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Iraci Marin
Iraci Marin Caxias do Sul/RS
Ambígua
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Não foi por amor, mas por necessidade, que ela fugiu de sua cama.
Vivia sentindo o fracasso e a frustração do sexo e não via alternativa para satisfazer o seu desejo. Ou a sua necessidade. Muitas vezes criou fantasias, mas sempre tudo acabava na amarga realidade da falta.
Com diabetes agressiva, há algum tempo a energia do marido murchara. Ela tinha ainda um forte motivo pra se afastar dele, inclusive durante o dia: carregava quase sempre o odor fedido de fumo. Dormir ao lado dele muitas vezes era um sacrifício.
A solução foi dormir em outro quarto. Pelo menos conseguiria dormir. Sim, e podia ficar nua, ver seus seios no espelho, seu ventre liso e branco, suas coxas, e se acariciar sem medo ou pudor.
Mas isto não era suficiente. Ela precisava dar-se uma resposta, apaziguar de verdade o seu corpo.
Um dia, inventou de escrever seu nome numa calcinha rosa, cheia de pequenas flores rosadas. Era a sua preferida: bonita, macia, e guardava bem o seu cheiro. Não tinha qualquer intenção com aquilo, apenas um capricho. Talvez servisse pra espantar sombras internas que cresciam dentro dela, sem foças para impedir.
Ele a viu bordando. Chegou devagar, sem que ela percebesse, e perguntou: - Pra que isto aí? - É coisa minha, passatempo.
Ele deu uma risada forçada e saiu, deixando a varanda impregnada do cheiro azedo de fumo.
Traçou seu nome com linha vermelha na parte da frente da calcinha. Terminou o trabalho, levantou-a para ver como tinha ficado e sorriu. Era certamente a única peça íntima personalizada da terra.
Colocou-a após o banho e se sentiu como se fosse a primeira vez que a usava e parecia que a sua vida estava completa. Era apenas impressão momentânea. Vivia a mesma vida vazia de muitos anos.
Mas um caso trouxe ingrediente novo para a sua vida. Estava caminhando distraidamente por uma rua bem movimentada, quando esbarrou em alguém. Parou em seguida, voltou-se para pedir desculpas, ele fez o mesmo, e seus olhares se abriram em
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cumplicidade. Foram a um bar, depois para uma cama.
Foi uma tarde de prazer despertado, com uma constelação de estrelas brilhando por trás dos seus olhos fechados, com a harmonia do mundo em plena sinfonia no seu corpo todo, com a paz de todos os mosteiros em seu peito.
Mais de uma vez sentiu o enlevo apaziguador, um corpo cheiroso combinando com o seu, uma lassidão extraordinária dominando-a por inteiro.
Sua entrega foi total e não poderia ter sido diferente. Então sentiu o alívio do corpo e pensava que sentiria a agonia da alma. Mas não. Nenhuma agonia, nenhuma sombra.
Ele viu a calcinha bordada com seu nome e a quis. Ficaria nua por baixo, com o sexo úmido, intumescido e sem proteção. Mas não quis resistir e ele levou a peça.
Os dias seguintes foram de pensamentos cheios das sensações daquele encontro com o desconhecido. Não havia remorso, nem amargura ou temor. Tinha sido bom, tinha valido a pena, e isto bastava.
Estava vivendo dias de leveza, com o corpo apaziguado.
Algum tempo depois, ao chegar da rua encontrou um envelope pardo sobre a mesa da varanda. Veio em seu nome. O marido se levantou da cadeira e perguntou: - Conhece o remetente? - Não. Ele tomou o envelope de suas mãos, abriu-o e ficou surpreso com a encomenda: era uma calcinha rosa com o nome dela bordado em vermelho. Olhou-a, entre curioso e indignado; ela olhou pra uma borboleta que voava por ali. - Agora explica. - Eu não sei de nada. - Como não? É a tua calcinha... Como é que este cara estava com ela?
- Não sei.
Tirou-a de suas mãos, virou as costas e trancou-se no quarto. Não sentia medo, só estava confusa. Mas precisava vencer a confusão. Precisava de um leme, um lume.Precisava atender aos chamamentos do seu corpo, apaziguá-lo.
Foi até a janela e olhou a rua deserta. No declínio da tarde, um calor fez-se dentro dela: abriu a porta do quarto e chamou o marido.