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MULTITELAS

Acompanhar uma partida de futebol é um hábito secular no Brasil, mas com o streaming ele se tornou muito mais diverso e caro

Por Nathalia Jesus

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HÁ 100 ANOS, o jornalista e empresário Cásper Líbero, dono do jornal A Gazeta, se tornava pioneiro na transmissão esportiva no Brasil de um jeito, no mínimo, peculiar. Nos meses de setembro e outubro de 1922, o locutor Leopoldo Santana narrava por telefone as partidas do Campeonato Sul-Americano de Futebol, que ocorriam no Estádio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Na outra ponta da linha, o áudio era reproduzido por alto-falantes colocados em lugares estratégicos de São Paulo, como o Viaduto do Chá. De lá para cá, acompanhar uma partida de futebol ao vivo se tornou um hábito bem mais simples, seja pela plataforma que for. Na Copa do Mundo do Catar, o canal do Casimiro, no Youtube, bateu seguidos recordes de audiência ao transmitir as partidas do Brasil dentro de um novo paradigma: o das transmissões futebolísticas por streaming.

O fenômeno Casimiro não foi obra do acaso. Havia tecnologia e público consolidados ao longo dos últimos anos. O brasileiro se acostumou a ver a partida que quiser nas multitelas disponíveis. Há uma profusão de opções, o que dificulta a vida do torcedor. Primeiro para encontrar onde acompanhar o jogo. São nove plataformas de streaming que disponibilizam os principais campeonatos mundiais, sem contar com as plataformas exclusivas dos times. O segundo problema é o custo. Uma pessoa fanática por futebol, se quiser ter à disposição todos os jogos, teria de desembolsar aproximadamente 295 reais por mês para assinar a todos os canais.

Em 2022, um torcedor do Flamengo que não mora no Rio de Janeiro teve três opções para acompanhar o time na final do Campeonato Carioca: Twitch, YouTube ou pelo FlaTV, que custa cerca de 90 reais por mês. “Às vezes tinha transmissões em alguns canais que não conhecia direito. Hoje estou em um grupo de WhatsApp com outros flamenguistas que vão atualizando onde vai passar a partida. A gente dá um jeito, só não pode perder o jogo”, comenta Alan Carvalho, de 56 anos. O torcedor rubro-negro se acostumou a acompanhar as partidas do Flamengo desde que morava em Minas Gerais ainda na infância. Mas ao se mudar para Jundiaí, na Grande São Paulo, descobriu que os times cariocas não tinham tanta vez nas transmissões pelas emissoras paulistas de rádios ou TV.

DE OLHO NESSE FILÃO, boa parte dos grandes clubes de futebol brasileiro já possui os seus próprios canais de streaming, que oferecem conteúdos exclusivos sobre os bastidores de jo- gos, transmissões de partidas e até mesmo abordam questões administrativas. A ideia ganhou força durante a pandemia da covid-19, quando as principais franquias esportivas do mundo perderam parte de seus lucros com as vendas de ingressos. O torcedor já pode voltar aos estádios, mas o hábito de ver pelo streaming permaneceu.

Segundo Walace Borges, coordenador da transmissão esportiva da WarnerMedia, a interatividade e o imediatismo fizeram com que a demanda por esse tipo de transmissão só cresça. “O público é diferente até dentro de si. As transmissões dentro da HBO Max e dentro do Star+ são muito mais parecidas com as de televisão, ao passo que as transmissões do YouTube são muito diferentes, têm uma pegada muito mais leve, um pouco mais rede social”, afirma.

De acordo com um levantamento da consultoria Sports Value, a projeção de perda do setor esportivo mundial era de 15 bilhões de dólares em 2020. Com a pandemia, surgiu a oportunidade de transformar as redes sociais em canais lucrativos e ainda gerar uma maior aproximação com o público. “O público tem conseguido participar mais das transmissões, ficar mais próximo das próprias empresas e não só do seu clube. Todo clube brasileiro tem a sua TV, como a FlaTV e a TimãoTV. Você consegue ver que, mesmo que elas não tenham o direito [de transmissão de imagem das partidas], elas conseguem aproximar muito mais o clube do seu torcedor”, explica Borges.

Nos canais que permitem transmissões por streaming, os números de audiência em partidas de futebol durante o período já podem ser vistas como consideráveis. A final da Champions League de 2020, entre Bayern de Munique e Paris Saint-Germain, transmitida pelo Esporte Interativo atingiu 4,2 milhões de espectadores no Facebook, assumindo o posto de maior live já transmitida dentro da plataforma em todo o mundo.

É fato que o futuro das transmissões esportivas passam pelas redes digitais. Porém, apesar de expressivos, os números do streaming ainda não são capazes de fazer cócegas com a audiência da televisão. Para que a transição para esses canais seja feita com maior êxito, os profissionais de comunicação terão que aguardar até que uma parcela da população apaixonada por futebol também possa se sentir incluída nessa nova fase de uma das maiores tradições do país, agora colocada em polegadas menores. Segundo a pesquisa TIC de 2021, cerca de 18% dos lares brasileiros ainda não possuem nenhum tipo de conexão à internet. @

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