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DUAS VEZES BRECHT
by comlimone
Poucos autores de teatro são tão remontados como Bertold Brecht. Sua obra, com forte teor político foi escrita como panfletos de ideais para a população proletária e seu formato o mais simpático ao seu público. A música faz parte da obra de Brecht e, por vezes, a ultrapassou. A parceria com Kurt Wiel rendeu canções que se espalharam como standards cantados, inclusive, por Frank Sinatra e Ella Fitzgerald (o que dizer da interpretação de Berlin em que ela confunde a letra de “Mack the Knife” e improvisa maravilhosamente?), e traduzidas para inúmeros idiomas.
Em tempos de pandemia e obscurantismo, quando mais precisamos dela, a obra é reencontrada e revisitada.
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DUAS VEZES BRECHT Roberti Gava
NOVAS LEITURAS
Roberto Gava se reconectou com a poesia de Brecht a partir da tradução de André Vallias (que recebeu o prêmio Jabuti pelo trabalho) e se encantou. Ao ler os poemas do dramaturgo alemão, selecionou aqueles que gostaria de musicar. Entrou em contato com o tradutor, que autorizou o uso de sua obra.
Com participações de Zezé Motta, Carlos Careqa, Skowa, Virginie Boutaud, Gereba Barreto, Nina Ximenes, Camila Costa e Ana Lee, Roberto Gava lançou “Bertolt Brecht”. Disponível nas principais plataformas digitais, o disco conta com 15 faixas. Além de compor e interpretar as canções, Roberto Gava fez os arranjos, tocou diversos instrumentos, mixou e masterizou o álbum.
Diferente das canções de cabaré de Kurt Weill, que se notabilizou por musicar Bertolt Brecht, as músicas de Gava sobre os poemas do dramaturgo nasceram com influências do jazz do início do século XX, do tropicalismo, da música erudita, da música brasileira e do psicodelismo dos anos 60. “Tentei fazer um Bertolt Brecht tropical, com pitadas de rock, jazz, MPB e world music, com toques teatrais e certa irreverência, querendo fazer jus à poesia do Brecht, que considero lírica, irônica, teatral, questionadora e revolucionária”.
O projeto foi desenvolvido durante a pandemia de Covid-19 e todos os músicos gravaram de forma isolada, cada um do seu jeito, em suas casas em diversas partes do Brasil e do mundo. Gava explica que os convites para os artistas que participaram do disco foram pensados de acordo com as canções. “O Gereba cantou um rock nordestino; o Skowa, um soul; a Zezé Motta, um tango com pegada teatral; o Carlos Careqa, uma canção mais irônica; a Camila Costa, um samba e um mambo; a Virginie, uma balada e uma canção mais contemporânea, que remete à vanguarda paulista; a Ana Lee, uma balada e um jazz; a Nina, um rock sinfônico”.
Roberto Gava diz ainda ter sido bastante especial trabalhar com artistas que foram referência na sua formação artística. “Cada um deu um toque de si, abrindo minha canção e a poesia do Brecht para outros horizontes”.
O resultado é uma obra singular. Gava se revela numa dualidade de compromisso e descompromisso, próprio de quem entende a necessidade artística de realizar um trabalho sem as imposições dos freios da indústria cultural, porém com o crivo intelectual necessário para se fazer escutado por sem barreiras sociais.
UMA MONTAGEM CUIDADOSA
No mês de novembro, o Theatro São Pedro, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, estreia a ópera Os Sete Pecados Capitais, última colaboração entre o compositor Kurt Weil (1900-1950) e o dramaturgo Bertolt Brecht (1898-1956). Com direção cênica de Alexandre Dal Farra, a montagem terá direção musical de Ira Levin, que vai comandar a Orquestra do Theatro São Pedro, cenografia de Fernando Pessetti, iluminação de Wagner Antônio e figurinos de João Marcos de Almeida e Renato Paiutto.
Montagem inédita conta com direção musical do maestro norte-americano Ira Levin e direção cênica de Alexandre Del Farra. O espetáculo traz ainda Concerto para Violino, do compositor alemão, e Cláudio Cruz como solista. Estreia será dia 05/11, mas haverá ensaio aberto, gratuito, no dia 04/11, às 19h. Ao todo, serão 8 récitas até o dia 14.
Os Sete Pecados Capitais narra a história de uma família na Louisiana, que decide enviar sua filha Anna para as grandes cidades dos EUA, para trabalhar e ganhar dinheiro suficiente para construir uma casa para a família (representada por um quarteto masculino, em que o baixo representa a mãe). Anna consiste em duas pessoas - Anna I (uma cantora) e Anna II (atriz ou bailarina). A ópera é composta por um prólogo e um epílogo e sete cenas em que cada cena é dedicada a um pecado capital.
“As duas irmãs aprendem a se reprimir, mas não para serem melhores pessoas, e sim, para poderem se vender melhor. É também uma ópera sobre empreendedorismo. Sobre essa espécie de estrutura de discurso moral que consiste em internalizar as dificuldades, como se o problema fôssemos sempre nós - e não a estrutura em que estamos inseridos”, destaca Alexandre Dal Farra.
Concebida como sendo um balé cantado, Os Sete Pecados é a obra de Kurt Weill em que predominam os vários tipos de dança e os ritmos a eles associados. O ritmo desempenha um papel importante, sublinhando a ação e os sentimentos dos protagonistas. Na primeira cena, Preguiça, o compositor faz uma paródia da música coral. Na segunda, Orgulho, evoca uma valsa; na terceira, Raiva é um exemplo de foxtrote; na sétima, Inveja é uma marcha que leva em direção ao Epílogo.
Antes da ópera será apresentado o Concerto para Violino, que Kurt Weil compôs em 1924, que terá o maestro e violinista Cláudio Cruz como solista.
“Tocarei pela primeira vez essa obra raramente programada. Apesar de ser uma obra complexa e ter, inicialmente, uma leitura difícil, o estudo está se transformando numa atividade absolutamente prazerosa. Tenho grande expectativa”, afirma Cláudio Cruz.
Com direção audiovisual de Giuliano Saade, o espetáculo será gravado e transmitido posteriormente pelo canal de YouTube do Theatro São Pedro.