Arco nº7

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JORNALISMO CIENTÍFICO E CULTURAL • Nº 7 • ABR/JUL 2017 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

DINOSSAUROS DE SANTA MARIA Região central do Rio Grande do Sul é reconhecida internacionalmente por achados e estudos paleontológicos

DIMITRI

ISSN: 2318-0757

Robô humanoide é fruto de parceria da UFSM com a Coreia do Sul

ENTREVISTA A relevância da colaboração entre Universidade e indústria farmacêutica para o desenvolvimento de pesquisas

GLONASS Projeto russo conta com central de monitoramento de satélites na UFSM

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Carta da

editora

Luciane Treulieb Editora-chefe da revista Arco

Fotografia: Júlia Goulart

A Arco vai completar quatro anos em junho deste ano, e quem acompanha a revista desde o início sabe que sempre ambicionamos atingir o público ‘para além do arco’ - uma metáfora ao arco de entrada do campus da UFSM em Santa Maria. Na verdade, essa segue sendo a nossa meta – e a missão para a qual a Arco foi criada. No entanto, nos demos conta de que, em termos estratégicos, precisávamos primeiramente de um maior reconhecimento institucional da comunidade acadêmica – que já é, de todos os modos, um público considerável: 35 mil pessoas, entre servidores técnicos, docentes e alunos. E isso sem levar em conta ex-alunos e servidores aposentados. Seguimos traduzindo a ciência e popularizando-a. Queremos aproximar diferentes áreas do conhecimento a partir do que de fato se produz na Universidade. Seja contando sobre o projeto de um pós-graduando da Medicina que será lido por um aluno do Colégio Politécnico, ou sobre a pesquisa de um docente da Engenharia Florestal claramente compreendida por um servidor técnico da área de tecnologia. Para nós, esse é um reposicionamento na produção de conteúdo – especialmente na versão digital. Ao nos reposicionarmos, também estamos visando estabelecer um diálogo maior com os pesquisadores da UFSM. Aqui faço um pedido especial aos nossos cientistas: rompam a timidez e divulguem o trabalho desenvolvido por vocês. Essa não é apenas uma questão de visibilidade, mas pode até ser compreendida como um dever: a sua produção científica apresentada para a comunidade de forma compreensível e interessante, segundo o que sustentam os preceitos sobre popularização da ciência. Em linhas gerais, se sua pesquisa pode ser de interesse público, ela pode ser uma pauta jornalística

– isto é, interessa à Arco. Para incentivar essa aproximação, estamos retomando a nossa campanha “Resgate seu trabalho”. Queremos que a Arco seja lembrada cada vez que os departamentos, cursos e grupos de pesquisa da Universidade discutirem projetos que se encaixem na nossa linha editorial. “Acho que isso pode interessar à Arco, vou escrever para eles” deveria ser um pensamento recorrente entre os pesquisadores. Sabemos que se trata de uma mudança de cultura entre os pesquisadores, e é importante que os cientistas se deem conta de que todos ganham com essa divulgação: os leitores, eles próprios e a instituição. No último ano, três matérias produzidas por nós acabaram gerando uma expressiva repercussão: um texto publicado no nosso site foi citado em um artigo da revista Carta Capital, de circulação nacional; uma reportagem da Arco foi divulgada no extinto jornal A Razão, de Santa Maria; e uma entrevista com um pesquisador que veio a Santa Maria participar de um evento apoiado pela UFSM foi reproduzida pelo Diário de Santa Maria. O LEx, Laboratório de Experimentação em Jornalismo, tem sido um aliado fundamental nesse momento de reposicionamento. Mais pessoas, com formações distintas, foram incluídas na nossa equipe, e estamos pensando constantemente em como tornar a revista mais atrativa e manter os conteúdos de qualidade. Vamos investir em formatos jornalísticos diferenciados e estamos trabalhando na construção de um novo site, que será lançado até a metade deste ano. Além disso, a Arco tem sido exemplar no sentido de mostrar que é possível que a Coordenadoria de Comunicação da UFSM e o curso de Comunicação trabalhem juntos, gerando bons resultados em prol da Universidade. Nesta 7ª edição impressa da Arco, a Paleontologia é o tema principal das matérias do nosso dossiê. Nossa ideia é destacar o quanto a região de Santa Maria é reconhecida internacionalmente por achados fósseis, com o desenvolvimento de importantes estudos no Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica da Quarta Colônia, que existe na UFSM desde 2013. Entre os outros assuntos trabalhados nesta edição, a internacionalização da Universidade é destaque em duas matérias sobre as parcerias da UFSM com a Rússia e a Coreia do Sul, que têm gerado pesquisas e até um robô – o Dimitri. Todas as edições impressas estão disponíveis no nosso site, que também apresenta conteúdos exclusivos produzidos para o formato digital. Acesse nosso site (ufsm.br/arco), leia a revista impressa, curta nossa página no Facebook e, se tiver comentários ou sugestões, escreva para nós. Boa leitura!

carta da editora

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sumário 07 curiosidades As portas corta-fogo, o traje do reitor e o porquê de a Avenida Roraima se chamar assim

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Diário de Campo Psicólogo investiga como usuários de crack percebem as campanhas de prevenção ao uso de drogas

08 nossas invenções Parceria entre Brasil e Coreia do Sul dá origem ao robô Dimitri

10 como surgiu? Conheça a história milenar do elevador

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19 DOSSIÊ Paleontologia é tema de projetos desenvolvidos na UFSM

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linha do tempo As principais descobertas da Paleontologia na região centro do Rio Grande do Sul

turismo Turismo paleontológico em Santa Maria e região demanda mais investimento

fósseis Avanço da urbanização fere preservação da nossa história

SOCIEDADE Música e arte para crianças e jovens da periferia de Santa Maria


ARCO a

Revista de Jornalismo Científico e Cultural da Universidade Federal de Santa Maria Universidade Federal de Santa Maria Reitor Paulo Afonso Burmann Vice-Reitor Paulo Bayard Dias Gonçalves

Conselho Editorial Amanda Eloina Scherer Professora do Departamento de Letras Clássicas e Linguística Ascísio dos Reis Pereira Coordenador de Eventos e Difusão Cultural da Pró-Reitoria de Extensão Beatriz Teixeira Weber Professora do Departamento de História Bernardo Baldisserotto Professor do Departamento de Fisiologia e Farmacologia

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ensaio Arquivo Permanente preserva memória fotográfica da UFSM

Daniel Arruda Coronel Diretor da Editora UFSM Graziela Maria Braga da Silva Coordenadora da Coordenadoria de Comunicação Social Hélio Leães Hey Diretor do Núcleo de Inovação e Transferência em Tecnologia Ivan Luiz Brondani Professor do Departamento de Zootecnia

16 tecnologia

18 HISTÓRIA

UFSM é sede de estação de monitoramento de satélite russo

Livro conta história da luta por justiça e direitos do povo negro em Santa Maria

30 entrevista

32 editora ufsm

Pesquisador destaca a importância da parceria público-privada para o avanço da saúde

Obra reúne pesquisas e técnicas sobre o cultivo do eucalipto no Brasil

37 recordações

38 escritos

Professor Ruben Boelter conta a história do seu anel de formatura

Poesia premiada expõe feridas emocionais

José Neri Gottfried Paniz Professor do Departamento de Química Lana D’Ávila Campanella Professora do Departamento de Ciências da Comunicação — Campus Frederico Westphalen Laura Strelow Storch Professora do Departamento de Ciências da Comunicação Luiz Fernando Sangói Coordenador da Educação Básica, Técnica e Tecnológica Marco Aurélio de Figueiredo Acosta Professor do Departamento de Métodos e Técnicas Desportivas Marcus Vinicius Tres Coordenação de Pesquisa e Extensão – Campus Cachoeira do Sul Marilda Oliveira de Oliveira Professora do Departamento de Metodologia de Ensino Martha Bohrer Adaime Pró-reitora de Graduação Mônica Elisa Dias Pons Professora do Departamento Multidisciplinar (Udessm) Paulo Cesar Piquini Coordenador de Iniciação Científica da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Rafael Aldrighi Tavares Professor do Departamento de Zootecnia e Ciências Biológicas — Campus Palmeira das Missões Raul Ceretta Nunes Professor do Departamento de Computação Aplicada Sérgio Luiz Jahn Professor do Departamento de Engenharia Química

Expediente Editora-chefe Luciane Treulieb Criação e Diagramação Carolina Delavy Chagas, Deirdre Holanda, Evandro Bertol, Filipe Ventura Duarte, Juliana Krupahtz, Kennior Dias, Nicolle Sartor, Vinicius Beltramin e Raquel Elise de Moraes Fotografias Rafael Happke Repórteres Andressa Doré Foggiato, Bernardo Souza Zamperetti, Guilherme Denardin Gabbi, Gabriele Wagner de Souza, Gustavo Parodia Martinez e Luciane Volpatto Rodrigues Colaboradores Leonardo Martins Penna, Ruben Boelter Revisão Alcione Manzoni Bidinoto Revista Arco Telefone: (55) 3220-6151 E-mail: arco@ufsm.br Site: ufsm.br/arco UFSM - Av. Roraima, 1000 Cidade Universitária - Bairro Camobi Prédio 67, sala 1110 - CEP 97105-900 Santa Maria - RS - Brasil Distribuição: Gratuita Impressão: Tavares e Tavares Tiragem: Dois mil exemplares

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Carta do

Leitor Este é o espaço reservado para os nossos leitores. Ficou com alguma dúvida? Percebeu algum erro? Quer fazer um comentário ou um elogio? Escreva para a gente e colabore para que a Arco fique cada vez mais útil e interessante!

PORTUGAL O que “achei” em meia dúzia de palavras: conteúdos de qualidade, leitura acessível e grafismo excelente. Estão de parabéns. Marco Pais Neves dos Santos, doutorando em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento na Universidade Aberta de Portugal

Lucas Visentini, professor da Escola Miguel Beltrame

SUSTENTABILIDADE Admiro muito o trabalho de vocês. Inclusive instalei um reservatório de coleta da água da chuva na minha casa a partir de uma matéria da revista. Rego todas as plantas, minha pequena horta e uso na limpeza da casa e do pátio... é muita água!

Fotografia: Rafael Happke

EXPERIÊNCIA Um aspecto importante em trabalhar com a revista Arco em sala de aula diz respeito à relevância de aproximar os estudantes — neste caso, com idades que variam entre dez e 13 anos, de ações oriundas da UFSM, para que se possa, dessa forma, tecer possibilidades de interação e inserção na Universidade desde os primeiros anos no Ensino Fundamental.

O lançamento da 6ª edição aconteceu no Festival de Inverno da UFSM em Vale Vêneto

Errata

Vanessa Solis Pereira, psicóloga

Na matéria Um convite de descanso aos olhos e ouvidos, publicada na 4ª edição da Arco, referimos que o professor Marco Antônio Verardi Fialho possui “pouco conhecimento sobre aves”. Em contato com a Arco, ele esclareceu: “Meu contato com as aves iniciou na minha infância, década de 1970, e de lá para cá são alguns anos de observação e conhecimento sobre a diversidade de espécies de aves que habitam o Rio Grande do Sul”. Pedimos desculpas ao professor pela imprecisão.

Fotografia: Rafael Happke

Fale com a gente

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carta do leitor

Telefone: (55) 3220 6151 E-mail: arco@ufsm.br www.ufsm.br/arco www.facebook.com/RevistaArco UFSM – Av. Roraima nº 1000, Cidade Universitária, Bairro Camobi Prédio 67, sala 1110 CEP: 97105-900 Santa Maria – RS, Brasil


curiosidades

VOCÊ SABIA? É VERDADE QUE...?

A cada edição, a seção Curiosidades responde àquelas questões que você sempre quis saber se eram mitos ou verdades e conta histórias singulares sobre a UFSM

A BORLA representa o poder temporal do reitor

O COLAR REITORAL é usado como símbolo de poder e transferido para novos reitores na posse

Você sabe de onde veio a ideia do traje cerimonial usado pelo reitor? As roupas usadas pelos reitores em cerimônias especiais têm origem em trajes de sacerdotes da Roma Antiga. Os Trajes Talares, como são chamados, são vestimentas compridas que vão até a altura do calcanhar, cobrindo praticamente todo o corpo, e foram adotados nas universidades europeias em meados do século 18, quando a figura do reitor surgiu nas instituições de ensino. Na UFSM, as vestes talares devem ser usadas nas solenidades de Colação de Grau e também podem ser usadas nas sessões solenes de outorga de títulos honoríficos, como Doutor Honoris Causa. Esses trajes representam o poder e a posição hierárquica do reitor, e algumas peças possuem significado especial. Em outras instituições, seu uso é obrigatório também em cerimônias de transmissão do cargo do reitor.

Já o CAPELO na cor branca representa o domínio do conhecimento em todas as áreas

Você sabia que as portas corta-fogo suportam temperaturas superiores a 1000°C? As portas corta-fogo têm como função impedir a propagação de calor e fogo, devendo, por isso, ser mantidas fechadas. Elas são feitas de aço galvanizado — aço revestido por outro metal para evitar a corrosão — e têm o núcleo de fibra cerâmica refratária, desorganizada e compactada. Essa manta refratária é um material que não incendeia, leve, flexível e de baixa condutividade térmica, com um uso limite em 1260ºC e ponto de fusão em 1760ºC. No Brasil, as portas corta-fogo são utilizadas, por força de lei, desde a década de 1970, período em que ocorreram diversos incêndios em edifícios altos no país. São indicadas para escadas de emergência, entrada de escritórios e apartamentos, áreas de refúgio e rotas de fuga. Na UFSM, em dezembro de 2015, alunos de Química Industrial fizeram uma campanha de sensibilização e informação a respeito dessas portas, e também sobre a importância de mantê-las fechadas. A professora Marta Tocchetto conta que os alunos confeccionaram cartazes que foram colados pela Universidade e passaram uma tarde prestando informações às pessoas que passavam pelo prédio da reitoria. “As pessoas que andam pelas escadas deixam as portas abertas pra não ter que abrir e fechar toda a vez. É o comodismo”, explica Marta.

Você sabe por que o principal acesso ao campus sede da UFSM se chama avenida Roraima? A Avenida Roraima foi inaugurada em 14 de dezembro de 1970 e é o principal acesso para o campus da UFSM em Camobi. Ela recebeu esse nome devido à parceria entre a UFSM e o estado de Roraima. Em 1969, o então reitor em exercício, Mariano da Rocha Filho, participou como conselheiro do Projeto Rondon. Mariano teve a ideia de fazer com que as ações do Projeto fossem mais eficazes. Então, em 1969, foi instalado o Campus Avançado de Boa Vista, em Roraima, que visou atender a comunidade local, com foco nas áreas da saúde e educação. Com isso, todo mês, acadêmicos da UFSM iam até o Campus Avançado trabalhar e dar continuidade aos serviços prestados. Assim, através das ações executadas pelo Projeto, foi possível mensurar as necessidades das comunidades locais e, então, propor cursos de graduação no Campus Avançado. A sede da UFSM em Roraima fechou em 1985 e as instalações foram fundamentais para a criação da Universidade Federal de Roraima em 1989. Mande a sua dúvida ou conte a sua história curiosa relativa à UFSM para nós: arco@ufsm.br. Colaboraram a professora do Departamento de Química Marta Tocchetto, a Relações Públicas do Gabinete do Reitor Tânia Regina Weber e Eugênia Barichello, professora do Departamento de Ciências da Comunicação

curiosidades

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nossas invenções

Inteligência artificial

para exportação Robô produzido na UFSM auxilia pesquisas do outro lado do planeta

A TauraBots, equipe de futebol de robôs humanoides da UFSM, ganhou mais um integrante: o robô Dimitri. O novo androide é o primeiro a ser financiado por meio de cooperação internacional entre a UFSM e um laboratório da Korea Advanced Institute of Science and Technology (KAIST), da Coreia do Sul. Dimitri tem auxiliado em pesquisas na área da robótica cognitiva, que utiliza uma linguagem de programação baseada no raciocínio lógico. A parceria foi iniciada a partir de um encontro entre o professor da UFSM e orientador do projeto, Rodrigo Guerra, e o diretor do laboratório sul-coreano, Jun Tani. O robô, que foi construído no final de dezembro de 2015 e exportado para a Coreia, é composto por torso, cabeça e braços robóticos, que lhe dão sensibilidade para manipular instrumentos e entender quando está apertando um objeto, por exemplo. Um segundo Dimitri foi construído na UFSM para que possa trocar códigos com o robô da Coreia. O androide que está em terras brasileiras tem ainda duas pernas e cerca de 1,24 metros de altura, um dos maiores robôs humanoides já projetados no Brasil. A ideia do nome partiu da sugestão de um integrante do projeto, que, ao considerar que atores de filmes russos são robustos e que o robô também tem esse atributo, concluiu que o invento precisaria ter um nome de origem russa. De acordo com os desenvolvedores, um bloco de concreto pode ser lançado sobre o Dimitri que, ainda assim, não ocorrerão estragos.

Conexão

O atuador de série elástica precisou de quase dois anos de pesquisas para ser desenvolvido. Ele é compacto, de baixo custo e constituído por poliuretano de baixa densidade

A expectativa é que se a equipe de Santa Maria melhorar a funcionalidade da máquina aqui, essa informação possa ser utilizada na Coreia do Sul — e vice-versa — já que os dois robôs têm como base o mesmo sistema, o que facilita a troca de códigos. Outro diferencial dos Dimitris é que eles possuem atuadores de série elástica especial — uma espécie de mola colocada nas articulações — inseridos nos braços e pernas, mas que podem ser colocados em qualquer articulação do corpo. Os motores de robôs que não possuem esse objeto diferenciado precisam de um atuador específico para cada articulação e, ainda assim, podem quebrar ou desligar quando são submetidos a uma força específica. Com a inovação desenvolvida na UFSM, os robôs mantêm a comunicação com o ambiente, mesmo que estejam sendo forçados, o que aumenta a segurança da interação entre a máquina e o meio em que está inserida.

Investimento

Fotografia: Rafael Happke

Desenvolver tecnologias desse tipo exige um bom investimento financeiro: cada robô custou pelo menos R$ 65 mil, segundo o professor Guerra. Só os motores utilizados no Dimitri brasileiro — que foram aproveitados de outro projeto — custaram R$ 4 mil cada um, somando o total de R$ 52 mil. O professor Guerra, que chegou a empregar recursos próprios no projeto, aponta que a importância do Dimitri para o futuro justifica o alto custo de desenvolvimento. “Ele é um robô que agora não tem pretensão de resolver problemas domésticos, de lavar louça ou ajudar pessoas com necessidades especiais, por exemplo, mas ele explora esse tipo de tecnologia, é um passo nessa direção”, comenta. a Repórter: Gabriele Wagner de Souza · Diagramação: Kennior Dias

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nossas invenções

Os desenvolvedores do Dimitri resolveram disponibilizar os arquivos utilizados para a construção do robô a quem desejar contribuir ou até mesmo copiar a invenção. O software e mais informações sobre o projeto podem ser obtidas por meio de contato com a equipe em facebook.com/tauraboots


Fotografia: Rafael Happke

sociedade

a periferia toca mozart Projeto de extensão muda a vida de crianças e jovens carentes através da música O termo spalla surgiu na Itália para se referir à escada que apoia o ator principal em uma peça. Em uma orquestra, o spalla é responsável pela primeira afinação dos instrumentos no palco, e é o apoio do músico principal, o maestro. O Projeto Orchestrarium, que promove a inclusão social através da música, de forma gratuita, pode ser considerado o spalla na vida de dezenas de crianças e jovens da periferia de Santa Maria. O projeto de extensão, vinculado ao Centro de Artes e Letras da UFSM, surgiu em abril de 2013 na região norte da cidade e foi idealizado pelo professor do curso de Música da UFSM Marco Antônio Penna. Através da arrecadação de instrumentos pelas redes sociais, as primeiras crianças e jovens, de seis a 29 anos, tiveram contato com violinos, violas e violoncelos. O projeto, que começou com 15 alunos, atendeu cerca de 150 novos músicos em 2016. As aulas acontecem no turno inverso da escola e contemplam diversas artes, como a música, a dança e o teatro, e até mesmo a matemática e o português. Aos sábados, há aulas de reforço para quem

está com alguma dificuldade na escola, já que o bom desempenho é requisito básico para tocar na orquestra principal. Além disso, as coordenadoras do projeto prezam por trabalhar junto com as famílias, devido à realidade delicada de algumas crianças, que enfrentam abandono, abuso e violência. Para a coordenadora geral, Mirian de Agustini Machado, o Orchestrarium é um projeto de inclusão e integração social. Independentemente de classe social, a integração se faz para que as pessoas não percebam no momento de ensaio ou apresentação quem é o filho de quem tem um pouquinho mais de condição e daquela família que não tem dinheiro para a comida. Durante o ano, diversos acadêmicos da UFSM compartilham seus aprendizados com as crianças e jovens. Segundo Mirian, alunos de bacharelado e licenciatura da Música, das Letras, e da Dança trabalham de forma voluntária e constituem a grande família que é o projeto Orchestrarium. Para a gestora, o contato com os universitários cria nos pequenos músicos

a perspectiva de também entrar em uma universidade no futuro, principalmente no curso de Música. Para o violista Luan Levi, 15 anos, a principal mudança que o projeto proporcionou está na família. “As pessoas começam a te ver diferente, porque tu começa a abranger outros conhecimentos que eles não têm”. Já Hemelayne Lima, que toca violoncelo, sonha em entrar na faculdade de Música e não quer se desvincular do projeto quando chegar nessa fase. Ela explica que quer continuar para ajudar os novos alunos que chegam, assim como a ajudaram quando iniciou. Diante das dificuldades de arrecadar instrumentos e de levar os alunos até os locais de ensaios e apresentações, o Orchestrarium encontra apoio em editais de recursos públicos e na ajuda financeira de pais e colaboradores. O principal objetivo é permanecer interferindo na vida de crianças e jovens, para que cada vez mais eles tenham a oportunidade de pisar em um palco ou atravessar o arco da universidade pela primeira vez. a Repórter: Andressa Foggiato · Diagramação: Kennior Dias

sociedade

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como surgiu?

subindo e descendo É difícil imaginar nosso cotidiano sem o elevador, não? Desde os primórdios, existe a necessidade de mover bens, materiais pesados e pessoas. No entanto, os métodos e instrumentos utilizados avançaram significativamente com o tempo. Confira a seguir o desenvolvimento do elevador ao longo dos anos

1743

2900 a.c. A Grande Pirâmide de Quéops, em Gizé, uma das Sete Maravilhas do Mundo Antigo, foi construída com uma altura de 147 metros, o equivalente a um prédio de 49 andares. Pedras pesando até cinco toneladas foram transferidas para o lugar com mecanismos de elevação rudimentares. Livros de história citam o envolvimento de 4 mil pedreiros e 100 mil trabalhadores.

O rei francês Luís XV foi um dos primeiros a usufruir dos elevadores utilizados por passageiros, desenvolvidos no século 18. A construção no Palácio de Versalhes aconteceu para que o rei fosse carregado dos seus aposentos até o quarto de sua amante, que ficava em outro andar. O elevador era conhecido como “cadeira voadora” e o modo de funcionamento pouco se modificava daqueles usados na Roma Antiga.

2000 a.c. Os egípcios elevavam a água do Rio Nilo para irrigação, através do uso de uma alavanca de contrapeso — o shaduf, no Brasil conhecido como picota.

1823 336 a.c. Na Roma Antiga, existem referências de ascensores rudimentares ligadas ao filósofo e inventor grego Arquimedes. Esses elevadores eram vagões abertos e consistiam de uma plataforma com molinetes que possibilitavam que a cabine se movimentasse de maneira vertical. Esses molinetes eram movidos por pessoas, animais ou rodas d’água.

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como surgiu?

Na Inglaterra, os engenheiros e arquitetos Burton e Hormer criaram uma “sala ascendente” a vapor para carregar turistas até uma plataforma que permitia ter uma visão geral de Londres. Anos depois, a invenção foi aperfeiçoada pelos também arquitetos britânicos Frost e Stutt, que adicionaram cinto de segurança e um contrapeso ao vapor.


1846

1889

Em 1846, Sir William Armstrong introduziu o guindaste hidráulico, e, no início dos anos 1870, máquinas hidráulicas começaram a substituir o elevador movido a vapor. O elevador hidráulico é suportado por um êmbolo pesado, movendo-se num cilindro, e operado pela pressão da água (ou petróleo) produzido por bombas.

Na Exposição Mundial de Paris, o engenheiro Alexandre Gustave Eiffel apresenta a torre que leva seu nome com cinco elevadores hidráulicos movidos a vapor, utilizando o sistema criado por Otis alguns anos antes. O elevador elétrico começou a ser desenvolvido no final do século 19 pelo inventor alemão Werner Siemens, assim que foram instaladas as primeiras redes de energia.

2016

1853

O elevador mais alto atualmente fica no arranha-céu Burj Khalifa, em Dubai, nos Emirados Árabes. A estrutura é a mais alta já construída no mundo, possui 830 metros. O elevador é também o mais rápido do mundo — desloca os ocupantes a uma velocidade de 18 metros por segundo. a Repórter: Bernardo Zamperetti

Em uma exposição em Nova York, o inventor norte-americano Elisha Grave Otis comprovou a eficiência do seu chamado “paraquedas de segurança”. Diante de uma multidão de espectadores, ele ficou em cima do palanque de um guincho impulsionado por um motor de vapor e, quando chegou ao ponto mais alto, pediu que o cabo de suspensão fosse cortado. Ao invés de cair, a plataforma foi parando em seus trilhos, devido a um sistema de pivôs de molas e barras verticais.

Diagramação: Juliana Krupahtz Ilustração: Nicolle Sartor

1931 1867 O engenheiro Léon Ledoux apresentou em Paris um elevador hidráulico. O sistema era alimentado pela pressão da água fornecida por grandes pistões de uma fonte de distribuição. Muitos desse tipo de elevador foram instalados em prédios da capital francesa

No então prédio mais alto do mundo, o Empire State Building, em Nova York, foram colocados 67 elevadores de última geração. O modelo operado é basicamente o mesmo até hoje: um motor elétrico localizado numa casa de máquinas – embaixo ou em cima do fosso – movimenta o elevador e um contrapeso, através de um sistema automatizado, que funciona bastando apertar um botão.

como surgiu?

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diário de campo

cicatrizes da

exclusão

Uma mesa, um quadro e algumas cadeiras dispostas em círculos mobiliavam a sala quase vazia da casa ocupada pelo Centro de Atenção Psicossocial — Álcool e Outras Drogas (CAPS AD) em Santa Maria. Era nesse local que o psicólogo Moisés Romanini e usuários de crack se encontravam em 2011, e onde ele frequentou, durante dois meses, as reuniões da equipe, os grupos terapêuticos e oficinas com os usuários. Esse primeiro vínculo possibilitou o começo de rodas de conversa sobre a campanha de prevenção ao uso do crack — Crack Nem Pensar, da RBS — objeto de estudo do seu mestrado em Psicologia na UFSM, sob orientação da professora Adriane Roso. Para o pesquisador, a dificuldade de participação social dos usuários aumenta o sentimento de exclusão. Entre os 16 participantes das rodas de conversa, apenas três estavam trabalhando. Entre os outros, parte estava afastada da escola, vivia na rua e não criava laços duradouros com outras pessoas. Romanini percebeu a importância de produzir uma psicologia de reconhecimento,

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diário de campo

Pesquisador investigou como usuários de crack se sentem representados nas campanhas de prevenção às drogas

em que os usuários pudessem falar e sentir-se incluídos. Assim, Moisés procurou entender como eles percebiam e se sentiam frente à campanha Crack Nem Pensar. O estudo da relação entre mídia e droga já era familiar para Romanini, que desenvolveu seu trabalho final de graduação em Psicologia sobre esse tema. No CAPS, o pesquisador conviveu com os usuários e iniciou três grupos de discussão. Nos encontros, os usuários deveriam estar acompanhados de profissionais da instituição. A medida foi importante, pois as reuniões poderiam suscitar sentimentos e lembranças desagradáveis aos participantes, que precisariam de apoio. Os usuários, na maioria, já se conheciam, alguns pela vivência nas ruas, e outros pela internação em centros de desintoxicação. As anotações a seguir, muito particulares, fizeram parte do método de pesquisa de Moisés, apoiado pela observação da rotina do CAPS. As experiências e percepções foram registradas em seu Diário de Campo.


1ª Cena Hoje foi o primeiro dia que estive junto com os usuários do CAPS AD. Logo que cheguei, uma das profissionais me apresentou a alguns deles. Fui muito bem recebido por todos. Estávamos sentados na sala da equipe quando o telefone tocou. Assim que ela desligou, contou-nos a história: era a gerente da escola de idiomas, que fica localizada ao lado do CAPS. Por que ela não foi ali para conversar? (Questionava-me). A reclamação era que, pela manhã, quando a secretária da escola chegou, os usuários estavam ali na frente bebendo (Bêbados! – pensei) e fumando maconha (Será que não era cigarro? — Pensei outra vez). Ela ainda completou dizendo que no outro dia jogaram objetos — pedras e tomates — no pátio deles. Disse também que a secretária tem medo quando chega à escola sozinha e que já perderam alunos por causa das “bagunças” do CAPS.

2ª Cena Participei da Oficina Online, que ocorre semanalmente na sala de computação da Biblioteca Pública Municipal. Uma situação me chamou muito a atenção: um participante da oficina estava assistindo ao clipe da música Eu só quero é ser feliz. Ele estava vidrado na tela e visivelmente emocionado. Cantarolando junto com o clipe, uma lágrima percorreu sua face. Tocado com o que vi, busquei a letra da música na internet e reproduzo aqui um trecho:

“Eu só quero é ser feliz, Andar tranquilamente na favela onde eu nasci, é. E poder me orgulhar, E ter a consciência que o pobre tem seu lugar. (...) Minha cara autoridade, eu já não sei o que fazer, Com tanta violência eu sinto medo de viver. Pois moro na favela e sou muito desrespeitado, A tristeza e alegria aqui caminham lado a lado. Eu faço uma oração para uma santa protetora, Mas sou interrompido a tiros de metralhadora. Enquanto os ricos moram numa casa grande e bela, O pobre é humilhado, esculachado na favela. (...) Eu só quero é ser feliz... (...).” Trecho do Rap da Felicidade, de Cidinho & Doca

3ª Cena Na sexta-feira estávamos na cozinha e um usuário, que deve ter uns 13 ou 14 anos, estava sentado conversando conosco. Repentinamente, ele olha para mim e diz: “Um dia quero ser igual a tu!”. Ele falou sorrindo. Surpreendido pela declaração do menino, questionei: “Como assim?”. Ele respondeu: “Eu tenho o sonho de ser um doutor, inteligente... queria ter um consultório só pra mim ou um escritório, pra ficar sentado trabalhando num computador”. Ele queria saber o que precisa fazer para alcançar seu sonho. Então conversamos sobre escola, estudos, universidade... e, mais do que isso, sobre esperança. Ele disse que ficou feliz com nossa conversa. E eu também.

4ª Cena Hoje o assunto no CAPS foi a morte de um jovem que frequentava o serviço. Tive pouco contato com ele, mas lembro quando ele disse na quinta-feira que não voltaria mais ao CAPS. E não voltou. A equipe estava providenciando sua internação em uma fazenda terapêutica, e ficaria tudo certo para essa semana. Ele foi baleado por um policial ao tentar roubar uma escola na madrugada do domingo. Fiquei um pouco chocado ao receber a notícia, mas logo os usuários queriam conversar sobre o assunto. Quando eu estava no pátio com eles, um usuário leu a notícia que foi publicada hoje no Diário de Santa Maria. Após a leitura eles discutiram se o rapaz “estava no inferno”. Um respondeu: “Ele já vivia no inferno quando estava vivo”. Outro disse: “Claro que está no inferno... ele roubava de pessoas inocentes, usava crack, aloprava por aí...”. Após um tempo de discussão, um dos guris disse que não concordava com a opinião dos demais e que encerrassem o assunto, pois estavam falando de crenças religiosas.

diário de campo

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5ª Cena Das três pessoas que tinham consulta marcada e haviam confir- “repórter” na justiça. (...). Quando ela falou em campanha da RBS, mado presença no grupo, uma não foi, e os outros dois foram, a profissional que a atendia entendeu que a situação se tratava de mas não quiseram ficar para participar do grupo. Com um deles um mal-entendido, e que a mulher estava se referindo à minha houve uma confusão. Eu ainda não havia chegado ao CAPS. Esse pesquisa. No caso, o “repórter” era eu. Desfeito o mal-entendido, usuário veio acompanhado da mãe. Essa mãe chegou muito essa mãe ficou mais calma, mas mesmo assim solicitou que eu alterada no serviço, acusando a equipe de ter dado o número de ligasse novamente para confirmar a explicação. Quando cheguei telefone da família para um repórter da RBS. Os profissionais da ao CAPS, me contaram a situação ocorrida e me disseram que, equipe não entendiam o que ela estava falando. Ela disse que está apesar de o rapaz ter demonstrado interesse em participar do se formando em um curso superior e que iria colocar o CAPS e o grupo, a mãe quis ir embora e levou o filho junto com ela.

6ª Cena Logo que cheguei ao CAPS, conversei um pouco com um rapaz que iria nessa manhã para uma internação em Nova Palma. Questionei-o sobre suas expectativas em relação à internação, ao que ele me responde: “Eu tô bem empolgado, tava precisando dessa internação por causa da vontade de usar... acho que agora vou começar o tratamento mesmo”. Perguntei se no CAPS ele já não estava se tratando: “Um pouco sim... mas fico muito tempo sem fazer nada e essa gurizada aí não é fácil”. Mais tarde, após uma situação de violência ocorrida no serviço com um dos usuários, um dos profissionais da equipe solicitou a presença de um vigilante da prefeitura dentro do CAPS. Depois do “sufoco”, chegou um vigilante e o responsável por esse setor na prefeitura. Após algumas explicações sobre o serviço e sobre o que havia ocorrido, os dois nos disseram algumas coisas, e algumas frases ditas foram muito marcantes para mim e as reproduzo nesse diário:

“Eu conheço vários deles. O ‘fulano’ [referindo-se ao usuário que apresentou comportamentos violentos naquela manhã] cresceu com a gente na rua. Eles já conhecem e já estão acostumados com o nosso jeito de trabalhar: desce o pau neles”.

“Se vocês querem os vigias aqui, vocês vão ter violência. O nosso treinamento é para bater e imobilizar os vagabundos. É claro, a gente entra em ação quando a conversa de vocês não funciona mais”.

“Vocês tinham que ter dado parte na polícia. Eles têm ficha suja. Vão dando parte até que a polícia vai guardando eles”.

“São tudo vagabundo e só vêm aqui pra comer de graça. Eles saem daqui e vão pro centro nos incomodar, roubar...”.

“Pra dar conta deles vamos precisar de dois vigias”.

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diário de campo


7ª Cena Cheguei hoje ao CAPS e estranhei o silêncio. Encontrei apenas comparavam entre si com base na quantidade de cicatrizes e no duas profissionais dentro da casa. Saí no pátio e fiz a volta na tempo ou número de vezes que “puxaram cadeia”. Os que têm casa. Nos fundos, encontrei dois estagiários do CAPS, numa mais cicatrizes no corpo e mais tempo de cadeia se consideram “roda de conversa” com sete usuários do serviço. Juntei-me à e são considerados mais fortes, portanto, merecem mais respeito roda. Conversamos durante quase duas horas. (...). Um momen- que os outros. Observei que o respeito está associado à obediência to da conversa que me chamou a atenção foi quando os guris “cega” ao “mais forte” e, consequentemente, ao medo. A “lei do começaram a mostrar suas cicatrizes. Parecia uma disputa de mais forte” e do medo, vivenciadas na rua, parecem estar sendo quem tinha mais cicatrizes no corpo. Cada cicatriz mostrada “reproduzidas” dentro do CAPS. a Repórter: Andressa Foggiato · Diagramação vinha acompanhada de uma história vivida por eles. Eles se e Ilustração: Carolina Delavy, Deirdre Holanda e Juliana Krupahtz

trechos da roda de conversa

"E outra coisa ó, eles [os policiais] só vão nas favelas, nos cortiços, nas vielas ver os irmãozinhos fumando aí. E outra coisa, por que eles não vão na burguesia ver se eles não acham aí pior do que quem mora em favela? E o que eles passam também: eles vendem a fuseu [muito] pros ricos!"

"A família do cara chega, julga o cara, te fala isso e aquilo, mas não consegue conversar, amparar, saber se o cara quer se internar, te ajudam com isso, te ajudam com aquilo. Se o cara já não tem o apoio da família, vai ter de quem? Então o cara vai usando mesmo, e vai usando, e vai usando, e a vida já não tem mais sentido..."

"Eu vi, eu vi agora no final de semana na televisão. Os índices de violência e homicídio, e assaltos que acontecem aumentou depois que veio o crack pra cá. Isso aí é inegável, né. Isso o que a propaganda mostra tá certo. O que não é verdade é o que mostraram a pessoa ali quase morrendo e com sangue, e daquele jeito ali. Eu pelo menos nunca vi uma pessoa em fase terminal do crack pra também tá falando, né, mas eu acho que é muito melhor mostrar as cenas reais, das pessoas fumando, como é que fica de verdade, ou mostrar o cérebro de uma pessoa, os neurônios de uma pessoa, o pulmão de uma pessoa, do que mostrar aquilo ali."

"Ah, eu acho que pra diminuir não é qualquer campanha, não é qualquer coisa não (...). Porque, pra diminuir, fecha uma boca, abre dez, não é bem assim. Num país corrupto como o nosso, isso não vai melhorar dum dia pro outro. Nem uma década, nem duas."

(...) “Não é que não funciona. É como nesse caso que o próprio vício comanda, que o vício é muito mais forte do que uma propaganda. Ela se torna pequena perto de um vício.”

"Não é o crack o único culpado. Eu acho que o governo, acho que a falta de lazer, eu acho que a falta de oportunidades pros jovens, a corrupção do país, isso aí é um ciclo que faz com que a gente se torne usuário e faz com que a gente entre nesse mundo, entendeu? Não é que seja o único culpado."

"Só tem um detalhe muito grande nisso aí que ninguém prestou atenção também. O usuário mesmo, até nem digo nós aqui, mas todo mundo aqui já usou e já teve lá no fundo do poço, cara. Quem tá no fundo do poço mesmo não tem acesso a essa propaganda. Entendeu? Não tem acesso à propaganda, então, não faz diferença pra quem tá usando, pra quem tá no fundo do poço mesmo."

diário de campo

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tecnologia

tecnologia em geolocalização É cada vez mais comum, especialmente nas grandes cidades, que os motoristas utilizem sistemas de navegação, como o Google Maps ou o Waze, para se localizar no trânsito ou encontrar a melhor rota para seu destino. Quem viaja para uma região desconhecida também percebe as vantagens dessa tecnologia. Mas dificilmente imaginamos de onde saem todas as informações, como elas são processadas e o método para que elas cheguem aos nossos celulares e computadores. Aquilo que geralmente chamamos de GPS é apenas uma parte do processo. Na verdade, existem, atualmente, dois principais sistemas de posicionamento e localização por satélites em pleno funcionamento: o GPS, desenvolvido pelos Estados Unidos, e o Glonass, que pertence à Rússia. Para os usuários, na prática, são sistemas complementares. Um sistema de navegação por satélite é capaz de indicar a localização geoespacial de determinado ponto no globo terrestre por meio de satélites que estão em órbita ao redor do planeta. Na prática, são necessários ao menos quatro satélites dispostos em diferentes lugares, que realizam um processo chamado de trilateração e enviam informações que possibilitam a determinação de coordenadas do ponto rastreado. Além do mapeamento, esses sistemas têm aplicação nas mais diversas áreas técnicas e científicas, como nos transportes (terrestre, aéreo e marítimo), na segurança (defesa civil, polícia, bombeiros), no rastreio de veículos, animais e pessoas (as “tornozeleiras”), na agricultura de precisão, nas telecomunicações, etc. No dia a dia, quando acessamos os dados de navegação no carro, ou em qualquer aplicativo para celular, a comunicação entre os sistemas acontece de forma a oferecer o serviço mais preciso possível. Os satélites do GPS e do Glonass, posicionados

UFSM se insere no projeto Glonass através de parceria com o governo russo estrategicamente no espaço sideral cerca de 20 mil quilômetros acima da superfície terrestre, são acessados simultaneamente para que os dados de georreferenciamento sejam exatos e o resultado que chega ao usuário tenha maior qualidade. Atualmente, existem em órbita 31 satélites do GPS e 24 satélites do Glonass, que oferecem informações de localização para todas as partes do mundo.

Glonass chega à ufsm Em 2015, a UFSM firmou uma parceria com o governo russo para instalar uma estação de monitoramento do Glonass em Santa Maria. A instalação foi concluída em abril de 2016, sendo a terceira no Brasil. A primeira delas existe no país desde 2013, na Universidade de Brasília, e uma segunda foi instalada em Recife em fevereiro de 2016. A função dessas estações é melhorar os sinais que chegam ao usuário e reduzir erros de posicionamento. Além disso, as informações captadas pela central de monitoramento servem também para pesquisas. No caso da UFSM, o projeto Glonass é coordenado pelo professor do Centro de Ciências Rurais Eno Saatkamp, e esses dados já colaboram para o desenvolvimento de pesquisas em nível de iniciação científica e mestrado. O projeto integra o Centro de Ciências Rurais, especializado no estudo de Geodésia (ciência que se ocupa da determinação da forma, das dimensões e do campo de gravidade da Terra), e o Centro de Tecnologia. “Por isso o projeto é tratado como institucional, porque envolve mais de um Centro da UFSM e isso, sem dúvida, enriquece muito em termos de conhecimento os dois lados”, salienta o professor Eno Saatkamp.

LINHA DO TEMPO

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1945

1978

No dia 2 de setembro, o Japão assinou, no convés do navio USS Missouri, a rendição do país diante do bloco dos aliados, encerrando formalmente a Segunda Guerra Mundial.

Em fevereiro, na base da Força Aérea dos EUA, são lançados os primeiros satélites GPS, destinados a fornecer às forças armadas informação mais precisa sobre a sua localização geográfica.

tecnologia

1989 A queda do muro de Berlim, que dividia na metade a capital alemã, simboliza o fim da Guerra Fria.

1946

1982

Início da Guerra Fria, período de bipolarização mundial. De um lado, a vertente socialista, liderada pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Do outro, a força capitalista, que tinha como país líder os Estados Unidos (EUA).

Quatro anos depois dos Estados Unidos, a União Soviética põe em órbita o primeiro satélite do Glonass.


O professor do Centro de Tecnologia e coordenador do curso de Engenharia de Telecomunicações, Renato Machado, destaca que o posicionamento geográfico estratégico da cidade de Santa Maria colaborou para a efetivação da parceria com a Rússia. Além da infraestrutura adequada proporcionada pela UFSM, que já tem histórico de trabalho com tecnologia GNSS (Sistema de Navegação Global por Satélite). “Em termos mundiais, isso se traduz em um balanço de forças. Para nós da academia, o que importa é que, através desse convênio, um dos países detentores do mais alto nível de tecnologia abre as portas das suas universidades e da Roscosmos (Agência Espacial Russa) para alunos da Universidade realizarem mestrado e doutorado”, destaca Machado.

O desenvolvimento do projeto fortalece os dois novos cursos da Universidade: Engenharia de Telecomunicações e Engenharia Aeroespacial. O acesso aos dados de um sistema de navegação proporciona aos alunos a possibilidade de lidar com conteúdos pouco explorados na maioria das instituições de ensino. A presença da estação de monitoramento do Glonass na UFSM reitera o ensino, através da aproximação dos alunos com a tecnologia; a pesquisa, pela possibilidade de produzir conhecimento a partir do acesso aos dados; e a extensão, visto que, mesmo indiretamente, a comunidade se beneficia do sistema de localização. a Repórter: Bernardo Zamperetti · Diagramação: Juliana Krupahtz e Vinícius Beltramin

como funciona o glonass? Para que o Glonass funcione continuamente, não basta lançar os satélites em órbita. Cada satélite transmite continuamente ondas eletromagnéticas em direção à Terra, que carregam informações necessárias para que o sistema possa cumprir sua finalidade: o usuário, com um receptor desses sinais, calcular sua posição georreferenciada. Esses dados variam ao longo do tempo, então necessitam ser periodicamente recalculados e informados a cada um dos satélites, para que eles possam transmitir informações corretas aos usuários. As Estações Monitoras, como a que existe na UFSM (1), têm justamente essa finalidade: monitorar os sinais dos satélites. Os dados serão processados numa estação central, que se localiza em Moscou, na Rússia (2), para recalcular os novos parâmetros reais dos satélites. Esses parâmetros atualizados são transmitidos a cada um dos satélites por uma estação up-link (3), que também fica na Rússia. A partir dessa atualização no satélite, ele transmitirá 1. ufsm os parâmetros aprimorados em seus 3. estação up-link sinais em direção aos usuários na Terra.

2. estação central

1993

2006

2011

Uma década após o lançamento do primeiro satélite, o Glonass começa a operar, mas ainda não globalmente.

São emitidos os primeiros sinais do sistema de navegação desenvolvido pela União Européia, chamado de Galileo.

Lançado o Beidou, Sistema de localização regional da China, com possibilidade de cobertura global em 2020.

1995

2010

2013

O GPS é declarado plenamente operacional, após um projeto inicial de 10 bilhões de dólares.

Japão dá origem ao seu próprio sistema, denominado QZSS, que atinge somente a área nacional.

Desenvolvido pela Índia, é lançado o IRNSS, que conta com cinco satélites em órbita, cobrindo exclusivamente a extensão do país.

tecnologia

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para manter viva a

história negra local União Familiar, clube social negro de Santa Maria, é rememorado em livro

“Quando estuda na escola, a gente acha que a escravidão é algo que só existiu no Nordeste e em São Paulo, com as lavouras do café. A gente nunca pensa que a escravidão foi tão difundida em todo o país, inclusive em Santa Maria”, constata a historiadora Franciele Rocha de Oliveira. Em 2010, quando era acadêmica no curso de História da UFSM, Franciele começou a trabalhar no Museu Treze de Maio — antigo clube social negro que foi transformado em museu comunitário em 2001 e que busca preservar e estimular a autoestima e autoimagem positivas de homens, mulheres e crianças negras. O convívio com a rotina do “Treze” mostrou a Franciele como a história local negra é esquecida e muitas vezes não mencionada em bibliografias locais. Nos encontros no museu, Franciele soube que existiu um outro clube negro em Santa Maria: “No museu havia rodas de lembranças, onde as pessoas iam rememorar o Treze e também falavam que ‘existia outro clube, o clube dos negros pobres, o União Familiar’, do qual não havia muitas informações em livros e registros”. Franciele começou a se aprofundar no tema e decidiu escrever, em 2014, seu Trabalho de Conclusão de Curso sobre o ‘outro clube’. Intitulada Moreno rei dos astros a brilhar, querida União Familiar, a monografia rememorou a história do União Familiar e a luta por justiça e direitos do povo negro em Santa Maria.

Memória impressa Vencedora do Prêmio Lei Municipal do Livro 2015, a pesquisa de Franciele virou livro e foi lançada na Feira do Livro santa-mariense de 2016. A publicação teve distribuição gratuita e contou com tiragem de 1.500 exemplares. A obra contém imagens de arquivos de pessoas ligadas ao clube, além de relatos e documentos que datam do século 19. Franciele realizou cinco entrevistas, com frequentadores que tinham entre 61 e 87 anos e que revelaram a história do União e sua importância para a sociedade negra local.

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história

Fotografia: Divulgação

história

Dividido em três capítulos, o livro inicia contando sobre o movimento abolicionista no país, a questão dos movimentos negros em Santa Maria e a precária condição de liberdade obtida pelo povo negro após o decreto da Lei Áurea. Já no segundo capítulo, o clube União Familiar é apresentado com detalhes. Franciele também comenta neste capítulo sobre a importância política dos clubes negros para quem os integrava: “Tem clubes que amparavam mulheres viúvas, ajudavam na aposentadoria de trabalhadores negros. Tem clubes que se organizavam para fazer o que o Estado não fazia para essas pessoas”. O terceiro capítulo conta sobre as práticas dentro do Clube, mostrando suas festas e costumes. Nesse capítulo, Franciele apresenta a prática do carnaval organizado pelo União, por meio do bloco de rua, e também a história de um jornal negro, que contemplava assuntos que os demais jornais locais não abordavam, como denúncias de racismo. Franciele conclui sua pesquisa ressaltando a importância de dar voz a uma comunidade negra que não possui visibilidade na História tida como oficial. Ela ressalta, no entanto, que ainda há muito a ser estudado sobre o tema: “É fundamental dizer que esse trabalho não se encerra em si mesmo. Pelo contrário, é um ponto de partida que assume a necessidade em falar do tema, olhando para os sujeitos históricos protagonistas desse processo histórico”. a Repórter: Guilherme Gabbi · Diagramação: Kennior Dias


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Paleontologia

Descobertas de pesquisadores da UFSM reforçam a importância do estudo de fósseis e outros vestígios ancestrais para o conhecimento da história da região central do Rio Grande do Sul

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1901

O caminho das descobertas Santa Maria e região registram inúmeras experiências na área paleontológica há mais de um século

O geógrafo Antero de Almeida descobre os primeiros fósseis animais nas sangas que se espalhavam pelo bairro da Alemoa. Ele foi também o responsável pela descoberta do sítio Chiniquá.

1902 A região central do Rio Grande do Sul é uma área chave no cenário paleontológico nacional. Tem sido palco de grandes descobertas, como a que encontrou o Staurikosaurus pricei, o primeiro dinossauro brasileiro e um dos mais antigos dinossauros do mundo. Essas descobertas, de reconhecimento internacional, aconteceram em uma faixa de cerca de 250 quilômetros, principalmente entre Candelária e São Pedro do Sul, abarcando também todos os municípios da Quarta Colônia e Santa Maria. A paleontologia é a ciência que se dedica ao estudo de antigas formas de vida do planeta Terra, tanto animais quanto vegetais. Através dos fósseis, busca reconhecer os organismos existentes nos diversos períodos geológicos e entender os processos responsáveis pelo surgimento de determinadas espécies, e pela extinção de outras. Atualmente, é um campo multidisciplinar com envolvimento direto em áreas como biologia, geografia, arqueologia e geologia. Dada a riqueza de informação contida nos fósseis, seus locais de ocorrência precisam ser preservados. De fato, tal patrimônio se encontra muitas vezes ameaçado por empreendimentos danosos aos sítios e exploração ilegal destes. Isso preocupa sobremaneira os paleontólogos e põe em risco o conhecimento e a compreensão sobre a rica história biológica de nosso planeta. Hoje, quem ajuda a contar parte dessa história é o Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica da Quarta Colônia (Cappa), localizado em São João do Polêsine e coordenado pelo professor Sérgio Dias da Silva, e o Laboratório de Estratigrafia e Paleobiologia, coordenado pelo professor Átila Stock da Rosa, ambos ligados à UFSM. A seguir, apresentamos uma linha do tempo das principais descobertas realizadas no Rio Grande do Sul. Esta não é, e nem pretende ser totalmente completa, mas sim uma síntese da história paleontológica local. a Repórter: Bernardo Zamperetti e Gustavo Martinez · Diagramação e Ilustração: Evandro Bertol

O Dr. Jango Fischer, nascido em Santa Maria e diplomata brasileiro no Chile, em uma de suas visitas à cidade natal, foi à Sanga da Alemoa e coletou vários exemplares de fósseis, que mais tarde seriam estudados pelo Dr. Arthus S. Woodward e classificados como Scaphonyx fischeri, hoje conhecido como Hyperodapedon, um dos primeiros répteis fósseis até então descobertos no Brasil.

Hyperodapedon

1915 –1917

Dr. Guilherme Rau

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dossiê

Dr. Arthus S. Woodward

O médico oftamologista Dr. Guilherme Rau auxiliou o paleontólogo alemão Dr. H. Lotz em suas escavações. Juntos, escavaram aproximadamente 200 peças nesses dois anos. Nesse período, o Dr. Lotz ensinou Atílio Munari, um jovem santa-mariense de 14 anos, a procurar, escavar e preparar com cuidado os achados fósseis. Munari auxiliou mais de 11 geólogos e paleontólogos que vieram a Santa Maria pesquisar, até seu falecimento em 1941.


1925

1928

A vinda do geólogo e pesquisador alemão Bruno von Freyberg influencia o jovem Vicentino Prestes de Almeida, um agrimensor da região, a estudar a paleontologia. Vicentino encontrou uma mandíbula de um pseudosuchio no Sítio Paleontológico Chiniquá, em São Pedro do Sul, que foi enviada para a Alemanha e analisada pelo prestigiado paleontólogo Friedrich von Huene. A descoberta influenciou a vinda de Huene ao Rio Grande do Sul. Vicentino teve participação tão ativa na paleontologia da época que Friedrich von Huene nomeou o fóssil de Prestosuchus chiniquensis, descoberto em 1938, em sua homenagem.

Friedrich von Huene e seu mais estimado aluno, Rudolf Stahlecker, vêm para Santa Maria depois de vários anos recebendo materiais fósseis da região. A expedição dos alemães durou dez meses e no total foram levados 8.600 quilos de blocos de rocha sólida que continham esqueletos e elementos ósseos isolados. Tudo foi encaixotado e enviado para análise na Alemanha. O museu de Tübingen conta hoje com esqueletos praticamente completos de mais de cinco espécies diferentes graças a essa expedição, como Stahleckeria potens e Traversodon stahleckeri, entre outros.

Friedrich von Huene

Pseudosuchia Grupo de répteis pré-históricos do período Triássico. O nome significa falsos crocodilos, justamente pelo grupo ser superficialmente muito similares a crocodilos modernos.

Stahleckeria potens

Prestosuchus chiniquensis

1936

1927 Guilherme Rau escava o crânio de um Gomphodontonsuchus brasiliensis, um cinodonte que foi estudado por Friedrich von Huene, em Arroio do Só.

Cinodonte Grupo de animais de formas amniotas de linhagem pré-mamaliana que eventualmente evoluiriam para se tornar os primeiros mamíferos. Supõe-se que eram de sangue quente e com pelos. Receberam esse nome devido à sua dentição heterodonte (incisivos, caninos, pré-molares e molares) com aparência superficialmente similar à dos cães.

Staurikossaurus

O brasileiro Llewellyn Ivor Price conduz uma expedição que conta com membros da Universidade de Harvard para a região. Descobriu aqui, entre outros, Staurikossaurus pricei, que só foi finalmente analisado e batizado em 1970 pelo paleontólogo americano Edwin Colbert. Staurikossaurus é classificado como um saurísquio basal surgido antes da subdivisão das duas grandes linhagens de Saurischia (Theropoda e Sauropodomorpha), um dos tipos mais antigos de dinossauros já encontrados.

dossiê

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1956 –1976 O padre Daniel Cargnin coleta, em cidades como Candelária, General Câmara e Cachoeira do Sul, cerca de 50 crânios de cinodontes e dicinodontes, e um número talvez maior de crânios de rincossauros, dos quais 36 se encontram no museu Vicente Pallotti, em Santa Maria. Ainda na sua lista de descobertas encontra-se o cinodonte Protuberum cabralensis.

Sacisaurus agudoensis

Pe. Daniel Cargnin

2006

Dicinodonte

Anunciada a descoberta do Sacisaurus agudoensis, um fóssil de aproximadamente 220 milhões de anos de idade. O primeiro fóssil da espécie foi encontrado em 2000, próximo a Agudo. A escavação acabou por revelar diversos ossos, incluindo 19 fêmures direitos, o que fez os pesquisadores batizarem a espécie como Sacissauro. Inicialmente acreditou-se ser de fato um dinossauro, porém pesquisas posteriores concluíram que era uma forma externa à Dinosauria (família dos dinossauros), mas muito próxima desse grupo.

Uma categoria de terápsidos similares aos mamíferos, assim como os cinodontes, porém antecedendo estes. Diferentemente dos cinodontes, eles possuíam um bico córneo, similar ao de uma tartaruga, e duas presas, que foram perdidas nas formas mais avançadas do grupo

Protuberum cabralensis

1999

2004

O paleontólogo Max Cardoso Langer descobre, na Sanga da Alemoa, Saturnalia tupiniquim, um dos mais antigos dinossauros já encontrados, que, como Staurikosaurus pricei, viveu o final do período Triássico, há aproximadamente 230 milhões de anos.

Pesquisadores da UFSM e do Museu Nacional da UFRJ anunciam a descoberta de mais um dinossauro em território nacional, Unaysaurus tolentinoi, que viveu há aproximadamente 225 milhões de anos. O fóssil foi descoberto em 1998, próximo do município de São Martinho da Serra, por um aposentado da região (senhor Tolentino, homenageado no batismo da nova espécie) que, ao encontrar o primeiro fragmento do fóssil, entrou em contato com a UFSM.

Saturnalia tupiniquim

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Unaysaurus tolentinoi


2009

Sanga da Alemoa BR 158

Um crânio bem preservado de um Cinodonte africano do gênero Luangwa é encontrado próximo à cidade de Dona Francisca. Essa espécie é geralmente encontrada apenas na África.

2011 Pesquisadores da Ulbra encontram fósseis do dinossauro Pampadromaeus barberenai. A ossada encontrada constituía um esqueleto parcial e desarticulado, porém bem preservado, de um só indivíduo da espécie. O “corredor dos pampas” era bípede e relativamente pequeno, com apenas 50 centímetros de altura e 120 de comprimento.

RS-509 - Faixa Velha

Sanga da Alemoa BR-287 - Faixa Nova

Ruas e estradas Sangas e arroios

A Sanga da Alemoa é o mais importante sítio paleontológico do estado do Rio Grande do Sul. Está localizada na área urbana de Santa Maria, no bairro Km 3, às margens da rodovia RS-509. Há mais de um século, grandes pesquisadores passam pelo local e colaboram com a formação da paleontologia brasileira. Além da Sanga da Alemoa, Santa Maria possui outros 19 sítios paleontológicos.

Pampadromaeus barberenai

Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica da Quarta Colônia – Cappa/UFSM

2012

2013

2014

Fósseis de três dinossauros foram encontrados no interior de Agudo por pesquisadores da Unipampa. As ossadas têm idade estimada de 225 milhões de anos e duas delas foram coletadas praticamente completas, algo raríssimo e ainda única ocorrência desse tipo em território brasileiro. Os pesquisadores acreditam que esses fósseis podem pertencer a uma nova espécie. O material hoje se encontra tombado no acervo do Cappa/UFSM.

É inaugurado o Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica da Quarta Colônia (Cappa/ UFSM), em São João do Polêsine. O Centro faz parte do quadro de unidades da UFSM e tem como objetivo reunir e prestar apoio aos profissionais que exploram os sítios paleontológicos da região central do Rio Grande do Sul.

Pesquisadores da UFSM, Ulbra e Unipampa coletaram um bloco contendo um dinossauro carnívoro em São João do Polêsine. Até hoje foram encontrados poucos fósseis de dinossauros carnívoros no Triássico mundial. Os pesquisadores afirmaram que essa descoberta pode trazer importantes informações sobre a origem e evolução dos dinossauros. O único dinossauro carnívoro de idade Triássica encontrado no Brasil de que se tem notícia foi justamente o Staurikossaurus na década de 30 do século XX na região central do Rio Grande do Sul.

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Paleontologia e o desenvolvimento do potencial turístico Com um território fossilífero vasto, a região central do Rio Grande do Sul ainda necessita de investimentos e reconhecimento para desenvolver o turismo paleontológico

O estudo dos fósseis permite compreendermos a evolução dos seres vivos com o passar dos anos. Na região central do Rio Grande do Sul, alguns municípios têm um vasto acervo fossilífero, porém ainda há pouca valorização e divulgação desse potencial paleontológico como uma forma de impulsionar o turismo nessa região. Santa Maria, como outras cidades da região, é importante nesse processo de descobertas e pesquisas na área da paleontologia. A Rota Paleontológica ilustra a importância dessas cidades. Criada em 2003, a Rota tem extensão de 300 quilômetros e abrange as cidades situadas entre Candelária e São Vicente do Sul. Dessas cidades, as que mais se destacam são Santa Maria, São Pedro do Sul, Mata, Candelária e São João do Polêsine, que têm museus como a principal forma de resgatar esse passado da região, mas carecem de investimentos para a divulgação de sua história (veja mapa na página seguinte).

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Investimentos para fomentar o turismo Para impulsionar o turismo, atividades recreativas, culturais e gastronômicas são segmentos atrativos para chamar a atenção dos visitantes. A pesquisadora mestre em Patrimônio Cultural pela UFSM Carmen Lorenci realizou sua dissertação sobre a temática de preservação do patrimônio geopaleontológico da região, sob orientação do professor Átila Stock da Rosa, do Departamento de Geociências da UFSM. Ela ressalta a necessidade de investimentos para fomentar o turismo paleontológico em Santa Maria, como em outras regiões: “Apesar de a região ter potencial para esse desenvolvimento, os municípios ainda estão despreparados”. A pesquisadora ainda relata que é preciso promover mais eventos sobre a paleontologia, como oficinas dentro de laboratórios, palestras, etc. Mas, para isso, é importante ter uma parceria entre público e privado. “Economicamente o turismo traz mais benefícios se ele for um turismo planejado”, afirma Carmen. No Brasil, a paleontologia ainda é uma área em desenvolvimento, pois não há um curso de graduação diretamente relacionado a esse ramo. Para Carmen, isso era um problema para o país no momento que os fósseis, quando encontrados, eram levados para outros lugares. “Até a inserção das universidades no Brasil, esse patrimônio foi levado embora. Por


isso, perdemos os primeiros achados na região. Os estrangeiros vinham, escavavam e levavam embora”. Outro ponto que a pesquisadora salienta é a importância de ter uma estrutura e profissionais adequados para trabalhar com a paleontologia. “Há muito patrimônio cultural e histórico a ser explorado; porém, muitas vezes há falta de museólogos, profissionais para cuidar e preservar os acervos”. Para Carmen, as pessoas precisam conhecer a história local e, nesse contexto, os estudos deveriam ter um papel fundamental nesse processo. “Os primeiros achados do período Triássico, esse patrimônio encontrado há 200 milhões de anos, começaram nessa região e ainda há poucos investimentos financeiros e incentivos a pesquisas relacionados a isso”. Para Norma Martini Moesch, secretária de turismo de Santa Maria até dezembro de 2016, os custos para investir em grandes projetos voltados para essa área são altos: “Quando começamos as ações deste governo [do prefeito Cezar Schirmer, finalizado em 2016], fizemos um estudo para implantar um grande parque temático com áreas de pesquisa, estudo, lazer e entretenimento. Porém, percebemos que o recurso para implantar o projeto era multiplicado por cem, mais do que a prefeitura tinha para gastar”. A atual gestão municipal, do prefeito Jorge Pozzobom, foi consultada pela revista Arco, mas informou ainda não ter dados sobre o assunto, pois a definição orçamentária só ocorreria em abril de 2017.

Projetos do CAPPA O Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa) é um órgão que apoia o estudo em Paleontologia na região da Quarta Colônia. Nesse Centro, que faz parte do quadro de unidades da UFSM e é coordenado pelo professor do Departamento de Ecologia e Evolução Sérgio Dias da Silva, existe toda uma estrutura para que professores, alunos, pesquisadores e profissionais desenvolvam seus estudos. Além desse público, o Cappa recebe constantemente visitas de escolas, com alunos de todas as idades, para participar de palestras, compreender a história da paleontologia na região e ainda conhecer os fósseis da Quarta Colônia. Dentre os projetos para a ampliação do espaço no Cappa, está a construção de um auditório para receber mais de 200 pessoas, unidades museológicas para exposição do material científico, uma cafeteria para atender os visitantes, alojamentos para abrigar paleontólogos, estudantes e o público em geral em suas visitas e atividades de campo na Quarta Colônia. No entanto, para a expansão dos setores no Cappa são necessários recursos do Governo Federal, que ainda estão em negociação com o Consórcio de Desenvolvimento Sustentável da Quarta Colônia (Condesus)

Iniciativas de divulgação da paleontologia na região Em 1997, o cartunista Byrata e o economista Abdon Barretto Filho criaram o projeto Dinotchê. No início dos anos 2000, ambos começaram a trabalhar nesse projeto temático na Vila Belga, em Santa Maria, com o intuito de resgatar o período Triássico através de leituras e apresentações em painéis ilustrativos, com a utilização de efeitos sonoros e luminosos Para Byrata, o trabalho realizado despertava o interesse de muitas pessoas pelos dinossauros. No entanto, pela falta de recursos financeiros, não foi possível dar continuidade ao projeto. “Tínhamos algum apoio financeiro de investidores e comerciantes, mas não foi o suficiente para custear as despesas e manter o projeto ativo”. Apesar disso, Byrata relembra: “Essas atividades culturais que realizamos foram muito prazerosas, pois tivemos resultados bastante significativos e positivos da população”. Outra ação realizada foi a campanha “Santa Maria e Região na Copa do Mundo 2014”, na qual a prefeitura de Santa Maria, em parceria com os municípios de Mata, São João do Polêsine e São Pedro do Sul, viu a oportunidade de criar um roteiro diferenciado para divulgar a paleontologia da região. Para atrair os turistas que vinham de outros estados e até de outros países para a Copa do Mundo, uma das estratégias foi a distribuição de folders com versões em português, inglês e espanhol. A exposição “Conhecendo os fósseis do Triássico” foi das ações desenvolvidas no período para mostrar os fósseis de dinossauros encontrados por arqueólogos no município e região e, além disso, caules de árvores petrificados, da cidade de Mata. A mostra aconteceu em um shopping de Santa Maria.a Repórter: Luciane Volpatto Rodrigues

Rota Paleontológica no Rio Grande do Sul MATA

SANTA MARIA

CANDELÁRIA

Possui grandes depósitos de árvores fossilizadas formando um importante centro da Paleobotânica

Foram encontrados os primeiros registros paleontológicos do RS

Foi encontrado o maior número de fósseis de dinossauros que habitaram no período Triássico

SÃO PEDRO DO SUL

SÃO JOÃO DO POLÊSINE

Estão as maiores reservas de fósseis vegetais do planeta

Localiza-se o Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa), em que estão as últimas descobertas de fósseis achados na Quarta Colônia

Porto Alegre

e Guilherme Denardin Gabbi · Ilustração e Diagramação: Evandro Bertol

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Entre a

preservação histórica e o desenvolvimento urbano Sete sítios paleontológicos de Santa Maria já foram destruídos pela ocupação urbana

Segundo o meteorologista alemão Alfred Wegener, há cerca de 200 milhões de anos, durante a Era Paleozoica, os continentes estavam unidos em uma única massa terrestre chamada Pangeia. A fragmentação desse supercontinente deu origem aos cinco continentes do mundo atual. Todos os indícios de vida na Terra daquela época, hoje, são vestígios ou fósseis. A cidade de Santa Maria, no centro do Rio Grande do Sul, é reconhecida pela riqueza do patrimônio histórico – está situada sobre 32 sítios paleontológicos, que remontam à vida na Terra durante a Era Paleozoica. Sete deles, no entanto, já foram destruídos pelo avanço da ocupação urbana.

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exemplos da dificuldade em aliar desenvolvimento e preservação. Iniciada em novembro de 2013, a duplicação de 4,3 quilômetros da Faixa Velha foi interrompida um mês depois do início das obras, por não possuir laudo técnico de um paleontólogo que evidenciasse as consequências da obra para os três sítios localizados ao longo da rodovia. Após a interrupção da obra, em outubro de 2013, o biólogo Darival Ferreira foi o profissional contratado para o acompanhamento. O trabalho consistia em monitorar as escavações e verificar a presença de fósseis nas paredes das valas abertas. Durante o tempo que esteve presente, o biólogo encontrou um fragmento fóssil, que foi encaminhado à Fundação Zoobotânica, em Porto Alegre, devido ao acordo preestabelecido pelo Daer. O especialista conta que, no início do trabalho, havia um clima turbulento quanto à decisão da necessidade da presença dele na obra, principalmente por parte das empresas e empreiteiras. A dificuldade maior foi a falta de comunicação ao profissional

quanto ao cronograma das escavações. No caso da Travessia Urbana, que possui 14,5 quilômetros, o problema apontado por Átila Stock foi o erro no cronograma de contratação das empresas. A responsável pela fiscalização foi contratada após a empresa executora da obra, ou seja, quando os trabalhos da primeira começaram, a segunda já havia realizado escavações. Além disso, acrescenta Átila, a dificuldade de liberação do dinheiro público para obras no país cria a sensação de que, quando liberado, tudo precisa ser feito às pressas para que não se perca o investimento. A responsabilidade de fiscalização passa dos órgãos nacionais, que não conseguem dar conta da demanda, para os estaduais e municipais, “O município, para poder ter a obra, dá a licença mesmo sem ter estudo prévio. O que ele está fazendo é um crime, mas, muitas vezes, prefere fazer isso para não perder o investimento da cidade”, aponta Átila.

Fotografia: Rafael Happke

Encontrar os resquícios históricos da vida na Terra exige um processo lento e gradual de pesquisa. No entanto, o crescimento das ocupações nas cidades trouxe o desafio da preservação do patrimônio, que entra em conflito com a necessidade de novas estruturas físicas, como a construção de ruas, faixas e viadutos. O professor do Departamento de Geociências da UFSM, Átila Stock da Rosa, aponta que obras ilegais, perfurações para colocação de fibras óticas e tubulações de água e esgoto são as principais atividades que ferem o patrimônio paleontológico. Embora necessitem de licença ambiental para iniciar, as construções públicas preocupam os pesquisadores. Para Átila, o acompanhamento de profissionais especializados junto à obra, como paleontólogos, técnicos e alunos da área, ajuda a diminuir o impacto ao patrimônio, mas não o extingue. As duas principais obras em execução de expansão urbana de Santa Maria, a Travessia Urbana e a duplicação da RS-509, conhecida como Faixa Velha, são

A escavação ideal atinge até 1,5 metros. Mas a falta de fiscalização contribui na destruição dos sítios arqueológicos.

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Saiba mais:

Fotografia: Rafael Happke

Como acontece a descoberta e a delimitação de uma área de preservação paleontológica?

Duplicação na Faixa Velha de Camobi

Para o pesquisador, o ideal seria que as obras desviassem dos patrimônios históricos nacionais e que existissem leis específicas e fiscalização efetiva. Para isso, seria preciso trabalhar a educação patrimonial e expandir os conhecimentos produzidos na Universidade: “Não adianta ter pesquisa dentro da Universidade, estudar os fósseis, se não dermos um retorno desse conhecimento à comunidade.”

Propriedade privada Os sítios paleontológicos são ameaçados, também, pela expansão das áreas de moradia nas grandes cidades. Os espaços, que antes eram descampados, são gradativamente ocupados por obras sem acompanhamento e que colocam em risco a preservação. No entanto, segundo o coordenador do Centro de Apoio à Pesquisa Paleontológica (Cappa), Sérgio Dias da Silva, apesar de os fósseis estarem em propriedade privada, eles não pertencem ao morador. “Todo o recurso que está imediatamente abaixo, no primeiro centímetro da superfície, pertence ao governo”, explicou o pesquisador.

Ao identificar vestígios em área privada, o Centro procura fazer uma aproximação direta com o proprietário. Algumas vezes o dono da terra permite que o estudo no solo seja feito e, se necessário, sejam iniciadas as escavações. Quando o acesso é dificultado, o caminho é pela via judicial. Os procedimentos de identificação de um afloramento, escavação e retirada do material seguem os mesmos padrões de áreas públicas. Após identificados e retirados, os fósseis têm seu valor histórico reconhecido e são tombados para se tornarem patrimônio da humanidade. No caso dos fósseis encontrados pelo Cappa, a UFSM é a guardiã do material, mas não é a proprietária. A vandalização e a venda de fósseis é proibida por lei, com pena de multa ou detenção. Segundo Sérgio, é importante fazer com que o proprietário da terra se sinta dono do patrimônio e queira preservá-lo. Além disso, é importante trabalhar a ideia de que os fósseis são atrativos culturais e turísticos, e podem ser trabalhados como uma alavanca econômica para a região onde forem encontrados.a Repórter: Andressa

O tombamento não é uma desapropriação, o proprietário continua sendo o dono da terra; porém, no sítio, ele não pode mais tocar.

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Foggiato · Ilustração e Diagramação: Evandro Bertol

O Centro de Apoio à Preservação Paleontológica (Cappa) trabalha com três principais maneiras de mapeamento dos sítios paleontológicos (veja infográfico ao lado). Uma dessas formas de mapear, o Google Earth, possibilita identificar manchas alaranjadas na paisagem — o que pode ser indício da presença de vestígios —, marcar o ponto, colocar as coordenadas em um GPS e ir até o local. “O trabalho, muitas vezes, precisa andar junto com a sorte”, destaca o professor Sérgio Dias. Quando encontrado, é necessário que o fóssil seja retirado do local original o mais rápido possível, pois há grande chance de que seja perdido no ambiente. Por serem objetos frágeis, o manuseio dos fósseis é reservado a profissionais como paleontólogos, técnicos e alunos da área, que são habilitados para o processo de extração. No Brasil, a coleta de material fóssil deve ser autorizada e fiscalizada pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPI). Apenas instituições de pesquisa brasileiras e de ensino superior não precisam da autorização; no entanto, é necessário submeter relatório anual de suas atividades.


como descobrir um sítio Do mapeamento à preparação de um fóssil

1º passo: Mapeamento É possível mapear sítios paleontológicos utilizando mapas geológicos, estudando a superfície através de escavações em locais — ainda que não haja afloramentos —, e através do GPS, utilizando o Google Earth.

2º passo: Escavação Após localizar o fóssil, é preciso delimitar o tamanho do material e isolá-lo.

3º passo: Engessar Quando a rocha circundante é isolada e retirada da terra, ela deve ser engessada e, dependendo de seu tamanho, levada de caminhão até o laboratório responsável.

4º passo: Preparação no laboratório No laboratório, é aplicada uma resina para fortalecimento do osso. Então, há um trabalho mecânico para retirar sedimentos, com ferramentas como martelos e talhadeiras. Também há processos químicos com ácidos para manter o fóssil por décadas. Dependendo do tamanho do material, a preparação pode demorar anos. Após a preparação, o fóssil fica sob a guarda do governo. No caso dos materiais encontrados pelo Cappa, a UFSM é a guardiã legal.

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ENTREVISTA

Pelo avanço

da ciência Até chegar nas prateleiras das farmácias, um medicamento passa por, basicamente, quatro fases, desde os testes de segurança até a comercialização. As empresas que desenvolvem os remédios são, em sua maioria, internacionais e privadas, o que não impede que parte do estudo seja feito em instituições públicas brasileiras. Entre as vantagens da parceria entre empresa privada e órgão público estão a possibilidade de formação de recursos humanos e a renovação e melhora de estruturas das universidades. Um estudo de desenvolvimento de um fármaco pode custar bilhões de reais, recurso não disponível nas instituições de educação. Alexandre Vargas Schwarzbold, coordenador da Unidade de Pesquisa Clínica da UFSM e especialista em doenças infecciosas, conduz cinco estudos de pesquisa clínica com parceria privada na Universidade. A pesquisa clínica envolve seres humanos e tem a finalidade de comprovar os efeitos de um fármaco. Em 2015, ele encerrou a pesquisa com a empresa japonesa Astellas para desenvolver o fármaco Cresemba. O remédio atua em um tipo de infecção fúngica invasiva, que mata mais de 80% dos pacientes afetados. Ela costuma atingir os pacientes imunodeprimidos, ou seja, aqueles que têm pouca resposta de defesa do corpo, como quem faz transplante de medula, quimioterapia ou está na UTI. Os fungos que nós enxergamos, nas paredes por exemplo, podem atingir os órgãos vitais deles. Além de Santa Maria, outros centros de ensino brasileiros e mundiais fizeram parte do desenvolvimento desse fármaco. Em entrevista à revista Arco, Alexandre Schwarzbold falou da necessidade da parceria entre empresa privada e universidade para o avanço da ciência.

Fotografia: Rafael Happke

Infectologista Alexandre Schwarzbold defende parceria entre indústria farmacêutica e academia

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entrevista


Qual a vantagem de se firmarem parcerias entre empresa privada e universidade pública? Uma das vantagens é o financiamento. A indústria dos fármacos tem um custo muito elevado. Não existe universidade no Brasil, privada nem pública, que possa desenvolver um estudo desse porte sozinha, tanto pelo valor quanto pela infraestrutura. Então, ao se conseguir firmar essas parcerias no desenvolvimento de fármacos, elas te dão o financiamento e ainda apresentam a universidade para fora do país. Esse é o segundo ponto: a visibilidade da instituição passa a ser muito grande, ou seja, permite fazer outras parcerias de pesquisa, englobando também outras áreas. O terceiro elemento que eu considero importante é a capacitação de pessoas. Nós começamos a desenvolver, nos profissionais do HUSM [Hospital Universitário de Santa Maria], a noção do ‘fazer pesquisa’, seus detalhes, nuances legais, até os aspectos éticos, que não eram parte do treinamento que a Universidade oferecia.

onde é preciso testar tudo, inclusive o que não dá certo. Quando o paciente está inconsciente, na UTI por exemplo, é preciso que um responsável legal assine. Além disso, familiares dos pesquisadores envolvidos na pesquisa não podem ser participantes. No caso do Cresemba, a UFSM foi apenas um dos centros de testes, já que havia outros nacionais e internacionais. Por que é necessário realizar os testes em diferentes locais? Os novos fármacos devem ter validação em lugares diferentes do mundo. O aspecto étnico tem que ser visto, pois é uma questão clínica, já que as pessoas respondem aos remédios de maneira diferente. Um estudo para ser bem validado tem que mostrar que foi feito com pessoas diferentes. Existem também estratégias técnicas para que não tenha erro nos estudos, como a seleção aleatória de pacientes, através de números sorteados por computadores. No fim do estudo, o remédio se mostrou eficaz principalmente numa população de pacientes de fungos raros que causam muitas micoses endêmicas e existem em muitos lugares do Brasil. Nosso país é tropical e tem muita tendência a ter micoses. E não são essas micoses superficiais, que qualquer pessoa pode ter. São doenças que invadem órgãos do corpo, pulmão, sangue, micoses invasivas. a Repórter: Andressa Foggiato · Diagramação: Juliana Krupahtz

“Nós começamos a desenvolver, nos profissionais do HUSM, a noção do ‘fazer pesquisa’, seus detalhes, nuances legais até os aspectos éticos, que não eram parte do treinamento que a Universidade oferecia”

Como se estabelecem as relações entre as empresas internacionais e a UFSM para firmar as parcerias? Bom, existem fontes diferentes para o patrocinador chegar até um centro de pesquisa. Em pesquisa clínica, a fonte mais comum é o próprio pesquisador que se torna conhecido através de publicações ou estágios. A empresa não investirá em algo que eles sabem que dará muito trabalho para o funcionamento. Então facilita se tem um pesquisador de referência. A universidade também é critério para a escolha. A UFSM é uma das melhores universidades do Brasil e, graças às áreas de excelência da instituição, isso vira uma carta de apresentação. O que permanece para a UFSM depois que os contratos acabam? A Universidade fica com uma parte do dinheiro investido no estudo, cerca de 10%, para uso próprio da instituição. Quem mais ganha, no entanto, é o paciente participante da pesquisa. Depois que o estudo é publicado, se a droga é recomendada para o que estávamos estudando, o paciente com doença crônica que participou da pesquisa tem o direito de receber o remédio pelo resto da vida, por lei, no Brasil. Como é feita a seleção dos participantes da pesquisa? Tem que haver critérios, chamados de inclusão, que seguem o protocolo da pesquisa, como idade e peso. Mas é voluntariado. Depois que o médico identifica um paciente potencial, a gente conversa com ele, que se voluntaria. Quando a pessoa não sabe nem ler nem escrever, ela precisa assinar com o polegar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, além de ter outra testemunha para provar que não houve indução por parte do médico. Também tem vezes em que o paciente se inclui e o remédio pode salvar a vida dele, mas ele não quer ser “cobaia”, termo que não é correto, pois é relacionado à pesquisa com ratinhos,

*Colaborou para a entrevista a enfermeira da Unidade de Pesquisa Clínica do HUSM Alexsandra Saul Rorato

As fases da Pesquisa Clínica

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Fases pré-clínicas: composta pela fase um e dois, é o estudo inicial do fármaco. Ele é testado em uma pequena população, geralmente sadia, visando avaliar a eficácia e segurança dele

Fase clínica: desenvolvida em diversos centros do mundo, como na UFSM, com diferentes populações de pacientes, para demonstrar a eficácia e segurança do fármaco

Fase pós-comercial: ocorre quando o remédio já está no mercado. Como são milhares de pessoas utilizando, muitas vezes é nessa fase que se descobrem novas reações

Fonte: Anvisa

entrevista

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editora ufsm

a ciência do

reflorestamento

pelo eucalipto Coletânea produzida na UFSM aposta na desmistificação da espécie e oferece pesquisas e técnicas de produção

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editora ufsm

florestal, e não apenas grandes empresas, mas também pessoas da comunidade em geral, que lidam com bosques ou áreas de eucaliptos para lenha, por exemplo”, comenta o professor Mauro Schumacher. A ideia inicial era a produção de um material didático menor, de circulação interna, mas foi expandida e gerou a obra Silvicultura do Eucalipto no Brasil, lançada em 2015 pela Editora UFSM, que reúne artigos escritos por professores e técnicos ligados à área. Em 308 páginas, o livro tem como propósito esclarecer aspectos técnicos e científicos sobre as atividades e processos produtivos envolvidos na silvicultura do eucalipto. “O que valoriza esse livro é o fato de não ser produzido apenas por pesquisadores da Universidade. A obra reúne vários especialistas, que tratam de temas como a origem do eucalipto, as primeiras sementes, melhoramento genético, escolha do solo, colheita, sistemas agroflorestais. Ou seja, tem uma gama muito grande de professores e profissionais que contribuíram em diferentes vertentes”, ressalta o professor Mauro Schumacher.

Fotografia: Rafael Happke

As árvores possuem o tronco geralmente retilíneo e cilíndrico e a copa quase sempre é rala e alongada. Vastas extensões de terra, com um eucalipto alinhado metodicamente ao lado do outro, constroem a paisagem de muitas viagens pelas estradas do Brasil e de outros países. Os eucaliptos chegaram ao Brasil em 1825, como plantas ornamentais no Jardim Botânico do Rio de Janeiro e são, no cenário atual, relevantes economicamente devido à capacidade de adaptação às mais diversas condições de clima e solo, além da importância ambiental. Nativos da Austrália e de outras ilhas da Oceania, onde constituem parte dominante da flora, os eucaliptos são árvores — em casos raros, arbustos — de rápido crescimento e ampla diversidade — ao todo, são mais de 700 espécies. No Brasil, o eucalipto é uma das principais fontes de matéria-prima de produtos como celulose, carvão vegetal, móveis, compensados e postes. As folhas das árvores permitem que se extraia um óleo, que aparece no dia a dia em forma de chás, balas, sabonetes, perfumes, produtos de limpeza e xaropes. A manutenção da diversidade das espécies em florestas naturais, a contenção do desmatamento e a busca por madeiras que gerem alto lucro industrial são demandas dos cenários ambiental e econômico e colaboram para que o eucalipto seja significativo nesses dois espaços. A silvicultura desse gênero, isto é, os métodos implantados para recuperar e aperfeiçoar a povoação florestal, tendo em vista a necessidade de mercado e o uso racional das árvores, está presente no Brasil há mais de cem anos. Devido à tamanha importância do eucalipto, o professor do Departamento de Ciências Florestais da UFSM Mauro Schumacher e o professor do curso de Tecnologia em Gestão Ambiental Márcio Viera organizaram um livro a respeito do tema. “Este livro tem muitas dicas técnicas para estudantes, pesquisadores e empreendedores da área


A redenção do “deserto verde” As primeiras tentativas de reflorestamento do eucalipto — isto é, a regeneração natural ou intencional de florestas e matas — aconteceram no início do século 20 e não obtiveram sucesso no Brasil, devido ao equivocado modo de implantação da técnica. No entanto, a demanda de mercado fez com que a lei 5.106, do ano de 1966, propusesse uma série de incentivos fiscais a empreendimentos florestais, o que gerou o aparecimento de pessoas contrárias ao método e às isenções conseguidas, baseando seus discursos no insucesso inicial. De acordo com o professor Schumacher, a obra desmitifica essas declarações. “Afirmações como as de que eucalipto seca e degrada o solo, que destrói a fauna e a flora, faz com que se perca a biodiversidade são falácias, sem respaldo científico algum”, assegura Schumacher.

Fotografia: Divulgação/ Editora UFSM

Melhoramento genético e incentivo estatal O crescimento da utilização de produtos de origem florestal tem estimulado a criação de programas de reflorestamento no Brasil, assim como projetos de melhoramento genético, o que é comum quando se desenvolve uma espécie longe do seu centro de origem. “Creio que o próximo passo no desenvolvimento da espécie seja a seleção de materiais genéticos mais específicos para determinados usos, sejam novos clones ou cruzamentos com finalidades específicas para as nossas condições, como materiais mais apropriados para madeira serrada e para condições de cultivos diferentes dos utilizados tradicionalmente até então”, observa o engenheiro agrônomo e pesquisador da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) Regis Pereira Venturin. A professora da Faculdade de Ciências Biológicas e Agrárias da Universidade Federal do Estado de Mato Grosso Juliana Garlet afirma que o Brasil é o grande detentor mundial da tecnologia de produção dessa espécie e por isso também é o maior produtor de eucalipto do mundo. “Sem dúvida, uma das principais perspectivas de avanço tecnológico é a liberação do eucalipto geneticamente modificado ocorrida em 2015, em que o Brasil é o primeiro país a possibilitar que isso ocorra e que dá a previsão de aumento de 20% na produtividade. Além da transgenia, o aumento da mecanização no processo de produção, a intensificação da silvicultura de precisão e melhorias no monitoramento florestal com o uso de Vants (veículos aéreos não tripulados) são outras perspectivas a serem citadas”.

Plantação no Vale do Jari

Regis Venturin, pesquisador da EPAMIG e co-autor de um capítulo sobre agrossilvicultura no livro Silvicultura do Eucalipto no Brasil, complementa: “Isso é um mito que vem sendo desmentido ao longo do tempo. A planta de eucalipto é extremamente eficiente em captar e armazenar nutrientes e recursos que ela necessita, assim é muito competitiva enquanto está estabelecida. Todavia não é diferente de outras tantas espécies cultivadas ou nativas do Brasil. O que observamos é que dentro de um plantio de eucalipto temos um sub-bosque diverso [que pode abrigar outras espécies vegetais] e, a partir da retirada da espécie, se não for mais cultivado, temos uma rápida recuperação da condição original, obviamente com os impactos normais de qualquer cultivo". a Repórter: Bernardo Zamperetti · Diagramação: Juliana Krupahtz

O livro Silvicultura do Eucalipto no Brasil possui nove capítulos, contou com a colaboração de 21 profissionais da área e aborda assuntos como produção de mudas, desbastes e derramas, manejo de solos, insetos-praga na cultura, exportação e ciclagem de nutrientes, agrossilvicultura e melhoramento genético. A obra, que também está disponível na versão digital, pode ser obtida na Livraria UFSM ou através do site da Editora UFSM (editoraufsm.com.br).

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História preservada em negativos Cinco décadas de memória da instituição estão disponíveis no Arquivo Permanente da UFSM

Aula prática do Curso de Educação Física — 1972

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O fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado diz que as fotografias são vetores entre o que acontece no mundo e as pessoas que não tiveram como presenciar. Se não fossem as fotos, o que comprovaria que os Beatles atravessaram a Abbey Road nos anos sessenta? Ou que Einstein mostrou a língua para as lentes do americano Arthur Sasse? A fotografia faz perdurarem os momentos e os transmite por gerações. Na UFSM, pensando na manutenção da memória da instituição, foi criado o Departamento de Arquivo Geral, o DAG, em 1988. No setor de Arquivo Permanente, fotografias e documentos são fontes de pesquisa e recordações para alunos, servidores e comunidade em geral, e guardam a história das mais de cinco décadas da Universidade. Além das que já estão em formato digital, 85 mil imagens em negativos, tiradas entre os anos de 1958 a 2002, compõem o acervo, organizadas por data, evento, personagem e fotógrafo. Os negativos são, gradativamente, transferidos para plataformas digitais e já somam 2.500 imagens disponíveis online. A preocupação de oferecer condições igualitárias de acesso a esse material para toda a comunidade universitária fez surgir o projeto Retalhos da Memória, em 2015, coordenado pela arquivista do DAG Cristina Strohschoen. Através dele, as imagens já digitalizadas são divulgadas com textos históricos e explicativos. Além disso, vídeos em libras para surdos e audiodescrição de fotografias para cegos acompanham as postagens. Diante de um acervo fotográfico repleto de curiosidades, o Ensaio desta edição da Arco é composto por algumas imagens memoráveis da história da UFSM. a Repórter: Andressa Foggiato · Diagramação: Kennior Dias Construção do Planetário da UFSM — 1970

Greve na UFSM — 1986

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Aula prática na Escola Nossa Senhora da Medianeira — 1960 (acima), Vestibular — 1976 (à esq.) e Doação de sangue dos calouros do curso de Engenharia Florestal — 1972 (à dir.)

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recordações

O anel de formatura por Ruben Boelter*

*Ruben Boelter é médico veterinário e professor aposentado da UFSM. Em 2008, essa história foi premiada na 4ª edição do Concurso de Crônicas da UFSM, promovido pelo Programa Volver

Num final de tarde no ano de 1962, como de costume, após a última aula do dia, embarquei no Farquinho, ônibus antigo que, naquele dia, estava fazendo o percurso da UFSM para a cidade. Ao entrar no ônibus, observei uma senhora, um tanto nervosa, com um gatinho no colo. Aproximando-me do seu banco, pedi licença e perguntei o que havia acontecido com o seu gatinho. Então ela respondeu: — Ele foi castrado no Hospital Veterinário, e está muito agitado. — Quem fez a cirurgia? Indaguei. — Não sei quem foi, mas ao chegar, fui muito bem recebida por um veterinário alto, moreno, de olhos verdes e muito bonito. Pelas características descritas, eu sabia que se tratava do Professor Petrucci, médico veterinário que vinha de Porto Alegre para ministrar aulas de Técnica Cirúrgica em nossa Universidade. Enquanto o ônibus fazia o percurso pela Faixa Velha de Camobi, apresentei-me como aluno da Faculdade de Veterinária, e coloquei-me à disposição se ela precisasse de qualquer auxílio, tal como retirar pontos, aplicar medicamentos ou tratar de pequenos curativos. Ao chegarmos no ponto de desembarque, no Garajão, perguntei-lhe qual era seu nome. — Eu me chamo Rosa Mena Barreto, sou professora aposentada, e moro na rua do Acampamento. Então, pediu-me que ajudasse a levar o seu gatinho para examiná-lo novamente. — A senhora pode contar com minha ajuda, no que for preciso. Ao chegarmos a sua casa, verifiquei que não tinha somente um, mas vários gatos. Enquanto eu examinava minuciosamente aquele operado, ela me perguntou:

— O senhor não gostaria, de agora em diante, de ser o médico dos meus gatos? Eu respondi que não havia nenhum problema e que eu faria tudo aquilo que me era permitido como estudante de veterinária. E, desde então, iniciou-se uma sólida amizade que, nesta vida, durou até a sua morte. A Dona Rosa, como eu a chamava, lia muito, era espírita convicta, conhecia muitos detalhes da história do Rio Grande do Sul, gostava de política, do Brizola e fazia críticas severas aos nossos governantes. Durante os dois anos que antecederam o final do curso, aprendi muito sobre doenças dos gatos e o manejo com essa espécie, a ponto de os colegas me chamarem de “doutor dos gatos”, e sempre que aparecia um caso clínico no Hospital Veterinário eu fazia questão de acompanhar até o fim. A formatura finalmente se aproximava, e era necessário que tivéssemos o anel de formatura, para que o Diretor da Faculdade, simbolicamente, colocasse no dedo dos formandos. Porém, eu e outros colegas não tínhamos condições de comprar o anel. Então combinamos que o formando que já tivesse recebido o seu diploma, ao retornar ao seu lugar, deveria passar o anel para o outro. Levei, então, um convite para Dona Rosa, que agradeceu muito sensibilizada, e antes de sair de sua casa, pediu que eu esperasse um pouco. — Doutor, tenho uma surpresa para você. E, após alguns minutos, ela trouxe um dos seus gatos, que trazia uma pequena caixa amarrada numa das suas patinhas. — É um presente dos gatinhos para você, disse-me ela. E, para minha surpresa, ao abrir a caixa, havia um lindo anel de formatura e um cartão com os seguintes dizeres: "Ao nosso dedicado médico, com muito carinho, a homenagem dos pacientes Fantinho, Nenezinha, Malhada, Meu Velho, Rajado e Gencinho". Com o anel no dedo, na noite de 3 de dezembro de 1965, no Cine Glória, recebia, com muita emoção e orgulho, das mãos do paraninfo, Dr. Danilo Saraiva, o meu diploma de Médico Veterinário, com as presenças do reitor, Dr. Mariano da Rocha Filho, e do Diretor da Faculdade de Veterinária, Dr. Armando Vallandro. Em memória à Dona Rosa, o anel que ganhei dos “gatinhos” ficará para um neto, bisneto ou sobrinho que venha a optar pela Medicina Veterinária. a Ilustração: Filipe Duarte

recordações

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escritos

Hoje é dia de João por Leonardo Martins Penna*

*É ex-aluno do Colégio Politécnico da UFSM. Gosta de escrever pois acredita que é possível transformar em arte e criar coisas incríveis a partir do que o machuca. A poesia foi premiada com o segundo lugar no 36º Concurso Literário Municipal de Santa Maria

João chegou chorando E todos sorriram João ficou faceiro Todos gostaram de João E João gostou de todos

Ninguém liga pro João Ninguém gosta do João Joga pedra no João João, seu esquisito

João ia ser ele mesmo Mas não pôde ser João tinha de seguir Não faz isso, João Faz aquilo, João

Ninguém sorri para o João João incompreendido Ninguém entende o João Tenta ser normal, João João, seu esquisito

João não podia se expressar João tinha de ficar quieto Fica calado, João João não podia ter opinião Não podia ter sentimento Sentimento não é coisa de homem E homem não tem sentimento

João não se sente bem Quer ir embora João quer voltar pra casa Quer ser igual João não aguenta mais

João foi reprimido Foi mal tratado João era sozinho Foi ignorado Joga João João João

pedra no João é esquisito é estranho é diferente

João não se sente bem Acha que não é daqui João não é daqui E João está perdido

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escritos

João se pendurou E saiu voando O mundo não quis João Que só queria sorrir Agora, João vai sorrindo Vai sonhando Vai flutuando Porque agora é diferente João é como a gente João, João Vai descansar, João Porque hoje é teu dia Hoje é dia de João Vai, vai ser feliz Vai ser João a Ilustração: Filipe Duarte


Sua pesquisa pode ser divulgada em uma de nossas reportagens Escreva para a revista arco e se informe pelo e-mail: arco@ufsm.br

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