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Redes e jornalismo: a colaboração em foco

Por Ana Célia de Sá | Coluna Comunicação na Web

A atuação em rede é uma constante no jornalismo e ganhou peso ainda maior na internet devido à natureza multidirecional, multicanal e participativa do ambiente conectado. A remodelação espaço-temporal do ciberespaço, traduzida na quebra de barreiras físicas e na adoção da temporalidade social, também estimula a formação de redes colaborativas entre jornalistas e público em escala global, renovando rotinas, produtos e formas de difusão de conteúdo, em sintonia com a dinâmica fluida da sociedade contemporânea.

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Para Heinrich (2011), o jornalismo em rede abrange justamente esse contexto digital. Nessa concepção, segundo a autora, produtores e distribuidores de conteúdo – jornalistas ou não – representam nós numa rede de informação. Esses nós se conectam por interatividade, constituindo o jornalismo em rede, o qual estimula a colaboração entre os participantes e, principalmente, modifica a estrutura organizacional do jornalismo e seus modos de produção em todas as plataformas jornalísticas que operam na sociedade em rede.

As organizações jornalísticas, conforme indica Heinrich (2012), tornam-se uma voz em meio a várias outras presentes na internet, a exemplo de blogueiros, influenciadores digitais e jornalistas cidadãos (comunicadores não profissionais). Apesar de ainda congregar audiências volumosas e possuir credibilidade social, a grande mídia centralizadora começa a dividir espaço com pessoas comuns ou que estão fora do circuito empresarial, mas com potencial agregador, desfazendo o monopólio da informação principalmente em plataformas de redes sociais.

Os fluxos informativos deixam de ser controlados exclusivamente pelo jornalismo e passam a envolver a audiência de maneira cooperativa nas diversas etapas produtivas na internet. Esse cenário relaciona-se ao posicionamento mais ativo do usuário, à busca por personalização, à criação de canais alternativos de circulação, ao acesso a tecnologias produtivas (hardwares e softwares), entre outras questões humanas e técnicas.

Recai-se na conceituação da cultura participativa, em que produtores e consumidores de mídia

interagem e interferem nos conteúdos de diferentes formas e em diferentes níveis, levando em conta aspectos políticos, culturais, econômicos e técnicos. Formata-se um ambiente de “mídia propagável”, com circulação de conteúdos por canais múltiplos e incentivo ao engajamento do público na produção e na difusão dos produtos (JENKINS; GREEN; FORD, 2014).

Como lembra Heinrich (2012), a internet não criou as redes no jornalismo, uma vez que a atividade profissional sempre agregou conexões ao seu trabalho, com destaque para as fontes de informação. Porém, sem dúvida, a internet remodelou e reforçou essa estruturação em rede, pois aproximou o público da rotina produtiva em si, em sintonia com a própria lógica relacional do ciberespaço, que aposta na interatividade e na participação mesmo que existam limitações demarcadas por relações de poder e pelo uso de algoritmos.

Para acompanhar o cenário de comunicação atual e manter o seu estatuto social, o jornalismo precisa adaptar suas rotinas e propor inovações capazes de aliar os princípios profissionais (especialmente a qualidade da notícia, a confiabilidade e a defesa de princípios democráticos) às demandas do público (associadas à horizontalidade, à colaboração, à personalização e à transparência).

“Organizações jornalísticas que entendem a necessidade de se reorganizarem nesta esfera dinâmica e flexível do jornalismo em rede, que sistematicamente aprimoram suas redes e formam vínculos contínuos com nós – grandes e pequenos – podem não apenas ter um futuro, mas também desfrutar de um futuro muito brilhante” (“Journalistic organisations that understand the need to reorganise themselves within this dynamic, flexible sphere of network journalism, who systematically enhance their networks and form continuous links with nodes – large and small – might not just have a future, but may well enjoy a very bright one”) (HEINRICH, 2012, p. 66).

Em uma conjuntura de crescente desinformação e pós-verdade, destacadamente nas plataformas de redes sociais e nos aplicativos de mensagens, revigorar o compromisso social do jornalismo com foco no bem coletivo torna-se essencial não apenas para a sobrevivência da atividade profissional, mas principalmente para a constituição de uma sociedade ética, diversa e justa. Para isso, o jornalismo deve desenvolver um trabalho sólido, incluindo apuração precisa, busca por fatos de interesse coletivo, diversidade de fontes, interpretações conscientes e atualização técnica. Junto a isso, a atividade precisa levar em consideração as demandas e contribuições do público, como ampliação informativa, sugestões de pauta, produção de materiais, apoio na difusão de conteúdos digitais, entre outras.

Referências

HEINRICH, Ansgard. Network Journalism: journalistic practice in interactive spheres. New York: Routledge, 2011.

_________________. What is ‘Network Journalism’? Media International Australia (MIA), v. 144, n. 1, p. 60-67, 2012. Disponível em: <https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/1329878X1214400110>. Acesso em: 17 out. 2019.

JENKINS, Henry; GREEN, Joshua; FORD, Sam. Cultura da Conexão: criando valor e significado por meio da mídia propagável. Tradução de Patricia Arnaud. São Paulo: Aleph, 2014.

Ana Célia de Sá é jornalista e doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGCOM-UFPE).

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