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Conselho Científico Presidente do Conselho Cientíico

Profa Dra Regina Helena Medeiros UCS - Universidade de Caxias do Sul

EXPEDIENTE Editora: Lisiane Palau Azevedo Editora Cientíica: Regina Medeiros Assistente Editorial: Gilberto Dias de Azevedo gilberto@moriaeditora.com.br Produção: Álvaro Lopes (Publikmais) contato@publikmais.com.br Revisão de Português: Suliani Editograia Vendas: moriaeditora@gmail.com (51) 3351-2361 / 3334-4753 Revista Sul-Brasileira de Enfermagem é um periódico cientíico, cultural e proissional bimestralmente lido por 5.000 proissionais de enfermagem. A Revista Sul-Brasileira de Enfermagem não aceita matéria paga em seu espaço editorial. Circulação: em todo território nacional. Seis números anuais: janeiro/fevereiro, março/ abril, maio/junho, julho/agosto, setembro/outubro e novembro/dezembro. Data da Impressão: Dezembro / 2011. Correspondência: Moriá Editora Ltda. Rua Aracy Fróes, 258 / 902 Jardim Itu Sabará - Porto Alegre/ RS CEP: 91.210-230 Tels.: (51) 9116.9298 / (51) 3334.4753. E-mail: revistasulbrasileira@gmail.com Números avulsos: R$ 40,00 Periodicidade: Bimestral Distribuição: Via Correios Revista Sul-Brasileira de Enfermagem reservase todos os direitos, inclusive os de tradução, em todos os países signatários da Convenção PanAmericana e da Convenção Internacional sobre Direitos Autorais. Os trabalhos publicados terão seus direitos autorais resguardados pela Moriá Editora que, em qualquer situação, agirá como detentora dos mesmos. A Revista Sul-Brasileira de Enfermagem é uma publicação bimestral. Publica trabalhos originais das diferentes áreas da Enfermagem, Saúde e áreas ains, como resultados de pesquisas, artigos de relexão, relato de experiências e discussão de temas atuais.

ISSN 2236-0417

Profa Doutoranda Adriana Aparecida Paz UFCSPA - Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre

Profa Dra Maria da Graça de Oliveira Crossetti UFRGS - Universidade Federal do RS

Profª Drª Ana Elizabeth Figueiredo PUC/RS

Profª Doutoranda Maria Ligia dos Reis Bellaguarda Univali/SC

Prof. Dr. Ari Nunes Assunção Unisc – Universidade de Santa Cruz do Sul Profa Dra Beatriz Regina Lara dos Santos PUC-RS Profa Dra Dulcinéia Ghizoni Schneider Unisul /SC Profa Dra Erica Rosalba Mallmann Duarte UFRGS - Universidade Federal do RS Profa MS Graziella Gasparotto Baiocco Grupo Hospitalar Conceição Profa Doutoranda Iride Cristofoli Caberlon Ulbra - Universidade Luterana do Brasil-Gravataí Profª Drª Juliana Vieira De Araújo Sandri Univali - Universidade do Vale do Itajaí /SC Profª Drª Laura Cristina S. Lisboa de Souza UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina Profa Dra Lisia Maria Fenstersefer Unisinos - Universidade do Vale do Rio dos Sinos

Profa Dra Marlene Gomes Terra UFSM – Universidade Federal de Santa Maria Profa Dra Nara Marilene Oliveira Giradon Perlini UFSM- Universidade Federal de Santa Maria Profa Doutoranda Nára Selaimen G. de Azeredo Grupo Hospitalar Conceição - Porto Alegre/RS Profa Dra Nilva Lúcia Rech Stedile UCS – Universidade de Caxias do Sul Profa Dra Regina Gema Santini Costenaro Unifra - Centro Universitário Franciscano Profa Dra Rita Catalina Aquino Caregnato Ulbra - Universidade Luterana do Brasil Profa Dra Roseana Maria Medeiros Faculdade da Serra Gaucha /RS Profa Dra Sandra Maria Cezar Leal Unisinos - Universidade do Vale do Rio dos Sinos Enfa Estomaterapeuta Silvana Janning Prazeres SOBEST – RS

Prof Doutoranda Lisnéia Fabiani Bock IPA - Rede Metodista de Educação do Sul a

Profa Dra Luzia Fernandes Milão Ulbra - Universidade Luterana do Brasil Profa Doutoranda Magada Tessman Schwalm Unesc /SC Profa Dra Maira Buss Thofehrn UFPel -Universidade Federal de Pelotas

Profa Dra Solange Machado Guimarães Ulbra - Universidade Luterana do Brasil Profa Dra Sonara Lucia Estima Unilasalle - Centro Universitário La Salle Profa Dra Sonia Beatriz Cocaro Souza UFRGS - Universidade Federal do RS Profa MS Terezinha Valduga Cardoso

Prof. Doutorando Marcio Neres dos Santos Grupo Hospitalar Conceição – Porto Alegre - RS

Ulbra - Universidade Luterana do Brasil IAHCS Instituto de Administração Hospitalar e Ciências da Saúde

Profa Doutoranda Maritê Inez Argenta Faculdade Estácio de Sá/SC

Profa MS Vera Lucia Fortunato Fortes UPF - Universidade de Passo Fundo

Profa Dra Maria Bettina Camargo Bub UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

Ficha Catalográfica R 454 Revista Sul-Brasileira de Enfermagem. - Vol. 1, nº 1(março/abril. 2011). Porto Alegre: Moriá Editora Ltda., 2011. -V. Bimestral ISSN 2236-0417 1. Enfermagem-Periódicos NLM WY 1 Bibliotecária Responsável – Maria Laura Martins Scheidemandel CRB10-581

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Sumário Página 03

Editorial Artigos

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Acompanhante no trabalho de parto e parto: a opinião dos proissionais de saúde do Centro Obstétrico Sitter in labor and delivery: a view of health center of obstetric Leodania Aparecida Américo, Ioná Vieira Bez Birolo, Suzane Raquel Périco, Luciana Rosa, Simoni Leal Justo

Página 09

Anemia na doença renal crônica Anemia in chronic kidney disease Bruna Pescador Mendonça, Luciana Rosa, Luciane Bisognin Ceretta, Karina Gulbis Zimmermann, Maria Teresa Brasil Zanini, Andreia Batista Bialeski

Página 14

A equipe de saúde em missão humanitária no Estado de Alagoas: relato de experiência The team of healthcare in humanitarian mission in Alagoas: experience story Márcio Haubert da Silva, Moema do Nascimento Ferreira, Maria Renita Burg Figueiredo

Página 21

Expectativas de pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico em um hospital de grande porte do Município de Porto Alegre – RS Expectations of patients with chronic renal failure under hemodialysis in a large hospital in the municipality Porto Alegre – RS Fabiane Regina dos Santos, Graziella Gasparotto Baiocco, Maria Cristina Sant’Ana da Silva

Página 26

Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem Adverse events in Intensive Care Unit: behavior assessment of a nursing team Rochelle Soares Cruz, Rita Catalina Aquino Caregnato

Página 31

Modelo de Gestão em Enfermagem : Hospital Nossa Senhora da Conceição Contextualizando a inserção da enfermagem na construção de um modelo de gestão para o Hospital Nossa Senhora da Conceição, Porto Alegre/RS. Márcio Neres dos Santos, Carine Paim da Silva Martins, Christian Negeliskii

Página 35

Normas para publicação

Página 38

Atualização em Terapia Intensiva – Aula 5: Ventilação Mecânica

Página 47

Notícias

Página 49

Eventos Cientíicos

ERRATAS No artigo intitulado “Solução Salina Hipertônica: revisão integrativa”, publicado na edição de setembro/outubro de 2011, no quadro 1, na pesquisa de Braz LG, Cequeira JR, Viana PTG, Vane LA (2001), onde lê-se nível de evidência IV leia-se VI No sumário publicado na edição de setembro/outubro no artigo intitulado “NEPEnf –Núcleo de Educação Permanente e Pesquisa em Enfermagem: Construindo Práticas Educativas e Processos de Trabalho a autoria correta é atribuída a Maria Augusta Moraes Soares ,Susana Maria Endres e Lisnéia Fabiani Bock, conforme consta na pagina 13 da mesma edição

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Editorial Parece mentira, mas nem bem começamos nossa jornada e o ano já se foi, mas desta vez o ele se encerra de maneira diferente em nossas vidas: ao olharmos para trás, percebemos que algo mudou, temos a sensação de dever cumprido, de sonho realizado; ao olharmos para frente, vemos uma longa jornada a ser prosseguida. Vislumbramos também infinitas possibilidades de crescimento em nosso caminho. Estamos cheios de ideias que nos estimulam no percurso. Uma delas é que a partir desta edição estaremos divulgando o modelo de gestão em enfermagem de diversas instituições de saúde para que os gestores possam compartilhar com seus colegas de profissão ideias que com certeza contribuirão para o enriquecimento e aprimoramento desta preciosa área de atuação. Com isso a saúde ganha mais qualidade. Optamos por começar pelo Grupo Hospitalar Conceição, por ser uma instituição de referência no Estado do Rio Grande do Sul e por acreditarmos ser um modelo a ser seguido, pois gerir uma instituição deste porte é um desafio diário. Agora temos pela frente desafios maiores. Entramos no mercado editorial cientifico e percebemos que a vontade de aprender mais e mais e de compartilhar o aprendizado a cada dia impulsiona os profissionais de enfermagem na busca do conhecimento.

Durante esse período nos aproximamos de profissionais que só conhecíamos de um contato profissional ou de ouvir falar em suas habilidades e percebermos a dimensão do seu conhecimento e ao mesmo tempo vimos o que realmente envolve o cuidar em enfermagem. É contagiante ver como esses mestres e doutores trabalham incansavelmente em busca da pesquisa e do conhecimento, e sempre com um sorriso no rosto, como se estivessem de férias, mesmo quando estão sobrecarregados pelas horas de trabalho e de dedicação às suas atividades profissionais. Como não poderia deixar de ser, queremos agradecer àqueles que tornaram possível a realização de nosso sonho e que agora estão sonhando junto conosco. O qualificado Conselho Editorial de nossa revista tem dedicado muito do seu tempo em correções, leituras e sugestões de aprimoramento a fim de aprimorarmos a qualidade cientifica de nossa Revista Sul-Brasileira de Enfermagem. Nosso muito obrigado a todos os que acreditaram neste sonho e que de uma maneira ou de outra têm contribuído com nosso trabalho. Esperamos retribuir à altura de suas expectativas para crescermos juntos. Estamos abertos a criticas, sugestões e colaborações; afinal, somos cada dia mais apaixonados pelos profissionais de enfermagem.

Gilberto e Lisiane editores

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ACOMPANHANTE NO TRABALHO DE PARTO E PARTO: A OPINIÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE DO CENTRO OBSTÉTRICO Sitter in labor and delivery: a view of health center of obstetric * Leodania Aparecida Américo ** Ioná Vieira Bez Birolo *** Suzane Raquel Périco

**** Luciana Rosa ***** Simoni Leal Justo

Resumo – Trata-se de um estudo com abordagem qualitativa do tipo descritivo que teve como objetivo geral identificar a opinião dos profissionais do Centro Obstétrico quanto à inserção do acompanhante durante o trabalho de parto e parto. Esta pesquisa foi desenvolvida em um Centro Obstétrico de um hospital do extremo sul catarinense com o universo de trabalhadores da equipe de saúde de todos os turnos do centro obstétrico. Utilizou-se para coletar os dados a entrevista semiestruturada e a observação sistemática. Resultados: arquitetura antiga, falta de espaço físico, falta de orientação aos acompanhantes quanto à legislação e às rotinas são fatores que mais dificultam a boa evolução do trabalho de parto e parto.

Palavras-chave: Acompanhante; enfermagem; parto. Abstract – It is a study with a descriptive qualitative approach that aimed at identifying the views of professionals in the obstetric center regarding the inclusion of companion during labor and delivery. This study was conducted in an obstetric center of a Deep South Santa Catarina Hospital with all the workers of the health team for all shifts in the obstetric ward. We used to collect data to semi-structured interviews and systematic observation. Results: ancient architecture, lack of physical space, lack of guidance from companions and law, are factors that hinder the smooth progress of labor and birth. Keywords: Companion; Nurse; Childbirth.

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Introdução Após a II Guerra Mundial, devido às altas taxas de mortalidade materna e infantil provenientes de partos ocorridos em ambiente domiciliar assistidos por parteiras, esses procedimentos foram institucionalizados e passa-ram para hospitalares e realizados por profissionais com formação específica. Com isso, ocorreu o afastamento familiar do processo de nascimento, pois a estrutura física e as rotinas hospitalares foram planejadas para atender às necessidades da equipe de saúde e não das parturientes. Em geral, as parturientes ficavam internadas em salas de pré-parto coletivas sem nenhuma privacidade e com assistência baseada em normas e rotinas preestabelecidas, impossibilitando a presença de uma pessoa de seu convívio social para apoiá-las1. Diante dessas mudanças, faz-se necessário fornecer à parturiente adequado suporte intraparto, caracterizado por apoio emocional, físico, informacional e clínico, proporcionando maior segurança e tranquilidade. Esse suporte é uma das principais ações para a prestação de uma assistência humanizada. O acom-panhante passa a ser um colaborador, um aliado da equipe de enfermagem, já que nem sempre o enfermeiro tem disponibilidade de tempo nem conhece suficientemente a paciente para proporcionar-lhe apoio emocional apropriado; neste sentido, a exposição do acompanhante proporciona maior alcance ao cuidado, pois acrescenta a observação e a interlocução das suas necessidades2. Humanizar a assistência de enfermagem materno-infantil é de vital importância, porque garante à mulher

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o acesso ao pré-natal, assegurando-lhe uma assistência digna, uma gravidez segura e saudável, com as informações necessárias para que possa escolher com tranquilidade o local, o tipo de parto, o profissional que a assistirá, o acompanhante, a posição de parição, entre outras escolhas, respeitando e informando os familiares em todo esse processo3.

OBJETIVO O objetivo principal deste trabalho foi identificar a opinião dos profissionais do Centro Obstétrico quanto à inserção do acompanhante durante o trabalho de parto e parto em um hospital da região sul de Santa Catarina.

REVISÃO DE LITER ATUR A Os primeiros programas de atenção, então denominados materno-infantis, traziam uma visão limitada sobre a mulher, baseada apenas em sua especificidade biológica e no papel social de ser mãe, com ações que enfocavam a atenção na gravidez e no parto1. Como revolução desse paradigma, surge, em 1984, o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM), o qual traz o conceito de assistência integral. Em 2000, baseado nas análises das necessidades de atenção específica à gestante, ao recém-nascido e à mulher no período pós-parto, foi instituído o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento (PHPN). Com

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MÉTODO Trata-se de um estudo de cunho qualitativo, do tipo descritivo. A pesquisa foi desenvolvida em um Centro Obstétrico de um hospital do Extremo Sul Catarinense com o universo de trabalhadores da equipe de saúde de todos os turnos do centro obstétrico. A equipe é composta por uma enfermeira, sete médicos obstetras e nove técnicos de enfermagem. Para seleção dos mesmos, utilizaram-se como critérios de inclusão ser maior de 18 anos, trabalhar no Centro Obstétrico como enfermeiro, técnico de enfermagem ou médico obstetra, não ser autor desta pesquisa e aceitar participar da pesquisa por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Utilizou-se como instrumento de coleta de dados entrevista semiestruturada, a fim de possibilitar que cada pesquisado expressasse abertamente sua percepção em relação à permanência do acompanhante durante o trabalho de parto e parto. As entrevistas foram realizadas individualmente. Utilizou-se também a observação sistemática para averiguar se a estrutura física da instituição hospitalar comporta o acompanhante. Para tal, utilizou-se a RDC 50. A análise foi feita por meio das informações coletadas com os profissionais de saúde trabalhadores do Centro Obstétrico. Para tal, utilizou-se a técnica de análise simples de conteúdo. Inicialmente organizaram-se os dados por temas abordados e fez-se leitura exaustiva dos mesmos, para em seguida interpretá-los e embasá-los à luz das referências disponíveis sobre cada assunto. Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da Unesc (Parecer 26/4/2011).

RESULTADOS E DISCUSSÃO Os participantes da pesquisa têm idade entre 22 e 68 anos. Participaram cinco médicos, um enfermeiro e onze técnicos de enfermagem, com de 3 a 29 anos de profissão. Os médicos têm Residência em Ginecologia e Obstetrícia, e um possui Mestrado em Ciências da Saúde. Os profissionais da equipe de enfermagem têm o ensino médio e a enfermeira é pós-graduada em Obstetrícia e Geriatria. Dos participantes, cinco trabalham em outros centros obstétricos. Quanto às orientações sobre a permanência do acompanhante durante o trabalho de parto e parto, 5 profissionais afirmaram ter tido esta informação durante a formação e 12 não a tiveram, sendo que, depois da formação, 10 afirmaram ter tido conhecimento do assunto e 7 não tiveram informações quanto à presença do acompanhante durante o trabalho de parto e parto. Alguns participantes desta pesquisa entendem a presença do acompanhante como vantajosa, uma vez que este tranquiliza, incentiva, conforta, estimula, diminui o temor, confere segurança e disposição para a parturiente e pode facilitar o desenvolvimento do trabalho de parto, como ilustram as falas a seguir: No momento tão importante em sua vida. E muito importante para que a gestante se sinta

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isso, o Ministério da Saúde buscou reduzir as altas taxas de morbidade e mortalidade materna e perinatal, procurando assegurar o acesso, a melhoria da cobertura e da qualidade do acompanhamento pré-natal, da assistência ao parto e puerpério4. O Programa fundamentou-se no direito à humanização da assistência obstétrica e neonatal, compreendendo dois aspectos fundamentais referindo-se: o primeiro, ao dever das unidades de saúde receber com dignidade a mulher, seus familiares e o recém-nascido; o segundo, à adoção de medidas e procedimentos sabidamente benéficos para o acompanhamento do parto e do nascimento, evitando práticas intervencionistas desnecessárias5. A fim de garantir um acompanhamento adequado às mulheres inseridas no Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento, foi desenvolvido, pelo Ministério da Saúde, o Sistema de Informação do Pré-Natal (SISPRENATAL), permitindo o acompanhamento das gestantes, desde o início da gravidez até a consulta de puerpério6. Ainda na perspectiva da humanização do parto e nascimento, em 7 de abril de 2005 foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei 11.108, que garante às parturientes o direito à presença de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do SUS5. A gestação, apesar de ser um processo fisiológico, gera mudanças de ordem física, psicológica e so-cial na mulher. Portanto, a gestante necessita de acom-panhamento qualificado para que complicações sejam prevenidas. Dentro dessa perspectiva se insere o acompanhamento pré-natal, que tem como finalidade acolher a mulher desde o início da gravidez, assegurando, ao final da gestação, o nascimento de uma criança saudável e a garantia do bem-estar materno e neonatal7. O acolhimento se configura na recepção do usuário, desde sua chegada, responsabilizando-se integralmente por ele, ouvindo sua queixa, permitindo que ele expresse suas preocupações, angústias e, ao mesmo tempo, colocando os limites necessários, garantindo atenção resolutiva e articulação com outros serviços de saúde para a continuidade da assistência quando necessária8. Nesse contexto, o pai/acompanhante deverá ter suas dúvidas esclarecidas sobre a gravidez, sobre o relacionamento com a mulher e sobre os cuidados com o bebê. Ele não é apenas acompanhante; é também o pai do bebê que vai nascer9. O parto humanizado é aquele que visa oferecer à mãe a melhor assistência do ponto de vista humano, além de evitar medicalização e instrumentação desne-cessárias. Hoje, existem evidências científicas de que o parto humanizado é ideal tanto para mãe quanto para o recém-nascido10. A presença do acompanhante proporciona bem-estar físico e emocional à mulher e favorece uma boa evolução no período gravídico-puerperal2.

Artigo de Reflexão

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Acompanhante no trabalho de parto e parto: a opinião dos profissionais de saúde do Centro Obstétrico


mais segura. (P10) Penso ser uma boa conduta para realizar atendimento ao parto de maneira humanizada. (P17) O suporte intraparto consiste em uma das principais ações para a prestação de uma assistência humanizada, e o acompanhante colabora para tal, é um aliado do quadro de enfermagem, já que o enfermeiro enfrenta restrições de tempo para um apoio emocional apropriado. A exposição do acompanhante proporciona mais qualidade ao cuidado, pois, acrescenta a obser-vação e a interlocução das suas necessidades2. A presença do acompanhante foi entendida também como fator protetor para a equipe, no sentido de que o familiar estará observando o empenho da mesma para o bom andamento do processo de parto, conferindo o empenho da equipe, o que faz com que ela trabalhe de forma mais segura, como ilustram as falas a seguir: Desenvolvimento do parto; parturiente mais tranquila; deixa a equipe trabalhar mais segura e solta sabendo que a parturiente está sendo assistida por familiares e estes vendo nossa forma de trabalho. (P2)

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A grande maioria tranquiliza as pacientes, visualizam os procedimentos executados e compreendem a situação. (P09) Estudos realizados em maternidades que permitem rotineiramente a presença do acompanhante indicam que os profissionais passam a considerar essa prática benéfica após a vivência da mesma. Além disso, os profissionais referiram que a experiência era positiva com o acompanhante para fortalecer a equipe e melhorar a compreensão das necessidades da parturiente e seus familiares2. Outros participantes chamaram atenção ainda para o fato de as parturientes geralmente preferirem mulheres para acompanhá-las. A Organização Mundial de Saúde recomenda que a escolha do acompanhante deva ser feita pela mulher, pois assim haverá garantia que ela estará acompanhada por alguém da sua confiança, com a qual se sentirá mais à vontade11. Os participantes entendem a presença do acom-panhante como positiva, porém, um deles cogita a pos-sibilidade de a parturiente se aproveitar de tal situação para demonstrar mais carência, afirmando que, com a presença do acompanhante, conseguirá alguma vantagem, como ilustra a fala a seguir: Para algumas pacientes é bom, pois se sentem confiantes e seguras desencadeando assim um bom trabalho de parto. Porem tem pacientes que usa o acompanhante fazendo manha. (P08) Os aspectos negativos percebidos pelos profissionais de saúde quanto à presença do acompanhante referem-se a um possível comportamento inadequado das partu-

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rientes. Algumas ficaram mais dengosas, mimadas e desestabilizadas por acharem que o acompanhante era a “salvação”, quando estavam cansadas, e pen-savam que não aguentariam até o final do trabalho de parto. Por outro lado, discutem este tema relatando que os profissionais, em geral, esperam da parturiente um comportamento adequado, de passividade, resignação e aceitação das circunstâncias, inerente ao modelo de assistência centrado na conveniência do profissional de saúde e da instituição, e não nas necessidades da mulher2. Emergiu dos dados também a concepção de que a presença do acompanhante é positiva, porém com algumas restrições, como falta de orientação e preparo do acompanhante durante o pré-natal, como ilustra a fala a seguir: “Penso ser muito positivo para o paciente porem o acompanhante deve ser preparado em como se comportar dentro da sala de pré-parto e parto.” (P4) Considera-se também suporte a presença de uma pessoa designada para desenvolver atividades de apoio, que contemplem aspectos emocionais (como encorajar, tranquilizar e estimular) assim como medidas de conforto e orientações. Desta forma é necessário que o acompanhante designado para dar suporte à parturiente tenha recebido orientações adequadas para tal12. Surgiram dos dados percepções negativas quanto à presença do acompanhante, como quando este interfere na conduta profissional da equipe, impedindo que o trabalho de parto transcorra bem, deixando a paciente e toda equipe vulnerável e tensa, como ilustram as falas a seguir: Familiares despreparados, sem nenhuma orientação, tentam interferir na conduta mé-dica. (P7) Normalmente acompanhantes tentam se intrometer na conduta médica, o que gera desentendimento. (P16) No Brasil, o Ministério da Saúde reconhece os benefícios e a ausência de riscos associados à inserção do acompanhante e recomenda que todos os esforços devem ser realizados para garantir que toda parturiente tenha uma pessoa de sua escolha para encorajá-la e dar-lhe conforto durante todo o processo do nascimento. Mesmo antes dessa recomendação, algumas maternidades permitiam a presença do acompanhante de escolha da parturiente durante o processo do nascimento. Entretanto, em muitos serviços, essa prática ainda não é adotada5. Outra questão levantada pelos pesquisados foi que a presença do acompanhante era negativa com relação a momentos de urgência e emergência obstétrica. Neste momento, a equipe precisa de espaço físico, concentração, agilidade e destreza para efetuar as técnicas cabíveis a determinadas situações, nestes casos, o acompanhante pode interferir negativamente na agili-

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Acompanhante no trabalho de parto e parto: a opinião dos profissionais de saúde do Centro Obstétrico


Acompanhante no trabalho de parto e parto: a opinião dos profissionais de saúde do Centro Obstétrico

A presença do acompanhante é positiva praticamente em todos os momentos, com exceção nas emergências como as intercorrências durante o trabalho de parto. (P10) Nos casos de urgência obstétrica em que é necessário trabalho em equipe, a presença do acompanhante atrapalha o serviço. (P17) Emergiu outro ponto negativo, quanto à inserção dos acompanhantes. Os profissionais citaram o despreparo da equipe de saúde hospitalar, não atendendo assim às necessidades das parturientes e acompanhantes. Observe as falas a seguir:

O despreparo de ambos, despreparo da equipe para atender às necessidades destas pessoas. (P13) Os benefícios da presença do(a) acompanhante já foram comprovados. Gestantes que tiveram a presença de acompanhantes se sentiram mais seguras e confiantes durante o parto, reduzindo o uso de medicações para alívio da dor, a duração do trabalho de parto e o número de cesáreas; além disso, alguns estudos sugerem a possibilidade de outros efeitos, como a redução dos casos de depressão pós-parto13. Quando questionado aos pesquisados sobre suas possíveis colaborações para o bom acolhimento do acompanhante, dos participantes obtiveram-se respostas semelhantes. Veja os relatos abaixo: Esclarecendo suas duvidas, passando orienta-ções que contribuam para a evolução da paciente durante seu período de trabalho de parto. Estabelecer um ambiente confortável. (P8) Acolhendo o acompanhante, explicando a ele tudo o que vai ser realizado, tentar fazer uma maior aproximação entre familiar e médicos para saberem sobre as condutas. (P9) Considera-se o apoio emocional uma atividade a ser realizada entre equipe de saúde e acompanhante, sendo que o acompanhante pode ser uma figura de apoio, considerando, entretanto, suas possibilidades e seus conhecimentos. Nesse sentido, cabe à equipe de enfermagem oferecer orientação à parturiente e ao acompanhante, informá-los sobre o desenvolvimento do parto e os procedimentos médico-hospitalares, sanar dúvidas e estar atenta às necessidades do par; enfim, estar disponível física e emocionalmente para ambos, propiciando um ambiente em que a parturiente desfrute de apoio emocional e físico14.

Em um determinado caso, o acompanhante [esposo], esteve presente desde o começo do trabalho de parto. Uma pessoa calma, comunicativa, esclarecida e bem companheiro da paciente, passou o tempo todo dando bons conselhos e apoio. Na hora do parto, mostrou-se bem forte, encorajando sua esposa. Ele teve a oportunidade de cortar o cordão umbilical com a autorização do doutor e direito a muitas fotos lindas e emocionantes. (P8) O apoio fornecido pelos acompanhantes gera sentimentos positivos nas parturientes, tornando-as mais seguras e colaborativas. Isto é, a presença do acompanhante escolhido pela parturiente é incentivada pela equipe de profissionais por considerá-la uma fonte segura de suporte emocional e apoio na facilitação do trabalho de parto14. Surgiram dos dados considerações sobre as características estruturais da instituição que facilitassem ter um acompanhante. Os participantes responderam que, quanto a este assunto, não há nada que facilite. Constatou-se que o setor em estudo apresenta limitações com relação ao atendimento com acompanhante, pois o espaço físico não proporciona conforto e privacidade. Ressalta-se ainda que a paciente não pode optar por um acompanhante do gênero masculino para não expor a outra parturiente que divide o mesmo espaço. As respostas dos participantes deste estudo sobre a estrutura física da instituição foram todas negativas. Os participantes enfatizam que o espaço físico é pequeno para atender à demanda e não favorece a privacidade, fazendo com que as mesmas permaneçam restritas ao leito. Quartos pequenos, sem condições de acomodar um acompanhante, não tem biombos para separar os leitos, falta de um banheiro com chuveiro adequado para a higiene pessoal das clientes, sala de espera para familiar. (P7) Locais inadequados, puérpera em pós-parto recuperando-se no corredor, mesmo ambiente para a parturiente e acompanhante, alguns profissionais despreparados para receber acompanhantes. (P14)

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As maiores dificuldades estão relacionadas à não preparação adequada tanto dos familiares quanto da equipe hospitalar. (P17)

Experiências positivas com relação aos acompanhantes durante o trabalho de parto e parto foram relatadas pelos participantes em que houve a colaboração das parturientes e empenho da acompanhante. Neste momento, o acompanhante deve ter muito calma, tranquilidade, paciência e compreensão com a parturiente, para poder transmitir incentivo, orientação, carinho, conselhos, troca de experiência entre acompanhante e parturiente, obtendo assim um resultado satisfatório, como ilustra o relato a seguir:

Artigo de Reflexão

dade da equipe, pretendendo adotar em alguns casos, a posição de condutor da equipe, postergando assim o atendimento.


No Brasil, algumas maternidades estão adequando a sua área física para possibilitar a permanência de um acompanhante, escolhido pela parturiente, sem comprometer a privacidade das demais parturientes, e até mesmo implantando o modelo conhecido como PPP (pré-parto, parto e puerpério), que possibilita que a assistência nos períodos clínicos do parto seja realizada no mesmo local, o que proporciona conforto e individualidade2. Quanto à observação sistemática acerca da estrutura física do Centro Obstétrico onde foi realizada esta pesquisa, utilizou-se a RDC 50; com isso, pôde-se observar que a área de recepção da paciente é adequada, segundo a RDC 50, porém durante a pesquisa foi possível observar desproporção entre oferta do espaço e a demanda de pacientes. As salas de exame, admissão e higienização de parturientes são adequadas; no entanto, a falta do chuveiro inviabiliza a higienização antes do parto. Sentiu-se necessidade de espaço maior também para prescrição e evolução nos prontuários. A sala de pré-parto foi considerada inadequada, comprometendo o atendimento de qualidade, pois os quartos são pequenos e não comportam a permanência do acompanhante com preservação da privacidade. O posto de enfermagem e a área de prescrição médica são adequados segundo a RDC 50; contudo, durante a pesquisa percebeu-se a necessidade de reestruturação no que diz respeito ao local para preparo de medicamentos e guarda de material, visto que no setor em questão há acadêmicos de vários cursos da saúde. As salas de parto normal são adequadas, segundo a RDC 50, mas nesta pesquisa pôde-se observar que faltam locais para acondicionar as caixas de insumos necessários para os procedimentos deste local, pois estas caixas permanecem no chão da sala; seria interessante uma bancada para acondicioná-las e preparar o material. O espaço físico inadequado do Centro Obstétrico pode interferir na evolução do trabalho de parto e parto. A estrutura deve comportar a demanda, possibilitando às parturientes privacidade e liberdade para ter um acompanhante e conforto para acolhê-lo com respeito e dignidade.

CONSIDER AÇÕES FINAIS O trabalho possibilitou cumprir o objetivo geral de identificar a opinião dos profissionais do centro obstétrico quanto à inserção do acompanhante durante o trabalho de parto e parto em um hospital da região sul de Santa Catarina. Durante a pesquisa, pôde-se observar que a instituição tem grande empenho em inserir os acompanhantes durante todo o desenvolvimento do processo. Por mais que questões levantadas pelos pesquisados indaguem quanto à estrutura física inadequada para comportar uma demanda superior à que pode atender, pois o espaço físico é limitado, impedindo que

as parturientes tenham privacidade e acompanhantes os procedimentos. Outra dificuldade encontrada pelos participantes foi à presença dos acompanhantes nas intercorrências obstétricas (urgência e emergência). Apontaram ainda que a permanência do acompanhante é algo muito vantajoso, pois deixa a parturiente tranquila, confiante, protegida, e este acompanhante acaba motivando, impulsionando, confortando e facilitando um bom desenvolvimento durante todo o procedimento, fazendo com que os laços familiares tornem-se mais estreitos. A enfermagem, não somente na obstetrícia, mas também em outras áreas do cuidado, deve ser executada de forma que proporcione conforto e bem-estar ao paciente, desenvolvendo esta atividade de forma espontânea, sempre atualizando os conhecimentos para que seja prestada uma assistência de qualidade a todos que necessitam de cuidados. Sugere-se que mais estudos sejam realizados, pois sempre haverá algo a acrescentar em nossos conhecimentos.

REFERÊNCIAS 1. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria 2418 de 2 de dezembro de 2005. Regula a presença do acompanhante durante o trabalho de parto. Lei 11.108 de 7 de abril de 2005. 2. Brüggemann OM, Osis MJD, Parpinelli MA. Apoio no nascimento: percepções de profissionais e acompanhantes escolhidos pela mulher. Rev. Saúde Pública 2007; 41(1): 44-52. 3. Marque FC, Dias IMV, Azevedo L. A percepção da equipe de enfermagem sobre humanização do parto e nascimento. Esc. Anna Nery 2006; 10(3): 439-47. 4. Brasil. Ministério da Saúde. Informes Técnico-Institucionais. Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento. Rev. Bras. Saude Mater. Infant 2002; 2(1). 5. Brasil, Ministério da Saúde. Portaria 2418 de 2 de dezembro de 2005. Regula a presença do acompanhante durante o trabalho de parto. Lei 11.108 de 7 de abril de 2005. 6. Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher: Princípios e Diretrizes. Brasília, 2001. 7. Cardinali F. O acompanhante no alojamento conjunto da maternidade. Revista de Enfermagem UFSM 2011; 1(1): 1-14. 8. Brasil. Ministério da Saúde. (2011). Humanização. Disponível em <http://portal.saude.gov.br/portal/saude/visualizar_texto.cfm?idtxt=283 61>. Acesso em 23 set 2011. 9. Portella AP. Gravidez saudável e parto seguro são direitos da mulher. Apoio Ministério da Saúde. São Paulo, março de 2000. 10. Brasil. Ministério da Saúde. Criança: Ministério da Saúde recomenda parto humanizado 2010. 11. Boaretto MC. Avaliação da política de humanização ao parto e nascimento no município do Rio de Janeiro. (dissertação). Rio de Janeiro (RJ): 2003. 12. Orsia E, Dóra CKG. Qualidade da atenção ao parto em maternidades do Rio de Janeiro. 2005. 13. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Pré-natal e puerpério: atenção qualificada e humanizada – manual técnico. Brasília, 2006. 14. Motta CCL, Crepaldi MA. O pai no parto e apoio emocional: a perspectiva da parturiente. Paideia 2005; 15(30): 105-118.

Recebido em 05/12/2011. Aprovado em 27/12/2011. * Leodania Aparecida Américo – Enfermeira egressa da Universidade do Extremo Sul Catarinense, Unesc. ** Ioná Vieira Bez Birolo – Enfermeira mestre e docente da Unesc. *** Suzane Raquel Périco – Enfermeira mestre e docente da Unesc. **** Luciana Rosa – Enfermeira mestre e docente da Unesc. ***** Simoni Leal Justo – Enfermeira residente do Programa de Residência Multiprofissional em Atenção Básica, Unesc.

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Leodania Aparecida Américo / Ioná Vieira Bez Birolo / Suzane Raquel Périco / Luciana Rosa / Simoni Leal Justo

Ano 1 – Número 5, Novembro/Dezembro de 2011 - paginas de 04 a 08

Artigo de Reflexão

Acompanhante no trabalho de parto e parto: a opinião dos profissionais de saúde do Centro Obstétrico


ANEMIA NA DOENÇA RENAL CRÔNICA Anemia in chronic kidney disease

* Bruna Pescador Mendonça ** Luciana Rosa *** Luciane Bisognin Ceretta

**** Karina Gulbis Zimmermann ***** Maria Teresa Brasil Zanini ****** Andreia Batista Bialeski

Resumo – Trata-se de um estudo de abordagem quantitativa, do tipo transversal, desenvolvido em uma clínica de hemodiálise de um município do Sul de Santa Catarina, com 58 pacientes portadores de insuficiência renal crônica. O objetivo foi identificar o perfil e os fatores contribuintes para anemia na doença renal crônica, apresentado pelos pacientes submetidos à hemodiálise. A busca dos dados se deu através da aplicação de questionários e pesquisa aos prontuários. Para a análise dos dados, foi utilizada a estatística descritiva, estabelecendo-se um p<0,05. Em conclusão, a pesquisa proporcionou compreender que a anemia ainda é uma complicação na DRC muito presente em pacientes em terapia renal substitutiva e merece especial atenção por parte da equipe multiprofissional, sendo o enfermeiro a peça fundamental no manejo e sistematização da assistência ao paciente com DRC. Palavras-chave: Anemia; Doença renal crônica; Hemodiálise; Enfermagem.

Abstract – It is a study of quantitative approach, a cross-sectional prospective, developed in adialysis clinic in a city in southern Santa Catarina, with 58 patients with chronic renal failure, whose goal was to identify the profile and the factors contributing to anemiain chronic kidney disease found in patients undergoing hemodialysis. The search data was through the use of questionnaires and medical records to search. For data analysis descriptive statistics were used, establishing a p <0.05. In conclusion the research provided to understand that anemia is still a very present in CKD complication in patients on renal replacement therapy and deserves special attention by themultidisciplinary team and the nurse the cornerstone in the management and organization of patient care with CKD. Keywords: Anemia; Chronic kidney disease; Hemodialysis; Nursing.

Introdução preconizados pelas últimas recomendações do Kidney Disease Outcome Quality Initiative – K/DOQI (2002) e os pacientes portadores de DRC em hemodiálise apresentam fatores contribuintes para o agravamento do quadro de anemia. Assim, o objetivo geral deste estudo foi identificar o perfil e os fatores contribuintes para anemia na doença renal crônica apresentados pelos pacientes submetidos à hemodiálise em uma clínica de nefrologia de um município da Região Sul de Santa Catarina. A relevância do presente estudo reside no fato de que poderá contribuir para a otimização da assistência de enfermagem através do conhecimento de fatores relacionados, bem como comparar os resultados encontrados com estudos recentes, indicando dessa maneira que esses desfechos indesejados podem ser prevenidos ou retardados se a DRC for diagnosticada precocemente e as medidas nefro e cardioprotetoras implementadas o mais rápido possível. Neste ínterim, tem-se a certeza de que o enfermeiro é peça fundamental para sistematizar o cuidado a esses pacientes.

OBJETIVO O objetivo geral deste estudo foi identificar o perfil e os fatores contribuintes para anemia na doença renal crônica apresentados pelos pacientes submetidos à

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Durante a trajetória em uma clínica de hemodiálise, foi possível vivenciarmos várias situações de pacientes com doença renal crônica (DRC) em tratamento de hemodiálise com problema de anemia. Na clínica, os pacientes passam de três a quadro horas, três vezes por semana, conectados a uma máquina para realização das sessões de hemodiálise. A anemia se associa com a evolução adversa da DRC, incluindo hospitalização, doença cardiovascular, mortalidade e diminuição de vida da maior parte dos pacientes, sendo sua principal causa a deficiência da eritropoetina. Observa-se também, durante o tratamento substitutivo, perda de sangue no circuito dos capilares artificiais e pelas fístulas, que também podem contribuir para a severidade da anemia. Diante deste contexto, aponta-se a seguinte questão norteadora: Qual o perfil e quais os fatores contribuintes para anemia na doença renal crônica apresentados pelos pacientes submetidos à hemodiálise em uma clínica de nefrologia de um município da Região Sul de Santa Catarina? Partindo desse questionamento, levantaram-se os seguintes pressupostos: Os pacientes portadores de DRC são na sua maioria de cor branca com nível médio de escolaridade, casados e com média de idade acima de 40 anos, o perfil bioquímico para anemia dos pacientes portadores de DRC não alcança os níveis


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Anemia na doença renal crônica

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REFERENCIAL DA LITER ATUR A A DRC atualmente é um problema de saúde pública mundial definida como a presença de lesão renal ou diminuição do nível da função renal por três meses ou mais, caracterizada por anormalidades estruturais ou funcionais do rim, com ou sem diminuições da filtração glomerular (FG) (<60mL/min/1,73m2), evidenciada por anormalidades histopatológicas ou de marcadores de lesão renal, incluindo alterações sanguíneas ou urinárias, ou ainda de exames de imagem1. A DRC é subdiagnosticada e tratada, resultando em falta de prevenção. Um dos principais fatores é a falta de acordo sobre a definição e classificação dos estágios da sua progressão. A classificação clinicamente aplicável seria com base na avaliação laboratorial e a associação do nível de função renal com complicações e estratificação de risco para a perda da função renal2. No Brasil, de acordo com o último Relatório do Censo Brasileiro de Diálise, a incidência e prevalência da DRC continuam aumentando; o prognóstico continua ruim e os custos gerados para o tratamento ainda são muito elevados3. Alguns pacientes apresentam suscetibilidade au-mentada para a DRC e por isso são considerados grupo de risco: hipertensos, diabéticos, idosos, pacientes com doença cardiovascular, familiares de pacientes portadores de DRC e pacientes em uso de medicações nefrotóxicas4. A anemia é definida pela Organização Mundial de Saúde como uma concentração de hemoglobina (Hb) inferior a 13,0 g/dL em homens adultos e mulheres com amenorreia e Hb menor que 12,0 g/dL que mens-truam regularmente. Sendo um problema comum em pacientes com DRC e sua incidência aumenta na medida em que diminui a taxa de filtração glomerular1,5. A anemia tem um impacto profundo em pacientes com DRC. Os sintomas mais comuns são: fadiga, perda da libido, tonturas, falta de ar e diminuição da sensação de bem-estar. Outros resultados mais perigosos e adversos incluem a doença cardiovascular com hipertrofia ventricular esquerda e insuficiência cardíaca congestiva1.

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A anemia em pacientes com DRC não é sempre causada por deficiência de eritropoetina (EPO) exclusivamente. A avaliação laboratorial, portanto, visa identificar outros fatores que podem causar ou contribuir para levar à hiporresponsividade de agentes estimuladores da eritropoese (ESA). Além da contagem completa dos elementos do sangue, deve-se incluir o hematócrito, índices de concentração de hemoglobina, que deve estar na meta de 11,0-12,0g/dL, ferritina sérica na concentração >200ng/mL, devendo ser avaliado seu nível quando for >500ng/mL, sendo este o único marcador de sangue disponível de armazenamento de ferro e saturação de transferrina que deve se manter em >20%6,7.

MATERIAL E MÉTODO A abordagem metodológica adotada para este estudo foi quantitativa do tipo transversal. Fizeram parte do estudo todos os pacientes portadores de DRC submetidos a tratamento hemodialítico, num total de 58 pacientes. O levantamento dos dados aconteceu através da aplicação de questionário fechado aos participantes do estudo, os quais foram abordados individualmente durante as sessões de hemodiálise; os dados laboratoriais tiveram como fonte os prontuários dos respectivos pacientes, mediante assinatura por ambas as partes do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo que cada parte ficou com uma via. O estudo foi desenvolvido em uma clínica de nefrologia de um município da Região Sul de Santa Catarina no período de agosto a outubro de 2011, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da instituição de ensino da Escola de Enfermagem, conforme a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), com número do protocolo 370/2011. Para análise dos dados foi utilizada a estatística descritiva. As variáveis contínuas foram descritas por medidas de tendência central e dispersão (média e desvio padrão). Para a associação da exposição com os desfechos foi utilizado o Teste de Frequência, por se tratar de variáveis categóricas. Quanto à significância estatística, foi estabelecido p<0,05. Foi realizada a correlação de Pearson por Teste Qui-quadrado para avaliação dos fatores contribuintes para o agravamento da anemia. O programa utilizado para armazenamento dos dados foi o Microsoft Excel e na análise estatística o SPSS (Statistical Package for the Social Sciences, SPSS Inc., Chicago) versão 17.0 para Windows.

RESULTADOS A Tabela 2 ilustra o perfil demográfico dos participantes do estudo (n=58), sendo que se encontrou nos pacientes com anemia 31 (59,6%) homens e 21 (40,4%) de mulheres, com idade média de 57,27±15,15; sen-

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hemodiálise em uma clínica de nefrologia de um município da Região Sul de Santa Catarina. Os objetivos específicos foram: definir o perfil dos pacientes portadores de DRC submetidos à hemodiálise na clínica de nefrologia quanto a patologia de base, tempo em hemodiálise, idade, cor, gênero, religião, estado civil, escolaridade e ocupação; definir o perfil laboratorial dos pacientes com DRC submetidos à hemodiálise quanto a níveis de hematócrito, hemoglobina, saturação de transferrina, ferro sérico e ferritina; identificar os fatores contribuintes para o agravamento da anemia nos pacientes com DRC submetidos à hemodiálise.


dora, supervisor de produção, operador industrial, costureira, serviços gerais, comerciante, eletricista, corretor de imóveis, auxiliar de cozinha, auxiliar judiciário, marceneiro, auxiliar farmacêutico e professora. Em relação ao perfil laboratorial, observa-se na Tabela 3 que na população com anemia o ferro sérico apresenta-se com 93,88ug/dl (±31,35), hematócrito 31,48% (±3,96), hemoglobina 10,41g/dL (±1,51), saturação de transferrina 30,5% (±8,75) e ferritina 564,79ng/mL (±487,68). Já na população sem anemia, o ferro sérico apresenta-se com 107,83ug/dl (±22,49), hematócrito 39% (±1,85), hemoglobina 13,10g/dL (±0,90), saturação de transferrina 35,33% (±12,46), ferritina 423,60ng/mL (±264,35).

Entre os grupos observa-se uma diferença significativa relacionada aos níveis do hematócrito e hemoglobina com p=0,01. Em relação aos fatores contribuintes para o agravamento da anemia citam-se: perda sanguínea no circuito de HD, inflamação e infecção, coletas seguidas de sangue e punções de fístula, resultaram em 100% de frequência, enquanto os fatores hemoglobinopatia e sangramento do trato-gastrointestinal não foram registrados. Em contrapartida, na avaliação da correlação de Pearson conforme Tabela 4, o fator contribuinte hiperparatireoidismo, encontrou-se uma correlação moderada em relação ao agravamento da anemia, corroborando os trabalhos apresentados pela literatura, que demonstram através da Odds Ratio que o paciente com hiperparatireoidismo tem 42 vezes maior chance de desenvolver anemia daqueles que não possuem esse fator. Tabela 1 - Estagiamento da DRC proposta pelo grupo de trabalho do K/DOQI Estágio

Descrição

FG*

1

Lesão renal com FG normal ou aumenta- > 90 da

2

Lesão renal com FG levemente diminuída 60-89

3

Lesão renal com FG moderadamente 30-89 diminuída

4

Lesão renal com FG severamente diminu- 15-29 ída

8

FFR** estando ou não em terapia renal > 15 substitutiva

*FG = Filtração Glomerular em ml/min/1.73m² **FFR = Falência funcional renal Vale salientar que a maioria das diretrizes define a FFR como: 1)FG menor que 15 ml/min/1.73m², a qual é acompanhada frequentemente por sinais e sintomas de uremia ou 2) a necessidade de início de terapia de substituição da função renal (dialise ou transplante).

Tabela 2 – Perfil demográfico Com Anemia Sem mia (=52) (n=6) Idade, média±DP

ane- Valor de p

57,27±15,15

51±10,64

HAS

18 (34,5)

2 (33,3)

DM

16 (29,3)

1 (16,7)

HAS + DM

6 (10,3)

-

Outras

12 (23,9)

3 (50)

Tempo em HD, média±EP

2,19±0,29

5±2,14

46 (88,5)

6 (100)

0,33

Patologia de base, n(%)

0,014*

Raça, n(%) Branca

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do que a patologia de base da DRC foi hipertensão arterial sistêmica (HAS) 18 (34,5%), diabetes melitus (DM) 16 (29,3%), HAS + DM 6 (10,3%) e outras patologias 12 (23,9%). O tempo médio em hemodiálise (HD) foi de 2,19 ±0,29 anos, a raça branca foi de 46 (88,5%) e negra de 6 (11,5%). Desses, 41 (78,8) são católicos, 8 (15,4%) são evangélicos e outras religiões 3 (5,8%). Quanto ao estado civil, 7 (13,5%) são solteiros, 38 (73,1%) são casados e 7 (13,4%) outros. Em relação à escolaridade, 36 (69,2%) possuem 1º grau, 11 (21,2%) 2o grau e 5 (9,6%) 3o grau. Destes, 19 (36,5%) são aposentados, 8 (15,4%) são do lar e 33 (48,1%) possuem ocupações diversas. Da população sem anemia, 4 (66,7%) são homens e 2 (33,3) mulheres, com idade média de 51±10,64 anos; em relação à patologia de base da DRC, encontrou-se HAS 2 (33,3%), DM 1 (16,7%) e outras patologias 3 (50%). O tempo médio em HD foi de 5±2,14 anos, a raça branca foi de 6 (100%). Quanto à religião, 5 (83,3) são católicos e 1 (16,7%) evangélico. Quanto ao estado civil, 1 (16,7%) solteiro, 5 (83,3%) são casados. Quanto à escolaridade, 5 (83,3%) possuem 1o grau, 1 (16,7%) 2o grau. Identificou-se 1(16,7%) aposentado, 1 (16,7%) do lar e 4 (66,6%) outras ocupações. As demais categorias (patologia de base, estado civil, religião e ocupação), definidas na tabela como “outras”, não foram especificadas, uma vez que não apresentaram valores individuais significativos, sendo estas: patologia de base: pielonefrite crônica, mieloma múltiplo, glomeruloesclerose focal e segmentar primária, doença policística, nefrite intersticial crônica, glomerulonefrite, nefropatia metabólica e glomerulonefrite crônica. Em relação o estado civil: concubinado e viúvo. Encontrou-se um ateu como situação religiosa. Na categoria ocupação citam-se: agricultora, funcionária pública, cabista de telecomunicação, caminhoneiro, estudante, motorista, pensionista, moldador, vende-

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Anemia na doença renal crônica


de ferro sérico apresentam-se dentro dos níveis estipulados, porém, a maioria deles Sexo, n(%) necessita da suplementação de ferro para Masculino 31 (59,6) 4 (66,7) manter a ferritina sérica e a saturação de transferrina em níveis adequados para a efeFeminino 21 (40,4) 2 (33,3) tiva eritropoiese estimulada pelo tratamento Religião, n(%) com a eritropoetina conforme preconizado Católico 41 (78,8) 5 (83,3) pelas últimas diretrizes internacionais6. Evangélico 8 (15,4) 1 (16,7) A razão mais comum para a má resposta à EPO é a deficiência de ferro. No entanto, Outras 3 (5,8) estudos têm sugerido que a terapia parenEstado Civil, n(%) teral de ferro pode contribuir para a morbiSolteiro 7 (13,5) 1 (16,7) dade e mortalidade por induzir um estado pró-inflamatório, devido ao aumento do Casado 38 (73,1) 5 (83,3) estresse oxidativo8. Além disso, a avaliação Outros 7 (13,4) do status de ferro em si pode ser dificultada Escolaridade, n(%) por conta da ativação inflamatória9,10,11. 1º grau 36 (69,2) 5 (83,3) Quando avaliamos o hematócrito e níveis de hemoglobina entre os grupos, os resulta2º grau 11 (21,2) 1 (16,7) dos apresentados denotam uma diferença 3º grau 5 (9,6) significativa com um p=0,01, podendo Ocupação, n(%) sugerir que outros fatores envolvidos na terapia com ESA não são capazes de garantir Aposentado 19 (36,5) 1 (16,7) os níveis desejados destes marcadores de Do lar 8 (15,4) 1 (16,7) anemia. Outras 33 (48,1) 4 (66,6) O ferro parenteral tem emergido como Fonte: Dados da pesquisa 2011. *p<0,05. uma importante ferramenta na gestão de anemia na DRC, por si só ou quando combiTabela 3 – Perfil laboratorial nado com EPO. No entanto, algumas descoValor de p Com Anemia Sem anemia bertas sugerem uma desvantagem para uma (n=52) (n=6) administração indiscriminada de ferro que pode contribuir para o estado inflamatório8. Ferro, média±DP 93,88±31,35 107,83±22,49 0,296 O papel do enfermeiro na organização Hematócrito, 31,48±3,96 39±1,85 0,01 * da terapia do controle da anemia na DRC média±DP é fundamental para garantir ao paciente Hemoglobina, 10,41±1,51 13,10±0,90 0,01 * uma qualidade de vida satisfatória na busca média±DP constante dos níveis desejados do hematóSaturação de 30,05±8,75 35,33±12,46 0,188 crito e hemoglobina, como também dos Transferrina, demais marcadores desta disfunção. A sismédia±DP tematização da assistência de enfermagem Ferritina, média±DP 564,79±487,68 423,60±264,35 0,491 ao paciente vem ao encontro de demandas Fonte: Dados da pesquisa 2011. *p<0,05. importantes em uma unidade de hemodiálise. A interação da equipe multidisciplinar Tabela 4 – Estimativa de risco para hiperparatireoidismo também é necessária para o alcance dos 95% de Intervalo de confiança objetivos preconizados nas diversas portarias que regem os serviços de diálise. Valor Inferior Superior Os achados da pesquisa referentes à Odds Ratio para portador de anemia 0,42 0,039 4,49 saturação de transferrina não apresentam (sim/não) diferenças importantes entre os grupos avaPearson correlation 0,55 liados; porém, sabe-se da sua importância no papel da eritropoiese. Fonte: Dados da pesquisa 2011. Em relação aos níveis de ferritina sérica entre os grupos, os resultados já eram esperados, tendo em vista DISCUSSÃO principalmente que os pacientes com DRC e com anemia apresentam valores exacerbados deste marcador, Entre os pacientes participantes da pesquisa, os níveis de acordo com a literatura apresentada. Negra

12

6 (11,5)

-

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Anemia na doença renal crônicaa


A pesquisa denota que fatores contribuintes, como perda sanguínea no circuito de HD, inflamação e infecção, coletas seguidas de sangue e punções de fístula, estão presentes em todos os pacientes estudados, pois a rotina na unidade de hemodiálise requer no seu cotidiano a realização de procedimentos que acabam ocasionando perda sanguínea de alguma forma. Sabe-se, pela literatura, que pacientes com DRC possuem um estado inflamatório, pois a própria doença renal é a causadora, conforme o quadro de perda renal evolui e a própria presença da anemia contribui para este agravamento. Neste ínterim, essa variável está presente em todos os pacientes estudados. Não se obteve também qualquer correlação com esse agravamento; porém, não podemos descartar totalmente esse achado, pois, deve-se levar em consideração o número da amostra, a ausência da avaliação das citocinas pró-inflamatórias, bem como o curto tempo de realização da pesquisa. O estado inflamatório da DRC provoca uma situação de resistência à ação medular da eritropoetina. Quando pacientes portadores de DRC apresentam infecções concomitantes, existe um claro agravamento da anemia12,13,14. Neste cenário, o enfermeiro deve estar atento às queixas dos pacientes referentes a esse agravamento. A consulta mensal de enfermagem é de extrema importância para a busca desses achados, pois diagnósticos e intervenções de enfermagem são primordiais para o alcance da melhoria na qualidade de vida do paciente com DRC. Dessa forma, a avaliação frente aos resultados esperados torna-se instrumento viabilizador do cuidado sistematizado.

CONSIDER AÇÕES FINAIS Ficou evidenciado, que a enfermagem tem um papel importante no cuidado do paciente com DRC e seu manejo com a anemia, devendo lançar um olhar proativo para os fatores agravantes dessa complicação. Para que isso ocorra de maneira otimizada, a sistematização da assistência de enfermagem deve ser implantada efetivamente para que o cuidado possa ficar evidenciado, proporcionando resultados de excelência para o paciente com DRC. Cabe aqui colocar a necessidade do trabalho preventivo da DRC na atenção primária, pois, como ficou evidenciado no trabalho, a HAS e a DM ainda continuam

sendo as patologias de base que mais acometem a função renal. Para isso, é imprescindível que a integralidade esteja presente nos diversos grupos desenvolvidos, pois pouco se evidencia o controle da creatinina e ureia nos grupos de risco, sendo estes parâmetros fundamentais para o controle da progressão da doença renal. Acredita-se que esta proposta possa, além de contribuir para a saúde desses pacientes, diminuir os custos que o governo tem frente a uma sessão de hemodiálise.

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* Bruna Pescador Mendonça – Acadêmica de Enfermagem – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc. ** Luciana Rosa – Mestre – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc. Recebido em 09/12/2011. *** Luciane Bisognin Ceretta – Mestre – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc. Aprovado em 15/12/2011. **** Karina Gulbis Zimmermann – Mestre – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc. ***** Maria Teresa Brasil Zanini – Especialista – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc. ****** Andreia Batista Bialeski – Mestre – Universidade do Extremo Sul Catarinense – Unesc.

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Anemia na doença renal crônica


A EQUIPE DE SAÚDE EM MISSÃO HUMANITÁRIA NO ESTADO DE ALAGOAS: RELATO DE EXPERIÊNCIA The team of healthcare in humanitarian mission in Alagoas: experience story * Márcio Haubert da Silva ** Moema do Nascimento Ferreira *** Maria Renita Burg Figueiredo

Ano 1 – Número 5, Novembro/Dezembro de 2011 - paginas de 14 a 20

Resumo – Por ocasião do desastre ocorrido pelas enchentes e alagamentos no Estado de Alagoas, o Ministério da Saúde solicitou voluntários do Grupo Hospitalar Conceição de Porto Alegre – RS, para formar equipes de ajuda humanitária junto aos necessitados. Nos meses de junho e julho de 2010, cerca de 40 profissionais, entre médicos, enfermeiros e técnicos em enfermagem, atuaram diretamente junto à população das cidades mais afetadas pelo desastre. O estudo tem por objetivo relatar a experiência vivida em uma catástrofe ambiental, atuando como integrante de uma equipe de ajuda humanitária no Estado de Alagoas. Trata-se de uma pesquisa descritiva exploratória de campo observacional assistemática, realizada no Estado de Alagoas. A experiência vivida é apresentada em quatro momentos: a apresentação das cidades envolvidas na catástrofe com a descrição dos setores afetados; as primeiras impressões da situação quando a equipe visitou os municípios; a atuação propriamente dita; e, por último, o relato dos sentimentos vividos, captados e registrados por um dos integrantes da equipe – objetivo deste estudo. A participação em missões humanitárias é ímpar; portanto, a participação dos profissionais da área saúde é de suma importância, para que possam vivenciar os desafios e os sentimentos que uma missão é capaz de trazer à vida de cada ser humano. Palavras-chave: Missão humanitária; Catástrofe em Alagoas; Defesa Civil; Equipe de saúde.

Abstract – With the event a disaster of floods and overflows in the State of Alagoas, the Healthcare Department requested volunteers from Grupo Hospitalar Conceição in Porto Alegre – RS, to form teams of humanitarian aid for the needed ones. In June and July 2010, about 40 professionals, such as doctors, nurses and nursing technicians, worked directly to help the population of the cities affected by the disaster. The aim of this study is to tell the experience lived in a catastrophe environment, acting as a member of a humanitarian aid team in Alagoas. It is an exploratory descriptive research of unsystematic observational field, in Alagoas. The experience is presented in four parts: the presentation of the cities involved in the catastrophe with the description of the affected sectors; the first impressions of the situation when the team visited the cities; the performance itself and, finally, the story of the emotions lived, caught and registered by one of the members of the team that’s object of this study. The participation in humanitarian missions is unique, therefore it is of utmost importance to the participation of the healthcare professionals, so that they can deeply live the challenges and the emotions that a mission is able to bring to the life of each human being. Keyword: Humanitarian mission; Disaster in Alagoas; Civil Defense;Health team.

Introdução As catástrofes naturais têm sido causas de frequentes problemas que afetam a saúde das populações, bem como representam obstáculos ao desenvolvimento das comunidades atingidas, na medida em que consomem ponderáveis recursos financeiros para a reparação dos danos sofridos. Existem vários tipos de catástrofes naturais, tais como terremotos, maremotos, erupções vulcânicas, deslizamentos, furacões, vendavais e ou inundações1. As catástrofes são resultantes de eventos adversos, naturais ou provocadas pelo homem, sobre um ecos-sistema vulnerável, causando danos humanos, materiais, ambientais e consequentes prejuízos econômicos e sociais. Danos e prejuízos são quantificados em termos de intensidade. Já os eventos adversos são quantificados em termos de magnitude, sendo que a intensidade depende da interação entre a magnitude do evento adverso com o grau de vulnerabilidade do sistema receptor afetado. Normalmente o fator preponderante para a intensificação de um desastre é o grau de vulnerabilidade do sistema receptor2.

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A Organização Mundial da Saúde define catástrofe como um fenômeno ecológico súbito de magnitude suficiente para necessitar de ajuda externa3. A ajuda externa, também conhecida como Ajuda Humanitária, é uma forma de cooperação ou solidariedade, geralmente destinada às populações carentes ou às que têm sofrido uma crise humanitária, como a desencadeada por uma guerra ou catástrofe natural4. Esta forma de auxílio diz respeito às necessidades básicas ou de urgência, tais como: fome, saúde, reconstrução das infraestruturas devido a algum de-sastre, educação, educação popular, proteção à criança e populações desfavorecidas, construção ou saneamento das redes de água, construção das redes de comunicação, entre outras. Normalmente, a ajuda humanitária se diferencia na urgência e nas necessidades de cada país4. Essa ajuda pode ser material, econômica ou profissional para trabalho voluntário diretamente na região afetada, podendo ser provida de organizações, associa-

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OBEJTIVO GER AL Relatar a experiência vivida em uma catástrofe ambiental, atuando como integrante de uma equipe de ajuda humanitária no Estado de Alagoas/Brasil.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS Apresentar a situação das cidades de Branquinha, Murici, Santana do Mundaú e União dos Palmares, assoladas pelas enchentes, atendidas pela equipe multiprofissional enviada pelo Ministério da Saúde; Descrever as ações desenvolvidas e as aprendizagens obtidas nesta ação de catástrofe no Estado de Alagoas, evidenciando a atuação humanizada prestada pelos profissionais em seus atendimentos; Relatar os sentimentos vivenciados na missão.

METODOLOGIA Trata-se de uma pesquisa descritiva exploratória de campo, utilizando a técnica de observação assistemática, também chamada de simples, não estruturada ou ocasional. Foi executada sem prévios controles elaborados nem planejamentos anteriores, sendo decorrência de fenômenos que surgiram do imprevisto6. A técnica de observação não estruturada ou assistemática, denominada de espontânea, ordinária, simples, livre, ocasional e acidental, consiste em recolher e registrar os fatos da realidade sem que o pesquisador utilize meios técnicos especiais ou precise fazer perguntas diretas. É empregada em estudos exploratórios e não tem planejamento e controle previamente elaborados7. A opção por essa modalidade foi a possibilidade de relatar a experiência vivida em situação de grande impacto emocional frente à condição humana. O cenário em que os fatos ocorreram foram as cidades de Branquinha, Murici, Santana do Mundaú e União dos Palmares, no Estado de Alagoas, no mês de julho de 2010. A coleta de dados deu-se através de observações, anotações em forma de diário, fotos de arquivo do pesquisador, jornais, complementadas com livros, revistas, artigos científicos e manuais da Defesa Civil. Os princípios éticos foram respeitados, protegendo os direitos dos indivíduos, levando em consideração as determinações mencionadas pelas Normas de Pesquisa em Saúde referidas pela resolução 196 de 10 de outubro de 1996 do Conselho Nacional de Saúde (Brasil, 1996). A privacidade e o anonimato dos sujeitos foram preservados.

RESULTADOS A experiência vivida na ajuda humanitária, organizada e financiada pelo Grupo Hospitalar Conceição, será apresentada em quatro momentos: a apresentação das cidades envolvidas na catástrofe com a descrição dos setores afetados; as primeiras impressões da situação quando a equipe visitou os municípios; a atuação propriamente dita; e, por último, o relato dos sentimentos vividos, captados e registrados por um dos integrantes da equipe e objeto deste estudo. 1º Momento: A catástrofe no Estado de Alagoas e a abrangência dos municípios envolvidos No dia 18 de junho de 2010, fortes chuvas atingiram Alagoas afetando 28 municípios, dos quais quatro decretaram Situação de Emergência e 15 municípios encontravam-se em Estado de Calamidade Pública. Foram afetadas 181.018 pessoas, das quais 26 foram a óbito, 69 desaparecidas, 26.618 desabrigadas, 47.847 desalojadas. Além disso, foram destruídos ou danificados 18.715 domicílios. As quatro cidades mais atingidas A cidade de Branquinha pertence à Microrregião da Mata alagoana, localizada a 62 km de Maceió, com população estimada de 12.215 habitantes e área territorial de 155 km².8 A enchente de junho de 2010 foi considerada de grande magnitude, pois atingiu 90% da

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ções e fundações de vários ramos; de organizações não governamentais amparadas por doações de empresas ou particulares; pelos Estados, Nações e outras coletividades públicas; por organismos internacionais públicos (Organização das Nações Unidas, União Europeia, entre outros); e por empresas de vários segmentos e setores4. Na saúde, as necessidades de atendimento estão acima dos recursos materiais e humanos disponíveis imediatamente, havendo necessidade de medidas extraordinárias e coordenadas para se ter e manter uma qualidade básica ou mínima de atendimento pré-hospitalar3. Os desastres de origem ambiental, no caso as inundações, potencializam a ocorrência de doenças, sobretudo as transmitidas por água, alimentos, vetores, reservatórios e animais peçonhentos. Em situações assim, existe necessidade de monitoramento e intensificação das ações de vigilância em saúde de forma oportuna, coordenada e articulada com outros setores e com base em dados para a tomada de decisões5. Nessa perspectiva, o Ministério da Saúde do Brasil solicitou ao Grupo Hospitalar Conceição, de Porto Alegre/RS, profissionais da saúde para atuarem como voluntários nas enchentes que atingiram o Estado de Alagoas. Isso porque, em outras situações de calamidade pública, a instituição já havia disponibilizado funcionários para atuação em desastres. Nos meses de junho e julho de 2010, cerca de 40 profissionais da área da saúde se inscreveram, entre auxiliares e técnicos em enfermagem, enfermeiros e médicos para comporem equipes de atuação direta junto à população das cidades acometidas pelas enchentes. Como acadêmico do Curso de Graduação em Enfermagem, atuando na referida Instituição como Técnico de Enfermagem, fui indicado para a missão. A partir dessa experiência, surgiu o interesse em relatar os fatos, para socializar as informações e sensibilizar outros profissionais no meio acadêmico a aproveitarem a oportunidade de atuar como voluntários em missões humanitárias, bem como mostrar a atuação de uma equipe de saúde e, principalmente, do profissional enfermeiro em situações de calamidade em uma população.

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cidade, deixando a maioria da população desabrigada e moradias demolidas, além de não ter deixado nenhum prédio público de pé, inclusive o Centro de Saúde e as Unidades de Saúde das quatro equipes de Estratégia de Saúde da Família. As equipes de ESF eram as únicas referências de saúde do município, agravando ainda mais o caos da localidade. A população atingida, cerca de nove mil pessoas, abrigou-se em casas de parentes e amigos e em abrigos fixados nas escolas municipais. A cidade já havia sido atingida por outras enchentes provocadas pelo rio Mundaú, nos anos de 1949, 1962, 1969 e 2000, mas nenhuma com essa magnitude9. Outro município atingido foi Murici, pertencente à Região da Mata alagoana, com extensão de 424 km² e uma população de aproximadamente 26.918 habitantes, fica a 44 km da capital, Maceió10. O município contava com nove Unidades de Saúde da Família, uma Unidade Mista de atendimento à saúde, além de Secretaria de Saúde, Centro de Atenção Psicossocial e Unidade de Vigilância em Saúde. Foram desabrigadas em torno de quatro mil pessoas nesse município. A enchente que atingiu a cidade destruiu o cartório, posto de saúde, escolas, lojas comerciais e diversas casas às margens do rio Mundaú, na parte baixa do município11. A cidade de Santana do Mundaú, localizada no Leste alagoano, na Serra dos Quilombos, distante 106 km da capital Maceió, tem uma população de aproximadamente 12.039 habitantes distribuídos em uma área de 223,62 km² 12.A cidade contava com três Unidades Básicas de Saúde, duas Unidades de Saúde da Família, um Centro de Especialidades Odontológicas, Secretaria da Saúde e Unidade de Vigilância em Saúde13, que foram totalmente carregadas pelas águas da enchente, deixando o local a descoberto de qualquer tipo de assistência à saúde. Nessa cidade, ruas inteiras foram destruídas, mais de trezentas famílias foram desabrigadas e encontraram abrigo na casa de familiares, amigos e na escola municipal da cidade. O caos se agravou com a queda de uma parte da principal ponte da cidade, única rota de ligação entre o bairro mais atingido e o centro. A cidade de União dos Palmares, localizada a cerca de 70 km de Maceió, tem população estimada em 62.727, um território de aproximadamente 427 km² e é considerada uma das principais cidades de Alagoas14. O município conta com 11 Unidades de Saúde da Família, três Unidades Básicas de Saúde, dois Hospitais Gerais (um particular e outro público) e demais clínicas e consultórios especializados. A cheia do rio Mundaú causou a destruição de duas Unidades de Saúde da Família. Nesse município, aproximadamente 6.350 pessoas foram atingidas pelas águas e tiveram de buscar abrigo no Ginásio Municipal, em escolas da rede municipal e em casas de familiares e amigos15. Classificação do desastre no Estado de Alagoas Todos os desastres são classificados quanto à intensidade, quanto à evolução, quanto à origem, quanto aos danos e quanto aos prejuízos. O desastre no Estado de Alagoas foi classificado Desastre de Nível IV, em uma escala de quatro, no quesito intensidade, pois os danos causados foram muito importantes e os prejuízos muito vultosos e consideráveis, já que milhares de pessoas fo-

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ram desabrigadas e milhares de residências e prédios públicos foram destruídos2. Quanto à evolução, foi um Desastre Súbito, caracterizado pela velocidade e violência com que os rios encheram e assolaram suas margens. Quanto à origem, foi considerado um Desastre Misto, pois ocorreu através das ações e omissões humanas que contribuíram para intensificar e agravar o desastre natural2. Quanto aos danos causados, registraram-se os Danos Humanos, evidenciados por pessoas desalojadas, desabrigadas, deslocadas, desaparecidas, feridas gravemente ou levemente, enfermas e mortas; os Danos Materiais, evidenciados por danos em instalações públicas e particulares (de saúde, de ensino, prestadoras de serviços e outras), em unidades habitacionais de baixa renda, em obras de infraestrutura, em instalações comunitárias e em unidades habitacionais de classes mais favorecidas; e os Danos Ambientais evidenciados pela poluição da água e do solo e por degradação e perda de solo agricultável2. No que se refere à classificação de prejuízos, a catástrofe causou Prejuízos Econômicos, por ter afetado a agricultura, pecuária, indústria e serviços e Prejuízos Sociais, em razão da interrupção do funcionamento de serviços à população, como assistência médica, saúde pública, atendimento de emergências, abastecimento de água potável, saneamento básico, sistema de limpeza urbana, telecomunicações, transportes, distribuição de combustíveis, segurança pública e ensino2. A partir de todas essas classificações, foi realizado um relatório para a decretação de Estado de Calamidade Pública, em que as autoridades, através de declaração, homologação e reconhecimento, verificam legalmente a situação anormal nas cidades alagoanas. Em tal avaliação, é verificada a seriedade dos danos à comunidade afetada, inclusive à incolumidade ou à vida de seus integrantes2. A identificação de existência de ecossistemas frágeis, ou legais, como as áreas de preservação permanentes, pode viabilizar um sistema de prevenção às intempéries, resguardando a população dos prováveis riscos ambientais a que estejam sujeitas, pois auxilia na prevenção de desastres de alagamentos, permitindo não só entender o comportamento e a dinâmica fluvial, como também a sua capacidade de vazão e a abrangência das inundações. Como muitas cidades estão próximas de uma linha de água como rio, arroio, sanga ou um reservatório, a identificação prévia permite ampliar as possibilidades de previsão e planejamento de obras de contenção de deslizamento e cheias16. 2º Momento: Percepção inicial da situação No dia 7 de julho de 2010, um grupo de nove pessoas, entre as quais três médicos, três enfermeiras e três técnicos de enfermagem, deslocaram-se de Porto Alegre para a cidade de Maceió, capital do Estado de Alagoas, com o objetivo de formar três equipes de saúde, cada uma contendo um médico, uma enfermeira e um técnico de enfermagem, para atuar junto às vítimas das enchentes no Estado por um período de 15 dias. Na chegada, os profissionais foram recebidos por um representante do Ministério da Saúde, que os encami-

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pitalar com os da saúde comunitária. O transporte era realizado pelas ambulâncias do SAMU e por um serviço terceirizado da Secretaria Estadual de Saúde. Todas as despesas de transporte, hospedagem e alimentação das equipes foram custeadas pelo Ministério da Saúde, Grupo Hospitalar Conceição e Secretaria Estadual de Saúde de Alagoas. O trabalho era dividido basicamente em dois tipos: uma equipe trabalhava no hospital de campanha de Santana do Mundaú, atendendo à livre demanda da população, enquanto as outras duas equipes atuavam na atenção direta da população nos abrigos, identificando a população necessitada e também atendendo à livre demanda. As equipes seguiam uma escala de trabalho para poder prestar todos os tipos de atendimento e em todas as cidades necessitadas, fazendo com que os plantões no hospital de campanha se repetissem a cada dois dias por equipe. 3º Momento: A atuação da equipe propriamente dita Nossa atuação foi basicamente dividida em dois tipos. O primeiro foi o trabalho realizado no Hospital de Campanha em Santana do Mundaú, local onde a população era atendida por livre demanda, ou seja, o próprio usuário buscava atendimento. Já o segundo trabalho, realizado nos abrigos das cidades de Branquinha, Murici e União dos Palmares, era efetuado através da busca ativa de usuários necessitados de atendimento, que por motivos diversos não conseguiam chegar a um ponto de atendimento. A atuação no Hospital de Campanha em Santana do Mundaú Ao chegar a esse município, a equipe identificou um hospital de campanha montado e o atendimento sendo realizado pelos Bombeiros do Rio de Janeiro. Mas, como já mencionado, aquele seria o último dia de atuação, pois estavam desmontando as instalações físicas e retornando ao seu Estado. Foi decidida a montagem de um novo hospital de campanha para a atuação das equipes e, no dia seguinte, uma nova estrutura já estava em condições de prestar atendimento. O trabalho da equipe iniciou imediatamente, com a organização e distribuição das estruturas físicas e materiais, visto que tudo o que era necessário e tudo o que era solicitado ficava à disposição dos profissionais para uso nos atendimentos. No espaço físico, estava à disposição um leito de intensivismo, classificado como Área Vermelha, utilizado para atendimento de pacientes graves. Havia outra área, classificada como Amarela, com dois leitos, utilizados para medicação e observação de pacientes. Ainda outros dois leitos, classificados como Verde, onde eram realizados atendimentos de baixa complexidade, bem como a triagem dos pacientes. Como área de apoio, estava sempre disponível um laboratório de análises clínicas do Estado de Alagoas, com um funcionário para a coleta e realização de exames laboratoriais diversos, como exames de sangue, urina, fezes e testes rápidos para HIV, dengue e hepatite C. Havia também uma ambulância do SAMU e outra ambulância de transporte para uma eventual necessidade de transferência de paciente para o hospital de

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nhou para a cidade de União dos Palmares, com o objetivo de conhecer os estragos causados pelo desastre na cidade. As equipes se depararam com um “cenário de guerra”, com casas em ruínas, pessoas recolhendo o pouco que sobrou e recuperando materiais que poderiam ser aproveitados para uma nova construção, como madeiras, tijolos, ferros e outros objetos. Foi possível observar o rio Mundaú e seu leito visivelmente alargado pela força das águas e, junto à sua margem direita, a destruição de uma usina de cana-de-açúcar e uma indústria de laticínios, que empregavam mais da metade da população da cidade, agravando a situação de desespero dos moradores. No município de Santana do Mundaú, existia um hospital de campanha montado e operado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, junto a uma escola municipal, que serviu de abrigo aos necessitados da cidade. Entretanto, estava encerrando suas operações, aguardando apenas a vinda das equipes de Porto Alegre para substituição. Estava sendo montada a estrutura de um novo hospital de campanha para ser operada pelos funcionários do Grupo Hospitalar Conceição. Nessa cidade, o cenário de destruição não era muito diferente, pois existiam muitas casas devastadas e atingidas. Todos os locais de atendimento de saúde da cidade haviam sido carregados pelas águas e a área habitacional das pessoas com maior poder aquisitivo da cidade, incluindo a residência do prefeito, foi a primeira que o rio Mundaú assolou, tirando desse município as chances de ajuda que poderia ganhar de seus próprios moradores. O prefeito, juntamente com a sua esposa, que ocupava o cargo de Secretária de Saúde, teve de se abrigar na casa de familiares. O caos talvez fosse ainda maior se não houvesse a iniciativa de uma cirurgiã dentista, integrante da Defesa Civil do Município, que assumiu a liderança na organização e reestruturação da cidade. Já em Branquinha, uma das cidades mais atingidas, a realidade também era de destruição. Porém, a cidade era maior e melhor organizada. Nesse local, havia uma estrutura bem montada com atuação do Exército Brasileiro e os Médicos sem Fronteiras, suprindo as principais demandas iniciais da população. Logo após, as equipes visitaram o município de Murici, local de maior preocupação, devido às condições subumanas dos habitantes dos abrigos comunitários, que estavam sobrevivendo sem as mínimas condições de higiene e saneamento básico. Nos cinco primeiros dias, as equipes ficaram hospedadas em um hotel na cidade de União dos Palmares e durante os dez dias restantes, em um hotel de Maceió, devido à facilidade logística de translado entre as cidades e as reuniões realizadas diariamente com os representantes do Ministério da Saúde, da Secretaria Estadual de Saúde e com o Coordenador Estadual do SAMU, a fim de traçar as diretrizes e as estratégias de atendimento que a população necessitava. Essa missão demandava mudanças de estratégias de ações diárias, desde o foco de atendimento, preventivo ou curativo, até o encerramento de atividades em alguma das cidades atendidas. Cada equipe foi formada a partir da experiência de cada profissional, mesclando profissionais da área hos-

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A atuação nos abrigos Foram visitados pelas equipes vários abrigos das cidades necessitadas, onde havia ambulâncias do SAMU, as quais foram previamente equipadas com materiais e medicações necessárias aos atendimentos. Nesses locais, a atuação dos profissionais dava-se primeiramente na busca ativa dos necessitados de atendimento, pois muitos não procuravam ajuda pelo medo de serem saqueados dentro dos próprios abrigos, correndo o risco de perder o pouco que haviam conseguido salvar das enchentes. Também havia os que, por questões físicas, não tinham condições de se deslocar até um ponto fixo de atendimento. Após atendimento desses casos resultantes da busca ativa, era aberto o atendimento de livre demanda. Com a ajuda da improvisação de cadeiras e mesas, era possível executar pela enfermagem a triagem e dispensação de medicamentos, enquanto, no interior das ambulâncias, eram realizadas as consultas médicas. Em todos os abrigos, os casos se assemelhavam, pois as condições sanitárias eram muito parecidas, ou seja, precárias. Nesses locais, os casos de gastroenterite, impetigo, verminose, pediculose, escabiose, desidra-tação, doenças diarreicas, crises conversivas, vaginoses e doenças sexualmente transmissíveis eram recorrentes entre a população. Ainda foram encontrados casos de hepatite viral aguda do tipo A e sepse por infecção de pele, casos esses encaminhados para hospitais, por necessitarem de internação hospitalar. As ações humanitárias da equipe de enfermagem As ações da enfermagem nesta missão transcende-ram as barreiras do cuidar, do zelar e do assistir. Foram além da verificação de sinais vitais, aplicação de medicações, acolhimento e avaliação de pacientes, que são procedimentos rotineiros – que, infelizmente, muitas vezes se assemelham a uma linha de montagem, mecanizados e frios. No local, a equipe se deparou com uma realidade totalmente adversa com a de costume, fazendo com que a assistência fosse repensada, remoldurada e reaplicada, de forma especial dentro de cada profissional, pois não somente a situação de desastre pedia tal mudança, mas principalmente a consciência de cada membro da equipe despertou em todos os reais

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sentimentos de humanização. Ao triar o paciente não se levavam em conta apenas os sinais e sintomas que os mesmos apresentavam, mas também sempre se verificava como sua família estava estruturada, como estava superando aquela situação de desastre e como aquilo tudo poderia estar se somatizando em seu organismo e em sua saúde. A equipe não podia apenas dispensar medicamentos, pois a maioria dos usuários era analfabeta. A orientação da enfermagem neste momento foi indispensável, pois as equipes tiveram de encontrar maneiras didáticas de orientar os pacientes quanto à medicação, para que o tratamento fosse efetivo. Quando a prescrição era de tomar certa medicação de oito em oito horas, a orientação era tomar ao acordar (pois a maioria acordava no máximo às oito horas da manhã), no meio da tarde ou junto com o café da tarde e ao se deitar para dormir. Cientificamente, não era a maneira mais correta de orientar a população por não garantir o tempo correto de intervalo, mas foi a única solução que a enfermagem encontrou ao se deparar com essa realidade. Era notória a diferença no atendimento que estávamos prestando nesse local, comparado com o que recebiam pelos profissionais locais antes da catástrofe. Os pacientes verbalmente externavam que raramente recebiam explicações sobre qualquer procedimento que lhes era feito, e dificilmente alguém os tocava e muito menos os tratava com igualdade. 4º Momento: Relato dos sentimentos vivenciados na missão Desde o momento em que recebi o convite para participar dessa missão, senti um misto de sentimentos: ansiedade, alegria, curiosidade, entre outros, pois até então não havia me deparado com uma missão de tamanha importância. Logo a seguir, passei a sentir medo, pois não sabia se teria estrutura física e mental para trabalhar com algo até então desconhecido, pois só com notícias em jornais e internet não é possível ter a real dimensão da situação. O medo deu-se por várias razões, como em não ser útil, não conseguir superar o desafio, não dominar tudo aquilo necessário para atender a essa população. Tive medo até mesmo de morrer em alguma fatalidade e nunca mais retornar aos meus amigos e familiares. Mas, em segundos, tudo isso mudou. Comecei a ser invadido pelos maiores sentimentos existente no mundo, ou seja, o amor e a compaixão. Esses me passaram confiança para aplicar todos os conhecimentos e experiências vividas até o momento e contribuir com a população da melhor forma possível. O real sentido da minha profissão veio à mente e, com isso, todos os medos se renderam. Pude, assim, viver a maior missão da minha vida. Considero essa a maior missão da minha vida, pois me deparei com situações que jamais pensei encontrar. Os determinantes da pobreza que vi eram muito maiores daquela que meus olhos estavam acostumados a ver aqui no nosso Estado. Fiquei emocionado em ver a forma como o povo busca forças para lutar. Essa dura realidade que a mim se apresentou fez com que me despisse de todas as armaduras que carregava, de to-

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referência. A equipe atuava no regime de plantões de 24 e de 12 horas. Os casos atendidos foram bastante variados, pois a população buscava atendimento tanto para tratamento de patologias associadas ao desastre quanto para patologias e acidentes que ocorriam no dia a dia. Foram atendidos casos de desidratação, suspeita e confirmação de dengue, suturas, crises hipertensivas, diabete descompensada, acidentes de carro e motomobilísticos, curativos, casos de ansiedade e estresse pós-traumático, faringites, amigdalites, dermatites, vacinas contra o tétano, reações alérgicas, infecções do trato urinário, gastroenterites, casos de agressões, broncoespasmos, acidente vascular cerebral agudo, DPOC descompensada, trabalho de parto, infecção de vias aéreas, asma, bronquite, herpes zoster, impetigo e demais infecções de pele, entre outros.


dos os preconceitos e conceitos até então formados. Não identificava cor, nem raça, muito menos credo ou etnia. Vi apenas minha própria imagem crua projetada nos rostos de todos aqueles a quem ajudei. As minhas lágrimas foram contidas por diversos momentos para prestar e garantir a assistência devida, principalmente quando uma paciente, mãe de quatro crianças, me fez o seguinte questionamento: “Doutor, o senhor tem filhos?” afirmei que não, e ela retomou: “Então leve o meu mais novo (de oito meses de idade) com você, assim terei certeza de que ele terá uma vida melhor que eu!” Não tive forças para responder, apenas pedi licença e pedi para uma colega continuar o atendimento, enquanto fui controlar minhas emoções em outro local. Fiquei impressionado como a população encontrava forças em Deus para continuar suas vidas, pois sempre me respondiam: “Pela graça e vontade de Deus tenho minha vida e a de todos da minha família”. Isso me fez reforçar a fé, que muitas vezes perdemos frente a situações corriqueiras e de menor magnitude. Outra situação que me deixou bastante comovido foi a questão dos habitantes dos abrigos. Eles conviviam em locais completamente insalubres, com pouco espaço, em meio a dejetos humanos, animais doentes, fornecimento precário de água e até mesmo com helmintos espalhados pelo chão entre crianças brincando. Com tudo isso, ainda foi possível enxergar o sorriso na face da maioria deles. A satisfação e a gratidão a cada atendimento serviam de combustível para uma longa e cansativa jornada de trabalho. Fornecia energia ao organismo e provava a importância da nossa missão, fazendo com que os momentos de tristeza, saudade e nostalgia fossem substituídos por alegria e entusiasmo de um simples sorriso ou de uma pequena frase de: “muito obrigado”.

CONSIDER AÇÕES FINAIS O Brasil, devido à sua geografia, condições regionais climáticas e fisiográficas e ao grau de desenvolvimento, está propenso, diariamente, a um elevado número de desastres e situações de emergência que podem provocar vários danos à sociedade, afetando diretamente a qualidade de vida dos cidadãos. Infelizmente ainda persiste na Nação uma ideia errônea de Defesa Civil por faltarem políticas públicas preventivas para contenção de desastres, evidenciada a pouca importância dada ao desenvolvimento e capacitação de recursos humanos em todos os níveis. Também é possível verificar que não existe preocupação efetiva em preparar a população e comunicar-lhe que a Defesa Civil é um dever de todo o cidadão e um direito da sociedade. Prova disso é que já haviam ocorrido enchentes e inundações no Nordeste brasileiro, inclusive no Estado de Alagoas, nos anos de 1949, 1962, 1969, 2000, atingindo os mesmos municípios atendidos e relatados neste estudo. Portanto, é de suma importância a execução de projetos para realocar as famílias moradoras em áreas de risco; de recuperação de áreas degradadas; de reconstrução da infraestrutura de serviços públicos afetados por

desastres; de educação, promoção e treinamento dos cidadãos em relação à conservação da natureza e do seu próprio bem estar, tanto antes quanto pós-instalação de desastres17. A reflexão realizada neste estudo mostrou a essência da ajuda humanitária, alicerçada na solidariedade e no desprovimento de qualquer preconceito entre os seres humanos. O relato da Comissão das Uniões Europeias vem ao encontro dos sentimentos vividos pelos profissionais e relatados no trabalho: “é uma forma de cooperação ou solidariedade, geralmente destinada às populações carentes, ou as que têm sofrido uma crise humanitária, como a desencadeada por uma guerra ou catástrofe natural”4. A conscientização da população e a execução pelos órgãos públicos de programas de saneamento ambiental, a partir de políticas voltadas tanto para “cidades sustentáveis” quanto aos “municípios saudáveis” devem ser valorizadas pelos gestores públicos municipais, estaduais e federais16. A experiência relatada nesta pesquisa apresentou a situação geográfica, condições socioeconômicas e de saneamento ambiental encontradas nas cidades atingidas pelo desastre. Permitiu abordar conceitos de Defesa Civil e ajuda humanitária em catástrofes, sejam elas de ecossistema ou epidemias e ainda desconhecidos e pouco explorados no meio acadêmico, nos cursos da área da saúde. A produção científica sobre o tema é incipiente, observando-se a necessidade de produção de trabalhos científicos relacionados ao atendimento a calamidades e catástrofes. As instituições universitárias, juntamente com órgãos públicos, devem despertar para a qualificação dos enfermeiros nessas novas demandas. Diante desta catástrofe, pude entender o real sentido da palavra “equipe”, pois trabalhamos unificadamente, juntamos não só conhecimento técnico e científico para atender aqueles que necessitavam, mas principalmente nos unimos mutuamente para vivenciar e dividir sentimentos e experiências até então desconhecidos. Trabalhar em equipe não foi apenas usar um esforço coletivo para a resolução dos problemas. Foi olhar para o colega e entender que a fragilidade não atingiu apenas as vítimas da catástrofe, mas também o coração de cada um. Os membros da equipe se apoiavam uns nos outros, dando força mútua e palavras de motivação. Para nós, ver toda aquela desgraça, somada com a saudade do nosso círculo social e com os sentimentos solidários latentes em cada profissional da área da saúde foi realmente doloroso, e essa dor não poderia ser sanada se não fosse pela paciência, colaboração e participação solidária que cada membro trocou entre si. Foi possível aprender, nesta missão, a importância da humanidade, da humanização do atendimento, da empatia e da doação. Retornei com o sentimento de dever cumprido. Vi várias famílias receberem barracas montadas que ofereciam melhores condições de moradia. Mas também ficou a vontade de ajudar mais, pois muito trabalho ainda precisava ser feito. Talvez pudesse ter me doado mais para aquelas pessoas, que, como todos nós, vivem, choram, riem e morrem porque simplesmente são pessoas, assim como eu, assim como nós.

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A equipe de saúde em missão humanitária no Estado de Alagoas: relato de experiência


A equipe de saúde em missão humanitária no Estado de Alagoas: relato de experiência

REFERÊNCIAS

Recebido em 20/11/2011. Aprovado em 06/12/2011.

* Márcio Haubert da Silva – Acadêmico do 8º semestre do Curso de Graduação de Enfermagem da Ulbra/Canoas. E-mail: marciohaubert@ gmail.com. ** Moema do Nascimento Ferreira – Enfermeira, professora do Curso de Graduação de Enfermagem da Ulbra/Canoas. Ms Saúde Coletiva. Orientadora do trabalho. *** Maria Renita Burg Figueiredo – Enfermeira, professora do Curso de Graduação de Enfermagem da Ulbra/Canoas. Ms Saúde Coletiva. Co-orientadora do trabalho.

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AL [internet]. Brasília (BR): Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; [atualizada mensalmente; acesso em 2010 Ago 15]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm. 11. Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde – Datasus [internet]. Brasília (BR): CNESNet; [atualizada em 2010 set 30; acesso em 2010 Ago 15]. Disponível: em: http://cnes. datasus.gov.br/Mod_Ind_Unidade.asp?VEstado=27&VMun=270550). 12. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estatística de população – estimativa 2009 [internet]. Brasília (BR): Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; [atualizada mensalmente; acesso em 2010 Ago 15]. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/ home/estatistica/populacao/estimativa2009/POP2009_DOU.pdf. 13. Brasil. Ministério da Saúde. Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde – Datasus [internet]. Brasília (BR): CNESNet; [atualizada em 2010 set 30; acesso em 2010 Ago 15]. Disponível em: http://cnes. datasus.gov.br/Mod_Ind_Unidade.aspVEstado=27&VMun=270810. 14. Maceió, Brasil turismo blog [internet]. Maceió (BR): Neoline 20052006 [acesso em 2010 Ago 16]. Disponível em: http://www.maceiobrasil. com.br/2007/municipios.php.acao=noticia&noticia=União dos Palmares. 15. Ministério da Saúde. Cadastro nacional de estabelecimento de saúde – Datasus [internet]. Brasília (BR): CNESNet; [atualizada em 2010 set 30; acesso em 2010 Ago 16]. Disponível em: http://cnes.datasus. gov.br/Mod_Ind_Unidade.asp?VEstado=27&VMun=270930. 16. Pinto MLC. Saneamento ambiental e saúde: uma reflexão geossistêmica para o urbano?. In: Pasche F, Cruz IBM. A saúde coletiva: diagnósticos contemporâneos. Ijuí (RS): Unijuí; 2005. 232p. 17. Ministério da Integração Nacional; Secretaria Nacional de Defesa Civil. Conferência geral sobre desastres para prefeitos, dirigentes de instituições públicas e privadas e líderes comunitários. Brasília (BR). 2007. 23p.


EXPECTATIVAS DE PACIENTES RENAIS CRÔNICOS EM TRATAMENTO HEMODIALÍTICO EM UM HOSPITAL DE GRANDE PORTE DO MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE – RS Expectations of patients with chronic renal failure under hemodialysis in a large hospital in the municipality Porto Alegre – RS * Fabiane Regina dos Santos ** Graziella Gasparotto Baiocco *** Maria Cristina Sant’Ana da Silva

Resumo – O objetivo deste estudo foi conhecer a percepção dos pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico com relação às suas expectativas na vida. A abordagem foi qualitativa, realizada no primeiro semestre de 2011, no setor de hemodiálise de um hospital de grande porte no município de Porto Alegre – RS. Foram entrevistados 12 pacientes. Na análise de conteúdo surgiram três categorias: A sombra da morte versus a esperança, O compromisso com a máquina e Não pode isso, não pode aquilo. Conclui-se que a intervenção do enfermeiro na busca de soluções relacionadas às limitações a que o paciente hemodialítico é submetido é de suma importância; é preciso auxiliá-lo a escolher comportamentos que beneficiem seu tratamento e a aceitar as modificações necessárias. Palavras-chave: Eventos adversos, Centro de Terapia Intensiva, Notificação, Subnotifcação.

Abstract - The objective was to investigate the perception of chronic renal failure patients on hemodialysis with respect to their expectations in lif. This is descriptive, qualitative approach, held in the first half of 2011, in the hemodialysis unit of a large hospital in the city of Porto Alegre – RS. We interviewed 12 patients on hemodialysis. The content analysis three categories emerged: The Shadow of Death Versus Hope, Commitment to Machine and Can not This, That Can not. We conclude that the intervention of the nurse in the search for solutions related to the limitations that the patient is undergoing hemodialysis is of paramount importance, you need to help you to choose behaviors that benefit their treatment to accept the necessary changes. Keywords: Chronic renal failure; Hemodialysis; Nursing; Expectation.

INTRODUÇÃO ser melhorados, e destaca a importância do censo anual para o planejamento da assistência dialítica3. Essa assistência, tão necessária, altera a rotina do paciente e de seus familiares ao exigir tempo e modificação dos hábitos alimentares e hídricos. Com isso, sentimentos negativos, como raiva e tristeza, podem surgir. Quando tais sentimentos não são expressos pelo paciente, podem levá-lo ao desespero, à depressão e a tentativas de suicídio. Em alguns casos chega a destruir relações familiares já ameaçadas. A incidência de suicídio é dez vezes superior em pacientes renais crônicos em relação à população em geral1,4. Com experiência profissional em unidade de hemodiálise e convivendo diariamente com pacientes renais crônicos, observa-se a dificuldade de eles aderirem ao tratamento recomendado. Mesmo sendo orientados quanto aos possíveis riscos da não adesão, muitas vezes seguem levando a vida como não portadores de doença crônica. Por que isso acontece? Como eles se sentem frente à doença, ao tratamento e à vida? Visando responder a tal pergunta e a ajudar pacientes renais crônicos, entende-se que é preciso compreendê-los. Espera-se auxiliá-los a fazer escolhas e a encontrar estratégias para aderirem de forma integral ao tratamento, com o intuito de reduzir danos e amenizar sofrimento.

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A doença crônica é considerada um cenário estressante e de longa permanência, não exclusi-vamente para o paciente que é submetido ao tratamento, mas para familiares e cuidadores. Por isso, a responsabilidade assumida pelos envolvidos gera necessidade de cuidado tanto para o portador da doença crônica como para os cuidadores e familiares¹. Nas últimas décadas, as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) têm recebido atenção especial dos profissionais de saúde, destacando-se entre elas a doença renal crônica (DRC), considerada um grande problema de saúde pública. Isso se justifica pela sua magnitude e relevância, pela terapia de alta complexidade, com riscos elevados, diversidade e alto custo¹,². A prevalência de pacientes em tratamento hemodialítico tem apresentado aumento progressivo. Em 2010, a Sociedade Brasileira de Nefrologia registrou 92.091 pacientes em tratamento dialítico, sendo 14.502 casos novos; o número estimado de óbitos foi de 13.235, correspondendo a uma taxa de mortalidade bruta de 17,1%. As principais causas de óbito foram: cardiovascular (35%), infecciosa (24%), cerebrovascular (9%), neoplasia (7%), outras (16%) e desconhecida (8%). A entidade chama a atenção para os indicadores da qualidade da diálise de manutenção, que necessitam


Expectativas de pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico em um hospital de grande porte do Município de Porto Alegre – RS

Objetivo geral – Conhecer a percepção dos pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico com relação às suas expectativas de vida. Objetivos específicos – Descrever as dificuldades encontradas pelos pacientes renais crônicos com relação ao seu tratamento; conhecer as mudanças no estilo de vida após o início do tratamento hemodialítico dos pacientes renais crônicos.

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REVISÃO DA LITER ATUR A A doença renal é uma alteração da função renal que pode manter-se por período variável, caracterizando-se de duas formas: insuficiência renal aguda (IRA) e insuficiência renal crônica (IRC). A caracterização entre uma forma e outra se dará conforme a evolução da doença. Embora, inicialmente, a insuficiência renal possa ser assintomática, os exames físico, laboratorial e por imagem, bem como a aferição da pressão arterial, conferem instrumentos importantes para obtenção do diagnóstico5,6. Na IRA, há perda súbita e quase completa da função renal, que se mantém por períodos variáveis, resultando na incapacidade dos rins em desempenhar suas funções basais de excreção e conservação da homeostase hidroeletrolítica do organismo. As causas da IRA podem ser de origem pré-renal (hipoperfusão do rim), intrarrenal (lesão do tecido renal) e pós-renal (obstrução do fluxo urinário)1,7. Já a IRC se caracteriza pela identificação da natureza de um problema de perda lenta, progressiva e frequentemente irreversível da função renal de depuração (filtração glomerular). Os principais fatores de risco desencadeantes da IRC são: diabetes melito (DM), hipertensão arterial sistêmica (HAS), sexo masculino, raça negra, azotemia – retenção de ureia e outros resíduos nitrogenados no sangue, bem como idade, tabagismo, doenças renais proteinúricas, uropatias obstrutivas e malformações congênitas, além dos fatores de risco cardiovasculares, em especial a dislipidemia, obesidade e o estado inflamatório crônico. No Censo Brasileiro de Nefrologia, de 2010, a HAS, com 35% dos diagnósticos primários, e o DM, com 27%, representaram as principais causas1,8. Quando a doença renal for diagnosticada, deverá ser imediatamente instituído tratamento conservador ou dialítico, com a finalidade de restaurar o bem-estar físico, psicológico e social do paciente; caso o contrário, as complicações podem acarretar a morte. Na progressão da doença renal para o estágio terminal (DRET), seja pela cronicidade e degeneração, seja pelas complicações do tratamento e pelo maior risco de doenças cardiovasculares, é necessária a terapia substitutiva da função renal (TRS)9,10,11.

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Atualmente, o tratamento oferecido para o manejo da IRC consiste em diálise peritoneal (DP), hemodiálise (HD) e transplante renal1. MÉTODO Trata-se de investigação descritiva e exploratória, de abordagem qualitativa. A investigação realizou-se na Unidade de Hemodiálise de um hospital de grande porte na cidade de Porto Alegre – RS. Possui capacidade de prestar assistência nefrológica para cerca de 80 pacientes em programa regular de terapia de substituição renal crônica ambulatorial, além da demanda dos pacientes que necessitam deste tipo de tratamento durante a hospitalização. Os participantes foram doze pacientes portadores de IRC que realizavam tratamento hemodialítico, selecionados intencionalmente. O número foi definido pela saturação de dados, nesse caso, quando deixaram de surgir novas informações12. Foram incluídos aqueles que demonstraram interesse em participar da investigação, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, realizavam o tratamento há pelo menos seis meses e tinham idade mínima de 18 anos. Foram excluídos os portadores de deficiências auditiva, visual e/ou mental. As informações foram obtidas por uma das pesquisadoras, mediante a realização de entrevista com roteiro semiestruturado elaborado para a investigação. Conforme orientações da Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, a investigação iniciou após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição e recebeu aprovação e o número 11-047. Para resguardar o anonimato, os participantes foram identificados com a letra “H” seguida pelo número da sua entrevista. Cada um deles recebeu uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi lido e assinado pelo participante e pelas pesquisadoras, que também ficaram com uma cópia13. Quanto aos resultados da investigação, realizou-se avaliação de variáveis sociodemográficas, idade, sexo, situação conjugal e do tempo de tratamento dialítico. Esses dados foram utilizados para caracterizar o perfil dos participantes. Quanto aos depoimentos, foram analisados segundo o caminho metodológico de Bardin (2007) que apresenta três polos cronológicos: pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação14.

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram entrevistados 12 pacientes renais crônicos submetidos à terapia hemodialítica, sendo a maioria do sexo masculino (sete). O dado é condizente com o atual Censo Brasileiro de Nefrologia, que aponta 57% de homens em diálise. Quanto à faixa etária, sete eram

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OBJETIVOS


Expectativas de pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico em um hospital de grande porte do Município de Porto Alegre – RS

maiores de 50 anos. Conforme os dados parciais do censo atual, o índice de prevalência incide entre 19 a 64 anos, totalizando 67,7% dos pacientes em diálise nesta faixa. Quanto ao tempo de diálise, variou entre dois e dez anos. Relacionado ao estado civil, apenas quatro relataram ter companheiro3. De acordo com os depoimentos, estabeleceram-se três categorias de análise: A sombra da morte versus a esperança, O compromisso com a máquina e Não pode isso, não pode aquilo. A sombra da morte versus a esperança O tratamento hemodialítico é um procedimento invasivo, sintomático e doloroso, com várias restrições físicas, alimentares e sociais. Os pacientes renais crônicos submetidos a esse tratamento se deparam cotidianamente com a morte, pois a terapia não contempla expectativa de cura, conforme os relatos a seguir: Que continue tudo bem. O que eu vou esperar mais da hemodiálise? Que prolongue a minha vida. Não tenho mais o que esperar da hemodiálise (H10, 35 anos).

Antes de tudo isso [de iniciar o tratamento hemodialítico] eu achava que tinha cura [...] achava que ia me curar, até me acostumar (H3, 53 anos). [...] Se não fosse isso aí, eu já teria [morrido] (H4, 61 anos). [...] É durar mais alguns anos, nada além disso. Não que vá melhorar, durar mais uns anos… (H7, 61 anos). A doença renal crônica nos remete a um dos grandes pontos da enfermidade: a convivência permanente com um estado de doença, que evolui lenta e gradualmente, com períodos de remissão que levam à fase terminal. Tal etapa traz a convivência com a possibilidade real ou fantasiada da morte. O paciente sente elevada angústia em relação à morte, preocupação que se torna a linha principal da sua vida e traz consigo grandes mudanças nas relações entre si, com seu corpo e com os outros15,16. Ao mesmo tempo que convivem com a proximidade da morte, os pacientes mantêm uma forte chama

Eu tenho que sair daqui o quanto antes [...] o tratamento deveria ser um pouco melhor [...]. Pretendo entrar na fila do transplante o quanto antes, para sair daqui, né? (H2, 35 anos). Ah, estou esperançoso no meu transplante [...] não é a cura, mas a qualidade de vida. Eu vou poder estar mais livre para outras coisas (H6, 53 anos). O que eu espero é um transplante, sem transplante não teria expectativa nenhuma [...] (H4, 61 anos). Assim, entendemos que a possibilidade de realização de transplante renal é o que impulsiona a continuidade do tratamento dos indivíduos entrevistados, o que lhes dá esperança para reassumirem papéis extraídos pela enfermidade. O compromisso com a máquina O paciente hemodialítico fica dependente da máquina, de três a quatro horas diárias, por três vezes por semana. Nesse período, pode haver angústia, medo, revolta e sentimento de inferioridade, bem como sintomas provocados pela terapia, como náuseas, vômitos, hipotensão, cefaleia e cãibras, entre outros. Às vezes passo muito mal, a pressão baixa, aquela dorzinha que dá na cabeça (H2, 35 anos). [...] a gente, que faz hemodiálise, é sofrimento e dor [...] (H3, 53 anos). O compromisso com a máquina, imprescindível à manutenção da vida, e que retira o ser humano do seu cotidiano e redefine sua difícil rotina é apontado pelos depoimentos seguintes: [...] Sou prisioneira [do hospital em que realiza a diálise], a gente tem que estar aqui dia sim, dia não, chova, faça sol, natal, inverno, verão. Não tem como escapar, a hemodiálise é uma prisão (H12, 59 anos). Ter que vir três vezes por semana [...]. Independente de qualquer situação, tu tens que vir, estando bem ou não. A gente não pode

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O tratamento é para manter vivo. Em relação à [expectativa de] vida, nunca levei muita fé [...] o cara não dura muito tempo em hemodiálise [...] Eu não aguento mais, é horrível [...]. Tem horas que dá vontade da gente se matar, vendo todo o mundo aproveitar a vida [...] (H1, 38 anos).

de esperança com a possibilidade do transplante renal, embora saibam que o mesmo não trará a cura e sim a expectativa da melhora quanto à qualidade de vida. O transplante é visto pelos pacientes como a única chance de retorno às suas atividades exercidas antes da doença.


falhar [...] eu fico bem angustiada, pensando em casa, nos filhos [...]. (H9, 38 anos).

breviver [...] [tem de] tomar medicação, levar a vida mais light (H6, 53 anos).

Eu nunca tive horário, agora eu estou tendo. [...], agora tenho que levantar cedo [...] (H11, 68 anos).

O fato de não poderem comer os alimentos que gostariam e de não beber a quantidade e tipo de líquidos que desejariam representa uma grande barreira a ser enfrentada dia após dia, causando-lhes grande sofrimento. Nesse sentido, a hemodiálise torna-se uma forma de tratamento que aprisiona e limita as ações dos pacientes, comprometendo inclusive sua liberdade para viajar19. Mas, conforme os depoimentos, o que transparece é justamente o tolhimento à autonomia do paciente, que não tem escolhas. É fazer a hemodiálise, é aguardar um transplante renal, é esperar, esperar e esperar, docilmente.

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As modificações exigidas pela nova rotina também interferem nas questões laborais, conforme enfatizado nos depoimentos de H11 (68 anos): eu sou taxista e não estava acostumado com este tipo de compromisso; de H3 (53 anos): antes eu era motorista de caminhão. Eu fui até onde dava, depois não deu mais [...]; de H7 (61 anos): tive que parar de trabalhar, [...] inclusive do que eu mais gostava de ser, cozinheira, para mim foi a pior parte. Como visto, a insuficiência renal causa grande transformação na vida de seus portadores, principalmente por ter como forma de tratamento a hemodiálise, que leva à dependência da equipe multiprofissional e da máquina. Tal dependência provoca modificações no processo de vida do indivíduo; e quanto maior o seu grau, maiores serão as alterações na maneira de ser, de pensar e de agir. Os limites impostos pela hemodiálise levam os pacientes a enxergar a rotina do tratamento sob uma ótica negativa, uma vez que ocasiona comprometimento na realização de atividades diárias, impactando principalmente nas laborais17,18. Pôde-se constatar que o compromisso com a máquina causa nitidamente uma sensação de perda aos depoentes, seja de liberdade, da própria saúde ou do trabalho. Não pode isso, não pode aquilo Os pacientes hemodialíticos são submetidos a inúmeras restrições, sejam alimentares, físicas ou sociais. Essas limitações, que a terapia exige, tornam-se exaustivas e difíceis de serem cumpridas ao longo do tempo, conforme os relatos: Eu jogava bola, hoje eu não jogo. Eu corria de manhã, eu saía de noite, eu bebia cerveja. [Agora] refrigerante controlado, água controlada, comida controlada (H1, 38 anos). Não pode comer muita fruta, bebida de álcool nem pensar, comer coisas gordas, comer feijão, que tem potássio. É difícil comer assim, pouquinho (H3, 53 anos). Todos os anos eu ia para a praia, [...] ia final de dezembro e voltava só final de fevereiro. Muita coisa que eu fazia antigamente [não faço mais] (H5, 46 anos). Depois que tu perdes a saúde, tens que ter uma disciplina. Não tem outra forma de so-

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CONSIDER AÇÕES FINAIS Assim, acredita-se que a intervenção do enfermeiro na busca de soluções relacionadas às limitações a que o paciente hemodialítico é submetido é de suma importância. Para isso, é preciso estabelecer diálogo e fornecer informações úteis, esclarecedoras e de fácil compreensão, procurando sanar suas dúvidas e facilitar o entendimento sobre o tratamento. Mas, acima de tudo, é preciso auxiliá-lo a escolher comportamentos que beneficiem seu tratamento, a aceitar as modificações necessárias e a aprender a lidar com elas. Dessa forma, a qualidade de vida pode melhorar, e o sofrimento, diminuir.

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Artigo de Pesquisa

Expectativas de pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico em um hospital de grande porte do Município de Porto Alegre – RS


Expectativas de pacientes renais crônicos em tratamento hemodialítico em um hospital de grande porte do Município de Porto Alegre – RS

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* Fabiane Regina dos Santos – Enfermeira graduada pela Universidade Luterana do Brasil ULBRA– Campus Gravataí. ** Graziella Gasparotto Baiocco – Enfermeira do setor de Hemodiálise do Grupo Hospitalar Conceição. Mestre em Medicina e Ciências da Saúde pela Pontifícia Universidade Católica – PUCRS. *** Maria Cristina Sant’Ana da Silva – Mestre em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Professora do Curso de Enfermagem da ULBRA – Campus Gravataí.

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Ano 1 – Número 5, Novembro/Dezembro de 2011 - paginas de 21 a 25

Fabiane Regina dos Santos / Graziella Gasparotto Baiocco / Maria Cristina Sant’Ana da Silva

Recebido em 10/11/2011. Aprovado em 28/11/2011.

Artigo de Pesquisa

9. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Prevenção clínica de doença cardiovascular, cerebrovascular e renal crônica. Brasília, 2006. (Cadernos de atenção Básica, n. 14). Disponível em: http://www. scribd.com/doc/3381125/Caderno-de-Atenção-Basica-CoracaoCerebro-Rim. 10. Santos FR, Filgueiras MST, Chaoubah A, Bastos MG, De Paula RB. Efeitos da abordagem interdisciplinar na qualidade de vida e em parâmetros laboratoriais de pacientes com doença renal crônica. Revista de Psiquiatria Clínica, São Paulo, v. 35, n. 3, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S010160832008000300001&script=sci_arttext&tlng=es>. Acesso em: 16 out. 2010. 11. Oliveira FC, Alves MDS, Bezerra AP. Co-morbidades de pacientes com doença renal: atendimento terceirizado de nefrologia. Acta Paulista de Enfermagem, v. 22, p. 476-480, 2009. Número Especial – Nefrologia. 12. Daugirdas JT, Blake PG, Ing TS. Manual de diálise. 3ª ed. Rio de Janeiro: Medsi; 2003. 13. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução 196, de 16 de outubro de 1996. Diretrizes e Normas para Pesquisa em Seres Humanos. Brasília: Diário Oficial da União, 16 out. 1996.


Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem* Adverse events in Intensive Care Unit: behavior assessment of a nursing team ** Rochelle Soares Cruz *** Rita Catalina Aquino Caregnato

Resumo – Esta pesquisa objetivou conhecer o comportamento de uma equipe de enfermagem frente aos eventos adversos (EAs) ocorridos em uma Unidade de Terapia Intensiva. Estudo exploratório descritivo quantitativo, amostra 49 profissionais da enfermagem de um hospital do Rio Grande do Sul. Dados coletados por meio de questionário. Perfil da amostra: 49% tinham entre 21 e 30 anos. Dos pesquisados, 91,8% admitiram envolvimento ou presenciaram EA e 67,3% responderam que o paciente necessitou maior monitorização ou intervenções. Para 91,8%, as mudanças frequentes no quadro funcional favorecem ocorrências adversas. O medo da punição é o principal motivo para a não notificação. Evidenciou-se comportamento favorável e maturidade da equipe em relação ao gerenciamento dos EAs, embora sejam jovens e pouco experientes. Palavras-chave: Efeitos adversos; unidade de terapia intensiva; comportamento.

Abstract – This paper’s goal was to understand the behavior of a nursing team facing adverse events (AEs) that happened at the Intensive Care Unit. Exploratory descriptive quantitative study carried out with a 49 nursing professionals sample of a hospital of Rio Grande do Sul. Data collection was through a questionary created by the researchers. Sample profile: 49% were between the ages of 21 and 30 years old. Form the people researched, 91,8% admitted involving or witnessing an AE and 67,3 % responded that the patient needed a greater monitoring or interventions. For 91,8%, the frequent changes on the staff favor adverse events. 77,5% of the participants report the AE to the chief of staff immediately, with the fear of being punished as the main factor for non-reporting: 59,2%. There were evidences of a favorable behavior and maturity of the staff towards AEs management, despite their being young and having little experience. Keyword: Adverse effects; intensive care unit; behavior.

Ano 1 – Número 5, Novembro/Dezembro de 2011 - paginas de 26 a 30

Introdução A segurança do paciente na assistência à saúde tem sido discutida há algumas décadas, com diferentes abordagens. A definição do “Evento Adverso” modificou-se ao longo do tempo, visando melhor entendimento deste fenômeno1-2. Entendem-se como Eventos Adversos (EAs) as “complicações indesejadas decorrentes do cuidado prestado aos pacientes, não atribuídas à evolução natural da doença de base”3. Os altos índices de situações adversas envolvendo o cuidado na assistência à saúde mostram a importância da obtenção de dados que possam auxiliar a diminuir a ocorrência dos erros. Cada vez mais, hospitais investem na busca de indicadores que possam apontar possíveis falhas na assistência, norteando as ações do gerenciamento de riscos, com objetivo de oferecer um cuidado mais seguro e qualificado2,4. Os eventos adversos, na década de 80, eram chamados de ocorrências iatrogênicas ou iatrogenias2. Naquela época foi publicado um estudo realizado durante cinco anos com base em registros, evidenciando que de 145 ocorrências 63% relacionavam-se a erros humanos2. Em 1999, a publicação To Err is Human: building a safer health system, do Instituto de Medicina Americano, foi um marco para a segurança do paciente2,5; este mostrou que um milhão de EAs evitáveis contribuíram para a morte de 44.000 a 98.000 americanos/ ano durante a assistência à saúde2.

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Em resposta aos inúmeros processos judiciais abertos por negligência nos serviços de saúde, realizou-se um estudo denominado Harvard Medical Pratice Study (HMPS), com amostra de 30.121 prontuários de pacientes internados em 1984, avaliando 52 hospitais de Nova York, revelando 3,7% de EAs, sendo destes, 25% por negligência1-2,6-7. Em 1992, no Colorado e em Utah, analisaram-se registros de 15.000 admissões, identificando-se 2,99% de EAs; destes, 55,58% foram considerados preveníveis2,6,8. Outro estudo, realizado na China, sobre incidentes críticos em pacientes adultos internados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), no período de 3 anos, analisou 281 relatos que apontaram como incidentes mais comuns aqueles relacionados ao manuseio de vias aéreas e de drenos, tubos e cateteres, sem alteração relevante do quadro clínico do paciente em 54% dos casos2,7. A literatura aponta vários fatores que predispõem à ocorrência de situações adversas; contudo, o fator humano ainda é o principal deles1-2,5,9-10-11. Erros de profissionais da saúde frequentemente são manchetes sensacionalistas nos meios de comunicação1, expondo detalhes assustadores que podem levar os profissionais a continuar negando o problema12-13. O erro ainda é tratado de maneira fechada, expresso por sentimentos como culpa, vergonha, sensação de incompetência e desatenção, fazendo com que o medo da punição

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Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem

Objetivos Definiu-se como objetivo geral conhecer o comporta-mento de uma equipe de enfermagem frente aos eventos adversos ocorridos em uma UTI de adultos. Os objetivos específicos foram: a) levantar os eventos adversos identificados pela equipe de enfermagem no atendimento ao paciente grave internado em uma UTI; b) investigar o comportamento pessoal de cada membro de uma equipe de enfermagem frente à ocorrência de um evento adverso na assistência oferecida ao doente crítico; c) avaliar o entendimento da equipe frente à conduta adotada pela chefia de enfermagem em relação à ocorrência dos eventos adversos.

Trata-se de estudo de campo exploratório descritivo com abordagem quantitativa. O campo de ação foi uma UTI de um hospital geral de médio porte, situado na região metropolitana de Porto Alegre, que atende a mais de 600 pessoas/dia na emergência e pronto atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS), de convênios e de particulares. O hospital dispõe de uma UTI com 20 leitos, sendo 2 para atendimento de pacientes em isolamento e 18 para casos clínicos e cirúrgicos. Considerou-se a população os 84 profissionais da equipe de enfermagem que trabalham nos três turnos na UTI pesquisada, sendo a amostra constituída de 49 destes. Os critérios para escolha dos profissionais de enfermagem participantes da pesquisa foram que: a) trabalhassem na UTI pesquisada há mais de 3 meses; b) estivessem presentes no momento da coleta de dados; e c) aceitassem participar da pesquisa. O instrumento utilizado para coleta dos dados foi um questionário elaborado pela pesquisadora, contendo um cabeçalho que explicava o objetivo do estudo e a definição adotada nesta pesquisa para Evento Adverso (EA). O questionário foi dividido em duas partes, sendo a primeira de identificação e a segunda investigativa do tema em estudo. Na identificação investigou-se: sexo,

Resultados Participaram de pesquisa 6 enfermeiros (12,2%) e 43 técnicos em enfermagem (87,8%) representando 58,3% dos profissionais que trabalham na UTI pesquisada. Quanto ao perfil da amostra, constatou-se: 75,5% (37) do sexo feminino; faixa etária: 49% (24) entre 21 e 30 anos, 36,7% (18) entre 31 e 40 anos, 14,3% (7) entre 41 e 50 anos, não havendo sujeitos com mais de 50 anos; 34,7% (17) concluíram a formação entre 3 meses e 2 anos, 30,6% (15) estavam formados há mais de 2 até 5 anos, 18,4% (9) há mais de 5 até 10 anos e 16,3% (8) há mais de 10 anos; referente ao tempo de atuação na área de terapia intensiva, 55,1% (27) trabalhavam de 3 meses até 2 anos, 30,6% (15) há mais de 2 até 5 anos, 8,2% (4) há mais de 5 até 10 anos e 6,1% (3) há mais de 10 anos; em relação ao tempo de atividade exercida na UTI pesquisada, 65,3% (32) trabalhavam de

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Método

idade, profissão (enfermeiro, técnico ou auxiliar de enfermagem), tempos de formação, de trabalho em UTI e na UTI em estudo. As perguntas em relação aos EAs foram 9 questões fechadas, permitindo escolhas múltiplas, podendo o participante expressar sua opinião em 6 delas, por conter um item aberto. As variáveis pesquisadas foram: 1) condições de identificar um EA durante a assistência; 2) ter presenciado ou estar diretamente envolvido em algum EA durante a assistência; 3) consequências dos EAs ocorridos na assistência; 4) EA mais frequentes na UTI; 5) motivos atribuídos para a ocorrência dos EA; 6) existência de protocolo para notificação dos eventos adversos; 7) comportamento frente a um EA; 8) fatores que influenciam a não notificação do EA; e 9) sentimentos da equipe em relação à conduta tomada pela chefia quando há notificação de um EA. O projeto foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética da instituição do estudo e posteriormente pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Luterana do Brasil (COEP-ULBRA), em setembro de 2010, com o número de registro 2010-450H. A pesquisa realizou-se após a liberação dos dois comitês, em outubro de 2010. O agendamento para a coleta de dados ocorreu por contato telefônico com a enfermeira gerente da UTI, que determinou datas e horários para coleta, comunicando aos enfermeiros a realização da pesquisa. Nos dias previamente marcados, a pesquisadora chegou à UTI, apresentou-se ao enfermeiro do turno e verificou a disponibilidade de a equipe responder ao questionário. O enfermeiro reuniu os profissionais de enfermagem presentes e a pesquisadora explicou os objetivos e os critérios de inclusão, entregando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aos que manifestaram interesse em participar; o TCLE foi assinado em duas vias, ficando uma com a pesquisadora e outra com o pesquisado. A pesquisadora permaneceu no local até o término do preenchimento do instrumento, agradecendo a participação de cada sujeito. Os dados posteriormente foram analisados através de percentuais simples.

Relato de Experiência

leve à subnotificação1. Embora seja da natureza humana cometer erros, é também humano criar soluções, identi-ficar alternativas e enfrentar desafios futuros14. EAs caracterizam-se por uma sucessão de falhas do sistema hospitalar; por isso, merecem uma abordagem ampla com enfoque nas situações reais de dano, pois podem gerar desde o aumento dos custos no tratamento até a incapacitação do paciente, além de mostrar o distanciamento entre o cuidado ideal e o cuidado real3,9. A escolha do tema EAs surgiu impulsionada pelo interesse em investigar este fenômeno tão presente na assistência à saúde e, por tantas vezes, vivenciado no exercício das atividades em UTI. A questão norteadora deste estudo direcionou-se para a investigação do comportamento de uma equipe de enfermagem frente ao evento adverso ocorrido em uma UTI.


Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem

%

Úlcera de Pressão.

40

81,6

Perda acidental de SNE*/SNG*.

33

67,3

Perda acidental de TOT*/TQT*.

14

28,6

Erros relacionados à administração de medicamentos.

14

28,6

Perda acidental de Cateteres Venosos (central ou periférico).

12

24,5

Discussão

Queimaduras relacionadas à aplicação de frio ou calor.

02

4,1

Outros.

02

4,1

O perfil da amostra caracterizou-se por uma equipe predominantemente jovem: 49% tinham idades entre 21 e 30 anos; 34,7 % tempo de formação inferior a dois anos; 55,1% atuavam há no máximo dois anos em UTI; e 65,3% desempenhavam suas atividades na UTI pesquisada de três meses até dois anos, apontando para profissionais pouco experientes no cuidado ao paciente crítico. Intenso dinamismo e complexidade são características inerentes das UTIs1, podendo estes fatores apresentarem-se como atrativos aos jovens recém-formados que desejam ampliar seus conhecimentos e pelas inúmeras oportunidades que as UTIs oferecem, no sentido de aprendizado e desenvolvimento de habilidades técnico-científicas através da prestação da assistência direta ao paciente gravemente enfermo15. Sob o enfoque dos EAs, um estudo sobre ocorrências iatrogênicas com pacientes submetidos à ventilação mecânica em UTI, realizado em 1998, apontou que, quando comparadas às consequências advindas do desempenho dos profissionais e dos equipamentos, observou-se que as dos últimos tendem a apresentar menor gravidade16. Neste estudo pode-se afirmar que 97,0% da amostra

Quadro 1 – Consequências relacionadas aos EAs apontadas pela equipe de enfermagem

Consequência

N

%

Paciente necessitou maior monitorização ou intervenções que revertessem a situação, sendo esta solucionada.

33

67,3

Lesão irreversível ou óbito do paciente.

12

24,5

7

14,3

Não ocorreu nenhuma alteração no quadro clínico do paciente.

Quadro 2 – Eventos adversos mais observados pelos sujeitos

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Evento Adverso

*SNE: Sonda Nasoentérica; SNG: Sonda Nasogástrica; TOT: Tubo Orotraqueal; TQT: Traqueostomia. Quadro 3 – Percepção da equipe em relação aos fatores que favorecem as ocorrências de EAs

Motivo

N

%

Mudanças frequentes no quadro funcional.

45

91,8

Pessoal despreparado para executar a assistência.

25

51

Falta de atenção do pessoal.

23

46,9

Carga de trabalho excessiva.

07

14,3

Deficiência na revisão das rotinas assistenciais.

07

14,3

No que se refere ao protocolo para notificação de EAs, 57,1% (28) afirmaram ter conhecimento da existência do mesmo na unidade, 16,3% (8) não tinham conhecimento e 26,5% (13) não tinham certeza da sua existência.

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Rochelle Soares Cruz, Rita Catalina Aquino Caregnato

N

Sobre o comportamento da equipe frente à ocorrência de um EA, evidenciou-se que 77,5% (38) comunicam imediatamente sua chefia, 10,2% (5) solicitam ajuda de um colega antes de comunicar à chefia, 18,4% (9) avaliam a situação e somente comunicam se julgarem necessário. As justificativas dos motivos para a não notificação de um EA foram: 59,2% (29) medo da punição; 32,6% (16) sentimento de incompetência; 14,3% (7) vergonha; 10,2% (5) relataram que nenhum motivo deveria ser apontado como justificativa para a não notificação de um EA, afirmando comunicar a ocorrência deste em qualquer circunstância; e um sujeito (2,1%) relatou que não comunicaria um EA. Dos enfermeiros que participaram da pesquisa, 50% (3) relataram que não notificam um EA à sua chefia em caso de não acharem necessário. Os sentimentos da equipe em relação à conduta tomada pela chefia quando há a notificação de um EA foram: 93,9% (46) acreditam que falar sobre o assunto é uma medida educativa, que pode diminuir as chances da ocorrência de um novo erro; 4,1% (2) entendem que falar sobre o assunto só gera conflitos e aumenta as chances para a ocorrência de um novo erro; 4,1% (2) apontaram que se sentem mais observados, porém entendem que esta é uma medida de segurança; 2,1% (1) sentem-se mais observados e constrangidos perante seus colegas; e 2,1% (1) afirmaram que falar sobre o assunto só serve para expor os envolvidos.

3 meses até 2 anos, 26,5% (13) de 2 até 5 anos, 4,1% (2) há mais de 5 até 10 anos e 4,1% (2) há mais de 10 anos. Sobre a identificação de um EA durante a assistência: 97,9% (48) afirmaram sentir-se em condições de perceber a ocorrência deste e 2,1% (1) informou não ter certeza se ser capaz de identificar um EA. Ao serem questionados se haviam presenciado ou estiveram diretamente envolvidos em algum EA durante a assistência, 91,8% (45) responderam que sim; 6,1% (3) negaram o envolvimento; e 2,1% (1) não tinham certeza de ter presenciado um EA.


sentem-se aptos a reconhecer uma situação adversa, sendo um ponto favorável ao gerenciamento destes eventos. Instituir uma cultura de segurança auxilia no apontamento das falhas no processo assistencial e direciona as medidas preventivas2. Estes tipos de medidas, associadas à educação continuada e à melhora na estrutura das UTIs, possibilitarão o planejamento de estratégias mais efetivas para dimi-nuição deste tipo de ocorrência9. Constatou-se alto índice de envolvimento direto ou indireto por parte da equipe em um EA, pois 91,8% dos pesquisados afirmaram ter presenciado ou mesmo vivenciado situações adversas nas suas atividades. O profissional, quando reconhece sua participação em um EA, possibilita apontar algumas falhas que podem ser corrigíveis, tanto estruturalmente quanto nos processos de trabalho2. Diante das consequências relacionadas aos EAs, 67,3% da amostra apontou que houve reversão do quadro após monitorização ou intervenções. Na percepção da equipe estudada, os EAs mais comuns foram: úlcera de pressão, perda acidental de SNE/SNG, perda acidental de TQT/TOT, conforme percentuais apresentados no Quadro 2. Outro estudo9 apontou como ocorrências mais frequentes as relacionadas aos cateteres, TOTs, sondas e drenos, seguidos por erros com medicação, equipamentos e procedimentos, corroborando a presente pesquisa. Alguns causadores de EAs são: a carga de trabalho excessiva; deficiência na revisão das rotinas assistenciais(2); condições de trabalho, muitas vezes duplas jornadas; condições de saúde dos profissionais9,18; inexperiência dos jovens; falhas de comunicação; e inserção de novas tecnologias1-2,3,9. A maioria desses fatores foi evidenciada pelos participantes desta pesquisa; contudo, o principal motivo atribuído pela equipe foi o das mudanças frequentes no quadro funcional. A UTI estudada possui alta rotatividade; isso se confirma à medida que a equipe identifica as mudan-ças frequentes no quadro funcional como um potencial problema relacionado à ocorrência dos EAs. Esta característica pode justificar a falta de conhecimento ou a incerteza acerca da existência de um protocolo para notificação e registro dos EAs na Unidade, pois 16,3% não conheciam o protocolo e 26,5% não tinham certeza de que este existia. Os dados relacionados aos EAs devem servir de subsídios para a adoção de medidas educativas a respeito dos mesmos17. Todos os indicadores podem fornecer isoladamente informações valiosas sobre falhas na assistência e apontar um possível motivo para que elas estejam ocorrendo, norteando medidas gerenciais mais efetivas. Portanto, é necessário que se insiram no ambiente hospitalar programas de registros voluntários, incentivando a notificação dos EAs, visando à melhora na qualidade do atendimento prestado2. No âmbito do cuidado, as medidas de gerenciamento não devem

limitar-se apenas aos fatores diretamente relacionados à ocorrência dos EAs, mas congregar ações de maneira global. Os enfermeiros estão diretamente ligados à promoção de um ambiente seguro5. Outros autores1,3,5,9-10,12,17 afirmam que a subnotifi-cação dos EAs ainda se faz muito presente na assistência, dificultando inclusive o estudo do tema. Contrariamente, nesta pesquisa, um número significa-tivo de participantes demonstrou reconhecer a impor-tância da notificação dos EAs, pois 77,5% deles apresentaram comportamento positivo em relação à notificação imediata à chefia frente à ocorrência de um EA. Entretanto, mais condizentes com a realidade apresentada na literatura, 18,4% avaliam a situação e somente comunicam se julgarem necessário; 10,2% solicitam ajuda de um colega antes de comunicar à chefia. Ainda sobre o processo de notificação dos EAs, os resultados desta mostraram-se mais próximos aos das pesquisas realizadas, pois 59,2% apontaram o medo da punição como o principal fator para a não notificação de um EA. Os dois fatores em conjunto – comportamento da equipe e processo de notificação – refletem um dos grandes problemas inerentes ao estudo dos EAs: a subnotificação das ocorrências1,5,12. Medidas punitivas adotadas frente aos erros, sanções ético-legais e administrativas possíveis, práticas comuns no segmento hospitalar, levam aos profissionais sentimentos de insegurança, culpa, medo, desconfiança nas pessoas e vergonha1,3,5,9-10,12,17. Em 2002, uma pesquisa sobre erros com medicação mostrou que os envolvidos nas situações de erro sofreram punições, tais como: advertência verbal, advertência escrita e em dois casos, demissão12. Esse tipo de conduta não contribui para a diminuição das ocorrências; ao contrário, incentiva ocultar os erros, impedindo o real dimensionamento do problema3. Estudo realizado em 2002 evidenciou, em ordem decrescente de citação, as principais condutas ado-tadas pelos enfermeiros frente a um EA: comunicar o médico, intensificar os controles e, em terceiro lugar, comunicar à chefia de enfermagem da UTI15. Por outro lado, 50% dos enfermeiros que participaram desta pesquisa responderam que não comunicam um EA à chefia caso não achem necessário. A maioria dos sujeitos apresentou comportamento favorável também em relação à conduta tomada pela chefia, quando há notificação de um EA, pois 93,9% afirmaram que falar sobre o assunto é uma medida educativa. Infere-se que a equipe esteja disponível no sentido de colaborar com os registros e com a coleta de dados relevantes ao estudo dos EAs ocorridos em sua unidade. Acredita-se que programas de educação continuada possam ser bem-aceitos pelo grupo, visto que este se apresenta comprometido em comunicar as ocorrências à sua chefia, facilitando o diagnóstico de propensão ao erro. Um pequeno percentual respondeu negativamente sobre a conduta tomada pela chefia,

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Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem


Eventos adversos na Unidade de Terapia Intensiva: avaliação do comportamento de uma equipe de enfermagem

provavelmente por experiências anteriores de condutas punitivas e expositivas adotadas.

Consider ações finais Esta pesquisa possibilitou conhecer o comportamento de uma equipe de enfermagem frente aos eventos adversos ocorridos em uma UTI. Evidenciou-se com-portamento favorável e maturidade da equipe em relação ao gerenciamento dos EAs, embora esta apresentasse um perfil jovem e pouco experiente. Os eventos adversos mais apontados pela equipe de enfermagem no atendimento ao paciente grave foram as úlceras de pressão e a perda acidental de SNG/SNE. Constatou-se que a maioria dos profissionais pesquisados comunica imediatamente sua chefia frente à ocorrência de um evento adverso na assistência oferecida ao doente crítico, evidenciando um comportamento maduro e consciente. Evidenciou-se que grande parte da equipe avalia positivamente a conduta adotada pela chefia de enfermagem em relação à ocorrência dos eventos adversos, percebendo esta como medida educativa. O estudo dos eventos adversos envolve uma complexa análise dos vários fatores associados. Não se podem ignorar as inúmeras brechas apresentadas pelo sistema; porém, além de corrigir estas falhas, é importante que as pessoas envolvidas no gerenciamento dos riscos levem em consideração a natureza falha do ser humano, investindo em condutas educativas, não punitivas e de conscientização dos profissionais diretamente ligados ao cuidado.

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Recebido em 22/01/2012. Aprovado em 01/02/2012. * Artigo apresentado como trabalho de conclusão do curso de graduação em Enfermagem da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA/ Canoas – RS. ** Rochelle Soares Cruz – Enfermeira do Hospital de Pronto Socorro de Canoas. E-mail: rochellescruz@yahoo.com.br. *** Rita Catalina Aquino Caregnato – Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Luterana do Brasil – ULBRA. Canoas/RS. Orientadora. E-mail: carezuca@terra.com.br.

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Ano 1 – Número 5, Novembro/Dezembro de 2011 - paginas de 26 a 30

Referências

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Modelo de Gestão Contextualizando a inserção da enfermagem na construção de um modelo de gestão par a o Hospital Nossa Senhor a da Conceição, Porto Alegre/RS. * Márcio Neres dos Santos ** Carine Paim da Silva Martins *** Christian Negeliskii Recém-completados 51 anos, o Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC) é um hospital público de grande porte que realiza atividades de assistência, ensino e pesquisa, sendo referência no sistema municipal e estadual de saúde no atendimento aos pacientes portadores de patologias de média e alta complexidade1. Integrado ao Sistema Único de Saúde – SUS – o HNSC atende a uma clientela universalizada, sendo que 100% dos pacientes são provenientes do SUS. O HNSC é uma das unidades que compõem um complexo de assistência à saúde, denominado Grupo Hospitalar Conceição (GHC). As unidades que integram o GHC estão localizadas no Eixo Norte-Baltazar, na cidade de Porto Alegre/RS, exceto o Hospital Fêmina que se situa no bairro Moinhos de Vento. Até a década de 1990, o GHC era subordinado à Presidência da República, através da Casa Civil. No dia 10 de maio de 1990, pelo Decreto número 99.240, tornou-se vinculado ao Ministério da Saúde (Fig. 1). Alguns anos depois, no início da década de 2000, iniciaram-se as discussões sobre a manutenção do caráter público da instituição, contanto com a mobilização de diversos atores sociais (gestores, trabalhadores, usuários, entidades sindicais, entre outros). Assim, no ano de 2003, todas as unidades vinculadas ao GHC passam a atender exclusivamente pelo SUS2. O GHC assume a postura de manter suas portas abertas 24 horas e acolher a todos os usuários que procuram seus serviços. O complexo do GHC é formado pelas unidades hospitalares Conceição (geral), Criança Conceição (pediátrico), Cristo Redentor (trauma e neurocirurgia) e Fêmina (materno-infantil). Além disso, também é referência na Atenção Básica através do Serviço de Saúde Comunitária que conta com doze unidades básicas de saúde e três centros de atenção psicossocial. No ano de 2010, o GHC foi responsável por 35% de todas as internações pelo SUS na cidade de Porto Alegre/RS1. O GHC forma a maior rede pública de hospitais do Sul do país. Oferta para o sistema de saúde 1.564 leitos, sendo responsável pela internação de 59,9 mil usuários por ano. Com uma força de trabalho de 7.913 profissionais, o GHC responde por cerca de 2,2 milhões de consultas e outras 36,1 mil cirurgias anuais1. Hoje, o GHC faz o diagnóstico de mais da metade dos casos esperados de câncer para a população da cidade de Porto Alegre/RS. E, também é importante relatar que 25% dos atendimentos de urgência e emergência do município são prestados em uma das portas hospitalares do grupo1. Diante desse cenário, a instituição parte do princípio de que todo o incremento da eficiência e eficácia nos

processos de gestão e assistência somente tem sentido se estiver a serviço de uma atenção humanizada com usuários e trabalhadores. Atualmente, a unidade HNSC direciona seus esforços para aperfeiçoar seus processos e fluxos assistenciais e gerenciais; para isso, torna-se necessária a incorporação de novos atores e de novas ferramentas de gestão que forneçam informações relevantes para um processo decisório baseado em evidências e não somente na experiência da instituição e de seus colaboradores. O enfermeiro, como responsável pelo gerenciamento do cuidado, pode ser um profissional estratégico no planejamento e na implementação de processos que possibilitem a gestão profissional em saúde. Este ensaio objetiva contextualizar a inserção da enfermagem no modelo de gestão adotado pelo Hospital Nossa Senhora da Conceição, além de possibilitar a reflexão sobre algumas mudanças no processo de trabalho da enfermagem disparadas com a adoção desse modelo. Vide Figura 1 (pagina 34) A Unidade Hospital Nossa Senhora da Conceição A história da unidade HNSC começa com a criação da Casa de Saúde Nossa Senhora da Conceição, na década de 1960, como uma unidade privada, pelo empreendedor Jahyr Boeira de Almeida. Na verdade, o nome da Casa de Saúde foi uma alusão à data em que se comemora o dia de Nossa Senhora da Conceição (também é a data do aniversário do fundador), dia 8 de dezembro2. Em 20 de fevereiro de 1975, em pleno fervor da ditadura militar, Ernesto Geisel, então presidente da República, desapropriou as quatro unidades hospitalares e nomeou um interventor para dirigir os hospitais. Dessa forma, alterou-se a característica social que, sob intervenção federal, formou um grupo hospitalar com gerenciamento centralizado, originando o GHC2. O HNSC é um hospital geral, exceto para o atendimento ao trauma, com capacidade aproximada de 839 leitos que presta assistência nos níveis secundários e terciários. O quadro de pessoal é de aproximadamente 5.000 mil trabalhadores, sendo que os de enfermagem (enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem) representam cerca de 44%1. Esta unidade é considerada um hospital de ensino, visto que, possui determinadas características, por servir de campo de prática a alunos

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Contextualizando a inserção da enfermagem na construção de um modelo de gestão para o Hospital Nossa Senhora da Conceição, Porto Alegre/RS. de diferentes níveis de formação (ensino médio, técnico, graduação e pós-graduação) da própria instituição e de instituições conveniadas.

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Construindo um modelo de gestão Um modelo de gestão é constituído a partir de uma configuração conceitual e operacional com características para estruturar os elementos do processo de trabalho e da organização dos recursos materiais, humanos e financeiros, definidos para uma dada estrutura institucional3,4. O modelo de gestão é, em parte, a materialização do planejamento estratégico, isto é, um processo ativo de determinação e orientação a ser seguido para a realização dos objetivos institucionais (planejamento tático), compreendendo análise, decisão, comunicação, liderança, motivação e controle/ avaliação que devem ser postas em operação em forma de ações que geram o produto ou serviço da empresa (planejamento operacional)5. Na unidade HNSC, o modelo de gestão é desenvol-vido à luz da integração com a rede SUS, visando à autonomia dos diferentes processos de trabalho dos atores envolvidos. São exemplares na instituição alguns avanços nesse sentido, tais como a participação dos usuários através de conselhos, a ouvidoria e os próprios colegiados de gestão das unidades produtivas. Entretanto, ainda é um desafio na instituição, segundo a lógica do modelo de gestão que hoje é adotado, a incorporação das Unidades de Produção de Saúde7,8, isto é, extinguir os antigos departamentos e seções recortadas segundo profissões, e criar outras unidades conforme as lógicas específicas de cada processo de trabalho7. Dessa forma, todos os profissionais envolvidos com o mesmo processo de trabalho, com um determinado produto ou objetivo identificável, passariam a compor uma Unidade de Produção7,8. Assim, da mesma forma como o processo de trabalho em saúde, o de enfermagem integra a prestação de serviços de saúde, sendo estes consumidos no ato da sua produção, ou seja, no momento da assistência, mais especificamente o cuidado, que pode ser individual, grupal ou coletivo9. O objeto de trabalho da enfermagem é o cuidado, que, por sua vez, está inserido na maior parte das ações dentro dos serviços de saúde. Sendo assim, considerando os princípios da prática da enfermagem e as instituições como espaços de conflitos que reproduzem ou modificam esta prática9, e acreditando ser a cogestão um dos instrumentos para a consolidação de um processo de trabalho, julga-se necessário que os enfermeiros estejam inseridos nos diversos espaços de gestão (estratégico, tático ou operacional) e desenvolvam a capacidade de serem propositivos, autônomos e capazes de contratar compromissos com outros, participando de alguma etapa de avaliação, não sendo meros executores de tarefas7,8,9,10.

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O modelo do HNSC a fim de garantir a democracia interna de seu próprio processo de gestão institucional já configura suas unidades produtivas e os colegiados gestores de modo a oferecer uma estrutura claramente estabelecida, propondo uma rede organizacional com base na horizontalidade e na democracia, em oposição a um modelo convencional verticalizado e concentrador de poder: uma organização voltada para o incentivo dos seus processos decisórios coletivos, a partir de colegiados democraticamente constituídos por estas unidades de trabalho3,4,6. O modelo de gestão verticalizado e centrado nos médicos e na enfermagem gera grande vieses, pois, ainda que as diferentes categorias busquem compartilhar sua práxis de maneira interdisciplinar, não se pode dizer que o trabalho acontece em equipe e, nem mesmo assegurar o cumprimento do objetivo maior da missão de uma instituição em saúde, que é produzir saúde e educar7. A escolha de um modelo de gestão horizontal ainda é um grande desafio, não só na unidade HNSC, mas nos serviços de saúde como um todo, visto que há necessidade de sensibilização dos atores envolvidos, ajustes nos processos de trabalho, reorganização do organograma institucional, redefinição de papéis e funções, apoio institucional como forma de fortalecer processos de cogestão e da clínica ampliada. É necessário transpor o modelo biomédico centralizador para um modelo de cogestão e humanizado na assistência à saúde. É uma mudança de paradigma. Entre os planejadores (atores responsáveis pela gestão) podemos destacar, no GHC, a Diretoria (Superintendência, Direção Administrativa e Financeira e Direção Técnica) e o Conselho de Administração (atores responsáveis pela gestão estratégica). Internamente, atualmente as estâncias que compõem o HNSC (atores responsáveis pela gestão tática) são Gerência de Pacientes Externos (GPEX), Gerência de Unidades de Internação (GUI), Gerência de Administração (GAD), Gerência de Serviços de Apoio e Diagnóstico (SADT), Gerência de Recursos Humanos (GRH), Gerência de Ensino e Pesquisa (GEP), Gerência de Materiais (GM), Gerência de Engenharia e Patrimônio (GENP), Gerência Financeira, Gerência de Ouvidoria e suas respectivas coordenações (atores responsáveis pela gestão operacional). Externamente, há o Ministério da Saúde (MS), a Secretaria Estadual de Saúde (SES) e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Na premissa de efetivar um modelo de gestão hospitalar requer-se a definição da missão institucional, que precisa ser desenhada, considerando o sistema de saúde como um todo, tendo em conta que é necessário construir, de forma flexível e criativa, múltiplos circuitos dentro dele e modelados sempre pelo critério das necessidades reais das pessoas4. A missão deve conter, em seu enunciado, três ideias básicas: quais produtos, para que clientela e com quais características um determinado serviço ou organização se compromete a oferecer5,6.

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Contextualizando a inserção da enfermagem na construção de um modelo de gestão para o Hospital Nossa Senhora da Conceição, Porto Alegre/RS. Adota-se como missão da unidade HNSC a mesma do GHC: “Desenvolver ações de atenção integral à saúde para a população, com a excelência e eficácia organizacional, através de seus recursos tecnológicos e humanos, programas de ensino e pesquisa, atuando em parcerias com outras entidades, fortalecendo o Sistema Único de Saúde e cumprindo, assim, a função social”.

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O GHC adota esse modelo de horizontalização da administração, contemplando linhas de cuidado e gerências, trazendo implicações para a unidade HNSC, que também está alinhada a esse processo, respeitando suas particularidades. Esse modelo foi criado por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas, no Laboratório de Planejamento e Administração em Saúde da UNICAMP (LAPA/UNICAMP), em São Paulo, no início da década de 20006. Nesse processo, a enfermagem e as demais profissões podem estar inseridas em qualquer um desses espaços de gestão. Esse modelo de gestão adotado na unidade HNSC propõe romper com o modelo tradicional de gerenciamento hospitalar, centrado na hierarquização vertical que separa a área assistencial da área de apoio. Esse tipo de administração verticalizada cria uma linha de conflito na área assistencial entre o poder formal das chefias médicas e o poder real exercido, na maioria das vezes, por enfermeiros4,5,6. No HNSC, os gerentes das áreas (responsáveis pelo planejamento tático) são apoiados por coordenações locais (responsáveis pelo planejamento operacional). Além disso, a maior parte das ações gerenciais é articulada junto aos colegiados de gestão das diferentes áreas. Esse modelo também visa à horizontalização das relações entre as diversas unidades de trabalho, estimulando a comunicação lateral, a responsabilização, a profissionalização, enfim, a interação e uma forma colegiada de gestão. Atualmente, os enfermeiros ainda estão inseridos, em seu maior contingente, nos microespaços de gestão (unidades produtivas), mas isso não diminui a sua importância e seu potencial de gestão. Sendo assim, não podemos reproduzir nesses espaços de gestão (sejam eles micro ou macroespaços) a concepção das clínicas tradicionais; ao contrário, é necessário alargar a sua dimensão com proposições que possam garantir a integração entre a assistência, o ensino e a gestão. O fortalecimento do trabalho coletivo é o objetivo nesse modelo, visto que o trabalho em equipe pode estabelecer a interlocução com os diferentes níveis de gestão e encaminhar os pleitos oriundos das unidades produtivas e dos colegiados locais. O corpo de enfermagem possui um responsável técnico (RT) pela área, que trabalha em conjunto com as gerências e as linhas de cuidados do hospital, articulando as ações institucionais com os processos de enfermagem. O RT exerce exclusivamente essa função

desde 2006 e é eleito pelo voto direto dos profissionais de enfermagem a partir do ano de 2008. Atualmente, o RT da Enfermagem fica vinculado à Gerência de Recursos Humanos; entretanto, o corpo de enfermagem fica vinculado predominantemente às áreas das Gerências de Pacientes Externos e das Unidades de Internação. No entanto, os profissionais de enfermagem estão presentes em todas as gerências do Hospital Nossa Senhora da Conceição. Essa configuração atual expõe algumas dificuldades na elaboração e implementação do planejamento assistencial de enfermagem, pois, embora o modelo teórico vise à horizontalização das ações e relações, na prática, algumas delas ainda acabam sendo verticalizadas pela estrutura político-administrativa do sistema. O modelo adotado requer uma constante busca pela aproximação das relações de trabalho entre as diversas áreas, como a comunicação efetiva, a responsabilização e a profissionalização da gestão, almejando, a interação entre as equipes, em busca de uma gestão colegiada. As constantes mudanças na área da saúde estão demandando dos enfermeiros uma alteração de perfil e de atuação profissional, apontando para uma atitude proativa de protagonização, não apenas da assistência de enfermagem propriamente dita, mas dos processos de gestão em saúde de um modo geral. A necessidade de instrumentalizar os enfermeiros para o desenvolvimento de competências como a gestão é evidente para que cada vez mais este profissional esteja capacitado para ocupar com propriedade os cargos de alta gestão dentro das instituições de saúde. No HNSC, observa-se a crescente participação dos enfermeiros em espaços gerenciais, da administração hospitalar, desempenhando um papel fundamental nos processos de planejamento e implementação das ações em saúde. Certamente, ainda estão por vir desafios ainda maiores para que a enfermagem passe a ocupar assentos na alta gestão. Assim, torna-se necessário instrumentalizar e educar permanentemente os enfermeiros para que possam atuar de maneira mais expressiva em todas as instâncias gerenciais nas unidades que compõem o GHC.


Contextualizando a inserção da enfermagem na construção de um modelo de gestão para o Hospital Nossa Senhora da Conceição, Porto Alegre/RS.

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e trabalho em saúde no Brasil. São Paulo: Annablume; 1998. p. 13 7. Rates SMM. Unidades de Produção como espaço de construção democrática. In: Araujo GF, Rates SMM (Org.). Co-gestão e humanização na saúde pública: experiências construídas no Hospital Odilon Behrens. Belo Horizonte: Sigma Editora; 2008. 8. CAMPOS GWS. O anti-Taylor: sobre a invenção de um método para co-governar instituições de saúde produzindo liberdade e compromisso. Cad. Saúde Pública [periódico na Internet]. 1998 Out

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Figura 1 – Unidades vinculadas ao Ministério da Saúde (Acessado em http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/index. cfm/?portal=pagina.visualizarTexto&codConteudo=1888&codModuloArea=237&chamada=Unidades-Vinculadas, em 15 de nov. 2011)

* Márcio Neres dos Santos – Enfermeiro. Doutorando em Biologia Celular e Molecular Aplicada à Saúde. Mestre em Educação. Especialista em Auditoria em Saúde e em Gestão de Recursos Físicos e Tecnológicos em Saúde. Atua como docente colaborador no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Moinhos de Vento (IEP/HMV), no Instituto Metodista de Porto Alegre e no Centro de Educação Tecnológica e Pesquisa em Saúde (GHC/MS). Assistente de Coordenação do Serviço de Emergência do Hospital Nossa Senhora da Conceição/Grupo Hospitalar Conceição, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: mneres@uol.com.br. ** Carine Paim da Silva Martins – Enfermeira. Especialista em Saúde Pública. Assistente de Coordenação da Gerência de Internação do Hospital Nossa Senhora da Conceição/Grupo Hospitalar Conceição, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: mcarine@ghc.com.br. *** Christian Negeliskii – Enfermeiro. Doutorando em Enfermagem. Mestre em Enfermagem. Especialista em Terapia Intensiva. Atua como docente na Graduação e na Pós-Graduação em Terapia Intensiva da Universidade Feevale. Responsável Técnico de Enfermagem do Hospital Nossa Senhora da Conceição/Grupo Hospitalar Conceição, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: nchristian@ghc.com.br.

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Normas para publicação A Revista Sul-Brasileira de Enfermagem é uma publicação bimestral, que tem por objetivo ser um dos principais veículos de divulgação do conhecimento na área de enfermagem no Brasil, promovendo, o desenvolvimento técnico-científico dos profissionais, publicando trabalhos originais e inéditos, de revisão, atualização ou relatos de casos/experiências. Seu conselho editorial, que tem caráter consultivo, é constituído por pesquisadores em enfermagem, de origem institucional diversificada, e é o principal responsável pela qualidade do conteúdo da revista. Apresentação do manuscrito 1. Os manuscritos apresentados devem destinar-se exclusivamente à Revista Sul-Brasileira de Enfermagem, não sendo permitida sua apresentação simultânea a outro periódico, no que se refere ao texto, às figuras ou tabelas, quer na íntegra ou parcialmente, excetuando-se resumos ou relatórios preliminares publicados em anais de reuniões científicas. 2. Nas pesquisas envolvendo seres humanos, os autores deverão enviar uma cópia de aprovação emitida pelo Comitê de Ética, reconhecido pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), segundo as normas da Resolução do Conselho Nacional de Saúde – CNS 196/96 ou órgão equivalente no país de origem da pesquisa. O número do processo/projeto deverá constar no método do trabalho. 3. A Revista Sul-Brasileira de Enfermagem adota as normas do Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (estilo Vancouver), publicadas no New England Journal of Medicine 1997; 336:309. 4. Figuras e tabelas deverão ser apresentadas em arquivo com boa resolução e separadas do texto (imagens com mínimo de 300 dpi). 5. O(s) autor(es) dos textos são por eles inteiramente responsáveis, devendo assinar e encaminhar a declaração de responsabilidade e Cessão de Direitos Autorais, conforme modelo abaixo. Declaração de Responsabilidade e Cessão de Direitos Autorais. Vimos submeter à aprovação da Revista Sul-Brasileira de Enfermagem o artigo ____________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ___ e informamos que todos os procedimentos éticos devidos foram observados. Declaramos que o trabalho é inédito e está sendo enviado com exclusividade à Revista. Concordamos que, em caso de aceitação do mesmo, os direitos autorais a ele referentes passarão a ser propriedade exclusiva da Revista Sul-Brasileira de Enfermagem.

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– Resultados: devem ser apresentados de forma clara e objetiva, sem interpretações ou comentários pessoais, podendo, para maior facilidade de compreensão, estar acompanhados por gráficos, tabelas, figuras, fotografias etc. – Discussão: deve restringir-se aos dados obtidos e aos resultados alcançados, enfatizando os novos e importantes aspectos observados e discutidas as concordâncias e divergências com outras pesquisas já publicadas. – Conclusões: correspondem aos objetivos ou hipóteses de maneira lógica, clara e concisa, fundamentadas nos resultados e discussão, coerentes com o título, proposição e método. Incluem-se ainda as Referências Bibliográficas (12 páginas de Word, espaçamento duplo). (B) Artigos de revisão – Estudo crítico, abrangente e sistematizado da literatura sobre um assunto de interesse para o desenvolvimento da Enfermagem, devendo apresentar análise e conclusão. (09 páginas no Word, espaçamento duplo). (C) Artigos de atualização ou divulgação – Trabalhos descritivos e interpretativos, com fundamentação sobre a situação global em que se encontra determinado assunto investigativo ou potencialmente investigativo. (05 páginas de Word, espaçamento duplo) (D) Experiência profissional/Relato de caso – Descrição de experiências assistenciais e de extensão, estudos avaliativos, originais contendo análise de implicações conceituais ou descrição de procedimentos com estratégias de intervenção, evidência metodológica apropriada de avaliação de eficácia, de interesse para a atuação de enfermeiros em diferentes áreas. (09 páginas no Word, espaçamento duplo). Processo de julgamento dos manuscritos Após o recebimento, o artigo é inicialmente analisado quanto ao cumprimento das normas estabelecidas para publicação, sendo sumariamente devolvido em caso de não atendimento. Se aprovado, é encaminhado para avaliação de dois consultores ad hoc, escolhidos entre pesquisadores de renomada competência na área do artigo, que exibirão seus pareceres aceitando, recomendando modificações ou recusando o mesmo. (Em qualquer situação os autores serão comunicados.) Havendo discordância nos pareceres, o manuscrito é encaminhado a um terceiro relator. O anonimato é garantido durante todo o processo de julgamento. Os pareceres dos relatores são analisados pelo Conselho Editorial que, se necessário, indica as alterações a serem efetuadas. Os trabalhos seguem para publicação somente após a aprovação final dos pareceristas e do Conselho Editorial.

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Após a aceitação do trabalho, os autores serão comunicados da decisão, com a data prevista para publicação, o volume e o fascículo da Revista na qual o artigo será publicado. Os artigos não publicados não serão devolvidos, serão destruídos seis meses após o final dos trâmites da revista. Preparo dos manuscritos • Folha de rosto com título que identifique o conteúdo em português e inglês, contendo o(s) nome(s) do(s) autor(es), a titulação e a instituição a que pertence(m). Serão aceitos até seis autores. • Resumo informativo em português e inglês (summary) com até 150 palavras. • Quatro unitermos (palavras-chave) que permitam identificar o assunto do artigo, apresentados em português e inglês (keywords). • Dados que permitam sua compreensão, como explicações sobre o sentido das abreviaturas e símbolos. • Errata: após a publicação do artigo, os autores, se identificarem a necessidade de uma errata, deverão enviá-la à Secretaria da Revista imediatamente e de preferência por e-mail. Referências bibliográficas (Exemplos) Artigos de periódicos: • Padrão: Elias MS, Cano MAT, Mestriner W Jr, Ferriani MGC. A importância da saúde bucal para adolescentes de diferentes estratos sociais do município de Ribeirão Preto. Rev Latino-Americana de Enfermagem 2001 jan.; 9 (1):88-95 • Artigo com indicação de subtítulo: Diniz NMF, Lopes RLM, Almeida MS, Gesteira SMA, Oliveira JF. Psicodrama com estratégia pedagógica: vivências no ensino de graduação na área da saúde da mulher. Rev. Latino-am. Enfermagem 2000 ago.; 8(4);88-94. Materiais em formato eletrônico: • Artigo de periódicos: Braga EM, Silva MJP. Como acompanhar a progressão da competência no aluno de enfermagem. Rev Esc Enfermagem USP (periódico na Internet). 2006 (citado 2006 set. 28);40(3): (cerca de 7 p). Disponível em: http://.ee.usp.br/reeusp/upload/pdf/258.pdf • Livro ou monografias: Alvarenga, RE. Cuidados paliativos domiciliares: percepções do paciente oncológico e seu cuidador. Porto Alegre: Moriá; 2005.

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Calil AM, Paranhos WY. O enfermeiro e as situações de emergência. São Paulo (SP): Atheneu; 2007 • Capítulo do livro ou monografia: Debert, GG. Problemas relativos à utilização da história de vida e história oral. In: Cardoso RCL. A aventura antropológica. Teorias e pesquisa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 1998. p.64-78. • Dissertação e tese: Amarante ST. Analise das condições ergonômicas do trabalho das enfermeiras de centro cirúrgico. (dissertação). São Paulo (SP): Escola de Enfermagem/USP; 1999. • Anais: Carreiro FA. A Equipe de Enfermagem e o Corpo (do) Queimado Durante a Balneoterapia. In: Anais do 11º CBCENF-Congresso Brasileiro dos Conselhos de Enfermagem; 2008 ago. 31 a set. 03; Belém-PA, Brasil.

Envio do manuscrito Os artigos originais encaminhados para avaliação e publicação deverão ser enviados por e-mail ou correio para o endereço da editora constante no final destas normas, aos cuidados do Conselho Científico, sendo que um dos autores deverá ser assinante da revista. Os trabalhos que forem encaminhados via correio deverão ser acompanhados de CD, uma cópia impressa com figuras e tabelas, juntamente com a Declaração de Responsabilidade e Cessão de Direitos Autorais, assinada por todos os autores, através de carta registrada ou sedex. Recomenda-se o uso do programa Word (papel formato A4; margens: superior 1,5 cm, inferior 1 cm; laterais 3 cm), bem como a fonte Times, tamanho 12, entrelinha dupla, em uma coluna. Pode conter ilustrações que sejam relacionadas com o assunto e tenham boa qualidade para impressão em cores ou em preto e branco (300 dpi). Texto justificado e com número de página no rodapé.

Moriá Editora Ltda. Revista Sul-Brasileira de Enfermagem Rua Aracy Fróes, 258 / 902 - Jardim Itu-Sabará - Porto Alegre/RS / CEP: 91210-230. E-mail: revistasulbrasileira@gmail.com Tel. (51) 3351.2361.

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ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 5–Ventilação mecânica

P P P P P

• 1a aula: Avaliação do paciente na UTI • 2a aula: Atendimento a PCR no adulto: O que mudou? • 3a aula: Interpretação de ECG e arritmias • 4a aula: Monitorização Hemodinâmica • 5a aula: Ventilação mecânica • 6a aula: Cuidados com drenos, cateteres e sondas

Lisnéia Fabiani Bock Graduada em Enfermagem pela Universidade Luterana do Brasil; Especialista em Administração dos Serviços em Enfermagem pela PUCRS; Especialista em Terapia Intensiva pela Ulbra; Mestre em Enfermagem pela UFSC; Docente do Curso de Pós-Graduação na Ênfase de Terapia Intensiva do HMV; Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, UFSC; Coordenadora do Curso de Pós-Graduação Enfermagem com Ênfase em Urgências e Emergências do IPA; Coordenadora do Curso de Enfermagem do Centro Universitário Metodista do IPA. fabibock@gmail.com

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ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 2 – ATENDIMENTO A PCR NO ADULTO: O que mudou? AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

INTRODUÇÃO A assistência ventilatória pode ser entendida como a manutenção da oxigenação e/ou da ventilação dos pacientes de maneira artificial até que estes estejam capacitados a reassumi-las, sendo um dos principais recursos utilizados em Unidades de Terapia Intensiva. Os conhecimentos sobre os mecanismos de lesão pulmonar e os avanços tecnológicos dos ventiladores mecânicos permitiram o desenvolvimento de vários modos de ventilação, priorizando a manutenção de uma adequada troca gasosa e a preservação da microestrutura pulmonar. A correta compreensão das técnicas ventilatórias é fundamental para a escolha do modo apropriado de ventilação para cada situação, uma vez que a ventilação mecânica inapropriada pode provocar sérias lesões pulmonares tão ou mais graves que aquelas que justificaram o seu uso. O ventilador mecânico é um dispositivo respiratório, com pressão negativa e positiva, utilizado para manter a liberação de oxigênio por um período predeterminado, podendo ser prolongado. Os primeiros aparelhos que surgiram era pneumáticos; atualmente, oferecem amplos recursos e possibilitam o emprego de novas técnicas para o tratamento de pacientes com falência e/ou fadiga respiratória. De fato, a ventilação mecânica auxilia no suporte à vida sob condições de insuficiência respiratória grave, porém não é um método curativo, sendo importante prevenir complicações e iatrogenias desde sua instalação. Indicações e Objetivos da Ventilação Mecânica A decisão e indicação da ventilação mecânica sempre serão do médico, baseado na avaliação clínica e em exames laboratoriais. Porém, muitas vezes será o enfermeiro que identificará estas alterações clínicas ao avaliar o paciente à beira do leito. Indicações para o suporte ventilatório mecânico:

Ausculta

Roncos, sibilos, estertores, ausência de murmúrio vesicular.

Aparência

Sudorese, cianose, uso de musculatura acessória, puxão traqueal.

Sistema Cardiovascular

Arritmias, hipertensão, hipotensão, poliúria ácida.

Fonte: VIANA, R.A.P.P., 2011, p. 439.

OBJETIVOS Melhorar ou garantir a oxigenação e/ou a ventilação adequadas (trocas gasosas). Diminuir o trabalho ventilatório – repouso dos músculos e ¯ da fadiga e do metabolismo anaeróbico. Manter as vias aéreas pérvias e protegidas. Garantir a estabilidade do sistema respiratório e menor gasto energético em situações de instabilidade hemodinâmica. Garantir o conforto do paciente. Preservar a estrutura pulmonar evitando lesão pulmonar associada à VM. – Reverter a hipoxemia: eleva a ventilação alveolar; aumenta o volume pulmonar; diminui o consumo de O2; aumenta a oferta de oxigênio. – Reverter a acidose respiratória aguda. – Reduzir o desconforto respiratório. – Prevenir ou reverter atelectasias. – Reverter fadiga dos músculos respiratórios. – Permitir sedação, anestesia ou uso de bloqueadores neuromusculares. – Reduzir consumo de oxigênio sistêmico e miocárdico. – Reduzir pressão intracraniana. – Estabilizar parede torácica. ALGUNS MODELOS 1) Savina

• PaO2 < 50 mmHg com FiO2 > 0,60. • PaO2 > 50 mmHg ou pH < 7,25. • Capacidade vital < duas vezes o volume corrente. • Força inspiratória negativa < 25 cm de H2O. • Frequência respiratória > 35 movimentos por minuto. • Diminuição do nível de consciência.

Fisiológico

Manifestação clínica

Sistema Nervoso Cen- Agitação, cefaleia, tremores, tral (SNC) alucinações, convulsões. Sistema Respiratório

Alterações de amplitude, frequência, ritmo, padrão, expiração prolongada.

Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pacientes adultos e pediátricos.

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Quadro 1 – Manifestações clínicas de Insuficiência Respiratória


ATUALIZAÇÃO ATUALIZAÇÃO EM EM TERAPIA TERAPIA INTENSIVA INTENSIVA AULA AULA 5 5 –– VENTILAÇÃO VENTILAÇÃO MECÂNICA MECÂNICA

Volume corrente: 50-2000 mL. PEEP máximo: 35 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Ventilação com pressão positiva intermitente – IPPV (CMV)/ IPPVassist (CMVassist); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV); SIMVASB (SIMV/PS); Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP); CPAPASB (CPAP/PS); Biphasic intermittent positive airway pressure – BIPAP (PCV+); BIPAPASB (PCV+/ PS); e AutoFlow® – Adaptação automática do fluxo inspiratório em modos volume controlado. 2) Evita 2 Dura

Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pacientes adultos, pediátricos e neonatos (opcional). Volume corrente: Adulto: 100-2000 mL; Pediátrico 20-300 mL; Neonatal 3-100 mL. PEEP máximo: 35 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Ventilação com pressão positiva intermitente – IPPV (CMV)/ IPPVassist (CMVassist); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)/SIMVASB (SIMV/PS); Ventilação mandatória minuto (MMV)/MMVASB; Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP)/CPAPASB (CPAP/PS); Biphasic intermittent positive airway pressure – BIPAP (PCV+); BIPAPASB (PCV+/PS), BIPAPAssist (PCV/Assist); Airway Pressure-Release Ventilation (APRV); Proportional Pressure Suport – PPS (opcional); AutoFlow® – Adaptação automática do fluxo inspiratório em modos volume controlado; e Automatic tube compensation (ATC). 4) Evita XL

Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pacientes adultos, pediátricos e neonatos (opcional). Volume corrente: Adulto: 100-2000 mL; Pediátrico 20300 mL; Neonatal 3-100 mL. PEEP máximo: 35 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Ventilação com pressão positiva intermitente – IPPV (CMV)/ IPPVassist (CMVassist); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV); SIMVASB (SIMV/PS); Ventilação mandatória minuto (MMV); MMVASB; Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP); CPAPASB (CPAP/PS); Biphasic intermittent positive airway pressure – BIPAP (PCV+); BIPAPASB (PCV+/PS), BIPAPAssist (PCV/Assist); Airway Pressure-Release Ventilation (APRV); AutoFlow® – Adaptação automática do fluxo inspiratório em modos volume controlado; e Automatic tube compensation (ATC).

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3) Evita 4

Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

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Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pacientes adultos, pediátricos e neonatos (opcional). Volume corrente: Adulto: 100-2000 mL; Pediátrico 20-300 mL; Neonatal 3-100 mL. PEEP máximo: 50 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Ventilação com pressão positiva intermitente – IPPV (CMV)/ IPPVassist (CMVassist); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)/SIMVASB (SIMV/PS); Ventilação mandatória minuto (MMV)/MMVASB; Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP)/CPAPASB (CPAP/PS); Biphasic intermittent positive airway pressure – BIPAP (PCV+); BIPAPASB (PCV+/PS), BIPAPAssist (PCV/Assist); Airway Pressure-Release Ventilation (APRV); Proportional Pressure Suport – PPS (opcional); AutoFlow® – Adaptação automática do fluxo inspiratório em modos volume controlado; Automatic tube compensation (ATC).

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ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 2 – ATENDIMENTO A PCR NO ADULTO: O que mudou? AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

5) Inter 5

Modos de Ventilação O ciclo ventilatório se divide em: • Fase inspiratória: há insuflação pulmonar com aumento da pressão intratorácica, do volume pulmonar e do fluxo inspiratório em relação ao final da expiração. Pode ser prolongada se houver indicação clínica. Os parâmetros são ajustados não ultrapassando um valor “x”, obtendo-se uma ventilação limitada a fluxo, volume ou pressão. • Término da fase inspiratória: a passagem da fase inspiratória para expiratória é chamada de ciclagem. Pode ser determinado por:

Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pacientes adultos, pediátricos e neonatais. Volume corrente: Adulto e pediátrico: 20-2000 mL. PEEP máximo: 30 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Pressão controlada/assistida (PC/A); Volume controlado/assistido (VC/A); Pressão de suporte (PSV); Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV); e Fluxo contínuo ciclado a tempo e limitado a pressão. 6) Servo Universal

o Pressão: quando é atingida uma determinada pressão, o fluxo é interrompido, independentemente do tempo inspiratório ou do volume que foi insuflado; o Volume: a fase inspiratória é terminada quando é atingido um volume de ar corrente predeterminado; o Fluxo: a fase final inspiratória ocorre quando o fluxo cai abaixo de 25% do nível de pico máximo, como no modo pressão suporte; o Tempo: a fase inspiratória acaba quando se passa um tempo determinado independentemente da pressão atingida ou do volume insuflado como no modo pressão controlada. • Fase expiratória: é passiva. • Final da fase expiratória e início da inspiratória: Pode ser desencadeado pelo paciente (ventilação espontânea) ou disparado pelo ventilador. O ventilador pode iniciar a fase inspiratória por:

Fonte: JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R., 2007.

Modos Ventilatórios Invasivos • Ventilação mandatória contínua com volume controlado: O parâmetro que se mantém constante é o volume de ar corrente. Pode ser disparado pelo tempo a partir do ajuste da frequência respiratória e sem a possibilidade de disparo através da sensibilidade. Corresponde ao modo volume controlado. Quando é permitida a inspiração através de mecanismos de sensibilidade a fluxo ou a pressão, temos o equivalente à ventilação assisto-controlada; neste caso, o disparo a tempo serve de mecanismo de segurança caso o esforço do paciente não ocorra.

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Pacientes que podem utilizar o ventilador: Pediátricos/ neonatos (0,5-30 kg) Adultos (10-250 kg). Volume corrente: Crianças: 2-350 mL; Adultos 1004000 mL. PEEP máximo: 50 cmH2O. Modos ventilatórios disponíveis: Pressão controlada/ assistida (PC/A); Volume controlado/assistido (VC/A); Volume controlado com pressão regulada (PRVC); Volume de suporte (VS); Pressão de suporte (PSV); Pressão positiva contínua vias aéreas (CPAP); Ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV); Bi-Vent (opcional) – similar ao modo BIPAP; Automode – modo de duplo controle ciclo a ciclo (opcional) VC-VS, PC-PSV, PRVC-VS.

o Tempo: após um tempo expiratório pré-determinado, ajustado pela frequência respiratória, o ventilador inicia um novo ciclo; o Fluxo: o ventilador inicia um novo ciclo a partir de um fluxo pré-determinado que é ajustado na sensibilidade; o Pressão: é necessária uma pressão negativa na via aérea que libera o fluxo inspiratório.


ATUALIZAÇÃO EM EM TERAPIA TERAPIA INTENSIVA INTENSIVA ATUALIZAÇÃO ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

• Ventilação mandatória contínua com pressão controlada: O ventilador aplica uma pressão predeterminada. Não há garantia de volume de ar corrente, que é resultante da complacência e resistência do sistema respiratório, podendo ocorrer hipo ou hiperventilação. Também pode ser ciclado a tempo com a sensibilidade do aparelho desligada e, portanto, com controle da relação entre o tempo inspiratório e o expiratório (pressão controlada) ou permitir disparo a fluxo ou pressão (pressão controlada – assisto-controlada). • Ventilação mandatória intermitente: Ciclos mandatórios são liberados de maneira intermitente, podendo ser volume controlado ou pressão controlada, de acordo com o mecanismo de ciclagem das ventilações mandatórias. Há diferenciação quanto ao modo de disparo:

a) pelo ventilador: o ventilador libera os ciclos mandatórios conforme um tempo predeterminado, não sendo possíveis outros mecanismos de disparo; b) disparo combinado: junto ao mecanismo de tempo há possibilidade de disparo a fluxo ou pressão através do esforço do paciente após ter sido ultrapassado o tempo fixado. O disparo a tempo será deflagrado caso o paciente não tenha esforço no intervalo determinado. • Ventilação espontânea contínua: Todos os ciclos são iniciados e interrompidos pelo paciente. a) Ventilação espontânea contínua assistida pelo ventilador: manutenção de pressão constante durante a inspiração. O ciclo é encerrado quando o fluxo inspiratório cai a 25% do fluxo máximo. Não há controle do tempo do fluxo ou da frequência respiratória e o VAC é o resultado destas variáveis. b) Ventilação espontânea contínua não assistida pelo ventilador: o paciente respira espontaneamente com uma pressão constante durante todo o ciclo respiratório.

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Quadro 2 – Vantagens e desvantagens dos modos ventilatórios MODO

VANTAGENS

DESVANTAGENS

Modo controlado

– Garante um VAC ou pico de pressão predeterminado. – Repouso muscular.

– Sem interação com o paciente. – Desconfortável a menos que o paciente esteja comatoso. – Efeitos hemodinâmicos adversos.

Assistocontrolado

– Permite aumento do volume/minuto pelo aumento da freqüência. – Menor trabalho exigido do paciente.

– Risco de hiperinsuflação e fadiga muscular. – Assincronia. – Alcalose respiratória.

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SMIV

– Garante volume minuto – Diminui o retorno venoso e as pressões das vias aéreas quando comparado a modo controlado.

– Pode prolongar o desmame – Pode aumentar o trabalho respiratório.

Pressão suporte

– Maior conforto. – Mantém o trofismo muscular – Uso no desmame.

– Não garante volume minuto que é dependente da complacência e resistência das vias aéreas. – Alarmes com backup. – Não pode ser usada com nebulizadores que excedam a taxa de fluxo do paciente exceto se for do mesmo ventilador.

Ajuste Inicial da Ventilação Mecânica Adequar a oxigenação/ventilação, diminuir o trabalho respiratório, conforto e sincronia do paciente com o ventilador e evitar altas pressões na via aérea. 1 - Escolher o modo de ventilação mais adequado para a patologia; 2 - Iniciar com fração inspirada de oxigênio (FiO2) de 1.0 e diminuir posteriormente conforme a oximetria e a gasometria; 3 - Iniciar com VAC=8ml/kg, nos pacientes com lesão pulmonar aguda podemos usar 5-8ml/kg, evitar pressão de platô maior que 35mmHg; 4 - Escolher a FR e o volume minuto adequado para o caso; 5 - Nos ventiladores em que o fluxo precisa ser ajustado – geralmente 50-60 l/min; 6 - Ajustar PEEP conforme a necessidade e a patologia para melhorar a ventilação; 7 - Considerar o uso de analgesia e sedação quando não houver sincronia ou melhorar da oxigenação. Complicações da Ventilação Mecânica Podemos dividir as complicações da ventilação mecânica em infecciosas e não infecciosas. As complicações não infecciosas podem correlacionar-se com a intubação traqueal ou aos efeitos da ventilação mecânica nos diversos órgãos. Das complicações relacionadas a intubação traqueal, devemos destacar as lesões labiais, dentárias e nasais, o deslocamento do tubo, com intubação seletiva ou extubação não programada. Em 5% dos casos pode ocorrer estenose, malácia e até ruptura traqueal. Os pacientes em ventilação mecânica apresentam uma taxa maior de lesão de mucosa gástrica e sangramento digestivo, embora não tenha sido comprovado

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ATUALIZAÇÃO EM EM TERAPIA TERAPIA INTENSIVA INTENSIVA ATUALIZAÇÃO AULA 22 –– ATENDIMENTO ATENDIMENTO A PCR PCR NO NO ADULTO: ADULTO: O que que mudou? mudou? AULA A O AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

que existe relação causa-efeito entre ventilação mecânica e hemorragia digestiva. A ventilação mecânica interage com o sistema cardiovascular, podendo provocar redução da pré-carga do ventrículo esquerdo e diminuição do volume sistólico, diminuição da contratilidade cardíaca e isquemia miocárdica, que muitas vezes se manifestam como hipotensão. Do ponto de vista metabólico, a ventilação mecânica, quando inadequadamente ajustada, pode levar a acidose ou alcalose severas. A pressão positiva intratorácica pode levar a aumento da pressão intracraniana e redução do fluxo sanguíneo cerebral. A ventilação mecânica prolongada, especialmente se associada a uso de corticoide, agentes paralisantes e quadro séptico, está associada a polineuromiopatia e atrofia muscular. Dentre as complicações mais conhecidas estão o barotrauma, o volutrauma e o atelectrauma, responsáveis por pneumotórax, pneumomediastino, pneumoperitônio, edema pulmonar e SARA. O barotrauma é a lesão pulmonar produzida pelo uso de altas pressões inspiratórias e correlaciona-se com a pressão de pico. O volutrauma é a lesão pulmonar provocada por grandes distensões dos alvéolos e endotélio capilar, relaciona-se com o volume inspiratório final. O atelectrauma refere-se à liberação de mediadores químicos provocada pela abertura e fechamento cíclico das unidades alveolares e relaciona-se com a pressão média de vias aéreas e a PEEP. O uso da PEEP, por manter as unidades alveolares abertas, reduz o atelectrauma e consequentemente a liberação de mediadores inflamatórios que podem levar a disfunção multiorgânica. Das complicações infecciosas, destacam-se a sinusite e a pneumonia associada à ventilação mecânica. A sinusite é mais frequente na intubação nasal ou no uso de sondas nasoentéricas. É uma complicação pouco diagnosticada, mas pode ser causa de sepse. A pneumonia associada à ventilação mecânica pode ser dividida em precoce (quando ocorre de 48h até 4 dias do início da ventilação mecânica) e tardia (quando ocorre após 4 dias de ventilação mecânica). As pneumonias tardias estão relacionadas com microorganismos hospitalares, mais resistentes e têm pior prognóstico. Cuidados de Enfermagem

Umidificação Normalmente as vias aéreas superiores umedecem e aquecem o ar inspirado. Em pacientes que recebem suporte ventilatório, os mecanismos de umidificação e aquecimento estão suprimidos pela utilização das vias aéreas artificiais (tubo traqueal/cânula). Desta forma, a administração de gases frios e não umidificados pode causar sérios problemas, entre eles: •Oclusões do tubo traqueal/cânula; •Espessamento de muco e diminuição da atividade ciliar; •Complicações, como atelectasia; •Aumento na incidência de complicações pósoperatórias; •Comprometimento alveolar; •Alterações da mecânica pulmonar causando hipoxemia; •Alterações celulares a nível superficial e também estrutural. A umidificação ativa representa risco de superumidificação, com condensação de água no circuito, o que por sua vez pode causar: •Aumento de risco de infecção nosocomial; •Aumento da secreção da mucosa; •Aumento da necessidade de processos de aspiração; •Risco de restrição e oclusão da prótese; •Bloqueio das vias aéreas através do acúmulo de água no circuito. Outro risco da umidificação ativa é o superaquecimento que provoca secura das mucosas pulmonares promovendo: •Maior de formação de tampões de secreção; •Alterações epiteliais.

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Os constantes avanços tecnológicos da ventilação mecânica tem propiciado ampla utilização deste recurso e beneficiado inúmeros pacientes com as mais diversas patologias. No entanto, as complicações a ela relacionadas como a pneumonia nosocomial e outras tantas complicações descritas a seguir, levam a equipe médica, de enfermagem, fisioterapia e nutrição a voltar seus olhos para a prevenção destas complicações.

Quando a ventilação mecânica é imprescindível, a manutenção das condições fisiológicas das vias aéreas será essencial. Os cuidados relacionados à umidificação, aspiração, higiene e fixação do tubo utilizado, são por muitas vezes esquecidos ou subestimados pela equipe que tem tantas atribuições. No entanto, estes cuidados básicos e tantas vezes repetidos necessitam ser revistos e adaptados às novas técnicas, conceitos e equipamentos para que a prevenção das complicações seja efetiva. O treinamento de toda a equipe de enfermagem tem papel fundamental neste processo. Apesar do conhecimento acerca do assunto por parte dos profissionais, são necessárias rotinas e até mesmo protocolos de manutenção dos sistemas de ventilação para que os cuidados sejam efetivos.


ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 2 – ATENDIMENTO A PCR NO ADULTO: O que mudou? AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

No caso da utilização de filtro de barreira, é necessário que o filtro preencha algumas características, como: o mínimo espaço morto, baixa resistência ao fluxo de ar, membrana hidrofóbica e higroscópica, o que retém a umidade do paciente, reduzindo a perda de calor e a condensação de líquidos no circuito. A membrana hidrofóbica garante ao filtro característica de barreira viral e bacteriana, não havendo contaminação, desde que corretamente utilizado, do circuito de ar do respirador. Estes filtros devem garantir uma temperatura de aproximadamente 32ºC. O uso de filtro é contraindicado para casos de secreção muito espessa ou sanguinolentas e/ou hipersecreção. Uma outra preocupação deve ocorrer frente ao tratamento com o uso de aerossol, caso em que o filtro de barreira deve ser removido do circuito durante a nebulização, pois a retenção de vapor de água e dos fármacos aerossóis pelo filtro pode aumentar a resistência do circuito. A umidificação ativa requer alguns cuidados especiais, dentre eles: Trocar diariamente a água; manter nível adequado da água; manter temperatura adequada do aquecedor; eliminar líquidos condensados do sistema; manter recipientes coletores nas linhas; trocar as linhas com esterilização a cada 72 horas. Cuidados com os filtros umidificadores: Trocar o filtro a cada 24 horas ou se houver presença de secreção neste; posicionar o filtro alinhado com curvatura de tubo; trocar as linhas do ventilador a cada troca de paciente. Remoção das Secreções Pulmonares A obstrução da via aérea por aumento de secreções estimula a tosse, aumenta a pressão intrapulmonar, na qual se apoia a pressão preestabelecida do ventilador, diminuindo o volume de ar corrente. Favorece, ainda, a infecção respiratória, o que finalmente resulta no aumento de secreção brônquica e redução da complacência pulmonar.

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CUIDADOS DE ENFERMAGEM RELACIONADOS À ASPIRAÇÃO DE VIAS AÉREAS • Aspirar secreções sempre que necessário, não em horários preestabelecidos, e revisar sempre; • Não adotar como prática que somente a equipe de fisioterapia realize a aspiração após o atendimento ao paciente; estas ações favorecem a formação de rolhas, obstrução do tubo e a necessidade de troca; • Utilizar de técnica asséptica acompanhada pela oximetria de pulso; • Aspirar a via aérea através da cânula no menor tempo possível para evitar a fadiga ventilatória e diminuição da SpO2; • Aspirar as vias aéreas superiores, especialmente a cavidade orofaríngea;

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• Proceder ausculta pulmonar antes e após a aspiração e registrar a evolução; • Em caso de obstrução parcial do tubo, instilar SF 0,9% até 5 ml e ventilar com AMBU, que oferece um fluxo de ar turbulento e estimula o reflexo de tosse promovendo melhor mobilização da secreção. A seguir aspirar a cânula. Em caso de insucesso do item anterior ou obstrução total da prótese, proceder sua troca; • Observar e registrar aspecto e volume de secreção, bem como alterações; • Proceder a escolha de material adequado pelo enfermeiro é de fundamental importância para o sucesso do procedimento. Indicações do Sistema Fechado de Aspiração As indicações de uso deste sistema variam de acordo com a rotina das instituições e avaliação do médico e do enfermeiro. Em algumas instituições é utilizado para todo e qualquer paciente em ventilação mecânica. Em outras, através de alguns critérios como: •FIO2 acima de 40%; •Grandes quantidades de secreção nas vias aéreas; •PEEP acima de 10; A escolha da numeração do sistema de aspiração (Trach Care) a ser utilizada, deve ser feita de acordo com a indicação do fabricante, por exemplo: sonda 14F para tubo com numeração de 6,5 a 8,0 e 16 F para tubo com numeração acima de 8,5. No processo de aspiração, ao introduzir a sonda no tubo, cuidar para que a numeração da sonda fique sobreposta à numeração do tubo, excedendo no máximo 1 cm. Isso evita lesões traqueais ou nas vias aéreas. Em alguns casos, como o de secreção extremamente espessa ou profunda faz-se necessária a eventual aspiração convencional destes pacientes por permitir a utilização de balão de ressuscitação com reservatório (AMBU) e assim facilitar o deslocamento destas secreções. Indicações do Sistema Aberto de Aspiração Em todos os pacientes em ventilação mecânica que não se enquadrarem nos critérios anteriores. A literatura recomenda a preferencial utilização de sondas de aspiração 12F em pacientes adultos, em função da compatibilidade com a maior parte das numerações de tubos utilizados nestes pacientes. O lúmen da sonda de aspiração não deve exceder 1/3 da luz do tubo empregado. Posicionamento e Fixação do Tubo Traqueal A adequada fixação e a avaliação da posição do tubo endotraqueal são aspectos importantes no cuidado da via aérea e devem ser realizados principalmente pelo enfermeiro, que exerce cuidados à beira do leito continuamente. O método ideal de fixação do tubo

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ATUALIZAÇÃO ATUALIZAÇÃOEM EMTERAPIA TERAPIAINTENSIVA INTENSIVA AULA 2 – ATENDIMENTO A PCR NO ADULTO: O que mudou? AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

deve permitir a menor movimentação possível do tubo, ser confortável para o paciente, permitir a higiene oral, preservar a pele integra e ser de fácil aplicação. A fixação do tubo com cadarço deve ser renovada a cada 6 horas ou quando necessário, tomando-se as devidas precauções para evitar deslocamento do tubo (como intubação seletiva ou extubação acidental) e o deslocamento da cânula de traqueostomia. A fixação deve ser realizada por duas pessoas, sendo uma a responsável por segurar o tubo na posição correta, enquanto a outra realiza a fixação. Segundo consta na literatura, a fixação ideal para evitar lesões de língua, lábios e face seria com fita adesiva; porém, devido à dificuldade na manipulação e também em realizar a higiene bucal, fixamos o tubo com cadarço ou fixadores especiais, que hoje já são disponibilizados por fabricantes, que garantem maior conforto e evitam a formação de lesões. A fixação do tubo deve também firmar a extremidade distal do balonete, a fim de garantir que não ocorra sua ruptura em caso de tração do tubo para reposicionamento. A posição bucal do tubo deve ser alternada de 12 em 12 horas, a posição deve ser centralizada, quando possível, para evitar formação de úlceras. É importante lembrar que o balonete não deve ser desinsuflado durante este procedimento. É interessante registrar em evolução ou em formulário onde constam os sinais vitais a altura do tubo, a cada 6 h, a nível da comissura labial para observação e reposicionamento se necessário. Esta é uma forma de detecção precoce de qualquer deslocamento do tubo. Cuidados com o Balonete da Via Aérea Artificial (CUFF)

Higiene Oral É preconizada a realização de higiene oral de no mínimo de 4/4h com solução antisséptica ou bicarbonato de sódio, dificultando assim o crescimento das placas bacterianas e/ou fúngicas na cavidade oral, já que microaspirações poderão ocorrer durante a Ventilação Mecânica. Prevenção de Broncoaspiração Como já descrito anteriormente, a insuflação do balonete não impossibilita a broncoaspiração; sendo assim, sua prevenção exige alguns cuidados. Já a nutrição do paciente neste momento é vital e indispensável. O uso da sonda nasoentérica (SNE) e não sonda nasogástrica (SNG) é amplamente difundido, salvo em casos especiais. Além do uso da SNE, a cabeceira deve ser mantida elevada na medida do possível, e, em caso de necessidade de baixá-la, o fluxo de dieta deve ser interrompido por 30min antes de fazê-lo, especialmente em momentos de grande movimentação, como a higiene corporal, auxiliando no esvaziamento gástrico e/ou duodenal e diminuindo os riscos de broncoaspiração. A aspiração da cavidade oral deve ser frequente e associada às aspirações do tubo, com a finalidade de prevenir acúmulo de secreção nesta, e assim diminuir o risco de microaspirações. Em caso de presença de vômitos, deve-se proceder a imediata elevação da cabeceira do paciente, lateralizando-o, aspirando as vias aéreas e observando presença de conteúdo gástrico. Em seguida, abrir/ aspirar da SNG/SNE, observar/registrar e comunicar alterações e possível broncoaspiração. Processo de Enfermagem O Processo de Enfermagem direcionará soluções de problemas, visando satisfazer as necessidades de enfermagem e de cuidado. As etapas incluem: histórico; diagnóstico; planejamento; implementação; avaliação. Listamos alguns cuidados de enfermagem e a justificativa para a elaboração do plano de cuidados:

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Um dos maiores riscos da intubação prolongada é a lesão da laringe e da traqueia por excesso de pressão do balonete. Ao contrário do que é descrito em algumas literaturas e até eventualmente exercido na prática diária, a função do balonete não consiste em impedir a broncoaspiração de secreções gástricas e/ou bucais ou fixar o tubo, mas sim em impedir a exalação de ar por fora do tubo, permitindo uma ventilação adequada. O nível máximo de enchimento do balonete não deve ultrapassar 2/3 da luz da traqueia e não deve ultrapassar a sua pressão capilar, isto é, 2034 cmH2O ou 15-25 mmHg. Insuflar o balonete com o mínimo volume de ar suficiente para evitar o escape de ar e a movimentação aleatória do TOT são objetivos que devem ser alcançados com a insuflação lenta do balonete até que não se ouça escape de ar pela cavidade oral. A insuflação do “cuff” bem como sua pressão devem se verificadas 3 vezes ao dia (no mínimo), para evitar lesões isquêmicas ou estenose traqueal. A melhor pressão é a menor possível sem que haja vazamento ao redor da via aérea artificial. Existem descrições de utilização de até 18 mmHg sem prejuízo para o padrão ventilatório adotado. O vazamento pode ser detectado

pela ausculta da região cervical ou ruído na cavidade oral nos casos mais exacerbados. A vasta numeração de tubos utilizados propicia a adequação do diâmetro do TOT com diâmetro da traqueia em questão. Se os objetivos acima descritos não forem alcançados com os níveis pressóricos preconizados, deve-se verificar a adequação do TOT aplicado ao caso, adequação da sua posição do ou possível perfuração do balonete, lembrando, que uma pressão contínua na parede traqueal, acima da perfusão capilar (25-35 mmHg), pode comprometer o fluxo sanguíneo em toda a mucosa.


ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA ATUALIZAÇÃO EMINTENSIVA TERAPIA INTENSIVA ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULA 2 – ATENDIMENTOAULA A PCR NO ADULTO: OMECÂNICA que mudou? 5 – VENTILAÇÃO AULA 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA

Quadro 3 – Exemplo de um planejamento Cuidados de Enfermagem

Justificativa

1. Comunicar ao paciente os procedimentos a serem realiza- 1. Proporcionar, pelo processo comunicativo, apoio emocional dos, bem como orientá-los quanto ao tempo e espaço, mes- e amenizar a ansiedade. mo sob o coma ou sedação contínua. 2. Manter cabeceira em 30º-45º se não houver contraindica- 2. Previnir Pneumonia Associada à Ventilação Mecânica, evitar a ção aspiração pulmonar diante do refluxo gástrico, além de melhorar a expansão torácica. 3. Avaliar a expansão e simetria torácica e realizar ausculta pul- 3. Verificar se o paciente está ventilando bilateralmente e detecmonar. tar desconforto respiratório. 4. Monitorar a administração de O2 através da saturação de 4. Permitir o controle da oxigenação e da ventilação, adequanoxigênio (SpO2) com oximetria de pulso e avaliação de gases do os parâmetros do ventilador mecânico às necessidades do sanguíneos. paciente. 5. Monitorar o CO2 ao final da expiração através de capnógrafo. 5. Permitir o controle da ventilação alveolar. 6. Manter a atenção aos alarmes.

6. Alertar para possíveis alterações clínicas e intercorrências com o paciente ou com o aparelho.

7. Avaliar sinais de hipóxia (taquicardia, dispneia, confusão men- 7. Verificar a eficácia da oxigenioterapia. tal e cianose). 8. Avaliar os sinais vitais e cardiovasculares (Pressão Arterial Mé- 8. Identificar qualquer alteração hemodinâmica, arritmias cardídia – PAM, Pressão Venosa Central – PVC e ECG). acas, sinais de hipóxia e outras complicações. 9. Prever as necessidades do paciente em relação à dor e ao 9. Diminuir a necessidade de consumo de O2 e desconforto desconforto. respiratório, evitando desajustes fisiológicos e comportamentais. 10. Avaliar os sinais neurológicos: nível de consciência e de se- 10. Identificar sinais de rebaixamento do nível de consciência dação (utilizando escala de Glasgow, RASS, ou Ramsay), pupilas em consequência de oxigenação insuficiente. e motricidade. 11. Fixar adequadamente o cadarço do tubo endotraqueal, ou 11. Prevenir a extubação acidental ou o deslocamento do tubo, traqueostomia, de forma segura, trocando 3 vezes ao dia ou lesão de pele e lábios, bem como lesão de traqueia. mais se necessário. Anotar a comissura labial. 12. Realizar a higiene bucal com solução antisséptica, prefe- 12. Prevenir infecções, uma vez que constitui fonte primária de rencialmente à base de clorexidine, a cada 6h e com mais contaminação dos pulmões no paciente intubado e comprofrequência se necessário. metido. 13. Remover secreções da cavidade bucal sempre que ne- 13. Prevenir infecções pulmonares, resultantes de possíveis ascessário, devido a incapacidade de deglutição do paciente pirações do conteúdo da via aérea superior, proporcionando intubado. higiene e conforto. 14. Realizar controle hídrico rigoroso.

14. Avaliar a diminuição do volume urinário, que, agregado a outras alterações, pode sugerir baixo débito cardíaco associado à ventilação mecânica com altas pressões.

15. Anotar os parâmetros do ventilador no prontuário do pacien- 15. Identificar e atuar frente aos problemas relacionados à sinte. cronia paciente-ventilador, permitindo ajustes dos parâmetros. 16. Avaliar a necessidade do uso de cânula oral (Guedel) nos 16. Evitar que o paciente morda o tubo, diminuir desconforto e pacientes agitados. No entanto, não fixar junto ao tudo endo- estabilizar a ventilação. traqueal. 17. Avaliar a necessidade de sedação ou de bloqueio neuro- 17. Reduzir o trabalho respiratório e a resistência à ventilação muscular. mecânica, diminuindo a ansiedade e o assincronismo entre o paciente e a máquina, proporcionando maior conforto e efetividade do tratamento.

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18. Realizar aspiração de secreção traqueal, com técnica pa- 18. Manter permeabilidade das vias aéreas. O sistema fechado, dronizada. E quando o PEEP estiver acima de 10, pensar em se indicado, permite que o paciente não seja desconectado instalar sistema fechado de aspiração. do ventilador, mantendo a via aérea pressurizada constantemente, minimizando as alterações de parâmetros e a necessidade do aumento da FiO2, com isso evitando hipóxia durante o procedimento. 19. Umidificar 100% o O2 a ser administrado.

19. Prevenir o ressecamento das vias aéreas superiores e promover a liquefação das secreções nela contidas. Evitar o aparecimento de atelectasia e a obstrução do tubo, favorecendo uma respiração mais confortável.

20. Usar filtro de calor e umidade (filtro bacteriológico) diminuin- 20. Diminuir o índice de Pneumonia Associada à Ventilação Medo o índice de infecção. cânica e possíveis infecções.

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ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA ATUALIZAÇÃO EM TERAPIA INTENSIVA AULAAULA 2 – ATENDIMENTO A PCR NO ADULTO: O que mudou? 5 – VENTILAÇÃO MECÂNICA 21. Monitorar a pressão do “Cuff” 3 vezes ao dia, deixando em 21. Diminuir o risco de broncoaspiração. Evitar o escape de ar, 15-25 mmHg. preservando o fluxo sanguíneo da mucosa e prevenindo lesões na traqueia. 22. Evitar condensação de fluídos nos circuitos de ventilação 22. Prevenir provável fonte de infecção. e desprezar o conteúdo dos copos de drenagem sempre que houver. 23. Avaliar as imagens radiológicas junto ao paciente, estimu- 23. Verificar o posicionamento do tubo endotraqueal e identifilando o desmame da ventilação mecânica conforme melhora car áreas de hipoventilação. clínica e radiológica. 24. Passar uma sonda nasogástrica ou nasoentérica, se for essa 24. Garantir drenagem gástrica, prevenindo distensão abdomia necessidade avaliada pelo enfermeiro. nal súbita que pode limitar a expansão torácica. Diminuir risco para broncoaspiração e, quando indicado, atuar como veículo para suporte nutricional. 25. Efetuar a manipulação dos equipamentos da ventilação 25. Prevenir colonização ou infecção do paciente e/ou contamecânica e procedimentos com os pacientes, sempre com minação do ambiente hospitalar. técnica adequada, estabelecida pela Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) da instituição Fonte: VIANA, R.A.P.P, 2011, p. 444.

Referências

Notícias Pesquisa sobre AIDS com participação de hospital de Porto Alegre é consider ada maior descoberta científica do ano Estudo destacado pela revista Science indicou que os antirretrovirais ajudaram a prevenir em 96% dos casos a transmissão do vírus da HIV A revista norte-americana Science, uma das mais importantes do mundo de divulgação científica, destaca em sua edição de fim de ano o que considerou o maior avanço da ciência em 2011: a descoberta de que o uso de antirretroviral, tratamento aplicado a pacientes portadores de HIV, também pode ser aliado da prevenção porque diminui a transmissão do vírus da AIDS. A pesquisa foi realizada em 13 pontos no mundo, nos Estados Unidos, na África, na Ásia e na América Latina, sendo dois deles no Brasil: no Instituto de pesquisa Clínica Evandro Chagas (IPEC-Fiocruz) do Rio de Janeiro e no Hospital Conceição de Porto Alegre. Os autores do estudo concluíram que, quando uma pessoa HIV positiva adere a um esquema eficaz de terapia antirretroviral, o risco da transmissão do vírus ao parceiro não-infectado pode ser reduzido em até 96%.

— É a primeira vez que foi demonstrada uma forma concreta e disponível de diminuir a incidência de novos casos de Aids — disse o chefe do Serviço de Infectologia do Hospital Conceição, Breno Riegel Santos. Em todo o mundo, mais de 1,7 mil casais foram recrutados para participar do estudo. No hospital gaúcho, participaram 90 casais sorodiscordantes, isto é, aqueles em que apenas um deles é infectado pela doença. Nenhum dos participantes da pesquisa precisava de tratamento imediato e todos receberam acompanhamentos preventivos como orientação para o uso de preservativos. Eles foram divididos então em dois grupos: metade recebeu uma combinação de drogas antirretrovirais (coquetel) e a outra parte não. O estudo iniciado em 2005 foi interrompido antes do prazo porque os resultados foram claros: houve 28 transmissões do vírus entre os participantes da pesquisa no mundo, sendo que 27 eram do grupo que não recebia medicação. *Fonte: www.clicrbs.com.br em 27.12.2011

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BANDERSON, J . Challenges for the future: the nurs’s role in weaning patients from mechanical ventilation. Intensive Crit Care Nurs 11:2-5. CINTRA, E. A. et al. Assistência de enfermagem ao paciente gravemente enfermo. São Paulo: Editora Atheneu, 2001. Consenso Brasileiro de Ventilação Mecânica. In Série Clínicas Brasileiras de Terapia Intensiva – Ventilação Mecânica, vol. I, Ed. Atheneu. COPETTI, M. e col. Curso de Ventilação Mecânica Básica. X Jornada Sul-brasileira de Terapia Intensiva. 23 de outubro de 2003. Gramado/ RS. DAVID, C.M.N. Ventilação Mecânica: da fisiologia à prática clínica. 1ª

edição. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Revinter, 2001. DAVID, C.M.N. Medicina intensiva. 1ª edição. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Revinter, 2003. GUYTON, AC. Tratado de fisiologia médica. 8a edição. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 1992. JUNIOR, C. T.; CARVALHO, C. R. R. Ventiladores Mecânicos. Jornal Brasileiro de Pneumologia. vol. 33, suppl. 2, São Paulo, July 2007. KNOBEL, E. Condutas no Paciente Grave. 2ª edição. São Paulo: Editora Atheneu, 1998. SARMENTO, G. J. V. Princípios e práticas de Ventilação Mecânica. 1ª edição. São Paulo: Editora anole, 2010. SILVA, L. D. Assistência ao Paciente Crítico: Fundamentos para a Enfermagem. Rio de janeiro: Editora Cultura Médica, 2001. VIANA, R. A. P. P. Enfermagem em Terapia Intensiva: Práticas baseadas em evidências. São Paulo: Editora Atheneu, 2011.


Estamos preparando as próximas aulas de atualização:

o tema será Ventilação Mecânica Confiram o Programa: Aula 1 – Abordagem da Via Aérea – Anatomia e Fisiologia da Via Aérea – Mecânica Ventilatória – Avaliação da Via Aérea e Ventilação Aula 2 – Via Aérea Difícil e Dispositivos Extraglóticos – Identificação da Via Aérea Difícil – Intervenções na Via Aérea e Ventilação – Intubação Endotraqueal – Intubação em Sequência Rápida – Dispositivos Extraglóticos – Máscara Laríngea, Dispositivo Esofágico de Multilúmen (Combi Tube) e Tubo Laríngeo – Cricotireoidostomia por Punção e Cirúrgica Aula 3 – Insuficiência Respiratória Aguda – IrpA e Equilíbrio Ácido-Básico – IrpA – Conceitos Básicos de Equilíbrio Ácido-Base – Princípios Básicos de Interpretação de Gasometria

Aula 4 – Ventilação Mecânica Invasiva – Breve Histórico da Ventilação Mecânica – Conceito – Objetivos e Indicações – Princípios de Ventilação Mecânica – Parâmetros Básicos e Fases do Ciclo Ventilatório na Ventilação Mecânica – Modalidades Ventilatórias Aula 5 – Ventilação Mecânica Não Invasiva – Conceito – Objetivos e Indicações – Princípios Básicos de Ventilação Mecânica Não Invasiva Aula 6 – Cuidados de Enfermagem com Pacientes em Ventilação Mecânica – Aspiração de Vias Aéreas – Protocolo PAV – Cuidados com Ventilação Mecânica

Nossos Facilitadores Márcio Neres dos Santos – Enfermeiro. Mestre em Educação. Especialista em Recursos Físicos e Tecnológicos em Saúde e Especialista em Auditoria em Saúde. Aperfeiçoamento em Terapia Intensiva. Orientador da Residência Integrada em Saúde (GHC), ênfase em Atenção ao Paciente Crítico. Assistente de Coordenação do Serviço de Emergência do Hospital Nossa Senhora da Conceição do Grupo Hospitalar Conceição (GHC). Atua como docente colaborador no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Moinhos de Vento (IEP/HMV), no Instituto Metodista de Porto Alegre (IPA) e no Centro de Educação Tecnológica e Pesquisa em Saúde (GHC/MS). Docente convidado do Curso de Especialização em Enfermagem em Urgência e Emergência Adulto e Pediátrica da UFRGS e do Curso de Especialização em Enfermagem em Urgência e Emergência da UNISINOS. E-mail: nerespoa@gmail.com. Fábio Rosa – Enfermeiro. Especialista em Enfermagem em Terapia Intensiva e Especialista em Dinâmica e Gestão de Grupo. Enfermeiro do CTI Adulto do Hospital Mãe de Deus (HMD). Atua como docente na Escola Profissional do Instituto de Cardiologia/Fundação Universitária de Cardiologia (IC FUC). Odon Melo Soares – Enfermeiro. Especialista em Enfermagem em Terapia Intensiva. Enfermeiro do UTI Central do Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (ISCMPA). Atua como docente colaborador no Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Moinhos de Vento (IEP/HMV).

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Congressos e Eventos em 2012 Evento

Local

Data

Informações

III Simpósio Internacional de Informática em Enfermagem 20ª Jornada Sul-Brasileira de Dermatologia

Matsubara Hotel São Paulo/SP Costão do Santinho Resort & Spa Florianópolis /SC

16,17 de março

sbis@sbis.org.br www.sbis.org.br www.oceanoeventos.com.br

Brasil+enf -Congresso de Enfermagem

Fiesta Bahia Hotel Salvador/BA

20,21 de abril

brasilenf@atualizacursos. com.br (71) 3444-7952 3240-7171

III Simpósio Internacional de Enfermagem

Auditório do Hospital Samaritano São Paulo/SP

26, 27 de abril

impiesamaritano@expansaoeventos.com.br www.expansaoeventos. com.br

23ª Semana de Enfermagem do HCPA

Hospital de Clinicas de Porto Alegre/RS

09 a 11 de maio

www.hcpa.ufrgs.br

XXX Semana de Enfermagem da Santa Casa de Porto Alegre

Anfiteatro Hugo Gerdau - Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre/RS

10,11 de maio

Fone: (51) 3214.8504 Fax: (51) 3214-8385

XII Encontro de Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica

Hotel Dan Inn Ribeirão Preto/SP

04 a 06 de junho

encontro@eerp.usp.br www.fierp.org.br/encontro/ saudemental2012

XXXIII Congresso da SOCESP

Transamérica Expo Center São Paulo/SP

07 a 09 de junho

socesp@socesp.org.br www.socesp.org.br

19 a 21 de abril

XXXIV Congresso da SBHCI Centro de Convenções de 20 a 22 de Junho XV Jornada Brasileira de EnfermaSalvador/BA gem em Hemodinâmica e Cardiologia

(11) 3849-5034 ou eventos@sbhci.org.br

8º Simpósio Internacional de Esterilização e Controle de Infecção Hospitalar

Palácio das Convenções do Anhembi São Paulo/SP

26 a 28 de Julho

portal.sobecc.org.br

V Congresso Iberolatinoamericano sobre Ulceras y Heridas

Radisson Montevideo, Uruguai.

12 a 14 de setembro

www.heridasenred.com

IV Congresso Brasileiro de Enfermagem em Dermatologia

Hotel Stella Maris – Salvador/BA Convidada Especial: Carol Dealey

19 a 21 de setembro

www.sobende.org.br

9ª Jornada Brasileira de Enfermagem Geriátrica e Gerontológica

Ponta Mar Hotel Fortaleza/CE

19 a 21 de setembro

aben@aben-ce.com.br www.aben-ce.com.br

IV Congresso Brasileiro de Enfermagem em Dermatologia

Hotel Stella Maris Salvador - BA

20, 21 de setembro de 2012

www.sobende.org.br

64º CBEn – Congresso Brasileiro de Enfermagem

Centro de Eventos da PUC Porto Alegre/RS

29 de outubro a 01 de novembro

www.abennacional.org.br

*Envie seu evento para divulgação em nosso calendário: revistasulbrasileira@gmail.com

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