Gazeta de Alagoas
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| QUARTA-FEIRA, 09 DE JANEIRO DE 2008 |
Imagem: reprodução / Arte: Sandro Oliveira
Considerado o disco mais importante dos Beatles, Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band revolucionou a música pop com inovações e experimentos, tudo a serviço das melodias acessíveis que levaram os quatro rapazes de Liverpool ao topo das paradas. Documento histórico sobre as mudanças sociais, políticas e estéticas dos anos 60, o álbum tem seu processo de elaboração dissecado no livro Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band – Um Ano na Vida dos Beatles e Amigos, do jornalista inglês Clinton Heylin. No Brasil, a obra sai pela Conrad
Por dentro da árvore-mãe | RAMIRO RIBEIRO Especial para a Gazeta
Imagine-se dentro de uma floresta de “árvores” musicais cujos galhos e troncos são mais espessos uns que os outros. É mais ou menos assim que pode ser vista a música pop produzida nos Estados Unidos e na Inglaterra dos agitados anos 60. Em meio a essa “flora”, mais especificamente em junho de 1967, surgiria a espécie mais frondosa do bosque, que redefiniria os caminhos de toda uma genealogia sonora. Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band – Um Ano na Vida dos Beatles e Amigos, do jornalista inglês Clinton Heylin, revela o processo de “feitura” da mais cultuada obra dos quatro rapazes de Liverpool, o álbum Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, lançado há mais de quatro décadas. Especialista em música, Heylin não vê apenas a “árvore-mãe”, e sim a floresta inteira, num cenário musical efervescente cuja composição foi impulsionada pelo ácido lisérgico, o LSD, e também por muitos outros experimentalismos. O livro acompanha de perto os bastidores do trabalho dos Beatles, mas vai além ao retratar a disputa que rolava entre as bandas na época: elas “competiam” entre si para ver quem expandiria as fronteiras daquilo que até então era classificado “apenas” como música pop – além de Bob Dylan e dos californianos do Beach Boys e do Byrds, grupos ingleses que começavam a despontar, como o Cream do jovem Eric Clapton e o Pink Floyd do talentoso Syd Barrett (1946-2006), estão no “panorama”. É nessa corrida psicodélica,
ambientada em 1967, que Heylin nos convida a embarcar. A leitura de seu livro – que sai no Brasil pela Conrad – nos leva a uma Los Angeles iluminada pelos primeiros raios da contracultura e do movimento hippie e à Londres dos estúdios Abbey Road, onde os “Fab Four” entraram em novembro de 1966 para gravar o sucessor de Revolver (o disco preferido do autor). O resultado? Cinco meses e mais de 700 horas de gravação depois, estava erguida a obra que, apesar de não ser explicitamente “conceitual”, consolidou o formato de álbum de rock, algo inexistente numa época em que as gravadoras selecionavam e montavam os LPs com pouca ou nenhuma intervenção de bandas ou artistas. A importância do disco, segundo Clinton, está justamente no controle que a banda e o produtor George Martin exerceram sobre sua produção, desde o início – um “privilégio” avalizado por três anos ininterruptos de sucesso e por uma febre mundial potencializada ao máximo pela gravadora (e por seus executivos vorazes). A gravação de Sgt. Pepper’s representa o ponto de virada nessa estrutura e sinaliza uma transformação cujos primeiros esboços já haviam sido traçados em 1965, com o álbum Rubber Soul, e que na verdade continuou em curso até a separação do grupo, em 1970. Nesse meio tempo, cresceram não somente as cabeleiras, mas também os egos e as tensões provenientes das novas influências de cada um dos quatro rapazes que um dia se encontraram em Liverpool. Eles ainda não sabiam, mas a partir de Sgt. Pepper’s e de seu intrincado
mosaico de referências – da capa inovadora até a catarse presente em sua última faixa, A Day in the Life –, o sonho começava a acabar. Musicalmente, o álbum é o resultado final de todos os experimentos sonoros que um estúdio podia oferecer à época, com excessos que lhe conferiram um certo ar barroco em alguns momentos – além de um “todo” desigual. “Um álbum com doze canções (uma é reprisada), algumas realmente magníficas, a maioria apenas bem composta, e uns dois tapa-buracos [...]”, escreve Heylin. Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band – Um Ano na Vida dos Beatles e Amigos contextualiza esse processo e traz à tona todas as etapas da “saga” que resultou nesse verdadeiro divisor de águas. O início claudicante, a presença imprescindível de George Martin na direção musical, o domínio de Paul, a tristeza de um John (1940-1980) infeliz com o primeiro casamento e imerso em doses de ácido e o crescente descontentamento de George Harrison (1943-2001) com o pouco espaço dado às suas composições. Também não faltam detalhes técnicos sobre cada uma das faixas, do número de instrumentos utilizados até as datas e horários das sessões de gravação. O autor se esforça para mostrar a repercussão do álbum na mídia e junto aos outros “competidores”. É interessante observar como a glorificação do disco, automaticamente rotulado como “revolucionário” e “o melhor de todos os tempos” pela imprensa inglesa, foi substituída pela ira e pela negação do passado por parte do movimento punk, dez anos após o seu lançamento, em
1977 – só no final da década de 80 é que Sgt. Pepper’s teria seu prestígio recuperado, na “esteira” do relançamento do catálogo da banda em CD e também com as celebrações em torno do aniversário dos 40 anos da obra, comemorado no ano passado. A partir da análise da “recuperação da glória perdida pelo tempo”, Clinton Heylin lança ataques desnecessários em direção a outros jornalistas e críticos, além de detonar a maioria das famigeradas listas de melhores álbuns de todos os tempos, que proliferaram na virada do século e laureavam Sgt. Pepper’s por qualidades sonoras que o autor afirma não constarem do disco. Heylin é categórico ao afirmar que o excesso de idéias e conceitos foi determinante para que este não fosse considerado o disco “primordial” dos Beatles. Para ele, seu mérito inegável está em condensar, na ousadia orquestral e no clima enigmático de suas letras, toda a avalanche de transformações não só da música popular, mas da cultura mundial como um todo. Em depoimento transcrito no livro, Paul McCartney endossa a teoria de Heylin e faz reverberar a tese do “lugar certo na hora certa”: “Em termos de relevância, é impossível continuar a fazer Pepper a vida toda. Ele tocou as notas certas, na época certa. Era estranho, esquisito e imensamente popular. Mais do que marcar, foi o álbum que sintetizou uma época. Pepper era algo de uma inevitabilidade absoluta. Tinha de acontecer. A mentalidade vitoriana dentro da qual fomos criados não podia dar em outra coisa senão nessa festa”. (CONTINUA NA PÁGINA B2)
CURIOSIDADES SOBRE O “SARGENTO PIMENTA” ›› É o disco dos Beatles mais vendido na Inglaterra – 4,8 milhões de unidades – e nos Estados Unidos – mais de 11 milhões de cópias; ›› Liderou as paradas de sucesso dos dois lados do Atlântico; ›› Ganhou os Grammys de álbum do ano e de melhor disco pop contemporâneo de 1967; ›› A capa dupla foi um marco. Idealizada pelo artista plástico Peter Blake e com influências da por art, a instalação custou 1.500 libras, 300 vezes mais que uma capa de disco da época; ›› O custo final do LP foi de US$ 100 mil, um “absurdo” para o mercado de então; sua gravação consumiu 700 horas de estúdio;
SERVIÇO Título: Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band – Um Ano na Vida dos Beatles e Amigos Autor: Clinton Heylin Editora: Conrad Preço: R$ 39 (256 págs.)
›› Semanas após seu lançamento, o empresário do grupo, Brian Epstein, morreu de overdose. A banda anunciou que ela própria gerenciaria seus negócios. Fonte: Revista Bizz, edição 214 (junho de 2007). Editora Abril.
AFP
Paul, Ringo, George e John: “vitorianos” em festa
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QUARTA-FEIRA, 09 DE JANEIRO DE 2008
André Fon - Cortesia
MARIA CÂNDIDA “COMO O FOGO REVELA AS MÁS IMPUREZAS DO OURO, AS DESGRAÇAS REVELAM O CORAÇÃO DOS FALSOS AMIGOS”
Divulgação
Metastásio
NAS SEXTAS... O “gordinho” mais simpático da cidade, Valdemar Leão está agitando as sex-
tas-feiras na Barra de São Miguel, com um encontro para jovens, resultado: é uma verdadeira festa. Divulgação
Karina Padilha comprova a harmonia entre maternidade e beleza
NOITADA
AS GÊMEAS
Soubemos que foi uma noitada com todas as notas mil, as comemorações dos cento e vinte anos de Rosa Carolina, Patrícia Gabriela e Cláudia Simões. Lamentavelmente estivemos ausentes.
Os amigos não podem esquecer em parabenizar, hoje, as gêmeas Roberta e Renata Correia Farias, em razão da idade nova que comemoram.
JOVENS
Sempre simpática a senhora Therezita Galvão Castro
João Paulo Procópio, para alegria de seus avós Januário e Margarida, e da mamãe Rosa Maria, veio passar pequena temporada de férias aqui em Maceió, trazendo alegrias e mais um punhado de gente bonita.
TAMBÉM
Casal amigo nota mil, Waldo e Ávia Wanderley
Outra figura de destaque que aniversaria hoje é o industrial Severino Carlos Maranhão.
SHOW
FEIRA
Ficamos sabendo, na manhã de ontem, que o padre Antônio Maria virá à cidade de São Luís do Quitunde ainda neste janeiro. Voltaremos com mais detalhes.
O talento dos artesãos do Norte-Nordeste estará em evidência na próxima sexta-feira, quando começa 14ª edição da Artnor, no Espaço Cultural e de Exposições, em Jaraguá.
SEMPRE Uma amiga querida, que continua aquela simpatia de sempre, é a senhora Cléa Torres. Reencontrá-la no último dia do ano foi uma alegria.
Contatos: candidapalmeira@ig.com.br | Rua Dep. José Lages, 250/101 - Ponta Verde - CEP 57035-330
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA B1
Sobre as outras árvores da “floresta” INFLUÊNCIAS E INFLUENCIADOS NO MESMO CALDEIRÃO POP DE SGT. PEPPER’S LONELY HEARTS CLUB BAND | RAMIRO RIBEIRO Especial para a Gazeta
Depois do advento de Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, o mundo e a música nunca mais seriam os mesmos. Mas se os quatro rapazes de Liverpool viraram referência para toda uma geração de músicos, também possuíam suas preferências musicais. Confira, a seguir, outras pérolas que chegaram às “radiolas” naqueles esfuziantes anos 60.
THE BEACH BOYS – PET SOUNDS (1966) Se Rubber Soul definiu um momento capital dos Beatles, sinalizando para a viagem psicodélica na qual eles iriam embarcar, também serviu para atiçar Brian Wilson, o gênio errático que era o coração dos Beach Boys. Um álbum que se igualou – e até mesmo superou – ao trabalho dos “Fab Four”.
BOB DYLAN – BLONDE ON BLONDE (1966) Primeiro álbum duplo do rock, seu sucesso ajudou a garantir que o avanço, a experimenta-
ção e o estímulo se tornassem fundamentais para a perspectiva do estilo musical. Seu blues selvagem dá ao disco um tom de conversa de fim de noite, reflexão e desespero. Clássico instantâneo.
COUNTRY JOE AND THE FISH – ELECTRIC MUSIC FOR THE MIND AND BODY (1967) Um dos discos mais coerentes do “Verão do Amor” e da geração hippie, nele suas guitarras alternam efeitos suaves e golpes no cérebro. Blues, folk e rock para todos os gostos. O movimento psicodélico em seu estágio embrionário, numa São Francisco que era celeiro de estudantes radicais movidos a (muito) LSD e política.
CREAM – DISRAELI GEARS (1967) Auge artístico do trio de jazzblues-rock, o álbum “abriu” as portas para novos gêneros musicais, como o jazz fusion e – dizem – o rock progressivo. A simbólica colagem fluorescente da capa era o acompanhamento perfeito para a enxurrada de
música de vanguarda ali contida.
PINK FLOYD – THE PIPER AT THE GATES OF DAWN (1967) Ninguém escrevia canções psicodélicas melhor do que Syd Barrett. A banda conseguia equilibrar a experimentação sonora de seus shows ao vivo e a técnica de composição por trás de hits como Arnold Layne e See Emily Play. Com The Piper..., o grupo conseguiu capturar com perfeição a essência psicodélica dos anos 60.
THE WHO – THE WHO SELL OUT (1967) Obra-prima da pop art, faz uma leitura satírica da relação entre música e propaganda. O disco foi concebido como uma transmissão de uma falsa rádio pirata, intercalando as faixas de música com comerciais fictícios. Os jingles ainda mantêm seu apelo, embora o tempo tenha passado antes que a idéia pudesse ser totalmente compreendida. THE DOORS – THE DOORS (1967)
A profunda influência exercida pelo grupo na evolução do rock no final dos anos 60 pode ser atribuída não apenas ao vocal apaixonante e ao carisma pessoal de Jim Morrison, mas também à integração certeira entre o teclado de Ray Manzarek, a guitarra de Robby Krieger e a bateria de John Densmore. Morrison era o “cara” da banda, mas o impacto deste álbum está efetivamente na interação entre seus quatro integrantes.
JEFFERSON AIRPLANE – SURREALISTIC PILLOW (1967) Assim como os Beach Boys deram uma idéia do que era a cultura do surfe na Califórnia no início da década de 60, Surrealistic Pillow pintou um quadro musical do livre pensamento, típico do chamado “Verão do Amor” na região de São Francisco. THE JIMI HENDRIX EXPERIENCE - ARE YOU EXPERIENCED (1967) Uma aura cerca James Marshall Hendrix até hoje. Seus dons quase sobrenaturais com a guitarra
elétrica e seu controle hábil de efeitos especiais nunca foram superados. Sua fusão de sons psicodélicos, blues e funk, suas grandes canções e sua aparição como importante músico negro no mundo branco dos roqueiros simplesmente deixaram atônita a aristocracia do rock dos anos 60. Avassalador. “esquerda” detestou como eles corromperam a música brasileira de “raiz”. Os Mutantes flutuavam nesse redemoinho e cresceriam em popularidade no início dos anos 70.
RAVI SHANKAR – THE SOUNDS OF INDIA (1968) Compilação definitiva da música indiana clássica, de forma acessível, gloriosamente bem tocada e informativa, numa época em que rastrear estilos musicais pelo planeta exigia um certo esforço. Amigo e professor informal dos Beatles, Shankar era um “embaixador” da música. OS MUTANTES – OS MUTANTES (1968) Liderados por jovens compositores como Gilberto Gil e Caetano Veloso, os tropicalistas pegaram tudo o que tinham ouvido em Londres e São Francisco e fizeram a coisa do seu jeito. A “direita” odiou seus cabelos, sua imoralidade e as drogas; a
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FRANK ZAPPA AND THE MOTHERS OF INVENTION – WE’RE ONLY IN IT FOR THE MONEY (1968) O quarto trabalho de Zappa com o Mothers confirmou seu status de gênio visionário. Com um espírito selvagem e cheio de vitalidade, a capa é a primeira paródia surrealista de Sgt. Pepper’s. Suas canções bem integradas e sedutoras tecem uma análise irrefutável do estilo de vida e da política niilista dos Estados Unidos. Fonte: 1001 Discos para Ouvir antes de Morrer. Organização: Robert Dimery. Editora Sextante, 2007.