ANO XXIII - Setembro 2016 - Nº 93 Escudo de Torá Varsóvia, Polônia, meados do séc. 18 Répoussé em prata, fundido e perfurado, parcialmente dourado
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Carta ao leitor O período que se inicia em Rosh Hashaná e se encerra no término de Yom Kipur é chamado de Yamim Noraim – os Dias Temíveis – pois essa é a época do ano em que D’us julga o destino de todo indivíduo para o ano que se inicia. Estas duas festividades máximas do ano judaico são os dias em que o D’us julga todas as pessoas e é natural temer o veredicto. Contudo, o Talmud ensina que, em Rosh Hashaná, o Povo Judeu se comporta de maneira atípica. Quando uma pessoa é levada a julgamento, ela sente ansiedade e medo e, assim, dá pouca atenção à aparência física. Mas em Rosh Hashaná nós, judeus, nos vestimos bem, comemos e bebemos e nos alegramos. O motivo disso, explica o Talmud, é termos confiança de que D’us nos beneficiará com Seu perdão e despejará sobre nós bênçãos extraordinárias. Rosh Hashaná é, portanto, um dia de celebração. Por um lado, os Yamim Noraim são os dias mais temíveis do ano, por outro, é a época em que a Shechiná, a Presença de D’us, se manifesta com mais intensidade no mundo. Assim, constituem as datas mais auspiciosas para o crescimento espiritual. São também os dias em que nossas orações e súplicas são mais bem recebidas nos Céus. Como ensinou o profeta Isaías, deve-se procurar D’us quando Ele pode ser encontrado e invocá-lo quando está próximo. Evidentemente, D’us se encontra sempre em todo lugar, mas nestas datas torna-se mais fácil encontráLo. Assim, em Rosh Hashaná e Yom Kipur, nós, judeus, rezamos para sermos inscritos e selados no livro da Vida. Yom Kipur – o ápice dos Dias Temíveis – aparenta ser uma data triste. É um dia de orações e confissão de pecados. No entanto, ensinam nossos Sábios que Yom Kipur é a data mais feliz do calendário judaico, pois é o dia do perdão e expiação para o Povo Judeu. Podemos nos arrepender de nossos erros, de nossas transgressões e obter o perdão Divino, a qualquer hora, em qualquer dia. Mas Yom Kipur é o dia mais auspicioso para que isso ocorra. É a data para perdoar e ser perdoado, tanto por pecados cometidos contra D’us como por falhas cometidas contra outras pessoas. A Cabalá enfatiza a grande importância de o homem estar sempre alegre. Os místicos ensinam que a alegria
quebra todas as barreiras e limitações e pode até gerar milagres, pois quando uma pessoa está verdadeiramente feliz, atrai grandes bênçãos dos Céus. Isso vale especialmente para os Yamim Noraim. É inegável que são dias de extrema importância, em que todos os seres são julgados e todos nossos atos são escrutinizados pelo Tribunal Celestial. Portanto, são dias que exigem que cada um de nós faça uma contabilidade espiritual e um autojulgamento. Mas são também uma época de imensa alegria e luz espiritual. Os Cabalistas ensinam que se nos comportarmos com júbilo e confiança em Rosh Hashaná e Yom Kipur – se depositarmos nossa confiança em D’us, tendo certeza de que Ele nos perdoará e nos abençoará com um ano maravilhoso, Ele honrará nossa confiança. Se emanarmos alegria, paz interior e confiança em D’us, Ele certamente nos retribuirá em igual medida. Esse deve ser nosso estado de espírito em Rosh Hashaná e em Yom Kipur, mesmo que o ano que se encerrou tenha sido de desafios e tribulações. Em julho deste ano faleceu Elie Wiesel, sobrevivente do Holocausto, vencedor do Prêmio Nobel e grande escritor. Minha família perdeu um amigo muito querido, Israel perdeu um devotado defensor e a humanidade perdeu um grande homem que lutou contra a indiferença e as perseguições ao redor do globo. Elie Wiesel escreveu sobre a esperança: “O mais extraordinário nas vítimas do Holocausto foi a sua capacidade de manter a esperança naquelas horas tão amargas. O otimismo e a esperança de um final feliz, sem dúvida, foi o que manteve a vontade de sobreviver nos judeus, e eles demonstravam essa esperança através de seu culto, sua confiança na família e em seu desejo de vencer…”. Neste Rosh Hashaná e Yom Kipur, que possamos atrair, por meio de sentimentos positivos, para nós mesmos e para nossa família, para os judeus da Diáspora, de Israel, e para o povo do Brasil, um Shaná Tová Umetuká – um ano bom e doce.
ÍNDICE
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28
31
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54
61
03 carta ao leitor
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israel
Meu irmão Jonathan por zevi ghivelder
06 NOSSAS grandes festas
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Tefilá, Tzedacá e Teshuvá
ATUALIDADE
Relações entre Israel e Egito,
14 Algumas Leis relacionadas com Yom Kipur
do tatame à diplomacia por JAIME SPITZCOVSKY
15
31
nossas leis
Uma introdução
brasil
Vamos continuar escrevendo
às leis da Cashrut
a nossa história...
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06
34 34
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PERSONALIDADE
a consciência da humanidade
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arte
Romance gráfico em quadrinhos
Elie Wiesel,
54 A arte de Issachar Ber Ryback
educação
Viagens acadêmicas da
61
46
68 Os réus 74 cartas
shoá
O Julgamento de Nuremberg
Escola Beit Yaacov fortalecem a identidade judaica ISRAEL
Explosão de cores em Israel
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nossas grandes festas
Tefilá, Tzedacá e Teshuvá
Rabi Lazar dizia: “Três coisas anulam um decreto severo: Tefilá (Oração), Tzedacá (Caridade) e Teshuvá (Arrependimento)” (Talmud Yerushalmi, Taanit 9b).
U
m dos temas principais dos Asseret Yemei Teshuvá, os Dez Dias de Arrependimento, que se iniciam em Rosh Hashaná e terminam na conclusão do Yom Kipur – são as três coisas que têm o poder de anular um decreto Celestial severo. E elas são: a Tefilá, oração, a Tzedacá, caridade, e a Teshuvá, arrependimento. O Talmud Yerushalmi (Taanit 9b), ensina que a origem desse ensinamento é uma passagem do Livro de Crônicas (2 Crônicas, 7:14), que reconta a resposta de D’us às orações do Rei Salomão quando ele inaugurou o Tempo Sagrado de Jerusalém. O rei pedira a D’us que fossem aceitas as súplicas em prol do Templo Sagrado. D’us respondeu que se Ele viesse a decretar uma escassez de alimentos, uma peste ou uma praga contra a Terra, Ele atenderia as súplicas do povo e aliviaria o decreto, com a estipulação mencionada no versículo: “E (se) Meu povo, sobre o qual Meu Nome é proclamado, humilhar-se, e orar, e buscar a Minha face, e se eles se arrependerem de seus maus caminhos, Eu os atenderei dos Céus, e perdoarei seus pecados e curarei sua terra”.
de elementos desse versículo. Quando o versículo diz “e orar”, obviamente se refere à oração. Quando diz “buscar a Minha face”, refere-se à caridade, pois está escrito no Livro de Salmos (em 17:15): “Quanto a mim, por minha justiça, contemplarei Tua face…”, que é interpretado como: “pelo mérito de minha justiça (Tzedek) – por meio da caridade (Tzedacá) que eu realizo – terei o mérito de contemplar a Tua face”. E quando o versículo diz: “eles se arrependerem de seus maus caminhos”, isso claramente se refere ao arrependimento. E conclui o Talmud Yerushalmi: “O que lá está escrito, na continuação daquele versículo: ‘Eu os atenderei dos Céus, e perdoarei seus pecados e curarei sua terra’”. Essa passagem do Talmud de Jerusalém – que ensina que a oração, a caridade e o arrependimento podem anular um decreto Celestial hostil – suscita muitas perguntas que constituem o cerne do Judaísmo. Por exemplo, como pode a oração influenciar as decisões Divinas? Ou, qual o significado do conceito de que por meio da caridade, da Tzedacá, pode-se “contemplar a Face de D’us” – obviamente um conceito antropomórfico, uma vez que os conceitos físicos não se aplicam ao Todo Poderoso? E ainda outra questão fundamental: Qual o significado da Teshuvá?
O Talmud Yerushalmi demonstra de que forma a oração, a caridade e o arrependimento se originam 6
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O propósito da oração Tefilá, oração, é um elemento essencial em todas as religiões. A oração e a religião são interligadas. Não existe relacionamento se não há comunicação e a oração é nossa forma de nos comunicarmos com D’us. Qualquer um pode orar, em qualquer idioma, e da forma que melhor lhe aprouver. Mesmo as crianças pequenas oram. É bem possível que a oração seja instintiva e não apenas algo que tenhamos que aprender. Como a oração é um fenômeno tão comum, muitas pessoas a aceitam como coisa natural, mas na verdade não é tão simples assim. O próprio conceito da oração levanta muitas questões teológicas e filosóficas. Por exemplo, se as decisões Divinas são decretadas por Sua Divina Sabedoria e, assim, simbolizam a bondade,
a verdade e a justiça, por que a oração levaria D’us a mudar de opinião? Outra pergunta: se uma pessoa é um ser humano íntegro e merecedor, por que D’us não haveria de favorecê-la mesmo se ela não orasse? Por outro lado, se a pessoa não faz jus àquilo que pede em suas orações, por que a oração deveria ajudá-la? Uma pergunta ainda mais fundamental: Por que devemos orar, afinal? D’us Infinito, que é Onisciente, certamente está ciente de nossos desejos e necessidades mesmo que nós não os pronunciemos. Não há nada que possamos dizer-Lhe que Ele ainda não saiba. D’us sabe, melhor ainda do que nós, aquilo que desejamos, aquilo que nos falta e de que carecemos. Ele certamente está ciente do que está em nosso coração e do que se passa em nossa mente. Conhece nossas ambições e anseios, nossas preocupações, problemas e 7
aflições. Nada do que sabemos e sentimos é desconhecido por D’us. Conhece-nos melhor do que nós nos conhecemos. O conceito de que por meio da oração podemos mudar a mente de D’us é especialmente desconcertante. Quando oramos e pedimos que D’us aja de determinada maneira, estamos indicando saber melhor do que Ele como deveria agir? Se Lhe pedimos que anule um decreto, estaríamos dizendo que Ele tomou uma decisão errada e deveria reconsiderá-la? Ao que tudo indica, o conceito de oração parece ser um ato que contradiz a noção de que D’us é onisciente e perfeito. E, mesmo assim, além de termos permissão de orar, somos mesmo instruídos a fazê-lo. Segundo vários SETEMBRO 2016
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que a pessoa sinta ter tudo o que precisa e deseja, sempre deve orar a D’us pedindo pelo futuro. É claro que quando oramos, estamos rogando a D’us para que realize nossas necessidades e desejos e geralmente Lhe pedimos que mude Seu decreto. Por que D’us não apenas permite, mas nos ordena fazer algo que parece ser pretensioso e mesmo um pouco ofensivo a Ele? Por que Ele espera que nós Lhe digamos aquilo que Ele já sabe e Lhe peçamos para que reverta ou anule Suas próprias decisões? Há várias respostas a essas perguntas. Uma discussão rica e profunda sobre a oração está muita além do escopo deste artigo. Mas tentaremos discutir brevemente algumas respostas que o Judaísmo dá ao tema.
quando a pessoa reza, especialmente quando o faz com intensidade e sinceridade, está intensificando sua fé e confiança em D’us
legisladores da Torá, a oração é um mandamento bíblico. Na verdade, temos o mandamento de servir a D’us diariamente, como determina a Torá: “... E servireis ao Eterno, vosso D’us, e Ele abençoará o teu pão e a tua água...” (Êxodo, 23:25). Apesar de podermos servir a D’us de várias formas, a principal delas é por meio da oração, quando podemos comungar com D’us com nossos pensamentos, emoções e pronunciamentos. A oração pode ter várias formas, desde que forneça uma forte comunhão entre a pessoa e D’us. Pode consistir de uma louvação a D’us, de um pedido a Ele para que realize nossas necessidades e desejos ou de um agradecimento por benesses recebidas. Mesmo 8
Nossos Sábios ensinam que D’us geralmente deposita bênçãos sobre uma pessoa na medida em que essa pessoa seja um digno receptáculo das mesmas. Se a pessoa não o é, pode “perder” uma bênção que lhe estava destinada, simplesmente porque deixou de se alinhar com aquela bênção ao não se tornar digno da mesma. Isso pode ser comparado a um agricultor que estava destinado a ter um ano próspero em suas terras, mas que deixou de semeálas e, portanto, não colheu nada. Assim, os problemas ou carências de uma pessoa podem refletir um estado espiritual inadequado, e não necessariamente o plano Divino para ela. Da mesma forma, quando a pessoa muda sua realidade espiritual, ela pode mudar as circunstâncias de sua vida. Essa mudança não ocorre porque ela mudou a ideia de D’us, mas porque, ao elevar seu estado espiritual, ela se tornou digna do bem que D’us lhe havia reservado, a priori.
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Uma das maneiras mais potentes e eficazes de se elevar o estado de espírito é por meio da oração. De fato, esse é um dos principais propósitos da oração. Quando a pessoa reza, especialmente quando o faz com intensidade e sinceridade, está intensificando sua fé e confiança em D’us, pois, ao orar, está reconhecendo a Infinita capacidade Divina, nossa dependência d’Ele e Seu controle sobre tudo. O ato de orar aumenta a conscientização que essa pessoa tem de D’us e de Sua Providência, tornando-a, assim, digna da bondade que D’us lhe quer dedicar. A oração também deve levar a pessoa a se curvar perante D’us. A humildade e o sentimento de que estamos totalmente dependentes de D’us nos leva mais perto d’Ele – tornando aquele que ora mais apto a receber as bênçãos Divinas. Isso explica melhor o porquê de D’us “desejar” as orações dos justos: um justo pode ser digno de uma bênção, de qualquer modo, mas, ainda assim, D’us deseja elevá-lo, ainda mais, motivando-o a orar e, assim, crescer espiritualmente. A oração tem a capacidade de levar a pessoa aos mais altos níveis de perfeição espiritual.
e Yaacov – bem como todos os grandes homens e mulheres de Israel se ligavam a D’us. De fato, vemos na Torá que Moshé, o maior dos profetas, regularmente orava a D’us. É importante observarmos que a oração tem o poder de efetuar uma mudança porque ela revela a dedicação da pessoa a D’us também de outras maneiras. Por exemplo, quando alguém se empenha em ir à sinagoga e se une aos demais, ela está santificando o Nome de D’us de forma pública e disseminando sua fé em D’us. Assim sendo, a oração não é uma questão de “informar” D’us acerca de nossas solicitações. É uma forma muitíssimo poderosa de dedicação, de crescimento espiritual e de união com D’us. Isso é o que a torna uma das funções mais fundamentais do homem na vida, e um meio dos
mais poderosos de se alcançar um favorecimento Divino. Como o propósito da oração é rogar a D’us que introduza mudanças no mundo físico, a oração serve para aperfeiçoar Seu relacionamento com o mundo e, assim, unificar os planos espiritual e material. Esse é o significado do ensinamento cabalístico de que a oração deve se elevar e penetrar todos os mundos espirituais, de modo a fazer com que a bondade Divina flua para baixo, unificandoos e nutrindo-os. Por essa razão, a oração é tão importante perante D’us. O Talmud Bavli ensina que a oração é uma daquelas coisas que se colocam nos reinos espirituais mais elevados, no entanto muitas pessoas a consideram de forma leviana. Se elas soubessem quão poderosa pode ser a oração, certamente orariam com mais frequência e muito mais concentração. Resumindo o que vimos acima, a oração anula os decretos Celestiais hostis porque orando nos aproximamos de D’us e, assim, removemos todas as barreiras que podem nos ter impedido de receber as benesses que emanam d’Ele. A oração não muda a Sua opinião. Mas muda nosso estado espiritual, tornando-nos, assim, mais aptos a receber as bênçãos Divinas. Voltando à analogia mencionada acima, D’us pode decretar que um determinado agricultor tenha uma boa safra, mas é necessário semear adequadamente para que a colheita seja boa. Da mesma forma, o esforço que uma pessoa despende na oração é, em geral, um prérequisito para a concretização de todas as benesses que D’us decretou para ela.
Isso também explica por que devemos orar ainda que D’us conheça nossos desejos e pedidos mais do que nós mesmos. Na oração, devemos nos concentrar e nos entregar por completo, chegando, assim, muito mais perto de D’us, pois voltamos toda a nossa atenção a Ele, conectandonos com Ele ao expressar nossas necessidades. Isso nos torna merecedores da benesse que D’us reservou para nós. Por essa razão, a oração era a forma como os patriarcas - Avraham, Itzhak 9
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O poder da caridade “E (se) Meu povo, sobre o qual Meu Nome é proclamado, humilhar-se, e orar, e buscar a Minha face, e se eles se arrependerem de seus maus caminhos, Eu os atenderei dos Céus, e perdoarei seus pecados e curarei sua terra” (2 Crônicas, 7:14). O Talmud Yerushalmi cita esse versículo e ensina que ao realizarmos atos de Tzedacá, “contemplamos a face” de D’us, e que essa é uma das formas de anular um decreto Celestial hostil. D’us obviamente não tem face; trata-se puramente de uma expressão antropomórfica, na qual os atributos humanos são atribuídos a D’us para que o homem possa ter alguma compreensão do Divino. Nossos Sábios ensinam que a “face” de D’us se refere ao Seu Atributo de Misericórdia, pois denota estima e bondade demonstradas à pessoa sobre a qual D’us irradia Seu Semblante, como vemos nos versículos da Bênção Sacerdotal (Números, 6:25), “Faça o Eterno resplandecer o Seu rosto sobre ti e te agracie”.
(Bava Batra 10a) ensina que Rabi Eliezer, baseando-se nesse versículo, tinha o costume de dar Tzedacá antes de rezar. Como ao orar nos aproximamos de D’us e buscamos Sua “face”, a forma de realizá-lo se dá mediante atos de caridade. Por que a caridade é tão poderosa? Por que invoca o Atributo Divino da Misericórdia? Porque para os Céus, a recompensa é dada de acordo com os nossos atos. Em outras palavras, D’us nos trata da mesma maneira como tratamos os demais. Se alguém é generoso com os outros, D’us é generoso com esse alguém. Se a pessoa cuida das necessidades dos demais, D’us cuidará das suas. Se a pessoa é misericordiosa e dá parte do que ganha para salvar os demais dos muitos sofrimentos decorrentes da pobreza, D’us será misericordioso com ele e o protegerá contra o sofrimento e a infelicidade.
Fora isso, a caridade, assim como a oração, eleva o estado de espírito da pessoa a alturas incríveis. E, portanto, aquele que regularmente pratica a caridade se torna merecedor de maravilhosas bênçãos Divinas. Nossos livros sagrados estão repletos de ensinamentos acerca do poder imenso e das recompensas, materiais e espirituais, da prática da Tzedacá. O Talmud Bavli (Bava Batra 9a) afirma que “A Tzedacá é igual a todos os demais mandamentos juntos”, e que “é maior do que todos os sacrifícios”. O Talmud Yerushalmi (Peah 1:1) o corrobora: “Tzedacá e atos de bondade são o equivalente a todos os mandamentos da Torá”. O Midrash (Midrash Zuta, Cântico dos Cânticos 1) ensina que “Se apenas as pessoas que viveram na geração do Dilúvio (de Noach)
caixas de caridade de metal. séc 19 e início do século 20
No livro de Salmos, 17:15, há um versículo que diz: “Quanto a mim, por minha justiça, contemplarei Tua face; e ao despertar serei saciado por Tua visão”, expressando o anseio e a antecipação do Rei David pelo Mundo Vindouro. Segundo ele, por meio de seus atos de caridade, ele mereceria “contemplar a face de D’us”, ou seja, deleitar-se na radiante Presença Divina. Vemos, portanto, que a “face de D’us” pode “ser vista” por meio de atos de caridade. Assim, quando o versículo diz – “E (se) o Meu povo, que é chamado pelo Meu Nome... buscar a Minha face” – a expressão “buscar a Minha face” refere-se a atos de caridade. O Talmud Bavli 10
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e as pessoas de Sodoma tivessem feito Tzedacá, elas não teriam perecido”. O Midrash também ensina que a existência do mundo é baseada na prática da caridade: “Grande é a Tzedacá, pois desde o dia em que o mundo foi criado até o dia de hoje, o mundo se equilibra sobre Tzedacá” (Midrash Tana d´Vei Eliyahu Zuta 1). O Talmud Bavli vai além e diz que a caridade é tão poderosa que pode reverter o decreto Celestial da morte – ou seja, pode prolongar a vida de uma pessoa. Pois está escrito: “Rabi Yehudá costumava dizer: ‘Dez coisas fortes foram criadas no mundo. A pedra é dura, mas o ferro a corta. O ferro é duro, mas o fogo o amolece. O fogo é duro, mas a água o apaga. A água é forte, mas as nuvens a carregam. As nuvens são fortes, mas o vento as dispersa. O vento é forte, mas o corpo o suporta. O corpo é forte, mas o medo o esmaga. O medo é forte, mas o vinho o expulsa. O vinho é forte, mas o sono o dissipa. A morte é a mais forte de todos, e a caridade salva da morte, pois está escrito: ‘A Tzedacá livra da morte’” (Provérbios, 10:2). Podemos concluir, com base nessa passagem talmúdica, que a coisa mais poderosa na Terra, mais poderosa mesmo que a morte, é a Tzedacá. Se a caridade é mais forte do que a morte, ela é certamente forte o bastante para anular os decretos Celestiais negativos.
O significado do arrependimento Há uma passagem no Livro de Jeremias (2:35), na qual o profeta cita D’us como tendo dito: “Eis porém que te julgarei, porquanto afirmas: ‘Não pequei’”. Isso implica que o julgamento desfavorável dos Céus cairá sobre a negação dos
dia do perdão. jacob kramer (1892-1962). óleo sobre tela
pecados, não sobre os próprios pecados. Se alguém deseja obter expiação por seus pecados, o primeiro passo necessário é admiti-los. Aquele que nega ou justifica seus delitos não pode arrepender-se e, portanto, torna-se muito difícil ser perdoado pelos mesmos. Para curar uma enfermidade, é preciso identificá-la e depois diagnosticála corretamente. Infelizmente, há muitos que se recusam a agir assim. Acreditam que podem estabelecer seus próprios padrões de moralidade. Tentam viver segundo suas próprias definições de bem e mal, sem recorrer à Revelação Divina. O que essas pessoas estão fazendo é seguir um curso mal sucedido, percorrido por geração após geração de filósofos. Após milhares de anos de experimentações, a própria Filosofia chegou à conclusão de que, a menos que seja revelado por algum Poder Superior, não existe nenhum padrão verdadeiramente objetivo do bem e do mal. 11
O Judaísmo, por outro lado, reconhece D’us como a autoridade suprema de toda a moralidade. O bem e o mal são definidos e determinados por D’us. Ao mesmo tempo, D’us, em Sua Onipotência, pode perdoar o pecado e erradicar qualquer transgressão cometida pela pessoa, pois a mesma Autoridade que declara o pecado de algo pode perdoá-lo. Se o pecado é uma enfermidade espiritual, o arrependimento é sua cura. Portanto, um dos ensinamentos fundamentais do Judaísmo é que quando uma pessoa se arrepende, seus pecados são perdoados. A Torá assim o declara: “...E voltares... para o Eterno e ouvires a Sua voz,... teu D’us aceitará teu arrependimento e Se compadecerá de ti...” (Deuteronômio, 30:2-3). O arrependimento é eficaz mesmo quando se trata de pecados graves. Como ensinam nossos Sábios: “Nada pode se antepor ao arrependimento”. Ele é eficaz não importa quantas vezes a pessoa tenha pecado. Mesmo se a pessoa tenha vivido toda a vida negando e blasfemando contra D’us, ela pode ser perdoada. O arrependimento é relevante para todos os seres humanos – até para os mais perversos e os mais justos. Como D’us criou o homem como uma criatura falível, com livre-escolha e livrearbítrio, é inevitável que ele peque. Como está escrito: “Não há homem na face da Terra que seja tão justo que só faça o bem e não peque” (Eclesiastes, 7:20). Mas, para obter o perdão Divino, o arrependimento tem que ser genuíno; não apenas dizer algo que não se sente, nem fingir piedade. Arrependimento significa SETEMBRO 2016
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admitir as próprias fraquezas e erros e fazer tudo o que for necessário para repará-los. Em seu sentido mais correto, o arrependimento consiste de quatro elementos: mudar a forma de agir, arrepender-se sinceramente, confessar-se a D’us e tomar a decisão de não repetir o pecado. Nossos Sábios ensinam que há dois tipos de pecados que a pessoa pode cometer. O primeiro é contra D’us. Quem desobedece às leis Divinas, por omissão ou comissão, comete um pecado – porque de alguma forma danificou a infraestrutura espiritual do universo (pecados de comissão) ou deixou de contribuir para aperfeiçoá-lo (pecados de omissão). O verdadeiro arrependimento é o remédio para quem não seguiu as leis de D’us. Mas, como ensinou o profeta Jeremias, para se achegar a D’us em arrependimento, é preciso primeiro admitir que se errou. Depois a pessoa tem que tentar melhorar – caminhar na direção certa. Não se espera que a pessoa se torne um Tzadik – um ser humano verdadeiramente justo – da noite para o dia. Mas se espera que a
pessoa melhore – passo a passo, um dia de cada vez. No entanto, há uma segunda categoria de pecados, geralmente muito mais sérios – aqueles que são cometidos contra outros seres humanos. D’us não perdoa uma pessoa por esse tipo de pecado até que aquele contra quem o pecado foi feito verdadeiramente perdoe o pecador. Quando alguém peca contra outro ser humano, nenhuma oração, nenhum jejum, nem mesmo em Yom Kipur, pode servir de expiação. O que é necessário fazer é desculpar-se com a pessoa que foi prejudicada ou injuriada e fazer todas as reparações necessárias. Somente depois de tê-lo feito, pode-se pedir perdão a D’us por ter pecado contra um de Seus filhos. Apesar dos passos iniciais do arrependimento consistirem em se afastar do pecado, aproximandose do remorso e da confissão, uma forma mais elevada de arrependimento envolve praticar boas ações. Na verdade, as três coisas que anulam um decreto
Celestial negativo – oração, caridade e arrependimento – são interligadas: uma parte essencial do arrependimento mais elevado é a oração, a caridade e os atos de bondade com os demais, bem como o estudo da Torá. Como está escrito: “Pela bondade (caridade) e pela verdade (Torá) é expiada a iniquidade” (Provérbios, 16:6). O arrependimento é tão poderoso que é uma das coisas principais que pode romper as barreiras que impedem a Redenção Messiânica. O profeta nos diz: “E virá um redentor a Tsión, a todos que se arrependerem das transgressões de Yaacov – diz o Eterno” (Isaías, 59:20). Há uma tradição que conta que se cada judeu se arrependesse e se voltasse a D’us por apenas um dia, a Redenção Messiânica ocorreria imediatamente. A Torá assim diz: “E se voltares – tu e teus filhos – para o Eterno, teu D’us, e ouvires a sua voz, seguindo tudo o que eu te ordeno hoje..., D’us se compadecerá de ti e te fará voltar, juntando-te dentre todas as nações para onde o Eterno, teu D’us, te espalhou (Deuteronômio, 30:2-3).
Os Dez Dias de Arrependimento Tefilá, Tzedacá e Teshuvá são três pilares do Judaísmo que cada judeu deve se empenhar em praticar durante todo o ano. Somos instruídos a orar diariamente, preferivelmente três vezes ao dia - Shacharit (a oração da manhã), Minchá (a oração da tarde) e Arvit (a oração da noite). A prática de caridade é um mandamento que deve ser realizado diariamente, exceto nos dias em que não podemos manusear dinheiro - Shabat e Yom Tov. Quanto ao arrependimento – a retificação das transgressões e o esforço em melhorar a nossa 12
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“Tocando o Shofar”, Marc Chagall
espiritualidade –, deveria ser uma preocupação diária de todo judeu. Rabi Eliezer, um dos maiores Sábios do Talmud, que, como mencionamos acima, fazia caridade antes de rezar, costumava dizer: “Arrependa-se na véspera de morrer”. Quando seus alunos lhe perguntaram como era possível saber o dia de nossa morte com antecedência, ele respondeu que era por isso que devíamos nos arrepender diariamente. Apesar de podermos e devermos sempre nos arrepender de nossos erros, D’us determinou que os dez dias entre Rosh Hashaná e Yom Kipur fossem os Asseret Yemei Teshuvá – os Dez Dias de Arrependimento. Portanto, é costume dizer preces de arrependimento durante esse período, ser ainda mais generosos na caridade que fazemos habitualmente
e ser mais rígidos em nosso cumprimento da ética e da religião. Os Dez Dias de Arrependimento se iniciam em Rosh Hashaná, cujo principal mandamento é ouvir o som do Shofar. Um dos simbolismos do Shofar é servir para despertar os corações das pessoas para D’us. Pois assim falou o profeta: “Será ouvido em uma cidade o som do Shofar sem que estremeçam seus moradores?” (Amós 3:6). Do mesmo modo, Yom Kipur, que conclui os Dez Dias de Arrependimento, é o dia mais auspicioso do ano para um judeu se arrepender. O chamado ao arrependimento foi uma das missões mais importantes de todos os profetas. Junto com a oração e a caridade, o arrependimento pode banir qualquer decreto maligno que possa ter sido 13
decretado sobre um indivíduo ou uma comunidade. Como a oração e a caridade, o arrependimento tem o poder de interceder por uma pessoa, protegendo-a do mal e mesmo prolongando sua vida. Assim sendo, durante os Asseret Yemei Teshuvá, cabe a cada um de nós fortalecerse no cumprimento das três coisas que anulam os decretos Celestiais negativos. Fazendo-o, poderemos melhor atrair as bênçãos Divinas para o ano vindouro – para nós e nossas famílias, para o Povo Judeu e para toda a humanidade.
Bibliografia
Talmud Yerushalmi - Artscroll Mesorah Rabenu Shmuel Yafeh, Sefer Yafeh Mareh Rabi Aryeh Kaplan, Handbook of Jewish Thought - Moznaim Publishing Corporation SETEMBRO 2016
NOSSAS GRANDES FESTAS
Algumas leis relacionadas com Yom Kipur Neste ano, Yom Kipur se inicia no dia 11 DE outubro, TERÇA-feira, às 17:50h, e termina na noite do dia 12 DE outubro, ÀS 18:44H. .
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ostuma-se fazer caparot – abate de um galo, para um homem, e de uma galinha, para uma mulher, no dia 9 de Tishrei de madrugada, 11 de outubro, por um shochet qualificado. Também é possível cumprir este costume com dinheiro, doando-o para tzedacá. É proibido jejuar no dia que precede Yom Kipur, mesmo se este jejum for por Taanit Halom. É, ao contrário, uma mitzvá fazer uma refeição adicional. A refeição que antecede o jejum deve ter pão e pratos de fácil digestão e ser concluída 20 minutos antes do pôr-do-sol. Bebidas alcoólicas são proibidas. As mulheres devem acender as velas antes de ir à sinagoga, dizendo a bênção “Lehadlik Ner Shel Shabat Veshel Yom HaKipurim”. Se a mulher quiser locomover-se de automóvel ou usar o elevador antes do início de Yom Kipur, deverá, antes de acender as velas, fazer uma ressalva dizendo que não está
recebendo Yom Kipur com o ato de acendimento das velas. É, porém, necessário antecipar o recebimento de Yom Kipur para antes do pôr-do-sol. É costume os pais abençoarem os filhos, pedindo que estes sejam selados no Livro da Vida e que, em seus corações, permaneça sempre o amor a D’us. Convém também ir à sinagoga antes do pôrdo-sol, para poder participar do Kol Nidrei, a “anulação dos votos”.
Restrições durante Yom Kipur Yom Kipur é o Shabat dos Shabatot e, portanto, todo trabalho profano deve cessar e todas as leis do Shabat devem ser respeitadas. Assim como no Shabat, é proibido carregar sobre si qualquer objeto durante Yom Kipur. Além de observar as leis do Shabat, em Yom Kipur outras cinco restrições são acrescidas: “Não comer, não beber, não trabalhar, não se lavar e nem massagear a 14
pele (perfumes, cremes etc.), não calçar couro, não ter relações conjugais”. O jejum diz respeito tanto aos homens quanto às mulheres, mesmo grávidas ou amamentando. Só em caso de doença ou onde haja algum perigo à vida, o jejum pode ser suspenso (consulte seu rabino). As crianças de 9 a 10 anos podem jejuar algumas horas, e, a partir dos 11 anos, conforme avaliação dos pais, podem jejuar o dia todo. Mas o jejum tornase obrigatório aos 12 anos, para meninas, e aos 13, para meninos. O uso de sapato, sandálias ou tênis de couro é proibido tanto para homens como para mulheres. As crianças também devem ser orientadas neste sentido. Ao término de Yom Kipur, a Havdalá deve ser feita sem bessamim, e a Bênção da Luz deve ser feita sobre uma vela que permaneceu acesa desde o dia anterior.
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Uma introdução às Leis da Cashrut Através da história do Povo Judeu, o cumprimento das leis da Cashrut tem sido um atributo inconfundível da identidade judaica. Quando um judeu volta ao Judaísmo – quando inicia sua jornada espiritual e abraça a Torá – o mandamento que ele mais provavelmente adota é a obediência às leis alimentares judaicas. Talvez, mais do que qualquer outra mitzvá da Torá, as leis da Cashrut enfatizam que o Judaísmo é muito mais do que uma “religião”, no sentido convencional.
E
ssas leis nos ensinam que a Santidade não está confinada à sinagoga e a alguns momentos especiais fora da vida cotidiana. Elas nos ensinam que a vida, em sua totalidade, é um empenho sagrado e que até mesmo uma atividade aparentemente mundana como o comer é governada por leis Divinas.
Cashrut, é importante consultar uma autoridade rabínica competente e versada no assunto. Este artigo não pretende ser um tratado sobre essas leis, mas sim, uma introdução básica ao assunto.
Leis básicas da Cashrut Segundo a Lei Judaica, carne, leite e ovos de certas espécies de animais são permitidos para consumo, enquanto outros são estritamente proibidos. Um animal terrestre é casher se ele rumina e tem o casco fendido. Essas duas características são imprescindíveis. São exemplo de animais terrestres casher a vaca, o carneiro, o cabrito e o veado. E de animais que não são casher o porco, o cachorro, o gato, o camelo, o cavalo e o coelho. Quanto às aves, a Torá relaciona 24 espécies não casher – basicamente todos os pássaros predatórios e necrófagos. São exemplo de pássaros casher a galinha, o peru, o pato e o pombo.
A palavra hebraica “casher” significa “apta”. As leis da Cashrut definem que alimentos são aptos para o consumo por um judeu. D’us as ordenou aos Filhos de Israel no deserto do Sinai. Os fundamentos dessas leis podem ser encontrados em Levítico e Deuteronômio, na Torá Escrita. D’us ensinou os detalhes e particularidades a Moshé. Esses ensinamentos foram transmitidos oralmente de uma geração a outra, até que finalmente foram escritos na Mishná e no Talmud. As leis da Cashrut são muitas e envolvem muitos detalhes. Algumas são alvo de muita discussão entre as autoridades em Halachá (a Lei Judaica). Alguns rabinos, inclusive alguns antigos Rabinos Chefes de Israel, são um pouco mais lenientes acerca de algumas dessas leis, enquanto outros são extremamente rígidos. Quando surgem perguntas ou dúvidas sobre as questões da
Uma criatura marítima é casher somente se tem barbatanas e escamas. Exemplos de peixes casher são o salmão, a truta, a carpa e o arenque. Já os não casher são a lagosta, o camarão, o caranguejo, o tubarão, os crustáceos e todos os mamíferos aquáticos. Todos os répteis, anfíbios, 15
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vermes e insetos não são casher. Há quatro tipos de gafanhotos que são casher, mas como há uma incerteza em sua identificação, quase todas as comunidades judaicas proíbem o consumo de qualquer tipo de gafanhoto. As frutas, os legumes e os grãos são, em geral, sempre casher. Contudo, é imprescindível saber se não contêm
insetos. O vinho e o suco de uva ou qualquer coisa que seja feita com os mesmos – como vinagre de vinho e conhaque – precisam da certificação casher. O Talmud (Avodá Zará 29b, 35a-35b) proíbe o judeu de comer queijo que não foi produzido sob supervisão rabínica. Apesar de haver muitas razões para essa proibição, a maioria das autoridades argumentam que a proibição foi feita em virtude do uso de coalho – que é tradicionalmente derivado do revestimento do estômago do bezerro -, usado na produção de
queijo. Portanto, para ser considerado casher, o queijo precisa ser produzido sob os auspícios de uma agência certificadora de Cashrut. Conhecer os animais que são casher e os que não o são é apenas o primeiro passo no cumprimento das leis de Cashrut. Há inúmeras leis que determinam como o animal deve ser abatido e que partes do
mesmo podem ser consumidas. Os mamíferos e pássaros casher são abatidos mediante um processo especial, a Shechitá, pelo qual a garganta do animal é cortada, rápida e com precisão, e de forma relativamente indolor, com uma faca especial, muito afiada e perfeitamente lisa, chamada chalaf. Se o animal não é abatido propriamente segundo a Lei Judaica, sua carne se torna não casher. E mais, a carne de um animal que morre ou é abatido por outro meio que não a Shechitá tampouco é casher. Também é estritamente proibido comer carne removida de um animal enquanto 16
ele ainda vive. Essa lei também se aplica a não judeus. É uma das Sete Leis Universais de Noé, que D’us espera que todos os seres humanos cumpram. É importante observar que os peixes casher não necessitam de Shechitá. Contudo, antes de comê-los, é preciso ter certeza absoluta de que estão mortos. Um aspecto muito importante das Leis de Cashrut diz respeito ao sangue do animal abatido. A Torá proíbe, terminantemente, o consumo do sangue de animais e aves. Dentro de 72 horas após o abate, todo o sangue extraído é drenado da carne por meio de um processo especial de imersão e salgamento. Apesar de ser permitido comer os ovos das espécies casher, estes devem ser cuidadosamente examinados para garantir que não têm mancha de sangue. Outra importante e bem conhecida lei de Cashrut é a proibição de se combinar carne e leite. Não podemos cozinhar, comer ou aproveitar, de nenhuma maneira, a combinação carne e leite ou qualquer produto derivado de leite. Segundo a Torá, um produto lácteo é qualquer alimento que contenha leite de um animal casher. (O leite de um animal não casher, como o camelo ou o porco, não é casher e não pode ser consumido, de qualquer maneira). O leite de soja, de amêndoa e de arroz não são produtos lácteos e, portanto, podem ser consumidos juntamente com a carne. Muitos pensam, erroneamente, que as leis de Cashrut, particularmente a proibição de misturar leite com carne, não se aplica às aves, como galinha. Errado. É terminantemente proibido misturar carne de aves com leite ou outro produto lácteo. Deve-se guardar um intervalo entre
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a ingestão de qualquer tipo de carne ou ave e um produto lácteo – em geral, seis horas. Por outro lado, após consumir qualquer tipo de laticínio – por exemplo, tomar leite ou sorvete – basta comer ou beber qualquer outra coisa para “limpar a boca” de qualquer resíduo de comida, antes de comer carne. No entanto, segundo o Zohar, após consumir um produto lácteo, deve-se esperar uma hora inteira antes de comer carne. Algumas comunidades têm o costume de esperar meia hora, apenas. Esse breve intervalo antes de ingerir carne se aplica à maioria dos produtos lácteos, como leite, sorvetes e queijos macios. Se o queijo for do tipo duro ou de sabor muito forte, tipo suíço ou parmesão, o costume é esperar pelas seis horas completas antes de comer carne. Há muitos alimentos que a Torá não considera nem carne nem laticínio. Estes caem em uma categoria chamada de Parve, e podem ser
comidos com carne ou com leite. As frutas, ovos, peixes, legumes e grãos são Parve. Os peixes são considerados Parve, pois a Torá não considera significativa a pequena quantidade de sangue que possuem. Por isso eles não requerem a prática da Shechitá. Os ovos também são Parve, ainda que se originem de um animal. É interessante observar que o mel, apesar de ser produzido pela abelha, que não é um animal casher, é considerado um alimento casher e Parve. Isto porque a Torá não considera o mel um produto animal.
Leis adicionais da Cashrut O Talmud ensina esta regra prática: o que vem de um animal casher é casher, e o que vem de um animal não casher não é casher. Portanto, apenas o leite e os ovos de um animal casher são casher. E o leite que se compra no supermercado, é casher? As leis de Cashrut estipulam que um judeu 17
cumpridor da Torá deve presenciar o processo da ordenha do início ao fim para assegurar que somente foi usado leite de animais casher. Por essa definição, somente o leite que é produzido sob inspeção rabínica é casher. No entanto, em certos países ocidentais, é ilegal a comercialização de leite de animais não casher. Por isso, algumas autoridades Haláchicas permitem que se use leite comum e produtos lácteos casher que usam leite comum (como o sorvete Häagen Dazs), pois confiam na inspeção do governo como garantia suficiente. Isso é especialmente válido nos Estados Unidos. Essa questão é muito controversa e vai muito além do escopo deste artigo. Muitas comunidades judaicas da Diáspora aceitam essa concessão, enquanto outras se opõem radicalmente. Outra questão da Cashrut relaciona-se ao pão e produtos de panificação. Segundo as leis da Torá, é permitido comer pão SETEMBRO 2016
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comprado em uma padaria. No entanto, é preciso certificar-se que nenhum ingrediente não casher foi utilizado em sua fabricação. Muitas comunidades judaicas são rigorosas a esse respeito e só consumem pão e produtos de panificação feitos em padaria que cumpra as leis da Cashrut. É importante observar que essa preocupação também se aplica a outros produtos industrializados; sempre é possível que um alimento comprado no supermercado contenha ingredientes não casher. Por isso, muitos judeus somente compram produtos cuja produção foi supervisionada por uma organização certificadora de Cashrut. Concluímos aqui nossa breve introdução às leis da Cashrut. Queremos enfatizar que há muitas outras leis que não foram contempladas neste artigo. Para estudá-las, particularmente as que tratam dos pratos e dos utensílios da cozinha, recomendamos que se consulte um rabino competente ou uma autoridade em Cashrut.
Razão para as leis de Cashrut No terceiro livro da Torá, Levítico, na porção de Shemini, lemos sobre as leis dietéticas do Judaísmo. A Torá nos ordena “... separar entre o impuro e o puro, e entre o animal que é para comer e o animal que não se deve comer” (Levítico, 11:47). Como vimos acima, há certos animais que temos permissão de comer e outros cujo consumo nos é terminantemente proibido. As diferenças entre os animais casher e não casher levantam dúvidas que desafiam até os maiores comentaristas da Torá. Por exemplo, por que a vaca é um animal casher e o porco não? Bem, um tem casco
dissuadir os judeus de comerem carne de porco. No entanto, se essa fosse a razão para a proibição, em vez de proibir, a Torá poderia dar um conselho melhor: cozer a carne por várias horas antes de comê-la.
fendido e rumina; o outro tem casco fendido, mas não rumina. Mas, e daí? Por que é pecado consumir a carne de um animal que não rumina? Da mesma forma, por que o golfinho não é casher e o salmão é? O salmão tem escamas e o golfinho, não. Repetindo: e daí? Qual o pecado de comer uma espécie de peixe que não possui escamas? Perguntas semelhantes podem ser feitas acerca de qualquer outra lei da Torá. Mas a questão dos alimentos casher e não casher chama especialmente a atenção em virtude da importância dessas leis em nossa vida diária. O que podemos ou não comer ocupa muito de nosso tempo, interesse e atenção. Comentaristas da Torá, rabinos e pensadores têm tentado resolver os enigmas levantados pelas leis da Cashrut. Alguns alegam que comer animais não casher faz mal à saúde. O porco é um exemplo disso. A carne de porco vem infestada de vermes, às vezes, e se não for bem cozida pode causar uma terrível doença, a triquinose, causada por parasitas. Esse argumento vem sendo usado repetidamente para 18
Outros alegam que a Torá proíbe o consumo do porco porque o animal era usado para fins de idolatria. Já outros alegam o contrário: que o porco nem se prestava à idolatria, portanto também não serve para o consumo. Esses argumentos não têm muita base, porque muitos animais, inclusive os que são casher, também foram usados para idolatria e também há animais casher que não prestam para a idolatria. Como vimos acima, há sinais que determinam se um animal é casher – casco fendido e que ruminam, barbatanas e escamas – mas não parece haver explicação clara para que o consumo de certos animais seja permitido e o de outros, não. E tentar justificar as razões para os mandamentos da Torá como sendo próprios para o benefício físico parece leviandade. Isso não significa, no entanto, que tais justificativas sejam necessariamente infundadas e pode-se argumentar que, de modo geral, comer carne de vaca é mais saudável e seguro do que de porco. Também é verdade que a Torá nunca nos ordenaria fazer algo que claramente fosse nocivo ao nosso organismo. Como nos ensina o Midrash: “Nada maligno provém das Alturas” (Genesis Rabá 51:3). Em outras palavras, D’us jamais nos ordenaria fazer algo que nos causasse dano físico. Contudo, é um exagero deixar tudo por conta disso e buscar apenas o benefício físico de cada mandamento. O Maharal de Praga, Sábio e Cabalista famoso por ter concebido o Golem, criticava duramente as explicações médicas
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para os Mandamentos, perguntando se seria concebível que a Torá se resumisse a artigos de uma revista médica (Tiferet Israel 8). Quando discutimos as leis da Cashrut ou, até mesmo, qualquer outra lei do judaísmo, devemos lembrar-nos que a Torá é uma obra de autoria Divina. Na maioria dos casos, o conteúdo de um livro é mais importante do que quem o escreveu. Um livro brilhante escrito por um autor desconhecido tem mais valor do que um trabalho inexpressivo escrito por um autor de renome. Mas quando o autor é D’us, Todo Poderoso, Ser Perfeito, é evidente que Seu trabalho também é perfeito. Foi Ele quem escolheu o que incluir e o que não incluir na Torá. Ele não apenas é o Rei do Universo e o Juiz Final, mas também o Legislador Supremo. O conteúdo da Torá não foi escolha de um ser humano caprichoso, mas de um Ser Onisciente, Onipotente e Eterno. Nossos Sábios ensinam, pois, que a Torá é a Vontade e Sabedoria Divinas, que D’us compartilhou com o homem quando Se revelou ao Povo Judeu no Monte Sinai. Como a Torá é produto da Vontade e Sabedoria Divinas, é eterna e infinita, assim como seu Autor. É incrível que nós, seres humanos limitados, possamos compreender parte da mesma. E a razão para isso ser possível é porque D’us “revestiu” a Torá com “vestimentas racionais” – ou seja, Ele permitiu que os mandamentos da Torá fossem, até certo ponto, compreensíveis ao homem. Os 613 mandamentos da Torá se dividem em três categorias gerais. Os primeiros são os Mishpatim ( Julgamentos) – os chamados mandamentos racionais. Entre os Mishpatim estão as proibições contra assassinato e roubo. A segunda
se preocupa com o sofrimento dos animais somente deveria comer carne casher. O problema é que alguém que realmente se preocupa com os animais não come carne animal. A lei da Torá não vai contra essa opção, tendo havido, mesmo, grandes rabinos que se abstinham de comer carne. Outro argumento para que se guarde a Cashrut é que, como dissemos acima, comer porco e mariscos pode fazer mal à saúde. Mas o mesmo se pode aplicar a comer açúcar e gorduras em demasia – e a Torá não os proíbe.
A que classe de mandamentos pertencem as leis da Cashrut?
Quem estuda a Cabalá sabe que há razões místicas em prol da alimentação casher. Por exemplo, uma das razões para não se comer carne e leite juntos é o fato de que a carne significa a morte de um animal, que é simbolizada pela Sefirá de Guevurá (severidade), ao passo que o leite, que é um símbolo de vida e crescimento, representa a Sefirá de Chessed (bondade), e não devemos misturar as duas. Mas, por quê? Não faria sentido temperar a severidade com alguma bondade, como muitos fazem durante o Kidush da noite de 6a feira, quando colocam um pouco de água (que, como o leite, representa Chessed) no copo de vinho (que também representa Guevurá)?
Algumas pessoas bem-intencionadas, na tentativa de influenciar outros judeus a seguirem as leis da Cashrut, classificam-nas de Mishpatim – leis racionais. De fato, podemos encontrar uma infinidade de razões para que a pessoa coma apenas comida casher. No entanto, o problema com esses argumentos é que todos podem ser refutados. Por exemplo, como vimos acima, a Shechitá é uma forma relativamente indolor e menos cruel de abater um animal. Por isso, quem
Outro argumento místico oferecido para promover as leis da Cashrut é que quando comemos a carne de um animal, nossa alma é influenciada por sua natureza. Nachmânides, grande Sábio e Cabalista do século 12, assinala que “os pássaros e muitos dos mamíferos proibidos pela Torá são predadores, ao passo que os permitidos não o são: somos instruídos a não comê-los, para não absorver essas qualidades malignas”. Segundo esse ponto de vista, a
categoria de mandamentos são os Edut (Testemunhos), que celebram as obras e maravilhas Divinas. Entre estes estão a guarda do Shabat (que testemunha o fato de que D’us criou o Universo) e Pessach (que celebra o Êxodo do Egito). Por fim, a terceira classe de mandamentos são os Chukim (Decretos), popularmente conhecidos como os mandamentos não racionais – aqueles cujos motivos não são tão óbvios. O mandamento que simboliza os Chukim é o ritual da Pará Adumá – a vaca vermelha.
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Cashrut é “nutrição espiritual”: assim como há alimentos que são bons para o corpo e outros que são nocivos, há alimentos que afetam nossa alma positivamente e outros, negativamente. Na verdade, os animais casher são, em geral, menos agressivos que os não casher. Seria esta a razão para a vaca e o carneiro serem casher enquanto o leão e a cobra não? Talvez. Mas, cabe a pergunta: não ser agressivo é sempre uma virtude?
Bibliografia
What is Kosher www.chabad.org Rabi Adin (Even Israel Steinsaltz) – Talks on the Parsha - The Toby Press
Está claro que para cada argumento promovendo as leis da Cashrut há um contraargumento. A tentativa de defender as leis da Cashrut apenas por meio de motivos racionais prova ser futilidade. Interessante, no entanto, é o fato de que as leis da Cashrut com frequência são o fator decisivo da identidade judaica de uma pessoa. Através da História, e particularmente durante a Inquisição, muitos judeus tinham que escolher entre comer porco ou arder na fogueira. Muitos optaram pela fogueira. Preferiram morrer a comer porco, porque para eles isso era um teste para seu Judaísmo. Ao forçar os judeus a violar um mandamento da Cashrut, os Inquisidores não apenas tentavam fazer com que eles violassem um decreto da Torá – queriam forçá-los a renunciar à sua fé. Muitos 20
preferiram a fogueira porque para eles comer porco não era diferente do que se curvar perante ídolos. Era o mesmo que renegar a sua identidade judaica. Devemos, então, fazer a seguinte pergunta: Quais as razões para que os judeus sacrifiquem seu conforto e até sua vida guardando as leis da Cashrut? Seriam razões de saúde? Seriam razões espirituais? Seriam questões relacionadas às Sefirot? Essa mesma pergunta pode ser feita acerca de praticamente todos os mandamentos da Torá: mesmo se argumentarmos que quem guarda a Torá e os mandamentos terá sucesso nos negócios, na vida conjugal, nos relacionamentos pessoais – ainda assim, esse sucesso merece que se dê a vida por ele? A resposta é ‘não’. Quando nos aproximamos da Torá, não podemos considerar vantagens pessoais. Por que, então, guardamos as leis da Cashrut? Pela mesma razão que guardamos todos os demais mandamentos da Torá: porque D’us nos disse que assim o fizéssemos. Ao cumprir a Vontade Divina, conectamo-nos com D’us. Essa é a razão para sermos casher. Todas as demais razões, sejam físicas ou espirituais, são secundárias.
ISRAEL
MEU IRMÃO JONATHAN POR ZEVI GHIVELDER
Quem hoje tem 40 anos de idade, ou está chegando aos 50, decerto não vivenciou aqueles dias tensos de junho e julho de 1976, portanto há quatro décadas, quando um avião da Air France, partindo de Tel Aviv, foi sequestrado por terroristas e levado para o aeroporto de Entebe, em Uganda. A aeronave conduzia 246 passageiros, dos quais 77 eram cidadãos de Israel. No dia 4 de julho, uma espetacular ação de comandos israelenses pôs fim ao cativeiro dos reféns.
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a operação disparada pelo exército de Israel para libertá-los só houve uma vítima fatal, o coronel Jonathan Nethanyahu, então com 30 anos de idade, justamente o comandante da tropa de elite que executou o extraordinário resgate. A vida e a carreira de Yoni, como era chamado por seus familiares e amigos, estão registradas num livro escrito com ternura e admiração por seu irmão Iddo, seis anos mais moço do que Yoni, e três anos mais jovem do que seu outro irmão, Benjamin, atual primeiro-ministro de Israel. O relato de Iddo é mais focado nas qualidades de líder militar de Jonathan do que em recordações do convívio íntimo com os pais e irmãos. Neste sentido, ele se dedicou a uma exaustiva pesquisa sobre o resgate em Entebe, colhendo entrevistas com mais de 70 pessoas, entre civis e militares envolvidos na operação no aeroporto em Uganda, além de ter consultado centenas de documentos. De qualquer maneira, sua narrativa compõe um atraente perfil da personalidade e do caráter de Yoni, além de transcrever trechos de cartas por ele escritas e de acrescentar diversos pormenores que contribuem para enriquecer a biografia de seu irmão. Na verdade, o livro é mais eloquente para
a memória de Jonathan do que seria uma estátua em praça pública ou quaisquer outras homenagens rotineiras. Iddo é formado em medicina pela Universidade Hebraica de Jerusalém e fez doutorado em radiologia no Georgetown University Hospital, em Washington. Atualmente dedica a maior parte de seu tempo à literatura. É autor de cinco livros e de peças de teatro encenadas na Europa e na Rússia. A rigor, tudo aquilo que ele narra sobre Entebe assume a dimensão de palavra definitiva. Jonathan Nethanyahu nasceu no dia 13 de março de 1946, em Nova York, onde seus pais, Benzion e Cela, atuavam na Organização Sionista. Benzion, renomado estudioso da história judaica, ali se encontrava na qualidade de secretário de Jabotinsky, formulador e líder do sionismo revisionista. Benzion assumira a chefia do movimento após a morte de Jabotinsky, em 1940. Logo após a proclamação da independência de Israel os Nethanyahu se fixaram em Jerusalém, onde nasceram Benjamin e Iddo. Anos mais tarde, a família retornou aos Estados Unidos onde Benzion intensificou suas pesquisas acadêmicas sobre os judeus na época 21
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Primeiro Ministro Netanyahu sentado ao lado do túmulo de seu irmão, Yoni
da Inquisição, assunto a respeito do qual escreveu um livro que até hoje é tido como referência. Em 1964, depois de concluir o ensino médio em Filadélfia, Yoni voltou para Israel. Ao ter que prestar o serviço militar obrigatório, optou pelo corpo de paraquedistas. Três anos mais tarde, já aceito pela Universidade de Harvard, adiou a ida para os Estados Unidos e combateu na Guerra dos Seis Dias, tendo participado de batalhas no Sinai e no Golã. Em seguida, antes de embarcar, casou-se com Tuti, sua namorada desde a adolescência. Os dois regressaram a Israel no ano seguinte e se matricularam na Universidade Hebraica onde Jonathan optou pelos cursos de matemática e filosofia. No entanto, antes de terminar esses cursos, decidiu reingressar no exército. Por suas qualidades, acabou assumindo o
subcomando da unidade Sayeret Matkal, consagrado grupo de comandos a cujos integrantes chegam a ser atribuídas façanhas fantásticas que nem têm como ser confirmadas por motivos de segurança. Iddo não revela as ações das quais Yoni participou, mas sabe-se que esteve à frente
Yoni Netanyahu
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do sequestro de oficiais sírios de alto escalão, dentro do próprio território sírio, que posteriormente foram trocados por pilotos israelenses prisioneiros em Damasco. Em 1973, novamente resolveu estudar em Harvard. Divorciouse de Tuti e, mais uma vez, teve que adiar seus planos em função da irrupção da Guerra do Yom Kipur. Neste conflito, Yoni foi condecorado após comandar uma operação que resgatou com vida o tenente-coronel Yossi Ben Hanan, que jazia ferido atrás das linhas inimigas. Dois anos depois foi nomeado comandante do Sayeret Matkal, posto que já fora ocupado por Ehud Barak, mais tarde primeiro-ministro de Israel. Esta era a função de Jonathan quando ocorreu o sequestro do avião da Air France. Conforme assinalei,
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para quem não acompanhou ao vivo os acontecimentos daquele fim de junho e começo de julho 1976, impõe-se fazer um resumo. Era domingo, 27 de junho, dia da habitual reunião semanal do gabinete israelense. Assim, tanto o primeiro-ministro Rabin como os demais ministros foram informados ao mesmo tempo sobre o que acontecera com o Airbus da Air France. Os presentes à reunião foram incumbidos de diferentes tarefas como a do responsável pelas relações exteriores, Igal Allon, que entrou em contato com o ministro do mesmo nível em Paris. O Airbus pousou no aeroporto de Entebe às 3h15m da manhã de segunda-feira. Em Jerusalém, o ministro da defesa, Shimon Peres, ponderava com seus auxiliares, sem se dar conta de que estava sendo profético, que talvez fosse possível enviar até Uganda aviões do tipo Hércules, enormes, destinados ao transporte de carga e de tropas.
Nenhum dos oficiais presentes fez qualquer pergunta. Pelo contrário. Falaram entre cochichos que fariam treinamentos, que ajustariam seus equipamentos e que tudo daria em nada porque o gabinete jamais aprovaria um plano tão sem base como aquele. Além disso, ficaram sabendo que o ditador de Uganda, Idi Amin, estava em conluio com os sequestradores, o que tornava qualquer iniciativa para o uso da força praticamente inviável. Às 11 horas da manhã de quarta-feira, dia 30, Peres, Gur e Peled decidiram convocar, para trocar ideias, dois militares nos quais depositavam total confiança: o general Dan Shomron e o coronel Jonathan Netanyahu. Ambos acabariam desempenhando funções cruciais em todas as etapas da operação de resgate. Mas, naquele momento, as opções ainda eram muito nebulosas. No dia do prazo fatal, quinta-feira, soube-se que as renovações no aeroporto de Entebe, incluindo o velho terminal onde se encontravam
O serviço de inteligência de Israel fez construir uma maquete, em tamanho real, das edificações no aeroporto de Uganda, que serviria para o treinamento dos homens do Sayeret Matkal
Na terça-feira, Peres recebeu uma lista com os nomes de terroristas presos em Israel, Alemanha, França e Suíça, com a proposta dos sequestradores de que todos, num total de 53, fossem trocados pelos reféns. O prazo para a aceitação da proposta era o dia 1 de julho, às 14 horas. À noite, o chefe do Estado-Maior, Motta Gur, e o comandante da Força Aérea, Benny Peled, se reuniram com Peres. Sim, insistiu Peled, era possível fazer os Hércules voarem até Uganda sem escalas. Enquanto isso, no quartel do Sayeret Matkal, Jonathan falava a seus comandados: “Nossa missão será chegar de alguma forma até Entebe e libertar os reféns. Pode parecer exagero, mas sei que isto é possível”. 23
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de Yoni à frente do Sayeret Matkal. Os militares sob seu comando treinavam até a exaustão: como agiriam depois de atingir o terminal antigo do aeroporto e como usariam suas armas de modo a atingir somente os terroristas e a evitar ferimentos ou mortes entre os reféns.
os reféns, haviam sido feitas por uma companhia construtora israelense que logo forneceu às autoridades as plantas dos prédios do aeroporto. As coisas começavam a se clarear. Às dez horas daquela manhã o gabinete se reuniu para decidir, em princípio, se Israel empreenderia, ou não, uma ação militar. Enquanto o gabinete discutia, Dan Shomron elaborou um plano de ação de comandos que entregou a Peres às três da tarde. Este logo determinou que os comandantes do Exército e da Força Aérea traçassem um detalhado plano de entrosamento com vistas a uma incursão em Entebe, a chamada Operação Trovão. O serviço de inteligência de Israel fez construir uma maquete, em tamanho real, das edificações no aeroporto de Uganda, que serviria para o treinamento dos homens do Sayeret Matkal. Na tarde daquele dia 2 de julho foram dados os retoques finais do plano de ação de resgate, que consistia em mandar três aviões Hércules até Entebe e mais um, do mesmo tipo, transformado em hospital voador. Motta Gur
relutou, mas Shomron lhe disse que o mais importante de tudo era a manutenção do fator surpresa, tal como havia sido concebido, a partir de uma eficiente colaboração prestada por Yoni Nethaniahu, especialista em ações de comandos, sempre rápidas, contundentes e inesperadas. O general Gur objetou, arguindo que os Hércules estariam impossibilitados de aterrar em Entebe, nas pistas sem luzes do aeroporto. Foi a vez de Peled intervir: “Há muitos voos comerciais chegando e saindo de Entebe. Duvido que a torre de controle ugandense se preocupe em apagar as luzes das pistas”. Em seguida, um dos principais formuladores do plano de ação, o general Kuti Adam, teve uma excelente ideia: um dos Hércules deveria levar uma limusine preta, da marca Mercedes Benz, pois este era o tipo de veículo usado por Idi Amin em suas eventuais idas ao aeroporto. Se a Mercedes chegasse a rodar na pista de Entebe, a torre de controle acreditaria tratar-se do ditador ali chegando após participar de uma conferência fora do país. Enquanto isso, era febril a atividade 24
A principal motivação de Jonathan era reduzir o tempo de duração de cada investida. Entre um exercício e outro a diminuição de apenas um minuto ou pouco mais era motivo de celebração. Pouco depois da meia-noite, Yoni deu o treinamento por encerrado e foi para casa a fim de dormir algumas poucas horas antes de voar rumo a Uganda. Sua nova mulher, Bruria, lembra-se de que o viu no chuveiro, com a água escorrendo sobre o corpo, encostado na parede e com os olhos fechados. Estava dormindo em pé. Ao escrever sobre este momento na vida de seu irmão, Iddo diz que, no começo do treinamento, Yoni estava um tanto desgostoso por causa de uma supervisão informal de seu trabalho feita por Ehud Barak que, àquela altura, já se havia aposentado do Sayeret Matkal. Assim, Jonathan respirou aliviado, e até se desdobrou, quando Barak foi enviado para o Quênia, com a missão de obter a permissão das autoridades para que os Hércules vindos de Uganda, depois do resgate, pudessem ser reabastecidos no aeroporto de Nairóbi. Se Barak não fosse bem sucedido, todo o plano da Operação Trovão seria jogado no lixo. Foi com enorme alívio que Rabin e Peres receberam seu comunicado de que estava tudo acertado com o governo do Quênia. À uma hora da manhã de sábado, 3 de julho, Gur informou a Peres que tudo estava pronto para a
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operação salvo um pequeno ajuste, o hospital voador seria um Boeing acompanhando quatro Hércules designados para a missão. Em seguida, o primeiro-ministro Rabin indagou a Gur a que horas os aviões deveriam decolar. Resposta precisa: sairiam de Sharm El Sheik, ao sul de Israel, à uma hora da tarde. Rabin convocou uma reunião do gabinete para as 14 horas no sentido de obter a necessária aprovação para o ousado plano de resgate. Alguns ministros ficaram perplexos, mas, mesmo assim, aprovaram. Outros preferiam um acordo com os sequestradores mesmo que não fosse apenas para ganhar tempo. O gabinete ignorava que os Hércules já haviam acionado seus motores para partir rumo a Uganda, tomando o maior cuidado para não serem detectados pelos radares egípcios ou da Arábia Saudita já que estariam voando perto da Península Arábica e sobre grande parte do Mar Vermelho, costeando o continente africano. Um dos ministros perguntou a Gur quantas baixas ele calculava para aquela ação. Gur respondeu que antecipava poucas baixas para os militares israelenses, mas admitia que cerca de vinte reféns pudessem ser atingidos: “É impossível prever
o número de mortos e feridos numa operação dessa natureza”. Depois de muita discussão, Rabin advertiu aos presentes: “Fiquem cientes de que se o resgate fracassar, nós todos teremos que renunciar aos nossos postos no governo”. Foi chamada uma votação na qual os ministros aprovaram em caráter unânime a Operação Trovão. Aquela tinha sido a mais angustiante decisão tomada por um governo de Israel desde a independência do país. No Hércules 1 os militares estavam imprensados entre armamentos, equipamentos e dois veículos do tipo Land-Rover, que acompanhariam a Mercedes, tal como fazia Idi Amin. Os rapazes falavam pouco entre si e em voz baixa. A certa altura do voo puderam avistar o deserto saudita que se estendia até o Oceano Índico. A bordo, Jonathan e o oficial Muki se empenhavam em dar instruções detalhadas ao oficial Amos Goren que embarcara no último momento, substituindo um militar que adoecera. Anos depois, Goren recordou: “Foi no meio da explanação que Jonathan me dava que nos chegou a notícia de que o gabinete tinha aprovado a operação. Jonathan continuou a falar na maior calma como se fossemos fazer apenas mais um treinamento”.
MERCEDES USADA PELOS ISRAELENSES, COMO PARTE DO PLANO DA MISSÃO EM ENTEBE, 1976
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Em seguida, Yoni e Muki sentaram no banco da frente da Mercedes e o primeiro começou a ler um livro. (Iddo jamais conseguiu saber que livro era). Eles viram o oficial Amitzur colocar na antena da Mercedes uma pequena bandeira de Uganda. Amitzur se lembra de ter conversado com Yoni naquele momento: “Ele não me falou sobre o que faríamos no aeroporto de Entebe. Enfatizou, isto sim, como era importante tudo o que estávamos a ponto de fazer”. Durante o voo, mais ou menos a cada vinte minutos, Dan Shomron e Netanyahu indagavam ao navegador sobre a exata posição do Hércules e o acompanhamento do plano de voo. Por enquanto tudo estava perfeito. Shomron lembra que a certa altura um oficial chamado Einstein começou a distribuir pedaços de bolo para os soldados. Yoni pegou o seu e mais um. Ofereceu-o ao copiloto, que lhe respondeu: “Não, obrigado, eu quero um pedaço do meio e não da ponta”. Shomron disse a Jonathan o que lhe passara pela cabeça naquele instante: “Se alguém ainda consegue ser arrogante numa hora como essa, é sinal de que estamos no bom caminho”. A bordo, Jonathan encontrou-se com o tenente-coronel Chaim Oren, a quem conhecia desde o tempo em que servira no corpo de paraquedistas. Conforme Iddo apurou, foi seu irmão quem disse, a certa altura da conversa: “Se ele estiver lá, eu vou acabar com ele”. - “Ele quem?” - “Ora, Idi Amin”. - “Você precisaria de autorização oficial para fazer isso”. - “Não vou pedir autorização a ninguém. Acabo com ele”. Essa atitude, segundo Iddo, era um traço marcante da personalidade do irmão: “Yoni achava que os fatos se justificavam por eles mesmos. Não era necessário setembro 2016
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RETORNO A ISRAEL DOS REFÉNS DE ENTEBE, 1976
procurar maiores explanações”. Manobrando na direção oeste, os Hércules atingiram o continente africano sobre a Etiópia. Por causa da turbulência os aviões teriam que se aproximar da fronteira do Sudão, mas era pouco provável que os radares em terra viessem a constatar que se tratava de aviões israelenses. Nas proximidades do lago Vitória a tempestade era tão forte que os Hércules tiveram que subir até 40 mil pés. O Hérculesguia enfrentou a adversidade enquanto os três outros ficaram voando em círculos, esperando a tempestade amainar. Foi nessa quadra dos acontecimentos que Yoni começou a despertar seus homens que dormiam. Instruiulhes que rechecassem suas armas e munições, pois em poucos minutos estariam pousando em Entebe. E acrescentou para cada pequeno grupo de soldados: “Nada de ter medo. Nós somos o que há de melhor em matéria de ação militar”. De súbito, uma preocupação: onde estava Amitzur, que ninguém conseguia achar dentro do avião? Estava dormindo
embaixo da Mercedes. Um dos comandos, Shlomo, também tinha uma preocupação: queria saber que roupa usar, se estava frio ou quente em Entebe. O copiloto informou-lhe: mais para o quente. O soldado Alik passou a maior parte do voo dormindo no banco traseiro de uma das camionetes. Quando foi acordado por Yoni, disse que estava morrendo de fome porque não comia desde a decolagem em Sharm El Sheik. Iddo não informa em seu minucioso relato se o rapaz encontrou algo para comer naquelas circunstâncias.
Yitzhak Rabin com os REFÉNS DE ENTEBE, 1976
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A enorme porta traseira do Hércules começou a ser aberta antes ainda que o avião tocasse o solo. Eram 23h1m de sábado, 3 de julho. O piloto não teve dificuldade para aterrar porque as luzes da pista estavam acesas. Os primeiros comandos que desceram do Hércules acenderam lanternas ao longo da pista para facilitar a chegada dos demais aparelhos caso as luzes viessem a ser apagadas. Yoni mandou que Amitzur pusesse para funcionar a Mercedes que, rapidamente, acompanhada pelas Land-Rovers, posicionouse para seguir em frente na pista do aeroporto, na direção ao velho terminal onde se encontravam 105 reféns, mais a tripulação do Airbus. No entanto, antes da limusine poder seguir o rumo traçado, Yoni percebeu a aproximação de duas sentinelas ugandenses, um pela direita e outro pela esquerda da Mercedes. Não hesitou em mandar que os dois fossem eliminados com silenciadores. Amitzur recordou: “O que mais me impressionou naquele momento foi a calma de Yoni”. À medida que os comandos começaram a avançar,
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tiveram que se proteger de rajadas vindas da torre de controle e de outras janelas do terminal novo. Com disparos precisos, Kuti Adam tirou dois soldados ugandenses para fora do combate. Um dos sequestradores chegou até a porta do terminal e percebendo o que ocorria, engatilhou sua metralhadora, voltou para dentro e passou a atirar sobre os reféns. Foi atingido por dois tiros disparados por Adam. Isso permitiu que os comandos entrassem no terminal, eliminassem os terroristas, e gritassem para os reféns: “Todos deitados no chão! Somos nós! O exército de Israel! Vocês vão para casa!” No entanto, alguns reféns sequer se mexeram porque realmente não entendiam o que estava acontecendo. Enquanto isso, outro Hércules descia em Entebe, trazendo a segunda unidade de assalto, comandada por Shaul Mofaz, que viria a ser chefe do Estado-Maior e ministro da defesa de Israel. Competia-lhe a missão de eliminar quem estivesse na torre de controle, a rigor o único lugar de forte resistência no aeroporto. Mofaz e seus homens foram bem sucedidos. Antes, porém, em seus estertores, um soldado de Idi Amin postado na torre de controle, fez um disparo de fuzil na direção do pátio de manobras do aeroporto. Um só tiro que atingiu o coração do coronel Jonathan Netanyahu.
REENCONTRO DOS REFÉNS DE ENTEBE COM FAMILIARES, 1976
do Sayeret e ordenou que os reféns fossem levados para o primeiro avião que deveria decolar logo em seguida. Ele temia que chegassem reforços de Kampala, a capital de Uganda, situada a poucos quilômetros do aeroporto. O Hércules levantou voo às 23h52m, ou seja, 51 minutos depois de sua chegada a Entebe, conduzindo os reféns, dentre os quais havia sete feridos, e o corpo inanimado de Yoni. Não tinha sido possível qualquer procedimento de fato eficaz para salvá-lo. Segundo o relato de Iddo, dois médicos militares tentaram de tudo para ressuscitar o comandante, porém a
Por instinto, Kuti Adam correu até o pátio e ali encontrou um médico debruçado sobre Yoni. Pediu uma avaliação. O médico apenas murmurou: “É grave, é muito grave”. Desde a aterragem do primeiro Hércules até aquele trágico desfecho, pouco mais de três minutos haviam transcorrido. Na falta de Yoni, seu amigo Adam assumiu o comando
perda de sangue era irreparável. Um médico disse para o outro: “Não adianta”. Ao que este respondeu: “Tem que adiantar. É o Yoni...” Há dez anos escrevi aqui para a revista um texto a propósito do 30o aniversário do resgate em Entebe. Acho importante reproduzir parte do último parágrafo, dado sua atualidade. Em setembro de 1976, dois meses depois da Operação Trovão, tive o privilégio de ser recebido para jantar com Itzhak e Leah Rabin em seu apartamento em Tel Aviv. Ao longo das conversas, Rabin insistiu em dois pontos: “Jamais, em qualquer circunstância, um estado soberano deve negociar com terroristas. E a principal lição de Entebe é nossos inimigos saberem que o braço de Israel pode ser muito longo”. Netanyahu, Iddo, Entebbe Bibliografia
A Defining Moment in the War on Terrorism, Balfour Books, EUA, 2004. editora ZEVI GHIVELDER é escritor E JORNALISTA
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Relações entre Israel e Egito, do tatame à diplomacia jaime spitzcovsky
Diplomacia e esporte, nos últimos meses, evidenciaram diferentes momentos das relações entre Israel e Egito. No tatame olímpico do Rio de Janeiro, o judoca egípcio Islam El Shehaby protagonizou cena lamentável, ao se recusar a cumprimentar, no final da luta, o atleta israelense Or Sasson. A hostilidade desportiva, no entanto, contrastou com o reaquecimento do diálogo entre Jerusalém e Cairo, colocando os vínculos bilaterais em nova fase, marcada pela intensificação.
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Apesar da preocupação das autoridades olímpicas, há uma lista extensa de manifestações antidesportivas em relação a atletas israelenses. Ainda no Rio de Janeiro, eles foram impedidos de entrar em um ônibus por integrantes da delegação libanesa. Em 2004, nos Jogos de Atenas, o judoca iraniano Arash Mirasmaeili, então campeão mundial, se recusou a enfrentar Ehud Vaks.
pós derrota para um lutador israelense que depois conquistaria a medalha de bronze (uma das duas obtidas por Israel nas Olimpíadas, ambas no judô), Islam El Shehaby quebrou uma tradição do tatame ao dar as costas a Or Sasson. O público irrompeu em vaias. A própria delegação egípcia despachou o seu atleta de volta ao Cairo, que carregou na bagagem uma dura reprimenda do Comitê Olímpico Internacional (COI) por sua atitude antidesportiva.
Mirasmaeili foi recebido com honras em Teerã. Já o caso de Islam El Shehaby foi diferente. Sua atitude foi elogiada por grupos fundamentalistas, enquanto as autoridades no Cairo insistiram nas críticas. O episódio demonstra ainda o fosso existente entre a política oficial do Egito, com quem Israel assinou um acordo de paz em 1979, e o sentimento anti-israelense disseminado na opinião pública egípcia.
“O presidente do Comitê Olímpico Nacional emitiu uma declaração afirmando respeitar todos os atletas e todas nações presentes ao Jogos Olímpicos”, afirmou o COI, em nota oficial. “O Comitê Disciplinar (DC) considerou que o comportamento (do atleta) ao final da competição foi contrário à regras do fair play e contrário ao espírito de amizade integrante dos valores olímpicos”.
Com apoio dos EUA, o presidente Anuar El Sadat e o premiê Menachem Begin costuraram o acordo de Camp David, o primeiro a trazer a paz entre Israel e um país árabe. Dois anos antes, em 1977, Sadat havia feito uma visita histórica a Jerusalém, incluindo um discurso na Knesset (Parlamento). Em 1981, foi assassinado em ataque terrorista no Cairo, arquitetado como resposta à sua aproximação com o Estado judeu.
O COI anunciou ainda medidas de prevenção: “Assim como a severa repreensão, o DC solicitou ao Comitê Olímpico Egípcio que garanta no futuro que todos os seus atletas recebam educação adequada em relação aos valores olímpicos antes de virem às Olimpíadas”. 28
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Presidente Anwar Sadat, do Egito (à esq.), com o Presidente Jimmy Carter, dos EUA, e o Primeiro Ministro Menachem Begin, de Israel, dão um aperto de mãos “a três” após a assinatura do Tratado de Paz entre Israel e o Egito, em 16 de março de 1979
O sucessor de Sadat, Hosni Mubarak, manteve o entendimento com Israel, mas promoveu uma “paz fria”. No plano bélico, a guerra estava descartada e, em vários momentos, registrava-se cooperação entre serviços de inteligência, por exemplo, no combate ao terrorismo. Mas o governo egípcio de então evitava o aprofundamento de laços políticos e culturais, permitindo ainda na mídia estatal a sobrevivência de discursos fortemente anti-israelense e até mesmo antissemitas. O regime de Mubarak mantinha a linha implementada há décadas pela liderança do mundo árabe de usar a questão palestina como elemento diversionista, a fim de desviar a atenção das suas sociedades dos problemas domésticos. O sucessor de Sadat visitou Israel apenas uma vez, no funeral de Yitzhak Rabin, em 1995.
Em 2011, a chamada Primavera Árabe levou à queda de Mubarak. Em seguida, após um período de governo interino, chegou ao poder, por meio de eleição, Mohamed Morsi, da Irmandade Muçulmana, grupo fundamentalista fundado no Egito na década de 1920. O Cairo passava a testemunhar a implementação paulatina de um regime religioso. A Irmandade Muçulmana egípcia se transformou, ao longo do século 20, numa organização com tentáculos em outros países. Sua ideologia influenciou, por exemplo, o Hamas, que atualmente controla a Faixa de Gaza. O saudita Osama Bin Laden construiu visão de mundo a partir da leitura, entre outros documentos, de textos da Irmandade Muçulmana. Em 2013, depois de uma onda de protestos contra Morsi, os militares 29
liderados pelo general Abdel AlSisi afastaram o presidente. No ano seguinte, Al-Sisi foi eleito para presidir o país por um mandato de sete anos. Enquanto o Egito mergulhava na queda de braço entre militares e Irmandade Muçulmana, a Síria testemunhava o início de sua trágica guerra civil, que teve como uma de suas consequências o surgimento do Estado Islâmico. O grupo fundamentalista, ao se fortalecer, passou a contar com a adesão de organização de outros países. Foi o caso de terroristas baseados na península do Sinai. A presença do Estado Islâmico e aliados em solo egípcio e perto da fronteira com Israel levou o Cairo e Jerusalém a registar um ponto na construção de uma agenda de reaproximação. Outros dois fatores para intensificar o diálogo: Hamas e Irã. SETEMBRO 2016
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1. Ministro Rel. Exteriores do Egito Sameh Shoukry e Primeiro Ministro de Israel Binyamin Netanyahu 2. Os judocas Or Sasson (Israel) e Islam El Shehaby (Egito) 3. Novo Embaixador do Egito em Israel Hazem Khairat, com o Presidente Reuven Rivlin, em Jerusalém
Em função dos laços históricos e ideológicos entre Hamas e Irmandade Muçulmana, o governo egípcio percebe o grupo terrorista palestino como ameaça estratégica. Portanto, autoridades israelenses e egípcias compartilham a preocupação de lidar com um inimigo comum baseado na Faixa de Gaza. O cenário ampliado do Oriente Médio demonstra, nos últimos anos, um agravamento da disputa entre o Irã, país de maioria xiita, e as nações sunitas, como Egito e Arábia Saudita, num embate por áreas de influência. Conflitos como da Síria e do Iêmen são alimentados também pelos interesses de potências regionais, que apoiam diferentes lados nessas guerras civis. A percepção da ameaça iraniana contribui fortemente, nos últimos anos, para uma aproximação entre Israel e os países sunitas, como Egito. O Cairo também tem
procurado investir nos laços com Jerusalém depois que o governo israelense, em junho, protagonizou uma reaproximação com a Turquia, pois autoridades egípcias temem a concorrência de Ancara em projetos políticos e, sobretudo, econômicos. O chanceler egípcio, Sameh Shoukry, no começo de julho realizou a primeira visita de um chefe da diplomacia egípcia a Israel, em nove anos. Mais uma sinalização dos novos tempos: o visitante se reuniu com o premiê Binyamin Netanyahu em Jerusalém, contrariando orientação anterior de evitar reuniões na capital israelense, para realizá-las em Tel Aviv. A agenda de Shoukry foi noticiada pela página no Facebook, em árabe, do Ministério das Relações Exteriores do Egito, numa demonstração de transparência, para a sociedade egípcia, da nova atmosfera nas relações entre os dois países do Oriente Médio. 30
Importante ressaltar que após o encontro formal, o chanceler foi ainda recebido na residência do primeiro-ministro. No final de julho, foi a vez do premiê israelense evidenciar os novos ares das relações bilaterais. Acompanhado de sua mulher, compareceu à celebração, na embaixada egípcia em Israel, do Dia da Revolução, que marca a derrubada, em 1952, do rei Farouk por uma revolta militar. Em discurso, Netanyahu agradeceu as iniciativas do presidente Al-Sisi, de buscar intermediar um diálogo com lideranças palestinas. O presidente Reuven Rivlin também compareceu à recepção. Iniciou seu discurso em árabe, em mais um sinal diplomático de reaproximação, e em contraste com a hostilidade demonstrada por um judoca egípcio em tatames do Rio de Janeiro. jaime spitzcovsky foi editor internacional e correspondente da folha de s. paulo em moscou e em pequim.
personalidade
Elie Wiesel, a consciência da humanidade No dia 2 de julho deste ano de 2016, aos 87 anos de idade, Elie Wiesel deixou este mundo. Talvez quem melhor o tenha definido foi o comitê do Prêmio Nobel da Paz de 1986: “Um dos mais importantes líderes espirituais em uma época em que a violência, a repressão e o racismo continuam a caracterizar o mundo... Um mensageiro para a humanidade; sua mensagem é de paz, reconciliação e dignidade humana”.
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pesar de ter sobrevivido ao Holocausto e vivenciado os horrores que a mente humana não consegue verdadeiramente assimilar, ele não se tornou amargo, tampouco indiferente, pois, como dizia, “a indiferença é a personificação do mal”. Pelo contrário, lutou contra as injustiças, a favor dos oprimidos, dos perseguidos, dos injustiçados, dos famintos. E, acima de tudo, lutou a favor de seu povo, de todos os judeus e do Estado de Israel.
Washington e ganhador de inúmeras condecorações além do Nobel da Paz – a lista de seus feitos e de suas contribuições é imensa, mas sua vida foi definida não tanto pelo trabalho que realizou como pelo amor que dedicou a seu povo e pelo silêncio que preencheu. Sua vida foi um combate permanente contra o esquecimento – para ele, a “segunda morte” dos milhões de judeus que foram assassinados durante a Shoá. Durante anos, após a 2ª Guerra, a Shoá ficou escondida sob um manto de silêncio. Ninguém queria relembrar ou falar sobre os tenebrosos anos de domínio nazista, nem os sobreviventes traumatizados, tampouco os judeus americanos – talvez se sentindo culpados por não terem feito mais para resgatar seus irmãos. Os israelenses, sabras, olhavam para os sobreviventes como sendo alguém que jamais queriam ser, as “vítimas indefesas”. Até surgir Elie Wiesel. Ele queria que os acontecimentos que destruíram os judeus da Europa ficassem marcados a ferro e fogo na consciência do mundo. A simples força de sua personalidade e sua incrível habilidade de transmitir o que acontecera com frases inesquecíveis, duras e cortantes, desenterraram o Holocausto dos livros de História. “Lembremo-nos”, dizia, “lembremo-nos
Muito tem-se escrito sobre Elie Wiesel e muito ainda está para ser escrito; líderes do mundo todo se manifestaram por ocasião de seu falecimento. Para o primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, ele representava “a vitória do espírito humano sobre a crueldade e o mal”. Para Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, ele era “a consciência do mundo, alguém que conseguiu mudar o mundo como cidadão mais do que ocupando cargos ou as tradicionais posições de poder”. Escritor, palestrante, filósofo, professor de ciências humanas, ativista dos direitos humanos, presidente fundador do Memorial do Holocausto dos EUA em 34
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prêmio nobel da paz de 1986, wiesel diante de uma foto em que ele próprio aparece junto outros internos, no campo de concentração de Buchenwald, em 1945. museu Yad Vashem, dezembro de 1986
dos heróis de Varsóvia, dos mártires de Treblinka, das crianças de Auschwitz. Eles lutaram sozinhos, sofreram sozinhos, viveram sozinhos, mas não morreram sozinhos, pois algo em nós morreu com eles”. Wiesel viveu atormentado por ter sobrevivido. “Se sobrevivi deve ter sido por alguma razão”, dizia. Ao receber o Prêmio Nobel da Paz, declarou que decidira dedicar sua vida “a manter viva a memória” e a lutar contra todos aqueles que tentam negar o Holocausto – todos os que dizem que não aconteceu, ou que não aconteceu da maneira ou nas proporções que são historicamente comprovadas. “Porque”, afirmou Wiesel “se nos esquecermos, seremos culpados, seremos cúmplices”. Sua vontade era “arrebatar aquelas vítimas do esquecimento, ajudar os mortos
a vencer a morte (...). Devo minha memória aos mortos. Tenho o dever de servir como seu emissário, transmitindo a história de seu desaparecimento, mesmo se for perturbadora, mesmo se trouxer dor”.
wiesel no verão de 1945, na frança, aos 16 anos de idade
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A vida antes de Auschwitz Elie Wiesel era o único homem dos quatro filhos de Shlomo e Sarah Wiesel. Ele nasceu em 1928 em Sighet, um típico shtetl judaico, nas montanhas dos Cárpatos, na Romênia, uma área que fez parte da Hungria de 1941 a 1945. Seu pai era dono de um armazém e a família vivia confortavelmente. O mundo do jovem Elie girava em torno de D’us, de sua família, sua comunidade, do estudo da Torá, do Talmud e dos ensinamentos místicos do Chassidismo. Fascinado pelos contos e lendas chassídicas, sua ambição era um dia estudar Cabalá. Elie não sabia que no fatídico 19 março de 1944 a vida dos judeus húngaros iria mudar tragicamente e que o mundo onde ele vivia seria irremediavelmente destruído. SETEMBRO 2016
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Naquele dia a Alemanha ocupou a Hungria e Adolf Eichmann deu início à mais rápida das grandes operações de assassinato do Holocausto. Já em abril os cerca de 500 mil judeus do leste da Hungria são confinados em guetos e, em 15 de maio, têm início as deportações. Todos os dias, 3 mil judeus eram amontoados em vagões de gados e levados para Auschwitz – 95% deles morreram ao chegar. Os judeus de Sighet estavam entre os deportados. Em seu livro “Memoirs, all rivers run to the sea” (Memórias, todos os rios correm para o mar) publicado em 1995, Elie recorda que tinha 15 anos quando brutalmente descobriu “o Mal absoluto”, quando foi “atirado em um universo assombrado onde a história da aventura humana parecia oscilar irrevogavelmente entre o horror e a maldição”. Ele recorda a rapidez da ação nazista: o gueto; a deportação; os vagões de gado vedados. Recorda a chegada a Auschwitz, sua mãe e Tzipora, sua doce irmã caçula, enviadas para as câmaras de gás…
Em sua obra, Elie condena os líderes ocidentais que, desde 1942, possuíam provas da intenção de Hitler de aniquilar o Povo Judeu. O mundo sabia e manteve silêncio. Por que, se pergunta Wiesel, por que ninguém alertou os judeus húngaros, os de Sighet? Se alguém os tivesse alertado, acusa Wiesel, eles poderiam ter fugido, se escondido, milhares teriam sido salvos... Sua primeira noite em Auschwitz, que ele reconta em seu primeiro livro sobre o Holocausto, “Noite”, é uma das passagens mais pungentes do livro: “Nunca hei de esquecer aquela noite, a primeira noite no campo, que fez da minha vida uma longa noite, sete vezes amaldiçoada e sete vezes selada. Nunca hei de esquecer aquela fumaça. Nunca hei de esquecer os rostinhos das crianças, cujos corpos vi se tornarem anéis de fumaça sob um céu azul silencioso. Nunca hei de esquecer aquelas chamas que consumiram minha fé para sempre. Nunca hei de esquecer o silêncio noturno que me privou, para toda a eternidade, do desejo de viver.(...). Nunca hei
elie wiesel e a esposa com seu filho shlomo elisha, em n.y., 1973
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de esquecer dessas coisas, ainda que eu seja condenado a viver tantos anos quanto o próprio D’us. Nunca”. O famigerado Dr. Mengele “julgara” Elie e o seu pai, Shlomo, capazes de realizar trabalhos forçados e, por isso, não foram enviadas às câmaras de gás, tendose tornado escravos obrigados a trabalhar até morrer. Os nazistas tatuaram no braço de Elie sua nova identidade, o número que o marcava como escravo e não ser humano. Depois de algumas semanas, pai e filho foram enviados para trabalhar em Auschwitz III, um dos subcampos de trabalho, também conhecido como Buna. De todas as terríveis experiências, a mais horrorosa foi ter que assistir o enforcamento de uma criança pequena perante todo o campo de morte. “Atrás de mim”, escreveu, “ouvi um homem perguntando: ‘Onde está D’us agora?’. E eu ouvi uma voz dentro de mim responder: ‘...Aqui, Ele... está bem aqui, pendurado nesta forca’ ”. Durante toda a sua vida, as crianças judias capturadas pela loucura nazista o assombraram. “Eu os vejo, repetidamente... perseguidos, acossados, humilhados, curvados como os velhinhos que os encobriam, tentando em vão protegê-los... As pessoas pensam que um assassino se enfraquece diante de uma criança; que a criança pode despertar a humanidade perdida do assassino. Não dessa vez. Conosco, foi diferente. Nossas crianças judias não causaram nenhum efeito nos assassinos. Nem no mundo”... A guerra estava no final e a Alemanha sabia que estava derrotada, mas apesar disso a caça
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e extermínio dos judeus continuava. Hitler não desistira de sua guerra contra os judeus, de sua promessa de aniquilá-los. No final de 1944, com as forças soviéticas se aproximando, os nazistas iniciaram a remoção dos prisioneiros de Auschwitz para campos localizados na Alemanha. Nos últimos dias de janeiro de 1945, em pleno inverno, as SS evacuaram os 60 mil prisioneiros, entre eles Elie e o pai. Os poucos que ficaram foram libertados no dia 27 de janeiro pelos soviéticos. Expostos ao frio extremo sem praticamente nenhum agasalho, comida ou água, os prisioneiros evacuados foram obrigados a caminhar por longas distâncias, antes de serem despachados para Buchenwald em vagões descobertos. Poucos chegaram com vida. Elie viu seu pai morrer um pouco, a cada dia. Quando ele finalmente morreu, em 29 de janeiro de 1945, Elie não derramou uma lágrima sequer, pois “já não tinha mais lágrimas”, conforme escreveu no livro “Noite”. No dia 11 de abril, Wiesel estava entre 20 mil prisioneiros libertados pelo 3° Exército estadunidense. Horas antes da entrada dos americanos no campo de Buchenwald, prisioneiros pertencentes a uma organização de resistência conseguiram tomar o controle, evitando a liquidação dos judeus. Nos dias que se seguiram, por causa de uma intoxicação alimentar, Elie ficou entre a vida e a morte. Na última passagem do livro “Noite”, Wiesel descreve o momento em que conseguiu emergir – ainda no hospital para onde fora levado – do estado de fraqueza absoluta em que se encontrava e se olhou no espelho pela primeira vez desde a deportação. Aquela imagem de si próprio, de um cadáver que o olhava e interpelava, nunca o abandonou.
Presidente Jimmy Carter e elie wiesel, presidente da comissão presidencial sobre o holocausto, na celebração do holocausto em 25/4/79, no capitólio, Washington
A vida depois de Auschwitz Elie estava entre os 400 órfãos que foram enviados para a França para se recuperar, tentando voltar a ter “uma vida normal”. O jovem ficou na Normandia numa casa da organização humanitária judaica OSE (Oeuvre de Secours aux Enfants). Foi nesse período que soube que suas duas irmãs mais velhas, Hilda e Bera, haviam sobrevivido. Elie voltou a estudar os textos judaicos sagrados, em suas palavras: “Resgatei meu fervor religioso, talvez como uma maneira de fechar um parêntese em meu passado recente... para voltar a encontrar meu caminho”. Continuou sendo judeu praticante pelo resto de sua vida, apesar de ter “suas questões com D’us”, como costumava dizer, pois tinha dificuldade de “conciliar o conceito de um D’us benevolente com o mal absoluto do Holocausto”. Quando lhe perguntaram se era religioso, Wiesel respondeu que quando jovem “eu era muito, muito religioso, mas em Auschwitz questionei o silêncio de D’us... Será 37
que isso significa que parei de ter fé? Não. Tenho fé, mas questiono”. Ele se tornou mais devoto à medida que os anos se passavam, indo à sinagoga perto de sua casa ou às sinagogas chassídicas de Brooklyn. “Se tenho problemas com D’us, por que deveria culpar o Shabat?”, perguntou certa vez. Como milhares de outros sobreviventes, Wiesel queria ir para a então Palestina, mas não estava entre os que obtiveram os certificados de entrada – entre eles, Israel Meir Lau, o futuro rabino chefe de Israel, e seu irmão. Quarenta anos depois, ao se encontrar com Elie, o Rabino Lau o fez lembrar que fora ele quem lhe ensinara a recitar o Kadish de cor. Wiesel passou a participar de reuniões de movimentos sionistas e seguia com apreensão a luta dos judeus na então Palestina contra os britânicos. Acompanhava com interesse o Julgamento em Nuremberg e os problemas e sofrimentos dos judeus que haviam sobrevivido e estavam nos campos de pessoas deslocadas. Entre eles, sua irmã Bera. A verdade, aponta Wiesel em Memoirs, é que “o sofrimento SETEMBRO 2016
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dos sobreviventes não terminara com a guerra; o mundo não queria saber deles, nem antes nem depois... Aqueles que foram idiotas e retornaram a seus países de origem quase sempre depararam-se com grande hostilidade...”. Em 1948, mudou-se para Paris e se matriculou na Sorbonne onde cursou literatura e filosofia. Já dominava o francês, idioma no qual escreveu praticamente todos os seus livros. Garantia o sustento dando aulas de hebraico e escrevendo artigos para várias publicações francesas e judaicas. No dia da Declaração de Independência de Israel, 14 de maio de 1948, “dia tão esperado, aurora de nossos sonhos”, Wiesel escreveu em Memoirs que não conseguira conter a emoção. “Quando foi que chorei, por último? Foi com o mais doloroso sentido de reverência que eu recebi o Shabat, o Shabat mais bonito e luminoso da minha vida. Aquele Shabat não foi uma oferenda a Israel, aquele dia Israel foi uma oferenda ao Shabat”.
A alegria, no entanto, veio junto com um profundo temor, pois Israel já lutava por sua sobrevivência, “apesar dos contingentes inferiores e do armamento inferior, eles já estavam lutando como nos dias dos Macabeus. Perder seria o fim de um sonho, o fim de Eretz Israel”. Mas, Israel ganhou, apesar de ter perdido parte de Jerusalém. “Gritei, de raiva e tristeza, quando soube da rendição da Cidade Velha”...
O reino da memória “Se há um tema único que domine todos os meus escritos, todas as minhas obsessões, esse tema é a memória, porque temo o esquecimento tanto quanto o ódio e a morte”, afirmava. “Não esqueçam que são judeus, os pais costumavam dizer a seus filhos e filhas quando deixavam seus lares... Nenhum outro mandamento bíblico é tão persistente como o da lembrança... Os judeus vivem e crescem sob o signo da memória”. “Esquecer, para um judeu, é negar seu povo – e tudo o que
recebendo o prêmio nobel da paz, em 1986
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isso simboliza – e também negar a si próprio”... E Wiesel jamais esqueceu... Seu primeiro testemunho sobre seu sofrimento e de todo o seu povo durante a Shoá foi uma obra de 862 páginas, em iídiche, com o título Un die Welt Hot Geshvign (E o Mundo Ficou em Silêncio). Um dos que sempre encorajaram Wiesel a “prestar testemunho” em nome dos milhões de pessoas que tinham sido silenciadas foi François Mauriac, prêmio Nobel de Literatura em 1952. Durante a entrevista que Mauriac concedeu a Wiesel, em 1955, o escritor francês lhe disse que não conseguia deixar de pensar nos milhares de crianças judias que os nazistas haviam deportado. “Eu fui uma delas”, revelou-lhe Wiesel. Wiesel escreveu uma nova versão reduzida, de umas 127 páginas, em francês, de suas memórias de Auschwitz, com o titulo de Nuit (Noite). Mauriac, a primeira pessoa que a leu, escreveu o prefácio. O estilo da obra é tenso, controlado, com frases curtas, pois ele queria que os eventos falassem por si só. Ao lhe perguntarem o que ele tinha feito com a versão original, respondeu: “É uma memória, um testemunho, por isso julguei que deveria guardá-lo e um dia talvez o publique”. O livro foi publicado em inglês pela editora Wang & Hill, que lhe ofereceu um adiantamento de apenas US$100. Embora tendo recebido boas críticas, o livro vendeu apenas 1.046 cópias. “Na época, o Holocausto não interessava”, Wiesel disse em 1985 à revista Time. O interesse aumentou após Adolf Eichmann ter sido capturado na Argentina e levado a Israel para ser julgado. Wiesel, então correspondente de um jornal judaico americano, estava presente
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no julgamento. Em virtude do julgamento, o mundo começou a compreender e reviver a enormidade dos crimes alemães. Wiesel foi um dos primeiros sobreviventes do Holocausto a expor seus verdadeiros horrores. Sua fala carismática e sua escrita prolífica, elegante e, sobretudo, pungente, trouxeram-lhe inúmeros seguidores. Ele passou a personificar o sobrevivente do Holocausto. Nos anos que se seguiram, seu livro “Noite” vendeu mais de 10 milhões de cópias. Vivendo desde 1955 em Nova York, tornou-se cidadão americano em 1963 e, em 1969, casou-se com uma judia austríaca, Marion Ester Rose, também sobrevivente do Holocausto. Escritora e editora, Marion editou e traduziu muitas das obras do marido. Em 1972, o casal teve um filho, Shlomo Elisha. A partir de 1972, Wiesel passou a ocupar a Cadeira de Estudos Judaicos na Universidade da Cidade de Nova York até 1976, quando se tornou Professor de Ciências Humanas na Universidade de Boston.
mas raramente oferecia as respostas. A verdade, ele escreveu: “Nosso inimigo pode nos matar, mas ele é impotente perante o que nós personificamos”.
Mensageiro Elie Wiesel escreveu 50 livros de ficção, ensaios e reportagens, duas peças de teatro e até mesmo duas cantatas. Escreveu sobre os mestres chassídicos, profetas bíblicos ou judeus soviéticos, sua angústia, seu despertar, sua coragem. Mas todos os seus escritos lidavam com profundas questões que ressoavam a partir do Holocausto: qual o sentido de viver em um mundo que tolerava a crueldade inimaginável? Como pôde o mundo manter-se mudo? Como continuar crendo em D’us? Wiesel lançava as perguntas,
Sempre afirmava que não queria escrever livros acerca do Holocausto; nenhum dos sobreviventes o queria. Mas ele tinha que escrevê-los ao perceber que se os sobreviventes não se expressassem, todo aquele período seria esquecido. Pior ainda, ajudaria seus detratores a dizer que aquele horror não tinha ocorrido. “Não transmitir uma experiência é traí-la; é isso o que a tradição judaica nos ensina”. Contar a história era o último dos desejos dos mortos. “O temor do esquecimento era a principal obsessão de todos os que haviam passado pelo universo dos condenados. O inimigo contava com o fato de que ninguém iria acreditar que aquele universo maldito realmente existira; contava com o esquecimento das pessoas. Lembre-se, disse o pai a seu filho, e o filho a seu amigo: reúnam os nomes, os rostos, as lágrimas. Se, por um milagre, alguém sair daqui vivo, tentem revelar tudo, não omitindo nada, não esquecendo nada. Esse foi o juramento que todos fizemos: ‘Se, por algum milagre, eu sobreviver, dedicarei minha vida a testemunhar em nome de todos aqueles cuja sombras ficarão coladas à minha para todo o sempre’”. Mas, como ele poderia escrever sobre algo tão terrível? “Eu não queria usar as palavras erradas”. Ele via-se assombrado com o que ele chamava de seu “conflito dialético”: a necessidade de contar o que tinha visto e a futilidade de explicar um evento que desafiava a razão e a imaginação.
com a esposa, marion
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Buchenwald com Elie Wiesel em 2009, chamou Wiesel de “memorial vivo”. Em uma declaração, disse: “Ele ergueu a voz não apenas contra o antissemitismo, mas contra o ódio, o preconceito e a intolerância de todas as formas. Implorou a cada um de nós, como nações e como seres humanos, a fazer o mesmo, a nos vermos no outro e a tornar realidade a promessa do ‘Nunca mais’”.
Elie Wiesel, com o presidente Barack Obama e a chanceler alemã Angela Merkel, em Buchenwald. julho 2009
“Nós, sobreviventes, nós todos sabíamos que nunca poderíamos dizer o que tinha que ser dito, que nunca poderíamos exprimir em palavras – coerentes, inteligíveis – nossa experiência de loucura em escala absoluta. Nossas palavras apenas poderiam evocar o incompreensível. Esta é a maior tragédia das vítimas. O gueto e os vagões vedados, as crianças arremessadas vivas às chamas, os idosos com a garganta cortada, as mães com o olhar desvairado, os filhos impotentes para aliviar a agonia dos pais: uma pessoa “normal” não consegue absorver tanto horror... Um bruto golpeia, um corpo cai; um oficial ergue o braço e toda uma comunidade caminha em direção a uma vala comum… A marcha durante noites flamejantes, o silêncio antes e após a seleção, a oração silenciosa dos condenados, o Kadish dos que agonizavam, o medo e a fome, a vergonha e o sofrimento, os olhos assombrados – uma pessoa normal não consegue absorver tanta escuridão, nem pode entender,
nem mesmo ter a esperança de entender. E eu pensei que nunca teria condições de falar deles. Todas as palavras pareciam inadequadas, gastas, tolas, sem vida, e eu queria que elas queimassem o coração, a alma. O que nós sofremos não encontra palavras na linguagem: situa-se em algum lugar além da vida e da história. Fome, sede, humilhação, espera, morte; para aqueles que passaram pelo inferno, essas palavras revestem-se de diferentes realidades. A linguagem do campo de concentração negou todas as demais línguas e tomou o lugar das mesmas. Ao invés de unir as pessoas, tornou-se um muro entre elas. Poder-se-ia escalar esse muro? Poderia o leitor ser levado ao outro lado? Eu sabia que a resposta era ‘não’, mas eu também sabia que o ‘não’ tinha que se tornar um ‘sim’...”
Wiesel sempre falou a favor dos oprimidos. Condenou os massacres na Bósnia, Camboja, Ruanda e a região de Darfur, no Sudão. Condenou, também, o incêndio das igrejas dos negros, nos Estados Unidos, e defendeu os negros da África do Sul e os prisioneiros políticos torturados da América Latina. Mas, o sofrimento dos judeus era a maior de suas preocupações. Em seu livro de 1966, “The Jews of Silence: A Personal Report on Soviet Jewry”, (Os judeus do silêncio: Um relato pessoal sobre o Judaísmo Soviético), ele expôs o drama dos judeus na União Soviética que estavam sendo perseguidos por sua religião e, no entanto, eram impedidos de deixar o país. “O que mais me atormenta, não são os “judeus do silêncio” que conheci na Rússia, mas o silêncio dos judeus entre os quais vivo, hoje”, disse. Seus esforços ajudaram a atenuar as restrições emigratórias.
Denunciando a perseguição
Wiesel teve um papel primordial na criação do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos, em Washington, servindo de presidente da comissão que reuniu grupos de sobreviventes na arrecadação de fundos para a construção de uma estrutura permanente.
O presidente Obama, que visitou o local do campo de concentração de
Quando o museu foi criado, Wiesel escreveu que a razão para a sua
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1. Acendendo a “Chama Eterna”, junto com o Presidente Clinton, no Museu do Holocausto,EUA,1993 2. Com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, 2001 3. Com Shimon Peres, 2008 4. No Parlamento húngaro, Budapeste, 2009 5. Com Nathan Sharansky, 2012 6. Com o veterano da 2a Guerra Scottie OOton, que ajudou a liberar um campo de concentração, em 2013
criação foi homenagear o último desejo das vítimas de contar e negar aos nazistas uma vitória póstuma, protegendo o futuro da Humanidade de que uma tamanha maldade voltasse a acontecer. Sempre manteve a crença de que “apesar de que nem todas as vítimas do Holocausto eram judeus, todos os judeus foram vítimas do Holocausto”. Wiesel acreditava que o Museu do Memorial precisava manter viva a lembrança do assassinato dos demais grupos: comunistas, ciganos, homossexuais, mas a maior ênfase devia ser dada à aniquilação dos judeus. Falando da singular natureza da tragédia judia, disse: “Não quero ser condescendente nem minimizar o sofrimento dos outros. Quero ter a mesma compaixão por todas as vítimas. Mas, o Holocausto foi um caso à parte. Pela primeira vez, foi posta em ação uma operação para matar todos os judeus do mundo, onde quer que estivessem”.
Amor por Israel Wiesel amava o Povo Judeu, Israel, Jerusalém. Em 2010, publicou um anúncio no The New York Times, “Para mim, o judeu que sou, Jerusalém está acima da política. Está mencionado mais de 600 vezes nas Sagradas Escrituras – e nem uma única vez no Corão... a primeira canção que ouvi dos lábios de minha mãe foi uma canção de ninar sobre e para Jerusalém”. Wiesel também se manifestou contra o acordo do Presidente Barack Obama com o Irã, publicando outro anúncio no The New York Times: “Será que não devemos mostrar nosso apoio pelo que pode ser o último aviso antes de fecharem um terrível acordo? Como alguém que viu os inimigos do Povo Judeu cumprirem a promessa de suas ameaças de exterminar-nos, como poderia me calar?” Wiesel alertou acerca do “objetivo genocida do Irã contra Israel” e conclamou ao “total 41
desmantelamento da infraestrutura nuclear do Irã”. Nenhuma citação resume melhor o apoio de Elie Wiesel ao Povo Judeu do que esta: “Existe Israel, ao menos para nós. O que nenhuma outra geração teve, nós temos. Nós temos Israel apesar de todos os perigos, as ameaças e as guerras, nós temos Israel. Podemos ir a Jerusalém. Gerações e gerações não podiam, e nós podemos”. “É claro para mim que não se pode ser judeu sem Israel. Religiosos ou não religiosos, sionistas e não-sionistas, asquenazis ou sefardis – todos eles não existirão sem Israel”. Bibliografia
Wiesel, Elie, Night. Kindle edition Wiesel, Elie, All Rivers Run to the Sea: Memoirs. Kindle edition Wiesel, Elie, And the Sea Is Never Full: Memoirs. Kindle edition Wiesel, Elie, From the Kingdom of Memory: Reminiscences. Kindle edition Wiesel, Elie, After the Darkness: Reflections on the Holocaust, Ed. Schocken SETEMBRO 2016
israel
Explosão de cores em Israel Seja no verão, no inverno, na primavera ou no outono, é sempre tempo de se admirar as flores em Israel. Aliando tecnologias avançadas às condições naturais do país, os produtores israelenses estão conquistando o mercado europeu com a singularidade das várias espécies cultivadas no país, assim como aquelas que crescem como dádivas da natureza.
e
m 1948, o então primeiro-ministro David Ben-Gurion prometeu que o recémcriado Estado de Israel faria o deserto florescer. Quem viaja pelo país atualmente percebe rapidamente que a promessa foi cumprida. De norte a sul do território israelense crescem as mais variadas espécies de flores colorindo a paisagem. Em campos abertos ou em estufas equipadas com avançadas tecnologias são produzidas toneladas de flores que transformaram o Estado Judeu no segundo maior exportador para a União Europeia, ficando atrás apenas da Holanda, há décadas o maior produtor mundial e sede dos maiores e mais importantes leilões do setor. No final da década de 1970, Israel foi o primeiro país estrangeiro a participar dos leilões e feiras da Holanda, dos quais, até então, tomavam parte apenas produtores holandeses.
recentes indicam que 90% das peônias, anêmonas, íris e ciclamens, entre outras espécies, chegam anualmente ao mercado internacional. Atualmente, a exportação israelense de flores – in natura ou em sementes e bulbos, plantas e materiais de propagação – soma cerca de US$ 200 milhões anuais; em 2000, este número chegava a US$ 50 milhões. Israel é considerado líder mundial na produção de plantas e flores cultivadas em clima quente e seco e um dos principais exportadores de produtos e equipamentos agrícolas de alta tecnologia para a União Europeia. As vendas externas israelenses em agricultura respondem por mais de 2% do Produto Interno Bruto e, deste total, 30% são principalmente de produtos in natura. Nem a queda do índice anual de chuva, a aridez do solo ou as constantes reduções no volume de água destinado à agricultura têm sido capazes de enfraquecer a cada vez mais forte indústria das flores de Israel. Aliás, a maior parte da produção de flores está concentrada no sul do país, ou seja, na região mais árida, que registra apenas 25 mm de chuva por ano. Em sua jornada para se consolidar como um dos
A média anual de 300 dias ensolarados e temperaturas relativamente quentes no inverno, principalmente no Deserto do Neguev, são condições ideais para o cultivo de flores no verão e, também, para o seu crescimento natural ao longo do ano. Este quadro favorável aliado à tecnologia de ponta tem garantido o crescimento da indústria de flores cortadas de Israel. Pesquisas 46
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SOLDADO ISRAELENSE EM UM CAMPO DE RANÚNCULOS, PERTO DO KIBUTZ NIR YITZHAK, AO SUL DE ISRAEL. (FOTO Amir Cohen/Reuters)
grandes produtores de flores para a Europa, o país tem investido continuamente na pesquisa para o desenvolvimento de novas espécies capazes de se adaptar às condições ambientais da região, ou seja, plantas que necessitem cada vez menos água para sobreviver e aptas a crescer em meio às pedras, ao asfalto (consequência da urbanização crescente) e aos espinhos. O Centro Volcani para Pesquisa Agrícola e o Centro para Floricultura em Regiões Áridas, órgãos do Ministério da Agricultura, são os dois principais institutos que atuam nessa área, com diferentes departamentos. Paralelamente a esse trabalho, as universidades israelenses também mantêm unidades de pesquisa. A botânica Sima Kagan, do Centro Volcani, tem dedicado seus últimos 20 anos de carreira a encontrar
soluções para esse desafio. Ela viaja o mundo em busca de plantas ornamentais que consigam se aclimatar às duras condições do meio ambiente israelense, sobrevivendo ao verão e à seca. Um dos resultados do esforço concentrado dos cientistas é a variedade das plantas ornamentais
hoje distribuídas no país e enviadas ao exterior com o selo “Made in Israel”. Anêmonas (em hebraico, kalanit), ciclamens (rakefet), narcisos (narkis), tremoço (tourmus) e outras flores silvestres nativas, como a íris, enfeitam jardins e parques da maioria das cidades israelenses. Mas nem sempre foi assim e muitas espécies estiveram ameaçadas de extinção. No entanto, a legislação clara e programas educacionais implantados nos últimos 50 anos garantem que a primavera se transforme em uma explosão de cores mesmo nas regiões mais áridas do território nacional. Amir Cohen faz parte da terceira geração de produtores de flores do país. Suas gérberas coloridas são vendidas por toda a Europa, tendo conquistado fama por seu padrão
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que os pedidos chegam em dois dias ao seu destino no exterior.
Um arco-íris de flores
Estufa para flores no Mar da Galileia (Kineret)
de alta qualidade e beleza. Em suas estufas, na cidade de Kfar Yedidia, crescem dezenas de milhares de flores por ano destinadas tanto ao mercado interno quanto ao externo. Segundo Amir, as cores das flores variam muito de acordo com a época do ano. Enquanto que nos feriados cristãos a procura maior é por plantas brancas e vermelhas, no inverno a demanda é por flores de cor laranja. No verão, rosa e amarelo estão na liderança. A apenas 15 minutos de Beit Shemesh, no pequeno moshav Sdot
Micha, milhares de rosas púrpura e amarelo e anêmonas vermelhas são cultivadas em fileiras mantidas constantemente limpas e úmidas pelo proprietário do campo, Beni Sharoni. Diariamente, centenas de embalagens cartonadas são transportadas do local refrigerado de empacotamento para o aeroporto, rumo à Europa. Uma das vantagens do cultivo das anêmonas é o fato de não precisarem de controle de temperatura no inverno, permitindo a colheita diária. O sistema de produção, colheita, embalagem e distribuição é tão eficiente e exato
iris ioessicola
Seja no verão, no inverno, na primavera ou no outono, é sempre tempo de se admirar as flores em Israel, seja em estufas ou em campos abertos. A melhor época, no entanto, é entre meados de fevereiro e final de março, quando as flores silvestres surgem em todo o seu esplendor. Nesta época costuma ser realizado o Scarlet South Festival, na região nordeste do Deserto do Neguev, quando são organizados passeios gratuitos em meio a tapetes vermelhos de anêmonas na Área de Recreação Reím e na Floresta Ruhama. Em março, também, é possível se apreciar o auge da florada das anêmonas e dos botões de ouro no chamado Campo das Anêmonas em Kfar Yarok. Estas também florescem ao norte e ao sul da estrada que leva a Beit Shmesh, mas estão concentradas principalmente na região de Givat Haturmasim, ao lado de tremoços vermelhos. Amendoeiras e ciclamens também são abundantes de fevereiro a março na reserva de Sataf, uma área preservada a leste do Monte Eitan, nas proximidades da área ocidental de Jerusalém. Os ciclamens, cujas cores variam do branco ao rosa escuro, são também chamados de Fogo de Salomão, pois parecem chamas que saltam das pedras e das sombras. Ao norte de Tel Aviv está o Vale dos Narcisos, ou Emek HaNarkisim, no cruzamento de Glilot. Ali, também, há muitos campos de margaridas silvestres. Na Reserva Natural Carmel, nas proximidades da Universidade de Haifa, os tremoços e as íris
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1. iris haynei 2. iris vartani 3. iris ioessicola
formam verdadeiros tapetes que se estendem por toda a região. Ali, também, pode-se presenciar mais um pequeno milagre da natureza: o crescimento de uma variedade singular de grandes tulipas cujas pétalas lembram as listras amarelas e marrons dos tigres. No Vale de Beit Shean, no alto do Monte Gilboa, está o habitat natural da espécie de íris que leva o nome da montanha. É, ainda, a flor escolhida para ser o símbolo da Sociedade de Proteção da Natureza de Israel. A melhor época para vê-las em todo o seu apogeu são os meses de março e abril. Há mais de 260 espécies de íris em todo o mundo sendo que muitas crescem naturalmente em território israelense e algumas apenas ali. A íris é considerada uma das flores silvestres mais bonitas de Israel e cresce nas montanhas da Judeia e também nas Colinas do Golã. A exótica íris marrom escura do Neguev floresce em uma área do KKL próxima a Beersheva.
vez menos recursos hídricos sem diminuir o padrão de seus produtos. Ainda assim, apesar das dificuldades, as flores ainda representam um dos maiores itens na pauta de exportação de Israel e um ótimo negócio para o setor agrícola.
Fortes conexões Diversas plantas nativas encontradas no moderno Estado de Israel estão mencionadas em vários textos bíblicos, comprovando a estreita ligação entre o Povo Judeu e a terra de seus ancestrais, há milênios de anos. Há aproximadamente cem plantas mencionadas na Torá e cerca de 400 na Mishná e no Talmud, citadas em diferentes contextos. Algumas fazem parte de narrativas
referentes aos rituais realizados no Templo; outras em situações do cotidiano e outras, ainda, pelo seu uso medicinal. As chamadas sete espécies bíblicas trigo, cevada, uva, figo, olivas, romãs e tâmaras - são mencionadas em Deuteronômio 8:8 e ainda crescem em amplas áreas da paisagem israelense e desempenham um papel especial na tradição judaica. “Uma terra de trigo e cevada, e vinhas, e figueiras e romã; uma terra de azeite de oliva, e mel ”, assim é definida a Terra Prometida aos judeus. Na Antiguidade, estes alimentos eram elementos básicos da dieta da população e apenas as primícias das sete espécies podiam ser utilizadas como oferenda ao Templo.
Os produtores israelenses enfrentam atualmente um duplo desafio: encontrar novas variedades e produtos que atendam à demanda do mercado, estando sempre um passo à frente de seus concorrentes, e, ao mesmo tempo, usar cada 49
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acrescentando-se suco de figo. Segundo citação em Isaías 38:21, o figo possui qualidades medicinais sendo, no passado, usado como cataplasma. A romã também foi trazida pelos espiões para mostrar a fertilidade da Terra de Israel. A romã possui 613 grãos, número que corresponde às 613 mitzvot mencionadas na Torá. As romãs são, também, um elemento muito presente nas obras de artistas judeus e seu suco é usado na produção de corantes vermelhos. jardim das oliveiras
O trigo hoje semeado em todo o mundo tem origem no trigo silvestre da Terra de Israel ou dos países próximos. Atualmente, no moderno Estado Judeu, é plantado principalmente na região norte do Deserto do Neguev e colhido em Shavuot. No passado, a farinha de trigo era consumida principalmente pelos ricos. Nos tempos bíblicos, segundo o Livro de Reis 2, 7:1, a cevada era usada como forragem e custava a metade do preço do trigo. Os mais pobres a consumiam como mingau e para fazer bolos. Menos popular que o trigo, não crescia com facilidade nos campos, era áspera e mais difícil de mastigar e digerir. Em Ruth 1, conta-se que a forragem teria chegado a Belém (Bethlehem) no início da colheita da cevada.
dois homens para carregá-lo. O vinho é um elemento importante dos rituais judaicos no Shabat e nas festas. O figo aparece pela primeira vez na Torá nos primeiros capítulos do Gênese, quando Adão e Eva cobrem sua nudez com folhas de figueira. Na Antiguidade, eram plantadas em jardins ao longo do país e seus frutos eram considerados nutrientes baratos. O queijo poderia ser talhado
A oliveira é uma das mais antigas e mais valiosas árvores do Oriente Médio, tanto pela sua fruta quanto pelo óleo e madeira. O azeite de oliva era utilizado para o acendimento da Menorá no Templo, além de ser um componente importante da dieta alimentar dos antigos israelitas, que já conheciam suas qualidades cosméticas. O ramo de oliveira é, até os dias de hoje, símbolo da paz inspirado no episódio do dilúvio, quando a pomba levou a Noah uma folha de oliveira para mostrar que havia terra nas proximidades da arca (Gênese 8:11). Alguns estudiosos acreditam que as oliveiras podem viver por mais de mil anos e, ainda, produzir frutos. Em Israel, é proibido cortá-las. As tâmaras, mais especificamente o mel feito a partir delas, são mencionadas em fontes antigas. Nos tempos bíblicos e ainda hoje, Jericó é conhecida como Cidade das Palmeiras, pelas grandes tamareiras que ali crescem.
“O vinho alegra o coração do homem”, diz o Salmo 104: 14. As videiras são a primeira planta mencionada na Torá na história de Noah (Gênese 9:20). Já o texto em Números 13: 23 descreve como os espiões enviados por Moshé retornaram com um cacho de uvas tão grande que foram necessários
Bibliografia
http://www.wildflowers.co.il Keeping the desert blooming, artigo publicado no site www.new-ag.info Revista Eretz 50
ARTE
romance gráfico em quadrinhos Na Holanda sob ocupação nazista, escondido num sótão por mais de dois anos, Emmanuel, um jovem judeu, criou as aventuras do detetive Dompie Stompie, uma graphic novel, romance gráfico em quadrinhos, para se comunicar com sua futura esposa, Hetty, que estava num esconderijo a poucos quilômetros de distância.
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ais de 70 anos depois, Emmanuel Joels viu publicadas as aventuras do detetive feito de arame e, em abril deste ano de 2016, expostas no Museu Histórico Judaico de Amsterdã, uma instituição que anualmente recebe mais de 250 mil visitantes. Apenas Emanuel, hoje com 97 anos, auditor financeiro aposentado, dono de uma memória fotográfica, pôde ver sua criação ser exposta. Hetty infelizmente faleceu no ano passado. Por pouco também teria essa alegria.
Um policial holandês alertara Emanuel e Hetty com algumas horas de antecedência de que as SS iriam invadir e deportar todos os funcionários e pacientes do hospital psiquiátrico judaico de Apeldomn, cidade localizada a 90 quilômetros a leste de Amsterdã, onde Hetty trabalhava como enfermeira. O hospital era um dos poucos lugares onde os judeus ainda podiam trabalhar durante a ocupação nazista da Holanda.
É bem provável que a mostra não tivesse chamado tamanha atenção da mídia e do público não fosse o romântico pano de fundo que levou à sua criação, pois durante todo o tempo em que Emanuel e Hetty ficaram escondidos dos nazistas, as aventuras de Dompie Stompie foram o único meio de comunicação entre o jovem par de namorados.
Membros da Resistência esconderam os dois jovens na casa de duas famílias de cristãos holandeses que viviam a alguns quilômetros de distância e que, apesar dos poucos recursos, já abrigavam outros judeus. Era praxe da Resistencia esconder membros de uma mesma família em separado, assim caso um dos esconderijos fosse descoberto, nem todos seriam presos – como aconteceu com a família de Anne Frank.
Os jovens judeus conseguiram escapar à deportação para Auschwitz por um triz e sobreviveram escondido ao Holocausto. Estavam entre os poucos judeus holandeses que tiveram “sorte”, pois 75% dos que viviam na Holanda acabaram sendo dizimados pelos nazistas e seus cúmplices, inclusive muitos dos familiares do casal.
Precisa ser lembrado que era grande a coragem desses indivíduos que escondiam judeus, pois estavam colocando suas próprias vidas e a de seus familiares em risco, já que a punição para esse “crime hediondo” era a morte. Os que acolheram Hetty foram além. Cuidaram da jovem que havia contraído tuberculose 51
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ou E., como era chamado, então encontrou uma forma criativa e discreta de ficar em contato e apoiar-se mutuamente: criando as histórias em quadrinhos do Dompie Stompie. Ele queria distrair a noiva com desenhos que não traíssem nem o autor nem os leitores caso fossem, porventura, interceptados.
Emmanuel e Hetty Joels em Amsterdã, em 2012 (cortesia de Jet Naftaniel)
Cada romance gráfico era composto de cerca de 30 páginas de texto e desenhos coloridos, e não fazia menção à Guerra nem aos crimes cometidos pelos nazistas
trabalhando no hospital, apesar do grande risco de contágio, e mesmo tendo poucos recursos financeiros conseguiram os medicamentos e os alimentos necessários para seu tratamento. Apesar de estarem a salvo e em local relativamente próximo um do outro, o casal não podia se encontrar – seu local de esconderijo era separado por uma importante artéria de tráfego das tropas nazistas que eles não podiam se arriscar a atravessar. Emmanuel,
Personagens da novela gráfica “Dompie Stompie” (cortesia de Jet Naftaniel)
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Cada romance gráfico era composto de cerca de 30 páginas de texto e desenhos coloridos, e não fazia menção à Guerra nem aos crimes cometidos pelos nazistas. Eram histórias das viagens que Dompie Stompie fazia para países imaginários onde era chamado para solucionar crimes. Hetty recebia semanalmente um novo capítulo das aventuras. A filha de sete anos do casal que abrigava E., Geeske Schurink, incumbia-se de levar as histórias em quadrinhos para a jovem. A menina nunca disse uma palavra sequer sobre os “visitantes”, que se encolhiam no sótão quando os Schurinks recebiam visitas – inclusive alguns parentes pronazistas. Ao falar sobre os dois anos e meio em que esteve escondido, Emanuel disse ser “inacreditável que nenhuma das quatro crianças que viviam na casa, mesmo as menores, jamais tivessem dito, a quem quer que fosse, uma só palavra do que ali acontecia“. Após o término da Guerra, Emanuel e Hetty se casaram e tiveram duas filhas, Jet e Marian. O casal raramente falava às filhas sobre a Shoá e seus traumas. “Nossos pais só nos contavam coisas ‘positivas’ do Holocausto, os poucos pontos de luz daquele período obscuro, mas mesmo sendo crianças aquilo não nos convencia”,
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revela Jet. “Nós sabíamos que a maioria de nossos familiares morreram durante a Shoá e percebíamos a tensão na voz de nossos pais. Eles nos transmitiam suas ansiedades sem precisar mencioná-las”. Emanuel costumava contar às filhas desde a infância as aventuras de Dompie Stompie, durante as refeições em família. Há alguns anos, ao mudar seus pais para uma instituição para idosos, Jet e Marian encontraram os manuscritos das aventuras guardados em uma caixa de papelão, no fundo de um armário. Decidiram que algo precisava ser feito com os manuscritos. Quando foram finalmente publicadas, a primeiríssima cópia foi enviada a Geeske Schurink, que funcionara como pombo-correio entre Emmanuel e Hetty tantos anos atrás. Emanuel, com hoje 97 anos, raramente fala de suas emoções. Em uma entrevista, ele revelou que optou por desenhar porque era o hobby preferido na casa dos Schurinks, onde estava escondido. Ele se recorda que afastado do mundo exterior e sem ter o que fazer, decidiu desenhar para passar o tempo. Sua primeira tentativa artística foi desenhar de memória uma tábua do jogo de Monopólio para as quatro crianças da família Schurink. Elas nunca tinham ouvido falar no jogo. Durante a entrevista, E. afirmou que considera os desenhos de Dompie Stompie um tanto “bobos”, e conta que escolheu uma figura feita de um fio de arame para ser o protagonista de sua história em quadrinhos porque não sabia desenhar rostos. Revela ainda
“Dompie Stompie se encontra com os canibais” (cortesia de Jet Naftaniel)
que, ao contrário do que se tem especulado, ele jamais teve a intenção de fazer qualquer alusão à situação que viviam, criando a série apenas para transmitir seu amor a Hetty e como uma forma de cumprir a promessa feita de sempre manter vivo em suas vidas um ponto de luz, algo positivo, não importando as dificuldades que viessem a enfrentar.
O detetive Dompie Stompie
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Mas, para a curadora da mostra, a graphic novel é algo mais de que uma história em quadrinhos entre um casal de namorados. É “mais uma prova da bravura dos judeus durante o Holocausto”. E, para sua filha Jet - apesar das afirmações do pai - há algo mais na escolha de um personagem feito de arame. Ela acredita que “simboliza a simplicidade e a força” e, talvez, “as cercas de arame farpado que circundavam os guetos e os campos de concentração”. Ela ainda acredita que “o pássaro que captura o detetive no terceiro e último volume da série lembra a águia imperial que aparece com força no regime nazista, e um bunker camuflado no qual o pássaro o deixa cair evoca os anos em que seus pais viveram escondidos“. “Trata-se de uma linda história de família, mas, também, de uma incrível força de vontade de meus pais e de toda a sua geração de não sucumbir à escuridão, mesmo quando resistir parecia sem significado”, concluiu Jet. SETEMBRO 2016
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A arte de Issachar Ber Ryback Pintor, artista gráfico e escultor, Ryback, nascido na Ucrânia no final do século 19, foi um dos nomes mais importantes da arte judaica da avant-garde russa. Nas palavras do poeta francês Edouard Roditi, “Ryback pode ser reconhecido como um artista cuja genialidade pode ser comparada apenas com a de Marc Chagall”. O pintor jamais esqueceu suas origens - os temas judaicos, os personagens e as cenas do cotidiano do shtetl eram uma constante em suas obras.
A
crítica e o público reconheceram seu talento e sua criatividade desde sua estreia no universo das artes plásticas, em 1815. Durante sua curta vida, participou de mostras coletivas e inúmeras individuais na Rússia, França, Alemanha, Inglaterra, Holanda e Bélgica. O artista morreu ainda jovem, em 1935, aos 38 anos, às vésperas de sua primeira grande retrospectiva, na Wildenstein Galleries, em Paris.
Na época já demostrava o talento com o qual construiria uma carreira de sucesso. Ele se matriculou nos cursos para pintores de cenários e, ao completar o programa, começou a trabalhar n artel1, cooperativa com fins econômicos. O dinheiro que ganhava permitiu que continuasse seus estudos artísticos, apesar das objeções do pai. Em 1911 entrou na Academia de Arte de Kiev, onde se formou em 1916.
Primeiros anos
Nesse período, Ryback fazia parte de um grupo artístico informal de pintores judeus unidos por um profundo sentimento de auto-identidade nacionalista e um grande interesse pelas várias tendências da arte moderna. Além dele, o grupo contava com artistas como Boris Aronson, Alexander Tyshler, Salomon Nikritin, Mark Epstein e Isaac Rabinovich. Todos viriam a se tornar famosos. Os jovens foram influenciados por duas correntes de pensamento. De um lado, pela ideologia do chamado Grupo de Kiev, escritores iídiches (Grupo de Kiev de Homens das Letras em iídiche) considerados os teóricos e criadores da moderna cultura e literatura judaica. Foi um período de crescimento e desenvolvimento sem precedentes em termos da literatura e cultura iídiche. Esse Grupo de
Issachar Ber Ryback nasceu em 2 de fevereiro de 1897, em Elisavetgrad (atual Kirovograd), na Ucrânia Central. Apesar de seu pai descender de uma proeminente família chassídica, era um seguidor da Haskalá e admirador da cultura russa, e conseguira inculcar nos filhos o amor por essa cultura. Issachar era uma criança de uma saúde muito frágil; até os nove anos mal falava. Ele tinha dez anos quando seu pai o enviou para estudar no cheder do povoado, mas lá ficou pouco mais de um ano. Passava a maior parte do tempo desenhando. Começou a frequentar, às escondidas, as aulas noturnas de desenho ministradas aos trabalhadores das fábricas da região. 54
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“minha aldeia”. portifólio de litografias sobre papel. o álbum, com 15 trabalhos, foi publicado na década de 1960 ou início de 1970. galeria jean tiroche, israel
Kiev incluía David Bergelson – que se destacou como um dos melhores estilistas da prosa em iídiche –, Nachman Mayzil, Yehezkiel Dobrushin e David Hofstein.
1
Uma pequena sociedade voluntária integrada por pessoas cujo objetivo comum era desempenhar uma atividade econômica. Os membros de uma artel doavam seu trabalho, ferramentas e eventualmente dinheiro, dividindo os lucros de acordo com o valor e a qualidade do trabalho com o qual contribuíam.
2
Historicamente, o termo “avant-garde russa” se refere à arte de todos os países que eram parte da URSS/Rússia no início do século 20.
3
Um dos principais fundadores foi Pablo Picasso. O pintor cubista tenta representar os objetos em três dimensões, numa superfície plana, em formas geométricas, com o predomínio de linhas retas. Não representa, mas sugere a estrutura dos corpos ou objetos.
Por outro lado, os jovens artistas criaram estreitos vínculos com pintores da avant-garde2 russa, entre eles, Alexander Bogomazov e Alexandra Exter, que viviam então em Kiev. Ryback estudou no atelier da pintora Alexandra Exter. Foi ela que o apresentou ao cubismo3, ao desenho para teatro e a Boris Aronson, que posteriormente conquistaria Hollywood com seus cenários. Ryback apresentou seus trabalhos ao público pela primeira vez na Exposição da Primavera, em Kiev, em 1915. A maioria de suas telas, pintadas em estilo modernista, eram inspiradas em temas judaicos. 55
Durante os verões europeus de 1915 e 1916, ele acompanhou El Lissitzky, figura importante da avant-garde, em viagens organizadas pela Sociedade Judaica Histórica e Etnográfica. Os dois artistas percorreram toda a Ucrânia, visitando os shtetls da Bielorrússia, copiaram as pinturas que cobriam as sinagogas de madeira, na Podólia e na Volínia, os túmulos dos cemitérios judaicos e objetos cerimoniais em prata. Essa viagem despertou o interesse de Ryback na arte folclórica judaica e, a partir de então, ele inicia um acervo de objetos e das reproduções da vida judaica que fizera durante suas viagens.
Após a Revolução Bolchevique Durante a 1ª Guerra, a Ucrânia foi palco de sangrentas batalhas. setembro 2016
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Judeus em Moscou, sendo então aclamado pelos críticos como um dos mais brilhantes artistas de sua época. No ano seguinte, ele retrata, numa série de pinturas, a carnificina que foi a guerra civil russa.
“a velha sinagoga”, 1917, óleo sobre tela. museu de arte de tel aviv
A maioria de suas telas, pintadas em estilo modernista, eram inspiradas em temas judaicos
A entrada da Rússia na Guerra acelerou o colapso do Império Tzarista. Em fevereiro de 1917, a miséria e as derrotas sofridas nos campos de batalha pelo exército do Tzar levaram o povo russo a se revoltar. Em 15 de março, o tzar Nicolau II foi deposto dando início à Revolução Russa e, em novembro daquele mesmo ano, o Partido Bolchevique derrubou o governo provisório então no poder e impôs o governo socialista soviético. Após a Revolução de 1917, o Comitê Central da Kultur Liege de Kiev convidou Ryback para dar aulas de desenho e, nesta função, ele teve a oportunidade de visitar comunidades judaicas agrícolas. As experiências vivenciadas durante as viagens inspiraram seus últimos trabalhos, entre os quais, o álbum de litografia “On the Jewish Fields of Ukraine” (Nos Campos Judaicos da Ucrânia), de 1926.
issachar ber ryback
Ainda em 1917 participou de Exposição de Pintores e Escultores 56
Suas atividades artísticas se multiplicaram. Ele passou a ensinar desenho e pintura no Estúdio Infantil Judaico de Kiev e participou no lançamento da filial de Kiev da Sociedade Judaica de Estímulo às Belas Artes. Na primavera russa de 1918, juntamente com El Lissitzky e Iosif Chaikov, funda formalmente o Departamento de Arte da Kultur Liege, instituição que tinha como objetivo o desenvolvimento da moderna cultura judaica em iídishe na Ucrânia. Criou vários selos para editoras de livros judaicos e produziu, também, esboços de cenários e modelos em escala para as produções pioneiras da Liga Cultural do Estúdio Teatral que se antecipariam ao design construtivista de cenários. Ele foi o responsável pelas maquetes para os cenários do primeiro espetáculo montado na Kultur Liege. Em meados de1919, publicou, na revista em iídiche de Kiev, em colaboração com Boris Aronson, um importante artigo sobre a arte judaica, intitulado “Di vegn fun der yidisher maleray” (“Caminhos da Arte Judaica”), publicado in 1919. O ensaio serviu como um manifesto da arte de vanguarda judaica. O tema central eram as dificuldades enfrentadas para a definição e o estabelecimento de um “estilo nacional judaico”. De acordo com os autores, a arte
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judaica deveria representar uma síntese da tradição judaica artística com o movimento modernista. Eles acreditavam ser necessário o estabelecimento de uma iconografia judaica baseada na arte popular judaica, principalmente a partir da representação das letras hebraicas e da cópia dos artefatos folclóricos judaicos. As estilizações utilizadas por artistas judeus como colunas, veados, leões e candelabros, tornaram-se o padrão para a moderna arte judaica. O próprio Ryback pintou uma série de obras em que os símbolos judaicos e os motivos de arte folclórica apareciam interligados com técnicas de imagem da avantgarde. Ainda em 1919 o artista passou um ano em Moscou, onde foi muito ativo no Círculo de Escritores e Pintores Judeus, além de assíduo colaborador da Câmara de Teatro Judaico da cidade. No ano seguinte ele retorna a Kiev, onde preside o comitê encarregado de organizar a primeira grande exposição em grupo de artistas judeus. Foi também um dos organizadores e participantes da exposição organização pela Divisão Artística da Liga Cultural, em Kiev. Logo após o encerramento da exposição, em abril, Ryback volta para Moscou. Na primavera de 1921, seu pai foi morto durante um pogrom em Elisavetgrad. Os pogroms antissemitas haviam-se iniciado em outubro de 1917 e se alastravam por toda a Ucrânia e em outras partes da União Soviética, e só terminaram em maio de 1921. Nesse período, foram atacadas 530 comunidades judaicas, e após a realização de 887 pogroms mais de 156 mil judeus
“uma rua no vilarejo”, 1917. museu ryback, bat-yam, israel
foram brutalmente assassinados. O assassinato do pai o perturbou profundamente, e ele criou uma série de trabalhos dedicados aos pogroms judaicos na Ucrânia. Após a morte do pai, Ryback deixa a Rússia e, durante vários meses, enquanto aguardava seu visto de entrada para Berlim, reside em Kovno (hoje, Kaunas). Lá ele desenhou alguns livros em iídiche e trabalhou em instituições da Liga de Cultura Lituana. Em outubro, chegou a Berlim onde participou ativamente na vida cultural internacional e judaica. Tornouse membro do chamado Novembergruppe (Grupo de Novembro), formado por artistas alemães logo após a 1ª Guerra Mundial, que tinha como objetivo revitalizar a arte do país. Com eles, Ryback participou de várias exposições importantes, além de mostrar sua arte nas exposições realizadas na Berlin Sezession e na Juryfreie Kunstshau. 57
alef-bet, 1918
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“violinista cego”, óleo sobre tela
“o casamenteiro”,, óleo sobre tela
Ryback acreditava ser necessário o estabelecimento de uma iconografia judaica baseada na arte popular judaica, principalmente a partir da representação das letras hebraicas e da cópia dos artefatos folclóricos judaicos
“buquê de flores”, óleo sobre tela
Em 1922, juntamente com Yankel Adler e Henryck Berlevi, Ryback (como representante dos pintores judaicos da Europa Oriental) participou da preparação e condução do congresso da União de Artistas Progressistas Internacionais realizado em Dusseldorf. Influenciado por Ivan Bilibin, ícone do nacionalismo russo estilizado, criou elementos próprios a partir do alfabeto hebraico, como cercas e casas em relevo de madeira. Também cooperou com as editoras judaicoalemãs e aceitou trabalhos artísticos de certas organizações judaicas, especificamente a ORT. Em 1923, 58
a editora judaico-alemã Shvelln, de Berlim, publicou seu álbum gráfico intitulado Stetl. Um ano mais tarde, seu álbum litográfico “Tipos Judaicos da Ucrânia” também foi publicado. Essas duas séries gráficas baseavam-se nas impressões e lembranças de Ryback de sua viagem de 1916 pelos shtetls da Ucrânia e da Bielorrússia. De dezembro de 1923 até janeiro de 1924 teve uma exposição individual em Berlim. De volta a Moscou, em 1924, foi convidado pelo Estúdio Judaico do Teatro da Bielorrússia a criar o cenário de um espetáculo
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em iídiche e, no início do ano seguinte, criou cenários para outra peça teatral, também em iídiche, do Teatro Judaico de Kharkov. Logo depois, ele iniciou uma longa viagem pelo kolkhozes judeus (fazendas cooperativas) da Ucrânia e Criméia. Foi em Moscou que ele pintou mais um quadro famoso, “Still Life with Jewish Objects”, (“Natureza morta com objetos judaicos’), no qual utiliza a divisão cubista no centro da obra como uma abordagem modernista ao retratar a festividade de Sucot. Ainda hoje, a coletânea de litografias “Shtetl, Mayn Chorever Heym, a Gedekniss” (“Shtetl, meu lar destruído, um Memorial”) de 1923, segundo muitos críticos, é considerada sua obra mais representativa. Evoca o shtetl em tons escuros, mesclando o estilo cubista com o expressionista, linhas assimétricas e exagerando as expressões do rosto e planos que penetram uns nos outros. O estilo desta obra, que imortalizou sua cidade natal totalmente destruída pelos pogroms, sobrepõe imagens de vários momentos da vida judaica na sinagoga, na escola, nas festas e nas cerimônias e rituais, como casamentos e funerais. Nas imagens é possível identificar as profissões dos moradores pela simbologia introduzida, como por exemplo, sapateiros, afiadores de facas, açougueiros e o rabino. Ryback produziu mais dois álbuns que relembram as pessoas, a vida e os lugares onde nasceu e cresceu e que foram totalmente destruídos: “Nos Campos Judeus da Ucrânia”, de 1926, e “Sombras do Passado”, de 1932.
“natureza-morta com objetos judaicos” 1924, óleo e colagem sobre tela
Ryback em Paris Em 1926 decidiu partir para recomeçar a vida em Paris. A cidade das luzes, centro mundial das artes, recebeu Ryback de braços abertos. Sua vinda, precedida pela fama que conquistara nos últimos anos, garantiu-lhe um espaço especial na vida artística da capital francesa. Lá realizou duas mostras individuais – uma na Galerie aux Quatre Chemins, em 1928, e outra um ano depois, na Galerie L’Art Contemporain. Em sua constante busca pela inovação, seu estilo de pintura mudou. Abandonou o cubismo e adotou o expressionismo 59
“a noiva”
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fantasia e o romantismo total que Ryback trilha seu caminho. Na inquietação de seu povo, no seu humor melancólico, ele sobrepõe uma riqueza de cores e temas, que não é sem excessos. O todo está totalmente harmônico com uma luz obscura, porém, dramática”. Artista completo, Ryback incluiu a escultura em sua arte, principalmente em seus últimos anos. No início de 1935, o Musée National de Céramique de Sèvres organizou uma mostra de seus trabalhos, adquirindo, posteriormente, algumas de suas obras. No mesmo ano foi à Inglaterra para a inauguração de uma exposição a convite da Sociedade Artística da Universidade de Cambridge.
“a velha em la rochelle”, óleo sobre tela
da Escola de Paris, conquistando, também, o reconhecimento dos críticos franceses. As exibições individuais passaram a fazer parte de sua agenda e, em 1930, montou uma mostra em Haia, em 1931 em Roterdã e, em 1932 em Bruxelas e Antuérpia. Nessas criações seu estilo sem igual incorporara os conceitos do cubismo com arte popular, em particular as características dos luboks, um forma de impressão muito comum na Rússia criada a partir de gravuras, xilogravuras e, mais tarde, litografia. O lubok ganhou popularidade na Rússia a partir do final do século 17, sendo geralmente usado em
narrativas de acontecimentos históricos, literaturas ou contos religiosos. A obra “La Fiancée” (A Noiva) foi produzida depois de sua mudança para Paris. Este trabalho retrata o amor do artista pelo mundo que ele deixou para trás, suas lembranças de infância, da alegria e do otimismo da vida espiritual judaica que deixara em busca de seu sonho artístico, um mundo que fora destruído para sempre pelos pogroms. Nessa obra está presente de forma muito clara seu estilo romântico e nostálgico. Segundo uma citação sobre a obra, publicada no Journal de Débats, “é justamente entre a mais leve 60
Retornou a Paris cheio de ideias para novos projetos, que acabou não realizando, pois foi internado devido a uma drástica piora de sua doença crônica. No hospital passou os últimos meses de sua vida. Os amigos do pintor tiveram tempo suficiente de realizar a exposição de suas obras em uma galeria parisiense. Ryback participou dos preparativos mesmo estando internado, mas não pôde ir à abertura. Faleceu logo após o encerramento da mostra, em 22 de dezembro de 1935. Em 1962, sua viúva doou toda a sua coleção de arte pessoal, incluindo as pequenas esculturas de personagens do shtetl feitas em argila, para o Ryback Museum em Bat-Yam, Israel. BIBLIOGRAFIA
Voolen, van Edward, 50 Jewish Artists You Should Know, Prestel Regenbogen, Lucien, Dictionary of Jewish Painters, Editura Tehnica Frankel, Ellen, The Jewish Spirit – A Celebration in Stories and Art Russian Jewish Artists, Prestel
shoá
o julgamento de nuremberg Nuremberg, dia 16 de outubro de 1946. Dez homens fortes do 3º Reich condenados à morte pelo Tribunal Militar Internacional são enforcados. Era Hoshaná Rabá – o dia em que D’us sela os veredictos de Rosh Hashaná para o ano seguinte.
A
cidade de Nuremberg, capital simbólica do III Reich, sediou, entre 20 de novembro de 1945 e 1 de outubro de 1946, o que a imprensa mundial chamou de o “Julgamento do século”. Os líderes aliados levaram perante o recém-estabelecido Tribunal Militar Internacional proeminentes membros da liderança política, militar e econômica da Alemanha Nazista. O Julgamento de Nuremberg mostrou ao mundo a verdadeira natureza das atrocidades cometidas pelos alemães antes e durante a 2ª Guerra Mundial, mostrando as entranhas da conspiração criminosa que pretendia subjugar e escravizar os povos da Europa e exterminar todo e qualquer judeu.
Um marco na História da Civilização Em maio de 1945 a Alemanha se rendera. O preço do conflito foi alto em vidas humanas, entre 50 a 70 milhões de mortos entre civis e militares, e milhões de feridos. Em muitos países arrasados pela guerra, a destruição, fome e miséria tinham-se tornado parte do cotidiano. Para os judeus, a guerra que Hitler empreendera contra nosso povo foi uma catástrofe sem igual na História. De acordo com as recentes estimativas, entre os mortos, 7 milhões eram judeus, sendo que mais de um milhão deles eram crianças. Os nazistas e seus colaboradores haviam assassinado dois de cada três judeus que viviam na Europa, mas é de extrema importância apontar que essa estatística é enganadora, pois a maioria dos que sobreviveram vivia em áreas da Europa que não foram ocupadas pela Alemanha, como o Leste da União Soviética, a Grã-Bretanha, a Bulgária, e estados neutros como Espanha, Portugal, Suíça e Suécia.
Para o Povo Judeu, o julgamento foi de suma importância. Apesar das limitações, das críticas e do fato de a “Solução Final da Questão Judaica” não ter sido o ponto central do julgamento, como os judeus queriam, pela primeira vez os representantes oficiais das forças aliadas apresentaram uma documentação abrangente, a um público não judeu, sobre a perseguição e massacre do Judaísmo Europeu durante a 2ª Guerra Mundial – o que viríamos a chamar de Holocausto, em hebraico, Shoá.
O sangue dos mortos e os sobreviventes clamavam por justiça. Hitler, Himmler e Goebbels haviam-se suicidado; Adolf Eichmann, Heinrich Mueller e Josef Mengele, entre outros, haviam conseguido fugir, mas 61
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palácio de justiça de Nuremberg, na Bavaria, alemanha
alguns dos principais orquestradores do regime nacional-socialista haviam sido capturados. Era imprescindível que os arquitetos da Solução Final respondessem por suas ações, e que a nação alemã assumisse sua responsabilidade coletiva, pois dera a Hitler o poder e anuência para levar adiante seus atos criminosos. No decorrer da Guerra, os aliados, ao tomarem conhecimento dos crimes cometidos pelos III Reich, haviam advertido o povo alemão de que teriam que responder pelos crimes cometidos em nome da Alemanha. A decisão de julgar os líderes do Reich fora expressa na Declaração de Moscou de 1943 e reiterada, em 1945, pelos Acordos de Ialta e a Conferência de Potsdam. Mas, já em 1942, o Gabinete britânico debatia o que devia ser feito com os criminosos de guerra nazistas. Winston Churchill era a favor da execução sumária, para evitar os “emaranhados dos procedimentos legais”. Anthony Eden, futuro primeiro-ministro, acreditava que
“a culpa das lideranças nazistas mais do que ultrapassava o âmbito de qualquer processo judicial”. Membros do governo americano concordavam com os britânicos e persuadiram o presidente Franklin D. Roosevelt de que os nazistas “não mereciam mais do que uma audiência sumária e um pelotão de fuzilamento”. Uma voz, porém, levantouse contra essa corrente: a do secretário de Guerra americano Henry Stimson, que encontrou um aliado em Joseph Stalin. O ditador soviético alertara que, caso os líderes nazistas fossem sumariamente executados, as gerações futuras poderiam ser levadas a crer que os aliados os haviam silenciado por temerem um julgamento. Para Stimson, o mundo precisava tomar pleno conhecimento das barbáries cometidas pelo nazistas. Os próprios alemães precisavam se conscientizar da culpa da Alemanha. Apesar das forças 62
americanas os obrigarem a ver in loco os cadáveres e os fornos crematórios, a maioria dos alemães acreditava que as acusações eram “mentiras forjadas pelos vencedores”. Stimson temia, ainda, que uma execução sumária transformaria criminosos de guerra em mártires. Em outubro de 1944, ele convenceu o presidente Roosevelt da necessidade de um julgamento público. “A punição desses homens de maneira digna terá o maior efeito para a posteridade”, argumentara. Após a morte súbita de Roosevelt, em abril de 1945, e a posse de Harry S. Truman na presidência dos Estados Unidos, os preparativos para levar os criminosos à justiça se aceleraram. Em maio, Truman pediu ao Juiz da Corte Suprema Robert Jackson1 que organizasse o julgamento. Jackson estava determinado a fazer do Julgamento de Nuremberg “um marco na história da civilização”. Estava determinado a dar aos réus a possibilidade de defesa, como
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afirmou em suas considerações finais: “Uma das coisas de que podemos ter certeza: o futuro jamais terá que perguntar o que os nazistas teriam dito a seu favor. A História saberá que o que poderia ter sido dito, foi-lhes permitido dizer. Foi-lhes concedido o tipo de julgamento que eles, em seus dias de poder, jamais deram a qualquer ser humano”...
O Tribunal Militar Internacional Em agosto de 1945 Grã-Bretanha, Estados Unidos, França e URSS assinaram em Londres o acordo que criou o Tribunal Militar Internacional ao qual aderiram outras 18 nações. O acordo estabeleceu as bases do funcionamento do Tribunal, e determinou que 24 proeminentes membros da liderança política, militar e econômica da Alemanha Nazista estariam no banco dos réus. Caberia aos promotores da GrãBretanha, Estados Unidos, França e URSS expor a participação dos réus na conspiração engendrada para dominar a Europa e nos crimes cometidos contra a humanidade. Definiu também que seriam julgados sete “grupos ou organizações nazistas”: o Gabinete do Reich, o Órgão Executivo do Partido Nazista, a SS, a SA, a Gestapo, a SD e o Estado Maior e Alto Comando das Forças Armadas Alemãs. A estratégia legal de não julgar apenas indivíduos pelos atos criminosos, mas também as organizações, tinha por objetivo que, no futuro, durante os julgamentos de réus menos conhecidos, uma Jackson ocupara o cargo de Advogado Geral dos EUA, Procurador Geral de Justiça dos EUA e Juiz da Suprema Corte dos EUA. Ele foi a única pessoa na história do país a ocupar todos esses três cargos.
vez que uma organização fosse declarada criminosa pelo Tribunal, a prova de pertencer àquela organização criminosa pudesse ser uma evidência-chave que levasse à condenação. A acusação partia do pressuposto de que quem tivesse apoiado a política da organização ou grupo à qual pertencia era responsável por seus atos e devia responder por crimes cometidos em seu nome. A obediência hierárquica não poderia ser considerada excludente. Com essa determinação, o Tribunal invalidava a “defesa” utilizada pelos nazistas – de que eles estavam “apenas seguindo ordens superiores”. Esse conceito de responsabilidade individual foi submetido a juízo em relação à participação em um “plano comum de conspiração” para cometer três tipos de crimes de guerra, crimes contra a paz e crimes contra a humanidade. A primeira acusação diz respeito à violação de acordos definidos pelas
convenções de Haia e Genebra. A segunda se traduz na noção de “guerras de agressão”, ou seja, na deflagração de conflitos que não tenham como motivação a legítima defesa. Crimes contra a humanidade, conceito até então não existente, são basicamente atos que atentam contra a dignidade e os direitos humanos. Na abertura do julgamento, o promotorchefe dos Estados Unidos, Robert Jackson, definiu-os como “delitos que feririam o limite do tolerável pela civilização, sendo independentes das circunstâncias de guerra”. São considerados crimes contra a humanidade assassinatos, extermínio, escravidão, deportação e outros atos desumanos cometidos contra a população civil antes ou durante a guerra, além de perseguições baseadas em motivos políticos, raciais ou religiosos, mesmo quando validadas pelas leis dos países nos quais foram perpetrados. Ao se preparar para o julgamento, a promotoria americana considerou
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o procurador geral dos eua, ROBERT H. JACKSON e o procurador geralassistente da união soviética, URI POKROVSKY na conclusão do julgamento
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shoá
bancada de juízes do tribunal militar internacional, 1945/46. no centro, o juíz presidente, Geoffrey Lawrence
seriamente destacar as políticas nazistas contra os judeus e uma participação direta judaica durante o processo judicial. Alguns grupos judeus haviam solicitado tal envolvimento ainda antes da Conferência de Londres. Jackson, que, a princípio, era contrário à ideia, parece ter mudado de opinião durante o verão europeu de 1945, provavelmente devido às conversas que manteve com Hersch Lauterpacht, professor de Direito Internacional em Cambridge, que insistira fortemente pela realização de um julgamento por crimes de guerra, em 1943, e que estava ávido para ver o Tribunal considerar as atrocidades cometidas contra o judaísmo europeu. Ainda que a ideia tivesse sido abandonada, Jackson introduziu o título “Crimes contra a Humanidade” em um dos rascunhos finais do Acordo de Londres. Assim sendo, o tópico encontrou seu lugar no Artigo 6 da Carta de Nuremberg (ou Acordo de Londres) e o veredicto da acusação foi proferido.
Quando, em 20 de novembro, o Tribunal composto por juízes dos Estados Unidos, Grã-Bretanha, França e União Soviética iniciou seus trabalhos, 21 dos 24 indiciados estavam no banco dos réus. Esse número foi reduzido quando se comprovou que o idoso industrial Barão Gustav Krupp era incapaz; Robert Ley, líder da Frente Trabalhista cometera suicídio e Bormann fora julgado in absentia.
Nos meses que antecederam o julgamento chegaram a Nuremberg caminhões carregando documentos que revelavam em detalhe as barbáries cometidas durante os 12 anos que os nazistas ficaram no poder. Os registros devidamente catalogados e traduzidos estão, desde então, à disposição do público. A promotoria apresentou ao Tribunal, como provas da acusação, mais de 3 mil documentos, além de filmes, fotografias e depoimentos.
Durante o julgamento, o amplo alcance das atrocidades cometidas por nazistas e seus colaboradores foi apresentado detalhadamente ao público. Para atingir os objetivos do julgamento e ser, ao mesmo tempo, “justo” e “diligente”, era necessário ser muito rápido e preciso na tradução das perguntas, respostas e das evidências. Para possibilitar todos os participantes do julgamento de entenderem o que estava sendo dito, de forma simultânea, em sua língua nativa, foram utilizados equipamentos especialmente desenvolvido pela IBM. Nascia a “interpretação simultânea” como hoje se conhece.
Apesar de não faltarem testemunhas oculares para evitar futuras acusações de tendenciosidade, Jackson, que se tornara promotor chefe, construiu o caso quase totalmente baseado nos registros e depoimentos dos próprios nazistas. Em suas palavras, “A paixão teutônica por fazer de qualquer mínimo detalhezinho uma questão digna de registro, fornece-nos nossa maior arma no julgamento. A partir de suas próprias ordens escritas, diretrizes, diários, jornais e correspondência, as provas avassaladoras da culpa dos réus nazistas se tornaram irrefutáveis”.
O Julgamento
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O momento decisivo do Julgamento ocorreu em seu nono dia. Thomas Dodd, um dos promotores americanos, incluiu como prova um filme compilado por fotógrafos militares no decorrer da libertação dos campos de concentração nazistas. Até então, o sofrimento humano havia sido obscurecido por números e páginas e mais páginas de detalhes, que, por mais horripilantes que fossem, eram algo frio e passível de esquecimento. Stalin dizia que a morte de um homem é uma tragédia, a de milhões se torna uma estatística. Era necessário mostrar a face do nazismo, dar um rosto à devastação humana. Ao se apagarem as luzes, o filme mostrava um mapa da extensa rede de campos nazistas, em seguida, imagens horripilantes: as condições desumanas dos campos, os fornos crematórios, as covas abertas em Mauthausen, os sobreviventes, esqueletos humanos famintos, cercados por pilhas de corpos, algumas tão altas quanto os barracos dos prisioneiros. As imagens desafiavam a compreensão. Ao término do filme, quando as luzes foram ligadas, um silêncio mortal. Os juízes simplesmente se levantaram e saíram. Nas semanas seguintes foram apresentadas à Corte outros curta-metragens, fotografias de assassinados, da execução de prisioneiros do Leste europeu, algumas das quais tiradas pelos próprios alemães. E, perante um público horrorizado, uma cabeça embalsamada de um judeu utilizada como peso para papel.
Crimes contra o Povo Judeu No segundo dia do Julgamento, dedicando uma parte importante de seu discurso de abertura a isso, o
donald e. spencer, diretor da divisão de documentação
promotor chefe Robert H. Jackson assim definiu a estratégia traçada pela promotoria em relação à política antissemita do Terceiro Reich: “Os crimes mais selvagens e em maior número planejados e cometidos pelos nazistas foram aqueles contra os judeus. Tenho o propósito de demonstrar um plano e objetivo aos quais todos os nazistas estavam fanaticamente comprometidos: aniquilar todo o Povo Judeu. Esses crimes foram organizados e promovidos pela liderança do Partido, executados e protegidos pelos oficiais nazistas, e nós os convenceremos disto mediante ordens por escrito da própria Polícia Secreta Estatal”. Ao longo do conflito, os não judeus e os próprios judeus não perceberam inteiramente o escopo nem o caráter da catástrofe. Importantes aspectos da catástrofe haviam vazado para os canais de notícias dos Aliados do Ocidente e mesmo através da propagando soviética durante o curso da guerra. Contudo – como os historiadores há muito deixaram claro – informação não significa conhecimento. Telford Taylor, um coronel do exército americano e parte da 65
promotoria, que assumiu vários julgamentos de Nuremberg, pessoa de inquestionável simpatia pelos judeus, testemunhou que, enquanto era preparado o julgamento, ele pouco sabia sobre o que nós chamamos de “o Holocausto”: “Como tantos outros, eu era um completo ignorante sobre os campos de extermínio em massa na Polônia, e o escopo completo do Holocausto só desabou sobre mim vários meses mais tarde, em Nuremberg”. Em sua fala, o Juiz Jackson, do Supremo, revelou o peso esmagador da evidência contra os nazistas: o número de vítimas judias – cerca de 5.700.000, de acordo com suas estimativas. Ele indicou o amplo envolvimento dos réus e de outros alemães – parte do plano nazista, “segundo o qual cada réu era um partido”; os ilimitados objetivos dos nazistas – seu plano de extermínio que visava eliminar os judeus da Europa e também do mundo; a selvageria fora do normal na Europa Oriental – “o judeu oriental sofreu como nenhum outro povo”; e os detalhes do assassinato em massa – os guetos, os Einsatzgruppen, as camionetes com gás, o gueto de Varsóvia... Estava tudo lá, e Jackson terminou sua apresentação destacando o lugar das perseguições antijudaicas no caso americano: “A determinação de destruir os judeus era uma força vinculante que constantemente serviu de alicerce para os elementos dessa conspiração. Em muitas políticas internas havia diferenças entre os réus. Mas não houve sequer um deles que não tenha repetido o grito de guerra do nazismo: “Deutschland erwache, Juda verrecke!” (Alemanha, desperta; judaísmo, perece!). SETEMBRO 2016
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Apesar do importante pronunciamento de abertura de Jackson, as acusações contra esses homens não se referiam especificamente a crimes contra os judeus. Ainda que também intimamente associados à última alegação no indiciamento, o assassinato dos judeus europeus não foi dissociado dos demais crimes. As questões judaicas foram apresentadas em vários pontos do caso da promotoria. Os crimes contra os judeus estavam entrelaçados nas evidências presentes em todas as alegações, em especial nos crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Mesmo os promotores soviéticos, relutantes em distinguir o sofrimento de judeus do de outros cidadãos soviéticos, apresentaram um relato completo e apavorante da campanha nazista contra os judeus. Mas, como observou um jurista, o assassinato dos judeus europeus foi visto “em termos da lógica pervertida do controle político e da conquista militar”, e não como parte de um projeto genocida inspirado pela ideologia antissemita. Sir Hersch Lauterpacht, Raphael Lemkin e Jacob Robinson foram
o procurador geral dos eua ROBERT H. JACKSON
três advogados judeus que, embora não tendo participado formalmente, atuaram ativamente antes e durante do Julgamento para que a destruição dos judeus da Europa se tornasse parte integrante do processo. Todos eles tinham emigrado do Leste europeu, vinham de famílias da Europa Oriental que falavam iídiche, e haviam perdido muitos de seus familiares no Holocausto. Professor de Direito Internacional da Universidade de Cambridge, como vimos acima, Lauterpacht nasceu em uma família judaica ortodoxa na Galícia Oriental e se mudou para a Inglaterra em 1923. Considerado por
muitos como o fundador do Direito Internacional Moderno uniu-se, em 1944, ao Executivo Britânico de Crimes de Guerra, envolvendo-se, profundamente, na preparação do Tribunal Internacional. Defendia os direitos humanos e estimulava as autoridades britânicas a perseguirem criminosos de guerra nazistas, mostrando a necessidade de julgar crimes de guerra e estabelecer a responsabilidade criminal individual quando a guerra terminasse. Como vimos acima, ele tentou, sem sucesso, persuadir a Comissão das Nações Unidas contra Crimes de Guerra, sediada em Londres, a criar uma unidade especial para analisar crimes contra os judeus. Ajudou a formular a noção de uma definição tripartite da criminalidade nazista (crimes contra a paz/ crimes de guerra/ crimes contra a humanidade) e, em particular, a ideia desta última definição, crimes contra a humanidade – claramente uma das principais inovações jurídicas do Julgamento”. Raphael Lemkin conquistou reconhecimento público significativo com sua apresentação do termo genocídio, que ele popularizou em seu livro “Axis Rule in Occupied Europe” (O domínio do Eixo na Europa Ocupada), publicado no final de 1944. Ele tinha um cargo no Escritório de Crimes de Guerra do Gabinete do Juiz AdvogadoGeral, no Pentágono, e participou da equipe de Nuremberg do Juiz Robert Jackson. Lemkin ficou, obviamente, gratificado quando o indiciamento dos acusados, em Nuremberg, se referiu a “genocídio” em sua especificação de seus crimes. Quem mais atuou foi Jacob Robinson. Sionista polonês, chegou a Nova York em 1941 após fugir
promotores americanos
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da Europa. Fundou o Instituto de Assuntos Judaicos (IJA), braço de pesquisa do Congresso Judaico Americano e Congresso Judaico Mundial. O IJA mantinha registro dos crimes cometidos contra judeus nos territórios ocupados pelos nazistas, na Europa, e estudava as bases legais para processar criminosos nazistas. Mais do que tudo, no coração de Robinson e na defesa do Congresso Judaico Mundial estava a noção de uma coletividade judaica cruelmente vitimada – uma nova ideia para muitos, em 1945-46. Robinson queria o reconhecimento dos crimes alemães contra o Povo Judeu e o fato de que o massacre do judaísmo europeu era um crime único e independente – “O objetivo final das políticas alemãs nazistas no tocante ao Povo Judeu era nada menos que sua completa aniquilação física”, ele observou em um relatório – um entendimento que é comumente aceito hoje, mas que era pouco compreendido ou apreciado à época. Robinson estava intensamente preocupado em documentar essa perspectiva e sentiu considerável satisfação com a forma na qual esse material foi, afinal, usado no Julgamento. Como ele disse, muito mais tarde: “As provas submetidas ao Tribunal Militar Internacional no caso judaico foram avassaladoras: mais de oitocentos documentos nazistas autoacusadores... foram apresentados e trinta e três testemunhas foram ouvidas, além de todos os réus presentes”. Uma análise cuidadosa dessa documentação leva, inexoravelmente, à conclusão da existência de uma conspiração para destruir o Povo Judeu. Robinson ficou compreensivelmente gratificado com a apresentação das evidências sobre a destruição do judaísmo europeu, mas lamentou
wilhelm frick (de pé), em sua exposição final ao tribunal
que Nuremberg tivesse falhado em considerar esse crime grandioso “como uma unidade, de facto e de juri” – ou, em outras palavras, que “o caso judaico não tenha sido destacado como um crime específico, mas ‘afogado’ nas abstrações dos Artigos 6 (b) e 6 (c) da Carta de Nuremberg”.
Reconhecimento da singularidade do ataque contra os judeus Diferentemente dos líderes políticos em tempos de guerra, os promotores reconheceram o caráter único do ataque contra os judeus da Europa. Houve um claro reconhecimento da importância histórica da catástrofe. Jackson, em sua conclusão, disse: “O movimento nazista será uma lembrança maligna na História devido à sua perseguição aos judeus, a mais ampla e terrível perseguição racial de todos os tempos”. De modo semelhante, um dia depois, o promotor chefe britânico, Sir Hartley Shawcross, declarou: “Houve um grupo ao qual o método de aniquilação foi aplicado em uma escala tão imensa que é meu dever referir-me separadamente às 67
evidências. Refiro-me ao extermínio dos judeus. Se não houvesse nenhum outro crime contra esses homens, este único, no qual todos foram implicados, já bastaria. Não há paralelo na História para esses horrores”. Certamente, muito ficou sem explicação, e os principais livros sobre o assunto somente foram publicados décadas mais tarde. Mas o Julgamento de Nuremberg disponibilizou de maneira plenamente fidedigna, pela primeira vez, os elementos dessa história. Desde então, as toneladas de provas, documentos e testemunhos coletados tem constituído o principal ponto de referência para o estudo do Holocausto.
BIBLIOGRAFIA
Roland, Paul, The Nuremberg Trials: The Nazis and Their Crimes Against Humanity. Kindle edition Gilbert, G. M., Nuremberg Diary, Ed. Da Capo Press Carruthers, Bob, The Nuremberg Trials - The Complete Proceedings Vol 1: The Indictment and Opening Statements. Kindle edition Ehrenfreund, Norbert, The Nuremberg Legacy: How the Nazi War Crimes Trials Changed the Course of History. Kindle Edition SETEMBRO 2016
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os réus Cada um dos 22 homens fortes do Terceiro Reich, que o Tribunal Militar Internacional levou a julgamento entre novembro de 1945 e outubro de 1946, teve uma participação integral e necessária na criação do III Reich. Cada um, à sua maneira, colocou suas “expertises” a serviço de Hitler para que fossem atingidos os objetivos do Führer de dominar a Europa e primordialmente exterminar todo e qualquer judeu.
A
os que se perguntam por que é necessário sempre relembrar os crimes cometidos há mais de sete décadas, fazemos nossas as palavras do promotor britânico: “A memória humana é muito curta. (...) os fatos verdadeiros, nunca relembrados assertivamente, tornam-se obscuros e esquecidos...”. Como vimos no artigo Nuremberg, à página 61 desta edição, os réus foram acusados de conspiração para cometer crimes: contra a paz; crimes de guerra e crimes contra a Humanidade. As barbaridades cometidas pelos nazistas foram tantas e de tamanha magnitude que, como afirmava Elie Wiesel, a mente humana tem dificuldade de assimilar. Nas páginas seguintes só nos resta dar uma pincelada nas “contribuições” de cada um dos acusados, sem as quais o sucesso da empreitada nazista teria sido comprometido.
a chegar ao poder. Implementou a Gestapo – polícia secreta do Estado – e os campos de concentração. Em 1933 chegou a alertar: “Qualquer um que erguer a mão contra um representante do Movimento Nacional Socialista ou do Estado deve saber que rapidamente perderá sua vida”. Seu Plano Quadrienal do Partido Nazista ajudou a reerguer a Alemanha, sendo responsável por uma grande parte do funcionamento da economia alemã na preparação para a 2a Guerra Mundial. Desrespeitando o Tratado de Versalhes, reestruturou a força aérea, a Luftwaffe, que passou a comandar em 1935, e que teve um papel fundamental na criação da Blitzkrieg, a “guerra-relâmpago”. Göring perseguiu ativamente os judeus e foi um dos que mais se empenhou em bani-los da Alemanha, em 1939. Ordenou a Reinhard Heydrich, Obergruppenführer das SS, e um dos principais “arquitetos” do Holocausto, “que resolvesse a ‘questão judaica’ por emigração ou evacuação”. Ele também incentivou a realização de manifestações contra os judeus e foi um dos que orquestrou a “Noite dos Cristais”, em 9 de novembro de 1938, obrigando-os ainda a pagarem pelos prejuízos. Em 1941 proibiu a emigração de todos os
Hermann Wilhelm Göring: Homem de confiança de Hitler, chegou ao mais alto nível da hierarquia civil: Reichsmarschall. Era o segundo homem mais poderoso do 3º Reich. Nas palavras do Juiz Jackson, promotor chefe, Göring foi “meio militar, meio gângster”. Ele usou as SA, as “camisas pardas”, tropas de choque compostas por violentos brutamontes, para ajudar Hitler 68
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Julgamento de Nuremberg
judeus dos territórios ocupados em vista da eminência da “Solução Final da Questão Judaica”. Em meados de 1942, centrou seus “esforços” no saque de milhares de obras de arte e no confisco de propriedades judaicas. Durante o Julgamento, manteve uma postura arrogante, tornandose um porta-voz não oficial dos réus, sempre afirmando que “os vitoriosos sempre serão os juízes e os derrotados, os acusados”. O Tribunal o condenou à morte, mas ele covardemente suicidou-se três horas antes da execução. O Exército Aliado, querendo evitar a criação de qualquer lenda no sentido de que Göring havia conseguido escapar, determinou que ele ocuparia seu lugar como um homem morto, aos pés da plataforma da forca, para que as testemunhas e os correspondentes Aliados pudessem ver que ele realmente estava morto.
Rudolf Hess: Vice-líder do Partido Nazista e secretárioparticular do Führer nas décadas de 1930 e 1940, ele era o terceiro homem mais poderoso da Alemanha Nazista. Em 1923, Hitler, que ficara
prisão de nuremberg
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preso com Hess após o fracassado Putsch da Cervejaria, ditou-lhe o livro Mein Kampf, seu “manifesto político”, imbuído de selvagem antissemitismo. Também foi Hess quem apresentou a Hitler o conceito de Lebensraum (um território adicional considerado necessário para a sobrevivência nacional) – uma importante plataforma política para a ideologia do Partido Nazista.Já em 1933, Hess queria ver a Alemanha com um completo domínio mundial. Ele era o “engenheiro” da máquina partidária e, por seu intermédio, os nazistas estabeleceram o controle do Partido acima do Estado. Ele dava a palavra final em todos os planos internos e em todas as questões consideradas vitais. Hess, que afirmava que “o nazismo era biologia aplicada”, foi responsável por propagar a doutrina da “superioridade da raça alemã” com a qual os nazistas buscavam justificar as perseguições contra os SETEMBRO 2016
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judeus e outras “raças inferiores”. Ele participou da criação das Leis de Nuremberg contra os judeus e dos centros de eutanásia onde eram assassinadas pessoas consideradas “incuravelmente doentes”. Em maio de 1941, voou sozinho para a Escócia. Os ingleses o mantiveram detido até o final da guerra, quando foi levado de volta à Alemanha para ser julgado. Durante o Julgamento, alegou sofrer de amnésia, mas, mais tarde, admitiu tratar-se de um estratagema. “Não me arrependo de coisa alguma”, afirmou durante o Julgamento. Condenado à prisão perpétua, morreu no presídio, em 1987.
Joachim von Ribbentrop: Ministro das Relações Exteriores. Quando os temores, no exterior, colocaram em risco o sucesso das conquistas nazistas, Ribbentrop, “o vendedor das ilusões”, como o Juiz Jackson o denominou, “foi encarregado de jogar água fria nas suspeitas, com sua ladainha de intenções limitadas e pacíficas”. Esteve ativamente envolvido no planejamento da anexação da Áustria, da Checoslováquia e na ocupação de todos os países que a Alemanha invadiu. Sua participação na “Solução Final” foi crucial, pois, já em 1942, ordenara aos diplomatas alemães sediados em vários estados satélites sob controle nazista que acelerassem a deportação dos judeus para o Leste europeu. O Tribunal o condenou à morte por enforcamento. Martin Bormann (julgado à revelia): Principal secretário-particular de Hitler, depois da fuga de Hess para a Grã-Bretanha, tornou-se seu Vice-Führer. Era a força que guiava o Partido nazista na execução
incondicional da Alemanha perante os Exércitos Aliados. Foi condenado à morte por enforcamento. O Tribunal recusou seu pedido para ser executado por um pelotão de fuzilamento.
rudolf hess (à frente, no centro), vice de hitler no partido nazista
de suas mais impiedosas políticas, entre elas o uso de mão-de-obra escrava. Ordenou o maus-tratos aos Prisioneiros de Guerra, em especial aos soviéticos. Em relação aos judeus, defendeu sua eliminação de todo território sob controle do III Reich e deu à Gestapo absoluta jurisdição sobre eles. Não era suficiente, afirmava, deportá-los. Havia que utilizar contra eles força e violência implacáveis. Testemunhas afirmaram durante o julgamento que era Bormann quem transmitia as ordens de Hitler de extermínio dos judeus. Foi condenado à morte à revelia. Posteriormente descobriu-se que Bormann não fugira, mas falecera em 1945.
Wilhelm Keitel: Marechal de Campo, chefe do Alto Comando das Forças Armadas, após 1938 tornouse conselheiro militar de Hitler. A promotoria o acusou de ter entregue as Forças Armadas ao Partido Nazista, usando-as para executar os criminosos planos partidários. Durante a Guerra, incentivou a selvageria nas fileiras do exército, ordenando o uso dos meios mais brutais possíveis, mesmo em relação a mulheres e crianças. Ele afirmara que “a vida humana no Leste valia menos que nada”. Em 8 de maio de 1945, Keitel assinou a rendição 70
Ernst Kaltenbrunner: Comandante Supremo das SS, RSHA, SD e Gestapo. Jackson o acusou de ter assumido, em 1943, o manto sangrento de Heydrich “de reprimir a oposição e aterrorizar a submissão”. Incontáveis crimes de guerra e crimes contra a Humanidade foram planejados e ordenados por ele: tortura e assassinato de opositores ao nazismo, de judeus, de comunistas e de prisioneiros de guerra. Foi responsável pela deportação de milhões de civis-homens, mulheres, velhos e crianças, de nações ocupadas para campos nazistas. A lista de seus crimes contra o Povo Judeu é infindável e assustadora. As RHA tiveram um papel crucial na Solução Final sendo que uma unidade especial foi criada para supervisionar o extermínio dos judeus. Dos 6 milhões assassinados durante a Shoá, 4 milhões foram mortos quando Kaltenbrunner estava à frente das RSHA. Foi condenado à morte por enforcamento. Alfred Rosenberg: Principal “filósofo” do nacionalsocialismo, em 1941se tornou Reich Minister dos Territórios da Europa Oriental. Antissemita convicto desde a juventude, elaborou “uma escala racial humana” que justificasse as políticas de Hitler e a longa lista de atrocidades nazistas. Para Rosenberg, os judeus eram um inimigo prioritário, um “vírus” que devia ser exterminado. Nas palavras de Jackson, Rosenberg foi “o sumo sacerdote intelectual da pretensa ‘raça superior’, o arquiteto da doutrina
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de ódio que daria o ímpeto para a aniquilação dos judeus europeus... e quem colocou suas teorias infiéis em prática contra os Territórios Ocupados do Leste”. Rosenberg criou a mais exitosa organização nazista engajada na pilhagem de objetos de arte da Europa. Quase 1,5 milhão de unidades de carga ferroviária de objetos de arte foram despachados para a Alemanha. Foi condenado à morte por enforcamento.
Hans Frank: Governador geral da Polônia Ocupada. Assessor jurídico pessoal de Hitler, em 1933 foi nomeado comissário do Reich para a submissão da Justiça nos Estados e a renovação do Estado de Direito. Frank fortaleceu o controle nazista sobre a Alemanha e estabeleceu uma nova ordem que fez dos ditames do partido nazista o único parâmetro de legalidade. Como governador da Polônia Ocupada era o responsável pela exploração e assassinato de centenas de milhares de civis e a virtual aniquilação dos judeus poloneses. Anunciou o planejado extermínio dos judeus da Polônia em uma reunião com seus superiores em 16 de dezembro de 1941. Durante o Julgamento a promotoria revelou que quatro dos seis campos de extermínio estavam localizados na Polônia. Convertido ao catolicismo, alegou remorso diante das evidências apresentadas. Foi condenado à morte por enforcamento. Wilhelm Frick: Ministro do Interior do Reich de 1933 a 1943, quando foi nomeado Protetor da Boêmia e Morávia. Jackson o intitulou de “organizador impiedoso”. Ele ajudou o Partido a conquistar o poder, supervisionando as forças policiais para garantir que continuasse no poder. Como
ministro do Interior, Frick era a autoridade final em questões constitucionais, de raça e cidadania, além de ter jurisdição sobre administração governamental e a defesa civil. Esteve profundamente envolvido na promulgação das leis raciais e da legislação antissemita. Frick implantou, ainda, o projeto de esterilização forçada e da eutanásia. Como outros nazistas, apropriou-se de bens dos judeus. Foi condenado à morte por enforcamento.
Julius Streicher: Sádico, com uma mente lasciva e pervertida, ele liderava a ala antijudaica mais violenta do partido nazista e orgulhosamente se autodenominando “Antissemita No 1”. Fundou o jornal semanal “Der Stürmer”, que acabou se tornando instrumento central de propaganda do Partido Nazista. O antissemitismo de Streicher era obsessivo e durante 25 anos ele educou o povo alemão para o ódio contra os judeus e clamou por seu extermínio em discursos e publicações. Chegou mesmo a publicar livros infantis antissemitas,
incluindo um chamado Der Giftpilz (O cogumelo venenoso). Após os nazistas assumirem o poder, sua postura antissemita tornou-se ainda mais violenta. Ele teve um papel de liderança nas manifestações contra os judeus na Noite dos Cristais, em novembro de 1938. Ordenou a destruição da Grande Sinagoga de Nuremberg, sua cidade natal, alegando “sua insatisfação com a arquitetura do edifício”. Foi condenado à morte por enforcamento. Pouco instantes antes de ser enforcado, gritou: “Festa de Purim, 1946”, lembrando a frustrada tentativa de extermínio dos judeus por Haman.
Hjalmar Schact: Ministro da Economia e presidente do Reichsbank, Banco Central da Alemanha, de 1933 a 1939. A ajuda de Schact foi indispensável para que os nazistas chegassem ao poder, pois utilizou seu prestígio no mundo de negócios para a causa nazista e atuou intensamente para que os empresários financiassem o colossal e secreto programa de rearmamento do.Führer. Foi Schacht, “verdadeira fachada de imaculada respeitabilidade, quem, nos primórdios da Guerra, forneceu a aparência enganosa, a isca para os que ainda hesitavam”. Absolvido posteriormente, um tribunal de Desnazificação alemão o condenou a oito anos de prisão. Foi libertado em 1948, vindo a falecer em 1970. Walter Funk: Chefe plenipotenciário para a Economia de 1938 até 1945. Em 1939 se tornou presidente do Reichsbank. Um momento de grande tensão durante o julgamento ocorreu quando a Procuradoria apresentou evidências documentais que demonstravam que quando Funk presidia o Reichsbank, o banco
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recebia e mantinha sob custódia vultosos depósitos das SS. Esse depósito consistia de joias e outros valores, inclusive ouro de dentes dos milhões de vítimas assassinados pelos nazistas nos campos de morte. Assessor econômico pessoal de Hitler na década de 1930, foi responsável por ter impulsionado o rearmamento da Alemanha. Funk atuava como elemento de ligação entre o Partido Nazista e os donos das grandes indústrias, conseguindo seu apoio para o Führer. Em janeiro de 1933, quando Hitler se tornou chanceler do Reich, Funk assumiu o Departamento de Imprensa. Com controle total sobre os meios de comunicação, foi, até o final de 1937, uma figurachave na área de propaganda. Teve ampla participação nas políticas e na legislação antissemita e na eliminação de judeus e dissidentes políticos no campo da literatura, música, teatro, jornalismo e artes, em geral. Em 1938, assinou um decreto de medidas econômicas drásticas em relação aos judeus, sujeitando seus bens ao confisco, vangloriandose de que, em 1938, o III Reich se apropriaria de cerca de dois milhões de marcos. Funk também participou do planejamento do ataque à Rússia e da apropriação das reservas de ouro dos bancos da então Checoslováquia. Condenado à prisão perpétua, foi libertado em 1957. Faleceu em 1960.
Karl Dönitz: Comandante supremo da Marinha em 1943, assumiu o posto de chanceler depois do suicídio de Hitler. Famoso pela atuação à frente da Kriegsmarine (Marinha de Guerra), instou os tripulantes dos submarinos a não resgatarem os sobreviventes dos navios inimigos. Ele “promoveu o sucesso das agressões nazistas instruindo sua frota de submarinos assassinos a conduzir a guerra no
Hermann Göring, Rudolf Hess, J. von Ribbentrop e Wilhelm Keitel
mar com ferocidade ilegal” de modo a incapacitar a marinha mercante dos Aliados dizimando suas tripulações. Foi condenado a dez anos de prisão, pena que cumpriu integralmente. Faleceu em 1980.
Erich Raeder: Comandante supremo da Marinha de 1928 a 1943. Jackon afirmou que ele, “o almirante político”, construíra furtivamente a Marinha alemã, desrespeitando o Tratado de Versalhes, pondo-a uso em uma série de agressões em cujo planejamento ele tivera parte ativa. Foi o principal responsável por transferir a lealdade da Marinha ao Partido Nazista, garantindo sua inquestionável aliança. Certos crimes de guerra foram ordenados através da cadeia naval de comando pelo próprio Raeder – “qualquer meio de guerra que é eficaz em quebrar a resistência do inimigo deve ser usado”. Condenado à prisão perpétua, foi solto em 1955, falecendo em 1960. Baldur von Shirach: Führer da Juventude Hitlerista. O “envenenador” de uma geração, introduziu a juventude alemã à doutrina nazista, treinando-os para se tornarem membros das SS e da Wehrmacht, e os “entregando 72
‘prontos’ ao Partido como executores fanáticos e incondicionais de suas determinações. Em 1938, ele fechou um acordo com Himmler para que membros da Juventude Hitlerista fossem considerados com a fonte primária de substituição para as SS.Em 1940, Hitler denominou-o “Gauleiter de Viena” (como um Prefeito), sendo responsável pela transferência dos judeus que ainda estavam na cidade para a Polônia. Em setembro de 1942, von Schirach fez um discurso em que defendia sua ação de ter deportado “dezenas de milhares de judeus para viver nos Guetos do Leste como uma contribuição à cultura europeia”. Juntamente com Albert Speer, ele denunciou as ações de Hitler no Tribunal. Condenado à pena de 20 anos de prisão, cumpriu-a integralmente. Faleceu em 1974.
Fritz Sauckel: Ministro Plenipotenciário Geral para o Emprego de Trabalhadores do III Reich (1942), foi apontado por Jackson como sendo “o maior e mais cruel escravagista desde os Faraós do Egito”. Foi o responsável pela organização de um método sistemático para subjugar milhões de civis, conseguindo levar para a Alemanha a tão desesperadamente necessária mão-de-obra. Mais de cinco milhões de trabalhadores dos países ocupados foram levados como escravos à força para a Alemanha. As ordens de Sauckel eram que “todo homem deve ser alimentado, abrigado e tratado de forma a ser explorado ao máximo com o mínimo custo”. Foi responsável pela morte de centenas de milhares de trabalhadores judeus na Polônia. Foi condenado à morte por enforcamento Alfred Jodl: Chefe do Staff de Operações do Alto Comando
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das Forças Armadas, atuou também como vice do Marechal de Campo Wilhelm Keitels. No planejamento e condução de assuntos militares ele era mais influente do que os demais departamentos militares. Jodl dirigiu a Wehrmacht na violação de seu próprio código de honra militar de modo a cumprir a política militar nazista. Foram suas as ordens para a campanha alemã contra a Holanda, Bélgica, Noruega e Polônia. Ele também planejou ataques contra a Grécia e Iugoslávia. Jodl foi o responsável por assassinatos, deportações, trabalho escravo, maus-tratos e assassinatos em massa das populações civis nos territórios ocupados e em alto-mar. Ele assinou a rendição da Alemanha. Foi condenado à morte por enforcamento.
Franz von Papen: Chanceler em 1932, apoiou a anexação da Áustria e devotou todo o seu talento diplomático aos objetivos nazistas. Ajudou a consolidar o controle nazista em 1933 e fortaleceu a posição do Partido na Áustria, criando as condições para a ocupação. Absolvido, um tribunal alemão, no entanto, condenou-o em 1949 a oito anos em um campo de trabalhos. Mas a pena foi considerada cumprida. Morreu em 1969. Arthur Seyss-Inquart: Ministro do Interior e governador do Reich na Áustria, além de Comissário do Reich na Holanda. Assumiu o governo de seu próprio país apenas para entregar a Áustria a Hitler. Em outubro de 1939 tornou-se vice-governador da Polônia e, em 1940, foi indicado Comissário do Reich na Holanda. Colaborou com as SS. Acreditava serem necessárias severas políticas de ocupação e foi “implacável na aniquilação de seus oponentes”. Perseguiu os judeus nos
Escola, que “atirava as pérolas” de sua experiência perante os nazistas, guiou a diplomacia nazista nos anos iniciais, amenizando o temor pelas potenciais vítimas”. Enquanto era governador da Boêmia e da Morávia, Von Neurath dissolveu o Parlamento checo e instituiu as Leis Racistas de Nuremberg. Foi condenado a 15 anos de prisão, mas solto em 1954. Faleceu em 1956.
franz von papen
Países Baixos sendo responsável pela deportação de 120 mil dos 140 mil judeus holandeses para Auschwitz. Foi condenado à morte por enforcamento.
Albert Speer: Ministro de Armamentos e Produção para a Guerra. Fazia parte do círculo mais próximo de Hitler. Em 1939, seu escritório assumiu o controle da distribuição dos apartamentos que pertenciam aos judeus de Berlim e, depois de 1941, foi eficiente organizador da economia de guerra alemã. A Procuradoria o acusou de usar trabalho forçado dos prisioneiros dos campos de concentração na indústria de armamentos alemã em condições sub-humanas. Contrariando a orientação de seu advogado de defesa, foi o único réu a aceitar a responsabilidade pelos atos do regime nazista. Porém, ele não admitiu sua culpa individualmente, afirmando que foi coletiva e que ele era apenas parte do todo. Condenado a 20 anos de prisão, cumpriu a pena integralmente. Morreu em 1981. Constantin von Neurath: Ministro das Relações Exteriores de 1932 a 1938 e Reich Protector da Boêmia e na Morávia (1939 a 1941).Diplomata da Velha73
Hans Fritzsche:Diretor da Divisão de Rádio do Ministério de Propaganda. Nessa função, teve participação importante “na manipulação da verdade dos fatos, levando a opinião pública alemã a apoiar totalmente o regime nazista e anestesiando a capacidade de julgamento independente da população”. Fritzsche incitou a atrocidades e encorajou o uso de força bruta nos países ocupados pelos nazistas. A frieza e o zelo das pessoas que cometeram as atrocidades foram, em grande parte, devidas à propaganda constante e corrosiva de Fritzsche e seus associados. Absolvido, foi, no entanto, condenado em 1947 a 17 anos a trabalho por um tribunal de Desnazificação alemão em um campo de trabalhos, sendo libertado três anos depois. Morreu em 1953.
BIBLIOGRAFIA
Roland, Paul, The Nuremberg Trials: The Nazis and Their Crimes Against Humanity. Kindle edition Gilbert, G. M., Nuremberg Diary, Ed. Da Capo Press Carruthers, Bob, The Nuremberg Trials - The Complete Proceedings Vol 1: The Indictment and Opening Statements. Kindle edition Ehrenfreund, Norbert, The Nuremberg Legacy: How the Nazi War Crimes Trials Changed the Course of History. Kindle Edition SETEMBRO 2016
cartas
A edição de junho da Morashá está cheia de lições, entre as quais, a do Bezerro de Ouro, de Anne Frank e do premiê judeu na Ucrânia. A Carta ao Leitor é plena de conhecimentos históricos, mostrando a diferença entre Jerusalém, sempre ligada ao Povo Judeu, e outros povos que sempre quiseram inutilmente impor sua cultura ao Povo Judeu. Am Israel Chai, o Povo Judeu permaneceu. Esta carta é uma magnífica lição de História. Meer Gurfinkel Rio de Janeiro - Rj
Gostaria de parabenizar a Morashá pelo excelente artigo sobre os judeus na Colômbia durante a 2ª Guerra Mundial. Ele descreve os fatos históricos com precisão. Foi uma linda surpresa me deparar com a foto do irmão do meu avô com a Golda Meir, e com a foto da muito querida família Eidelman. Um dos meninos nessa última foto é o Natan, que foi o melhor médico geral de Bogotá durante décadas, e pai de duas queridas amigas. Muito especial! Parabéns! Compartilhei a matéria com vários amigos e parentes. Foi muito elogiada por todos! Diana Moreinis Nasser Por e-mail
A leitura da Morashá é enriquecedora, elucida aspectos da tradição judaica, difundindo através de artigos bastante originais conhecimento a respeito dos mais variados aspectos do povo judeu e de personagens interessantes de sua história. Todo esse acervo de informações é entremeado a uma impressionante e bela documentação fotográfica. A revista realmente encanta. Vejo-a como uma preciosidade, pois cada exemplar é uma obra de arte. Guardo os números que já recebi com muito carinho e os exponho quando a possibilidade de mostrar as belezas da tradição judaica se apresenta. Horácio Friedman Brasília - DF
Da edição 91 da Morashá, abril 2016, ressalto comentários sobre o filme “O Filho de Saul”, uma viagem ao inferno. Oscar de melhor filme estrangeiro (húngaro), exibido em poucos cinemas no Brasil. Para mim, uma obra-prima. No ensejo dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, dou destaques ao técnico de futebol Bela Gutman, judeu húngaro que veio para o Brasil em meados da década de 1950. Foi contratado pelo time do São Paulo F.C. e introduziu no futebol brasileiro as modernas técnicas adotadas pelo futebol húngaro, sensação mundial; e registro a carreira do técnico de voleibol, judeu brasileiro Sami Melnisky, que formou muitas gerações de jogadores e deu títulos internacionais para o voleibol do Brasil. Bela Gutman tornou-se um ídolo para o São Paulo F.C. e ganhou uma lembrança na entrada do Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Leopoldo Goldenberg Por e-mail
Por meio da revista Morashá tenho ao longo destes anos me aproximado da cultura, religião e tradições judaicas. Agradeço à equipe editorial por tornar acessível este conhecimento. Sou professor de agronomia da UFSC, em Santa Catarina, e como tal, gostaria de parabenizar os editores pela reportagem publicada na edição 92 de Junho sobre “O sucesso dos vinhos de Israel”. Em um texto sucinto e ilustrado, o leitor tem uma visão geral sobre o desenvolvimento da vitivinicultura de Israel. Apreciar um vinho produzido com uvas dos terroirs israelenses transcende os sentidos do olfato e paladar! Tem uma dimensão histórica e religiosa incomensurável, que aliada a sua qualidade, irá certamente conquistar os mercados mais longínquos. Lechaim! Prof. Marciel J. Stadnik Florianópolis - SC
Agradeço o envio da Morashá. Considero a revista um primor! Após a leitura levo-a para o meu consultório, onde os pacientes podem desfrutar de matérias com o conteúdo histórico e muito interessante desta linda revista. Não é raro alguém pedir emprestado.
Sou professor de História e a revista Morashá tem me ajudado muito a me aprofundar em temas mais variados, desde religiosos até puramente históricos. É uma fonte de conhecimentos e de diálogo de valor inestimável, tanto para os leitores quanto para os alunos que recebem parte deste legado. Que D’us continue abençoando seus editores.
Bela Rosa Lichand São Paulo - SP
David Barbosa Miranda Osasco - SP
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REVISTA MORASHÁ i 93
Conheci a Morashá por meio da minha primeira professora de hebraico, Iara Feldman, que me presenteou com algumas publicações. Acho a qualidade da publicação excelente! De imediato, gostei muito do conteúdo editorial, muito rico e de grande relevância para as famílias judias, por enfocar os valores judaicos e a história de nosso povo. Caroline Rossi Tardin São Paulo - SP
Morashá, como sempre exemplar... a capa e a seleção dos artigos. Como educadora, destaco a entrevista com o ministro da Educação de Israel, Naftali Bennet. Tenho socializado a leitura do artigo, que envolve uma postura comprometida em diminuir a diferença de oportunidades entre os vários segmentos da nossa sociedade. “Um dever de casa” para nosso Sistema Público Educacional Brasileiro... simples e profundo... apenas quatro objetivos que trariam mudanças significativas: a importância dos valores familiares e sociais, a preocupação com estratégias para criar uma geração mais articulada, criativa e produtiva, inclusão social e, principalmente, o investimento no Ensino Básico. É um imenso orgulho o resultado, uma taxa de 98% de alfabetizados em Israel. Deu-se relevância ao ensino de qualidade que contemplasse desde a pré-escola até a universidade. Outro destaque, a iniciativa do COI em homenagear os 11 atletas israelenses mortos em Munique – Esse momento deve ser sempre lembrado numa busca da paz e união entre os povos. Esse é o espírito das Olimpíadas... Baruch Habá. Janete Haber Fajntuch Rio de Janeiro - RJ
Morashá tem artigos maravilhosos! Silvia e Oscar Glusman Porto Alegre - RS
Recebi a edição 92, de junho, na véspera de embarcar e passei a viagem toda aproveitando este maravilhoso material. Parabéns pela edição, que agora, será repassada para meus familiares em Jerusalém. Desejo muitas alegrias e, sobretudo, gratidão pelo fantástico trabalho da revista ao longo destes anos. Continuem com Morashá, força total! Sylvia Lakeland Jerusalém - Israel
É com grande satisfação que venho recebendo essa importante revista, que não só se destaca pelo seu original e esclarecedor conteúdo, sempre fiel ao resgate da memória judaica no nosso mundo, como, também, pelo seu artístico projeto gráfico. Receber essa publicação é como receber um irmão-judeu em casa. Denise Weinreb Porto Alegre - RS
Toda a revista está maravilhosa, a capa muito bonita e todos os artigos são muito interessantes. Aprendese muito sobre o judaísmo ao ler a revista e espero cada edição com ansiedade. Queria destacar, nessa edição nº 92 de Junho 2016, um artigo que me tocou muito: do gladiador que virou sábio! Fantástica, também, a matéria sobre Veneza. Que D’us vos dê forças para continuar esse trabalho. David Kohen Rio de Janeiro, - RJ
Dolorosa, mas importante leitura, principalmente para os mais jovens, o artigo sobre o Pogrom de Kielce. Nos dias de hoje, quando a intolerância e radicalismo crescem é preciso ter consciência das consequências que podem acarretar. Rachel S. Pereira
Leio cada artigo, a cada ansiosamente aguardada edição da revista Morashá. Acompanho também as cartas dos seus leitores que, como eu, adquirem conhecimento ímpar pelo conteúdo apresentado e pela seleção de imagens que enriquecem ainda mais seu teor. A edição de junho impactou mais uma vez por todos estes motivos, mas é preciso ressaltar sua beleza a partir de sua deslumbrante capa. Vocês foram mestres ao ressaltar detalhes da Sinagoga Scuola Grande Spagnola de Veneza. Frederik Simon Curitiba - PR
Contente? Não existem agradecimentos suficientes ao receber com tanto carinho esta coleção de edições da Morashá! Já li a última edição de capa a capa. Meu primeiro conhecimento foram três edições trazidas há alguns anos por uma amiga. Me trouxeram tal alegria que ainda as tenho e já as reli. Eu já “frequentei” o website da Morashá, mas leitura na mão é mais valiosa para mim. No Rio, frequentei escola primária e secundária com uma menina; éramos muito amigas e as únicas Israelitas na nossa classe. Com a idade de 20 anos vim viver em Nova York e perdemos contato. Há trinta anos atrás visitamos o Rio e nos reencontramos. Minha amiga querida Ana Carla Safadi trouxe sua filha para estudar aqui neste verão. Como ia voltar e mencionou se eu queria algo do Brasil, eu imediatamente disse que o melhor presente seria uma edição da Morashá! “Little did I know” que ela se comunicou com Morashá, e vocês me mandaram este tesouro adorado! E quantas pessoas carregam quase 5 quilos preciosos de bagagem de São Paulo ao Rio e depois para cá? Somente uma grande amiga. Gladys udewitz Nova York - EUA
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setembro 2016