Revista Dasartes 84

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DOROTHEA TANNING REMBRANDT CARLOS VERGARA HENRI MATISSE JONATHAN DE ANDRADE




DIRETORA Liege Gonzalez Jung CONSELHO EDITORIAL Agnaldo Farias Artur Lescher Guilherme Bueno Marcelo Campos Vanda Klabin REDAÇÃO André Fabro PUBLICIDADE publicidade@dasartes.com

Capa: Dorothea Tanning, Birthday, 1942. Philadelphia Museum of Art (Philadelphia, US) © DACS, 2019

DESIGNER Moiré Art SOCIAL MEDIA Thiago Fernandes SUGESTÕES E CONTATO dasartes@dasartes.com APOIE A DASARTES Seja um amigo Dasartes em recorrente.benfeito ria.com/dasartesdigital Doe ou patrocine pelas leis de incentivo Rouanet, ISS ou ICMS/RJ

Contracapa: Rembrandt van Rijn, Man in oosterse kleding, 1635.

A Dasartes não se responsabiliza pelas opiniões e pelo conteúdo expresso nas matérias assinadas, que são de livre autoria de seus colaboradores.”

Henri Matisse, Nua com braços levantados, 1930-33. © Succession H. Matisse © Centre Pompidou, MNAM-CCI Philippe Migeat/Dist. RMN-GP.


JOSÉ DAMASCENO

10 DOROTHEA TANNING

JONATHAS DE ANDRADE

6 De Arte a Z 78 Livros 80

12

Coluna do meio

REMBRANDT

CARLOS VERGARA

HENRI MATISSE

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28

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DE ARTE A Z Notas do circuito de arte

STEDELIJK DESVENDA MISTÉRIO SOBRE RETRATO DE GUERRA O museu de Amsterdã revelou novas informações sobre famoso retrato de guerra da pintora holandesa Charley Toorop. O museu descobriu que o assunto ansioso na tela era baseado na governanta de Toorop, Johanna “Jansje” Punt, que estava preocupada com seus três filhos forçados a trabalhar na Alemanha nazista. Os netos de Punt escreveram ao museu para identificar o tema depois de ler um artigo sobre a pintura no jornal.

CHRISTIE’S SUSTENTÁVEL

MANIFESTA PARA OS BÁLCÃS

PERDIDO NO ESPAÇO

Em Nova York

Prevista para 2022

Graças ao governo

Artista Jonas Wood doou sua pintura para ser vendida em leilão da Christie's por uma boa causa: os recursos financiarão uma reserva de 600 mil acres da floresta tropical americana. As instituições de caridade Global Wildlife Conservation e Rainforest Trust ofereceram uma combinação de 400% do preço de martelo para beneficiar a iniciativa.

A “bienal nômade europeia” anunciou que sua 14ª edição será realizada em Pristina, capital do Kosovo. Expandindo sua missão de explorar a mudança das paisagens políticas e artísticas da Europa, os organizadores selecionaram Pristina em parte devido às questões geopolíticas distintas – a privatização dos espaços urbanos – e seu papel como porta de entrada para os Bálcãs.

O satélite do artista Trevor Paglen, de US$ 1,5 milhão, foi perdido no espaço – e a parada do governo de Donald Trump, que durou 35 dias em janeiro, pode ser a culpada. O artista lançou com sucesso sua ambiciosa instalação, , no final do ano passado, mas o silêncio do rádio durante o desligamento imprevisto fez com que os engenheiros perdessem a implantação do trabalho e seu rastreamento.

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GIRO NA CENA RESIDÊNCIA ADELINA Inscrições até 12/5 Adelina Instituto está recebendo portfólios de artistas que nasceram e/ou residem na América Latina para participar de sua residência artística. A Residência Adelina contemplará quatro artistas, sendo dois brasileiros, e acontecerá no segundo semestre de 2019. A seleção dos artistas será realizada por um júri liderado por Julia Lima, que assina a curadoria da segunda edição do projeto. Os artistas selecionados, terão hospedagem, ajuda de custo e verba de produção para a realização do projeto de pesquisa inscrito. Inscreva-se em www. adelina.org.br.

Acervo histórico do Videobrasil Em paralelo aos preparativos para a 21ª Bienal de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, a Associação Cultural Videobrasil mostrará recortes de seu acervo histórico em programas desenvolvidos em parceria com a Pinacoteca, o Instituto Tomie Ohtake, o Instituto Moreira Salles, a Casa do Povo, entre outras instituições. Intitulado , o projeto busca difundir a riqueza e a diversidade do acervo, formado por mais de 1.500 obras em vídeo.

Pego no flagra “Obrigado por suas dicas. Um homem de 61 anos foi preso e responderá por este roubo.” Polícia de Nova York após divulgar vídeo de um homem saindo de uma galeria de arte de Nova York com uma valiosa escultura de cristal. O ladrão fugiu com a obra avaliada em US$ 16 mil. A peça estava em exposição na Galeries Bartoux, em Manhattan.

Varejão Itinerante é a mostra itinerante que circulará o ano de 2019 em cidades brasileiras fora do eixo Rio-São Paulo, começando pela capital baiana, no MAM-BA. Com curadoria de Luisa Duarte, a exposição faz parte de um projeto que pretende descentralizar o acesso à produção da artista carioca, exibindo 19 obras dos seus mais de 30 anos de trajetória.


GIRO NA CENA

Artefatos saqueados no Facebook Antiguidades da Síria e do Iraque estão sendo negociadas em uma grande rede de grupos dedicados do Facebook, com cerca de 120 mil membros. A rede social disse que suspendeu 49 grupos após uma investigação da BBC ter encontrado uma estátua da antiga cidade de Palmyra e um mosaico romano completo de Aleppo entre os artefatos listados para venda.

Vazo de ouro de Cattelan no Reino Unido A famosa privada de ouro sólido está pronta para ser instalada em um banheiro do Palácio de Blenheim, no Reino Unido. E as pessoas poderão usá-la. A obra de arte de ouro de 18 , do artista italiano quilates, Maurizio Cattelan, ganhou as manchetes nos EUA depois que o Guggenheim ofereceu a escultura à Donald Trump, em vez da pintura de Van Gogh que ele havia solicitado.

8 DE ARTE A Z

MUSEU ESPANHOL MANTÉM OBRA-PRIMA DE SAQUE NAZISTA O museu Thyssen-Bornemisza, da Espanha, venceu a longa batalha legal nos EUA para manter uma obra-prima de Camille Pissarro que foi confiscada pelos nazistas de seu dono judeu em 1939, quando ele fugiu da Alemanha. Apesar de expressar algumas dúvidas sobre as ações do museu, um juiz federal decidiu que o proprietário legal da pintura é o Barão Hans Heinrich Thyssen-Bornemisza, depois de adquirilo há décadas. Os herdeiros americanos do proprietário original alegaram que o barão sabia que a pintura tinha sido roubada quando ele a comprou de uma galeria de Nova York em 1976.

VISTO POR AÍ Até 11 de maio, a Fundação Andy Warhol irá exibir cerca de 70 fotografias raramente vistas do artista no Instagram. As fotos íntimas e espontâneas foram tiradas do Arquivo de Fotografia de Andy Warhol, no Cantor Arts Center de Stanford, onde foram doadas em 2014. Siga a hashtag #IntimateAndy no Instagram para saber mais.



JOSÉ DAMASCENO éa primeira mostra do Programa Solo, em que o MAM-RJ realiza individuais de artistas brasileiros com obras pertencentes as suas coleções. Do artista carioca serão mostradas sete obras, entre elas (2000), uma estrutura de linhas de metal apoiada em nove compassos que "revela o interesse do artista pelo espaço real e nos chama a atenção para sua dimensão móvel, instável, com o equilíbrio frágil que articula as peças e sustenta o objeto", apontam os curadores Fernando Cocchiarale e Fernanda Lopes. Estará também na mostra a obra (1998), composta por estantes para partitura. 10 AGENDA

Desenhos a nanquim, hidrocor e esferográfica sobre papel, dos anos 1990, integram a mostra, assim como a litografia (1987), considerada pelo artista o ponto de partida de seu trabalho, quando ainda era estudante da Escola de Artes Visuais do Parque Lage. O trabalho "já anuncia o estranhamento como um dos procedimentos que vai acompanhar seu trabalho até os dias de hoje.

Programa Solo - José Damasceno • MAM • Rio de Janeiro • 6/4 a 16/6/2019



DORO TANN


Eine Kleine Nachtmusik, 1943. Tate © DACS, 2019.

OTHEA NING


DE PINTURAS ENIGMÁTICAS SURREALISTAS A PIONEIRAS E MISTERIOSAS ESCULTURAS DE TECIDO, DOROTHEA TANNING PRODUZIU SUAS OBRAS DURANTE AS ÚLTIMAS SETE DÉCADAS. OFUSCADA PELO TÍTULO DE PRIMEIRA-DAMA DO SURREALISMO, FRUTO DE CASAMENTO COM MAX ERNST, DEPOIS DE 25 ANOS A ARTISTA RECEBE MERECIDA RETROSPECTIVA NO TATE MODERN

POR ELISA MAIA Dorothea Tanning nasceu em 1910, no Estado de Illinois, em Galesburg, uma típica cidade pequena do centro-oeste americano. Ao longo de sua vida, mudou-se para Chicago, Nova York, Sedona, Paris, Huismes, Seillans e de volta a Nova York, onde faleceu, em 2012. Viveu longos 101 anos e, por mais de sessenta, produziu uma obra que desafiou limites e atribuições, ajudando a afirmar a arte como um espaço de multiplicação de possíveis. Seu percurso foi marcado por uma prática que transitou por diferentes terrenos, lançando mão de uma enorme variedade de materiais, meios e linguagens. Fez desenho, pintura, escultura e instalação, escreveu prosa e poesia e produziu cenários e figurinos para balés e peças de teatro. Apesar de ser ainda hoje comumente associada ao movimento Surrealista, 14 CAPA

um rótulo que tende a localizar sua prática historicamente, Tanning deixou uma obra que em muito ultrapassa os preceitos do movimento. Destacou-se tanto pelas primeiras cenas surrealistas da década de 1940, quanto pelas pinturas espectrais e caleidoscópicas dos anos 1950 e, sobretudo, pelas esculturas macias de tecido que passou a fazer no final dos anos 1960, duas décadas antes de Louise Bourgeois ou Sarah Lucas começarem a trabalhar com o material. Seu pioneirismo e talento extraordinários foram por muito tempo ofuscados pelo título de primeira-dama do surrealismo, fruto do seu casamento com Max Ernst, uma figura emblemática do movimento. Os dois se conheceram em 1942, em Nova York, quando Ernst, então casado com Peggy Guggenheim, fez uma visita ao


Costume Design for Night Shadow, 1945. © DACS, 2019.



Birthday, 1942. © DACS, 2019.

ateliê dela em busca de trabalhos para uma exposição de artistas mulheres que Peggy estava organizando – a . A pintura selecionada para (1942), na qual Tanning se autorretratou olhando para o a ocasião foi espectador, vestida em trajes shakespearianos, ao lado de uma criatura fantástica, com asas e um longo rabo, em um espaço vertiginoso marcado por uma multiplicidade de portas semiabertas. O quadro foi exposto em 1943 ao lado de obras de outras 31 artistas, entre elas Leonora Carrington, Leonor Fini, Frida Kahlo, Meret Oppenheim e Kay Sage. Apenas uma das convidadas declinou o convite para participar da mostra, Georgia O’Keeffe, que, de acordo com os relatos de Jimmy Ernst, foi até a galeria dizer a Peggy que não poderia participar porque era “uma pintora” e “não uma pintora mulher”. Algumas décadas mais tarde, em uma entrevista em 1990, Tanning adotou a mesma postura de O’Keeffe quando afirmou: “Artistas mulheres, não existe tal coisa. Ou pessoa.” Falar nesses termos seria uma contradição assim como falar em “artista homem” ou “artista elefante”. Desconfiava, na verdade, dos rótulos que pudessem domesticar seu trabalho e se recusava a deixar que sua arte fosse confinada à categoria de ilustração de qualquer teoria ou doutrina. Escrevendo sobre Tanning em 1944, Max Ernst disse que, embora o domínio do maravilhoso fosse sua terra natal, ela “se recusava a fazer os votos de obediência às exigências do surrealismo ortodoxo”. se tornaram um significante recorrente em toda As portas que marcam a sua obra, tanto nas imagens quanto nos textos, sugerindo um movimento perpétuo e vertiginoso – “tudo está em movimento, atrás de cada porta invisível, há outra porta”. Elas tornam a aparecer no ano seguinte em uma pintura que talvez seja a mais conhecida do início de sua carreira, a pequena e enigmática (1943), cujo título faz homenagem à composição DOROTHEA TANNING 17


Endgame, 1944. © DACS, 2019.

18 ARTUR LESCHER


homônima de Mozart. No que aparenta ser o corredor de um hotel antigo, a atmosfera sombria do ambiente é iluminada por uma luz incandescente que entra pela única porta entreaberta na fileira de portas numeradas. No topo da escada, sobre o carpete vermelho e com o caule quebrado, repousa um girassol gigante, segundo Tanning, “a mais agressiva das flores”. Outro símbolo recorrente em sua obra, o girassol, longe de simbolizar a fragilidade e a beleza associada às flores, encarna uma aura de ameaça e monstruosidade. Recostada a uma das portas, uma figura que não se sabe ser uma boneca ou uma menina. Apesar das proporções humanas, seu couro cabeludo termina de forma abrupta sugerindo um corpo artificial. Ao seu lado, de costas, está uma menina cujos longos cabelos pretos desafiam a gravidade, suspensos em um movimento insólito que sugere a presença de alguma força ou fenômeno sobrenatural. As pinturas da década de 1950 marcam uma mudança na direção de uma prática mais livre e abstrata, onde as figuras das primeiras imagens começam a perder contornos e definição. Em telas como (1957) e (1955), lançando mão de transparências e de uma paleta de cores suaves, a artista criou imagens fantasmagóricas, mesclando com delicadeza espaços e temporalidades distintas. Sobre esse período, Tanning observou: “nos 19


Nue couchée, 1969. Fotos: © DACS, 2019.

primeiros anos, eu estava pintando do nosso lado do espelho – pra mim, o espelho é uma porta –, mas acho que cruzei essa porta e fui para um lugar onde não há mais identidades”. Se havia um espelho, este se estilhaçou e passou a revelar estados corporais fugazes em um espaço pictórico fragmentado. Na virada da década de 1960, uma nova mudança. Valendo-se de uma antiga máquina de costura e de tecidos garimpados em brechós, Tanning passou a encarnar o mundo bidimensional de suas pinturas em audaciosas esculturas macias que privilegiaram a dimensão tátil e enfatizaram a precariedade e a efemeridade dos objetos. A fragilidade 20 CAPA

do tecido, a qualidade informe dos objetos e a maciez das esculturas feitas à mão se opunham de maneira flagrante à resistência dos materiais, à geometria das formas e à rigidez das esculturas minimalistas produzidas industrialmente nos Estados Unidos no mesmo período por artistas como Donald Judd, Tony Smith e Carl Andre. Um sofá se torna um casal de amantes (1970), em uma mesa se contorce dando forma a um corpo feminino em (1970) e o dorso de uma mulher se metamorfoseia em um emaranhado de membros que remetem a raízes vegetais ou patas de insetos em (1969). A partir da rearticulação das partes e da


Chambre 202, Hôtel du Pavot , 1970-1973.

manipulação dos membros, que se sobrepõem, se interrompem ou metamorfoseiam em outros objetos, multiplicam-se as possibilidades do corpo, de forma que os limites físicos são borrados e reinventados por uma anatomia transgressiva, informe, liberta tanto de suas amarras biológicas, quanto de seu papel de representação. Por meio de suas esculturas, Tanning enfatiza a dimensão fabricada e fragmentada do corpo, provocando o observador através de um esgarçamento de seus limites que aponta para o abjeto. Por isso é comum a afirmação de que esses trabalhos só encontrariam seu verdadeiro contexto na década de

1990, quando o corpo, que havia sido recalcado nas décadas anteriores em favor dos conceitos, retorna como um duplo estranho nos trabalhos de artistas como Annette Messager, Kiki Smith, Rosemarie Trockel, Mike Kelley e Robert Gober. As esculturas macias deram origem ao trabalho mais radical de Tanning, a instalação (1970-1973), um quarto anônimo de hotel, ao mesmo tempo banal e monstruoso, onde as paredes parecem gritar. As formas – alongadas, reviradas, torcidas – parecem transfiguradas pelos afetos e cada móvel tomado por um transe próprio. Duas formas orgânicas que remetem a partes do corpo humano brotam das


Children’s games, 1942. © DACS, 2019.

Agora o sonho se torna pensamento, um pensamento que mobiliza o corpo e os membros ao mesmo tempo em que celebra o enigma, a liberdade e a transfiguração.

paredes rasgando o papel de parede florido. Da chaminé emergem formas híbridas, meio humanas, meio animais. poderia ser o avesso de alguma das portas que Tanning pintou ao longo de sua carreira, uma porta que daria acesso às entranhas do espaço. Enfim, um lugar onde não haveria mais identidades, onde as fronteiras entre o real e o imaginado, entre o sonho e a vigília, entre o espaço físico e o espaço do inconsciente se diluíram por completo. Se ainda restava algum desejo de ilustrar o sonho – uma pretensão compartilhada por muitos surrealistas que por vezes corria o risco de dar aos trabalhos um caráter anedótico –, esse desejo é abandonado de forma definitiva. Agora o sonho se torna pensamento, um pensamento que mobiliza o corpo e os membros ao mesmo tempo em que celebra o enigma, a liberdade e a transfiguração. O Surrealismo, desde seu nascimento na década de 1920, em Paris, e até muito pouco tempo atrás, foi entendido como um movimento organizado e dominado por homens europeus. A figura da mulher, embora central à vanguarda, era celebrada na função de musa e não no papel de artista. Sua imagem muda e sua sexualidade, associada a uma aparente irracionalidade, impuseram-se no imaginário surrealista de forma preponderante. 22 DOROTHEA TANNING


Acima: Os Castelos do pensamento, 1988. Foto: Rubens Chiri.


À direita: Dogs of Cythera, 1963. Inutile (Useless), 1969.

Louis Aragon e André Breton celebraram a histeria como “a maior descoberta poética do fim do século 19”, enxergando nas imagens fotográficas do neurologista JeanMartin Charcot – de mulheres histéricas com seus corpos contorcidos em meio aos ataques no Hospital da Salpêtrière – o arquétipo da beleza convulsiva que eles idealizavam. A temática da reificação, da violação e da exploração do corpo feminino que a crítica percebia nos romances de Breton e Bataille, nas bonecas desmembradas de Hans Bellmer e nas mulheres decapitadas de Max Ernst, contribuiu para que na década de 1980 houvesse um relativo consenso da crítica feminista de que o Surrealismo, além de excludente, era extremamente misógino. Nos últimos cinco anos, entretanto, um crescente interesse curatorial no trabalho de mulheres surrealistas e no diálogo que a vanguarda de uma maneira geral estabelece com a arte 24 CAPA

contemporânea tem enfatizado que não apenas houve mulheres dentro do movimento, mas muitas delas produziram obras revolucionárias. Quando o filósofo alemão Walter Benjamim, em 1929, chamou o Surrealismo de “o último instantâneo da inteligência europeia”, ele não podia imaginar os rumos e os ecos que o movimento teria com o exílio de grande parte de seus representantes, levados a cruzar o Atlântico em decorrência da ascendência dos movimentos fascistas e do início da Segunda Guerra Mundial na Europa. Estabelecendo-se em diferentes países da América, o movimento precisou se repensar em diálogo com outras culturas, vozes e perspectivas, entre as quais as de artistas mulheres. Dorothea Tanning, Leonora Carrington, Kay Sage, Remedio Varos, Leonor Fini, Valentine Hugo, Única Zurn e Dora Maar e outras que desconfiaram do título de surrealistas, mas cujo trabalho conversou de forma


Zu 2, 2012.


Verbe, 1966-1970. © DACS, 2019.

eloquente com sua estética, como Frida Kahlo e Kati Horna, cada uma à sua maneira contribuiu para expandir o movimento para lugares até então impensados. É preciso agora ir com elas até esses lugares e reimaginar não apenas o Surrealismo, mas um Modernismo que contemple a obra de grandes artistas que eram também mulheres em uma época em que o gênero era determinante não para a potência da prática artística, mas para seu alcance institucional e comercial. Nesse sentido, muitos espaços já começaram a ser destrancados, mas há ainda uma enorme quantidade de portas esperando para serem abertas. Mãos à obra.

Elisa Maia é doutoranda do programa de Comunicação e Cultura da ECO-UFRJ.

Dorothea Tanning • Tate Modern • Reino Unido • 27/2 a 9/6/2019



Suar a Camisa, 2014 (Vista da Instalação One to One, 2019) Museu de Arte Contemporânea de Chicago. Nathan Keay, © MCA Chicago.

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Jonathas de Andrade


EM SUA PRIMEIRA GRANDE INDIVIDUAL NOS ESTADOS UNIDOS, O ARTISTA FILTRA QUESTÕES SOCIAIS TIPICAMENTE BRASILEIRAS PARA PASSAR UMA MENSAGEM UNIVERSAL POR UM MUNDO MAIS FOCADO NO COLETIVO

POR JOSÉ ESPARZA CHONG CUY Apropriando-se de técnicas de disciplinas como etnografia, antropologia, sociologia e outras ciências sociais, Andrade aborda temas como interseção de raça, classe, trabalho e educação – assuntos que estão no centro dos atuais debates políticos no Brasil. Durante anos, vem utilizando a escala de espaços da vida real para explorar as dinâmicas de poder e intimidade que permeiam tanto os lugares físicos quanto as relações pessoais, seja na cidade do Recife ou no ambiente doméstico do intelectual Gilberto Freyre. Andrade reconhece esses locais como carregados de uma história ativa e memória, onde forças sociais, políticas e econômicas estão em jogo. Por meio de seu trabalho, Andrade nos pede para escutar para que possamos aprender a conviver uns com os outros de maneira mais solidária e coletiva. Ele também tende a adotar uma abordagem subversiva aos construtos normativos da sexualidade, com o objetivo de desestabilizar as convenções da masculinidade. Há um olhar sexual palpável na maior parte de seu corpo de trabalho, dos corpos esculpidos de pele escura de uma campanha de mídia fictícia para um museu aos corpos ausentes evocados por uma coleção de uniformes suados. Essa camada erótica – ou “temperatura”, como o artista descreve – está presente na maior parte de sua produção artística, mas ele nunca aborda a sexualidade tão diretamente quanto aborda outros temas, como raça e classe. Seu comentário sobre os tabus e convenções sexuais é ainda mais comovente como resultado dessa sensualidade muda. Enquanto as imagens que ele produz através de suas fotografias, vídeos, esculturas e instalações às vezes podem parecer controversas e provocantes à 30 ALTO RELEVO


Suar a camisa, 2014.

Cartazes para o Museu do Homem do Nordeste.


A voz não é mais sobre a articulação de palavras, mas sobre a expressão.

Manual para 2 em 1, 2015.

40 nego bom é um real, 2013

32 JONATHAS DE ANDRADE


Still de O Peixe, 2016.

luz dos assuntos que eles descrevem, Andrade está ciente do que seu trabalho pode despertar no espectador. Pode fazer você se sentir desconfortável, mas também incrivelmente em casa. Pode-se dizer que seu trabalho procura esse momento de contradição. Em sua obra, testemunhamos como a voz não é mais sobre a articulação de palavras, mas sobre a expressão. O corpo não é apenas uma ferramenta dessexualizada para produzir trabalho, mas também para lazer e prazer. A casa não é simplesmente uma barreira para nos proteger do ambiente natural e construído, mas também um espaço íntimo onde os relacionamentos são desenvolvidos e fomentados. A terra não está lá apenas para ser trabalhada e explorada, mas também para ser cuidada e preservada. Criticamente informado pelo lugar, Andrade frequentemente complica a suposição básica de que a terra urbana é um sinal de progresso moderno e o campo rural é um local de produção. Ele questiona ativamente quem se beneficia desse desenvolvimento e exploração, e a que custo. Vendo através dessa lente, ele permite que o espectador navegue por esses espaços tanto de longe quanto pela experiência pessoal dos temas retratados em sua obra – um jovem afluente que viveu intensamente no Recife durante os anos da ditadura, como em ; um carroceiro no centro da cidade, como em ; ou um operário de fábrica que produz as clássicas balas Nego Bom, como em . Andrade revela um território que não é mais uma paisagem tropical idílica, mas um campo colonizado explorado por corpos negros e marrons. 33


O Levante, 2012-2014.

O ambiente doméstico onde identidades e relacionamentos são desenvolvidos é outro ponto crucial para Andrade. É nesses espaços íntimos e pessoais onde os costumes coloniais e patriarcais continuam se reproduzindo e replicando, mas é também onde eles podem ser desafiados. A casa é um espaço para proteção, carinho, descanso e prazer, mas também pode ser um ambiente privado para exploração clandestina; é um espaço de isolamento e contemplação, mas também de perpetuação e desempenho de um sistema colonial de raça e classe. A voz humana fornece um sistema de comunicação que posiciona nossos corpos, necessidades e desejos publicamente. No entanto, nem todos nós temos voz e nem todas as nossas vozes são audíveis. Alguns podem falar, mas a fala por si só não garante que alguém escute. Outros podem não falar, mas podem chegar a muitos. Andrade entende a voz como um espaço intangível que permite conexão e aprendizagem, e seu interesse contínuo em questões de analfabetismo e grupos marginalizados chama a atenção para as vozes daqueles que não podem ser ouvidos. Ele aproxima as pessoas umas das outras por meio de distintos processos de aprendizagem na produção de uma peça, e a voz audível (ou inaudível) é tanto o espaço quanto o veículo pelo qual esse processo é facilitado. Influenciado pelo trabalho do educador e filósofo paulistano Paulo Freire, a abordagem experimental de educação de Andrade pode ser entendida como um apelo à expansão do foco acadêmico dos centros urbanos para o campo, para expressar as deficiências de um sistema que raramente atinge quem mais precisa. As consequências cruas dessas hierarquias urbanas , principal peça de são visíveis em Andrade feita especialmente para sua exposição no Museu de Arte Contemporânea de Chicago. Este novo vídeo é ambientado no sertão de Várzea Queimada, no Estado do Piauí, também no Nordeste. Essa pequena cidade empobrecida, fora 34


Abaixo: Sem título, 2019. À esquerda: Rasga Mortalha, 2019 (Frames de vídeo).

35 DESTAQUE


do mapa, com cerca de novecentos habitantes – muitos dos quais são relacionados pelo sangue – sustenta-se principalmente através da produção de bens artesanais e de uma economia interna. Andrade escolheu trabalhar com a ampla população surda da aldeia e centralizou o vídeo em torno de novas formas de troca e comunicação, efeitos que só foram possíveis ​devido à confiança que ele ganhou dessa comunidade após várias visitas. Sua câmera captura pessoas interagindo através de jogos direcionados e destaca as poderosas expressões que eles trocam. Aqui, Andrade se afasta da linguagem da voz humana para a linguagem das emoções. O artista substitui a ausência da voz pela presença do ser. Embora a voz do elenco em seu novo filme não possa ser ouvida pelo espectador, a alegria e a energia de seus personagens são contagiantes. Andrade, de alguma forma, desmonta formas de interação impostas, demonstrando com cuidado e delicadeza a essência da comunicação. Em , a natureza específica da voz inaudível de um grupo naquela pequena cidade do Nordeste encontra uma maneira de compartilhar o que parece ser uma linguagem universal.

Still de Jogos dirigidos, 2019.

José Esparza Choy Cuy é curador associado do Museu de Arte Contemporânea de Chicago.

Jonathas de Andrade: One to One • Museu de Arte Contemporânea de Chicago MCA • 13/4 a 25/8/2019




REMBRANDT van Rijn

Isaac e Rebecca, conhecida como A Noiva Judaica, c. 1665.


HÁ 350 ANOS, O MUNDO PERDIA O GRANDE MESTRE DA PINTURA REMBRANDT VON RIJN. PARA CELEBRAR A DATA, O RIJKSMUSEUM DE AMSTERDÃ CRIOU UMA PROGRAMAÇÃO ESPECIAL PARA 2019, QUE COMEÇA REUNINDO, PELA PRIMEIRA VEZ, MAIS DE 350 OBRAS DO ARTISTA QUE FAZEM PARTE DE SUA COLEÇÃO

POR JONATHAN BIKKER Sempre inovador e, com frequência, provocante, Rembrandt balançou o mundo da arte na Era de Ouro. Este ano marca o 350º aniversário de sua morte, mas, mesmo depois de três séculos e meio, sua arte e sua biografia épica continuam a nos inspirar e a nos mover. Acusado por seus contemporâneos de quebrar as regras da arte, Rembrandt não era apenas um vanguardista, era um rebelde. Sua recusa em seguir as convenções era justificada pela ambição de ser o maior contador de histórias que o mundo já conheceu.

FORMAÇÃO Rembrandt foi o penúltimo dos dez filhos do dono de um moinho de Leiden, na Holanda. Ainda que sua situação plebeia não fosse favorável ao sucesso na carreira de artista, a prosperidade de sua família garantiu que ele pudesse ser treinado junto a dois pintores importantes da região: Jacob Van Swanenburg, de Leiden, e Pieter Lastman, de Amsterdã, ambos formados na Itália, então a “Meca” da arte. O talento da Rembrandt permitiu que, após apenas seis meses no ateliê de Lastman, o pupilo abrisse seu próprio estúdio e começasse a desenvolver seu estilo único, seguindo o conselho de seu professor: ir além de simplesmente copiar o trabalho de outros artistas para incorporar o que é bom e eficaz na arte do passado em algo novo. Esse conselho foi levado tão ao “pé da letra” que especialistas têm dificuldade em identificar os temas de algumas de suas e primeiras pinturas independentes, como , ambas de 1626. Em 1631, Rembrandt estava a caminho de se tornar um dos maiores artistas de todos os tempos. Em seis anos de trabalho autônomo, dominara os truques do meio e alcançara certa fama. Não apenas cidadãos proeminentes de Leiden compravam suas pinturas, mas também conhecedores importantes de outras regiões, como Constantijn Huygens, que visitou seu estúdio em 1929, um dos pontos de virada da carreira do artista. Foi graças ao entusiasmo sem limites da 40 FLASHBACK


Companhia Musical, 1626.


Tobit e Ana com cabrito, 1626.

Huygens por seu talento que várias de suas pinturas entraram nas coleções do príncipe Frederik Hendrik e do rei Charles I, da Inglaterra. Outra prova do sucesso de Rembrandt é o fato de que, já em 1628, ele passou a receber seus próprios alunos, começando por Gerrit Dou. Embora Leiden fosse a segunda maior cidade da Holanda, tinha apenas alguns cidadãos ricos o suficiente para comprar as pinturas de Rembrandt e não oferecia o ambiente cosmopolita de outros grandes centros urbanos. Era hora de seguir em frente. AMSTERDÃ O excêntrico dândi de um de seus autorretratos, gravado por volta de 1631 é um novo homem. De repente, o filho do dono de um moinho se transformou em um fidalgo despreocupado e rico, com ares de cortesão. Vestido à última moda em um manto e chapéu ricamente bordados, faz uma pose confiante. A inspiração veio de um autorretrato de Peter Paul Rubens, para muitos, o maior artista vivo da época e um ídolo para o jovem artista holandês. Rembrandt buscava chamar atenção para si, impressionando seu novo círculo na cidade que era o coração dinâmico da República Holandesa e divulgando suas habilidades como retratista. Pouco depois de tocar os pés na próspera metrópole, Rembrandt se tornou o novo “queridinho” da cidade e os anos de 1631 a 1642 seriam os mais gloriosos de sua carreira. Embora fosse inexperiente com retratos formais, Rembrandt conseguiu inovar na 42 REMBRANDT



Country Road: Kentucky, 1984 (Série Fake Fashion).


Renderização magistral de várias texturas de superfície e habilidade para infundir seus modelos com uma incrível sensação de vitalidade e sutileza psicológica.

representação de modelos individuais. O que é novo não era tanto suas composições ou as poses dos retratados, mas os contrastes originais do artista com luz e sombra, sua renderização magistral de várias texturas de superfície e sua habilidade para infundir seus modelos com uma incrível sensação de vitalidade e sutileza psicológica. Em sua estreia, o , por exemplo, a composição de um homem com a mão apoiada nas costas de uma cadeira já tinha sido usada por Anthony van Dyck e Frans Hals. O que impressiona é a execução única dos pelos macios do manto e da barba, onde o pintor aplicou o seu truque de arranhar a tinta molhada, bem como os dramáticos contrastes de iluminação. Os retratos de Rembrandt foram um sucesso instantâneo. Logo, a demanda por seu trabalho se tornou tão grande que, depois de uma curta estadia em Haia, onde pintou, entre outras coisas, um retrato da esposa de Prince Frederik Hendrik, Amalia van Solms, ele se mudou para Amesterdã definitivamente, em 1632. Dois anos mais tarde, casou-se com Saskia, filha de parentes de seu sócio Hendrik Uylenburgh. No mesmo ano, tornou-se oficialmente um cidadão de Amsterdã e abriu um estúdio sozinho no ano seguinte.

Jeremias lamentando a destruição de Jerusalém, 1630.

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Ainda viva com pavões mortos, c. 1639.

PINTURA HISTÓRICA Depois de se estabelecer por conta própria, em 1635, Rembrandt reduziu drasticamente a produção de retratos comissionados e embarcou em uma série ambiciosa de grandes pinturas históricas. Elas combinaram a grande escala da (c. 1634) com a ação explosiva encontrada em cenas como . Talvez o trabalho mais 46 FLASHBACK

Em 1635, embarcou em uma série ambiciosa de grandes pinturas históricas.


As três irmãs, 1955. Cegando Sansão, 1636.

impressionante dessa série seja o terrivelmente violento (1636), que viria a ser a imagem holandesa mais brutal do século 17. Ao longo da década de 1630, o artista trabalhou em uma série de pinturas retratando a Paixão de Cristo para o príncipe Frederik Hendrik, que se tornaria a comissão mais importante do início de sua carreira. Perto do final da década de 1630, Rembrandt também pintou algumas paisagens e

uma natureza morta, uma imagem concebida em grande escala de uma jovem que medita sobre dois pavões mortos. APOGEU Como principal artista de Amsterdã, Rembrandt exigia uma casa e um estúdio que refletissem seu . No início de 1639, ele assinou o título de propriedade de uma mansão na


mesma rua onde havia sido aprendiz de Pieter Lastman, que mais tarde se tornaria o Museu Rembrandt, pagando o equivalente a 2,6 milhões de euros hoje. Nessa casa nasceu o primeiro filho do casal a sobreviver às primeiras semanas, Titus. Após a cerimônia de batismo, os convidados tiveram a chance de conhecer em primeira mão a tela que se tornaria a mais famosa do pintor, um retrato coletivo do capitão Frans Banninck Cocq e outros 17 guardas cívicos, que viria a ser conhecida como Rembrandt concebeu essa tela como um registro histórico. Em vez de fazer com que seus guardas simplesmente ficassem parados, colocou-os em movimento. A ação está implícita não apenas pela animação real das figuras, como o menino à esquerda correndo para acompanhar os guardas, mas também por meio de gestos, a direção dos olhares e o movimento das roupas e objetos. A atividade é acompanhada de sons, quando um mosquete é disparado bem atrás do capitão e uma figura bate um tambor à direita, fazendo latir o cachorro aos seus pés. O padrão irregular de luz e sombra na pintura aumenta a sensação de drama e dinamismo geral da cena. Suas enormes dimensões significavam que todas as figuras poderiam ser pintadas em tamanho maior que o real, algo inédito na época, mas também fizeram com que a tela tivesse que ser cortada em 1715, quando foi transferida para a Prefeitura. 48 REMBRANDT


A Guarda noturna, c. 1642–1655.


Abaixo: As três cruzes, 1653. À direita: Júpiter e Antíope, 1659.

50 FLASHBACK


Cerca de um mês antes da entrega da pintura, em 1642, Saskia morreu e a produção de Rembrandt despencou, concentrando-se na criação de algumas pinturas e gravuras. Sua água(que é forte de 1648, conhecida como devido ao seu preço salgado) é comparada com a , devido ao manuseio da luz típica da pintura, que vai desde a brilhante iluminação à esquerda até as passagens à escuridão à direita e no fundo. Esses anos foram marcados por dificuldades pessoais, resultado de seu casamento com uma criada e sua difícil separação, marcada pela humilhação pública da qual sua reputação não escapou ilesa. A partir de 1953, retomou a produção de

gravuras, criando novas tiragens a partir das pequenas mudanças nas placas mãe, detalhe que as tornaram objetos de desejo das classes abastadas. Também são dessa época alguns de seus retratos mais nobres, como os de e . No entanto, novas dificuldades pessoais – dessa vez, a recriminação pública da igreja por sua recusa em se casar com a amante grávida – reduziu ainda mais seu círculo de clientes e, consequentemente, sua posição financeira. Em um de seus últimos autorretratos, de 1661, Rembrandt apareceu aos 54 ou 55 anos como o apóstolo Paulo. Parece um velho frágil. Obviamente, as provações e percalços de suas 51


últimas décadas tiveram seu preço. Os anos restantes não foram menos tumultuados. Com suas finanças em decrepitude, sofreu um grande revés profissional e, pior, duas dolorosas perdas pessoais, de sua amante e de seu filho. Faleceu em 1969 e foi enterrado em uma cova alugada, sem lápide. Apesar das circunstâncias tristes de seus últimos anos, Rembrandt continuou a resistir a todas as tendências e permaneceu fiel à sua própria e incomparável busca de técnicas de pintura radicalmente inovadoras e à representação das mais profundas emoções humanas.

Autorretrato como o apóstolo Paulo, 1661.

Jonathan Bikker é curador de pesquisas no Rijksmuseum.

All The Rembrandt’s • Rijksmuseum • Amsterdan • 15/2 a 10/6/2019



CARLOS

VERGARA POR ELE MESMO

“O convite da Dasartes para escolher cinco trabalhos para um percurso longo como o meu, é uma tarefa difícil. Eu comecei cedo, ao mesmo tempo em que trabalhei na Petrobrás, entre 1959 e 1966, e trabalhava a convite de Iberê Camargo em seu ateliê, como seu assistente, por três anos. Minha vivência na Petrobrás me permitiu estar próximo à indústria e, nessa época, começou a indústria química nacional derivada do petróleo. Os acrílicos eram produzidos aqui e não são mais importados, e eu comecei a trabalhar com esses novos materiais que permitiam também novas linguagens, permitia-nos sair a pintura a óleo, da pintura tradicional. Minha geração queria uma pintura que ,a tivesse uma cara brasileira, nova, por isso fizemos a ,a , em 1967. Isso caminhava junto ao teatro, ao Cinema Novo, à vontade de produzir uma coisa com uma “pegada forte”. Assim, o primeiro trabalho que escolhi para este artigo é o , porque, já naquela época, era uma questão nossa, o massacre e a perseguição das etnias indígenas assim como se mostra uma questão tão presente na produção de artistas hoje. Esse trabalho foi feito sobre um molde em acrílico que seria usado para uma placa de posto de gasolina da TEXACO com a intenção de incorporar à pintura uma imagem do cotidiano, do que se via e se passava na rua. Então eu apaguei uma placa da TEXACO pela metade e pintei com tinta acrílica um autorretrato e o retrato de dois índios carajás.”


AUTORRETRATO COM ÍNDIOS CARAJÁS, 1968

REFLEXO 55


56 CARLOS VERGARA


PODER, 1972.

“A fotografia sempre esteve comigo, desde sempre fotografei e pintei. Ela era também um caderno de anotação ou base para produzir os trabalhos. Essa fotografia que eu escolhi para este artigo, chamada , registrei às margens do bloco Cacique de Ramos, na Central do Brasil. O Cacique de Ramos me interessou também pois trazia uma questão política nos anos 1970. Eu acompanhei muito de perto entre 1970 e 1976. Fiz uma exposição apresentando esse trabalho em 1972, que era para ser uma individual e eu transformei em uma coletiva e chamei amigos como Gerchman, Waltércio e Helio Oiticica, que era muito amigo e foi um grande incentivador dessa minha relação com a chamada arte popular. Na verdade, conversávamos sobre uma dimensão mais profunda do Carnaval, um grande ritual popular de passagem do tempo. mostra a situação em que nós vivíamos politicamente na época Essa foto do e o Cacique escolhia ser uma sociedade horizontal onde todos são caciques. Dos sete mil, eu sou um. Olhar para fora e olhar para dentro sempre foi uma característica da minha ação artística. Não sou um artista isolado do mundo. Essa possibilidade de trabalhar com o Cacique foi muito gratificante e me ensinou muito, aproximou-me da produção anônima, do desejo de discurso político que existe na população como um todo. Uma ação de discurso artístico popular.” CRISTIANO MASCARO 57


“Sempre estive pintando paralelamente ao trabalho com a fotografia. A pintura é um ritual íntimo e constante na minha vida. Mas, durante meu trabalho com o Carnaval, percebia uma coisa interessante: entre o público/plateia e os desfiles, a Prefeitura colocava grades metálicas losangulares, e eu fotografava através dessas grades. A grade se tornava um campo imantado entre esses dois olhares, de quem estava assistindo e de quem estava desfilando. E isso me deu a ideia de produzir pinturas que fossem grades losangulares onde a medição do espaço era feita por tensão de cor. Pinturas feitas com cores que tinha cores por trás. Cores que tivessem uma cor anterior que pudessem ser vistas ou pela transparência ou pelo gesto pictórico. Uma medição emocional feita com cor do espaço pictórico, sem discurso literário. A pintura é o personagem. Essa pintura é o maior painel que fiz dessa série que chamei de e durou até 1989, quando a interrompi decididamente.”


SÉRIE GRADES, 1982

A pintura é um ritual íntimo e constante na minha vida.

REFLEXO 59


CALOR, 1989

60 60 REFLEXO REFLEXO


“Quando interrompi a série , decidi reinventar minha pintura e, a partir da amizade com Frans Krajcberg, que me apresentou a região, fui para a área dos pigmentos naturais de Minas Gerais. E fui procurando não só os pigmentos naturais, mas as cores do Brasil. Encontrei, em uma fábrica de cerâmicas que calcinava o óxido de ferro para fazer o vermelhão, as bocas de forno cobertas de pigmento e usei a monotipia como forma de reinventar minha forma de pintar, desta vez quase sem gesto, deslocando a pele do mundo que já estava lá. Colocava cola na tela e registrava o pó de pigmento depositado nas coisas. E é interessante que a pintura brasileira foi inventada com Mestre Ataíde pintando as esculturas do Aleijadinho usando os mesmos pigmentos, no século 17, que, com toda a dificuldade de receber as tintas da Europa, foi descobrindo os mesmos pigmentos. Os têm a cor brasileira dos óxidos de ferro e isso também me interessou. E escolhi também para este artigo na Dasartes o trabalho , da série , de 1989.”


SÉRIE MANGUE. NATUREZA INVENTADA

“Trinta anos é muito tempo e quase nada. A partir dessa incursão para Minas, fiz diversas outras viagens e me tornei um artista viajante. E, de repente, volta agora o ferro de outra forma. Na pele do aço Corten, na matéria da carne da escultura. E das viagens veio a vontade de trabalhar com o que o Felipe Scovino . Escolhi esse painel que está no Rio de Janeiro chamou de e uma série de esculturas que tem essa carne e esse quê de natureza, mas é uma invenção sem nada descritivo e se mantém em pé por si mesmo por encaixe. Os mesmos encaixes que usei na década de 1960 e 1970. A gente inventa coisas, mas há coisas que vão permanecendo, pequenas conquistas que o trabalho nos dá e que vão reaparecendo. De certa, forma em cada trabalho, há toda a minha história. Produzir no espectador esse pequeno susto, essa surpresa, é, na verdade, o gol que quero fazer.”


Carlos Vergara • Bolsa de Arte • São Paulo • 30/3 a 18/5/2019 Natureza Inventada • Refêrencia Galeria • Brasília • 13/4 a 18/5/2019 Natureza Inventada • CCBB • Brasília • 14/4 a 28/6/2019


HENRI

MATISSE


Lorette com xícara de café, 1917. © Succession H. Matisse


EM COMEMORAÇÃO AOS 150 ANOS DE ANIVERSÁRIO DE NASCIMENTO DE MATISSE, O CENTRE POMPIDOU APRESENTA UM CONJUNTO DE OBRAS ICÔNICAS DO ARTISTA QUE REVOLUCIONOU A SOCIEDADE

POR AURÉLIE VERDIE

A carreira de Henri Matisse poder ser traçada graças a uma seleção de obras mestres que fazem dialogar a pintura, a escultura e o desenho. São seis sequências cronológicas que seguem a rota desse importante artista da modernidade, desde suas primeiras criações, em 1900, até seus últimos 66 DO MUNDO

trabalhos do início dos anos 1950, em uma evocação dos interiores de Vence e sua última obra para a Capilla del Rosario. Em , cerca de cinquenta obras são exibidas, com obras-primas como (1918), durante sua


primeira estadia em Nice, o (1935-1936), que mostra a simplificação radical dirigida pelo artista desde o início, ou um de seus primeiros papéis cortados, (1937). Este é primeiro evento que marca o 150º aniversário do nascimento do artista e nos apresenta Matisse como o “clássico” da arte moderna, cuja radicalidade surpreende até hoje. A FAVOR E CONTRA OS PROFESSORES. INÍCIOS E RUPTURAS (1900-1903) Após uma formação acadêmica que considerou excessivamente rígida, Matisse entrou na oficina de Gustave Moreau, onde ele forjou sua própria identidade. Durante seus anos de formação, ele continuava copiando os mestres do Louvre, mas a liberdade inculcada por Moreau reforçou seu temperamento teimoso e rebelde. Aprendeu o tratamento da cor e da luz acentuada de Turner e Van Gogh e, desde 1899, o trabalho de Cézanne o libertou de seus últimos gestos acadêmicos. Da mesma forma, desde 1899, a escultura também acompanhou sua evolução artística e alimentou sua pesquisa pictórica ao longo de sua vida. O , pintado durante o inverno de 1899-1900, segue a marca de Cézanne, decisiva para o jovem Matisse. Com o tema, o uso de pinceladas grossas e uma paleta ainda escura, mas com tons cromáticos arrojados, presta um tímido tributo ao mestre de Aix-en-Provence. Esse trabalho, que sugere contenção e paixão, assina a liberação visual do artista.

À esquerda: Autorretrato, 1900. À direita: Violinista na janela, 1918. Todas Fotos: © Succession H. Matisse © Centre Pompidou, MNAM-CCI Philippe Migeat/Dist. RMN-GP.


Madeleine II, 1903.

Desde seus inícios e, paralelamente à pintura, Matisse trabalhava o volume e foi formado por Antoine Bourdelle, na época assistente de Auguste Rodin. Com sua pose expressiva, mostra à perfeição que deteve o movimento no qual Matisse buscava o dinamismo da silhueta e a animação da superfície. Essa escultura, de tamanho modesto, exemplifica a recomendação que Matisse fez alguns anos mais tarde a seus alunos de que “quanto menor a escultura, mas prevalecerá a forma essencial”. “MEIOS MAIS SIMPLES”. O PERÍODO FAUVE E “PRIMITIVO” (1905-1909) Em 1904, Matisse abordou o divisionismo de Paul Signac, mas logo viu os limites desse método pictórico que impedia a comunicação entre desenho e cor. O


Nua no atelier, 1904-1905.

verão que passou, em 1905, em Collioure, foi decisivo em sua conquista de cor. Nesse mesmo ano, expôs seus trabalhos no Salão de Outono com Derain, Marquet e Manguin. Esse grupo de jovens pintores, conhecidos como “fauves” (do francês , feroz, selvagem), escandalizou com sua “orgia de cores puras”. Apesar das críticas severas da imprensa, Matisse foi ainda mais longe em seus experimentos pictóricos radicais. Durante o ponto de inflexão que os anos 1904-1906 supunham, ele se afastou da imitação da natureza para se concentrar na expressão de um sentimento. A descoberta da estatuária africana influenciou essa mudança e o levou a simplificar as linhas. A partir de 1907, Matisse explorou a noção do decorativo – primordial para a sua jornada artística –, enriquecido com o seu conhecimento do Oriente, suas viagens para a Argélia e Marrocos, e o artesanato desses lugares. HENRI MATISSE 69


Por meio dessa pesquisa, apagou a dualidade entre figura e fundo, demonstrando que todos os elementos da pintura devem participar de sua expressividade. A APOSTA PELA RADICALIDADE. RETRATOS E FIGURAS (1909-1917) Nos retratos pintados, esboçados ou esculpidos desse período, Matisse continuou sua busca por uma linha expressiva e confirmou a dimensão analítica de sua obra. O tema principal de Matisse, que é a espinha dorsal de toda a sua produção artística, continuava a ser a figura, seja ela individualizada ou simplificada para um “sinal plástico’. No final de 1916, Matisse reintroduziu o modelo em sua pintura e viu na colaboração com seus modelos “o foco de sua energia’. A partir de 1914, ele constantemente recorreu ao preto, que considerava uma cor absoluta. Essa cor intensa – a famosa “luz negra” – prevaleceu em alguns de seus retratos mais radicais. No inverno de 1917, o artista descobriu Nice e a luz do Mediterrâneo, uma autêntica revelação para esse norte. Desde então, ele vivia a cavalo entre Nice e Issy-les-Moulineaux, perto de Paris. Um novo ciclo começava no final da Primeira Guerra Mundial, em 1918, 70 DO MUNDO

uma espécie de trégua após mais de uma década de experimentação radical. , pintada em Sua obra 1909, é um marco importante no processo de purificação de mídia. Os retratos esculpidos (1910/1930 e 1911) representam a radicalização de seu processo artístico e a evolução em sua busca pela expressividade da forma. NICE, INTERIORES, FIGURAS (19171929) As viagens que fez, em 1909 à Argélia, e, em 1911 a Sevilha, Moscou e Tânger, permitiram a Matisse a profunda integração do problema do ornamental, resultante também de seu conhecimento da arte islâmica e dos ícones russos. Desde a sua estada em Nice, durante a primeira metade de 1918, a pintura de Matisse sofreu uma mudança profunda que envolvia a modelagem aproveitando a luz suave da oficina de Nice. Os temas da janela e do corpo feminino aparece incansavelmente em seu trabalho durante a década de 1920. Matisse transformava suas modelos em odaliscas orientais adornadas com as roupas coloridas que ele colecionava.


Mulher argelina, 1909.



Odalisca com calรงas vermelha, 1921.


Matisse conseguiu unir desenho e cor em um gesto rico em repercussões plásticas. Bailarino, 1937. © Succession H. Matisse © Centre Pompidou, MNAM-CCI/Philippe Migeat/Dist. RMN-GP.


MODERNIDADE. OS ANOS 1930 Encomendado no início dos anos 1930 pelo colecionador americano Alfred C. Barnes, o grande ofereceu a Matisse a painel intitulado oportunidade de trabalhar pela primeira vez a técnica de recortes de papel. Sua pesquisa para essa “pintura arquitetônica” se concentrou no equilíbrio da composição, na linha arabesca, na estilização extrema dos corpos e na relação entre as cores rosa e azul. Ele continuou com a pintura de cavalete, que retomou depois de 1935, em particular com sua modelo Lydia Delectorskaya. Matisse então fotografava os estados sucessivos de suas pinturas para analisá-las melhor e enriquecer sua reflexão plástica. Essa documentação também permitiu descobrir o longo e complexo processo de realização de suas telas e as batalhas que o levaram a simplificar os traços e a composição. Com , concebido como um estudo para , Matisse conseguiu unir desenho e cor em um gesto rico em repercussões plásticas. O PRÓPRIO QUARTO. VENCE, OS ÚLTIMOS INTERIORES Com o tema do , “próprio quarto”, Matisse conheceu seu momento de glória a partir da instalação do artista na Villa Le Rêve, em Vence, em 1943, onde viveu até 1948. Em 1941, sobreviveu a uma cirurgia de grande porte. Já com nova energia, trabalhou incansavelmente e experimentou várias técnicas, incluindo papéis recortados que lhe permitiram “desenhar diretamente na cor”. Entre 1946 e 1948,


começou sua última série de pinturas , onde chamada misturou naturezas-mortas, paisagens e interiores. As pinturas desse período são marcadas pela relação entre linha e cor, que criam um espaço totalmente unificado. Retornando a Nice, em 1949, ele mergulhou na realização de um grande projeto encomendado, a Capela do Rosário de Vence, que para ele seria “o fruto de uma vida inteira de trabalho”. Projetou então a decoração completa da capela seguindo sua invenção singular de papéis pintados de guache e recortados. Assim, com os reflexos de vitrais coloridos sobre os desenhos em preto e branco da cerâmica de parede, Matisse encontrou no final de sua vida o equilíbrio desejado entre o desenho e a cor. , Com Matisse renovou a ideia de saturação da cor como uma tradução plástica do espaço e mostrou seu trabalho dentro da obra. O fundo vermelho vibrante, recorrente no trabalho de Matisse, unificava uma composição complexa de simetria (todos os objetos são duplicados), contrastes (arabescos e linhas em oposição) e ecos de cores. Exibida no Museu Nacional de Arte Moderna no ano seguinte à sua execução, essa obra-prima permanece no museu de acordo com o desejo do próprio artista.

Aurélie Verdier é curadora e conservadora do Museu Nacional de Arte Moderna no Centre Pompidou.

À direita: Grande interior vermelho, 1948. Abaixo: Jeannette IV, 1911-1930.

Un país nuevo: Henri Matisse (1869-1954) • Centre Pompidou • Málaga • 6/3/2019 a 9/6/2019



LIVROS lançamentos

O Universo de Emanoel Araújo, Vida e Obra Textos: Claudio Leal, Odorico Tavares e Hugo Loetscher Capella Editorial • 320 pg • R$ 75,00 A rica produção de Emanoel Araujo reflete sua raiz africana, com ascendência nagô e iorubá, e o interesse nato do artista pela cultura popular baiana e as tradições modernistas brasileiras e europeias. A publicação eterniza o trabalho do artista, que convida à reflexão sobre a sociedade brasileira - ainda violenta, racista, desigual e injusta. O livro reúne textos, entrevistas e pensamentos de Araujo. Mostra a infância em Santo Amaro da Purificação (BA), as primeiras exposições, o sucesso internacional, a mudança para São Paulo, a exposição em Zurique, a perseguição dos anos de chumbo, a ajuda do governo norte-americano até a fundação do Museu Afro Brasil e a mostra no Masp, em 2018.

Pequenos acasos cotidianos: presentes e desastres da vida urbana

Juliana Russo Editora Ikrek • R$ 35,00 Em 2017, a artista Juliana Russo teve a ideia de sair de casa com uma câmera fotográfica, um caderno de desenho e uma caneta nanquim em mãos. Tudo que chamava sua atenção, ela anotava, fotografava e desenhava. Foram 10 km percorridos. Ao voltar para casa, escreveu um relato do dia e percebeu que se tratava de um roteiro de uma história gráfica. Assim, surgiu este projeto, contemplado pelo Rumos Itaú Cultural 2017-2018 e que se desdobra em uma exposição e um livro. Este trabalho, como descreve a cineasta e artista Mariana Lacerda no texto de apresentação, transmite a escuta das ruas, das pessoas, dos objetos descartados, árvores e matos que crescem, também na rua. 78


Daniel de Paula: Poema 100 exemplares numerados e assinados Ikrek Edições • 92 pg • R$ 240,00 O livro articula uma narrativa aberta, simultaneamente poética e crítica, ao compilar alfabeticamente fragmentos de uma série de índices analíticos provenientes de livros que correspondem a uma constelação de referencias dentro da produção de Daniel de Paula como artista e pesquisador. Para além do conjunto de escritos apropriados, que nos dão evidencias sutis para decodificar a prática do artista, o livro também defronta os índices como poemas de informação, incapazes de reivindicar neutralidade, logo apontando, tal como o gesto do dedo, para sistemas subjetivos de organização de linguagem, e por conseguinte, de compreensão de mundo.

Ivan Grilo: Não me lembro bem Livro de artista em colaboração com Ivan Grilo Familia Editions • Edição de 150, assinados e numerados

Uma interpretação editorial do trabalho de Grilo sobre a história esquecida do Brasil e sua relação com os tempos atuais. A gravura feita à mão em dois tipos de papel artesanal, feita de fibras naturais brasileiras, traduz em um livro sensorial a poética e a sutileza da narrativa de . Este livro foi inteiramente feito à mão no Brasil com materiais locais.


COLUNA DO MEIO Fotos: Briefcom

Quem e onde no meio da arte

Agrippina Manhattan, Simone Cadinelli e Anna Bella Geiger

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Passeata Simone Cadinelli Arte Contemporânea Rio de Janeiro Raul Leal e Patrizia D'Angello

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Ricardo Muniz e Juliana Braga

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Paulo Herkenhoff, Luciana Caravello e Marcelo Solá

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Miro PS, Denise Anne e Lia do Rio

Miro PS e Lia do Rio

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