CAPÍTULO 1
Jean Piaget
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JEAN PIAGET 1. A EPISTEMOLOGIA GENÉTICA DE JEAN PIAGET Iniciaremos nosso Módulo de Desenvolvimento Humano estudando a Epistemologia Genética, teoria desenvolvida por Jean Piaget. Jean Piaget nasceu em 9 de agosto de 1896, na Suíça. Foi um biólogo e psicólogo que trabalhou com crianças por mais de meio século. Suas pesquisas buscavam compreender a forma pela qual o ser humano passa de um estado de menor conhecimento para um estado de maior conhecimento, buscando assim identificar os mecanismos que permitem essa construção contínua, bem como o processo de formação desses mecanismos desde a infância até a idade adulta. Ao tentar explicar como os seres humanos chegam ao conhecimento, a teoria de Piaget nos oferece não somente uma explicação a respeito das etapas ou fases do processo de construção do conhecimento, mas, principalmente, oferece uma explicação sobre quais são os processos e mecanismos que permitem a passagem de um nível a outro. Isso faz da teoria de Piaget extremamente relevante quando o problema que se coloca é o que podemos fazer com a educação, em termos de opções didáticas, para ajudar nossos alunos a aprender mais e melhor. Piaget partiu da abordagem interacionista, destacando o papel ativo do indivíduo na construção do conhecimento. Ele é sem dúvida um dos psicólogos mais influentes do desenvolvimento infantil. Denominou sua ciência de epistemologia genética, ou seja, um estudo experimental sobre a origem do conhecimento. Piaget inicia seus estudos observando seus próprios filhos, seja como brincavam, como resolviam problemas, como lidavam com as dificuldades diárias, etc. Em um momento posterior, Piaget estuda amostras grandes, através do método clínico. O método clínico é uma técnica de perguntas e respostas para descobrir como as crianças, de todas as idades, pensavam sobre diversos assuntos.
Inteligência Piaget define a inteligência como uma função vital básica que ajuda o organismo a adaptar-se a seu ambiente. Uma criança descobrindo como ligar o computador ou um adolescente se esforçando para resolver um problema de matemática manifesta possuir inteligência. Para Piaget a inteligência é uma forma de equilibração para a qual todas as estruturas cognitivas tendem. Para entender esse conceito é importante pensar que a atividade intelectual acontece com um objetivo em mente. Qual é esse objetivo? Produzir uma relação harmoniosa, ou seja, equilibrada entre os processos de
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pensamento do indivíduo e o ambiente. Os desequilíbrios entre os modos de pensamento da criança e os eventos ambientais as levavam a realizar ajustes mentais a fim de que a equilibração cognitiva seja alcançada novamente. Piaget descreve as crianças como contrutivistas, ou seja, capazes de construir o conhecimento por elas mesmas. O construtivismo é outro conceito importante dentro da teoria de Piaget. As construções da criança sobre a realidade vão depender do conhecimento que ela possui até aquele momento.
Esquemas cognitivos Um esquema cognitivo é um modelo ou estrutura mental que nós criamos para representar e interpretar nossas experiências. De um modo simples podemos dizer que é uma estratégia ou conceito. Existem três tipos de esquemas: comportamentais, simbólicos e operacionais. Os esquemas comportamentais são um padrão organizado de comportamento que a criança usa para representar ou responder a um objeto ou experiência. São as primeiras estruturas intelectuais que emergem e está limitado àquilo que esta criança pode representar por meio de ações. Para uma criança de 8 meses uma bola não é um brinquedo redondo com um nome formal. É apenas um objeto que ela e seus companheiros podem lançar e rolar. Os esquemas simbólicos são símbolos metais utilizados pelas crianças a partir do segundo ano de vida para representar experiências mentalmente e para alcançar objetivos utilizados. Por fim, os esquemas operacionais estão presentes em crianças de 7 anos ou mais. Dizem respeito à atividade mental interna que se realiza para chegar a uma conclusão lógica. Aqui está presente a operação cognitiva denominada reversibilidade. Por exemplo, se fizermos certas transformações, somos capazes de refazê-las, fazendo voltar ao estágio inicial, como na água que se transforma em gelo e que ao ser aquecida volta à forma original. As operações matemáticas também compreendem esse conceito. Ou seja, adições mentais podem ser desfeitas rapidamente por subtrações mentais. Como as crianças constroem e modificam seus esquemas intelectuais? Piaget responde a essa pergunta através dos conceitos de organização e adaptação. A organização é um processo pelo qual as crianças combinam os esquemas existentes em estruturas intelectuais novas e mais complexas. Por exemplo, uma criança pequena que possui o reflexo de olhar fixamente, alcançar e segurar, organiza esses esquemas não relacionados em estruturas mais complexas: o alcance visualmente direcionado. Já o objetivo da organização é a adaptação, um processo de ajuste às demandas do ambiente. A adaptação acontece através da assimilação e da acomodação. A assimilação é o processo de tentar interpretar novas experiências nos termos de seus modelos existentes de mundo. Por exemplo, uma criança que vê um cavalo pela primeira vez e tenta assimilá-lo em seus esquemas existentes de animais de quatro pa-
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Jean Piaget tas. Assim considerará esse animal um “au au”. Ou seja, essa criança foi capaz de adaptar um novo estímulo para a construção de algo familiar. Já a acomodação é o processo de modificação de estruturas existentes para dar conta das novas experiências. No exemplo dado anteriormente a criança pode perceber que o cavalo não se encaixa perfeitamente àquele tipo de animais que ela chama de “au au”. Assim, pode começar a chamar o cavalo de um outro nome, inventado por ela ou o usado por seus companheiros ou simplesmente perguntando para alguém o que é. Para Piaget a acomodação e assimilação trabalham juntas para promover o crescimento cognitivo. Assimilações não compatíveis com os esquemas existentes podem introduzir conflitos cognitivos e levam a acomodações dessas experiências. E o resultado final é a adaptação, o estado de equilíbrio entre as estruturas cognitivas do indivíduo e o ambiente.
Estágios de Desenvolvimento Cognitivo Piaget identificou quatro grandes períodos ou estágios de desenvolvimento cognitivo: 1. Sensório-motor (do nascimento aos 2 anos); 2. Pré-operacional (dos 2 aos 7 anos); 3. Operações concretas (dos 7 aos 11 anos); 4. Operações Formais (dos 11 anos em diante). Esses estágios formam a chamada sequência desenvolvimental invariante, ou seja, todas as pessoas progridem por todos esses estágios, e necessariamente nessa ordem. Piaget reconhecia as diferenças individuais nas idades em que as crianças entravam ou saíam de cada estágio particular. De uma forma geral, todos os indivíduos vivenciam essas quatro fases na mesma sequência, porém o início e o término de cada uma delas podem sofrer variações em função das características da estrutura biológica de cada indivíduo e da riqueza (ou não) dos estímulos proporcionados pelo meio ambiente em que ele estiver inserido. Por isso mesmo é que a divisão nessas faixas etárias é uma referência, e não uma norma rígida. Cada uma dessas fases é caracterizada por formas diferentes de organização mental que possibilitam as diferentes maneiras do indivíduo relacionar-se com a realidade que o rodeia.
Período Sensório-motor (do nascimento aos 2 anos) Nesse estágio as crianças são capazes de coordenar as informações sensoriais que recebem com as informações motoras, o que permite a formação de esquemas comportamentais para agir sobre o ambiente e conhecer o ambiente. Nesta fase está presente a chamada inteligência prática, baseada nas sensações e nos movimentos (o mundo que existe para o bebê é apenas aquele que ele vê, ouve ou sente e sobre o qual age). O crescimento nesses dois primeiros anos de vida é radical. Por isso esse estágio foi dividido por Pia-
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get em seis subestágios que descrevem a transição da criança. Neste período o desenvolvimento físico acelerado é o suporte para o aparecimento de novas habilidades, como sentar e andar, o que propiciará um domínio maior do ambiente. Este estágio é dividido em seis subestágios, a saber: 1. Atividades reflexas: exercícios de reflexos inatos, como sugar cobertores, brinquedos ou o seio materno. Alguns reflexos desaparecem com o tempo e outros permanecem inalterados ao longo da nossa vida. As noções de espaço e tempo são construídas pela ação e o contato com o meio é direto e imediato, sem representação ou pensamento. 2. Reações Circulares Primárias: resposta agradável, centrada no próprio corpo do bebê e realizada repetidas vezes, como chupar os dedos, fazendo sons. Formação das primeiras estruturas adquiridas, ou hábitos, ou seja, a criança começa a repetir algumas situações que antes não ocorriam. 3. Reações Circulares Secundárias: resposta agradável, mas centrada num objeto externo, descoberto por acaso e realizado repetidas vezes, como provocar o som em um pato de borracha apertando sua barriga. 4. Coordenação de Esquemas Secundários: a criança coordena duas ou mais ações para alcançar objetivos simples, por exemplo, ao se colocar um brinquedo debaixo de uma almofada, o bebê levantaria a almofada com uma das mãos e com a outra pegaria o objeto. Surge a chamada intencionalidade, ou seja, se há um obstáculo entre a criança e um objeto que ela deseja pegar, ela retira este obstáculo. 5. Reações Circulares Terciárias: esquema exploratório no qual a criança cria um novo método de ação sobre objetos com o objetivo de produzir resultados interessantes. Por exemplo, a criança que antes apertou o pato de borracha agora poderia jogá-lo no chão, amassá-lo, etc., simplesmente para ver o resultado que produziria. Esse subestágio reflete a curiosidade da criança, através das “experimentações” feitas pela criança. 6. Solução de Problemas por Combinações Mentais: habilidades de resolver problemas a nível mental ou simbólico, sem ter que se apoiar na experiência do tipo tentativa e erro. No final deste estádio surge a capacidade de representação mental e de simbolização. A inteligência centrada na ação dá lugar ao pensamento (representação mental), o pensamento se caracteriza por ser ação interiorizada. Até o período de 8 a 12 meses as crianças são capazes de imitar, mas de forma muito imprecisa. Por exemplo, se você dobrasse e esticasse o dedo, o bebê provavelmente tentaria imitá-lo, abrindo e fechando toda a mão. A imitação voluntária torna-se mais precisa entre os 12 e 18 meses. A imitação diferida (habilidade de reproduzir o comportamento de um modelo ausente) aparece pela primeira vez entre 18 e 24 meses. Crianças nessa idade são capazes deste tipo de imitação porque constroem símbolos mentais do comportamento modelo que está guardado em sua memória e é trazido a tona mais tarde para guiar a recriação da resposta do modelo.
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Jean Piaget Nesse estágio também está presente a ideia de que um objeto continua a existir quando não são mais visíveis ou percebidos por meio dos outros sentidos (permanência do objeto). Por exemplo, quando cobrimos um relógio com uma caneca temos a noção de que o relógio continua a existir. No estágio sensório-motor observamos a transição de atos reflexos automáticos para comportamentos sob controle voluntário e consciente. A criança passa de uma situação de passividade para uma organização móvel onde os meios podem ser variáveis para se chegar a um fim. A criança então é um ser ativo com maior domínio sobre suas ações.
Estágio Pré-operacional (dos 2 aos 7 anos) Neste estágio percebemos um grande aumento no uso de símbolos mentais (palavras e imagens) para representar os objetos e os eventos que as crianças se deparam. Mas o que é que é um símbolo? Um símbolo é algo que representa alguma coisa. A palavra “cachorro”, por exemplo, representa um mamífero doméstico de quatro patas e que possui um tamanho médio. As evidências de uso de símbolos pelas crianças para Piaget são a linguagem, as imagens mentais e os jogos simbólicos, como alimentar uma boneca com uma mamadeira imaginária. Piaget denomina essa fase de período pré -operacional porque, segundo ele, as crianças nessa fase ainda não adquiriram os esquemas operacionais que lhes permitissem pensar de forma lógica. Esse período é dividido em dois subestágios: período pré-conceitual (dos 2 aos 4 anos) e período intuitivo (dos 4 aos 7 anos). O Período Pré-conceitual é marcado pelo aparecimento da função simbólica, ou seja, a habilidade significar ou representar alguma outra coisa. As crianças agora são capazes de reconstruir o passado e pensar sobre objetos que não estão presentes. A linguagem seria a forma mais óbvia do simbolismo demonstrado por crianças pequenas. Mas será que o uso da linguagem promove o desenvolvimento cognitivo? Piaget dirá que não, já que, segundo ele, a linguagem somente reflete o que a criança já sabe e contribui muito pouco para o conhecimento. Ou seja, o desenvolvimento cognitivo promove o desenvolvimento da linguagem, e não o contrário. Também neste subestágio está presente o jogo simbólico ou jogo de faz de conta. As crianças podem imaginar ser outras pessoas, objetos simples simbolizam outras coisas, etc. Essa característica, para Piaget, seria algo muito saudável e podem contribuir positivamente para o desenvolvimento social, emocional e intelectual da criança. Piaget denominou a criança de dois a quatro anos de pré-conceituais porque ele acreditava que as ideias, conceitos e processos cognitivos delas seriam bastante primitivos para os padrões de um adulto. Nessa fase as crianças pequenas possuem o que chamamos de animismo (desejo de atribuir vida e qualidades de vida, como intenções) a objetos inanimados. Um exemplo é a criança que considera que o sol se põe porque pensa
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que ele está bravo, então apresentaria motivos para se esconder. Também nesta fase apresentam o chamado egocentrismo, a tendência de ver o mundo apenas pela própria perspectiva e a dificuldade em reconhecer o ponto de vista de outras pessoas. Por exemplo: uma criança nesta fase está diante de uma montanha assimétrica; ao se perguntar para ela o que um observador que estivesse em uma posição diferente da sua veria, ela diria que este estaria vendo exatamente o que ela vê. Mostra assim dificuldades em considerar as perspectivas do outro. A característica egocêntrica da criança torna quase impossível que ela diferencie aparências enganosas da realidade. Ao ser apresentado um gato para a criança e logo após colocada uma máscara de cachorro nesse gato, a criança dirá que o animal que se apresenta agora é um cachorro. Essas crianças não tem o que é chamado de decodificação dual, ou seja, a representação de um objeto em mais de uma maneira ao mesmo tempo. O Período Intuitivo é a fase na qual a criança se encontra entre os 4 e 7 anos. É praticamente uma extensão do pensamento pré-conceitual, embora as crianças sejam menos egocêntricas. O termo intuitivo deve-se ao fato de que o entendimento das crianças nessa fase ainda está muito baseado ou centrado em sua característica perceptual mais saliente, ou seja, o modo como as coisas parecem ser, em lugar de um pensamento lógico e racional. O exemplo mais famoso são os estudos de Piaget sobre a conservação. Pede-se que a criança que ajuste o líquido de dois copos iguais (longos e finos), até que ambos possuam a mesma quantidade de líquido. A seguir, o pesquisador coloca o líquido de um dos copos longos e finos em outro largo e baixo. Então se pergunta se ambos têm a mesma quantidade de líquido. As crianças menores de 6/7 anos, mais ou menos, normalmente dizem que o copo longo e fino contém mais líquido. Ou seja, o pensamento da criança a respeito de líquidos é aparentemente centrado em sua característica perceptual. Para Piaget crianças no período pré-operacional não se atentam para a conservação: elas não percebem que algumas propriedades dos objetos (como volume, massa ou número) mantêm-se imutáveis mesmo quando as aparências desses objetos são alterados de modo artificial. Porque as crianças nesse estágio não se atentam para a conservação? Segundo Piaget, essas crianças não possuem duas características: descentração e reversibilidade. A descentração é a habilidade de se concentrar em mais de um aspecto de um problema ao mesmo tempo. As crianças nesse estágio são incapazes de prestar atenção simultaneamente tanto na largura quanto na altura ao tentar resolver o problema de conservação de líquidos. Tendem a centrar sua atenção na altura ou na largura e tomam suas decisões pelas diferenças nessa dimensão particular. Assim, não reconhecem que aumentos na largura compensam a perda em altura na preservação da quantidade absoluta. A reversibilidade é a habilidade de desfazer ou negar mentalmente uma ação. A criança é incapaz de reverter mentalmente o que acabou de ver para concluir
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Jean Piaget que o líquido no pote largo e baixo ainda é o mesmo e atingiria a altura anterior se colocado novamente no pote original.
Estágio de Operações Formais (dos 11 anos em diante)
Estágio Operacional- Concreto (7 aos 11 anos)
Segundo Piaget, os adolescentes entram no nível mais elevado de desenvolvimento cognitivo - as operações formais - quando desenvolvem a capacidade para o pensamento abstrato. Esse desenvolvimento, geralmente em torno dos 11 anos, lhes proporciona um modo novo e mais flexível de manipular as informações. Não mais limitados ao aqui e agora, são capazes de compreender o tempo histórico e o espaço extraterrestre. Podem utilizar símbolos para representar outros símbolos (por exemplo, utilizar a letra X para representar um número, como 15) e, assim, podem aprender álgebra e cálculo. Podem apreciar melhor a metáfora e a alegoria e, assim, descobrir significados mais ricos na literatura. São capazes de pensar em termos do que poderia ser, e não apenas do que é. São capazes de imaginar possibilidades e de gerar e de testar hipóteses. A capacidade de pensar de maneira abstrata tem implicações emocionais. Até então, uma criança podia amar os pais ou detestar um colega. Agora, o adolescente pode amar a liberdade ou detestar a exploração de crianças como mão de obra de trabalho. Nesse período dá-se a emergência dos sentimentos idealistas e o início da adaptação ao mundo adulto. São características das operações formais: 1. Elas atuam sobre hipóteses e não sobre objetos; 2. Todas as possíveis relações das condições experimentais ou teóricas são levadas em consideração, mesmo aquelas fisicamente irrealizáveis (a isto se chama de raciocínio combinatório); 3. Há um controle estrito das variáveis. Ao testar hipóteses o sujeito reconhece a necessidade de controlar todas as variáveis, menos a que está sendo estudada; 4. No último nível estão as operações sobre as operações (dedução). Neste estágio as crianças tem presente o raciocínio hipotético-dedutivo. Para apreciar a diferença que o raciocínio formal faz, vamos acompanhar o progresso de uma criança típica frente a um problema piagetiano clássico, o problema do pêndulo. Mostra-se à criança (Carolina) um pêndulo - um objeto pendurado em um fio. Depois permite-se que ela veja como pode mudar quatro fatores: o comprimento do fio, o peso do objeto, a altura da qual o objeto é solto e a quantidade de força que se pode usar para empurrar o objeto. Pede-se a ela que imagine que fator ou que combinação de fatores determina a rapidez com que o pêndulo balança. Quando Carolina vê o pêndulo pela primeira vez, ainda não tem sete anos e está no estágio pré-operacional. Incapaz de formular um plano para atacar o problema, tenta uma coisa atrás da outra no modo de tentativa e erro. Primeiro ela põe um peso leve em um fio comprido e o empurra; depois tenta embalar um peso pesado em um fio curto; depois retira totalmente o peso. Não é apenas seu método que é aleatório; ela também não consegue compreender ou descrever o que aconteceu. Depois a
Neste estágio as crianças adquirem rapidamente operações cognitivas e aplicam essas novas e importantes habilidades quando pensam sobre objetos e eventos que estão experienciando. Crianças nesta fase podem resolver os problemas sobre conservação. Em relação a esta questão, a crianças de sete anos ou mais será capaz de descentrar ao enfocar simultaneamente tanto na altura quanto na largura de ambos os copos. É também capaz de usar a reversibilidade (habilidade de desfazer mentalmente o processo e dessa forma imaginar o líquido no copo original). Com essas operações cognitivas a criança saberá que cada um dos dois copos diferentes contém a mesma quantidade de líquido. Nessa fase também são capazes de seriação mental: habilidade de ordenar itens mentalmente em uma dimensão quantificável, como por exemplo, peso e altura. Quando o professor pede as crianças para fazerem uma fila em ordem de tamanho, do menor para o maior, crianças nessa fase fazem essa tarefa bem facilmente. Já as crianças pré-operacionais lutariam para fazer essa fila de forma adequada. Também apresentam a capacidade de transitividade, a capacidade de perceber relações dos elementos em uma série. Se por exemplo: João é mais alto que Marcos e Marcos é mais alto que Samuel, quem é mais alto, João ou Samuel? A consequência lógica é que João é mais alto que Samuel e a criança nessa fase é capaz de compreender a transitividade dessas relações de tamanho. Para a criança pré-operacional talvez fosse preciso colocar João e Samuel lado a lado para ver quem é mais alto. Algumas formas de conservação (massa, por exemplo) são compreendidas muito antes que outras (como volume). Piaget estava ciente dessas diferenças e por isso formulou o termo decalagem horizontal. A decalagem horizontal acontecerá quando problemas que aparentemente são bem similares são diferentes em complexidade. A conservação de volume, por exemplo, não se dá antes dos 9 anos porque é uma tarefa complexa que requer que a criança considere simultaneamente operações que envolvem conservação tanto de líquidos quanto de massa e então determine se há relações significativas entre esses dois fenômenos. Vimos que é lógico pensar o porquê de muitas sociedades iniciarem os estudos formais das crianças aos 6, 7 anos, já que nessa idade a criança é capaz de realizações intelectuais que antes não possuía. Nessa idade a criança já é capaz de compreender aritmética, pensar sobre a linguagem e suas propriedades, classificar animais, pessoas, objetos, eventos, entender relações entre letras minúsculas e maiúsculas, etc.
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Jean Piaget criança volta a encontrar-se com o pêndulo aos 10 anos, quando está no estágio de operações concretas. Dessa vez, ele descobre que o comprimento do fio e o peso do objeto afetam a velocidade do balanço. Entretanto, como ele varia ambos os fatores ao mesmo tempo, não consegue distinguir qual deles é mais importante ou se ambos o são. Carolina confronta-se com o pêndulo pela terceira vez na idade de 15 anos e, dessa vez, ela aborda o problema de maneira sistemática. Monta um experimento para testar todas as hipóteses possíveis, variando um fator de cada vez - primeiro, o comprimento do fio; depois, o peso do objeto; depois, a altura da qual o pêndulo é solto; finalmente, a quantidade de força utilizada - a cada vez mantendo os outros três fatores constantes. Dessa forma, ela é capaz de determinar que apenas um fator - o comprimento do fio - determina a rapidez de oscilação do pêndulo. A solução encontrada por ela para o problema do pêndulo mostra que ela já chegou ao estágio de operações formais. Carolina agora é capaz de produzir o raciocínio hipotético-dedutivo. Ela pode desenvolver uma hipótese e criar um experimento para testá-la. Considera todos os relacionamentos que pode imaginar e examina-os sistematicamente, um depois do outro, para eliminar o falso e para chegar ao verdadeiro. O raciocínio hipotético-dedutivo lhe oferece um instrumento para resolver problemas, desde consertar o carro da família até formular uma teoria política. O que acarreta essa mudança para o raciocínio formal? Piaget a atribuía a um misto de maturação cerebral e de expansão das oportunidades ambientais. Ambas são essenciais: mesmo que o desenvolvimento neurológico dos jovens tenha avançado o suficiente para permitir o raciocínio formal, eles só podem alcançá -lo com estimulação ambiental apropriada. Um modo de isso ocorrer é mediante o esforço cooperativo. Vejamos este exemplo: quando estudantes universitários (com idade média de 18,5 anos) receberam um problema de química e foram solicitados a montar seus próprios experimentos para resolvê-lo, os estudantes aleatoriamente selecionados para trabalhar em pares resolveram mais problemas do que os que trabalharam sozinhos. Quanto mais os parceiros questionavam o raciocínio um do outro, maiores eram os avanços no pensamento. Como com o desenvolvimento de operações concretas, a escolaridade e a cultura parecem desempenhar um papel importante como Piaget por fim reconheceu.
ciência não tenha questionado seriamente a sequência geral de desenvolvimento descrita por Piaget, ela questionou sua proposição de estágios definidos de desenvolvimento. Por exemplo, a distinção entre os estágios de operações concretas e formais pode ser menos bem definida do que sugere a teoria de Piaget. Seus próprios textos apresentam muitos exemplos de crianças demonstrando aspectos do pensamento científico muito antes da adolescência. Ao mesmo tempo, Piaget parece ter superestimado as capacidades de crianças com mais idade. Muitos adolescentes tardios e adultos - talvez de um terço à metade - parecem incapazes de pensamento abstrato como Piaget o definiu, e os que são capazes nem sempre o utilizam. A familiaridade de uma situação e o quanto uma criança conhece-a pode influenciar grandemente a sofisticação do raciocínio de uma criança. Entretanto, Piaget, na maioria de seus textos, deu pouca atenção às diferenças individuais, às variações no desempenho de uma criança em diferentes tipos de tarefas ou às influências sociais e culturais.
Avaliação da Teoria de Piaget A análise de Piaget do desenvolvimento do raciocínio formal parece, até certo ponto, bastante precisa. Entretanto, existem diversos avanços, tanto na terceira infância como na adolescência, que ela não leva em conta adequadamente. Entre eles estão o acúmulo gradual de conhecimento e de saber em campos específicos; o aumento na capacidade de processamento de informações; o desenvolvimento da metacognição, da consciência e o monitoramento de nossos próprios processos e de nossas estratégias mentais. Embora a
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QUESTÕES DE CONCURSOS 1. Com relação às teorias de desenvolvimento e aprendizagem, julgue o item seguinte. Segundo Jean Piaget, o desenvolvimento psíquico, que se inicia no nascimento e se encerra na idade adulta, orienta-se essencialmente para o equilíbrio. ( ) Certo
( ) Errado
2. Julgue o item subsequente, acerca das bases psicológicas da aprendizagem. A perspectiva epistemológica do interacionismo, representada pelo pensamento de Piaget, nega o empirismo e o racionalismo. A ideia central da teoria de Piaget é a de que o conhecimento precede à experiência. ( ) Certo
( ) Errado
3. Quando a professora percebe que uma criança está na fase heterônoma do desenvolvimento moral, expressando crenças e comportamentos tipicamente estudados e descritos por Piaget, sabe que não pode ensinar ao aluno como adquirir autonomia no pensamento e na ação. De fato, se ela se propusesse a fazer isso, estaria, segundo o construtivismo, levando esse aluno a a) Pular um estágio importante do desenvolvimento cognitivo. b) Parar de atuar cognitivamente, por confiar na professora. c) Realizar uma aprendizagem exógena, para a qual não há maturação biológica. d) Distinguir entre o aparato jurídico e as regras éticas da sociedade em que vive. e) Confundir as fronteiras entre os conceitos de assimilação, acomodação e adaptação. 4. Quando uma criança de quatro anos diz “eu odio comer verdura”, ela está conjugando um verbo irregular (odiar) como se fosse um regular. De acordo com Piaget, essa criança a) Cometeu um erro construtivo. b) Acabou de entrar na fase anal. c) Construiu a noção de qualidade. d) Entrou no período operatório formal. 5. Prova: ACEP - 2010 - Prefeitura de Quixadá - CE – Psicólogo - A teoria das fases de desenvolvimento da criança, de Piaget, serve de base e pode auxiliar os psicólogos organizacionais. Assinale a alternativa que apresenta situações em que essa teoria pode ser utilizada.
atender aos filhos dos funcionários. b) Na identificação de problemas de aprendizagem que possam estar comprometendo o desempenho dos indivíduos na realização de suas tarefas, principalmente em momentos de mudanças tecnológicas. c) Na definição de planos de benefícios que contemplem ajudas e bolsas escolares para filhos de funcionários. d) No reconhecimento de problemas de saúde que possam estar comprometendo o desenvolvimento físico dos filhos de funcionários. 6. Com relação aos estágios do desenvolvimento cognitivo descritos por Jean Piaget, é correto afirmar: a) No estágio operatório formal, as crianças operam e agem no mundo concreto, real e percebido dos objetos e eventos. O pensamento egocêntrico é substituído pelo pensamento operatório, que envolve lidar com uma ampla variedade de informações externas à criança. b) O estágio sensório-motor ocorre do nascimento aos 3 anos de idade e é caracterizado pelo aprendizado por meio da observação sensorial e pela aquisição do controle de suas funções motoras a partir de atividades, exploração e manipulação do ambiente. c) No estágio do pensamento pré-operatório, as crianças usam símbolos e a linguagem de forma mais ampla do que no estágio sensório-motor. O pensamento e o raciocínio são intuitivos. As crianças não conseguem pensar de forma lógica ou dedutiva, e seus conceitos são primitivos. d) O pensamento hipotético-dedutivo é a organização mais elevada da cognição e possibilita que as pessoas elaborem uma hipótese ou proposição e a testem em relação à realidade. O raciocínio dedutivo parte do particular para o geral e é um processo mais complicado do que o raciocínio indutivo, que avança do geral para o particular. e) No estágio operatório concreto, emerge a função semiótica, na qual as crianças conseguem representar algo por meio de um significante, que tem uma função representativa, ou seja, usam um símbolo ou sinal para representar outra coisa. 7. Prova: FCC - 2009 - TJ-AP - Analista Judiciário – Psicologia - No modelo piagetiano de desenvolvimento cognitivo, a criança em idade escolar entre 7 a 12 anos apresenta um declínio do egocentrismo intelectual e um crescente incremento do pensamento lógico, encontrando-se no período a) Das operações formais. b) Sensoriomotor. c) Pré-operacional. d) Das operações concretas. e) Das operações informais.
a) Na tomada de decisão de criação de creches para
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Jean Piaget 8. Prova: FCC - 2009 - TJ-SE - Analista Judiciário – Psicologia - No modelo piagetiano de desenvolvimento cognitivo, o período pré-operacional é esperado a) Dos 0 aos 24 meses, quando se formam os esquemas sensoriais-motores. b) Dos 2 aos 7 anos, em que o indivíduo inicia a capacidade de representar uma coisa por outra, ou seja, formar esquemas simbólicos. c) Dos 7 aos 12 anos, em que se inicia a frequência à escola elementar, que será marcada por grandes aquisições intelectuais. d) Dos 8 aos 12 anos, quando ocorre um crescente incremento do pensamento lógico. e) Dos 12 anos em diante, quando tanto os esquemas conceituais como as operações mentais realizadas se referem a objetos ou situações que existem concretamente na realidade. 9. Prova: ACEP - 2010 - Prefeitura de Quixadá - CE - Psicólogo / Psicologia - Sobre as fases do desenvolvimento humano e os fatores psicológicos do desenvolvimento, assinale a alternativa CORRETA. a) Freud abordou a construção das estruturas mentais do pensamento pautadas na epistemologia genética. b) A interação e a socialização, segundo Piaget, são mecanismos importantes que favorecem a autorregulação do ser humano. c) No Construtivismo, o período da criança entre 02 a 07 anos caracteriza-se como estágio pré-operacional. d) Vygotsky associou o desenvolvimento da inteligência da criança aos processos de assimilação e acomodação.
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RESPOSTAS DAS QUESTÕES DE CONCURSOS RESPOSTA 1: CERTO COMENTÁRIO: Como vimos, segundo Piaget, o desenvolvimento cognitivo tende para a equilibração, ou seja, todos os indivíduos procuram realizar um equilíbrio entre seus modos de pensamento e o que acontece no ambiente. RESPOSTA 2: ERRADO COMENTÁRIO: A teoria de Piaget é justamente o contrário do que é afirmado na sentença. Esta teoria é denominada construtivista, justamente por pressupor que o conhecimento dos indivíduos se constitui através da interação com o meio, ou seja, através das experiências vividas.
COMENTÁRIO: Basta verificarmos a faixa etária apresentada nas afirmativas para verificarmos que a resposta certa é a letra B. Pessoal, verificamos em muitas questões sobre o desenvolvimento cognitivo, segundo Piaget, a apresentação da faixa etária de cada estágio, portanto é muito importante decorarmos quais são esses períodos e a idade abarcada por cada um deles. Assim, garantiremos pontos em diversas questões. RESPOSTA 9: C COMENTÁRIO: Não é preciso saber nada sobre a teoria de Vygotsky e Freud (que veremos mais a frente) para verificarmos que a resposta certa é a letra C. O período de 2 a 7 anos é justamente a idade que compreende o estágio pré-operacional.
RESPOSTA 3: B COMENTÁRIO: Para que se adquira autonomia de pensamento e ação é importante que cada sujeito, de acordo com o construtivismo, viva suas próprias experiências e, assim, será ativo cognitivamente, construindo seus conhecimentos. A letra A está incorreta porque, segundo Piaget, todas as pessoas devem, necessariamente, passar por todos os estágios de desenvolvimento por ele propostos. RESPOSTA 4: A COMENTÁRIO: Vejamos: a resposta não poderia ser a letra B porque fase anal é um conceito Freudiano. A resposta C não faz muito sentido. A letra D não pode ser verdadeira porque a criança só entra no estágio das operações formais a partir dos 11 anos e, no enunciado, se afirma que a criança possui apenas quatro anos. Então concluímos que a resposta só pode ser a alternativa A. RESPOSTA 5: B COMENTÁRIO: Como a teoria de Piaget trata do desenvolvimento cognitivo, fica claro que ela pode ser utilizada para a identificação de problemas de aprendizagem. RESPOSTA 6: C COMENTÁRIO: Se verificarmos a descrição feita dos estágios de desenvolvimento de Piaget, verificamos que a única afirmativa completamente correta é a alternativa C. RESPOSTA 7: D COMENTÁRIO: No período das operações concretas ocorre sim uma diminuição do pensamento egocêntrico e aparecimento de indícios do pensamento lógico, preparando o sujeito para entrar na fase das operações formais. Além disso, somente através da idade apresentada no enunciado (7 a 12 anos) fica claro que se trata do período de operações concretas. RESPOSTA 8: B
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