um tipo penal básico, descrito no caput do Art. 1.º, três tipos assemelhados (Art. 1.º, § 1.º, incisos I a III) e dois tipos equiparados (Art. 1.º, § 2.º, incisos I e II)6. Entre eles, interessa de forma especial à presente abordagem (mas não exclusivamente) aquele instituído pelo inciso III do § 1.º de seu Art. 1.°, que se refere à conduta de importar ou exportar bens com valores não correspondentes aos verdadeiros, para ocultar ou dissimular a utilização de

2.3 - Características da Lavagem de Dinheiro Entre as características que normalmente marcam essa atividade e fazem das operações de comércio internacional terreno fértil para sua prática, a primeira delas é sua dimensão internacional, ou transnacionalização das condutas7, decorrente, de forma direta, de sua vinculação com o crime organizado, que extrapola os limites dos territórios em que originalmente se estabeleceram as organizações, para atuar em todo o globo8. Tal característica representa uma vantagem adicional aos “lavadores” e, na mesma proporção, um obstáculo a mais para as autoridades na tarefa de detecção e persecução das atividades criminosas dessa natureza. O fato de transitarem os recursos objeto da lavagem através de diversas fronteiras provoca dificuldades relativas à cooperação judicial internacional e à troca de informações entre as autoridades, falta de harmonização entre os diversos ordenamentos jurídicos e permite ao criminoso a busca de localidades cujos controles sejam menos rigorosos, facilitando sua ocultação. Outra característica digna de nota é o enorme volume de recursos movimentados pela atividade. No geral, os crimes antecedentes a que se dedicam tais grupos, em especial o tráfico de drogas, apresentam, além da enorme danosidade social, margens de lucro inatingíveis na ativi-

5. Todavia, deve-se devotar a necessária atenção a eventuais efeitos negativos deste alargamento do escopo de aplicação da norma penal aqui tratada, pelo risco de banalização de sua utilização, especialmente em relação a crimes de baixo ou nenhum potencial ofensivo, sob pena de desvirtuar-se a sua aplicação, voltada à efetiva proteção da ordem econômica e dedicada especialmente às atividades de grupos criminosos organizados e a crimes praticados por detentores de grande poder econômico e/ou político. 6. Adota-se aqui a denominação utilizada por Rodolfo Tigre Maia, Lavagem de dinheiro, p. 56 a 102. 7. Raúl Cervini, Lei de lavagem de capitais, p. 62 e 63. 8. Antônio Sérgio A. de Moraes Pitombo, Lavagem de dinheiro: a tipicidade do crime antecedente, p. 28, Peter Lilley, Lavagem de dinheiro: negócios ilícitos transformados em atividades legais, p. 17-18.

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dade legal9, proporcionando a seus perpetradores um acúmulo de capital que lhes obriga à prática de movimentos massivos de recursos e lhes permite também a obtenção de um poder que rivaliza, quando não supera, o poder dos Estados nos quais as organizações se encontram estabelecidas, representando fonte perene de recursos que lhes permitem por vezes exercer controle sobre porções dos territórios nacionais. De tal característica decorre outra, apontada por Raúl Cervini, que vem a ser a dimensão dos danos causados pela atividade, que extrapola a esfera individual, alcançando ou se projetando sobre toda a economia nacional, podendo, inclusive, chegar a quebrar a confiança no sistema econômico10. 2.4 – Dimensão da Atividade no Mundo e no Brasil Michel Camdessus, em discurso proferido no Encontro da Plenária do GAFI, realizado em Paris, em 1998, estimou o volume de dinheiro “lavado” anualmente entre 2% e 5% do PIB mundial11. Já Moisés Naím afirma que estimativas mais recentes fixam o fluxo de “lavagem” de dinheiro próximo a 10% do PIB global12. Para auxiliar a compreensão de tais números, deve-se consignar que a estimativa mais otimista (aplicando-se o percentual de 2% sobre o PIB mundial de 2009, da ordem de US$ 57,937 trilhões) supera o PIB mexicano daquele ano, ao passo que a estimativa mais pessimista representa um volume de capital ilícito circulando ao redor do mundo mais de três vezes superior a toda a riqueza produzida no Brasil naquele ano, ou algo em torno de 40% (quarenta por cento) do PIB norte-americano no mesmo período13. Em estudo concluído no ano de 2006, demonstrou-se que o volume de dinheiro sujo colocado em circulação ao redor do mundo pela atividade de lavagem de dinhei-

ro chegaria, na hipótese mais pessimista (que considera o percentual de 10%) a configurar a terceira maior riqueza do mundo, atrás apenas do Produto Interno Bruto dos Estados Unidos e do Japão e, na hipótese mais otimista, seria a décima economia mundial, superando o PIB brasileiro à época14. Tais projeções revelavam que o capital acumulado em dez anos pelas organizações criminosas superava o PIB norte-americano15. 2.5 – As Ameaças Representadas pela Lavagem de Dinheiro à Economia e a Soberania Nacionais Tal volume de recursos circulando pelo globo nas mãos de organizações criminosas já representa, por si só, uma ameaça às soberanias e de forma especial às economias nacionais. O resultado já foi visto em diversos países e mesmo no Brasil, sob a forma de controle de territórios por tais grupos e, atualmente, apresenta sua face mais cruel na guerra travada no México entre o Estado e narcotraficantes, que passaram a afrontar as autoridades de forma pública e direta, com intenções abertas de subjugar o poder estatal aos seus interesses. Segundo Raúl Cervini, a atividade de lavagem de dinheiro tem impacto direto sobre as políticas econômicas públicas, seu planejamento e controle, produzindo desde fenômenos de hiper-reação dos mercados financeiros, tais como oscilações nas taxas de câmbio e juros, à contaminação da livre concorrência, condicionamento da liquidez do setor bancário, atingindo mesmo a independência econômica de alterar políticas macroeconômicas16. Estudos do Fundo Monetário Internacional apontam que a lavagem de dinheiro pode levar a erros na formulação de políticas econômicas, devido a falhas contidas nas informações estatísticas, em virtude do fluxo de capitais ilícitos praticado de forma clandestina, modificações na

9. Ver, a respeito, Jean Ziegler, A Suíça lava mais branco, págs. 25 e 26. 10. op. cit., p. 61 e 62. 11. Money Laundering: the Importance of International Countermeasures. 12. Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e do tráfico à economia global, p. 20. 13. Valores informados pelo Fundo Monetário Internacional, Word economic outlook database, april 2010. 14. Gerson José Morgado de Castro, op. cit., p. 29. 15. op. cit., p. 32. 16. Lei de lavagem de capitais, p. 59 e 60.

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demanda por moeda sem uma relação direta com mudan-

3 – As Tipologias Ligadas ao Comércio Internacional

ças nas variáveis econômicas correspondentes, volatilida-

Com o crescente controle das operações bancárias e o aperfeiçoamento dos controles e instrumentos jurídicos disponíveis para o combate à lavagem de dinheiro no sistema financeiro, é natural que as organizações criminosas busquem novos canais para movimentar recursos entre

de do câmbio e das taxas de juros devido às transferências imprevistas de recursos através das fronteiras, realizadas pelos “lavadores”, contaminação da estrutura dos ativos e passivos das instituições financeiras, distorções nos preços de bens e serviços, bem como a perda de credibilidade de atividades legais por sua contaminação pelas atividades criminosas17. Dessa forma, constata-se que a atividade de lavagem de dinheiro atinge a soberania nacional, na medida em que as políticas econômicas vêem-se prejudicadas pela atuação de grupos criminosos transnacionais, que, com a realização de movimentos internacionais de bens e recursos, sem fundamento econômico e no mais das vezes de forma clandestina, influenciam as variáveis econômicas sem que se encontrem as devidas motivações nas estatísticas oficiais disponíveis para a tomada de decisões no âmbito econômico. O comprometimento de tais políticas públicas leva, inexoravelmente, a prejuízos na persecução da redução das desigualdades regionais e sociais e na busca do pleno emprego, em virtude, também, do menor crescimento econômico gerado pela atividade de lavagem de dinheiro e as distorções por ela geradas nas variáveis econômicas do país. Aponta-se ainda, como efeitos negativos da criminalidade econômica, os chamados efeitos “ressaca” e “espiral”18: numa realidade econômica de forte concorrência, o primeiro ator econômico a praticar atividade delituosa acaba pressionando os demais a praticar novos delitos (efeito ressaca) e cada participante se converte também no centro de uma nova ressaca (efeito espiral), contagiando continuamente a atividade econômica de um

as fronteiras nacionais e dar-lhes uma aparência de legalidade. O próprio GAFI reconhece que a importância das operações de comércio internacional praticadas com esse objetivo tem sido subestimada pelas autoridades responsáveis pela repressão dessa conduta19. Entre os fatores de atratividade de tais operações para a lavagem de dinheiro, aponta-se a limitação de recursos das autoridades alfandegárias de diversos países para detectar as operações fraudulentas e de programas de trocas de informações entre as autoridades dos países envolvidos na operação comercial. O incremento do fluxo de mercadorias e o aumento no fornecimento de serviços internacionais propiciou um novo horizonte para essa atividade, escondendo operações fraudulentas destinadas exclusivamente a dar aparência de legalidade a riquezas criminosas, que se confundem com os milhões de outras operações normais de comércio internacional e outras tantas destinadas a realizar a evasão fiscal, de divisas, contrabando, descaminho, etc. As técnicas descritas nos relatórios de tipologias são as mesmas que, há décadas, são utilizadas para a movi-

país. Colaboram com tal realidade a consciência da enor-

mentação internacional de divisas com fraude aos controles oficiais. A primeira técnica - sobrefaturamento ou subfaturamento - permite manipular o envio de recursos para fora do país ou seu recebimento de outros países, tão somente pela alteração dos preços da transação, efetuando a lava-

me quantidade de delitos econômicos, os lucros por eles gerados, a leveza da legislação penal e da jurisprudência contra essa classe de criminosos e uma imagem benevolente da sociedade em relação aos criminosos de “colarinho branco”.

gem dos valores pelo “lucro” obtido na transação no país exportador (sobrefaturamento) ou importador (subfaturamento). A um só tempo, obtém-se a transferência de recursos criminosos de um país para outro e a lavagem de dinheiro sob a forma de falso lucro.

17. Raúl Cervini, op. cit., p. 104 e 105. 18. Bajo Fernández apud Callegari, André Luís. Direito penal econômico e lavagem de dinheiro: aspectos criminológicos, p. 25. 19. Trade based money laundering, passim. TRIBUTAÇÃO em revista

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A segunda técnica - múltiplo faturamento – consiste na emissão de mais de uma fatura para a mesma operação de comércio internacional, justificando múltiplos pagamentos para o mesmo embarque de mercadorias. Normalmente envolve distintas instituições financeiras para a remessa dos diversos pagamentos, de modo a não levantar suspeitas. Apresenta, em relação à primeira técnica, a vantagem de permitir a remessa dos recursos sem a necessidade de recorrer à fraude nos valores declarados às autoridades aduaneiras. Já a fraude quanto às quantidades embarcadas também vai permitir a transferência internacional de recursos, de forma similar à manipulação de preços, permitindo-se a transferência de valores ao país exportador pelo embarque de mercadorias em quantidade inferior ao declarado ou tal transferência ao país importador pelo embarque de quantidade superior. Por fim, a falsa descrição dos bens ou serviços, que permite a transferência de valores pelo embarque de bens de valores muito maiores ou menores que os descritos nos documentos. A título de exemplo, desejando transferir recursos ao exterior, o “lavador” de dinheiro realiza a importação de barras de chumbo, folheadas a ouro, descrevendo na documentação pertinente que se trata de barras de ouro. Deve-se atentar que não somente as modalidades ligadas à alteração de valores ou qualidade dos bens importados ou exportados servem ao “lavador”. Por vezes, a preocupação é simplesmente a introdução do bem no território, por seu valor real de aquisição, apenas como forma de reincorporar ao patrimônio do criminoso, recursos enviados ilicitamente ao exterior. Assim, deve-se observar que o criminoso, não raras vezes, envia seus recursos obtidos ilicitamente ao exterior por meios alternativos de remessa e lá adquire, em nome de “laranjas” ou de empresas de fachada bens, que serão posteriormente enviados ao País para aqui serem utiliza-

dos, sob o manto de aparente legalidade. Especial atenção deve ser dada à introdução de bens no País sob a forma de arrendamento, em admissão temporária para utilização econômica, já que, nessa modalidade, o criminoso pode utilizar-se do bem no País e ainda remeter divisas ao exterior, pagando a si mesmo, sob a forma de suposto pagamento de contraprestação do arrendamento, criando ainda uma despesa dedutível no Brasil20. Nesses casos, o Auditor-Fiscal deve ter especial atenção quanto à formação societária das empresas arrendadoras, buscando encontrar, quando possível, vínculos entre o arrendador e o arrendatário, tais como procuradores em comum, bem como atentar quanto à sua localização geográfica, tradição no mercado internacional de arrendamentos e portfolio de clientes. Acrescente-se, ainda, a realização de exportações fictícias, de serviços ou bens, relatada pelo GAFISUD21 como prática comum em nossa região. Nesse caso, a operação de comércio internacional é realizada exclusivamente em bases documentais, não ocorrendo a efetiva prestação de serviços ou o movimento físico de bens através das fronteiras nacionais, ocorrendo tão somente o movimento de capitais desejado pelo “lavador”. Tais tipologias, usualmente, são praticadas com a utilização de interpostas pessoas, como forma de dissimular os reais exportadores e importadores, servindo ainda à blindagem patrimonial e tributária dos reais operadores. Reveste-se também de especial relevância no trabalho de repressão aos ilícitos aduaneiros, com influência direta no combate à lavagem de dinheiro, a questão do contrabando de moeda e outros ativos, financeiros ou não, através das fronteiras nacionais22. A confirmação de tal realidade pode ser vista, no caso brasileiro, pela preocupação do legislador em coibir tal prática, cominando a pena de perdimento à moeda que entrar ou sair do País sem a devida declaração às autoridades aduaneiras23.

20. Tal tipologia era utiliza por Paulo César Farias, que se utilizava no Brasil de aeronaves arrendadas junto à empresa Miami Leasing, localizada nos Estados Unidos e controlada por próprio P.C. Farias. 21. Tipologias regionais GAFISUD - 2005. 22. Cita-se que, em 1992, dois contêineres foram apreendidos no Panamá, contendo US$ 7 milhões em dinheiro (p. 26) e que um traficante colombiano preso no Brasil teria relatado a autoridades brasileiras, em 1999, a existência de armazéns abarrotados de dólares em diversas cidades colombianas, conf. Rogério Pacheco Jordão, Crime (quase) perfeito: corrupção e lavagem de dinheiro no Brasil, p. 26. 23. Lei n.º 9065/95, art. 65.

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para a aferição do correto valor aduaneiro);

Essa modalidade não se resume ao transporte por “mulas” ou camuflado entre cargas internacionais, sendo utilizados serviços de correio ou de remessas expressas e de encomendas para proceder à movimentação internacional dos recursos. Nesse passo, cabe indicar que essa técnica pode ser utilizada para a introdução clandestina no País de outros instrumentos financeiros, como títulos e ações ao portador (nos países em que tais instrumentos são admitidos), cheques administrativos ou cheques de viagem, smart cards e instrumentos não financeiros, como jóias, obras de arte, antiguidades, pedras preciosas, ouro etc. Ciente de que tais tipologias são usualmente utilizadas

para a prática de outras fraudes, não necessariamente ligadas à prática da lavagem de dinheiro, apresentou o GAFI alguns indicadores para sua detecção (“red flags”), usualmente utilizados pelas administrações aduaneiras que colaboraram para a elaboração do estudo que serviu de ponto de partida para esta reflexão24, os quais, em aperta-

da síntese, são: UÊ

uma significativa diferença entre a descrição dos bens no conhecimento de carga e na fatura comercial; divergência entre a descrição dos bens em qualquer documento e o efetivamente apurado em conferência física das mercadorias; significativa diferença entre os valores declarados na operação e os usualmente praticados no mercado; incompatibilidade entre o volume transacionado em determinada operação e os volumes de negócios usuais das empresas envolvidas; operações envolvendo mercadorias de alto risco sob o ponto de vista da atividade de lavagem de dinheiro (bens de alto valor agregado, tais como produtos eletrônicos de consumo, que podem apresentar altas margens de lucro nas operações de comércio internacional, além de dificuldades

UÊ UÊ UÊ

mercadorias não usualmente comercializadas pelas empresas envolvidas na operação de importação ou exportação; operações que não aparentam ter sentido do ponto de vista logístico e econômico, como a utilização de contêineres de tamanho incompatível com o volume, natureza e valor das mercadorias; mercadorias embarcadas ou exportadas a partir de países de alto risco sob o ponto de vista da atividade de lavagem de dinheiro (v.g., aqueles considerados como “paraísos fiscais”); utilização de logística não usual na operação, como a passagem da mercadoria por diversos países sem aparente razão do ponto de vista econômico; condições e métodos de pagamento que aparentem um risco não usual para o tipo de transação, como importações financiadas pelo exportador sem garantias ou pagamentos adiantados de importações, sem um sólido histórico de operações anteriores entre as empresas; operações que envolvem pagamentos a terceiros sem aparente conexão com o negócio realizado; operações realizadas com frequentes alterações e postergações nas condições de pagamento; operações envolvendo empresas que aparentam serem “fantasmas” ou “de fachada”, por suas características, localização, composição societária, estrutura financeira, etc, utilizadas como interpostas pessoas.

4 - O Papel da Fiscalização Aduaneira na Prevenção e Combate a Lavagem de Dinheiro em Operações de Comércio Internacional. Ante o quadro exposto, é fácil perceber a importância da fiscalização aduaneira para a prevenção e o combate a tal atividade criminosa. No primeiro aspecto,

24. Entre elas a Secretaria da Receita Federal do Brasil.

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constata-se que a legislação avançou nos últimos anos, a

No âmbito do combate às operações de lavagem

partir da edição da Portaria MF n.º 350/2002, que deter-

de dinheiro, a atuação aduaneira apresenta ainda impor-

minou o estabelecimento de diretrizes de controle dos flu-

tantes deficiências, seja pela dificuldade própria dessa ati-

xos cambiais e da estrutura financeira das empresas que

vidade, seja pela carência de recursos e treinamento, seja

pratiquem atividades ligadas ao comércio internacional,

pelo foco dado à fiscalização dos despachos aduaneiros,

buscando evitar a utilização de empresas sem real capaci-

que obrigam o Auditor-Fiscal, por dever de ofício e sob

dade econômica. Nessa esteira, foram editadas as Instruções Normativas SRF n.º 228/2002, que estabeleceu procedimentos para a

pena de responsabilidade funcional e penal, a agir de for-

verificação da origem dos recursos aplicados em opera-

infrações aduaneiras, podem se referir à prática de quadri-

ções de comércio exterior e combate à interposição fraudulenta de pessoas e n.º 206/2002, que em seus artigos 65

lhas organizadas que atuem na lavagem de dinheiro. Em relação a essa última questão, ganha relevân-

a 69 (mantidos em vigor pela IN-SRF n.º 680/2006) prevê

cia o PLS n.° 150/2006, atualmente aguardando tramita-

os requisitos e condições para a instauração de procedi-

ção junto à Câmara Federal, que pretende reestruturar o

mento especial de controle aduaneiro no curso do despa-

combate ao crime organizado e prevê a realização de ação

cho de mercadorias importadas ou a exportar, no caso de

administrativa controlada. Tal instituto é de especial im-

suspeitas de ocorrência de infração punível com a pena de

portância para a atividade de fiscalização aduaneira, já que

perdimento. Não obstante o avanço, tais procedimentos focam, preferencialmente, o combate às fraudes aduaneiras, não se

garante ao Auditor-Fiscal que se depare com fortes indí-

prestando, diretamente, ao combate à lavagem de dinhei-

possibilidade de postergar a ação fiscal, como forma de

ro, embora de suas conclusões seja possível extrair impor-

recolher maiores elementos de prova, sem advertir pre-

tantes informações para tal objetivo.

viamente à organização criminosa que está sob o foco da

Outro instrumento de controle e prevenção à lavagem de dinheiro encontra-se na prévia habilitação do

fiscalização aduaneira, permitindo monitorar o fluxo das

operador de comércio internacional, que se apresenta

ponsáveis pelas operações realizadas, sem o risco de perda

como verdadeira implementação, no campo da fiscaliza-

de informações e destruição de documentos por parte dos

ção aduaneira, da política “conheça seu cliente”, aplicada

investigados.

ma imediata e individualizada sobre cada despacho no qual se apresentem situações que, a par de configurarem

cios de utilização de operação comercial fraudulenta para a lavagem de recursos originados em infrações penais, a

atividades fraudulentas e permitir encontrar os reais res-

pelas instituições bancárias na prevenção dessa modalidade de crime. Nessa fase, é desejável aplicar-se uma adequada ênfase à análise da composição societária e à forma de constituição do capital da sociedade que pretende realizar tais operações, em especial quanto a grupos empresariais controlados por pessoas físicas residentes ou empresas sediadas no exterior (em especial em “paraísos fiscais”), por meio de “procuradores profissionais” residentes no Brasil, e a existência no quadro social de sociedades do tipo holdings, factorings, administradoras de imóveis ou outras atividades de risco sob o ponto de vista da lavagem de dinheiro.

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5 – Conclusão Conforme se demonstrou, a prática da lavagem de dinheiro representa grave ameaça às soberanias nacionais, seja pelo exercício de um poder paralelo por grupos criminosos que controlam parcelas de território, seja pelos desequilíbrios que o fluxo de dinheiro “sujo” pode causar às economias nacionais. O combate a tal forma de criminalidade focou, inicialmente, o controle das instituições bancárias, por serem o meio mais comum para a movimentação e tentativa de ocultação da origem dos recursos, razão pela qual aqueles


que se dedicam à lavagem de dinheiro buscam, continua-

O papel do Auditor-Fiscal da Receita Federal do

mente, alternativas ao sistema financeiro, entre as quais o

Brasil nesse contexto, como autoridade aduaneira, ganha especial destaque, na medida em que atua não só

uso de operações de comércio internacional para a remessa de divisas e para a ocultação da origem e introdução dos recursos na economia formal. Diante desse quadro, a atuação das aduanas é impres-

no controle individual dos despachos aduaneiros, mas também como agente de inteligência fiscal, obtendo, compilando e compartilhando informações que pos-

cindível à garantia da segurança do território e da econo-

sam levar à identificação de operações de comércio

mia nacional, na medida em que a identificação das opera-

internacional que objetivem a transferência, ocultação e introdução de recursos criminosos, permitindo, por meio da atuação conjunta dos órgãos responsáveis pela repressão desse crime, desarticular organizações especializadas nesse tipo de ações.

ções que objetivam atingir tal intento possibilita, a um só tempo, garantir a higidez da economia nacional e a segurança do território, pelo estrangulamento dos fluxos financeiros dos grupos criminosos organizados transnacionais.

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TRIBUTAÇÃO em revista

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e ntrevista Vito Tanzi “Há muito menos incidência tributária nas operações internacionais. Mas a tributação internacional está se tornando cada vez mais importante com o passar do tempo.”

E

m recente visita ao Brasil para conferir palestra no Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, o conhecido economista italiano Vito Tanzi, especialista em tributação, concedeu a entrevista abaixo à TRIBUTAÇÃO EM REVISTA. Vito Tanzi, acadêmico e pesquisador respeitado em todo o mundo, doutor pela Universidade de Harvard, autor de diversos livros e artigos, consultor do Banco Mundial e Diretor do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI, tornou-se célebre ao analisar a defasagem temporal entre o fato gerador e a arrecadação do tributo, observando o efeito da inflação sobre esta última, fato este que se incorporou à teoria econômica e ficou conhecido como “efeito Tanzi”.

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TRIBUTAÇÃO em revista


Tributação em Revista –O Brasil tem uma das piores

TR - Após a crise econômica de 2008-09, quais são

distribuições de renda do mundo (10ª pior segundo o

os aspectos tributários mais relevantes nas relações

Índice de Gini levantado pelo PNUD) e uma elevada

econômicas internacionais? Como o Sr. vê a evolução

carga tributária (34,2% segundo cálculos do Sindi-

do fluxo internacional de capitais, de mercadorias e

fisco). Em situações como esta, especialmente em se

de fatores de produção e qual o papel que os tributos

tratando de países emergentes, como o Sr. vê o papel

exerceriam neste desenvolvimento? VT - Não há dúvida de que o fluxo de dinheiro contribuiu para a crise. Olhe para o que está acontecendo na Irlanda agora. Bancos irlandeses tomaram muitos empréstimos no exterior. Eles, então, emprestaram para investimentos em habitação e, em seguida, os preços dos imóveis entraram em colapso. Estão agora enfrentando grandes problemas. Por outro lado, grande parte do fluxo internacional de fatores de produção tem sido incentivado por baixos impostos. Nos EUA, por exemplo, os fundos de investimento são tributados com taxas muito pequenas. Provavelmente, a maioria dos administradores de fundos de investimento paga menos impostos do que os taxistas que os transportam. Deve haver um ajuste neste tipo de incentivo que tem sido dado às pessoas que têm altos rendimentos derivados do capital financeiro. Elas têm interesse em reduzir a incidência de tributos em nível internacional. O papel dos paraísos fiscais deve ser reduzido. Os paraísos fiscais desempenharam, provavelmente, um papel muito grande na crise porque as pessoas podiam depositar seu dinheiro nesses paraísos fiscais pagando menores impostos. E, então, a partir daí, elas faziam seus investimentos em vários países. Assim, a luta contra a maior incidência tributária em nível internacional não atrai interesse de quase ninguém, não chama muito a atenção nem gera muitas estatísticas. Há muito menos incidência tributária nas operações internacionais. Mas a tributação internacional está se tornando cada vez mais importante com o passar do tempo.

da política tributária? Ela poderia contribuir para amenizar o peso da carga tributária e as disparidades de renda? Vito Tanzi - Dois ou três breves comentários. O primeiro é que a tributação não costuma ir muito longe em termos de distribuição de renda porque é muito difícil tributar as pessoas muito ricas. Muito frequentemente o seu rendimento está associado ao capital e este capital tem grande mobilidade. Se o tributarmos pesadamente, os seus proprietários levam-no para fora do país. E, na verdade, este é um dos problemas na América Latina. A tributação da renda pessoal tem se mostrado relativamente ineficiente em gerar muita arrecadação. Mas neste contexto, quero dizer a coisa mais óbvia é utilizar principalmente os impostos sobre a renda pessoal para que eles sejam mais progressivos do que eles realmente são, tornando-os muito mais produtivos do que eles têm sido. Na América Latina os impostos sobre a renda não geram muita receita e não são realmente muito progressivos. Um uso maior do imposto sobre a renda pessoal seria muito benéfico em termos de distribuição de renda. O segundo comentário é que, em relação à receita arrecadada, deve ser feito um grande esforço para usar este dinheiro de forma eficiente com vistas à redistribuição de renda para os pobres. Isto significa melhorar a qualidade dos serviços públicos, evitando o desperdício de dinheiro. O ponto principal é que os impostos podem ser usados mais facilmente para reduzir a renda dos ricos do que para aumentar a renda dos pobres. Esta é uma observação importante a fazer. Há muito por fazer em termos da qualidade e incidência dos gastos públicos para aumentar a renda dos mais pobres. A redução da renda dos ricos tem muito mais a ver com a progressividade do imposto sobre a renda pessoal.

TR - Num contexto pós-crise não correríamos o risco de um crescimento do protecionismo com precedentes apenas na crise de 1929 que poderia levar a um bloqueio do comércio internacional? Qual o papel das barreiras tributárias e não tributárias neste con-

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texto? Há hoje um razoável nível de ordenamento via regras internacionais, como as definidas pela OMC. Contudo, não haveria o risco de os países entrarem em desespero e romperem com esta situação? VT - Este é claramente um grande problema. Há alguns textos sobre este assunto de economistas que escreveram sobre a grande depressão dos anos 30. Eles dizem que não haveria uma recessão que poderia levar a uma depressão e então a uma grande depressão, e que o que ocorreu foi essencialmente um movimento protecionista; que os países começaram a fechar suas economias estabelecendo barreiras à importação e assim por diante. Isto, talvez, tenha detido o início da nossa crise econômica. Têm aparecido estatísticas razoavelmente confortáveis a respeito. Li uma reportagem afirmando que uma instituição de pesquisas estava levantando as medidas protecionistas introduzidas por diferentes países e a última contagem era de que havia quatrocentas medidas protecionistas que vêm sendo implementadas por diversos países nos últimos dois anos. É preocupante o fato de que alguns países tenham promovido empregos em seu próprio território proibindo importações, incentivando o consumo de sua produção interna, dando subsídio às atividades domésticas, etc. Isto é algo preocupante e que eu espero estudar com mais atenção. TR - Uma primeira evidência neste sentido seria à barreira de mobilidade de mão-de-obra na Europa. Ela não poderia estender-se também ao comércio? VT - Não. Isso seria um desastre. Eu acho que seria um grande problema porque fecharia ainda mais as economias com menos comércio exterior, com menos exportações, trazendo menos eficiência para todo o sistema. Isto poderia realmente fazer com que a atual crise se torne muito pior do que tem sido. TR - A política neo-keynesiana de déficits públicos crescentes, especialmente para o combate aos efeitos da crise econômica de 2008-09, já chegou ao seu limite? Os governos têm gastado além do seu limite? Que implicações esta política anticíclica teria sobre

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a carga tributária? Estamos condenados a um crescente nível de tributação? VT - Esta é uma questão com a qual eu comecei a lidar recentemente. Participei da Conferência Anual sobre Pesquisa da Comissão Européia, em Bruxelas, e também participei de uma conferência similar no FMI. Minha opinião é que a economia Keynesiana, as despesas Keynesianas, funcionam bem quando as condições iniciais são boas. Se um país que não tem elevada dívida pública, não têm elevados déficits fiscais, entrar em recessão, então o governo pode gastar e também pode reduzir impostos sem maiores consequências. Mas se o país já tem um déficit fiscal substancial e uma dívida pública elevada, então esta possibilidade torna-se menos viável porque quando o governo começa a realizar despesas e aumenta o déficit fiscal, ele assusta o mercado. Os investidores começam a se preocupar com a sustentabilidade da política do governo e fazem menos investimentos. Então, não se ganha muito com essa política. Quem mora nos Estados Unidos abre seu jornal todos os dias e lê que as pessoas estão assustadas com o déficit fiscal, com a dívida pública e com o futuro. Então, nessas condições, as pessoas não investem. Esperam para ver o que vai acontecer. E isto é exatamente o que está acontecendo. Esta é a razão pela qual não há muito investimento nos EUA e grandes hiatos no nível de emprego. É por isso que temos que pensar cuidadosamente sobre o que fazer no futuro. Aumentar o nível de tributação para corrigir o déficit é tecnicamente possível em alguns países. Se os EUA aumentarem impostos, poderiam resolver o problema do déficit orçamentário da noite para o dia. Mas não é provável que os políticos americanos permitam que isto aconteça. Portanto, é muito difícil antever como os EUA sairão desta grande confusão fiscal, com um déficit em 10% do PIB e uma dívida pública que em poucos anos poderá atingir cem por cento. É realmente um grande problema. TR - Os EUA têm inundado o mundo com dólares. O Brasil vive uma situação inédita em sua história econômica, batendo recordes de acúmulo de reservas in-


ternacionais. Esta não seria uma forma de exportar a sua crise (americana) para os países periféricos? VT - Os EUA criaram, desde a década de 1990, essa tradição de que a solução dos seus problemas econômicos sempre tem que vir de fora. E eles tentaram fazer isso agora com esta expansão dos dólares promovida pelo FED (Banco

e União Européia, têm futuro? A racionalidade econômica (aumento de impostos, corte de gastos, etc.) conseguirá se impor e controlar algumas áreas instáveis economicamente como Grécia, Portugal, Irlanda? VT - O problema original é que eles fizeram a união mo-

Central dos EUA). E, bem, isso claramente criou um grande problema para todos os países. E para o Brasil este é um grande problema porque as pessoas têm muita liquidez e estão procurando por um bom investimento. E se alguém puder investir no Brasil, em bônus brasileiros, ganha 10%.

netária, mas deixaram muita flexibilidade na área fiscal

Então, esta é claramente uma boa oportunidade para investidores internacionais. Mas ao mesmo tempo, isso cria alguns problemas para o Brasil, porque na medida em que o dinheiro vem para o Brasil, começa a contribuir para a inflação e outros problemas. Então este é claramente um problema que os EUA, em parte, estão criando. Quero dizer, eles

Mas, ao mesmo tempo não seguram os seus gastos. A polí-

desempenham um papel mais importante do que China e outros. A China é certamente parte do problema quando os chineses mexem na sua taxa de câmbio. Mas não podemos culpar apenas os chineses. A política americana tem muita responsabilidade neste assunto.

vêm e financiam as dívidas destes países. Mas isso não vai

para os países, individualmente. Assim, países como Grécia, Portugal e a Irlanda, em certa medida, como parte da união, e usando a mesma taxa de câmbio, beneficiam-se, dentre outros fatores, com uma queda na taxa de juros. tica fiscal tornou-se muito flexível. A Grécia tem uma dívida elevada, e todos eles têm um elevado déficit fiscal. Esta é a situação atual. O elevado déficit fiscal começa a criar problemas para eles. Quais são as alternativas? A alternativa número um é Papai Noel, que seriam os alemães. Eles acontecer. Então, eles têm que se voltar para a política interna. Os gregos têm que aprender que não podem correr na mesma velocidade dos alemães, esperando que os alemães os subsidiem. Eles não podem ter baixos impostos para os ricos, enquanto que os alemães pagam impostos

TR - Como o Sr. vê o futuro do Euro? A unificação da moeda européia tirou a autonomia dos países europeus de fazerem política monetária. Ambos, Euro

muito mais elevados. Assim, a crise trará alguns ajustes necessários para alguns destes países. Eles aprendem com a realidade.

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a RTIGO Introdução do Operador Econômico Autorizado no Sistema Aduaneiro Brasileiro1 Antonio Cesar Bueno Ferreira2 Jorge Alberto Teixeira3

1 – Introdução

pliance aduaneiro, o combate à lavagem de dinheiro na

Seguindo uma tendência mundial de agilização do fluxo das operações de comércio exterior, o governo brasileiro pretende instituir um programa brasileiro de Operador Econômico Autorizado (OEA), denominado Programa Aduaneiro de Segurança, Controle e Simplificação – PASS, tendo por base a estrutura normativa da Organização Mundial das Aduanas (OMA) relativa aos padrões de segurança da cadeia logística, tendo sido renomeado para Operador Econômico Qualificado (OEQ), em decorrência do Código Aduaneiro do Mercosul (CAM), instituído pela Decisão nº 27/10 do Con-

constituição de sociedades empresárias e a segurança da cadeia logística como condições e requisitos para adesão ao regime. Em razão da limitação imposta na delegação legislativa para a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), o alcance da Nova Linha Azul limitou-se a importadores e exportadores.

selho do Mercado Comum do Mercosul. Registre-se que já em 2004 a chamada, “Nova Linha Azul”, instituída pela IN SRF nº 476/2004, introduziu no sistema aduaneiro brasileiro a auditoria de controles internos, a gestão da taxa de regularidade fiscal, o com-

2005, e colocar em vigor o seu respectivo programa a

Este trabalho foi implementado antes de o Conselho da OMA, em 2005, adotar normas destinadas a assegurar e a incrementar o fluxo crescente do comércio internacional, e antes de a União Européia aprovar o novo conceito de Operador Econômico Autorizado, em partir de 2008. A Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 497/2010, em seu item 43, reconhece que o Despacho Aduaneiro Expresso - Linha Azul, segue a orientação

1. Artigo originalmente apresentado como tese ao CONAF 2010 – Congresso Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil 2. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. 3. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.

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internacional de Operadores Econômicos Autorizados,

assim como aos dispositivos contidos no acordo estabe-

como segue:

lecido no âmbito do Mercosul. Senão, vejamos. O inciso III do artigo 273 do atual Regimento Interno da RFB estabelece que ao seu Secretário incumbe a expedição de atos administrativos de caráter normativo sobre assuntos de competência da RFB.

43. Fundamentalmente, o Linha Azul é um procedimento simplificado que propicia às empresas habilitadas um menor percentual de seleção para os canais de verificação amarelo e vermelho e conferência aduaneira das declarações selecionadas realizada prioritariamente, inclusive com compromisso de tempo máximo para essa conferência estipulado. Esse procedimento segue a orientação internacional de Operadores Econômicos Autorizados - OEA, ou seja, de credenciamento de operadores legítimos e confiáveis para operar no comércio exterior com menores entraves burocráticos.

Nesse contexto, buscamos analisar as condições necessárias à implantação do referido programa, tendo por base as regras estabelecidas no regime da Nova Linha Azul, de que trata a IN SRF nº 476/2004, já reconhecidas por empresas e institutos de auditora independente no Brasil e no Exterior como normas de excelência na qualificação de seus usuários. Constatamos, inicialmente, a necessidade de se instituir o programa OEA no Brasil através de lei, instrumento jurídico adequado ao fim colimado. Antevemos a necessidade de utilização de grande quantidade de mão de obra fiscal, onerando sobremaneira o já comprometido efetivo de Auditores-Fiscais alocados na aduana em benefício de um reduzido número de operadores. Destacamos a necessidade de participação de auditoria externa nos procedimentos de certificação e verificação da regularidade das empresas autorizadas, e enfatizamos o impacto nos recursos humanos e materiais da Aduana e a necessidade de custeamento do programa pelos próprios operadores beneficiários. 2 – A Legalidade Cumpre registrar que o programa de Operador Econômico Autorizado no Brasil, bem como a gestão do referido instituto, deve ser introduzido por lei em sentido estrito, em observância à dispositivos constitucionais

Os artigos 578 a 579 e 595 do Decreto nº 6.759/2009, atual Regulamento Aduaneiro, tratam da simplificação do despacho aduaneiro de importação e de exportação que, em decorrência da matriz legal no artigo 52, caput, do Decreto-Lei nº 37/1966, delegam tal competência a RFB. Denota-se que a delegação de competência para a RFB é para expedir atos que tratem da simplificação do despacho aduaneiro de importação ou de exportação alcançando apenas e tão somente importadores e/ou exportadores que podem figurar como titulares dos despachos aduaneiros. Esta delegação legislativa alcança um único e específico procedimento fiscal: o despacho aduaneiro. Por conseguinte, os demais procedimentos fiscais aduaneiros não são alcançados por esta delegação legislativa, assim como a mesma não autoriza a RFB a expedir certificações de qualquer espécie ou nível para os operadores da cadeia logística no Brasil. O item 1 do artigo 22 do Anexo da Diretriz do MERCOSUL/CCM nº 32, de 2008, estabelece que as Administrações Aduaneiras poderão estabelecer medidas de facilitação para operadores que cumpram com requisitos exigidos na legislação aduaneira. Entretanto, a delegação é para estabelecer medidas de facilitação e não para efetuar certificação que implica em reconhecimento de um fato ou direito. Desta forma, os requisitos para ser um operador serão definidos na legislação de cada Estado membro, em consonância com o seu sistema jurídico. Já o Código Aduaneiro do Mercosul aprovado pela Decisão CMC/MERCOSUL nº 27/2010, de 02/08/2010, em seu artigo 15 criou o instituto do “Operador Econômico Qualificado”, no âmbito do Mercosul, como segue:

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Federal de 1988. Artigo 15 - Operador econômico qualificado A Administração Aduaneira poderá instituir procedimentos simplificados de controle aduaneiro e outras facilidades para as pessoas vinculadas que cumpram os requisitos para ser consideradas como operadores econômicos qualificados, nos termos estabelecidos nas normas regulamentares.

Verifica-se que os gestores do Mercosul não instituíram normas comuns para todas as Administrações Aduaneiras tratando da certificação de operador econômico qualificado ou autorizado. Cada Estado membro fixará suas normas, nos termos da sua legislação interna até a aprovação de um acordo sobre a matéria no âmbito do Mercosul. Em ambas as decisões a delegação de competência é para a Administração Aduaneira instituir procedimentos simplificados de controle aduaneiro e outras facilidades para pessoas que cumpram requisitos exigidos na legislação aduaneira ou estabelecidos em normas regulamentares. Entretanto, não há delegação de competência para a própria Administração Aduaneira fixar normas para certificação de operador econômico autorizado ou qualificado. A instituição da certificação de uma pessoa física ou jurídica com o título de operador econômico autorizado ou qualificado implica a criação de um novo instituto na administração tributária brasileira, a intervenção e regulamentação do exercício de uma atividade econômica e a criação de uma titulação ou estatuto que dá ao seu possuidor um tratamento diferenciado em relação à administração aduaneira, alcançando outros procedimentos fiscais além do despacho aduaneiro, inclusive instituindo um sistema de parceria público-privado. A certificação de operador econômico autorizado ou qualificado implica em reconhecimento de um benefício administrativo que só pode ser instituído por lei, salvo nas hipóteses de delegação legislativa específica. Essa matéria é reservada a lei ordinária, conforme o disposto no inciso II, do artigo 5º, no artigo 37 e na alínea “b”, do inciso II, do § 1º do art. 61 da Constituição

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Desta forma, entendemos, s.m.j., que a introdução e gestão do instituto do OEA ou OEQ no sistema aduaneiro nacional necessita de lei prévia regulamentando a matéria por força dos dispositivos constitucionais e do acordo estabelecido no âmbito do Mercosul. 3 – Da Inserção do Operador Econômico Autorizado Para Melhorar a Atuação da Aduana e Melhoria dos Serviços Aduaneiros Diante da implantação do programa de operador econômico autorizado na União Européia, do C-TPAT(Customs-Trade Partnership Against Terrorism) nos Estados Unidos da América e da Estrutura Normativa da OMA para a Segurança e a Facilitação do Comércio Internacional, não há como o Estado brasileiro não implantar o seu programa de operador econômico autorizado, devendo o País adotar os procedimentos necessários à sua inclusão nessa tendência mundial de agilização do fluxo comercial entre as nações. Resta salientar que a falta de um acordo no âmbito do Mercosul estabelecendo normas comuns a todos os Estados membros contendo as condições, requisitos, obrigações e vantagens para concessão do estatuto ou certificação de OEA ou OEQ não inviabiliza a sua implantação imediata no Brasil. A Estrutura Normativa da OMA estabelece condições e obrigações para a Aduana e o OEA, entre as quais se destacam a prova de conformidade com as obrigações aduaneiras; sistema satisfatório de gestão dos registros comerciais; viabilidade financeira; consulta, cooperação e comunicação; troca de informação, acesso e confiabilidade; segurança da carga; segurança dos meios de transporte; segurança das instalações; segurança dos parceiros comerciais; avaliação, análise e aperfeiçoamento, entre outras. Para viabilizar a adesão ao programa, poderão ser oferecidas várias vantagens aos OEA como: 1) medidas destinadas a acelerar a liberação da carga, redução da duração do trânsito e diminuição dos custos de armaze-


nagem; 2) permissão ao OEA de acesso as informações

mércio exterior.

de seu interesse, nos termos do artigo 198 da Lei nº 5.172/1966 - CTN; 3) medidas especiais em períodos

Para solicitar sua certificação, o operador deverá, antes de apresentar a sua solicitação à RFB, efetuar uma auto-avaliação, avaliando a sua conformidade com os

de interrupção do comércio ou elevado nível de ameaça e 4) exame prioritário para participação em todos os novos programas de processamento da carga. Não obstante, na instituição de um programa de OEA no Brasil seria de boa prática de gestão tributária manter os fundamentos que foram introduzidos com a Nova Linha Azul. Entendemos que esses fundamentos deveriam nortear a conduta dos agentes da cadeia logística, especialmente à taxa de regularidade fiscal elevada, o compliance aduaneiro alto, a auditoria de controle interno nas atividades relacionadas ao comércio exterior, registros e escrituração contábil confiáveis, auditoria externa das demonstrações financeiras e contábeis, garantia de acesso direto e irrestrito da fiscalização

critérios e requisitos a serem estabelecidos pela Receita Federal do Brasil, devendo estar apto a responder de forma positiva às questões consideradas imprescindíveis à certificação do interessado. Apresentada a solicitação, compete à Aduana proceder à sua análise e verificação de conformidade com a legislação e certificar o operador, caso esteja conforme, além de efetuar a revisão, manutenção e monitoramento do OEA, nessa qualidade. É importante frisar que a minuta não especifica quais os procedimentos devem ser adotados pela Aduana para esse desiderato, limitando-se a mencionar que o operador deverá custear as despesas necessárias às

da RFB aos sistemas informatizado de contabilidade, de estoques e de comércio exterior, combate à lavagem de dinheiro e alto nível de governança corporativa. Em relação a estes fundamentos detectamos o seu reconhecimento pelo mercado como, por exemplo: 1º) O “roteiro e relatório de auditoria sobre controles

atividades de certificação, tais como auditorias e diligências efetuadas pelos servidores da RFB. Como se vê, tais atividades são típicas do Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, que deverá proceder às auditorias e diligências necessárias à certificação do operador econômico no PASS, para que a Adminis-

internos para habilitação à Linha Azul” (IN SRF nº

tração Aduaneira lhe conceda o direito a usufruir tratamento procedimental diferenciado em suas operações

476/2004), foi objeto do Comunicado Técnico do Instituto dos Auditores Independentes do Brasil - IBRACON nº 02/2007. Tivemos o reconhecimento de uma norma de auditoria elaborada pela RFB como integrante das normas de auditoria do País e do universo de

vinculadas ao comércio exterior. Não obstante, entendemos que a segurança dos procedimentos de certificação não pode se sustentar apenas

trabalho dos auditores independentes;

em duas vertentes: Aduana <-> empresa. A autorização a ser outorgada pela RFB ao operador econômico terá

2º) O artigo “Programa Linha Azul foi discutido em

um grande peso na sua condição perante o mercado,

Bruxelas” publicado no “Tax View” nº 20, de ju-

na medida em que este receberá uma espécie de salvo

nho/2008 da Ernst Young, a respeito de “compliance

conduto frente os órgãos intervenientes nas operações de comércio exterior, eis que estará capacitado a obter

aduaneiro”. Conforme dispõe a minuta da IN do PASS, são passíveis de certificação no programa o importador ou

a chancela de operador seguro na cadeia logística do

operadores de unitização e desunitização de cargas e

comércio internacional. Nessa esteira, a exemplo de outras instituições (CVM e Bovespa, em relação a balanços, demonstrações financeiras e governança corporativa), entendemos ser

outros integrantes da cadeia logística no fluxo do co-

necessário incluir no processo de certificação do OEA a

exportador brasileiros, o depositário, o operador portuário, o transportador, o despachante aduaneiro, os

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exigência da participação de auditoria externa, contratada pela própria interessada, que também deverá assumir a responsabilidade pela validação das declarações prestadas pela sociedade empresária (contribuinte), assim como da sua taxa de regularidade fiscal, dos seus níveis de compliance aduaneiro e de governança corporativa, comprometendo-se conjuntamente com esta perante a Administração Aduaneira. Essa forma tripartite de controle objetiva dar maior transparência ao processo de certificação, conferindo à RFB e aos próprios Auditores-Fiscais a necessária segurança nessa atribuição de certificação do OEA e sua

midade de sua atuação com a condição apresentada na solicitação da certificação. Ou seja, a auditoria externa não pode elidir a Administração Aduaneira de executar ações fiscais e diligências que entender necessárias, através da atuação de seus Auditores-Fiscais. 4 – Do Custeamento da Gestão do OEA É cediço que todas as despesas necessárias às atividades de certificação, tais como auditorias, diligências efetuadas pelos servidores da RFB deveriam ser custeadas pelo próprio operador, por exemplo, por meio de ressarcimento ao Fundo Especial de Desenvolvimento e

conforme exposto no já citado artigo “Programa Linha

Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização – FUNDAF (art. 6º do Decreto-Lei nº 1.437, de 1975). Entretanto, é preciso estabelecer que o ressarcimento ao FUNDAF seja suficiente para custear, não só as

Azul” da Ernst Young, publicado no “Tax View”, in verbis:

despesas necessárias às atividades de certificação (audi-

Para o sócio, o selo Linha Azul será comparável, em um futuro próximo, à obtenção do ISO no quesito busca constante pela qualidade. “É um caminho sem volta. E, certamente, as empresas vão divulgar amplamente a obtenção do Linha Azul como um diferencial”, completa.

torias e diligências efetuadas pelos servidores da RFB), mas também, e principalmente, o necessário incremento do efetivo fiscal para fazer frente a essas atividades específicas, além do investimento em capacitação, indispensável à execução dessas atribuições. Com efeito, como já visto, ficará ao encargo da RFB,

manutenção no sistema. A exemplo da Linha Azul, a certificação como OEA será comparada com a obtenção de uma certificação ISO,

Da mesma forma a assegurar a qualidade da certificação, as atividades de revisão, de manutenção e de monitoramento do OEA também devem estar submetidas aos procedimentos de auditoria periódicos, em especial, de controles internos e de compliance aduaneiro,

não só as atribuições de análise, verificação de conformidade da solicitação e conseqüente certificação, como também a revisão, a manutenção e o monitoramento do

com a devida participação de auditoria externa contratada pela própria interessada, em sistema de rodízios de auditores (das empresas de auditoria e de auditores). As condições necessárias para obtenção da certificação do OEA devem ser mantidas durante todo o período em que a empresa estiver operando nessa qualidade,

E, é óbvio que o exercício desses controles, de forma segura e efetiva, demandará expressiva qualificação da mão-de-obra fiscal e de apoio, inclusive com treinamentos constantes no Brasil e no exterior. A subtração de parte do efetivo atual das suas atribuições na Aduana brasileira para essas atividades po-

pelo que a transparência de suas operações deve sempre ser passível de verificação. Deveras, os benefícios de agilização e facilitação da atuação do OEA na cadeia logística não podem obstar que, a qualquer tempo, a RFB proceda às diligências que entender necessárias para verificação da confor-

deriam ser compensadas com uma substancial melhora

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OEA, assim como o reconhecimento mútuo da qualidade de OEA, quando aplicável.

na taxa de regularidade aduaneira, quer em relação às obrigações principais quer em relação às obrigações acessórias, no nível de compliance aduaneiro, no nível de governança corporativa, ocasionando um incremento na qualidade da gestão da Administração Aduaneira.


Não se pode olvidar que os benefícios administrati-

intervenientes na cadeia logística, incluídos seus sócios

vos advindos da condição de OEA, com a melhora no fluxo das mercadorias importadas ou a exportar, implicariam em significativa redução de custos operacionais, sendo absolutamente razoável que sua condição privilegiada em relação a outros operadores econômicos que

e executivos, que estão sendo investigados sob inquérito policial ou foram denunciados ou condenados, em qualquer grau, pelos crimes de descaminho ou contrabando, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e de crime organizado ou organização criminosa, de que trata a

também atuam no comércio internacional seja por eles, custeada de forma integral.

Convenção de Palermo. A Receita Federal estará anuindo com a qualidade de operador seguro à empresa certificada no PASS, ou

5 – Conclusão É indiscutível a necessidade de o Brasil ampliar o Regime de Despacho Aduaneiro Expresso - Linha Azul,

seja, empresa parceira da Aduana. É preciso eliminar qualquer possibilidade de um operador certificado estar envolvido ou se envolver, direta ou indiretamente, com

instituindo um programa de operador econômico au-

fraudes, narcotráfico, financiamento ou favorecimento

torizado, visto que este tipo de programa vem sendo

ao terrorismo, lavagem de dinheiro, crime organizado,

adotado pelas principais nações, com as quais mantém intensas relações comerciais. Na busca de incremen-

qualquer forma de contrabando ou descaminho e ou-

to do comércio internacional, o Brasil precisa se inserir nas novas tendências de políticas voltadas à agilização e segurança do fluxo comercial no mundo do século XXI. Não obstante, as vantagens oferecidas para adesão ao programa devem estar amparadas em compromissos de regularidade fiscal, compliance aduaneiro, segurança da cadeia logística, transparência, auditoria de contro-

tras condutas criminosas. Ademais, qualquer norma legal no âmbito do comércio internacional deve seguir as recomendações estabelecidas pelo GAFI (Grupo Internacional de Ação Financeira), na matéria de prevenção de repressão à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. Nesse contexto, é preciso sempre ter em vista a presença do Auditor-Fiscal como agente essencial na idealização,

les internos, solvência financeira, governança corporativa, entre outros, de forma que a certificação não possa alcançar contribuintes inidôneos ou com condutas potencialmente lesivas aos interesses da coisa pública e da economia nacional.

preparação, e desenvolvimento do processo, bem como na

De igual forma esta certificação não pode alcançar empresas com sócios em paraísos fiscais ou em países ou dependências que não tributem a renda ou que a

instalação e manutenção do sistema, com investimento em

tributem à alíquota inferior a 20% (vinte por cento) ou, ainda, cuja legislação interna não permita acesso a informações relativas à composição societária de pessoas

cos autorizados, exclusivos beneficiários do programa. A parceria deve estar calcada não apenas em um requerimento com respostas a um ou mais questionários,

jurídicas ou à sua titularidade. Também, não pode alcançar empresas com sócios sediados em regimes fiscais privilegiados de que trata o artigo 2º da Instrução Normativa RFB nº 1037, de 2010, ou que são constituídos ou regidos segundo a legislação destes.

mas em um conjunto de compromissos assumidos, pe-

É indiscutível que a certificação não pode alcançar

fiscalização e controle das empresas certificadas no PASS. Vale lembrar que nenhum sistema informatizado ou certificação substitui o trabalho do AFRFB. E o custeamento da gestão do programa de OEA (pela tecnologia, incremento da mão-de-obra fiscal, etc.) deve ser suportado, integralmente, pelos operadores econômi-

los dirigentes das empresas e de seus sócios, associados à real atuação da Aduana na verificação do cumprimento das normas estabelecidas, através do trabalho efetivo dos seus Auditores-Fiscais e obediências aos ditames constitucionais.

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REFERÊNCIAS COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS. Recomendações da CVM sobre governança Corporativa. Rio de Janeiro, 2002. INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA CORPORATIVA. Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. 4. ed. São Paulo: IBGC, 2009. INSTITUTO DOS AUDITORES INDEPENDENTES DO BRASIL. Comunicado Técnico IBRACON Nº. 02/2007. Despacho Aduaneiro Expresso (Linha Azul). RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Menos burocracia, mais eficiência no comércio exterior - Despacho Aduaneiro Expresso: agilidade e ganhos financeiros para empresas importadoras e exportadoras. [S.l]: Deloitte

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Touche Tohmatsu, 2009. Disponível em: www.deloitte. com.br. Acesso em: 16 fev. 2011. SOX: Entendendo a Lei Sarbanes-Oxley: um caminho para a informação transparente. Tradução Vania Maria da Costa Borgerth. São Paulo: Cenggape Learnig, 2008. ERNST & YOUNG. Tax View, Reino Unido, n. 20, jun. 2008. Disponível em: <http://www.ey.com.br/BR/pt/ Home>. Acesso em: 16 jan. 2011. JÚNIOR, J.P.B.; MORO, S.F. et al. (org.). Lavagem de Dinheiro: comentários à lei pelos juízes das varas especializadas em homenagem ao Ministro Gilson Dipp. Livraria do Advogado Editora: Porto Alegre, 2007.


a RTIGO A Fiscalização nas Zonas de Processamento da Exportação (ZPE) da Aduana Brasileira: novas obrigações tributárias acessórias1 Albino Carlos Martins Vieira2

1 – Introdução

alta qualidade e expandir o mercado de trabalho formal.

A Constituição Federal de 1988 atribui ao Estado brasileiro o desafio de expandir o bem-estar de todos, com uma existência digna, sob os ditames da justiça social. Para tanto, o constituinte prescreveu que a Ordem Econômica deve observar, entre outros, os princípios da redução das desigualdades regionais e da busca do pleno emprego. Alguns países, com intento de enfrentar tal desafio, adotaram a instalação de zonas de processamento de exportação (ZPE) em seus territórios, para atrair novos investimentos industriais nacionais, estrangeiros ou associados (joint-ventures3); expandir o comércio internacional, com a diversificação da pauta das exportações, bem como introduzir novas tecnologias de produção e de produtos de

Assim, considerada a experiência internacional, a adoção das ZPE para as regiões menos desenvolvidas do nosso País pode representar uma alavancagem das potencialidades econômicas dessas áreas. No entanto, tal expansão econômica não pode ser alcançada à custa do aumento dos riscos fiscais ou mesmo da perda dos controles aduaneiros e fiscais desenvolvidos ao longo de tantos anos pela Receita Federal, sob pena de se colocar a arrecadação tributária federal em risco com a disseminação de fraudes fiscais. Tudo isso reforça a importância do estudo da matéria pelos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, em face de seu papel perante a sociedade brasileira de alertar

1. Artigo originalmente apresentado como tese ao CONAF 2010 – Congresso Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil 2. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil em exercício na DRF-Recife. Graduado em Engenharia Eletrônica (1992), Administração de Empresas (1996) e Direito (2002) pela Universidade Federal de Pernambuco. Cursando a Especialização em Direito Administrativo pela Universidade Federal de Pernambuco. 3. Joint-Venture é uma associação entre empresas (ou outras organizações) não concorrentes, com o fim de partilharem o risco de negócio, os investimentos, as responsabilidades e os lucros associados a determinado projeto, comumente relacionado ao desenvolvimento tecnológico. As joint ventures podem resultar em criação de nova personalidade jurídica (corporate joint ventures) ou não (non corporate joint ventures). No Brasil, as corporate joint ventures são denominadas de sociedade de propósito específico.

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os riscos, vantagens e desvantagens envolvidas nesse novo

2.2 – Quadro das ZPE no Brasil

momento de expansão econômica e de investimentos estrangeiros.

Após a malsucedida tentativa de implantação das ZPE no final dos anos oitenta6, o Brasil reformou as medidas

2 – Zona de Processamento de Exportação (ZPE)

legais para instalação desses polos de industrialização em regiões menos desenvolvidas, com foco no mercado externo, atualizando os benefícios fiscais, administrativos

2.1 – Conceito e Classificação A ZPE é um tipo de zona de livre comércio, geralmente instalada em países em desenvolvimento, com o fim de promover as exportações. Para conseguirem seu intento, as políticas governamentais asseguram incentivos fiscais, cambiais e administrativos. Pode ser também denominada de zona de desenvolvimento econômico ou zona econômica especial. No Brasil, de acordo com os regramentos existentes, adota-se o conceito de ZPE de pequena área4, correspondendo a áreas delimitadas, nas quais empresas produtoras de bens industrializados destinados à exportação recebem incentivos tributários e administrativos. Deve-se ressaltar que a ZPE não se confunde com a Zona Franca de Manaus5, nem com as estações aduaneiras interiores (portos secos). Nome da zpe ZPE DE SUAPE ZPE DE MACAÍBA ZPE DO SERTÃO ZPE DE PECÉM ZPE DE ARACRUZ ZPE DE BATAGUASSU ZPE DE BOA VISTA ZPE DE FERNANDÓPOLIS ZPE DE PARNAÍBA ZPE DO ACRE

e cambiais. Ao contrário do que ocorreu no Brasil, em dezenas de países, mediante o programa de criação de ZPE, verificou-se a instalação de novos parques industriais em áreas específicas, com a expansão da atividade econômica e dos fluxos comerciais internacionais, bem como a ampliação do mercado formal de trabalho e maior difusão tecnológica. Com a aprovação da Lei nº 11.508/2007, foi conferido novo fundamento legal para as ZPE, com a definição dos intervenientes e dos requisitos exigíveis das empresas ali instalados. A regulamentação da Lei ocorreu com o Decreto nº 6.634/2008 e com o Decreto nº 6.819/2009. Desde a edição da Lei até 1º de julho de 2010, o Presidente da República já autorizara a instalação de dez novas ZPE no território nacional7, assim distribuídas:

Local JABOATÃO DOS GUARARAPES / PE MACAÍBA / RN ASSÚ / RN SÃO GONÇALO DO AMARANTE / CE ARACRUZ / ES BATAGUASSU / MS BOA VISTA / RR FERNANDÓPOLIS / SP PARNAÍBA / PI SENADOR GUIOMARD / AC

Área (hectares) 198,84 125,70 1.019,98 4.271,41 162,35 200,00 166,74 121,00 313,57 130,12

Data do decreto 27/01/2010 27/01/2010 10/06/2010 16/06/2010 30/06/2010 30/06/2010 30/06/2010 30/06/2010 30/06/2010 30/06/2010

4. “Small Area EPZ”. Por outro lado, no exemplo chinês, há as “Wide Area EPZ” (ZPE de extensa área) que ocupam até trinta e três mil quilômetros quadrados, contendo cidades inteiras, com população residente e estruturas da administração pública, autoridades legislativas e judiciárias. (HAYWOOD, Robert. Pre-feasibility Study of an Export Processing Zone in Vanuatu, 2003). 5. Área específica na cidade de Manaus (na Amazônia Ocidental), que atua como área de livre comércio, de importação e exportação, com o objetivo de fomentar o desenvolvimento comercial, industrial e agropecuário da região. 6. Possibilidade de instalação de ZPE, criada pelo Decreto-Lei nº 2.452, de 29 de julho de 1988, regulamentado pelo Decreto nº 846, de 25 de junho de 1993. No entanto, por pressões do empresariado nacional, o governo desistiu de estimular a instalação das zonas de exportação. 7. Resolução CZPE nº 01, de 26 de maio de 2010. “Art. 4º As ZPEs deverão ser criadas em áreas localizadas em regiões menos desenvolvidas. Parágrafo único. Para efeitos da política das ZPEs, serão consideradas regiões menos desenvolvidas: I - todos os municípios das regiões Norte, Nordeste e Centro- Oeste, bem como os municípios dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo pertencentes à área de atuação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE; II - os municípios das regiões Sul e Sudeste localizados em microrregião pertencente aos Grupos 4 - Sub-Região de Baixa Renda, 3 - Sub-Região Estagnada ou 2 - Sub-Região Dinâmica, conforme tipologia estabelecida pela Política Nacional de Desenvolvimento Regional - PNDR, constante do Anexo II do Decreto No- 6.047, de 22 de fevereiro de 2007; III - os municípios das regiões Sul e Sudeste, exceto as capitais dos Estados dessas duas regiões, quando a participação do valor adicionado bruto da indústria do município no valor adicionado bruto total do município for inferior à participação do valor adicionado bruto da indústria brasileira no valor adicionado bruto do País, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)”.

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O funcionamento das ZPE está baseado em um modelo de gestão de negócios com três tipos de participantes, pelo qual cada um detém atribuições e responsabilidades específicas. O referido modelo pode ser representado desta forma:

limitar a área de atuação da RFB, no desempenho de suas atribuições legais. Já a empresa instalada na ZPE, destinatária do regime especial deferido pela Lei, deverá portar-se de acordo com os regramentos estabelecidos pelo CZPE, com as regras de funcionamento da ZPE onde se situa e com

Conselho Nacional das Zonas de Processamento

os regramentos fixados pelos órgãos reguladores do comércio exterior10.

2.3 – Modelo de Funcionamento das ZPE

de Exportação - CZPE ZPE A ZPE B (Administra- (Administradora) dora)

ZPE C (Administradora)

EMP EMP EMP EMP EMP EMP EMP 1 2 X Y T Z U

Conforme diagrama acima, a instalação e o funcionamento das ZPE estão sujeitos às resoluções do Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação (CZPE)8, em especial, à análise da proposta de criação das ZPE9 e da proposta de instalação de novas empresas nas zonas de processamento. No seu âmbito espacial, a Administradora da ZPE atua de modo a manter o funcionamento das instalações e a qualidade do atendimento às empresas ali instaladas, além de assegurar o pleno exercício das prerrogativas dos órgãos oficiais de fiscalização tributária ou de outra natureza administrativa. As atribuições e responsabilidades da Administradora, conforme a Resolução CZPE nº 5/2009, são de natureza operacional-executiva, excluído o poder normativo, sem reduzir ou

Feito esse breve resumo das atribuições de cada participante, é importante verificar algumas informações complementares sobre eles: 2.3.1 – Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação (CZPE) O Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação (CZPE), criado pelo art. 3º do Decreto-Lei nº 2.452/1988 e mantido pela Lei nº 11.508/2007, é órgão colegiado da estrutura básica do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O Conselho é integrado por seis ministros de Estado11 e, para bem exercer suas funções, dispõe de uma Secretaria Executiva, que fornece apoio administrativo e técnico, dirigida pelo Secretário Executivo, indicado pelo Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Esse órgão tem um amplo rol de atribuições, com destaque para: a) analisar as propostas de criação das zonas de processamento, com parecer para a decisão do Presidente da República (mediante Decreto); b) aprovar os projetos industriais correspondentes, observadas as diretrizes estabelecidas; c) traçar a orientação superior da política das ZPE. A RFB, a despeito de sua importância para o funcio-

8. Art. 2º do Decreto nº 6.634/2008. 9. O parecer será submetido à apreciação do Presidente da República (art. 2º, I, do Decreto nº 6.634/2008). 10. No comércio exterior, há diversos órgãos intervenientes: RFB - fiscalização aduaneira e a dos tributos internos e previdenciários; Agência Nacional de Vigilância Sanitária – controle sanitário; Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – vigilância agropecuária e Polícia Federal – entrada e saída de pessoas. 11. São integrantes do CZPE: Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, na qualidade de Presidente; pelos Ministros de Estado da Fazenda, do Planejamento, Orçamento e Gestão, da Integração Nacional; do Meio Ambiente; e pelo Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República.

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namento das ZPE, não tem participação no referido ór-

manifestação da Administradora sobre a aceitação do

gão consultivo, formado apenas no âmbito ministerial. Tal ausência pode resultar em riscos maiores à indústria nacional, por faltar uma apreciação mais detalhada dos riscos tributários das medidas adotadas. A Receita Federal deveria ter oportunidade de pronunciar-se pre-

empreendimento13. As obrigações tributárias acessórias atribuídas à Administradora serão detalhadas adiante.

viamente sobre os aspectos negativos e riscos da área pretendida. 2.3.2 – Administradora da ZPE A Administradora da ZPE é uma pessoa jurídica, com capital público, privado ou misto, criada com o

A ZPE, segundo a concepção adotada pela legislação brasileira, é destinada à instalação de empreendimentos industriais14. Logo, as empresas exclusivamente prestadoras de serviço ou comerciais não são admitidas nas ZPE. A instalação de empresa na zona de processamento

objetivo específico de implantar e administrar a ZPE. Por isso, a Administradora tem de realizar as obras de implementação da infraestrutura básica (vias de acesso, meios de comunicação e demais serviços básicos), incluindo os equipamentos e estruturas de vigilância

dependerá de apresentação de projeto, com o parecer da Administradora e sujeito à aprovação do CZPE. Se aprovado o projeto de instalação, a empresa deverá ser constituída pelos interessados, no prazo de noventa dias, nos termos estabelecidos pelo Conselho.

e segurança, controle e administração aduaneira, para a prestação de serviços às empresas instaladas e para assegurar o pleno exercício das atribuições das autoridades aduaneiras. Destaque-se que, de acordo com a legislação existente, ocorre hipótese de credenciamento da Adminis-

A legislação também estabelece os seguintes requisitos para a empresa instalada na ZPE: Deverá auferir, por ano-calendário, receita bruta decorrente de exportação para o exterior de, no mínimo, oitenta por cento de sua receita bruta total de venda de bens e serviços. Assim, poderão ser destinados ao

tradora da ZPE, similar ao que ocorre em relação à arrecadação das receitas federais pelos bancos. Assim, a escolha da Administradora não é precedida de licitação pública para a seleção da empresa responsável. A Administradora, entre outras atribuições12, atua

comércio com o mercado interno até o limite de vinte por cento da receita bruta da empresa. Não poderá constituir filial ou participar de outra pessoa jurídica fora da ZPE, ainda que para usufruir incentivos na legislação tributária.

como fiel depositária das mercadorias sob controle aduaneiro na ZPE, facultada sempre a conferência docu-

Não poderá submeter à aprovação do Conselho um projeto que represente a simples transferência de planta industrial já existente para a ZPE, a fim de impedir a desindustrialização das demais áreas do País. Não poderá produzir armas, explosivos, material radioativo e outros mencionados em regulamento, salvo se poderá excluir a produção de outros bens.

mental e física dos bens pela fiscalização aduaneira. A Administradora fará jus a remuneração pelos serviços prestados às empresas instaladas em sua área. Em função da gestão sobre a área da ZPE, a empresa interessada em se instalar deverá apresentar ao CZPE a

2.3.3 – Empresa Instalada na ZPE

12. São atribuições e responsabilidades previstas na Resolução CZPE nº 05/2009 (art. 2º), entre outras: Supervisionar e garantir a qualidade dos serviços de infra-estrutura básica; manter a limpeza das áreas comuns da ZPE, assim como das vias de acesso; administrar os lotes da ZPE; observar as normas relativas à preservação do meio ambiente, instruindo as empresas a fazerem o mesmo; atuar como depositária das mercadorias sob controle aduaneiro que receber na área da ZPE, até a entrega definitiva à empresa ali instalada; atuar em conjunto com as empresas e agências governamentais para a promoção das oportunidades econômicas da ZPE. 13. Decreto nº 6.814/2009. Art. 5º, § 1º. 14. Lei nº 11.508/2007. “Art. 1º. (...) Parágrafo único. As ZPE caracterizam-se como áreas de livre comércio com o exterior, destinadas à instalação de empresas voltadas para a produção de bens a serem comercializados no exterior, sendo consideradas zonas primárias para efeito de controle aduaneiro.” (grifos nossos). “Art. 8º O ato que autorizar a instalação de empresa em ZPE relacionará os produtos a serem fabricados de acordo com a sua classificação na Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM e assegurará o tratamento instituído por esta Lei pelo prazo de até 20 (vinte) anos.” (grifos nossos)

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3 – Incentivos Federais Para as Empresas Instaladas nas ZPE A Lei nº 11.508/2007 relacionou os benefícios fiscais a serem deferidos às empresas instaladas nas ZPE. Foi nítida a preocupação do legislador de não estabelecer um sistema totalmente díspar (muito vantajoso) em relação ao vigente para as empresas do setor de exportações já instaladas no território nacional. De acordo com o art. 6º-A da Lei nº 11.508/2007, com as alterações promovidas pela Lei nº 11.532/200815, o regime tributário favorecido das empresas instaladas nas ZPE engloba a suspensão da exigência de vários impostos e contribuições federais: a) Imposto de Importação (II); b) Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI); c) Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); d) Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social devida pelo Importador de Bens Estrangeiros ou Serviços do Exterior (Cofins-Importação); e) Contribuição para o PIS/Pasep; f) Contribuição para o PIS/Pasep-Importação; e g) Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). A preocupação de evitar transferências de empresas de diversas partes do País para as zonas de processamento em busca de um regime mais vantajoso inspirou o legislador a vedar o CZPE16 de admitir a instalação de projetos industriais que representassem a simples transferência de plantas industriais já instaladas no País.

Os vetos presidenciais opostos a dispositivos de matéria tributária na redação original do projeto de lei convertido na Lei nº 11.508/2007 pretenderam diminuir os desequilíbrios em favor das ZPE17. A Lei também autoriza a cumulação de tais benefícios fiscais com outros expressamente relacionados18, e facilidades de licenciamento das importações19, sem prejuízo dos benefícios fiscais e outros incentivos que possam ser concedidos pelos estados e municípios interessados. 4 – Fiscalização Pela RFB das Empresas Instaladas nas ZPE A Lei nº 11.508/2007 modificou o tratamento tributário, cambial e administrativo exigível das ZPE, deferindo, como já detalhado, vários benefícios fiscais em relação aos tributos federais. Como forma de controle dos benefícios propugnados, e para evitar a sonegação ou os desvios não autorizados, a norma previu a necessidade de regulamentar a fiscalização, o despacho e o controle aduaneiro de mercadorias em ZPE20. O decreto regulamentar – Dec. nº 6.814/200921 – delegou poderes à RFB para disciplinar os aspectos vinculados à tributação dos fatos desenvolvidos na ZPE. Por meio da IN RFB nº 952/2009, a Receita Federal exerceu sua prerrogativa, fixando várias formas de controle fiscal (obrigações tributárias acessórias) para os fatos

15. Lei resultante da conversão da Medida Provisória nº 418/2008. 16. “Art. 3º Fica mantido o Conselho Nacional das Zonas de Processamento de Exportação -CZPE, criado pelo art. 3o do Decreto-Lei no 2.452, de 29 de julho de 1988, com competência para: (Redação dada pela Lei nº 11.732, de 2008): (...); II - aprovar os projetos industriais correspondentes, observado o disposto no § 5o do art. 2º desta Lei;” (Redação dada pela Lei nº 11.732, de 2008) 17. Vetos presidenciais aos art. 10 e 11 da versão final do projeto de lei foram necessários, segundo parecer do Ministério da Fazenda, para evitar a concessão de vantagens exageradas às empresas instaladas nas ZPE. O justo receio de um processo de transferência das indústrias do território nacional para o interior de ZPE está presente em várias disposições da Lei. Ademais, alguns benefícios preceituados destoariam do princípio da tributação em bases universais, permitindo que recursos tributários fossem meramente transferidos da União para país diverso (país de destino das remessas). 18. Benefícios passíveis de cumulação com os definidos para as ZPE: a) Os previstos para as áreas da SUDAM, SUDENE e dos Programas de Desenvolvimento da Região Centro-Oeste; b) previstos no art. 9º da MP nº 2.159-70 de 2001 (Promoção Comercial no Exterior); c) previstos na Lei nº 8.248 de 1991 (Lei da Informática e Automação); d) previstos nos Arts. 17 a 26 da Lei nº 11.196 de 2005 (Programa de Inclusão Digital). 19. O artigo 12 da Lei 11.508/2007 estabelece que as importações e exportações de empresa autorizada a operar em ZPE têm dispensa de licença ou de autorização de órgãos federais, com exceção dos controles de ordem sanitária, de interesse da segurança nacional e de proteção do meio ambiente. 20. Art. 20 da Lei nº 11.508/2007. 21. Vide art. 13 do Decreto nº 6814/2009.

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geradores ocorridos no âmbito da ZPE, a seguir estudadas: a) Extensão da zona primária à ZPE: O art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 11.508/200722 estende à área da zona de processamento o regime de zona primária previsto no Regulamento Aduaneiro23, ainda que situada em espaço completamente distinto das áreas demarcadas pela autoridade aduaneira em portos, aeroportos e pontos de fronteira alfandegados. Em função de a indústria nacional poder ser fortemente afetada pelo direcionamento autorizado de certo percentual das vendas de empresas instaladas em ZPE para o mercado interno ou mesmo na concorrência pelos mercados internacionais, o controle aduaneiro nos limites da ZPE foi valorizado. Dessa forma, a inclusão da ZPE como área da zona primária pretendeu tornar mais eficiente e eficaz o controle sobre os bens, pessoas e animais, diferentemente do tratamento dispensado a outros recintos alfandegados (p. ex; portos secos). b) Prévio alfandegamento da área da ZPE (verificação de atendimento aos requisitos definidos pela legislação): A legislação exige o mesmo requisito geral previsto às demais áreas habilitadas a movimentar, armazenar e intercambiar mercadorias importadas ou destinadas à exportação, o alfandegamento da área. Nesse sentido, há previsão estabelecida no art. 2º, § 1º, do Decreto nº 6.814/2009 para a delimitação e fechamento de toda a área da ZPE, com o fim de garantir o controle fiscal das operações regulares com o mercado exterior. Por isso, a norma exige o estabelecimento de um sistema de vigilância e segurança, bem como a criação de infraestrutura

de instalações e de equipamentos adequados aos controle aduaneiro. Similar às outras hipóteses de alfandegamento, a Administradora da ZPE disponibilizará um conjunto de áreas destinadas ao exercício das atividades de controle aduaneiro24. No ato de alfandegamento da área, a autoridade tributária declara, em processo administrativo específico, que a Administradora da ZPE cumpriu todos os requisitos estabelecidos para proporcionar um bom padrão de atendimento e de segurança e vigilância às empresas a serem instaladas, à RFB e aos demais órgãos intervenientes no controle do despacho aduaneiro. O ato declaratório abrangerá toda a área da ZPE, independentemente da efetiva ocupação dos espaços pelos estabelecimentos industriais a serem instalados. c) Emissão de Relação de Transferência de Mercadorias (RTM): A legislação cria este novo documento fiscal, a ser emitido pela Administradora da ZPE, para acompanhar toda a movimentação de bens, a qualquer título, entre a Administradora (fiel depositária) e a empresa instalada na ZPE. Como todo o fluxo de bens dirigido ou oriundo da empresa deverá transitar pelo depósito da Administradora da ZPE, esse documento consistirá em um controle adicional da movimentação efetivada e servirá para confronto com as informações constantes nas declarações de importação, de exportação e notas fiscais eletrônicas correlatas. d) Sistema informatizado da Administradora da ZPE para controle de entrada, armazenamento, transferência entre empresas e saída de bens no período: O sistema informatizado deve ser capaz de individualizar as operações de cada empresa instalada na ZPE e da

22. Repetindo o tratamento deferido pelo Decreto-lei nº 2.452, de 29 de julho de 1988, em prol de facilitação do despacho aduaneiro de importação e de exportação. 23. Decreto nº 6.759/2009. 24. De acordo com o art. 6º, § 1º, VI, da IN RFB nº 952/2009, deverão ser disponibilizadas as seguintes áreas de depósito individualizadas para bens: a) aguardando despacho aduaneiro; b) a serem submetidos a conferência aduaneira; c) aguardando entrega a empresa instalada na ZPE, embarque ao exterior ou saída para o mercado interno,conforme o caso; d) retidos para devolução ao exterior ou destinação; e e) retidos por determinação da RFB ou de órgão ou agência da administração pública federal.

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própria administradora, de modo a discernir precisamente

Apesar de o sistema da empresa instalada referir-se a

as informações econômicas e fiscais das operações realiza-

um controle de movimentação de bens, ele deverá estar

das: aquisição no mercado interno, importações de insu-

também integrado aos demais controles corporativos e fis-

mos e bens, exportações de produtos e vendas autorizadas

cais, de modo a quantificar corretamente os valores dos

no mercado interno. Essa exigência é uma importante obrigação tributária

estoques e dos insumos utilizados na produção (sistema

acessória prevista na Instrução Normativa da RFB, para o

turação). O sistema deverá também registrar todos os dados de entradas (importações e aquisições no mercado interno) e

controle da movimentação das mercadorias no âmbito da ZPE.

de custo integrado e coordenado com o restante da escri-

saídas (exportações e vendas no mercado interno) de bens. e) Utilização obrigatória de nota fiscal eletrônica pela empresa instalada na ZPE:

A legislação ainda obriga ao registro das informações das

O tratamento tributário da ZPE prescreve a obrigatoriedade de utilização da nota fiscal eletrônica (NF-e)25 nas entradas de bens importados, bem como em todas as

tar defasagem de informações entre os dados constantes

saídas dos bens ali industrializados, independentemente do tipo de atividade desempenhada pela empresa (regra

notas fiscais eletrônicas emitidas (NF-e), de modo a evino sistema informatizado e os registros contábeis e fiscais anotados. Dentro desse contexto, a RFB depara-se com o desafio de estender seus mecanismos de controle aduaneiros

específica). Tal sistemática proporciona à RFB, de forma rápida, segura e ágil, as informações sobre todas as notas fiscais emi-

e fiscais a esse novo tipo de empreendimento industrial

tidas no período por meio da Internet. De acordo com as

ferramentas criadas (obrigações tributárias acessórias).

regras da NF-e, as notas fiscais não emitidas previamente pelo sistema, ressalvados os casos de contingência26, não

5 – Conclusão

terão valor fiscal. Como todas as informações das notas fiscais eletrônicas ficam previamente disponíveis às administrações tributárias federal e estaduais27, é possível melhorar a seleção dos contribuintes com indícios de infrações e realizar au-

A ZPE é um instrumento mundialmente utilizado para estimular o desempenho do setor exportador de países com deficiências estruturais em seus mercados produtores ou dificuldades de competitividade nos mercados internacionais mais restritivos.

ditorias fiscais com mais qualidade e rapidez, permitindo

Superado o marco legal anterior com a Lei nº 11.508/2007, parece que o governo federal volta a incentivar a instalação de ZPE em várias regiões menos desenvolvidas do território nacional, regulamentando os diversos aspectos correlatos, a fim de obter ganhos significativos

o aumento da eficiência da atividade fiscalizadora. f) Sistema informatizado da empresa instalada na ZPE para controle de entrada, estoque e saída de bens:

exportador, sem perder os níveis de acompanhamento desenvolvidos ao longo de tantos anos, com essas novas

25. A empresa gerará um arquivo eletrônico que contém as informações fiscais da operação comercial, o qual deverá ser assinado digitalmente, de maneira a garantir a integridade dos dados e a autoria do emissor. Este arquivo eletrônico, que corresponderá à Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), será então transmitido pela Internet para a Secretaria da Fazenda de jurisdição do contribuinte, que fará uma pré-validação do arquivo e devolverá um protocolo de recebimento (autorização de uso), sem o qual não poderá haver o trânsito da mercadoria. 26. Caracteriza-se uma contingência no sistema NF-e, quando em decorrência de problemas técnicos não for possível transmitir a NF-e para a unidade federada do emitente, ou obter resposta à solicitação de Autorização de Uso da NF-e. Nessa hipótese, o contribuinte deverá gerar novo arquivo, conforme definido em Ato Cotepe, e adotar uma das seguintes alternativas: I – transmitir a NF-e para o Sistema de Contingência do Ambiente Nacional (SCAN); ou II - imprimir o Danfe em formulário de segurança e transmitir a NF-e, em contingência, conforme definido na legislação vigente. 27. Para tanto, é desnecessário apresentar intimação à empresa para a coleta de documentos e informações.

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para o País, a exemplo das experiências internacionais. A nova regulamentação das ZPE prevê modernas ferramentas de controle aduaneiro e fiscal para acompanhar o desempenho e a movimentação das empresas nelas instaladas, como definidas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Todavia, o sucesso de tais medidas dependerá, fundamentalmente, de um corpo técnico bem preparado e treinado para lidar com os desafios apresentados pelos novos métodos de produção globalizados e exigirá a integração das ações estratégicas desenvolvidas, incluindo os controles fiscais adotados.

REFERÊNCIAS MANDANI, Dorsati. A Review of the Role and Impact of Export Processing Zones. [S.l.: s.n.], 1999.

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HAYWOOD, Robert. Pre-feasibility Study of an Export Processing Zone in Vanuatu. [S.l.: s.n.], 2003.


a RTIGO Valoração Aduaneira e Legitimidade das Transações Foch Simão Jr.1

1 - Introdução A função das Instituições Aduaneiras é a de assegurar que todos os bens, objeto de comércio internacional, circulem pelas fronteiras do país em consonância com os mandamentos legais vigentes e em condições econômicas compatíveis com a do mercado interno, preservando a sua capacidade econômica e a segurança dos seus cidadãos, através da execução do controle físico e documental eficaz e eficiente, que não interfira substancialmente nos custos logísticos das transações. Compreende esse controle, visando a defesa econômica da nação, o procedimento de valoração aduaneira. A valoração aduaneira é o método pelo qual as alfândegas avaliam os bens importados. Esta metodologia é utilizada principalmente com a finalidade de aplicar tributos ad valorem a partir da determinação da base de cálculo aduaneira. O Acordo de Valoração

da Organização Mundial do Comércio, OMC, conhecido formalmente como AVA, Acordo para Aplicação do Artigo VII do Acordo Geral de Tarifas e Comércio 1994 (GATT), substituiu o código de valoração do GATT em consequência das negociações multilaterais de comércio havidas na rodada do Uruguai, que deu origem à Organização Mundial do Comércio. O código de valoração do GATT foi criado originalmente em 1979 durante o circuito de negociações de Tókio sobre comércio multilateral com o objetivo de assegurar que o efeito de concessões tarifárias não fosse derrogado pelas barreiras não tarifárias, constituídas em parte pelos regimes arbitrários de valoração aduaneira que prevaleciam a esse tempo. Estabeleceu-se, então, um sistema de valoração aduaneiro que considera em primeiro plano o valor de transação dos bens importados, objetivamente definido, como o

1. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil.

TRIBUTAÇÃO em revista

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preço pago realmente ou pagável para os bens quan-

mente pago ou a pagar pelas mercadorias importadas

do vendido para a exportação ao país de importação,

nos termos do AVA, ajustado em conformidade com as

preço este que é acrescido de determinados ajustes

disposições do Art. 8.

considerados na especificidade da transação.

Nos

nado na base do valor de transação, determinar-se-á

2 – Proposta de Alteração Normativa Quando a Administração analisa o método de valo-

utilizando-se de um dos seguintes métodos: o valor de transação de bens idênticos; o valor de transação de bens similares; o método dedutivo do valor; o método do valor computado; o método iterativo flexibilizado. Tais métodos de valoração devem ser adotados estritamente na ordem hierárquica.

ração aplicado, valor da transação (Art. 1º, do AVA), o seu objetivo é saber se ao preço legítimo há a interveniência de algum dos fatores de ressalva descritos no inciso 1 do Art. 1º do AVA e se a ele foram adicionados os valores que o Art. 8º do AVA exige, ou se foram excluídos aqueles que ele qualifica como excludentes.

Inicialmente há que se considerar que, nos termos do Artigo 17 do AVA, aprovado pelo Decreto Legis-

Ressalte-se aqui que para a análise do valor aduaneiro segundo os pressupostos do AVA, qualquer suspeita de ilícito aduaneiro deve ser afastada. O que se discute é a subvaloração em uma transação de comércio exterior lídima, amparada por documentação hábil e fidedigna, condizente com as práticas comerciais, onde as prescrições do Art. 1º do AVA possam ser motivo de questionamento. Outrossim, havendo suspeita de fraude, subfaturamento, qualquer perspectiva do AVA deve ser afastada, tratando-se o caso conforme o exarado no Art. 86 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro

casos onde o valor aduaneiro não puder ser determi-

lativo nº 30, de 1994 e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 30 de dezembro de 1994, nenhuma disposição do Acordo poderá ser interpretada como restrição ou questionamento dos direitos que têm as administrações aduaneiras de se assegurarem da veracidade ou exatidão de qualquer afirmação, documento ou declaração apresentado para fins de valoração aduaneira. Uma vez apresentadas as Declarações de Importação relativas aos bens importados pelo contribuinte a Administração Aduaneira, em face dos motivos para duvidar da veracidade ou exatidão das informações ou dos documentos apresentados para justificar essas declarações, pode selecioná-las para a programação de procedimento fiscal com a consequente pesquisa interna para a análise dos valores dos bens importados conforme a Classificação Fiscal da Nomenclatura Comum do Mercosul, NCM, com a finalidade de apurar a possível redução de base de cálculo das tarifas aduaneiras ad valorem nas importações realizadas. Para tanto, a Administração Aduaneira deve emitir o competente Termo de Início de Fiscalização solicitando do importador o fornecimento de explicação adicional àquelas manifestadas na Declaração de Importação, bem assim como a exibição de documentos ou outras provas de que os valores dos bens declarados nas importações representaram o montante efetiva-

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TRIBUTAÇÃO em revista

de 2009. Embora as determinações normativas do AVA pareçam juridicamente bem estruturadas em termos teóricos, na prática a sua implementação inicial revelou-se complexa e de difícil operação por parte das autoridades aduaneiras dos países em desenvolvimento. Atendendo a estas demandas, em 1995, tendo em vista os problemas levantados sobre a aplicabilidade do AVA, na Reunião Ministerial de Marrakesh da OMC foram acordados os termos e os respectivos textos relativos à valoração aduaneira que deu às Aduanas o poder de inverter o ônus da prova, Decisão I do documento G/ VAL/1 do Comitê de Valoração Aduaneira, levada a efeito em 27 de abril de 1995 pela Organização Mundial de Comércio. Este ato nada mais foi que um ato contínuo ao Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio com base no Art. 17 do AVA, recepcionado


pela legislação brasileira.

diversas e domicílios em países distintos, uma vez que

Apesar da inovação normativa exarada na Reunião Ministerial de Marrakesh, em face da peculiaridade do sistema jurídico brasileiro de tradição de direito positivo, a questão de enquadrar uma transação de comércio exterior como passível de análise na perspectiva do

a mercadoria ou o serviço objeto da obrigação é entregue ou prestado além das fronteiras e os lugares da celebração e execução das obrigações contratadas podem ser diversos. Enquanto o direito interno regula todos os aspectos abrangentes à formação e às consequências do negócio jurídico, os termos acordados em uma transação internacional têm a sua vinculação a um ou mais sistemas jurídicos estrangeiros, além de outros dados como o domicílio, a nacionalidade, a localização da sede, centro de principais atividades e até a própria conceituação legal. Portanto, não há nexo plausível em considerar normal uma transação de comércio exterior destituída de contratos de compra e venda e outros documentos que lhe dê estabilidade jurídica no âmbito transnacional. Desta forma, deveria constar do arcabouço nor-

AVA fica um tanto quanto vaga. O próprio AVA não é assertivo quanto a esta questão, apenas enuncia preceitos que deveriam ser complementados pela legislação nacional. Um aspecto fundamental da valoração aduaneira é o corolário da neutralidade, que representa o fator de compatibilidade com a realidade comercial, porquanto a técnica de valoração deve adequar-se a todos os princípios do comércio internacional, garantindo o cumprimento da liberdade comercial, do exercício de autonomia privada e da legalidade dos atos. Para tanto, o significado de “valor de transação”, quando considerado no contexto do AVA, sugere que o valor aduaneiro se destina a captar o valor real das mercadorias no momento da importação em todos os seus aspectos; comercial e legal. Isso incluiria não apenas o preço que poderá abarcar pagamentos específicos para o fornecedor, mas também qualquer tipo de pagamentos ou subsídio financeiro que possam ser quantificados, de modo a capturar o valor econômico real dos bens e a sua normalidade comercial. A importância deste ponto de vista é inestimável, como demonstra o caso dos produtos que ostentam uma marca notória, marca registrada, que possuem valores superiores aos mesmos produtos sem marca, face ao custo dos direitos de autoria ou propriedade geralmente incluídos como royalties. A relevância da apuração da legalidade da transação comercial recai sobre os mesmos produtos no caso de uma transação com a suspeita de contrafação. Embora o valor de transação possa ser considerado normal, a legalidade do ato não o seria, assim a transação não poderia ser considerada normal. Ademais, deve-se considerar que as partes contratantes no Comércio Internacional têm nacionalidades

mativo nacional a consideração de que uma transação comercial transnacional passível da aplicação de disposições do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994 só poderia ser aceita, nos termos estritamente legais, se o valor de transação for o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias, em uma venda para exportação para o país de importação, ajustado de Acordo com as disposições do Art. 8º, e adotado como valor aduaneiro nas seguintes condições: Toda mercadoria submetida a despacho de importação está sujeita ao controle do correspondente valor aduaneiro nos termos Acordo de Valoração Aduaneira, aprovado pelo Decreto Legislativo nº 30, de 1994, e promulgado pelo Decreto nº 1.355, de 1994: I- Desde que haja evidência comprovada de uma venda de mercadorias do país de exportação para o Brasil. Esta evidência deve ser corroborada por contratos comerciais, fatura comercial, ordem de compra e outros documentos usualmente utilizados nas transações de comercio exterior. II- Desde que a transação seja realizada no curso ordinário do comércio internacional em condições de livre concorrência, sem a omissão de qualquer interveniente na produção e logística,

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desde a etapa de fabricação, transporte e comercialização da mercadoria, não envolvendo nesse processo nenhuma espécie de prática comercial, deduções ou descontos que não os normalmente utilizados no comércio internacional (Medida Provisória no 2.158-35, de 2001).

Em sintonia com o exarado pelo Artigo 17 do AVA, deveria constar da mesma forma do sistema normativo nacional as disposições que estabelecem o valor de critério, aquele obtido pelas fontes de informação oficializadas na forma da Lei e não contrárias ao prescrito no Acordo. Portanto, considerar-se-ia as fontes de informação para análise do valor aduaneiro de mercadorias idênticas e similares, valor critério, àquelas obtidas na seguinte ordem: I - O Sistema de Informação de Comércio Exterior da Receita Federal do Brasil (Siscomex), desde que as informações nele contidas atendam as condições de análise comparativa de características físicas, funcionais e comerciais. Admitindo para aplicação deste artigo a mesma descrição funcional ou técnica, incluindo, nos bens manufaturados, as codificações de fábrica; a mesma qualidade, entendendo como tal os detalhes funcionais e técnicos de operação ou de utilização, incluindo acessórios e demais apetrechos funcionais; o mesmo patamar de reputação comercial, entendendo como tal semelhante grau de concorrência exercido no mercado brasileiro. II – Os Catálogos de preço do fabricante, EW (“Ex-Work”), posto fábrica para exportação, fornecidos, por qualquer meio de informação, pelo fabricante das mercadorias objeto da valoração ou suas similares; de mercadorias vendidas para exportação para o mesmo país de importação e exportadas ao mesmo tempo ou em tempo aproximado. III – As edições em publicações ou páginas da Internet dos valores das mercadorias objeto da valoração ou suas similares, vendidas para exportação para o mesmo país de importação e exportadas ao mesmo tempo ou em tempo aproximado ao da importação em análise. § 1º Na hipótese em que o importador possua informações sobre o valor aduaneiro de mercadorias idênticas às importadas e que a administração aduaneira não disponha daquelas informações, de forma imediata no local de importação, o importador, a seu critério, poderá informar a

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TRIBUTAÇÃO em revista

autoridade aduaneira sobre tais importações, detalhando os valores de transação e as condições em que ocorreram, mediante preenchimento de anexo descritivo, de modo a possibilitar a determinação do valor aduaneiro. § 2º O valor aduaneiro determinado na forma do § 1º deste artigo será submetido à avaliação da autoridade aduaneira, a qual poderá rechaçá-lo mediante comunicação escrita justificando os motivos da recusa. § 3º A aplicação do método de valoração de mercadorias idênticas levará em conta sua respectiva utilidade e função merceológica, assim entendida como um estudo que leva em conta a análise das características técnicas e comerciais, bem como a obsolescência de uma determinada mercadoria. § 4º Para fins do disposto no § 3º serão observados, na ordem descrita, os seguintes processos: I - Estudo merceológico emitido ou aceito pela Coordenação Geral do Controle Aduaneiro COANA; II - Laudo técnico emitido por peritos credenciados pela Receita Federal do Brasil; e III - Estudo técnico efetuado por Universidade, Faculdades e Institutos de pesquisa especializados, relativos às características técnicas e comerciais, inclusive a obsolescência da mercadoria em questão.

Note que os catálogos e as edições em publicações ou páginas da Internet tornam-se referências legais para corroborar alguma importação que se descubra, mesmo que única, ou corroborar a afirmação do produtor de que o valor praticado de venda é o valor cotado no catálogo. Neste item procura-se dar subsídios ao Auditor-Fiscal para identificar o fabricante ou produtor da mercadoria e questioná-lo ou obter dele informação de transações idênticas às analisadas. Serve também este item para embasar a inversão do ônus da prova já que a metodologia acima proposta seria oficializada como fonte de informação. Quanto à questão documental, como não é exaustiva a determinação dos documentos legais para fins de comprovação do valor aduaneiro declarado, propõe


constar do controle normativo a obrigatoriedade do importador apresentar ainda, segundo as circunstâncias da correspondente operação comercial, e quando exigido pela fiscalização aduaneira, documentos justificativos e informações adicionais àqueles exigidos, em caráter geral, para instrução da DI. Desse modo sugerimos a inclusão no texto normativo os seguintes parágrafos em complemento ao Art 82 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009: § 1º As informações a que se refere o inciso II deste artigo incluem, entre outras, a identificação das pessoas envolvidas na transação, seus papéis de atuação na operação, a correspondência comercial e a descrição completa do processo de negociação e de determinação do preço das mercadorias face às circunstâncias econômicas do mercado internacional. § 2º. A comprovação do valor de transação deverá ser efetuada através dos seguintes documentos (Art. 17 e parágrafo 6 do anexo III do Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT 1994 e Art. 553, inciso IV do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009): a) fatura comercial em conformidade com as normas vigentes no país de exportação e atendendo o exarado no Art. 557 do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009; b) contrato ou Acordo de compra e venda; c) ordem de compra; d) contrato de câmbio e respectivo SWIFT e) carta de crédito; f) demais documentos exigidos pela autoridade fiscal. § 3º. Caso não exista na operação de comércio exterior em análise algum dos documentos mencionados no § segundo, o importador deverá preencher um termo de declarações informando as causas da não apresentação dos documentos exigidos, datando-o e firmando-o.

As práticas comerciais condizentes, primado do AVA, pressupõem a existência entre as partes de documentações compromissárias com o condão de instituir as condições arbitrais específicas vinculadas às transações comerciais oriundas do comércio internacional, garantindo o cumprimento rigoroso e firme

dos termos da transação. Estas condições são materializadas em ordens de compras, faturas pró-formas, contratos-tipos e outros documentos correlatos enviados por correio eletrônico, fax e outros meios céleres de comunicação, garantem os compromissos acordados entre as partes e asseguram o direito de terceiros como no caso do transporte internacional, serviços intermediários de armazenagem e movimentação de carga, outros serviços consubstanciados em contratos bancários, corretagem, agenciamento, distribuição, seguros, e outras especificidades estabelecidas em documentação própria cujo objetivo final se constitui na operacionalização eficaz do contrato de compra e venda mercantil compatível com a necessidade de rapidez e confiabilidade demandadas pelas práticas do comércio exterior. 3 – Conclusão Os acordos internacionais, principalmente os tratados no âmbito do comércio carregam sempre um viés de favorecimento às nações hegemônicas. Os termos acordados no âmbito do GATT e posteriormente nas rodadas da OMC carregam da mesma forma esta genética predatória, facilitando, com certa permissividade, a livre circulação no comércio transnacional dos bens manufaturados com alto valor agregado em detrimento dos bens primários e dos insumos agrícolas. Dentro desta perspectiva de facilitação do comércio estabeleceram-se os termos do AVA, Acordo sobre a Implementação do Artigo VII do GATT, com pressupostos de afastar qualquer proteção ao parque manufatureiro nacional que se baseasse na comparação de preços com produtos idênticos ou similares produzidos no país, uma vez que, em tese, as nações com maior produção industrial seriam mais eficientes neste quesito. Outras considerações para o texto do Acordo foram as queixas encaminhadas por exportadores europeus e norte-americanos que se consideravam prejudicados por práticas abusivas, sobretudo na forma de demandas de informações não razoáveis por partes das autoridades

TRIBUTAÇÃO em revista

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aduaneiras, que resultavam em atrasos nos embarques

protegendo o seu setor produtivo, contemplaram a le-

e, consequentemente, em custos adicionais. Com a pressão dos países em desenvolvimento por ferramentas mais eficientes na detecção do planeja-

gislação interna com instrumentos normativos com-

mento tributário aduaneiro dentro das perspectivas

visando à preservação econômica do país. Neste sen-

do AVA, estabeleceu-se em Marrakech, Marrocos, em

tido as proposições contidas neste trabalho vêm ao

1995, Decisão I do documento G/VAL/1 do Comitê de Valoração Aduaneira, um instrumento de inversão do

encontro dos anseios de vários setores produtivos do Brasil que são constantemente atacados predatoria-

ônus da prova que possibilitou às autoridades adu-

mente por ações comerciais estrangeiras através da

aneiras uma maior oportunidade de investigação das

prática de dumping, planejamento tributário abusivo

transações suspeitas. A partir desse episódio, alguns países como a Índia, dignificando a sua soberania e

e subvaloração, ameaçando o nosso futuro como nação

plementares ao Acordo, possibilitando um controle mais eficaz do valor declarado dos bens importados

desenvolvida.

REFERÊNCIAS SATAPAHY, C. Customs Valuation in India. 3. ed. Mumbai: Shoroff Publishers & Distr. Ltda, 2000.

58

TRIBUTAÇÃO em revista

TORRES, Heleno Taveira. Pluritributação Internacional Sobre as Rendas de Empresas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.


a RTIGO Centro Regional Conjunto de Capacitação Aduaneira em Brasília: Aperfeiçoando e Fortalecendo as Administrações Aduaneiras Patricia Prisco Paraiso Barreto de Andrade1

Inaugurado em abril de 2010, o Centro Regional Conjunto de Capacitação Aduaneira – CRC em Brasília – Brasil, foi estabelecido oficialmente em dezembro de 2009, por meio da assinatura de um Memorando de Entendimento (acordo internacional simplificado) entre a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), a Escola de Administração Fazendária (Esaf) e a Organização Mundial das Aduanas (OMA). A OMA é a única organização intergovernamental com foco exclusivo em matérias aduaneiras. Atualmente possui 177 membros e o Brasil está inserido na Região das Américas e do Caribe, que possui 31 membros. A OMA estabeleceu uma política regional para o tema fortalecimento de capacidades, e os Centros Regionais de Capacitação (CRC) são peças chaves na implementação das estratégias regionais de: apoio às iniciativas regionais de capacitação e res-

paldo à filosofia de serviço profissional baseado no conhecimento; criação de CRC autossustentáveis, que se tornem referência em capacitação aduaneira; criação de sinergia e fomento a integração regional; compartilhar melhores práticas e, ainda, promoção de troca de experiências. Em consonância com as missões principais estabelecidas pela OMA para os Centros Regionais de Capacitação, o CRC em Brasília - Brasil tem os seguintes objetivos: desenvolver programa de capacitação de acordo com as necessidades nacionais e regionais de fortalecimento de capacidades, com as políticas de capacitação do Ministério da Fazenda do Brasil e com a política de regionalização de fortalecimento de capacidades estabelecido pela OMA; gerir grupo de especialistas para atendimento de demanda de capacitação da região; organizar a logística e demais serviços para a realização de programa de capacitação di-

1. Auditora-Fiscal da Receita Federal do Brasil, ex- Gerente do Centro Regional Conjunto de Capacitação Aduaneira RFB/ESAF/OMA no Brasil

TRIBUTAÇÃO em revista

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rigido à Aduana brasileira e aos países membros da região;

objetivo disponibilizar a plataforma de cursos e-learning

e implantar, manter e administrar o Ambiente Virtual de

da OMA, com cursos traduzidos para o português. Esses

Aprendizagem (AVA) para oferta de cursos e-learning. O CRC Brasília - Brasil tem a missão de desenvolver pessoas para promover o aperfeiçoamento e o fortaleci-

cursos versam sobre temas de relevância para o exercício das atividades aduaneiras, tais como: Valoração Aduanei-

mento das Administrações Aduaneiras das Américas e do

ra, Sistema Harmonizado e Controle Aduaneiro. Mas não oferecerem somente cursos já produzidos

Caribe com a visão de ser referência regional e internacio-

pela OMA. Prova disso é que está previsto para abril deste

nal em geração e disseminação de conhecimento na área

ano a oferta do curso e-learning de Práticas Aduaneiras In-

aduaneira. Carrega como valores: Integridade; Compro-

ternacionais. O conteúdo deste curso é resultado de adap-

misso; Responsabilidade e Profissionalismo. O Centro tem como principais desafios ajustar as demandas da Aduana Brasileira aos assuntos regionais; de-

tação de material disponibilizado por meio de cooperação

senvolver treinamentos com conteúdos adaptados; fomen-

gional sobre Planejamento Estratégico na Área Aduaneira,

tar a cooperação das Administrações Aduaneiras da região

contando com a expertise de especialistas da OMA e do

das Américas e do Caribe, no que se refere à capacitação;

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Este

desenvolver e manter um grupo de especialistas regionais;

evento demonstra de forma inequívoca que o Centro está

e tornar o CRC em Brasília - Brasil um Centro de excelên-

totalmente alinhado com os objetivos estratégicos da RFB,

cia em geração e disseminação do conhecimento na área

e que ele existe para prover capacitação à Aduana brasilei-

aduaneira. Em participação a XXV Reunião do Conselho de Diretores-Gerais de Aduanas da Comunidade de Países de

ra e às Aduanas da região, buscando a implementação de

internacional entre Esaf e instituições da Espanha. Realizarão, também neste semestre, um Seminário Re-

normas internacionais adaptadas às expectativas dos seus

çambique, em outubro de 2010, a Aduana brasileira as-

governos. Ainda em 2011, lançarão a Especialização em Comércio Exterior e Gestão Aduaneira, em aprendizagem flexí-

sumiu o compromisso de prover os membros da CPLP de

vel (módulos presenciais e a distância). Esta especialização

capacitação na área aduaneira, por meio do Centro Regio-

tem como objetivo principal prover a Administração Adu-

nal Conjunto de Capacitação Aduaneira RFB/ESAF/OMA

aneira da RFB de novas capacidades aos atuais gestores e

no Brasil (CRC em Brasília – Brasil). Importante ressaltar

potenciais gestores aduaneiros, de forma a contribuir para

que esta iniciativa conta com total apoio da Secretaria-Ge-

elevar a Aduana brasileira a um novo patamar de excelên-

ral da OMA. Neste sentido, desde o 2º semestre de 2010,

cia, com resultados profundamente positivos para a eco-

aduaneiros da CPLP participam de eventos realizados pelo

nomia e a sociedade do Brasil. Outros eventos de capacitação, para o período de junho de 2011 até junho de 2012, estão ainda em fase de

Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Maputo – Mo-

Centro. Em 2010, além do Seminário Internacional sobre Aduana e Empresas – Cooperação para melhoria do Desempe-

aprovação entre as partes envolvidas, e serão discutidos

nho do Comércio Exterior, que inaugurou o Centro, reali-

em reunião de Planejamento Estratégico da OMA para a

zaram Seminário Regional sobre o Sistema Harmonizado

Região das Américas e do Caribe, prevista para abril deste

e Workshop Regional sobre Valoração Aduaneira (que já

ano. Em breve será lançado o site do CRC em Brasília - Brasil, contendo informações gerais sobre o Centro, calendá-

contou com participantes da CPLP). Para 2011, em consonância com a tendência mundial de disseminação do conhecimento de forma democrática, aliando didática e tecnologia, o Centro tem como principal

rio de eventos, biblioteca virtual com os principais documentos da OMA traduzidos para o português, fóruns de discussão e hospedagem on-line na Esaf.

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TRIBUTAÇÃO em revista


qUESTÕES POLÊMICAS EM DIREITO TRIBUTÁRIO Tribunal Regional Federal da Terceira Região modifica seu posicionamento a respeito da aplicabilidade do art. 12, § 11, da IN 243, de 2002. Natureza:

Mandados de Segurança

Órgão julgador:

Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região

Nº do Processo:

ApC 0034048-52.2007.4.03.6100/SP; e ApC 0017381-30.2003.4.03.6100/SP

Relatores:

Juiz Federal Convocado Roberto Jeuken; e Juiz Federal Convocado Rubens Calixto

Matéria:

Tributária- Preço de Transferência entre pessoas jurídicas coligadas

Apelantes:

Delphi Diesel Systems do Brasil Ltda.; e Schneider Eletric Brasil Ltda

Apelado:

União (Fazenda Nacional)

Datas das Decisões:

19/08/2010; 10/02/2011

Publicações:

14/09/2010; 22/02/2011

Texto da Decisão:

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Desembargador Federal Márcio Moraes e da certidão de julgamento, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

TRIBUTAÇÃO em revista

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O Tribunal Regional Federal da Terceira Região decidiu, pela primeira vez em agosto de 2010, que a Receita Federal do Brasil – RFB – teria ofendido o Princípio da Reserva Legal, quando da elaboração do art. 12, § 11, da Instrução Normativa 243, de 2002, o qual tratou de regulamentar a metodologia de cálculo do preço parâmetro para fins de ajuste do preço de transferência previsto no art. 18 da Lei 9.430, de 1996. Explica-se. O preço de transferência está ligado à transferência de bens, produtos e serviços entre empresas brasileiras coligadas às estrangeiras com a finalidade de sua importação ao Brasil para produção dos respectivos bens, cujos gastos poderiam ser utilizados para redução tributária no Imposto sobre a Renda de Pessoas Jurídicas – IRPJ – e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL. Assim, a previsão legal nada mais é que uma tentativa de o Estado evitar a evasão fiscal com a remessa ao exterior dos lucros auferidos por empresas multinacionais para haver um recolhimento tributário menor sob a máscara de importação de insumos e serviços necessários para a produção dos bens. Para tanto, houve a edição da Lei mencionada, a qual considerou serem dedutíveis na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, os custos, despesas e encargos relativos a bens, serviços e direitos constantes em documentos de importação ou aquisição das mencionadas empresas coligadas por intermédio de métodos descritos nos incisos seguintes do artigo. A RFB, por sua vez, elaborou a Instrução Normativa, objeto do Mandado de Segurança, para regulamentar esses fatores dedutíveis, indicando a possibilidade de serem efetuados por um dos métodos ali descritos, sendo um deles o Preço de Revenda menos Lucro – PRL –, definido como a média aritmética ponderada dos preços de revenda dos bens, serviços ou direitos, diminuídos, no caso do processo em questão, do valor agregado no País e a margem de lucro de 60%, pela metodologia expressa nos incisos do parágrafo 11 do art. 12 da Instrução Normativa. Dadas essas informações, em Apelação ao primeiro Mandado de Segurança sob exame, a saber, ApC 003404852.2007.4.03.6100/SP, o Tribunal, por maioria dos votos, declarou que a RFB teria se excedido ao regulamentar o dispositivo supracitado, apontando cálculos que resultaram

62

TRIBUTAÇÃO em revista

em aumento de tributo, pois não possui atribuição para tanto e agir dessa sorte significa clara desobediência ao Princípio da Estrita Legalidade. Esse Princípio consiste em dizer que determinadas matérias hão de ser feitas sob determinada forma legal. Por exemplo, a majoração do IR deve ocorrer por meio de Lei Ordinária e não por uma Resolução. Porém, submetida pela segunda vez a mesma matéria à análise do Tribunal por meio da apelação ApC 001738130.2003.4.03.6100/SP, o seu posicionamento mudou. Em 10 de fevereiro do ano corrente houve o reconhecimento, por unanimidade, de que a RFB apenas regulamentou a Lei 9.430, de 1996, sem inovar o sistema jurídico, ou seja, sem resultar em majoração de tributo ao contribuinte por meio da Instrução Normativa em comento. Muito embora essa adequada instrução tenha resultado em pagamento do tributo maior que o esperado pelo contribuinte, não significa ter excedido os limites legais estabelecidos. Ao contrário, a RFB possui competência para interpretar e aplicar leis tributárias, aduaneiras, previdenciárias e correlatas, podendo, para tanto, elaborar atos e instruções normativas para garantir a eficácia das leis, conforme dispõe o art. 7º, III, do Decreto 3.782, de 2001, sucedido por outros até o atual art. 14, III, do Decreto 7.386, de 2010. Ora, o artigo contestado pelo contribuinte somente determinou os critérios para aplicação do método do PRL, frisa-se, ao levar em conta os quesitos mencionados no decorrer deste para, a partir do resultado do custo total do bem produzido, obter-se a dedução para fins de recolhimento do IRPJ e da CSLL. Dessa feita, constata-se que a RFB atuou nos limites legais, como bem assim o Tribunal Regional da Terceira Região entendeu nesse processo, apesar de não se tratar de decisão final e é provável que a questão seja levada ao Superior Tribunal de Justiça para se pronunciar a respeito.

Áryna Rangel Advogada – Assessora de Diretoria do Departamento de Estudos Técnicos do Sindifisco Nacional




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