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livro-reportagem - Alexandre Zarate Maciel
Escritores nordestinos: desafios do mercado de livro-reportagem
Por Alexandre Zarate Maciel | Coluna Prosa Real
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O universo do livro-reportagem não se finda quando o repórter-escritor conclui a sua obra, mas pelo contrário, neste momento é que surgem os maiores desafios: a publicação e, por consequência, a divulgação da obra, o lançamento, o sustento do escritor e a própria inserção no mercado editorial. Em mais uma coluna especial, divulgamos os resultados finais da pesquisa “Jornalistas escritores do Nordeste”, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Jornalismo de Fôlego, do curso de Jornalismo da UFMA de Imperatriz. Desta vez, o foco é o universo das editoras e as formas de divulgação, que contempla o espaço no qual os escritores de livros-reportagem nordestinos entrevistados argumentam sobre as suas angústias e dificuldades de encarar um mercado editorial brasileiro que sofre com um número baixo de vendas e com o fechamento de grandes e pequenas livrarias. Um dos escritores entrevistados, Bruno Araújo, do Rio Grande do Norte, e autor da biografia de um jogador de futebol, Moura, o príncipe negro, afirmou que tem a impressão de que mais livros estão sendo publicados, porém, alega não perceber as pessoas lendo. Por isso, acrescenta: “A gente se vê publicando para um nicho específico, e isso é ruim. Porque livro é caro. Eu acho que um dos grandes problemas do acesso à literatura é porque o livro é caro. A gente sabe que a maior parte da população não tem como pagar pelo básico.” Foi perceptível, de acordo com as entrevistas, que o mercado editorial nordestino funciona um pouco diferente do sul do país, onde estão concentradas as grandes editoras. Ao invés de ser uma publicação tradicional, em que todo o trato do livro (edição, correção, publicação e divulgação) fica a cargo das editoras, no Nordeste a autopublicação ganha força, como relata a jornalista e escritora pernambucana Jaqueline Fraga, autora do livro Negra Sou- a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho: “Custeei a edição do livro, mas depois que eu recebo a edição desses livros, aí são meus. Porque como a gente tá num processo comum em que a editora é grande responsável pela edição do livro, por todo processo, ela fica com boa parte do valor de venda dos livros também.” Ou seja, além do autor pagar por todo o serviço, por vezes, a editora ainda fica com alguma porcentagem das vendas.
“Se você passa pelo crivo, a editora publica o seu livro”
O jornalista e escritor alagoano Jorge Oliveira, autor de Curral da Morte (2010), explica melhor como se dá a relação com as editoras. “O escritor submete o tema à editora e elas têm um conselho editorial. Ou seja, todos passam a ler o livro para ver se é viável no quesito econômico, se é uma boa história e se ela é bem contada. Se você passa por esse crivo, a editora publica o seu livro.” Sergio Maggio, jornalista e escritor baiano, foi um dos poucos entrevistados que contou com um apoio total de sua editora, sendo que o seu livro, Conversas de Cafetinas (2009), recebeu o prêmio Jabuti. “A divulgação ficou toda em cima da editora. A editora tem toda uma estrutura de divulgação, você realmente não entra nesse lugar nem na divulgação e nem dos lançamentos. Eu lancei em diversas capitais, tudo planejado, divulgado pela editora.” Para ele, esse foi um dos motivos para o grande sucesso da obra. Já o jornalista escritor maranhense Elbio Carvalho, autor de Centro de Lançamento de Alcântara-Tecnologia Der-
retida, apontou um dos contrapontos mais comuns nas publicações: “A maioria dos autores do Maranhão são publicações independentes, porque nós não temos um Paulo Coelho no Maranhão. Não é menosprezando os escritores maranhenses. É que eixo mais forte é o Rio/São Paulo e lá é que estão as editoras. O mercado, de fato, funciona lá.”
“Sabemos que aqui no Brasil é muito complicado patrocínio para a questão cultural”
Persiste uma certa resistência com autores que ainda não são conhecidos. Um reflexo disso é a quantidade imensa de literatura estrangeira preenchendo as estantes nas livrarias, fato que limita as oportunidades, como relata a jornalista e escritora cearense Maggie Paiva, autora de Perpétua: “Sendo uma escritora desconhecida, não tem muitas editoras no Brasil dispostas a publicar um autor desconhecido, muito menos livro-reportagem.” Outro aspecto a ser observado é que nenhum dos autores entrevistados afirma que consegue se sustentar financeiramente apenas com o livro-reportagem, sempre mantendo a produção dessas obras como prática secundária. Alguns dos livros foram produtos experimentais para a concluir a graduação, ou nasceram a partir da prática jornalística, porém, todos os entrevistados afirmam que não vivem exclusivamente da rentabilidade de suas obras. O autor baiano Joaldo Cavalcante, que escreveu 17 de julho - a gameleira, as lembranças e a história decidida à bala, assevera que nenhuma de suas publicações foi o suficiente para seu sustento financeiro, comprovando, assim, a dificuldade do repórter-escritor de se manter no mercado editorial, publicando ainda mais livros, visto que a produção, além de demorada, é cara. A realidade, é claro, muda no caso de cada escritor. Nelson Melo, do Maranhão, custeou toda a produção dos seus dois livros, Guerra urbana – O homem vida loka e Guerra Urbana - Morrendo pela vida loka e assevera: “Sabemos que aqui no Brasil é muito complicado patrocínio para a questão cultural”. Por conta dessas dificuldades financeiras, a única forma viável é tentar se destacar no mercado, seja com o texto ou com o projeto gráfico. A escritora da biografia do cantor e compositor João do Vale, Andrea Oliveira, também do Maranhão, vê a crise como algo inevitável, que vem se estendendo desde 2018. Porém ela acredita, de forma otimista, que “sempre vai ter leitor para boas histórias. [...] O livro é um produto, não dá pra gente sair disso, então, não é só você ter um bom texto, uma boa história, você precisa de uma capa, não é qualquer capa.”
ARAÚJO, Bruno. João Marcos dos Santos Silva. João Lisboa: entrevista via Google Meet. [08/07/2020] 1 arquivo. Mp3 (45min)
CARVALHO, Elbio. Entrevistador: João Marcos dos Santos Silva.João Lisboa: entrevista via WhatsApp Video Chamada. [19/05/2020] 1 arquivo. Mp3 (1h29min)
CAVALCANTE, Joaldo. Entrevistador: Ana Carolina Campos Sales. Imperatriz: entrevista por e-mail [10/09/2019]. 1 arquivo .doc.
FRAGA, Jaqueline. Entrevistador: Viviane Reis Silva. Imperatriz: entrevista por WhatsApp. [08/02/2020]. 1 arquivo .doc.
MAGGIO, Sérgio. Entrevistador: Viviane Reis Silva. Imperatriz: entrevista por WhatsApp Áudio. [08/02/2020]. 1 arquivo .mp3. (12min57s).
MELO, Nelson. Entrevistador: João Marcos dos Santos Silva. João Lisboa: entrevista por Whatsapp chamada de vídeo [25/02/2019]. 1 arquivo .mp3 (40min).
OLIVEIRA, Andrea. Entrevistador: João Marcos dos Santos Silva. João Lisboa: entrevista presencial [11/10/2019]. 1 arquivo. Mp3 (53min53s).
OLIVEIRA, Jorge. Entrevistador: Ana Carolina Campos Sales Imperatriz: entrevista por WhatsApp Chamada de Áudio. [29/04/2020]. 1 arquivo .mp3. (59min)
PAIVA, Maggie. Entrevistador: Yanna Duarte Arrais. Imperatriz: entrevista por Google Meet.
Em parceria com: Ana Carolina Campos dos Santos, Gislei Nayra Soares Moura, João Marcos dos Santos Silva, Viviane Reis Silva, Yanna Duarte Arrais.
Elaborada pelo professor do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – campus de Imperatriz e doutor em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Alexandre Zarate Maciel, a coluna Prosa Real traz, todos os meses, uma perspectiva dos estudos acadêmicos sobre a área do livro-reportagem e também um olhar sobre o mercado editorial para esse tipo de produto, seus principais autores, títulos e a visão do leitor.