Edição 10
O Cariri de
XICO SÁ
nas páginas do Big Jato
PoLÍTICAS PÚBLICAS:
em busca das cidades perdidas
CARIRI REVISTA 1
A RS2 Consultoria é especializada em gestão, consultorias, auditorias e treinamentos. Possui reconhecimento internacional, sendo uma das poucas empresas do ramo no Brasil que é certificada, por organismo credenciado ao INMETRO, nas normas NBR ISO 9001:2008, NBR ISO 14001:2004 e OHSAS 18001:2007 * ISO 9001 - Gestão da Qualidade * ISO 14001 - Gestão Ambiental * PBQP/H - Construção Civil * Gestão Financeira * Certificação de Produtos * ARG - Apresentação de Resultados Gerenciais * Pesquisa e Estudo de Mercado * Planejamento Estratégico * NBR 16001 - Responsabilidade Social * Acreditação Hospitalar – ONA * OHSAS 18001 - Segurança e Saúde Ocupacional
2 CARIRI REVISTA
1.189 empresas certificadas
Número de empresas certificadas no Nordeste
330 empresas certificadas 243 empresas certificadas
44 empresas certificadas
OHSAS 18001
34 empresas certificadas
PBQP/H
ISO 14001
27 empresas certificadas
ISO 9001
CERTIFICAÇÃO DE PRODUTOS
ONA
Fontes dos dados: INMETRO, Ministério das Cidades, QSP e ONA;
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#caririeditorial
Caro leitor, Diz o Velho, personagem do romance Big Jato, lançado recentemente por Xico Sá, que “um homem de verdade tem que saltar para dentro do dia, senão o dia engole ele, como uma sucuri devora o boi”. Saltar para dentro do dia parece significar viver de verdade, intensamente, sem rodeios ou hesitações. Assim temos feito com a CARIRI. Como dissemos no início e voltamos a lembrar em algumas edições, a ideia é revelar a imensa riqueza cultural dessa região fantástica, marcada pela magia e mais recentemente por conquistas relevantes de prosperidade. Contar sobre as pessoas, o imaginário, a lida do cotidiano, a chegada da sofisticação da tecnologia. Resgatar histórias e fazer história. Promover o encontro do Cariri consigo mesmo e, simultaneamente, mostrá-lo a outras paragens. Acreditamos estar fazendo a diferença em tempos de pouca valorização da leitura e fragilização do impresso cada vez mais evidente. No entanto, ainda há leitores curiosos e apaixonados que justificam o esforço que empreendemos, com grande prazer. E, felizmente, há também escritores exuberantes e criativos como Xico Sá, nossa capa, um filho da terra que nunca se perdeu de sua essência, agora exposta no seu primeiro roman-
ce. Dedicamos algumas páginas a revelar sua trajetória, suas frases inteligentes e bem humoradas, sua poesia estruturando a prosa. Como ainda é início de ano ouvimos alguns especialistas a respeito das perspectivas de investimento para 2013 e iniciamos um observatório atento ao que as novas gestões pretendem fazer para resgatar uma urbanidade mais salubre. Tem também “Depois do Sol”, filme rodado em terras do Cariri, com direção de Emmanuel Nogueira e produção executiva de Dora Freitas E outras curiosidades para incrementar com mais um pouquinho de informação o salto para dentro do dia!
Editora-Geral: Tuty Osório
6 CARIRI REVISTA
#caririconexão Por Lara Costa
A palavra dos últimos meses foi “compartilhar” (ou retwitar). Aliás, esse tem sido o verbo mais conjugado desde que a internet vive a revolução das redes sociais. Nossos post´s se multiplicam na timeline alheia, espalhando pelo mundo as belezas, os talentos e o inegável amor pelo Cariri.
Tweets @nathrandrade Nathália Andrade
chocada com a @caririrevista! que revista linda!
Facebook São ótimas as matérias da Cariri Revista! Janiele Feitosa
@DaaniLt Daniele A. L.
Tive a belíssima oportunidade de ler nesta revista a história da Irmã Annette e fiquei encantada com sua trajetória até chegar a ser a mãe dos romeiros. Parabéns pela sensibilidade jornalística por parte dos repórteres! Graça Oliveira
Irmã Annette é realmente uma revolucionária. Sua história é encantadora. Uma mulher que contesta a posição do machismo absoluto dentro da Igreja e na sociedade... Vida longa irmã Annette! Gustavo Cabral
A Revista mais uma vez está ótima. Parabéns. Sonia Lustosa
Vocês e suas reportagens maravilhosas! #Quero Ivayr Saraiva
A minha matéria preferida foi sobre o clube de negócios. Excelente iniciativa para a região! Roberto Ramos
Envie sua mensagem para Cariri Revista pelo e-mail: tutyosorio@gmail.com, Twitter: www.twitter.com/caririrevista ou Facebook: www.facebook.com/CaririRevista.
@caririrevista pessoal, tô “apaixonada” pelo trabalho de vcs.
@daian_alves Daian Alves
@CaririRevista A cada edição um visual mais surpreendente, o Cariri se mostrando com uma qualidade gigantesca.
E-mail Oi Raquel, sou do Crato mas moro há muito tempo no RJ. Recebi de um amigo a assinatura da Revista Cariri e fiquei encantada com seu modo de escrever ao ler o que você escreveu sobre a Missa do Vaqueiro e a reportagem de Annete Dumoulin. Parabéns pelo seu trabalho, é muito bom ler e se emocionar com as palavras, ainda mais quando se trata de algo que nos traz de volta pra nossa terra, como a Revista faz comigo. Mais uma vez parabéns!!!” Simone Freitas CARIRI REVISTA 7
#edição 10 CAPA DESTA EDIçÃO
Foto: Rafael Vilarouca EXPEDIENTE
capa
Diretores Isabela Bezerra Renato Fernandes
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EDITORA-GERAL Tuty Osório tuty@caririrevista.com.br EDIÇÃO DE TEXTOS e redação Claudia Albuquerque claus.albuquerque@gmail.com Projeto gráfico Fernando Brito DESIGN GRÁFICO Álvaro Beleza Lívia Beleza RepORTAGEM Raquel Arraes Sarah Coelho Lara Costa FOTOGRAFIA Rafael Vilarouca redes sociais Lara Costa www.twitter.com/caririrevista www.facebook.com/caririrevista direção de arte em publicidade Rubênio Lima Publicidade (88) 3085.1323 | (88) 8855.3013 comercial@caririrevista.com.br COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Tarsila Krüse Sérgio Pires
PICOTADO espaço cidades
12 79
negócios
49
saúde
20
POLÍTICAS PÚBLICAS
64
GASTRONOMIA viajantes especial
83 86 89
cinema
26
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#cariripicotado
O QUE MUDA NA SUA VIDA EM 2013? DENTRO DE CASA E MUNDO AFORA “Em cada virada de ano aproveito para renovar minhas esperanças e expectativas. Em 2013, minhas atenções serão divididas entre novidades em casa e desafios no mundo corporativo. Com a chegada de meu filho George,
régis capibaribe
precisarei reforçar as atenções com a família, dando todo o suporte para minha esposa Renata e meu filho Renan, um quase pré-adolescente com todos os questionamentos da idade. Em paralelo, o ano promete bons projetos, nos quais a Comunicação terá papel estratégico, com o mercado aquecido em diversos setores. É nesta realidade positiva que buscaremos boas oportunidades de negócios para a AD2M Engenharia de Comunicação, nossa agência em Fortaleza, que completa 17 anos em maio, bem como para a Loa Publicidade, agência de publicidade criada no ano passado e nosso novo xodó. Vai ser um ano para se ter muito a celebrar!”
(Mauro Costa, jornalista) rafael vilarouca
APRIMORAR HABILIDADES “Em 2013 eu quero investir em minha carreira. Fazer cursos de aperfeiçoamento, me especializar, estudar língua estrangeira para melhorar minhas possibilidades e habilidades profissionais”. (Luzielma Bessa, secretária)
O LUGAR CERTO “Ao pensar sobre as mudanças do ano, a primeira coisa que me vem à cabeça é que as mudanças não são de 2013 e sim mudanças que podem ser realizadas por nós em 2013. Por isso, qualquer prognóstico a respeito do ano, primeiramente, deve ser o nosso prognóstico pessoal para realizar as mudanças necessárias, sermos exatamente o que queremos ser e estarmos onde queremos estar. Já posso adiantar que comecei 2013, literalmente, mudado para o Crato. E aqui continuo sendo mudado (para melhor)
pelas pessoas maravilhosas que conheci. A meu ver, a melhor atitude para esse ano é desejar a todos o que peço para mim: a força e a paz necessárias para a realização dos sonhos. Em 2013 e sempre!” (Antonio Carlos Campos, advogado) 12 CARIRI REVISTA
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FEIRA MÍSTICA “Para 2013 estou reformulando o espaço de minha loja, ampliando com uma comedoria, massagens, reiki... Além disso, quero trabalhar atividades físicas com misticismo e fazer a segunda feira mística no Crato”. (Raquel Leite, empresária)
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DRINKS E VIAGENS
UM NOVO AMOR!
“Uma das coisas que eu queria – e que já consegui esse ano – foi sair da casa de meus pais e morar sozinho. Agora quero arrumar um emprego que seja na minha profissão de barista e fazer uma viagem com todos os meus amigos”. (Maurício Ferreira, barista)
“Em 2013 quero crescer profissionalmente. Dar uma renovada na vida para mim e para meus filhos. Arrumar um novo amor, uma pessoa que me compreenda e não me julgue, que procure viver em harmonia para os dois crescerem juntos”. (Cristiane Soares, merendeira)
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NA GINGA DA CAPOEIRA “Como eu já estou na metade do curso, tenho planos de focar mais nas minhas leituras para dar embasamento ao meu projeto de conclusão de curso, e para os estágios que se iniciam. E paralelo à faculdade, meu grande interesse é a capoeira. Quero criar um projeto de um ponto de cultura para a capoeira e os capoeiristas”. (Luiz Souza – Estudante Universitário) CARIRI REVISTA 13
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LIVRE DO ALUGUEL “Esse ano quero enfim comprar meu carro zero e realizar o sonho de ter minha casa. Também quero rever meus amigos das antigas de Fortaleza. Moro no Crato já tem um tempo e nunca mais os vi. Profissionalmente, desejo multiplicar minha produção de vendas para meu salário aumentar e eu conseguir juntar algum capital pra abrir meu próprio negócio”. (Paulo Ricardo – Consultor de vendas)
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SANGUE NOVO “Quero desenvolver a estrutura de minha produtora de vídeo, que criei recentemente com mais dois sócios, e trazer uma proposta de publicidade nova para a região do Cariri, trabalhando com comerciais do gênero filme e não só animações em 2D como vem sendo feito atualmente”. (Carlos Lourenço, publicitário)
arquivo pessoal
DE OLHO EM 2014 “Sempre ao final de cada ano costumo escrever metas e planos para o ano seguinte. Assim fica mais fácil visualizar o que buscamos e o que esperamos realizar. Tenho metas pessoais e profissionais – não são muitas, mas o importante é ter bons planos e conseguir realizá-los. Em 2013 faço 25 anos de casada, e lógico que tenho planos de viajar com meu marido e comemorar essa data tão importante em nossas vidas. Também é um ano para planejar 2014. Realizarei o MaxiModa LAB em março (curso de dois dias com a Farm), Publicarei em parceria com o Diário do Nordeste, o Anuário da Moda do Ceará. Realizarei em agosto a sexta edição do MaxiModa (Seminário de Negócios da Moda), em Fortaleza Tenho metas de crescimento para minha empresa, a 333 Comunicação, e quando digo crescimento não me refiro somente a números e resultados, mas principalmente a evolução e inovação”. ( Márcia Travessoni, publicitária)
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FÉ NA RENOVAÇÃO “A fé na renovação e num ciclo que se compreende no tempo de um ano move sensações e esperanças da humanidade. Reiniciar é a palavra de ordem. Algo como se o tempo pudesse ser domado. Como se o passado pudesse ser atenuado e o futuro enaltecido como um tempo mais ilusório e abstrato do que palpável e alcançável. Planos com prazo de validade. 365 dias de execução, sem renovação. Um contrato onde as partes são a consciência real, prática e objetiva, de um lado, e a ilusão, travessia de esperança, tentando preencher certos vazios da alma. Planejo pensar mais, compreender objetos do cotidiano, enfrentar momentos de dificuldade com maestria e deleitar-me com os momentos de alegria e felicidade. Planejo continuar trabalhando com prazer, manter minhas amizades e conquistar outras novas. Planos egoístas, pessoais, subjetivos. Planos com prazos mais longos, pois o tempo, este segue a galope acelerado”. (Diógenes Luna – Jornalista/Professor Universitário)
VAGA-LUME, CALDEIRÃO E CRATO
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“No campo da literatura estou terminando um livro infantil, “O Menino que Engoliu o Vaga-lume”, e um folheto sobre a chacina do Caldeirão, “O Caldeirão dos Esquecidos”. No plano da música, quero gravar um Cd dos meus 10 anos no Crato”. (Ulisses Germano, músico e cordelista)
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IMPULSO COM PACIÊNCIA “Meu 2012 foi um ano muito especial: casei e dei impulso à carreira. Então, em 2013 eu quero manter e melhorar tudo isso. Quero ser mais paciente, fazer a minha primeira viagem pela Europa. Ah, ter muito dinheiro para cumprir todas as metas! Além dessas tenho outros projetos para a minha vida pessoal e afins. Por enquanto vou começando por aí!”. (Jéssica Jeórgia, enfermeira)
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#caririsaúde
A FÓRMULA SECRETA DO BÁLSAMO DA VIDA Por Raquel Arraes
E
m 1913, Juazeiro do Norte não era mais que uma vila com o título de cidade. Algumas centenas de casas, um tanto de igrejas, um padre aprendendo a ser prefeito. Médico nenhum. Para quem adoecesse havia apenas um destino: a Farmácia dos Pobres de seu José Geraldo da Cruz. Seu Geraldo, como todos bem sabiam, não era formado em medicina, enfermagem ou qualquer coisa que o valha. Em seu cabedal, apenas a experiência prática de quem passou anos a fio atrás de um balcão. Mas isso não espantava a freguesia. Muito pelo contrário. Geraldo Cruz por ali era o único médico conhecido, e foi confiando nessa versatilidade que em 31 de agosto de 1913 inaugurou a Farmácia dos Pobres, estabelecimento que se tornaria uma referência para a medicina popular de todo o Nordeste. Assim que abriu, a farmácia passou a ser o endereço certo para a cura de todo tipo de enfermidade: machucados, cortes, ferimentos graves, gripe, dor de dente. “Meu pai era o que chamavam de farmacêutico prático, aprendeu na lida do dia a dia, então as pessoas chegavam aqui buscando por ajuda e ele limpava e cuidava dos ferimentos na calçada mesmo. Ele até sabia animar o povo. Dizia sempre: ‘Quem entra aqui, não morre mais!’”, sorri o filho de seu Geraldo, Carlos Cruz.
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A presteza do farmacêutico acabou chamando a atenção de um cliente ilustre, o Pe. Cícero Romão Batista. O padrinho costumava requisitar Geraldo para aplicar injeções e fazer curativos. “O Pe. Cícero notou que ele tinha uma tendência para a medicina e disse que se ele quisesse custeava seus estudos na Alemanha”, conta Carlos Cruz. A oferta foi recusada, pois já nessa época mulher e filhos eram merecedores de cuidados e atenção. “Naqueles tempos, os farmacêuticos usavam fórmulas e meu pai já conhecia muitas de tanto experimentar sozinho as substâncias”, lembra Carlos Cruz. Curioso, Geraldo fazia suas experimentações e criava diversos remédios e comprimidos para tosse e verme, principais moléstias da população. Anos depois, ele conheceria um químico francês de passagem pelo Cariri. Na bagagem do viajante, diversas e novas fórmulas que seriam repassadas para Geraldo. Até que em 1920 as experiências renderiam frutos e Geraldo criaria o famoso unguento conhecido como Bálsamo da Vida, seu remédio mais ilustre – a ponto de sua farmácia e seu nome entrarem para a história de Juazeiro do Norte, perpetuando-se por um século. Não são poucos os que atribuem ao Bálsamo da Vida um poder miraculoso, sua eficácia sarando males muitos e diversos. Dessa fama de milagreiro, surgiu a
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Carlos Cruz: herdeiro de uma tradição.
lenda de que sua fórmula era um segredo guardado a sete chaves. Mas o caso é que o bálsamo é um remédio fitoterápico, ou seja, em sua fórmula atuam substâncias derivadas de plantas reconhecidas pela eficácia, usadas há milhares de anos no tratamento de doenças. A mistura complexa de substâncias faz com que, na maioria dos casos, o princípio ativo, esse sim, seja desconhecido. Basta ler a bula: Matricária, Genciana, Jaborandi, Carnaúba, Casca de Laranja, Caramelo e Água destilada. A simplicidade salta aos olhos, o que certifica a engenhosidade do criador. “Eu não tenho a concepção
de que o bálsamo é milagreiro. Ele é eficaz para os problemas em que atua, como os gástricos. Vem se perpetuando porque o seu efeito é bom para aquilo a que se destina”, informa Ana Paula Cruz, neta do criador. Hoje responsável pela fórmula do bálsamo, Ana Paula lembra que a cajuína São Geraldo, refrigerante que é uma verdadeira iguaria apreciada por tantos caririenses, também foi criação de Geraldo Cruz. “Meu avô era um inventor de primeira, inventou até perfume, fora outros remédios. A cajuína foi só uma dessas muitas invenções. Inclusive, é São Geraldo devido ao nome dele”, pontua. CARIRI REVISTA 21
“NÃO PODE FALTAR E SERVE PRA TUDO!” O ziguezague intenso de veículos e pedestres não tira a calma e placidez de seu José Antônio, que há 18 anos atende no balcão da Farmácia dos Pobres. Lá fora, a balbúrdia de uma cidade em crescimento que botou abaixo seus prédios históricos para dar lugar ao nem sempre admirável mundo novo. Dentro da farmácia, o que se vê são os ladrilhos hidráulicos colorindo o chão, o balcão esculpido em madeira e os impressionantes armários que vão do teto ao piso com lindos adornos, tudo em madeira centenária. Seu José Antônio, ele também um apreciador do Bálsamo da Vida, fala que para os clientes que ali chegam, não há limites para o poder curativo do remédio. Já ouviu de um tudo: que o bálsamo cura indigestões, enjoos, mal-estar e cortes. “Cada um que chega aqui, narra uma história diferente”, comenta. Em média, 20 frascos são vendidos diariamente. Tem para todos os tipos de bolso. As embalagens de 100 ml custam R$ 9,00 e as de 250 ml, R$ 15,00. A garrafa contendo um litro sai por R$ 28,00. “A garrafa de um litro é a que mais sai”, enfatiza Antônio. Em dias normais, a farmácia é uma tranquilidade, mas em tempos de romaria o extenso balcão de madeira é pequeno para tanta demanda. “Isso aqui fica uma
loucura. Vendemos o estoque inteiro, eu quase não dou conta de tanto pedido”, destaca o antigo funcionário. Cliente assíduo da farmácia, José Ribamar de Souza é um apreciador inveterado do Bálsamo da Vida. Pegou gosto de tomar o santo remédio com a mãe, que dizia que o unguento era especial. “Eu tomo três vezes no dia, só não tomo toda hora porque fica caro”, sorri matreiro. Ribamar costuma comprar de três a quatro frascos por semana. Para ele, como o bálsamo não há igual. “Ele me dá disposição, espanta o enjoo e serve para praticamente tudo!”. Também dona Judite de Lima faz do Bálsamo da Vida um companheiro inseparável. “Meus pais sempre compravam. Diziam que o bálsamo é um ótimo remédio e que não pode faltar numa casa. Então eu não deixo faltar na minha”, garante. Para ela o bálsamo é um milagreiro na cura de enjoos, desmaios, cólicas e cortes. “Eu coloco num copo e tomo puro, sem misturar na água”, explica ela, para quem o maior feito do remédio foi salvá-la de um desmaio iminente. Tendo passado mal, voltou a si após tomar praticamente um frasco da beberagem. “É por isso que estou com 64 anos e não deixo de tomar. Já estou acostumando minhas netinhas no bálsamo. Não tem melhor que ele!”.
Então, por que é que depois de tanta criação feita por Geraldo Cruz, a Farmácia dos Pobres se absteve à venda de outros medicamentos, restando apenas o Bálsamo da Vida? “Acontece que meu pai foi prefeito de Juazeiro duas vezes. Na primeira vez, todo mundo que chegava até ele pedindo algum remédio ele mandava buscar na farmácia. Quando ele ganhou, me passou a farmácia, e quando eu vi, não tínhamos mais nada! Ele havia distribuído todo o estoque!”, lembra Carlos Cruz. Após se tornar prefeito de Juazeiro do Norte, em 22 CARIRI REVISTA
1930, Geraldo Cruz não mais se interessaria pelos negócios. O filho, sem nenhuma vocação para a área, continuou com a farmácia apostando apenas na venda do bálsamo. “Eu nunca gostei muito dessa área, então, não sabia as fórmulas como meu pai sabia. A farmácia virou meu ganha-pão. O que eu fiz foi descentralizar a venda do bálsamo passando a vender também em outras drogarias de Juazeiro, Crato e Barbalha. Priorizei o bálsamo porque era o que mais saía e até hoje é o que nós temos à venda”, conta Carlos.
VEJA COMO ATUA CADA SUBSTÂNCIA
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Matricária: Planta medicinal utilizada para tratar a enxaqueca e as dores de cabeça. Genciana: Planta medicinal com efeito amargo e digestivo, utilizada contra diversos distúrbios digestivos. Jaborandi: O jaborandi é utilizado principalmente em colírios para o tratamento de glaucoma, mas em receitas caseiras é muito usado para baixar febre, problemas capilares e laringites. Carnaúba: As raízes têm uso medicinal como eficiente diurético. Casca de Laranja: Combate as infecções, ajuda na eliminação das toxinas do álcool, é diurética, anti-escorbútica, tônica, digestiva e ligeiramente laxativa. Caramelo: Atua como corante.
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#cariricinema
luz interior Inteiramente rodado no Cariri, o longa-metragem “Antes do Sol”, de Emmanuel Nogueira, conta uma trágica história de amor impossível sob o calor sertanejo. É o mito de Fedra com paisagem agreste, amarração contemporânea e pimenta local.
Q
uinta-feira, dia 24 de janeiro de 2013. A brisa leve não ameniza o calor do meio-dia no sítio Amaro Coelho, pequena localidade da zona rural de Juazeiro do Norte. Debaixo de um frondoso pé de juá, parte da equipe se protege do mormaço, do cansaço, das muitas horas de filmagens – incluindo Thor, o carismático vira-lata cego que participa da trama com o nome artístico de Russo. A outra parte do elenco está na minúscula capela em que se desdobram algumas das cenas mais importantes de “Antes do Sol”. Salpicada de sangue falso, a atriz Emanuela Pinheiro atravessa a manhã estendida no chão, enquanto o ator Renato Dantas refaz os movimentos de seu personagem, a pedido do diretor Emmanuel Nogueira, que transpira sem parar nessa manhã iluminada – para felicidade da equipe. Quanto mais sol, melhor. “Chegamos no início de janeiro, para um mês intenso de filmagens. Só paramos
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quando chove”, explica o diretor no intervalo do almoço. Algumas pancadas d´água andaram rondando o set, mas o cronograma de filmagens nem por isso atrasou. “Nossa sorte é ter todas as locações aqui, distantes no máximo 5 km umas das outras”. Exausto mas satisfeito, Emmanuel está se aventurando pela primeira vez na direção de um longa-metragem. Nascido em Juazeiro, formado em João Pessoa e transplantado para Fortaleza, ele já conquistou vários prêmios de dramaturgia e assinou alguns roteiros cinematográficos, mas nunca esteve atrás de uma câmara até começarem as filmagens de “Antes do Sol”, uma história eletrizante que todos nós – de certa forma e em diferentes meios – conhecemos e amamos. Rosália (Emanuela Pinheiro) é casada com Malaquias (Renato Dantas), mas se apaixona pelo irmão mais novo deste, João (Magno Carvalho). O descontrole de emoções, a vulnerabilidade dos envolvidos e
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Emmanuel Nogueira dirige seu primeiro longa.
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BONS NÚMEROS Os números da Agência Nacional de Cinema (Ancine) são auspiciosos para o mercado brasileiro. Em 1995, a produção era reduzida: apenas 13 filmes. No ano seguinte esse número subiu para 18. Em 1997 foram registradas 21 películas. O total de 1998 foi de 23, subindo para 26 em 1999. Numa dinâmica progressiva, atingimos a marca de 70 longas-metragens em 2006, sendo que nos últimos 12 anos foram finalizados 449 longas-metragens. Até chegarmos a sucessos de bilheteria como “Tropa de Elite 2” (2010), que levou mais de 12 milhões de espectadores para o escurinho do cinema. Hoje, os estados da Bahia e Pernambuco despontam no Nordeste como novos polos de produção, seguidos de perto pelo Ceará. CARIRI REVISTA 27
as artimanhas de Dinorah (Rita Cidade) se unem num caldo grosso que inevitavelmente transborda e entorna. Uma tragédia grega nas terras do Padre Cícero. Não à toa, antes de ser dramático o filme é um verdadeiro milagre, já que conta com a bagatela de R$ 200 mil, prêmio recebido no IX Edital de Cinema e Vídeo da Secult em 2011. “Para viabilizar a produção, corremos atrás de outros apoios. O Sesc e a Prefeitura de Juazeiro deram suas contribuições”, diz Emmanuel. Também foi fundamental a ajuda da família Callou, proprietária do sítio em que a equipe se hospeda, dividindo-se em duas casas, uma delas centenária. São 40 “batalhadores da arte”, entre atores, assistentes, técnicos de som, câmaras, figurinista, maquiador, continuista, preparador de elenco. “Nosso primeiro assistente de fotografia tem uma frase que resume tudo: ‘ninguém está aqui por obrigação’. Quem topou, foi por prazer”. Um estranho prazer: acordar às 5h, começar o dia às 6h, repetir uma cena atrás da outra, engolir rapidamente o almoço, retornar ao trabalho até o final da tarde, quando a luz vai embora e é possível voltar para casa a fim de... ensaiar as cenas do dia seguinte. “É impressionante a força de vontade desse pessoal. Fazer cinema é uma pauleira!”, considera a produtora executiva Dora Freitas, da Lumiar Comunicação, que faz verdadeiros malabarismos com os custos de produção. ANIMAÇÃO COLETIVA Rita Cidade, atriz de teatro profissional, está vivendo sua primeira experiência num longa. Ela, que desde 2007 faz parte do Grupo Ninho de Teatro, com sede em Crato, interpreta a ardilosa Dinorah em “Antes do Sol”. “A Dinorah é uma dessas pessoas que é de dentro da casa, a criada mais próxima. Ela começa a perceber uma brecha que pode desestruturar a família, então encadeia os fatos de uma maneira que seja favorável a ela. Porém, os acontecimentos ganham uma dimensão imprevista, como em toda tragédia”, explana Rita. Magno Carvalho, que trabalha com teatro desde 2005 e teve sua primeira experiência com cinema em 2007 (fez o Bezerra de Menezes jovem em “Diário de um Espírita” e o Floro Bartolomeu em “Sedição de Juazeiro”), já conhecia a estrutura do texto por causa da leitura de “Dentro da Noite Escura”, peça escrita por Emmanuel Nogueira, que serviu de base para o roteiro do filme, também feito por ele. “Estou muito animado com essa produção. E ansioso para ver o resultado”, resume Magno. 28 CARIRI REVISTA
Animados estão todos, segundo Genildo Angelim, o Angelim de Icó, assistente de direção de arte: “A gente até esquece o cansaço. O filme é interessante, dentre outros fatores, porque lida com a contemporaneidade rural, numa localidade muito antiga”. Atual secretário de Cultura de Icó, Angelim é o que se pode chamar de um multi-artista moderno, tendo diversas peças e produções no currículo. Para o diretor Emmanuel Nogueira, o fato dos atores residirem por um mês no próprio local das filmagens é muito inspirador. “Trouxemos um preparador de elenco, o Sidney Souto, que tem nos ajudado muito”, conta ele. Jornalista desde sempre apaixonado por artes cênicas, Emmanuel fez o Curso de Dramaturgia do Instituto Dragão do Mar, em Fortaleza, e há 13 anos escreve para o teatro. Já recebeu vários prêmios. Sua primeira peça foi “A Serva” (2000), montada pela Companhia de Teatro Livre Mente, de Juazeiro do Norte, com a qual trabalha até hoje. A comédia “Esperando Comadre Daiana”, escrita por Emmanuel, é encenada pelo grupo há oito anos. Para quem aprendeu a alternar a militância nos palcos com o exercício do jornalismo diário, trabalhar muito não é problema. Em 2008, Emmanuel ganhou uma bolsa da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura para escrever o roteiro de “Homens com Cheiro de Flor”, elogiado filme de Joe Pimentel. Durante a produção, recebeu um convite para escrever “As Mães de Xico Xavier”, que virou filme nas mãos de Glauber Filho e Halder Gomes. Agora, a grande batalha é transformar “Antes do Sol”, que foi rodado em HDTV e finalizado em blue ray, em película. Até o fechamento dessa CARIRI – no início de março – a montagem já tinha começado e novos apoios estavam sendo buscados, já que a finalização ficou comprometida devido à verba escassa. “No cronograma ideal, teremos o filme pronto até junho de 2013. Depois, vamos tentar um outro edital para botar o filme em 35mm, senão não conseguimos chegar às telas”, suspira Emmanuel, mas sem desanimar.
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Renato Dantas e Emanuela Pinheiro em cena.
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#cariricapa
XICO SÁ: NASCIDO PARA CONTAR Por claudia albuquerque
“Um homem de verdade tem que saltar para dentro do dia, senão o dia engole ele, como uma sucuri devora o boi”. Essa frase cheia de bravura é dita pelo Velho, o personagem mais resmungão e afiado de “Big Jato”, romance-biografia-epopeia de Xico Sá, menino do Crato, poeta do Recife, jornalista de São Paulo e cronista do mundo. Além de roteirista de cinema, comentarista de TV, palpiteiro de futebol e conselheiro amoroso de prestígio nacional. Saltar para dentro do dia. Xico guardou essa imagem na poeira da memória desde que a viu estampada, muitos anos antes, numa outra frase, perdida entre tantos livros: “Caminhou para dentro do
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dia o mais alerta possível”. Não que atribuísse um sentido especial a ela – até esqueceu o nome do autor –, mas por algum motivo isso nunca lhe saiu da cabeça. Tanto é que foi parar, com remendos e alinhavos, na boca do Velho, então um pássaro sem plumas, ou um personagem em formação, quebrando a casca da nova obra. Justo nessa fase aventuresca dos primeiros achados, Xico Sá entrou num sebo, abriu por acaso uma página de “O Jovem Audaz no Trapézio Voador”, de William Saroyan, e... PIMBA! Lá estava a danada da frase. Perdida e reencontrada. Direto para dentro do dia. Era o motor do Big Jato, “barulhento como as dores de uma terceira venérea”, decolando de vez.
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‘‘B
ig Jato” (Cia. das Letras, 184 págs, 2012) é o primeiro romance de Xico Sá escrito em português, já que “Caballeros Solitários Rumo ao Sol Poente” (Editora do Bispo, 144 págs, 2006) foi lançado em “portunhol selvagem”, uma língua que ele inventou com os amigos entre um boteco e outro. O novo livro é um retorno barulhento ao passado, um voo saculejante sobre as asas da infância, uma “biografia adulterada ao infinito pela ficção”, como a define o autor, que nasceu no Crato em 1962, mas viveu os verdes anos em Santana do Cariri e Juazeiro do Norte. A história do menino sertanejo, seu tio beatlemaníaco e o pai durão que dirige um caminhão limpa-fossas – o Big Jato do título – marca mais um avanço na carreira de Xico e surpreende os que o veem apenas como o “cronista do amor louco e das noites nas tavernas”. Fama adquirida com suor, graça e talento nas páginas da Folha de S. Paulo, onde assina uma coluna de prosódia única, humor lírico e frases irretocáveis sobre paixão, namoro, traição, comportamento humano e rolos amorosos.
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Nascido para narrar, sua lida na imprensa começou no Tabloide Esportivo de Recife, cidade onde cursou a Faculdade de Jornalismo, antes de se mudar para São Paulo. Foi repórter investigativo durante muitos anos. Escreveu em grandes veículos, deu furos de reportagem, ganhou prêmios – inclusive um Esso, o mais prestigioso do jornalismo brasileiro. Num desses lances incríveis do destino, descobriu o paradeiro de PC Farias, o ex-tesoureiro de Fernando Collor e inimigo nº 1 da nação em 1993. Despontou para a fama, virou repórter especial, turbinou as finanças, mas permaneceu inquieto. “Não era minha vontade ser um jornalista fodão. Era um desgosto, porque quanto mais coisa eu conseguia no jornalismo, mais eu me afastava de ser um escritor”, disse certa vez numa entrevista. Como num jogo penoso de subtração, ganhava prestígio, mas perdia horas de leitura; embolsava recompensas, mas adiava a própria criação. A grande virada aconteceu em 1997, quando começou a escrever a Coluna Macho, na Revista da Folha, um contraponto inteligente e bem humorado à Coluna GLS. Para surpresa do cronista, no dia seguinte
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à estreia as pessoas o paravam na rua e a redação se enchia de cartas. Era a ponte que ele tanto procurava para o arco-íris dos textos autorais, o pote de ouro no fim da jornada heroica. De lá para cá, são mais de 20 livros na praça, alguns assinados por ele, outros em coautoria. Dentre as suas criações exclusivas estão “Modos de Macho & Modinhas de Fêmea” (Ed. Record), “Divina Comédia da Fama” (Objetiva), “Se um Cão Vadio aos Pés de uma Mulher-abismo” (Ed. Fina Flor) e “Catecismo de Devoções, Intimidades & Pornografias”, este último lançado pela Editora do Bispo, a empresa artesanal e primorosa que manteve com Pink Wainer. Dentre as obras de que participa como colaborador, destaca-se “Essa Canção Está Diferente” (Cia. Das Letras), com dez contos de autores como Mia Couto, Luís Fernando Veríssimo e João Gilberto Noll sobre canções de Chico Buarque. Em cada um dos livros, a essência do cronista mundano: exuberante, sensível e encharcado de ironia fina. Os que nunca leram Xico Sá, já o viram na televisão, falando sobre futebol no programa Cartão Verde, da TV Cultura, onde permaneceu por alguns anos, ou sentado na bancada masculina do programa Saia Justa (GNT), do qual participou até a temporada passada. Xico conquista na lábia. Suas frases circulam no infinito mundo da internet, como pílulas pop dos desvarios apaixonados: “Sou a favor da cura pela carta de amor”; “Só um chifre humaniza um macho”; “Mais vale uma amizade colorida do que 50 tons de cinza!”, “Escrever e amar se assemelham na medida em que gastamos nossos dedos e matamos nossos medos”. As mulheres? “Se tem coisa melhor, não existe”. E parafraseando Guimarães Rosa: “Viver não tem alvará, baby, viver é perigoso, sempre!”. Perigoso e divertido. Desde os tempos de Recife, cidade amada que habitou dos 16 aos 28 anos, Francisco Reginaldo de Sá Menezes alimenta a fama de boêmio. “O bar é minha Sorbourne, minha universidade católica, meu doutorado da USP, minha filosofia, minha cachaça, minha cátedra, minha nota de rodapé”, escreveu certa vez. Foi entornando cervejas com os “intelectuais, putas e ladrões” da Praça do Sebo, em Recife, que ampliou o gosto pela poesia, embora trabalhasse duro para pagar a dose, datilografando fichas de crediário na Mesbla. Também labutou numa ótica, foi estagiário na biblioteca da faculdade e vendedor de livros e poemas. O menino que se criou no Sítio das Cobras, em Santana do Cariri, sempre teve vocação para a festa. “Sinceramente eu não sei quem dança mais nessa vida. Se os sentimentais, os canalhas ou os canalhas sentimentais. CARIRI REVISTA 35
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Se as histéricas, as inteligentes ou as lindamente burras. Eu só acredito nos deuses que dançam...”, diz ele na abertura do clip “Tenho”, onde baila com Sidney Magal e a atriz Débora Fallabela, numa hilária coreografia. Também aparece no clip “Pra Ser só Minha Mulher”, do amigo Otto, confraternizando num inferninho da Rua Augusta. Não à toa, no começo dos anos 90, quando a Nação Zumbi e o Mundo Livre S/A se uniram para fazer um show na finada Aeroanta, em São Paulo, foi na casa de Xico que fundaram seu quartel-general. Outros clips, outros planos, parcerias musicais, uma ponta no filme “O Cheiro do Ralo” (2007), o roteiro do longa “Deserto Feliz” (2007): Xico se desdobra mas não perde a linha. Agora as atenções se voltam para “Big Jato”, sem dúvida seu melhor livro, o romance de uma vida, a história de um menino que cresce e deixa sua terra, escrito em três meses, elaborado ao longo de dez anos. Nele, Santana do Cariri vira Peixe de Pedra, os rostos reais se refundem em personagens fictícios, o correr dos anos embaralha a sequência, as tardes modorrentas deságuam em prosa delirante. Mas no fundo, como os fósseis preservados da Chapada do Araripe, ou a memória involuntária de um
cuscuz com cabrito, está tudo lá: as caçadas de tatu, os candeeiros e lampiões a gás, as tertúlias no Clube Titãs, as sessões do Cine Eldorado, a Ordem dos Penitentes, o Príncipe Ribamar da Beira Fresca, Seu Lunga, o calor, o amor, a necessidade de bater asas. E também os Beatles, Luiz Gonzaga, Tarzan, Pernalonga, Perdidos no Espaço, Médici, o Brasil dos anos 70. Tocante, engraçado, luxuoso à moda agreste. E muito bem traçado. “Tudo isso aconteceu, mais ou menos”, diz o autor no prefácio, citando Kurt Vonnegut, outra de suas influências. O pai real, por exemplo, era um caminhoneiro “sem merda”, mas o limpa-fossas existia e passava em todas as casas. Narrar é uma forma de viver. Ou reagir. “Quem não reage, rasteja”, resmunga o Velho do Big Jato. Xico Sá reage pondo a vida em parágrafos: “Se um homem não conta, é um homem morto”. ORÓS DE LÁGRIMAS “Foi muito prazeroso escrever ‘Big Jato’, mas como é uma história que tem muito do menino que fui no Cariri, eu me pegava chorando em vários momentos, banhado de um Orós de lágrimas, quer dizer, um Tatajuba de lágrimas – para citar o grande açude de Santana do Cariri, CARIRI REVISTA 37
perto de onde fui criado. Inicialmente era apenas um conto, mas deixei para lá, esperando a hora certa. Quando retomei, em 2011, foi com tudo. Escrevi em uns três meses, mas o bicho estava em elaboração na cabeça havia dez anos”.
para o jornalismo. Minha grande disciplina, na verdade, é para a leitura. Sou um leitor devorador, escolho uns livros e gasto mesmo as pestanas. Tenho relido ultimamente o Albert Camus, esse monstro, principalmente por causa de “O Estrangeiro”.
MÉTODO CORUJA “Não tenho grandes manias, além da preguiça, é claro, mas não consigo escrever algo mais literário durante o dia. Tiro o dia para o jornalismo, as encomendas de textos, as coisas mais objetivas... e somente lá pela meia-noite pego no breu para viajar na ficção. É o método coruja ou bacurau. Desde o Cariri era assim. Ficava acordado, os sinos da igreja dos Franciscanos, em Juazeiro, fazendo companhia de hora em hora. Varava noites com a minha Olivetti”.
O DESTINO DAS METÁFORAS “Acabei de ler um escritor do Cariri, por coincidência, o Sidney Rocha, que é de Juazeiro e mora no Recife há muito tempo. É excelente contista. Ganhou no ano passado o prêmio nacional de maior prestígio da literatura, o Jabuti, com o livro “O Destino das Metáforas”.
LEITOR DEVORADOR “Disciplina para escrever? Tenho nada! É uma bagunça, um caos, mas acabo fazendo. A disciplina fica mais
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NOVOS AUTORES “É tanto livro e autor novo que não tem diabo que acompanhe, mas tento. No caso de Daniel Galera, Marcelino Freire e João Paulo Cuenca fica mais fácil, porque somos amigos, sempre nos encontramos e costumamos ler os livros uns dos outros, o que é ótimo, temos críticas sinceras que nos ajudam a seguir no ramo”.
POR DENTRO DO DIA “Como é difícil se ajustar dentro de um dia, o velho às vezes pensava. Entro ou não entro. O dia é uma roupa nova mal cortada. O horizonte tem zíper ou botões? (...) Para entrar num dia, pensava e pensava, é preciso amolar sonhos na mesma pedra azul que afina as lâminas das facas e das foices. O dia não é uma página. O dia não é sequer um diário. Quando a gente consegue enfiar a primeira perna dentro, ele já vai tarde”. (Trecho de “Big Jato”)
HUMOR, MISTICISMO, LUNGUICES “Minha família achou bonito como retrarei o nosso mundo em ‘Big Jato’, a infância e adolescência na região, mas se fossem se apegar aos personagens como se fossem mesmo eles, eu estava lascado, iria levar uma pisa de pai, mãe, tios etc. Estão todos no livro, no mosaico de tipos, mas com personalidades e características, inclusive físicas, trocadas. Na hora de escrever o pai e a mãe ficaram uma mistura de vários outros parentes e de pessoas do nosso convívio. O que é mais real no livro é o Cariri ali dos anos 1970, 80, com seus profetas e sábios, como o Príncipe Ribamar da Beira Fresca, os ditos loucos, o misticismo, o humor, as lunguices, a zoada caririense, os poetas. Nisso é bem fiel”. PAI AUSTERO x TIO BEATLEMANÍACO “Esse é o grande conflito do menino do livro. Ele ora pende para a disciplina ranzinza, severa, do pai, a que muito admira; ora flerta com a poesia do tio, principalmente quando se depara com a descoberta do amor
– algo considerado um atraso de vida para o Velho. Crescer à sombra dos dois é o embate. Creio que é um dilema que a gente carrega na existência. O cabrinha, porém, escolhe um rumo. Claro que não vou contar aqui para não estragar para os possíveis leitores”. BIG JATO NO CINEMA “O livro vai ser filmado pelo diretor pernambucano Claudio Assis, um velho amigo, autor de ‘Amarelo Manga’, ‘Febre do Rato’ – filme que conta com a minha colaboração – etc. Ele leu e se apaixonou pela história e principalmente pelo cenário do Cariri que descrevo. Deve ser rodado ainda este ano. Só está definido que a fotografia será de Walter Carvalho e terá, entre outros atores, Dira Paes em um dos papéis”. FEIRA DO CRATO “Sou o primeiro filho de um total de seis. Na época, 1962, meus pais moravam no Sítio das Cobras, em Santana do Cariri, onde vivi boa parte da infância, mas eu nasci
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no Crato, porque minha mãe tinha uma grande amiga parteira que trabalhava no hospital São Francisco, a Salvanira – vê que nome bonito e apropriado! Minha relação afetiva com o Crato sempre foi muito grande por causa do meu pai, que me levava às segundas na feira – em uma destas ocasiões, por exemplo, ele me mostrou pela primeira vez o Patativa do Assaré e também o Luiz Gonzaga. Mas nunca morei no Crato, embora fosse um frequentador da casa de Marivone, uma parente querida e grande confidente da minha mãe. Amava ouvir a conversa bonita das duas e talvez aí eu tenha aprendido tudo que sei até hoje”. CHEGADA A JUAZEIRO “Depois do sítio em Santana, fomos morar em Juazeiro, onde minha mãe e meus irmãos estão até hoje. Meu pai foi de tudo: agricultor, mascate, bodegueiro, sapateiro, caminhoneiro até virar um caminhão com uma carrada de rapadura etc. Só não era do Big Jato, que era nome comum de limpa-fossas antigamente. Quando a família chegou a Juazeiro, a gente sem conhecer quase ninguém, uma das primeiras visitas foi do Big Jatto – o real do Juá tem dois tts”. TEMAS DE AMOR “Existia um programa chamado Temas de Amor, na rádio Vale do Cariri, AM, 22h, nos anos 80, apresentado pelo meu vizinho e amigo Jevan Siqueira, grande seresteiro que hoje vive em Fortaleza. Grande intérprete de Altemar, Waldick, entre outros da canção romântica. Eu fazia poemas e textos que se encaixavam nos dramas vividos pelos ouvintes. Tudo começou ali mesmo. E olhe que eu nem sabia o que era uma mulher de fato e de direito”. VIDAS SECAS “Graciliano Ramos foi o escritor que me fez despertar: ‘meu Deus do céu, é isso que eu quero ser um dia, esse homem escreve demais, e escreve sobre os nossos problemas, com cheiro da nossa região’. Foi um impacto e tanto, depois de já ter lido clássicos da literatura estrangeira, principalmente livros de aventura, como os de Charles Dickens e Jack London”.
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MUDANÇA PARA RECIFE “Quando cheguei no Recife, fiz logo uma foto ali na ponte principal. Aquilo tudo era um mundo impressionante, diferente, bonito e assustador ao mesmo tempo. Cheguei na rodoviária velha, que ficava no bairro de São José, e saí arrastando uma mala de couro, como todos nós que íamos embora naquela época, até achar a primeira pensão mais barata. Fui sem indicação de nada”. POEMAS SOB ENCOMENDA “No Recife eu anunciei nos classificados de um jornal o serviço ‘Poemas de amor sob encomenda’. Foi meio uma sequência do trabalho na rádio Vale do Cariri, quando eu fazia textos para o programa Temas de Amor. Tinha duas utilidades: ganhar um dinheirinho e também chamar a atenção para a poesia de um cigano que estava chegando na praça. Foi muito bom, me garantiu fartas refeições em um tempo de muita penúria”. XICO COM “X” Na faculdade de Jornalismo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), já começaram a me chamar de Chico e eu passei a assinar, em folhetos de poesia do movimento da poesia marginal ou mimeófrafo, como Chico Reginaldo Sá. Aí um dia, cobrindo polícia e futebol no JC, acordo e está lá a assinatura Xico Sá. ‘Que diabo é isso’, eu pensei. Reclamei pro editor que tinha inventado a moda e ele disse: ‘Vai por mim, é bom, é curto, é com X, é diferente, chama a atenção’. Caí na conversinha e deixei até agora”.
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PAIXÃO POR FUTEBOL “Ih, o Romeirão foi minha grande escola. Via todos os jogos. A onda era dar o truque e entrar com uma caixa de quem iria vender dindin. Para não pagar. Sou Verdão do Cariri e não abro, embora, na distância, torça um pouco por todos os times da região, incluindo o velho rival Guarani e agora o Crato. Disputei também, como dente-de-leite, os campeonatos da LDJ, a liga desportiva juazeirense, comandada pelo folclórico e genial Tico Bandeirinha”.
NOVO PROGRAMA “Tudo que faço em televisão é consequência das minhas crônicas. Como escrevo sobre relacionamento, amor louco etc, me chamaram para o programa Saia Justa (GNT). Os homens entraram para fazer apenas um verão, mas acabamos ficando dois anos e tanto. Agora encerramos a temporada, o que pode rolar é um novo programa, tem gente lá dentro pensando nisso, como projeto”.
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SIDNEY MAGAL “Fui ali apenas para apresentar o Magal, com aquele texto de abertura, que é meu mesmo. Aí me viram dançando de forma maluca e inconsequente, e o diretor, o Pedro Becker, me botou na roda. Valeu demais ter beijado aquele pezinho da Débora Falabella. Depois disso fiz vários clips, com Otto, Junio Barreto (contracenando com a Mariana Ximenes) e etc”. EDITORA DO BISPO “A Editora do Bispo chegou a publicar 15 livros, mas fechamos. A ideia era brincar um tempo de fazer livros que as editoras convencionais não topavam, uma paixão minha e da Pinky Wainer, a sócia na empreitada. Editora pequena não aguenta o tranco da disputa de mercado. No Brasil dura em média uns dois anos. Mas foi uma bela experiência!”. PROFISSÃO ESCRITOR “Quando me livrei da pauleira das redações e comecei a viver de crônicas achei, e continuo achando, um verdadeiro milagre, uma bênção, uma graça alcançada. O pinga-pinga dos livros também tem aumentado depois do ‘Big Jato’, que, graças a Deus, é um sucesso de público”. ROMANCE RUSSO “Eu já disse que queria escrever um romance russo. Como o Nordeste e o Cariri, em especial, têm muito daquele mundo, creio que já iniciei o projeto com esse ‘Big Jato’. As histórias de Nicolau Gogol, o russo que mais gosto, têm tudo a ver com a nossa região, até cito um caso dele parecido com o universo caririense no meu romance”. AMAR É... “...tentar entender o que a mulher está querendo naquele momento da vida e antecipar a realização desse desejo. Antes que ela grite, surte e vá embora”. O VALOR DO CHIFRE “Todo homem deveria levar um chifre para evoluir. Eu sou evoluidíssimo, quase canonizado nesse sentido. A tese do chifre é simples: o homem é muito metido a besta, mandão, autoritário, machista ao extremo, então quando enfrenta uma traição amansa, humaniza, evolui, tem uns que até falam fino quando dizem ‘xô galinha, pra dentro menino...”
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SE UMA DOIDA JEITOSA... “Tive uns seiscentos amancebamentos, mas nunca fui ao altar. Durante muito tempo fui arrimo de família e creio que isso me ensinou a arte de gozar nas coxas, a arte de evitar filhos, tamanho seria o susto em sustentar uma romaria inteira. Mas se aparecer uma doida jeitosa hoje querendo, a gente dá um jeito”. DEPOIS DE UM FORA “O tempo é um bálsamo da vida, um santo remédio, mas tomar uns porres ouvindo Waldick Soriano, Roberto Carlos, Fagner, Belchior ou Chico Buarque, dependendo do gosto do freguês, também ajuda. Eu curo muita fossa na escrita. Mas não aconselho ninguém a ficar alimentando esse bezerro desmamado da dor amorosa. É tentar abreviar o luto e correr atrás de outro(a)”. CRONISTA DO AMOR LOUCO “Eu me tornei um tanto escravo do personagem da minha escrita. Muitas vezes isso é um drama. Quem escreve mais colado na vida que vive, mais visceral, sempre corre esse risco. Nesse sentido, ‘Big Jato’ foi um santo remédio, um espanto para muita gente que me via apenas como o cronista do amor louco e das noites nas tavernas”. HOMENS NO DIVÃ “Homem que faz análise é mais valorizado. Ô, demais! Parece que ganha um álibi para errar mais ainda. A psicanálise absolve o canalha. Mas curar o canalha, não cura”. CARIRI NO COMANDO “Sou um torcedor do Cariri. Essa região ainda vai mandar no mundo”.
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Grupo São Geraldo: um negócio de família Onde investir em 2013 CARIRI REVISTA 49
essa é do santo!
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anto italiano do século XVIII, São Geraldo jamais imaginou que um dia seria conhecido em todo o Nordeste do Brasil. Padroeiro das mulheres grávidas e dos alfaiates, ele nasceu na pequena localidade de Muro Lucano, mas hoje todo o Cariri lê o seu nome estampado numa apreciada marca de refrigerantes genuinamente regional, a São Geraldo. Corria o ano de 1934 quando a pequena fábrica com nome de santo – tão tosca que mais parecia uma bodega – instalou-se em Juazeiro do Norte. Seu fundador foi José Geraldo da Cruz, que produzia apenas vinhos feitos de caju, jurubeba e jenipapo. Após décadas de transformações, mudanças na diretoria e modernização de maquinário, a fabriqueta virou um grande negócio. Hoje tem 475 empregados diretos e quase 4.000 colaboradores indiretos, produzindo até 723 mil volumes, ou garrafas de diversos tamanhos – recorde alcançado em janeiro de 2013. Dessa produção, 90% leva o rótulo do famoso Refrigerante de Caju São Geraldo, que há 50 anos carrega o nome do santo e mata a sede dos fãs – geralmente fiéis. “Os 10% restantes referem-se à nossa água mineral, que é muito boa, e aos refrigerantes de diversos sabores”, comenta Francisco de Souza Filho, 45, atual diretor-administrativo dessa empresa que se reconhece pelo paladar. Foi o tio dele, José Amâncio de Sousa, quem comprou a fábrica do segundo dono, transformando-a num negócio definitivamente familiar. Familiar na composição, mas profissional nos procedimentos. Caminhando pelo pátio da matriz, que fica na ensolarada Av. Padre Cícero, Souza garante que a São Geraldo é a única empresa que produz o refrigerante de caju com a fruta in natura. “Refrigerante de caju natural só tem o nosso. Nenhum mais no Brasil!. Os outros trabalham com o extratos e misturas”. Pior para a concorrência. A fábrica de Juazeiro desenvolve, engarrafa e envasa bebidas com a segurança dos que descobriram a
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UMA HISTÓRIA NORDESTINA No início, vinho de frutas, aguardentes, vinagres. Depois, bebidas gaseificadas. O primeiro refrigerante produzido pela São Geraldo surgiu em 1958, com o nome de Guaraná Brasil, marcando uma década de aquisição dos primeiros maquinários (todos manuais). Somente quatro anos depois surgiu a estrela do grupo: o refrigerante de caju. Foi a época da chegada da energia elétrica na região, quando se pôde adquirir equipamentos semi-automáticos, dando um novo impulso à produção. “Essas máquinas eram muito simples, fazíamos meia dúzia de caixas de refrigerantes por dia, mas já foi um avanço”, explica o diretoradministrativo da empresa. A grande guinada aconteceu nos anos 1970, com um maquinário mais moderno e a contratação de novos quadros. Uma parceria com a multinacional Cadbury permitiu que a empresa engarrafasse, durante 12 anos, o refrigerante Crush. Em 1987 a fábrica foi deslocada do centro de Juazeiro para novas instalações, na avenida Pe. Cícero, triângulo Crajubar. Dois anos depois, os testes realizados no poço da empresa culminaram no processo de concessão de lavra e autorização para envase de água mineral. Agora, a São Geraldo se prepara para lançar seu refrigerante de caju em lata e um novo vinho de sabor regional.
São Geraldo: 40% de crescimento entre 2011 e 2012.
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fotos: arquivo são geraldo
A fabriqueta acanhada dos anos 30 virou um grande negócio.
DA CAJUÍNA AO REFRIGERANTE DE CAJU 1962 foi o ano de lançamento da Cajuína São Geraldo, que mais tarde, com a regulamentação da legislação brasileira de bebidas, seria classificada como refrigerante de caju. Embora tenham a mesma base, cajuína e refrigerante de caju são diferentes. A distinção básica é que a cajuína não leva gás. Portanto, a fábrica teve que adaptar o rótulo. O Refrigerante de Caju São Geraldo é composto de suco natural de caju, que vem do Piauí e de Currais Novos, mais o gás (CO2) comprado em Recife, além de água, açúcar e a fórmula da marca. O cajueiro é uma árvore nativa do Brasil, que
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muitos serviços tem prestado à gula nacional. Do caju tudo se aproveita, a começar pelo fruto, que na verdade é a castanha, item importante na pauta de exportação cearense. O pedúnculo, ou pseudofruto do cajueiro, também é apreciado na culinária. Do sumo se faz suco. Do suco se obtém variadas bebidas (incluindo cajuínas e refrigerantes). Das fibras fazemos “carne de caju” para diferentes pratos. Da carne fabricam-se doces, além de licores e vinhos. Verdadeiro presente da natureza, o caju resiste às piores intempéries e a todos os modismos gastronômicos.
receita certa. As primeiras garrafas de seu mais famoso refrigerante apareceram na década de 60, ainda com a denominação de “cajuína” (veja o box “Da cajuína ao refrigerante de caju”). Atualmente, muitas toneladas de caju são usadas na fabricação da bebida, que é acondicionada em garrafas de vidro retornáveis (300ml e 600ml) e em garrafas PET (250ml, 350ml, 1 litro e 2 litros). Nem gigantes nem nanicos, os membros da família acham que devem progredir. “Nós não podemos ser mais baratos que o Guaraná Antártica e não queremos ser mais caros que a Coca-Cola. Estrategicamente, o refrigerante de caju está posicionado entre um e outro”, explica Souza, que reconhece outro imperativo. “Vamos reforçar a retaguarda. A marca São Geraldo é forte regionalmente, mas precisamos intensificar as estratégias de distribuição e marketing em vários estados. Nosso objetivo é cobrir o Nordeste em dois anos e o Brasil em oito”. Depois disso, o céu é o limite. “Em 2026, vocês vão encontrar refrigerante de caju no mundo!”, garante. Antes do porvir, uma novidade urgente. Em 2013, a São Geraldo vai lançar o seu refrigerante de caju em lata.
“E se eu consigo lançar a lata em São Paulo, eu consigo em qualquer parte do mundo”, cogita o diretor da empresa. “Queremos também fazer um vinho de mesa, fino, que as pessoas possam degustar”, adianta. Por enquanto o vinho – à base de jurubeba e uva – descansa em imensos tonéis de maçaranduba num grande galpão da fábrica, cada pipa com capacidade para 35 mil litros. A ideia é que até junho deste ano as primeiras garrafas estejam sendo abertas. Além do sabor caju, a São Geraldo produz refrigerantes de laranja, uva e cola, obtendo um índice de crescimento que chegou a 40% entre 2011 e 2012. Segundo a equipe que coordena os trabalhos, a grande preocupação atual é dar conta da demanda. “A tendência, nos próximos três anos, é triplicar as vendas. Acabamos de cavar um novo poço de água, que está em processo de liberação. Temos outros quatro poços de água mineral. Estamos ampliando as linhas de sopro, para fazer mais garrafas. Temos uma boa capacidade de produção, acima de 2.500.000 volumes/mês. Hoje estamos correndo para entregar o que o mercado pede”, comemora Francisco de Souza Filho.
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PARA NÃO PERDER O FÔLEGO Em 2012 o fraco crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) decepcionou os analistas de plantão, mas a economia brasileira continua a se expandir, ainda que num passo aquém das expectativas. Entre as oscilações do mercado e o humor dos investidores, é preciso fazer as apostas certas para acelerar o ritmo de crescimento. A CARIRI conversou com consultores e empresários de diferentes áreas para saber quais as demandas e promessas de 2013 na região. Confira o que disseram Albery Viana (gerente do BNB-Crato), Erasmo Mendonça (consultor executivo e sócio-proprietário da EBM Consultoria & Investimentos), Luciano Cavalcante Neto (empresário do setor imobiliário), João Luís Fiúsa (diretor da Faculdade Paraíso) e Douglas Feitosa (sócioproprietário da Full Vision-Cliente Oculto).
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O CRATO É A BOLA DA VEZ O Banco do Nordeste transformou Albery Viana, geógrafo de formação, num experimentado andarilho. Com 38 anos de serviços prestados, ele já esteve na Paraíba, Rio Grande do Norte e Maranhão. Morou 12 anos em Fortaleza. Por cinco anos desenvolveu projetos de ovinocaprinocultura em Canindé. Ainda no Ceará, passou por Mauriti, Brejo Santo e, finalmente, Juazeiro do Norte. “Quando cheguei, há alguns anos, Juazeiro estava em crise”, resume o atual gerente do BNB-Crato, que usa uma imagem prosaica para evocar aqueles tempos não tão distantes: “Às vezes eu tinha o estacionamento do Cariri Shopping só para mim, de tão pequeno que era o movimento”. Lojas fechadas e poucas opções na praça de alimentação complementavam o quadro desolador. “Aquilo não era condizente com uma região tão promissora”, considera Albery, que passou quatro anos em Juazeiro antes de ser transferido para o Crato. Com um trabalho consistente de apoio aos empresários locais, Albery considera que o BNB fez a sua parte, ajudando a modernizar o parque fabril e incentivando o setor de alumínio, folheados e calçados. A chegada das universidades, as transformações na área da saúde e a melhoria da infraestrutura viária foram motores imprescindíveis ao funcionamento da engrenagem. “Agora eu ouso dizer que a bola da vez é o Crato”, sorri o gerente, que hoje pensa duas vezes antes de ir ao shopping, com receio de não encontrar vaga para estacionar. No começo do ano, ele esteve reunido com o novo prefeito do Crato, Ronaldo Gomes de Mattos, e as diversas lideranças locais. Como conselheiro de uma instituição com históricos projetos de apoio ao Nordeste, Albery enxerga um leque de investimentos promissores para 2013, ano em que, segundo sua avaliação, convém apostar na logística de distribuição de produtos e na infraestrutura de construção. “Tudo o que se relaciona à construção de moradias e ao mercado imobiliário tende a crescer. Os programas do governo, como o Minha Casa, Minha Vida, mexem com uma grande teia de fabricantes, aí inclusos produtores de gesso, de blocos de cimento, de cerâmica... Essa é uma área que, sem dúvida, vai continuar robusta”. PROMESSAS PLAUSÍVEIS Outro setor que será fermentado em 2013 é o da educação, especialmente o Ensino Médio de qualidade.
Albery Viana aposta em várias frentes de negócios.
“Tivemos grandes conglomerados universitários se estabelecendo aqui. Agora é a vez do Ensino Médio. Há uma abertura para se investir em grandes escolas no conclave Juazeiro-Crato, ali no entorno do Centro de Convenções. Quem tiver a visão de montar um curso pré-vestibular não vai se arrepender. Acho que teremos uma grande demanda por crédito nessa área”. Nicho também propício seria um centro de atacado. “Se nós temos 250 indústrias de calçados, não adianta cada produtor montar uma loja próxima a sua fábrica. O comprador de fora fica perdido com tantos endereços para visitar. Se colocássemos todas essas lojas num só local, facilitaríamos as compras”, acredita Albery Viana, pesando outros fatores na mesma balança: Juazeiro tem vários distritos industriais, nem todas as fábricas se comunicam bem com os clientes (algumas não possuem um site) e a maioria delas são micro ou pequenas empresas. “Então, um centro de atacado e distribuição de calçados, folhados e alumínio seria um belo empreendimento aglutinador”. O gerente do BNB-Crato lembra que a hotelaria avançou muito, mas que ainda há um déficit de leitos no eixo Crajubar. A fruticultura irrigada também deve CARIRI REVISTA 55
acenar com promessas e investimentos públicos, especialmente no cultivo da cana, para a produção de álcool e açúcar. “Existe um centro de abastecimento pedindo mercadorias, que é a Ceasa de Barbalha. Temos o apoio governamental em programas como o Agricultura Familiar – os recursos são a longo prazo e os juros são negativos. A fruticultura, portanto, é um foco para 2013”. Um negócio bem distinto, mas igualmente favorável, é o das oficinas de carros 24 horas. “As principais cidades brasileiras de médio porte já contam com esse tipo de serviço. O Cariri poderia abrigar uma oficina assim, pois muitas pessoas que trabalham o dia inteiro e não dispõe do horário comercial”. Na região, somente farmácias e postos de combustível permanecem com as portas abertas noite adentro. “Então há espaço para quem quiser investir não apenas numa oficina, mas também num centro de serviços 24 horas”, arrisca Albery. Na área de saúde, há boas perspectivas para clínicas e laboratórios. Uma fábrica para embalagens também seria interessante, no entender do especialista, que indaga: “Por que, em todo esse complexo industrial do Cariri, nós ainda não temos uma fábrica que produza embalagens e pacotes?” E para finalizar, fica a sugestão de um novo shopping, com um mix de atacado e varejo. “Seria altamente rentável”, garante Albery Viana.
SINTONIA DE AÇÕES Homem de reconhecida sagacidade, Erasmo Mendonça é consultor executivo e sócio-proprietário da EBM Consultoria & Investimentos, que busca turbinar os processos internos de trabalho, elaborando estudos técnicos para empresas de diferentes portes e setores: infraestrutura, indústria, comércio, serviços e agronegócio. Com matriz em Juazeiro do Norte e filial em Fortaleza, a EBM se especializou na captação de investimentos, elaboração de estudos setoriais, planos de negócios, treinamentos e todo o passo a passo necessário ao sucesso de novas empreitadas, incluindo distritos industriais. Animado pelos últimos dez anos de crescimento, Erasmo considera que 2013 abrirá um grande leque de possibilidades: “A região do Cariri está experimentando um nível de desenvolvimento nunca antes imaginado pelo mais otimista de seus habitantes. Há uma sintonia das ações públicas e privadas – o que tem convergido no aumento da geração de emprego e renda. Este ano acredito que o desenvolvimento será ainda maior. Temos novos empreendimentos em gestação nos setores do comércio, indústria e serviços”. O consultor cita exemplos para justificar sua confiança nos bons indicadores regionais: a expansão do Cariri Shopping, que passa a ofertar 24.828 m² de ABL
RECURSOS CONTRA A SECA Nos núcleos urbanos nem todos se apercebem, mas a escassez de água vem atormentando a região Nordeste há três longos anos. “Tivemos seca em 2010, pouca chuva em 2011 e uma das piores estiagens da história em 2012. Essa seca foi tão cruel quanto a de 1915, porém com consequências mais amenas, porque já estamos melhor preparados para enfrentar as adversidades do clima. Mesmo salvando as pessoas, perdemos os animais: os rebanhos foram dizimados”, lamenta Albery Viana. No planejamento do Banco do Nordeste para 2013, a agropecuária tem lugar de destaque, com recursos 56 CARIRI REVISTA
já assegurados e metas estabelecidas. Só na região do Crato, serão mais de R$ 7 milhões destinados à agricultura familiar. “A tendência é passarmos disso, pois para recuperar a atividade produtiva os agricultores vão demandar mais recursos”, considera Albery. O banco também a aposta nas micro e pequenas empresas locais. “Temos verbas garantidas para a área de MPE, que abarca a grande maioria dos negócios da região, com faturamento de até R$ 3 milhões e 400 mil, mas sem descartar as médias empresas, com faturamento de até R$ 16 milhões”, informa.
(Área Bruta Locável, índice que corresponde à soma de todas as áreas disponíveis para locação, exceto quiosques) e a implantação do Shopping Center Juazeiro, com 12.193 m² de ABL. “Através desses dois grandes shoppings centers vem a instalação de várias franquias de fast food, roupas, calçados, perfumaria, brinquedos e outros segmentos”, pontua Erasmo. Em função do aumento de poder de compra e da distância da capital, há uma grande demanda para serviços de alimentação, entretenimento e lazer. “Temos visto recentemente um grande número de novos restaurantes e a ampliação dos existentes – o que deverá continuar a acontecer em 2013”. Também no setor industrial há negócios estreando e outros ganhando fôlego, especialmente no ramo de calçados, em que várias empresas apostam na modernização de suas instalações, de olho nas exportações. “A empresa Bom Sinal, fabricante de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) tem investido continuamente em novas tecnologias e ampliado a quantidade de empregos em Barbalha, município que conta ainda com a Farmace – uma grande empresa geradora de mão de obra no setor farmacêutico. Vale citar a ampliação da Trevo Industrial, que investe no aumento da produção de placa de drywall. A Trevo é a pioneira cearense nesse segmento”. OCUPAÇÃO PLANEJADA Sem medo de errar, Erasmo afirma que o Distrito Industrial do Cariri (DIC) vivencia uma fase de verdadeira ocupação – planejada –, com projetos nascentes em setores como os de calçados, alimentos, alumínio, metalurgia e construção civil. “Neste momento”, enfatiza ele, “estão em obras cinco novas indústrias no DIC: uma no setor de vidro temperado, uma no setor de alumínio, uma de pré-moldados e duas outras na área de metalurgia”. Prevê que a construção civil e o setor imobiliário – que tiveram o maior crescimento dos últimos anos – continuarão levantando muita poeira. “A verticalização das obras passa a compor o espaço urbano com maior presença. Existe carência por insumos que ofereçam segurança, preço e ganho de tempo e qualidade”, esclarece o consultor da EBM. Assim como Albery Viana, ele destaca as demandas do ensino e o espaço para novas instituições educa-
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Erasmo Mendonça aponta o crescimento do Distrito Industrial do Cariri.
tivas. “É evidente o grande crescimento na oferta de cursos de Ensino Superior e pós-graduações em Juazeiro do Norte, Crato e Barbalha, com destaque para a visão empreendedora dos que têm investido continuamente em novas tecnologias e modernização das instalações”, elogia. O próprio setor em que atua Erasmo Mendonça tem respirado ares inspiradores. “Mudanças no mercado, aumento da concorrência, clientes mais exigentes e maior rigor dos órgãos fiscalizadores obrigam que as empresas se especializem, controlem melhor seus custos e processos. Com isto, há investimentos na criação e ampliação de consultorias especializadas nas áreas contábil, financeira, tributária, de gestão, certificação e treinamento de mão de obra”. Para ao consultor da EBM, há espaço para todos, desde que não falte planejamento, estratégia e visão de conjunto. LEVANTANDO POEIRA Em 2013, Luciano Cavalcante Neto completa cinco anos de transações imobiliárias em Juazeiro do Norte. O empresário, que atua desde 1992 em Fortaleza, mantém um escritório também em Teresina. No Cariri, montou seu quartel-general numa área nobre e trabalha com 50 corretores, sendo que 90% da equipe é da região. Ele CARIRI REVISTA 57
chegou em 2009, com a proposta de vender imóveis de Fortaleza para os moradores de Juazeiro. A permanência, entretanto, não foi programada. “Montamos um stand no Cariri Shopping, onde ficamos um ano e meio, tempo em que fizemos muitas amizades”. Entre os novos amigos estavam Patrícia e Felipe Coelho, diretores da CRC, uma das grandes construtoras da região. “Eles nos confiaram as intermediações de vendas do segundo condomínio que fizeram sob regime de incorporação, o Bella Vita, com 41 casas duplex na Lagoa Seca. Até hoje, são nossos grandes parceiros”, celebra Luciano. Ele aponta outros projetos vendidos em parceria com a CRC, como o Edifício Alberto de Moraes, no Centro de Juazeiro, e o condomínio de casas Terra da Lagoa. Outro marco importante foi o Central Park. Primeiro multiuso de Juazeiro do Norte, o Central Park é um mix de residencial e comercial idealizado por Manoel Salviano, sob regime de incorporação da S&A, construção da CRC e vendas da Luciano Cavalcante Imóveis. De lá para cá, muitos outros projetos foram surgindo, até aparecer um segundo grande marco, o Unique Condominium, complexo que engloba duas torres comerciais, cada qual com 200 salas, e uma torre residencial com 122 apartamentos, vizinho ao Cariri Shopping. O empresário se entusiasma: ao todo são 522 unidades, com faturamento estimado de R$ 100 milhões. “É um projeto magnífico! Das três torres, nós temos uma já totalmente vendida e outra com 60% das unidades comercializadas. Lançamos esse projeto em setembro do ano passado!”. Mais que o turismo religioso, é o turismo de negócios que está servindo de esteio para a compra de apartamentos na região. Alguns deles são bem pequenos. O espaço reduzido é justificado pela demanda do público. “Temos muitos estudantes solteiros, além de executivos, representantes e distribuidores que passam pela região apenas para fechar contratos. É um padrão médio alto, mas que não precisa de grandes apartamentos”, considera Luciano. “Isso acabou criando uma tendência”. Apartamentos de 45 m2, pagos em suaves 58 CARIRI REVISTA
prestações e a juros baixos não são mais novidades. Em Juazeiro do Norte, o metro quadrado gira em torno de R$ 4.500. Em Fortaleza chega a R$ 6.500. INTENSIDADE EM 2013 Como especialista na venda de imóveis, Luciano Cavalcante Neto continua tranquilo ante o que se delineia entre os canteiros de obras. “O ano de 2012 foi um ano de eleição, um ano indeciso, com muitos entraves no segundo semestre e excessiva burocracia na aprovação dos projetos... Mas 2013 promete ser intenso. Nós temos boas expectativas, afinal, desde 2011 as atenções do estado se voltam para Juazeiro do Norte e seu entorno. Já passamos as eleições, a desburocratização já começou, temos muito apoio dos cartórios e das prefeituras”. Agora as atenções de Luciano e sua equipe se voltam para o Gran Palace, um mega projeto que oferece um apartamento por andar, em regime de condomínio fechado, com duas torres de 21 andares e 42 apartamentos ao todo, cada qual com 340 m2 de área e seis vagas, na Lagoa Seca. A construção é da CRC. “Os principais nomes da região estão investindo nesse empreendimento, que vai ser lançado nesse primeiro semestre”. Paralelamente, aposta suas fichas no primeiro condomínio fechado de alto luxo de Juazeiro, com 300 lotes de 300 m2, que está sendo lançado por uma loteadora de Fortaleza. “Acredito que a gente tenha ainda bons anos pela frente de preenchimento do mercado. O importante é acertar no que a população deseja. O que as pessoas querem? Não somos aventureiros e viemos para ficar”, garante com veemência. CLIENTE OCULTO, VISÃO AMPLIADA Em 2013 os sócios da Full Vision-Cliente Oculto esperam mostrar aos homens e mulheres de negócios tudo aquilo que suas empresas precisam saber, mas que nem sempre é óbvio. A técnica de Cliente Oculto, usada nessa empreitada e pela primeira vez em curso no Cariri, surgiu na década de 1940, nos EUA, e consiste numa espécie de “espionagem” em prol da qualidade. Explicando melhor: pessoas contratadas pela Full
Vision se disfarçam de clientes e visitam os estabelecimentos comerciais para avaliar os mais variados quesitos, desde o ambiente físico até a postura pessoal da equipe, passando pelo comportamento dos vendedores, a organização e o conhecimento sobre produtos e serviços prestados. É como um raio-X feito do início ao fim do processo de compra e venda. “Além das visitas, são mantidos contatos telefônicos que visam observar diversos critérios no processo de atendimento. Cada avaliador é responsável por gerar um relatório, tanto da visita quanto da ligação, abordando os itens previstos no check list e respeitando a metodologia da análise”, detalha o empresário Douglas Rodrigues Feitosa, mentor da Full Vision, que tem sede em Juazeiro. Com a análise em mãos, é possível identificar exatamente quais os erros, acertos, entraves e promessas de cada empresa. Especialista e mestrando nas áreas de gestão e auditoria, Douglas Feitosa abriu a Full Vision em outubro de 2012, depois de uma estadia no Canadá, onde fez um intercâmbio e conheceu a técnica de Cliente Oculto. “Ao chegar ao Brasil realizei atividades na área e fui em busca de conhecimento para abertura da empresa”, conta Douglas. Juntamente com os sócios Webert Jannsen e
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Douglas Feitosa aposta na técnica do Cliente Oculto para aperfeiçoar procedimentos.
Leonardo Brandão, todos da área administrativa, ele começou a considerar que havia espaço no Cariri para esse negócio. “A receptividade foi além do esperado!”, comemora. “Pelas informações que possuímos, somos a única empresa genuinamente cearense especializada nesta área. Estamos lidando com a implantação de uma cultura com uma técnica que é pouco conhecida pelos gestores. Vamos mostrar que o atendimento de qualidade não é um gasto e sim um investimento que trará a fidelização dos clientes e a maximização das vendas”. A grande sedução da técnica utilizada é que ela traz o ponto de vista daqueles que realmente interessam aos empresários: os clientes. Apesar do pouco tempo de funcionamento, a Full Vision-Cliente Oculto já foi contatada por empresas de ônibus e concessionárias, restaurantes e lanchonetes, lojas de roupas e calçados, farmácias, óticas, hotéis, pousadas e operadoras de viagens. “Mais do que vender um produto, buscamos mostrar que todas as empresas, sejam elas de pequeno ou grande porte, podem dar um atendimento de excelência ao seu cliente, aumentando o volume de vendas”, afirma Douglas Feitosa, bastante entusiasmado com as perspectivas para 2013. CARIRI REVISTA 59
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PROMESSAS DO PARAÍSO Rua Conceição, em pleno bairro São Miguel, Juazeiro do Norte. Pelos corredores iluminados, alunos carregando livros e apostilas conversam entre uma aula e outra, os notebooks e celulares sempre à mão. Longe do burburinho, num segundo andar formado por um curto labirinto de corredores iguais, está a sala do professor João Luís Alexandre Fiúsa, que lidera 70 professores e 1.750 alunos na Faculdade Paraíso (FAP). Com sete anos de vida, a FAP é uma das mais jovens instituições de ensino superior instaladas em Juazeiro do Norte, uma semente que brotou do Colégio Paraíso, este com mais de 40 anos de atuação. Fundado pela professora Maria Cícera Alexandre Fiúsa, conhecida como Rosenir, pedagoga de formação, o Colégio oferece desde a Educação Básica até o Ensino Médio e o pré-vestibular. Formado em Direito e Engenharia Civil, o diretor-geral da Faculdade Paraíso fala rápido e não vacila quando cita números. Ou planos. A construção de um novo campus, a instalação de mais sete cursos e o início da estruturação de um mestrado em Direito: 2013 é um ano que promete. “Essa terra adotou muita gente boa, acolheu talentos incríveis e gerou demandas. O Cariri é uma potência. Basta circular pelas cidades e constatar como elas se transformam, muitas vezes sem intervenção política, apenas pela vontade da população”, festeja o professor João Luís. Nascido em Juazeiro do Norte, ele acompanha a FAP desde os primeiros tempos. A Faculdade abriu as 60 CARIRI REVISTA
João Luís Fiúsa: As dificuldades regionais não devem impedir a abertura de novos cursos.
portas em 2006, oferecendo Administração e Direito. No ano seguinte, deu início ao curso de Sistemas de Informação. “Esses três cursos foram reconhecidos com nota 4 (OBS: as notas, dadas pelo MEC, vão de 0 a 5) . Fizemos também o recredenciamento da Faculdade e obtivemos igualmente nota 4, que consideramos excelente”. Outra boa surpresa veio com o IGC – o Índice Geral de Cursos. O IGC é divulgado anualmente pelo Inep/MEC, logo após a divulgação dos resultados do Enade. O índice vai de 1 a 5 e sintetiza num único indicador a qualidade de todos os cursos oferecidos por uma mesma instituição de ensino. “Fomos a única instituição particular do Ceará a obter nota 4. Fora nós, só a UFC, que é pública”, comenta o professor. Em todo o Brasil, foram 2.136 instituições avaliadas. Dessas, 261 não obtiveram conceito, 27 alcançaram a nota máxima e 190 conseguiram a nota 4. Ou seja, a FAP se colocou num pequeno grupo de faculdades formado por menos de 10% dos avaliados. “Isso é um indicador de desenvolvimento! Faz com que os investidores percebam que podem se instalar aqui, pois há mão de obra qualificada”, acredita João Luís Fiúsa.
NOVOS HORIZONTES EDUCACIONAIS Depois de consolidado um ciclo, é hora de alargar os horizontes. Em 2013, sete novos cursos vão integrar a grade acadêmica da FAP. “Fizemos pesquisas de mercado e identificamos algumas necessidades da região. Vamos entrar forte nas áreas de Exatas e Saúde”. Dos sete cursos, quatro já estão bem definidos, mas, até o fechamento desta edição, o prof. João Luís evitava citar os nomes. “É uma questão de planejamento estratégico, mas posso afirmar que são cursos inéditos no Cariri”. Ele aproveita para repetir uma frase que lhe ficou na memória: melhor uma universidade em cada esquina que um ponto de drogas em cada bairro. “É muito criticado no Brasil o fato de termos instituições em excesso. Reconheço que são muitas faculdades e que é preciso melhorá-las. Mas é fato que, numa cidade pequena, de 6.000 habitantes, por exemplo, uma faculdade faz a maior diferença, por mais precária que seja”. A universidade é transformadora, um dos mais poderosos pontos de partida para uma vida mais próspera. “Não estou defendendo as instituições ruins, mas acho que as dificuldades regionais não devem impedir a abertura de novos cursos. Óbvio que as instituições de má-fé são casos de polícia e não de educação”, diz o professor, que adianta uma boa notícia: a FAP está se preparando para oferecer o mestrado interinstitucional (Minter) em Direito. “Mas isso talvez só em 2014, numa parceria com a UFC. Hoje, 44% dos nossos professores são mestres e doutores. Com o Minter, esse índice vai subir, porque já temos muitos profissionais na região com mestrado e doutorado”. Para 2013, uma mudança estrutural. A FAP vai começar a construção de sua nova sede, em frente ao Hotel Verdes Vales, na Lagoa Seca, numa área de quase 22.000 m2. O campus vai abrigar os novos cursos e talvez uma parte dos antigos. “Alguns cursos têm a tendência de ficar mais na área central. Faremos uma consulta interna entre os alunos”, esclarece o diretor da Faculdade Paraíso. Cheio de confiança nos passos a serem empreendidos, ele encerra: “Quem lida com instituições de ensino, mexe com sonhos, conquistas, transformações. Não é só o aluno que se forma. É a família toda. Somos mediadores e zeladores desse processo. É um momento ímpar, e fico muito feliz de participar dele”.
BÔNUS DEMOGRÁFICO O professor João Luís Fiúsa lembra que em 2013 estamos começando o que os economistas chamam de “bônus demográfico”: pela primeira vez na história do Brasil a maior parte da população será economicamente ativa. Essa curva só começará a se reduzir depois de 2030, se bem que até 2050 ainda teremos entre 68% e 64% da população economicamente ativa. “Todos os países passaram pelo bônus demográfico. Foi quando os índices de saúde, economia e desenvolvimento se elevaram, pois o país produz em sua capacidade máxima. Depois a pirâmide inverte, como acontece há muitos anos na Europa”, explica CARIRI REVISTA 61
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#cariripolíticaspúblicas
os desafios urbanos e as
novas prefeituras
As cidades ocupam cada vez mais um lugar imperioso na vida contemporânea. Independentemente de estarem no centro ou na periferia da origem do desenvolvimento, crescem desordenadamente, tornando-se desafios complexos e exigindo de seus gestores – recentemente empossados – planejamento, racionalidade e criatividade. A partir de temas específicos, porém fundamentais para a qualidade urbana, a CARIRI iniciou um périplo de identificação de problemas e descoberta de soluções, junto à capital do Ceará e às duas maiores urbes da região sul do estado. 64 CARIRI REVISTA
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O Crato já chamou atenção pela beleza das praças.
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CRATO: EM BUSCA DE UM NOVO CENTRO Encontramos o novo prefeito do Crato, Ronaldo Gomes de Mattos (PMDB), no sítio do irmão – um espaço verde com araras criadas soltas e um imenso coral de passarinhos –, onde às vezes ele se refugia com pastas e assuntos da Prefeitura. No final de uma tarde calma, já havia conversado com vários secretários e servido algumas xícaras de café. Eleito com 59,87% dos votos, Ronaldo foi um dos fundadores do PSDB no Crato, mas é um estreante em cargos públicos. Antes de qualquer medida estrutural, o novo prefeito resolveu organizar um mutirão de limpeza, colocando nas ruas 50 homens com caminhões-caçambas, tratores e retroescavadeiras. O projeto de limpeza emergencial foi levado adiante pela Coordenação da Limpeza Urbana e Conservação do Patrimônio ainda em janeiro. “Quando cheguei à Prefeitura, o Rio Granjeiro estava totalmente assoreado. Organizamos uma grande campanha de limpeza, tanto no Granjeiro quanto no Rio Lobo – que nas últimas enchentes ficou desgovernado e inundou os bairros vizinhos”, ressalta Ronaldo, que já manteve vários encontros com o governador Cid Gomes. Foram conversas preliminares em que trataram de antigos projetos, como o canal do Rio Granjeiro, as obras da estrada de Santa Fé e os planos para a Encosta do Seminário. 66 CARIRI REVISTA
“Esses projetos existem nas intenções, com exceção do projeto da Encosta do Seminário, que já está pronto, esperando apenas que se resolva a parte social, com o remanejamento das famílias”, resume o prefeito. Devido ao uso impróprio dos terrenos, a Encosta do Seminário transformou-se numa área de risco, com grandes volumes de rochas se deslocando e esculpindo perigosas crateras – algumas delas ganharam até apelidos, como Vulcão Maior e Vulcão Menor. Por causa da topografia irregular e da ocupação desordenada, as paredes dessas crateras vão arriando e engolindo as residências. Pelo menos 100 famílias precisarão ser remanejadas. “Os moradores estão cientes da necessidade de mudança e a Prefeitura, em convênio com o Governo do Estado, vai construir as novas casas. Esse projeto só ficou parado porque as administrações anteriores não priorizaram”, explica Ronaldo. Nas conversas com o governador Cid Gomes, ficaram acordados outros passos importantes rumo a uma cidade mais bem resolvida, como a construção da estrada Crato-Bela Vista, passando pela Vila São Bento, que vai beneficiar mais de 10 mil pessoas. O Centro de Convenções, cujas obras estavam paradas, será concluído até o meio deste ano, segundo Ronaldo, que também solicitou
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Ronaldo Gomes de Mattos: “As calçadas são públicas, mas não para o comércio”.
a inclusão de mais cinco quilômetros à estrada Crato-Santa Fé, para que ela chegue ao distrito de Dom Quintino. A obra será tocada a partir de uma parceria do Governo do Estado com o Governo Federal, e está dependendo apenas de licenças ambientais para ser liberada. TRABALHO NAS RUAS Empresário bem sucedido, Ronaldo Gomes de Mattos tem despertado expectativas nos que esperam uma gestão mais arrojada para o município. Geólogo de formação, logo nos primeiros anos de carreira resolveu apostar na atividade industrial, investindo no ramo da cerâmica. Da cerâmica foi para a construção civil, da construção civil para a fabricação de sandálias, e daí para argamassas. Ganhou reconhecimento e influência ao longo de 26 anos dedicados à iniciativa privada – além do apelido Ronaldo da Cerâmica. Agora se aventura numa nova tarefa, certamente a maior de todas. Nascido no Crato em 1966, Ronaldo é filho de uma família tradicional da região. Declara-se um apaixonado pela terra natal e reconhece a necessidade urgente de uma reordenação urbana, a começar pelo Centro. “Um dos nossos problemas atuais é a grande quantidade
de pessoas vendendo frutas e outros artigos nas praças e ruas. Isso é um problema social, mas é também um transtorno urbano”, pontua o prefeito, lembrando que existem espaços específicos para esse tipo de atividade. “As calçadas são públicas, mas não para o comércio, e sim para os pedestres. Os vendedores estão nas ruas por necessidade, mas o código de postura do município tem que ser respeitado”. A solução então é organizar os espaços, para que os ambulantes possam ser levados ao mercado público. “Estamos visitando mercados antigos que estão fora da realidade, sem qualquer norma de higiene. É necessária uma intervenção do poder público para que tais áreas sejam recuperadas”. Hoje esses espaços possuem o que Ronaldo chama d e “grandeza negativa”. Ele quer incentivar parcerias público-privadas para que novos projetos viabilizem a recuperação de vários pontos centrais. No mês de março teve início uma ação educativa, com vistas ao disciplinamento e desocupação das ruas – pois o número de ambulantes tem aumentado. O trabalho de convencimento começou na Praça da Sé, seguindo pelas ruas Dr. João Pessoa, Monsenhor Esmeraldo e Coronel Luiz Teixeira, Santos Dumont e José Carvalho. CARIRI REVISTA 67
A determinação é que a partir do dia 1º de abril seja proibida a instalação de barracas nas ruas. A Secretaria de Meio Ambiente e Controle urbano está realizando o cadastramento dos comerciantes para encaminhá-los aos mercados Wilson Roriz e o Walter Peixoto. Fora do Centro, nos bairros periféricos, as necessidades são outras: pavimentação, calçamento, abertura de novas ruas, incentivo à instalação de empresas. “A ideia é transformar o Crato numa cidade que seja atraente para moradores, turistas e investidores”, sonha o prefeito, citando duas outras grandes preocupações: saúde a curto prazo e educação ao longo do tempo. “Estamos na 164ª posição dentre as cidades do estado do Ceará em termos de educação”, diz ele, expressando aborrecimento. “Precisamos elevar esse nível, para que o Crato volte a ser a cidade da cultura e dos bons colégios”. Já a saúde faz parte de uma orquestra, desafinada há muito tempo e que também tem a ver com urbanidade. “Nós temos esgotos a céu aberto e problemas com o lixo espalhado pela cidade, o que leva à proliferação de insetos... Investindo e insistindo na saúde básica, com toda certeza sobrarão leitos nos
hospitais”. Em pouquíssimo tempo de gestão, o novo prefeito já descobriu que os problemas caminham juntos e as soluções também. Para ele, a missão que assumiu pode ser resumida num lema: “A coisa ou funciona ou... funciona! Não temos outra opção!”. JUAZEIRO DO NORTE: PELO DIREITO DE ANDAR Juazeiro do Norte é o terceiro maior colégio eleitoral do Ceará e o mais robusto do Cariri, com 165.540 eleitores. Nas últimas eleições, 51,55% desses eleitores resolveram dar a Raimundo Antônio de Macedo, o Raimundão (PMDB), a chance tomar as rédeas da cidade novamente. Formado em medicina, Raimundo Macedo estreou na política como vice-prefeito de Juazeiro pelo PSDB há 25 anos
Valdo Figueiredo, secretário da Cidade: “Tem como melhorar”
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fotos: rafael vilarouca
Juazeiro do Norte: crescimento desordenado e centro caótico.
Em 2004, foi eleito prefeito da cidade pela primeira vez. Antes disso, cumpriu mandatos como deputado estadual e deputado federal. Na nova gestão, assume um município que aos cem anos tem grandes empreendimentos comerciais, virou polo universitário e se destaca na produção de calçados. Mas que também enfrenta problemas básicos de trânsito, lixo e mobilidade. Devido à quantidade de demandas urbanas, provocadas principalmente pelo inchaço populacional e a falta quase absoluta de planejamento, a nova Secretaria da Cidade é uma das que terá muito trabalho pela frente. O juazeirense Valdo Figueiredo assumiu o encargo de dar vida à pasta. “Fui chamado para cuidar da parte de urbanismo, mas ganhei de brinde a área de habitação popular”, brinca ele, que é formado em arquitetura e morou alguns anos em Fortaleza antes de retornar à terra natal. No início, as pequenas coisas. “Antes de fazer grandes planos, é preciso assegurar o básico, investindo em sinalização, calçadas, acessibilidade. Vamos privilegiar o pedestre”, promete Valdo, lembrando que
Juazeiro é uma cidade de porte médio com fluxo de carros que se equipara ao de algumas capitais do Brasil. “Nas grandes avenidas e ruas principais, nós temos como melhorar as calçadas, fazer rampas, cuidar da sinalização para deficientes visuais e instalar sinais sonoros para deficientes auditivos. Quando as grandes avenidas forem sendo reformadas, nós temos que nivelar todo o asfalto, senão não adianta ter rampas. Em alguns lugares onde o fluxo de carros não é tão grande, estamos pensando em fazer passagens elevadas em que a faixa de pedestres se mantenha no nível da calçada e os carros é que sejam obrigados a diminuir a velocidade e passar por cima – como já é feito nas principais capitais e já foi feito pelo Governo do Estado ali perto do Franciscano”, planeja. As mudanças são possíveis, desde que se entenda o valor do coletivo. “As pessoas não estão acostumadas a respeitar a calçada como espaço público, muitas delas fazem intervenções, colocando o piso de sua preferência, entrando com rampas e degraus de diferentes tamanhos, sem qualquer nivelamento”, pontua CARIRI REVISTA 69
o novo secretário. Outro problema é a ocupação dos canteiros centrais. “Canteiro central é espaço público. Não pode ser ocupado e privatizado. Assim como os parques, os canteiros centrais servem para deixar a cidade respirar. Eles absorvem a água da chuva. É uma área que tem que ser livre, de uso público”, insiste. Valdo quer começar uma campanha de limpeza visual na cidade. “A ideia é limpar os canteiros, retirando placas, quiosques, barracas... Obviamente daremos alternativas às pessoas que comercializam produtos ali”. Missão espinhosa, ele sabe. “Quando a gente chega querendo mexer em algo, acaba despertando antipatia, porque tira as pessoas da zona de conforto. Algumas
decisões só são encaradas como medidas simpáticas quando as pessoas começam a sentir os benefícios”. Um dos maiores benefícios, sem dúvida, seria o envolvimento da população. “Nós temos que deixar Juazeiro mais bonita, para aumentar o sentimento de amor por ela. Quando as pessoas começarem a ver os canteiros bem cuidados, também vão querer cuidar deles”, acredita Valdo. A Secretaria da Cidade vai chamar uma consultoria técnica para auxiliar na reformulação do Plano Diretor. “Vamos dar continuidade ao Plano, que precisa ser atualizado. Um Plano Diretor é como um ser vivo, como uma cidade em constante mutação. De período em período ele tem que ser reajustado”, defende.
UMA LONGA CAMINHADA Em entrevista à Cariri Revista, a arquiteta e urbanista Deborah Macêdo analisa os desafios urbanos de Juazeiro do Norte. Ela acredita que nos quesitos mobilidade urbana, acessibilidade universal, saneamento básico, impermeabilização do solo e combate à desertificação, a cidade ainda terá uma longa caminhada pela frente. CARIRI: Por onde começar? Antes de tudo é preciso que a população se aproprie da cidade e se esforce para cumprir a legislação urbana vigente. O Plano Diretor atual, que fará 13 anos este ano, já prevê que as calçadas tenham um mínimo de 1,5 m de largura, mas isso não é bem o que vemos. Pelas calçadas circulam os pedestres, os portadores de necessidades especiais, ou seja, os cadeirantes, idosos, mulheres com carrinho de bebê, gestantes, crianças com mochilas de rodinhas, etc. Manter uma calçada livre faz com que se cumpra o direito que todos têm de ir e vir. A população inteira é prejudicada quando alguma construção se apropria do espaço da calçada. CARIRI: Mobilidade urbana é outro grande desafio. Sim, carros, motos, pedestres e ciclistas disputam espaço para transitar. Uma cidade do porte de Juazeiro já era para ter, no mínimo, uma ciclovia. Não que a ciclovia seja a redentora de todos os problemas de mobilidade, mas faz parte de uma estratégia que deve ser pensada para que todos possam trafegar com eficiência e segurança. CARIRI: Juazeiro do Norte cresce a números 70 CARIRI REVISTA
impressionantes, entretanto, ainda sofre com problemas primários como esgoto a céu aberto. Saneamento básico é outro “calcanhar de Aquiles”. Ainda é comum achar águas servidas depositadas nas ruas, muitas vezes sem tratamento algum. Inúmeros poços artesianos instalados próximos demais às fossas sépticas que findam por poluí-los e, pior, em locais aonde chega o serviço da concessionária de água. Taxa de permeabilidade é o nome de um dos indicadores presentes no Plano Diretor vigente que todas as construções devem seguir. Ela indica a fração do lote que deverá ficar livre de toda construção para que a água possa infiltrar no terreno. O alagamento da cidade com qualquer chuva também ocorre em virtude do desrespeito ao cumprimento deste indicador. CARIRI: O que o novo prefeito deve priorizar em 2013 para que a cidade cresça de maneira mais aprazível? Creio que para resolver os problemas urbanos não bastam atitudes pontuais isoladas. O desafio é pensar no todo, é ter consciência de que, infelizmente, estes problemas não vão se esgotar até que outros setores sejam também explorados e trabalhados em coletividade e sinergia, como educação e pesquisa. As obras de infraestutura, embora extremamente necessárias e urgentes, por si sós, não bastam. Por fim eu colocaria que é importante a presença de uma equipe técnica forte, que conheça de perto os problemas que se dispõe a resolver.
Um problema que só cresce é o transito, já que a frota flutuante de Juazeiro é imensa. “Na época das grandes romarias, a cidade chega a abrigar dois milhões de pessoas, quando na verdade tem 300.000 habitantes. Por isso estamos estudando a abertura e o alargamento de ruas, inclusive no Centro da cidade”, diz Valdo Figueiredo. Um projeto já apresentado ao prefeito é o que prevê a abertura de vias paralelas à Rua São Pedro até à saída da cidade, em direção a Caririaçu. O Anel Viário, prometido desde a administração passada de Raimundão, já está com o traçado pronto e o primeiro trecho licitado. Várias vias já foram abertas para as futuras obras. O primeiro trecho de 3,5 km vai ligar a
descida do Horto – ali na Boca das Cobras – até a Av. Paulo Maia, que é a que vai seguindo a linha do trem, próximo à Av. Padre Cícero. “A conclusão desse trecho vai permitir que o fluxo de carros que for para o Crato, possa fazer isso sem passar por dentro da cidade”, comemora Valdo. Os prefeitos do Cariri já se reuniram este ano para discutir a questão do Aterro Sanitário Consorciado, que ficará em Caririaçu, na fronteira com Juazeiro. “A lei federal estabelece que os processos de implantação estejam encerrados em 2014. O dinheiro já está reservado, tudo depende dos processos sociais. Será feito um reassentamento assistido. Queremos instalar o canteiro de obras ainda em março”, planeja o secretário Valdo Figueiredo.
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FORTALEZA E A QUESTÃO DO LIXO Por Sarah Coelho
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udança exige coragem e capacidade de readequação. A ida para um novo endereço chegou com novidades à vida da empresária Paula Osório. Entre as positivas, mais espaço, uma piscina no térreo do prédio e muitos armários. Entre as negativas, a questão do lixo. “Não temos lixeiras nos andares. Se esqueço de colocar o lixo para fora no horário que o funcionário passa, fica tudo acumulado dentro de casa. Além disso, tento fazer a separação do lixo, mas tenho que deixar tudo em algum ponto de coleta seletiva, pois o condomínio não se responsabiliza”, ressalta. O problema de Paula vai além de sua vida privada e retrata também a realidade de outros cidadãos da cidade de Fortaleza. Preocupados com assuntos urgentes como segurança e emprego, deixam em segundo plano a exigência de um serviço de limpeza urbana eficiente e bem estruturado. Até que um dia se esquecem do horário do lixo! Ou, olhando para além de nossas paredes, até que um terreno baldio próximo de casa começa a ser usado como lixeira; um catador atrapalha o tráfego; ou o mau cheiro incomoda a caminhada por certos pontos da cidade. É a má administração de um setor que pode fazer a diferença na qualidade de vida de uma população que já supera os 2,5 milhões de habitantes. A jornalista Natália Vieira voltou a morar em Fortaleza depois de alguns anos fora. Com o retorno, a constatação do atraso em certas questões tidas por ela como básicas. “Fiquei muito impressionada com a falta de organização em determinados setores, como, por exemplo, a coleta seletiva, que pra mim já era algo meio impossível de não ser feito. Mas conversando com amigos e familiares, percebi que não é apenas no meu condomínio, infelizmente esse é o normal da cidade”, conta.
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Separação do lixo na estação de reciclagem do Pão de Açúcar : mérito da iniciativa privada
rafael inácio
A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO ÓBVIO Entretanto, como um prédio que muda de síndico, Fortaleza está animada com o novo cenário que começa a desenhar-se. Em janeiro deste ano teve início uma nova gestão municipal e, no campo da limpeza urbana, a aprovação de um Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos (PMGIRS) tornou lei o que antes era apenas diretriz e intenção. Desde agosto de 2010, a nova Política Nacional de Resíduos Sólidos, lei federal nº 12.305/2010, impôs aos setores público e privado uma nova maneira de lidar com produção, serviços e destinação final dos resíduos sólidos. Do município, passou a ser exigido um marco regulatório que envolvesse entidades e sociedade civil no tratamento adequado do lixo gerado. Apenas em dezembro de 2012 ele foi definitivamente apresentado à população. A demora reflete um antigo descaso com o assunto. “Nós não tivemos em oito anos uma política de gestão de resíduos sólidos comprometida a contento com a sustentabilidade, tivemos apenas algumas ações isoladas, e na Câmara Municipal de Fortaleza conseguimos aprovar projetos interessantes, mas que não foram implementados”, comenta o vereador João Alfredo (Psol), conhecido pelo trabalho na área ambiental. Entre os projetos citados pelo parlamentar, a replicação a nível municipal do decreto Nº 5.940, que torna a coleta seletiva obrigatória dentro de órgãos e entidades da administração pública; além do desconto de 5% no IPTU de condomínios que passarem a realizar a coleta seletiva. PANORAMA DE EXPECTATIVAS Atualmente, a gestão de resíduos sólidos em Fortaleza acontece de forma descentralizada, com três CARIRI REVISTA 73
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Mutirão de limpeza do grupo de jovens Consciência Limpa
principais responsáveis pelos serviços: Empresa Municipal de Limpeza Urbana e Urbanização (Emlurb), Marquise, e Ecofor Ambiental. A Emlurb executa serviços como limpeza de bocas de lobo, pintura de meio fio, paisagismo, limpeza de córregos, coleta de animais mortos, roçagem e capinação. Parte dos serviços é ainda terceirizada com a Marquise, a Cocace e a Coopserv, como varrição e capina. A empresa Marquise, por sua vez, realiza a operação do Centro de Tratamento de Resíduos Perigosos (CTRP), para a incineração do lixo e inertização por autoclavagem. Já a Ecofor Ambiental faz a coleta, transporte e disposição final dos resíduos sólidos domiciliares. Neste contexto, o PMGIRS, lançado pela Autarquia de Regulação, Fiscalização e Controle dos Serviços Públicos de Saneamento Ambiental (ACFOR), planeja metas para um período de 20 anos, destacando 37 propostas para a redução do lixo na cidade, como o incentivo à reciclagem, estímulo à construção de ecopontos e melhoria no tratamento final dos resíduos. “Considero o Plano muito bom, mas a sua 74 CARIRI REVISTA
implementação dependerá da decisão política da nova administração. A cidade de Fortaleza tem características de turismo forte e também um comércio crescente, gerando hoje 5.124 ton/dia. Temos um consumismo grande, fruto de anos de pobreza. A geração de resíduos urbanos em Fortaleza cresce mais do que a taxa de crescimento populacional”, explica o engenheiro ambiental da ACFor, Humberto Júnior. O documento foi elaborado a partir de um conjunto de estudos, informações e dados disponibilizados por instituições públicas municipais, estaduais e federais e entidades da sociedade civil; além de duas consultas públicas e de reuniões com diferentes instituições que atuam no setor. Entretantoa, a professora da Universidade de Fortaleza (Unifor), Janayde Gonçalves, aponta falhas no projeto: “Algumas das pesquisas que embasaram o diagnóstico da cidade apresentado no PMGIRS são muito antigas, até de 2003. Mas em dez anos a geração de lixo de uma cidade muda muito. Com o risco de um diagnóstico falho, também corremos o risco de recomendações pouco assertivas”.
diVulgação
Reciclar e educar é preciso Segundo a ACFOR, em material de apresentação do seu site oficial, “o destino inevitável do lixo é o aterro, mas a comunidade, através de seus governantes, deve decidir que proporção do lixo vai ser aterrada”. Assim, o desafio é envolver os dois lados da moeda na resolução do problema, tanto sociedade civil quanto associações de catadores, para que uma parcela cada vez menor dos resíduos chegue ao aterro, através da reciclagem e da adoção de hábitos que reduzam o volume de lixo gerado. Nesse sentido, o vereador João Alfredo aponta duas iniciativas fundamentais: “O que é preciso ser feito imediatamente é tirar os catadores dessa situação vergonhosa de indigência e dar condição de trabalho a eles. Também necessitamos de ações educativas, como, por exemplo, aproveitar o espaço de publicidade da Prefeitura não para falar de obras inauguradas, mas para conscientizar a população. Isso é que é o interesse público”. Dados do Instituto Municipal de Pesquisas, Administração e Recursos Humanos (IMPARH) indicam que o município de Fortaleza conta com cerca de 6.000 a 8.000 catadores de materiais recicláveis. Destes, apenas 367 trabalhavam nas 22 associações de catadores existentes na cidade, segundo cadastro de 2012 da Semam. A situação de miséria desta parcela da população que tem como única fonte de sobrevivência a busca de alimentos e de outros materiais do lixo contrapõe-se à cultura do desperdício instalada no Brasil, em especial nas grandes cidades, como Fortaleza. Com o lançamento de novos produtos no mercado e a publicidade se incumbindo de “criar” necessidades, foi gerado um sistema de produção e consumo indutor de desperdícios, com a substituição massificada de produtos duráveis por outros, descartáveis ou com vida útil muito curta.
João Alfredo: por melhores condições para os catadores.
Espelho premiado Exemplo bem sucedido de modelo é o da capital mineira, Belo Horizonte. A cidade não esperou ser obrigada por lei a ter um plano de gestão para os resíduos urbanos, e já em 1993 iniciou a sua implementação, através da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU), pelo qual foi reconhecida nacional e internacionalmente, tendo recebido vários prêmios. Além de inúmeras inovações tecnológicas, um elemento decisivo na empreitada foi a incorporação de componentes de caráter social e ambiental. Para isso, foi fundamental a mobilização da sociedade no sistema de limpeza urbana. Teatro de rua, dança, shows musicais e teatro de bonecos ajudaram a sensibilizar os moradores. “Tratava-se de revisar valores, princípios, comportamentos… Em outras palavras, o trabalho precisava enfrentar a enorme desconsideração da sociedade em relação à limpeza pública, principalmente no que se referia ao constante jogar lixo em vias públicas, lotes vagos e cursos d’água, e à depredação dos equipamentos destinados à sua coleta”, conta Fátima Abreu, engenheira civil com especialização em Saneamento pela UFMG e pós-graduação em gestão ambiental pela Universidade de Aberdeen, Escócia. CARIRI REVISTA 75
Catadores do descaso alheio A iniciativa de Belo Horizonte, já no início da década de 90, reflete o reconhecimento do lixo urbano como um dos mais graves problemas ambientais da atualidade, não só por seu alto potencial poluidor dos solos, da água e do ar, mas, também, pela sua relação com o esgotamento dos recursos naturais. Esta importância tem mantido em alerta não apenas o poder público. Tanto iniciativa privada quanto sociedade civil tem buscado soluções para o problema, mesmo que por meio de ações pontuais. A construtora cearense Mota Machado lançou recentemente um novo empreendimento, com a sustentabilidade como diferencial. Além de coleta seletiva, o condomínio terá ponto para aquecedores de água e gás e gerador de
energia eólica para uso em parte das áreas comuns. Outro exemplo é o Consciência Limpa, grupo de jovens voluntários que buscam conscientizar e educar os moradores e visitantes da cidade para a preservação dos parques e praias. O grupo realiza ações socioambientais, como mutirões de limpeza. “Sabemos que não vamos conseguir limpar a praia toda, e nem é esse o objetivo. Queremos chamar a atenção das pessoas contra o hábito de poluir”, explica Lucas Moreira, 18 anos, um dos idealizadores. Na descrição de sua Fan Page oficial do Facebook, eles deixam o recado: “Sou um só, mas ainda assim sou um. Não posso fazer tudo, mas posso fazer alguma coisa. E, por não poder fazer tudo, não me recusarei a fazer o pouco que posso” (Edward Everett Hale). rafael inácio
Fortaleza gera mais de 5 mil toneladas de lixo que exige destinação e tratamento
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#caririespaçocidades
práticas necessárias Por Isabela Bezerra
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a frágil condição em que o mundo se encontra, preocupar-se com o meio ambiente deixou de ser uma prática alternativa para se tornar uma prática necessária. Os prejuízos causados pela destinação inadequada dos resíduos sólidos (lixo) que produzimos afetam o bem estar social e a saúde pública, além de gerar grande desperdício econômico. Segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Brasil desperdiça aproximadamente R$10 bilhões por ano devido à ausência de políticas de gerenciamento adequadas, que visem o reaproveitamento do lixo reciclável. E é esta realidade que o MMA pretende transformar com a implantação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305/2010. Essa política tem por objetivo extinguir os lixões no Brasil até o final de 2014, sendo substituídos por aterros sani-
O QUE RECICLAR Papéis: todos os tipos são recicláveis, inclusive caixas do tipo longavida e de papelão. Não recicle papel com material orgânico, como caixas de pizza cheias de gordura, pontas de cigarro, fitas adesivas, fotografias, papéis sanitários e papel-carbono. Plásticos: 90% do lixo produzido no mundo é à base de plástico. Por isso, esse material merece uma atenção especial. Recicle sacos de supermercados, garrafas de refrigerante (PET), tampinhas e até brinquedos quebrados. Vidros: quando limpos e secos, todos são recicláveis, exceto lâmpadas, cristais, espelhos, vidros de automóveis ou temperados, cerâmicas e porcelanas. Metais: além de todos os tipos de latas de alumínio, é possível reciclar tampinhas, pregos e parafusos. Atenção: clipes, grampos, canos e esponjas de aço devem ficar de fora. Isopor: Ao contrário do que muita gente pensa, o isopor é reciclável. No entanto, esse processo não é economicamente viável. Por isso, é importante usar o isopor de diversas formas e evitar ao máximo o seu desperdício. Quando tiver que jogar fora, coloque na lata de plásticos. Algumas empresas o transformam em matéria-prima para blocos de construção civil. Informações do quadro: http://www.mma.gov.br/informma/ item/8521-como-e-porqu%C3%AA-separar-o-lixo
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tários. A partir deste período, a liberação de recursos da União estará condicionada à existência de planos estaduais e municipais de gestão de resíduos sólidos e de saneamento básico. Com os avanços da tecnologia, o lixo se transforma em energia. E o Brasil tem grande potencial neste segmento, devido à alta quantidade de lixo produzida. Hoje, 1.723 aterros sanitários estão espalhados pelo país e, somente eles, têm capacidade de gerar 280 megawatts de energia limpa a partir do aproveitamento do metano, gás expelido durante o processo de decomposição do lixo. Isso é energia suficiente para atender 1,5 milhão de pessoas. E, após 2014, com a implantação da Política Nacional de Residuos Sólidos e a transformação dos lixões em aterros sanitários, nossa capacidade de produção de energia a partir da decomposição do lixo será duas vezes maior. Outro exemplo da transformação do lixo foi a criação do asfalto ecológico, desenvolvido a partir de plástico reciclado. O novo material evita a emissão de carbono na atmosfera, minimizando o aquecimento global, e, diferente do asfalto convencional, o ecológico não precisa de alta temperatura para ser aplicado. A economia com o combustível utilizado é de 20%. A prefeitura de
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Aterro sanitário: terreno preparado para receber adequadamente os resíduos sólidos sem prejudicar o meio ambiente ou a população local. Existem 1.723 aterros sanitários no Brasil. Aterro controlado: área que está numa fase intermediária entre o aterro e o lixão. Normalmente é um antigo lixão que passou a receber preparação para tratar o lixo. Existem 1.130 aterros controlados no Brasil. Lixão: área que recebe resíduos sólidos sem nenhuma preparação para evitar consequências ambientais e sociais negativas. Existem 2.906 lixões no Brasil. Informações do quadro estão disponíveis http://www. brasil.gov.br/sobre/meio-ambiente/gestao-do-lixo/ aterros-sanitario
Vancouver (Canadá) passou a usar plástico reciclado para asfaltar as vias públicas, transformando-se em uma das metrópoles mais verdes do mundo. Mudar alguns hábitos e adquirir novas atitudes que envolvem responsabilidade ambiental geram grande impacto positivo na preservação do meio ambiente: separar o lixo, economizar água, diminuir a emissão de poluentes e comprar de maneira consciente e reciclar. Essas práticas desencadeiam grandes resultados. E o planeta agradece!
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#caririgastronomia
tratado básico sobre a ressaca: parte II Por Sérgio Pires [Ex-funcionário do Banco do Brasil, praticante de karatê e diretor responsável pela comunicação da ABS-DF, Associação Brasileira de Sommeliers. No momento elabora dois livros sobre vinho, devidamente engavetados ao lado da adega]
“Se o mal-estar precedesse a embriaguez, nós nos guardaríamos de beber em excesso. Mas o prazer, para enganar-nos, vai na frente e nos oculta seu séquito”. Michel de Montaigne
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ontinuando nosso estudo sobre a ressaca vamos falar, como prometido, sobre o antes, o durante e o depois do beber, sempre lembrando que beber bem,é beber com qualidade.
ANTES DE BEBER: 1. Comer Beber de barriga vazia é a pior idéia que se pode ter, o etanol estará sozinho e sem concorrência no processo de digestão. Com a sobrecarga de trabalho do estômago proporcionada pela comida, a entrada do álcool na corrente sanguínea será mais lenta, diminuindo a produção de acetaldeído. Os alimentos saudáveis, ricos em sal e gordura, estimulam a secreção de substâncias estomacais que protegem o estômago do álcool. São compatíveis com o álcool os queijos, nozes, castanhas e amendoim. Os carboidratos como arroz, massa ou pão integral e a carne vermelha ou branca. Há uma lenda de que o azeite criaria uma capa no estômago, dificultando a ab-
sorção do álcool. A verdade é que o azeite também é gordura, além de ser muito saudável. 2. Qualidade da bebida Quanto melhor a qualidade da bebida – e a certeza da sua origem – maior a chance de que ela não contenha substâncias estranhas ou algum tipo de álcool intoxicante desprezado no processo de destilação. 3. Tipo de bebida Existem bebidas que provocam ressacas maiores? Não. Mas há bebidas com teores de álcool mais elevados. No caso delas, o ataque ao organismo é mais rápido. Também há bebidas que levam em sua composição várias ervas ou que são feitas a partir de diferentes cereais. Vai que você é alérgico a algum desses componentes... Mas a regra geral é a quantidade de álcool que é ingerida. 4. Hidratação Chegue bem hidratado para beber, a desidratação causa muita dor de cabeça.
5. Cansado/descansado Esteja descansado, pois acumular estresse com falta de nutrientes só faz aumentar a ressaca. 6. Saúde Esta é fácil de entender. Se você vai sobrecarregar o fígado, que é o responsável pela eliminação do álcool, é bom que ele esteja em perfeito estado de funcionamento. Para prepará-lo e protegê-lo, precisaremos de vitaminas e minerais essenciais, como selênio, zinco e magnésio. Proteínas e gorduras monoinsaturadas, estas auxiliam na produção das enzimas que são fundamentais na manutenção do fígado. Portanto, uma dieta rica e variada com frutas e verduras, cereais integrais (pão, arroz, aveia), feijões, sementes e peixes. Além das fontes de gordura com os sempre presentes azeite de oliva e castanhas ou nozes. 7. Remédios para evitar ressaca Não queria citar marcas, mas como não lembrar da propaganda: “Um Engov antes CARIRI REVISTA 83
e outro depois”? Isso não evita a ressaca, apenas combate os sintomas. Dentre seus componentes estão o hidróxido de alumínio, que alivia os males digestivos; AAS, que é um analgésico e a cafeína, que contrai os vasos sanguíneos dilatados pelo álcool e, assim, diminui o mal-estar. Na verdade ainda não inventaram remédio algum que evite a ressaca. DURANTE A INGESTÃO DAS BEBIDAS: 1. Misturar bebidas Não há prova científica de que a ressaca é pior para quem mistura destilados e fermentados. Alguns especialistas dizem que a piora talvez tenha alguma relação com a forma como cada bebida é digerida pelo organismo. As que contêm carboidrato, como a cerveja e os espumantes, estimulam o corpo a absorver maior quantidade de álcool, e assim, ao se passar para o uísque ou a cachaça a absorção do álcool seria mais rápida. Mas o que acontece, com certeza científica, é que quem mistura bebidas acaba bebendo mais ainda. 2. Tipo de bebida Quem já teve muitas ressacas, de bebidas diferentes, acredita que os tipos de ressaca também foram diferentes – e já existem alguns estudos para corroborar esta sensação. Ficou constatado nestes estudos, difíceis e duros de serem realizados – mas alguém tem de se sacrificar pela ciência – que o alto consumo das bebidas escuras, como vinho, tequila, licores, uísque e conhaque, aumentam a frequência e a intensidade da ressaca. Já as bebidas claras, como rum, vodca e gim, tendem a causar menos efeitos. A explicação não poderia estar no teor alcoólico, mas sim na presença de substâncias processadas na fabricação das bebidas. 3. Hidratação O álcool desidrata, fazendo com que o corpo retenha líquidos. A água reidrata, dilui o álcool e facilita o trabalho dos rins e do fígado na remoção de toxinas. O álcool inibe a ação de um hormônio cha84 CARIRI REVISTA
mado antidiurético. Por isso, aumenta a produção de urina, facilitando a desidratação e a maior concentração de acetaldeído no corpo. A água é o remédio anti-ressaca mais prático e barato que existe. Precisamos ingerir mais líquidos sem álcool do que o habitual. O ideal é intercalar um copo d’água entre dois de bebida. Pode-se ingerir também suco ou refrigerantes, ambas as bebidas são ricas em carboidratos, que se transformam em energia e ajudam a metabolizar o álcool. 4. Comidas Como já foi dito aqui, beber de barriga vazia é a pior ideia que se pode ter, pois o álcool fica sem concorrência no processo de digestão. 5. Beber aos poucos/limite pessoal Beber espaçadamente dá tempo ao organismo de metabolizar o álcool ingerido. Da mesma forma, a produção de acetaldeído é mais lenta, dando tempo ao organismo de eliminá-lo e evitar sua maior concentração. Observar peso, tolerância pessoal ao álcool e sexo são variáveis importantes para determinar o limite de cada pessoa. Conheça os sinais que seu corpo lhe dá. 6. Mulheres Não é preconceito ou machismo, mas as mulheres são mais suscetíveis aos efeitos do álcool, ficando altas mais rápido e com menor quantidade de álcool do que os homens. Ao contrário dos homens, elas não têm um pouco da enzima álcool desidrogenase no estômago, que ajuda a metabolizar a bebida. As mulheres só possuem essa enzima no fígado. Mesmos as mulheres magras e saradas têm proporcionalmente mais gordura e menos água do que os homens no organismo. E como o álcool se distribui pela porção de água, ele se concentra mais fortemente no organismo das mulheres. 7. Coisas que aumentam o risco de ressaca Beber rapidamente, de estômago vazio, de maneira concentrada num curto período, é a “receita” perfeita para aumentar o risco de ressaca no dia seguinte. 8. Vomitar Vomitar para não ter ressaca é uma rou-
bada. Quando se vomita, há pouco álcool no estômago para pôr para fora. A maior parte já foi absorvida. O que se tem neste momento é muita secreção gástrica, que é ácida e dá o maior enjôo. Melhor apelar para os anti-ácidos. 9. Nicotina Dobradinha do mal, quanto mais nicotina, menos oxigênio no sangue e mais rápido se dá o processo de intoxicação. In jurubeba veritas: Entrevista com Xico Sá Nessa entrevista que não aconteceu, as perguntas foram formuladas para respostas encontradas nos textos do cronista. Você gosta de beber? Bebo para cacete e escrevo socialmente. Gosto do licor dos deuses, o vinho macerado da Solanum paniculatum, a rica fruta conhecida vulgarmente como jurubeba, a pinot noir de quem nasceu para beber, não para cheirar a rolha e degustar como uma freira. Qual a sua opinião sobre o novo hábito do brasileiro de beber vinho? Na minha velha opinião formada sobre vinhos, esse é o novo fetiche e arroto chique da pequeno burguesia brasuca. Como você classifica o apreciador do vinho? Não aprecio é o Homem-bouquet – aquele macho que entende de vinhos finos, abre a garrafa, cheira a rolha, balança na taça, sente o “bouquet” da bebida... O tipinho não perde um programa sobre vinho na tv a cabo, entra em sites franceses, reúne os amigos para encher o saco com o tal “bouquet”... Homem que entende e gosta mesmo de vinho não sai arrotando conhecimentos por ai, simplesmente aprecia e faz a sua linda bacante apreciar a bebida sem arrogância ou jequice. Vinho branco ou tinto? Vinho branco pra não manchar livro ou outras obras. Só os bêbados suportam os bêbados? Só os sóbrios suportam os sóbrios?
Os bêbados são anjos que vagam lindamente, é tanto que as crianças adoram os seus passos trôpegos e outras vadiagens. Dos sóbrios, não entendo patavinas, faz muito tempo que não sei o que seja essa forma chata de encarar o inferno terreno.” E as ressacas? O homem só é bom por inteiro quando está de ressaca. O homem de ressaca é perfeito. Não mente, não pula a cerca, é carinhoso e tântrico. Só na ressaca existe o homem. É neste estadão das coisas que a sua bondade se revela.
No dicionário está assim: epônimo – que dá ou empresta o seu nome a alguma coisa. Já o topônimo é nome ou expressão usado para nomear um lugar. Ficou fácil? Vamos a alguns epônimos comestíveis. O Conde Stroganov cedeu o nome de sua família para o estrogonofe, alguém escreveu errado e ficou. O carpaccio, aquela deliciosa carne crua fininha, foi criada no Harry’s Bar, em Veneza (depois conto uma história minha lá neste mesmo bar). Já o nome foi em homenagem ao pintor Vittore Carpaccio, que era conhecido por seus tons de vermelho vivo. No Rio de Janeiro foi criaEpônimos e topônimos, do o Filé à Osvaldo Aranha, em homenagem aposto que você já comeu ao político da primeira metade do século XX: ou bebeu um deles. filé mignon alto ou um contra filé, temperado Nossas conversas aqui neste espaço são, com alho fatiado, acompanhado de batatas no mínimo, gastronômicas, etílicas e cultu- portuguesas, arroz branco e farofa de ovos. rais. Então vamos falar de epônimos e topôPara beber um epônimo, do mesmo nimos, mas apenas daqueles que dão para Harry’s Bar em Veneza, um Bellini, famoso comer ou beber. pintor veneziense, que batizou o delicioso
coquetel de espumante com pêssego ou uma champagne Don Pérignon. Aceita um topônimo? Temos Bauru, laranja Bahia, Peru à brasileira, couve de Bruxelas, arroz à grega, queijo minas, presunto Parma, mostarda de Dijon e, para acompanhar, podemos pedir uma Cuba Libre ou um Samba em Berlim. Se preferir vinho temos, dentre outros, o Sauternes, o Madeira ou o Porto. São muitas mais as comidas e bebidas com nomes de gente ou de lugares. Preste atenção, logo você vai encontrar um epônimo ou um topônimo no seu copo ou no seu prato. Aprecie com moderação.quase licor obtido de uvas naturalmente congeladas nas parreiras. Feliz Natal e um feliz Ano Novo é o que desejo para todos.
Mande sugestões, brindes e comentários para esta coluna: sergiosvp@yahoo.com.br
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#caririviajantes
A PRIMEIRA VEZ EM JUAZEIRO
Por Eddie Cardoso [Ednaldo (Eddie) Cardoso, 23 anos, é estudante, cronista nas horas vagas e pretende cursar jornalismo. Mantém o blog Móbile Literal (mobileliteral.wordpress. com) sobre literatura, cinema e cultura. Mora em Teresina (PI), mas é apaixonado por Juazeiro do Norte.]
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primeira vez que viajei para Juazeiro do Norte foi em 2003, aos 13 anos de idade. Não foi uma viagem programada, só fui porque meu avô faleceu e “herdei” a passagem dele. Não estava nem um pouco ansioso para conhecer a cidade, estava mesmo era com vontade de, pela primeira vez, sair do meu estado, o Piauí. Lembro que uma semana antes, quando começaram as histórias sobre os locais e as pessoas do lugar para onde íamos, é que senti um pouco de curiosidade, pois não paravam de falar no quanto era bom viajar em pau-de-arara. A semana passou lentamente — a sensação que dá em pré-viagem —, e no dia 18 de outubro, às oito horas da manhã, subi naquele caminhão com bancos de madeira, cheio de idosos, adolescentes e crianças. Não vi graça alguma em um pau-de-arara. Para não ser injusto, o que gostei mesmo foi daquele cheiro de lona queimada pelo sol (que, apesar da hora, já estava pelando)
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– que chamo de cheiro de circo. Antes de seguir viagem tivemos que parar em outros bairros para pegar mais pessoas. Quando todos os lugares já estavam ocupados — e minhas costas já ameaçavam doer — seguimos para a tal cidade. Não demorou muito e comecei a entender porque era tão bom viajar em pau-de-arara. Todos se conheciam, sorriam, conversavam; alguém começava uma cantoria tímida, chamada bendito, e os outros acompanhavam, principalmente as crianças. Um terço começava a ser rezado, alguns ajudavam dizendo os mistérios; uma piada era dita no meio do caminhão, e ia passando de fileira em fileira até que todos estivessem sorrindo da mesma coisa. Um bebê começava a se esgoelar, palpites do motivo do choro não faltavam; bolos e frutas eram distribuídos. Era uma família, durante uma semana inteira. E eu, indo pela primeira vez, já me sentia parte dela. A estrada é longa, horas e horas de
viagem. Quando passou toda a algazarra do começo, o aperto de mãos, as boas vindas, veio a monotonia; o mesmo cenário sempre, o mato seco — raramente uma árvore viva se destacava , serras altíssimas, cidadelas isoladas do mundo, animais na pista, pessoas a pé, outras montadas em bicicletas, solitárias na estrada, caminhões de carga, ônibus e outros paus-de-arara. O único passatempo era contar as placas e decorar os nomes das cidades deixadas para trás — e encarar seus moradores, que olhavam estranhamente para nós; alguns até davam tchau. Também era nessa hora que toalhas e camisas serviam como uma barreira contra o sol, penduradas nas laterais do caminhão — amarradas na cobertura —, ou cobrindo rostos. Durante o percurso passávamos por vários postos da policia rodoviária, e vinha aquela tensão do pau-de-arara ser parado e impedido de continuar. Mas não fomos parados. Os únicos lugares em que
ilustração: tarsila krüse
descíamos eram os postos de gasolina — quando pratos, vasilhas, colheres e copos eram retirados de dentro de sacolas— e acostamentos. Após um intervalo para o almoço, retornávamos para a estrada, vinha o sono, os menores conseguiam se enfiar de baixo dos bancos e os mais velhos cochilavam sentados. Eu estava bem na beirada, arranjei um travesseiro, sentei em cima e fiquei olhando para aquela linha branca, reta, no meio da estrada, que não chegava a lugar nenhum. O restante da viagem foi desse jeito, até que paramos em um posto, já saindo do Piauí e chegando ao Ceará “Quem tiver algo pra fazer, faça agora. Vamos parar agora só em Juazeiro!”, disse o motorista. Seis horas da tarde. Ainda faltava um bom pedaço para a tal cidade. Com a chegada da noite — e do frio —, éramos guiados por uma enorme lua brilhante; talvez essa seja a luminária que um dos benditos falava. O caminhão ainda parou em mais dois postos. Para loucura do
motorista, em um deles foi cogitada a janta, mas, por unanimidade, escolheram “jantar só na terra do padrinho”. Horas depois, às nove da noite, quando alguém disse: “Serra do Crato!”, misteriosamente, todo mundo se ajeitou nos bancos. Mas ninguém ficou alegre, cantou, rezou. Todos estavam com o medo estampado na cara. Não entendi nada — só depois me contaram como é perigoso descer ali. Mas nem me importei, continuei olhando para as poucas casas que apareciam durante a descida. Como eu estava no lado esquerdo, só vi um vulto amarelo, mas logo em seguida fui despertado pelos gritos e hipnotizado pelas luzes lá embaixo. A vista durou poucos segundos, mas os poucos segundos foram necessários para me deixar de boca aberta: as cidades de Juazeiro e Crato fundidas e reduzidas a milhares de luzes — grandes e pequenas. Todas as dificuldades da estrada foram recompensadas com aquela visão. Dava para ver
que centenas de outros caminhões e ônibus entravam na cidade. Não existia mais medo de descer a ladeira, medo de cair no abismo. A alegria estava presente naquele espaço. Mais emocionante que isso foi ver a estátua lá no Horto, um ponto branco, iluminado. Se eu, que vi pela primeira vez, fiquei encantado com o espetáculo de luzes, imagina Padre Cícero, no ponto mais alto da cidade, olhando para aquilo todos os dias? Admirando o seu maior milagre, Juazeiro do Norte? Deve se encher de orgulho. Essa foi a primeira visão que tive de Juazeiro, e da qual sempre me lembro, do nada. Mesmo agora, quase dez anos depois, é como se fosse ontem. Ao entrar na cidade fomos recebidos com uma barulheira; buzinas e gritos. A quantidade de crianças era assustadora — romeirinhos, encarregados de continuar a tradição. Se existir algo mais bonito que essa recepção, nem quero experimentar. Não sei se meu coração aguenta. CARIRI REVISTA 87
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#caririespecial
“De Chapéu na mão, na cabeça e no coração.” Por Jari Vieira
Jari Vieira nasceu em Juazeiro do Norte. É fotógrafo publicitário, professor e documentarista. Desenvolve desde 2002 trabalhos de pesquisa e extensão sobre fotografia artística, jornalística e etnográfica, além de vídeos documentários sobre o interior do estado do Ceará, com foco na região do Cariri.
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