Revista Òkòtó - Edição 19

Page 1

Revista EDIÇÃO

19

|

26.MAI.2021

VERSÃO ESTENDIDA

Imagine a dor

A eterna espera pelo redentor sem cor


#020

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

3

EQUIPE Editores

Bianca Melo Kianga Ziara Òkòtó Mata Rindo da Zumbiido Òkòtó Mayara Assunção Onnurb X Yakô Aba

TENDE PIEDADE

Diagramação e Projeto Gráfico

DE NÓS!

Lisimba Dafari

Textos

Akínwálé Òkòtó Ayana Anaya Bàbálóore Omowale Apokan . . Òkòtó Balogum Manu Yahya Òkòtó Cristal Òkòtó Dara Makandal Hellen Kianga Kafunji Òkòtó Magrinha Òkòtó Omoro . . Umoja Afrika Òkòtó Rodjéli Nyack Ra Roselaine Òkòtó Saulo Ricardo Stephanie Manu

Fotos

Arquivo Lagos City Photo Blogspot

Freepik Izaias Oliveira Lisimba Dafari Vecteezy The Noun Project

á ouvi muito essa frase no tempo em que eu frequentava a igreja católica. Como forma de súplica a algo ou alguém para que venha em nosso auxílio e nos salve. A gente vê uma galera aí usando a mesma lógica com os brancos, né? É um tal de “parem de nos matar” pra cá, é frasezinha de efeito pra lá, sempre em busca de um único objetivo: suplicar pela piedade daqueles que são nossos maiores inimigos. As perguntas que ficam são: será que somos mesmo impotentes a ponto de não podermos fazer nada por nós mesmos para nos esquivar nem que seja um pouco do racismo? Ou será que entramos

num looping tão grande de dependência que é difícil até enxergar outra saída que não seja a tão famosa súplica por misericórdia? Enfim, pra gente pensar aí. O texto tema da nossa décima nona edição vem falando justamente sobre piedade, dependência e conformismo do povo preto. Além dele, temos mais outros textos para vocês se divertirem aí durante essas duas semanas. Revista de preto para preto. Boa leitura e aproveitem a nossa revista digital estendida

Kianga Òkòtó

26.MAI.21

2

Ilustrações

J


#020

5

EXÚ VAI A FRENTE

PRA DIZER QUEM VOCÊ É! Iza Oliveira :

O

ntem assisti o filme “Mariguella”, na BlackFlix. Já tava a um tempo pra assistir e quando anunciaram que estava lá, entrou na minha lista de filmes a ver. Mas não tô aqui pra falar do filme...tô pra dizer de reflexões que me trouxe.

REVISTA ÒKÒTÓ

Desde os africanos escravizados até os seus descendentes em diáspora... Fiquei o resto deste domingo, de dia das mães, pensando em pelo que eu daria a vida...minha filha, com toda certeza. Mas isso é inquestionável, é o concreto! O visível aos olhos. E o que não se pode ver ainda? O que ainda é ideia... Você daria a vida pelo que você acredita? Ou melhor, você morreria pelo que você acredita?

Kafunji Mahin Alayê Òkòtó

A Vida deu a luz a Iku, a morte. E as duas viviam se bicando, tudo o que a Vida fazia, Iku ia lá e desfazia. A Vida fazia, Iku desfazia...então a Vida foi à Ifá pedir um conselho, e Ifá contou que Exu disse através do jogo, que o destino delas era aquele

Ainnn mas Marighella foi assassinado, Malcolm foi assassinado… E morreram pelos seus ideais. Ou será que deram vida a seus ideais?! Deixar nosso corpo físico nunca foi um problema para o nosso povo, até encherem nossas mentes de cristianismo. Afinal, o que seria mais eficiente para frear um povo que não tem medo de Iku, que tem várias histórias onde engana Iku, do que fazer com que acreditem na mentira sobre irem para um inferno caso sacrifiquem suas vidas?! O problema nunca foi a morte, mas permitir que o branco decida o momento em que encontraremos ela! O problema nunca foi a morte! Se eu morrer aqui, eu renasço em casa! Se eu morrer aqui, eu renasço em Áfrika! E se eu renascer de novo por aqui, eu venho como mosquito! Hahahaha.

Palavras-chave: Exú Papo de Blackflix Pretagogia

26.MAI.21

4

Uma coisa é certa. Não vale a pena, se não houver quem esteja caminhando ao seu lado com o mesmo propósito! Esse negócio de messianismo, ser herói, é burrice! É preciso estar organizado, alinhado e principalmente seguindo o mesmo propósito!

Nosso povo sempre cultuou a vida, e também sempre cultuou a morte, entendendo que ela é também um orixá e deve ser respeitado como tal! E por ser filha da vida, a morte é sua continuidade... não aqui, não neste plano, mas em outro, até retornarmos a vida! Então a Vida compreendeu que após nascer Iku, ela ganharia outro nome; Renascimento!

EDIÇÃO 19

No mês de aniversário do Malcolm X, fiquei aqui pensando quantos tantos deram a vida por algo em que acreditaram. Não não...quantos tantos PRETOS deram a vida por acreditar que valia a pena ser livre!?

mesmo. Mas algo fazia a Vida ser maior que Iku! Ela nasceu primeiro que sua filha e mesmo que um dia, Iku passasse pela vida, ela continuaria! Porque Iku é passagem...é necessário para que aja Vida também.


#020

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

7

A

A FALSIDADE REINA

mesma dissimulação que os atores globais pretos têm de, ao mesmo tempo que estão reproduzindo/afirmando todos os estereótipos da gente, diz que ama sua raça que defende a gente e tal. É a mesma que esse pessoal acadêmico, feminista/mulherista, exquerdista e todos os istas tem. Vivem no meio branco, entre eles. Ajudando a manter seus propósito como forma de agradecimento por serem aceitos naquele mundo. Porque é tudo que eles mais sonham, serem aceitos pelos brancos.

Ayana Okô Anaya Òkòtó

No final todo mundo é ator, porque pra viver duas vidas tem que ser ator. Em uma você vive de alimentar as esperanças da comunidade preta, em você e nos pretos como você (Sabendo que é a gente que financia todos os roles). Damos audiência, impostos e a vida a eles.

: Iza Oliveira

Só organizados conseguiremos evitar que essas pessoas se criem por perto. Se escolheu viver com e como o branco que fica pra lá, não existe jogo duplo. Temos que largar a carência. Aceitar o jogo dessas pessoas é ser cúmplice. Investigue e desconfie de quem vive falando de racismo, comunidade e bla bla bla e só conseguem ir até onde o branco vai. Na cópia, na enganação, na falta de respeito com a nossa casa. Porque o errado é quem leva.

Palavras-chave: Pretagogia

26.MAI.21

6

Mesmo que isto custe a vida de alguns pretos, o que importa é se integrar.

Na outra você nos vende a preço de banana pra aqueles que ainda nos mantém em cárcere nessa diáspora desgracenta, esse comportamento rotineiro se torna viciante e nada holístico no ponto de vista complementar, porque eles só nos sugam, pra botar lá. Como a egiptóloga que faz suas pesquisas com gente preta e deixa tudo pra academia na nossa frente fala mal, mas lá, ela entrega tudo e faz a egípcia.


#020

9

NÃO PARE DE SE MOVIMENTAR

8

Por fim, o racismo é foda pro nosso corpo e mente, cada vez mais vamos ser condicionados a um atrofio que apenas os brankkkos vão ser beneficiados, pois mais máquinas e mais mão de obra serão feitas. Mas cabe a nós, na medida que estamos, seguir por esse caminho junto com eles ou lutar pela emancipação do nosso povo.

Palavras-chave: Pretagogia

26.MAI.21

Dara Makandal

Sempre escutei de Mainha que artes não dava dinheiro, que tinha que ser Engenheira ou Advogada pra poder ser “alguém na vida” e sair dali pra ter um futuro melhor. Mas futuro melhor pra quem? Gastando com quem e o que? Muito tempo eu tive raiva dela, porque eu adorava dançar (e diga-se de passagem, eu dançava bem pra porra), porém a medida que as responsabilidades foram chegando, eu tive que ir parando e junto com essas responsabilidades, os olhares críticos e isso foi travando, atrofiando, meu corpo foi ficando parado. Mas hoje essa raiva se transformou em entendimento, SIM, eu entendi que não era culpa dela, essa sociedade/país não é o fantástico mundo de bob que a gente acha que é na infância e nem é as mil maravilhas que a esquerda pinta com as palavras “aí no governo tal era bem melhor”. Não, não era, o racismo ainda imperava ali, a alegria de cantar e dançar, era a cada ano, mais reprimida até o atrofio total.

Na época de do Entendendo (atual CFK) eu me via “pegada” nos exercícios, pois eu estava dura, joelho doía, corpo cansava, mas eu sempre me colocava a prova, porque eram coisas que eu fazia e sabia fazer, não era nada extraordinário, mas meu corpo já estava tão brancamente moldado que eu não conseguia, era como esquecer que 2+2 são 4, assim como o corpo a mente também parou. Ainda no Entendendo, Taiwo falava dos três pilares do Òkòtó, Corporeidade, Espiritualidade e Intelectualidade e que os três tinham que andar juntos para você funcionar, tinham que estar equilibrados e isso me acendeu um alerta muito grande porque me lembrei da época de universidade, que quando eu comecei eu tive que parar tudo o que eu estava fazendo para me concentrar a aquilo, com isso parei de fazer todas as atividades físicas que estava por não ter tempo, por estar sempre cansada e isso me fez perceber que não adiantava todo o “conhecimento” que eu estava “adquirindo” ali, algo sempre faltaria, ali na academia, eles só queriam uma coisa, me endurecer. E até certo ponto conseguiram, porque eu não via alternativas para aquela realidade, mas já disse o Hon. Marcus Garvey: “Libere as mentes dos homens e, finalmente, você liberará os corpos dos homens.” E foi nessa que eu passei a recuperar o tempo que eu perdi, passei a recuperar tudo que me foi tirado desde cedo, tudo que me foi impedido, ali eu passei a lutar para que os próximos não passem por isso.

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

Iza Oliveira:

E

u sempre gostei de música e tudo que fosse relacionado a artes, tanto que hoje em dia trabalho com isso, mas nem sempre foi assim. Quando a gente é criança, tudo pode, a gente faz uma papagaiada aqui e ali e tá todo mundo rindo, mas, à medida que vamos crescendo, os olhares de alegria vão se transformando em olhares de “que mico” ou de “pra que isso, não tem mais idade”. Pode reparar, é muito comum isso acontecer e o foda é que isso é muito do processo do racismo que é implantado na gente. À medida que vamos crescendo, nosso corpo vai sendo moldado pro trabalho, vai sendo moldado pra “construir uma carreira”, vai sendo moldado pra servir. Mas servir a quem? Com que propósito?


#020

11

AS FACILIDADES SÃO ARMADILHA S

G

eralmente, tudo o que é mais fácil de fazer ou de adquirir acaba saindo mais caro. Comer hambúrguer e pizza é bem mais fácil que comer verduras. Beber refrigerante é bem mais fácil que beber suco verde. Jogar videogame, ficar deitado vendo Netflix é bem mais fácil que criar uma rotina de exercícios físicos. Essa parada é verdade pra tudo. Inclusive quando o assunto é finanças.

10

• 200 gramas de sobrecoxa de frango porque carne tá caro — R$2,40; • umas folha de alface — R$0,30; • umas rodela de tomate (50g) — R$0,45. Vou colocar mais 1 real de eventuais temperos (cebola, alho, etc… sazon não pelo amor de deus). Esse almoço balanceado aí deu papo de R$5,00 (carai, doidão! Dei uma de Julius legal agora). Uma comidinha básica que tu compra por aplicativo dá o que? 15, 20, 30 reais? No ruim, dá 3x mais do que você gastaria em casa. É fato que muitos de nós não temos condições de guardar muito dinheiro, mas não podemos usar isso como desculpa para sermos displicentes com nosso dinheiro. Pega a visão que Marcus Garvey deu no livro Procure por mim na tempestade: “Dinheiro é o sustento da vida, ele paga todas as necessidades e oferece segurança”. Ao ganhar dinheiro, o indivíduo nunca

Se você gasta tudo o que tem, você está à beira da falência o tempo inteiro. Portanto, faça do poupar dinheiro uma regra, não importa o quão pouco seja.” Voltando à analogia inicial, qualquer um que se dispõe a comer saudável e se exercitar pelo tempo necessário acaba descobrindo que essas coisas podem ser tão ou mais prazerosas que comer besteira e ficar vendo televisão. O mesmo acontece com o controle das suas finanças. É ótimo saber pra onde está indo seu dinheiro, poder controlá-lo e fazer planos com ele, mesmo que sejam planos simples. Então vamo querer parar de gastar dinheiro com besteira?

: Iza Oliveira

Palavras-chave: Aqué

26.MAI.21

Balogum Manu Yahya Òkòtó

Pedir comida é bem mais fácil que fazer comida, mas tu sabe quanto custa um prato de comida que tu faz na tua casa? Vou fazer uma estimativa considerando o preço das paradas nos mercados perto aqui de casa. Vamo considerar que tu come o seguinte:

• 100 gramas de feijão — R$0,60;

deve gastar mais do que recebe. Isso é um mau negócio. Qualquer que seja o montante recebido, ele deve ser econômico o suficiente para poupar pelo menos de 15 a 20% de sua renda, poupando para criar assim novas oportunidades e se prover durante os tempos difíceis.

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

Pedir um carro que te busque na porta de casa e te deixe no exato endereço do teu destino na hora do evento sem precisar sair com muita antecedência de casa é bem mais fácil que começar a se

arrumar mais cedo, andar até o ponto de ônibus, esperar por ele, levar mais tempo na viagem e ainda ter que andar mais um pouco. Mas nessa daí tu gastou 15, 20 reais em vez de 5. A princípio parece pouco, mas de grão em grão, a galinha enche o papo… e esvazia o teu bolso.

• 150 gramas de arroz — R$0,60;


#020

13

EMPREENDER

REVISTA ÒKÒTÓ

Iza Oliveira:

Bom pensar que às vezes menos é mais. Às vezes a parada está bem próxima de você, você só precisa trabalhar em cima dela. A maior parte do pessoal que conheço que está na função de empreender ou está fazendo algo que aprendeu com os pais, tios, avós ou então algo que fazia para os familiares, amigos ou até para si mesmo. Tudo envolvendo cuidado. O cuidado de aprender dos mais velhos e não deixar uma função como pedreiro, marceneiro, cozinheiro, etc morrer na linhagem da sua família e o cuidado de fazer algo para si e para aqueles a quem se importa. Desde sabonete até empada. Àdáyébá ou Quituteria Raízes. Os passos de onde nasceram. Não adianta querer algo pronto, a gente sabe que as coisas não vêm assim. O pessoal super se desgasta e se esforça pra trabalhar para brancos, mas quando é pra trabalhar pra si ou em algum empreendimento preto já não tem a mesma energia.

12

Magrinha Òkòtó

Recebendo ordens, sofrendo racismo, dando energia e ajudando no sucesso

Mesma coisa com o corpo, se você não se movimenta não vai ser de um dia pro outro que você vai estar com o corpo naquele shape. É um processo de ir trabalhando, vendo qual movimento vai dando mais certo, lapidando com a prática. E você nem precisa de super equipamentos, se você está começando aquilo às vezes só vai atrapalhar, porque depois você vai descobrir que aquele equipamento não é o melhor ou que na verdade ele até faz mal. Vai testando. Se superando, criando planos para atingir sua meta. Descobrindo os detalhes e desafios do ofício que você está buscando. Não adianta querer chegar como o presidente de uma grande empresa se essa empresa ainda não existe, e se ela ainda não existe é seu papel de ajudá-la a criar. “Perguntei: Onde esta o governante negro, onde esta o seu rei e o seu reino? O seu presidente, seu país e seu embaixador? Sua marinha, seu exército, seu líder? Não pude achá-los e então eu declarei: Eu ajudarei a criar!!” Honorável Marcus Garvey.

Palavras-chave: Autonomia

26.MAI.21

Ninguém quer começar de baixo, mas aceita todo dia estar abaixo do branco.

de um projeto branco. E esse projeto a gente já sabe que é o projeto do nosso extermínio de todos os jeitos, físico, mental e econômico. Sabendo disso como alguém que se diz consciente, que fala que quer fortalecer a nossa comunidade, não pensa e não faz por onde sair dessa lógica?

EDIÇÃO 19

É IMPOSSÍVEL?

U

m pessoal pensa que tem que ter uma ideia super mirabolante para empreender. Tipo preciso criar um produto inovador que as pessoas vão sentir uma incrível necessidade de comprar, algo que nem existe, o único no mercado.


#020

15

CARTA ABERTA AOS ESCRAVOS DA CA SA E FUTUROS BAFIOTES

E

REVISTA ÒKÒTÓ

Omoro . . Umoja Afrika Òkòtó

Vai chegar um ponto que já não vai dar para dizer que não há uma “estrutura preta”, que não há instituições pretas às

Vocês estão escolhendo diante de tudo que está sendo discutido, manter critério de análise branca lotada de moralismo cristão para opinar, julgar, maldizer, discriminar… Digo com segurança que nenhum dos constrangimentos e exposições que já houveram pesará tanto sobre o subjetivo de vocês do que quando chegar o ponto de você ter a instituição branca e a preta para recorrer e você ter que escolher a branca pq tu amaldiçoou a preta e ela prosperou mesmo assim!!! Nada vai pesar tanto na autoestima, na perspectiva de quão merda você é para si mesmo, do que ver que você trabalhou 30 anos numa instituição branca da qual eles diziam ao vivo e nos bastidores que tu era uma macaca e merecia ser estuprada, sendo que vocês foram contemporâneos de organizações precursoras e competentes, porém vocês alecrins

dourados da gentileza e boa convivência achavam que não haviam lugares fora da lógica racista para onde olhar e correr, então escolheram método branco. Portanto, nós devemos zelar pelas nossas coisas e não deixar qualquer um entrar, de qualquer jeito. Para muito custa entrar na mente, principalmente os pan africanistas, que por todos os meios necessários também inclui criar instrumentos e mecanismo de contenção de pessoas pretas. Eles acreditam que começar a trabalhar isso vai empacar nossa retomada rumo à unidade. Eu e meu bonde asseguramos que não. E também será esfregado na cara do namastê pan Africanismo que é falácia. Muito embora eu não os veja como parte constituinte de escravos da casa e bafiotes, eu tenho certo temor pela postura condescendente que eles insistem em ter com os da casa e os bafiotes, uma eterna irresponsabilidade e infantilidade direcionada ao povo preto que em diversos exemplos já está se mostrando improdutivo. É aquela coisa, se o branco não chega em você, ele manda o da casa, se o da casa não chega em você ele manda algum zen pan africanista. Eu torço até certo ponto, que vocês peguem todo esse pseudo orgulho que vocês dizem que tem e comecem a se mexer para serem o mais autônomos possível. Porque eu não queria estar na pele de vocês dependendo em todos os âmbitos subjetivos e objetivos de uma instituição preta construída a base da CAPOEIRA e da espiritualidade africana. Você vai se

ver diante de uma comunidade sagaz que já está produzindo e reproduzindo comportamentos diferentes dos seus, aos quais você relutou em criar e/ou resgatar, conservar. E a tão sonhada Wakanda se materializou na sua frente e você perdeu o time, afinal o seu critério sempre foi materialista e você não conseguiu se municiar de nada VERDADEIRAMENTE IMPORTANTE, da qual já tinha vários exemplos e precedentes dentro da nossa cultura e história. E então você vai se ver sendo marginalizado entre pretos pq nesse território você é um vírus. Você é a representatividade branca materializada em um corpo preto. Você pagará o preço das suas escolhas. E eu não estarei nem um pouco incomodado em ser o cobrador. E não perderei um minuto de sono perante a situação ao qual você se enfiou. Ela será instrumentalizada de exemplo e lição para as futuras gerações não caírem nos mesmos erros e destinos terríveis. Há quem diga que esse tipo de postura propaga ódio dentro da nossa comunidade. Porém eu desconheço tamanha prova de amor, um amor verdadeiramente nãoromântico. Sem expectativa nada a ver com precedentes. Esse tipo de postura irá promover mais amor e unidade sólida do que qualquer outra. Àqueles que se pretendem antagonistas desse destino, guardem com carinho esse presságio, esse prelúdio. Se possível amoroso como sou ainda dou dica - tenta desenvolver algo para se rastejar de forma inteligente para não gerar alarde e incômodo.

Palavras-chave: Negrescagem

26.MAI.21

14

Aqui eu to me colocando sem modéstia nenhuma como a pessoa que tem a intuição tão forte quanto o Malcolm e sua mãe. Para terror dos materialistas, os capoeiras irão construir um império autodeterminado sem precedentes, que vai engolir todo esse lixo que vocês reconhecem como coletividade, movimento negro, Black money, consciência negra, afrocentricidade… Vamos passar o carro nos modos comuns de ascensão que vocês conhecem, daremos aulas de como se faz política, de como construir, e de como fazer manutenção de poder. Do que é unidade e prosperidade. Baseado na nossa própria cultura, nada de copiar métodos dos outros. Agora podem me chamar de megalomaníaco!

quais se possa recorrer. Aí as ratazanas vão querer chegar. Mas vai ser a gente HEHEHE’ Pode ser que vocês esqueçam, que vocês sejam sonsos, mas a galera que carregou nas costas os custos de erguer o império não irá esquecer. E digo, da minha parte, que não pretendo aliviar a imaginação e criar mecanismos de controle para barrar potenciais traidores com passado todo cagado. Na hora que não havia “nada”(o que já é criticável hoje, pois há organização e a possibilidade da criação delas) criticava os métodos, agora que prosperou(materialmente, pq espiritualmente e cultural já está) vai querer explorar? Não comigo. Para alguns, paga dobrado para assistir. Para outros, nem entra.

EDIÇÃO 19

u guardo com bastante rancor pretos que insinuam que os precursores de ideais africanos estão na “mesma merda” que eles por estarmos na diáspora ou por não sermos bilionários. O meu ódio e o meu ranço desses inertes desgraçados apaixonados pelas contradições vai me fazer lembrar de cada face e de cada nome. Porque eu e o meu quilombo iremos enriquecer materialmente NESTA VIDA. JUSTAMENTE por sermos precursores de um trampo espiritual, corporal e emocional decente em comunidade. Paradigma esse do qual nós carregamos quase toda a carga, portanto carregaremos a frente de todos os ganhos disso.

: Iza Oliveira


#020

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

17

CORTEJO DA PIEDADE Lisimba Dafari :

“Minha mente jovem e ambiciosa conduziu-me a voos de grande imaginação. Eu vi, então, diante de mim, homens, assim como vejo agora, um novo mundo de homens Pretos, não peões, servos, cães e escravos, mas uma nação de homens robustos deixando sua marca na civilização e fazendo alvorecer uma nova luz sobre raça humana.“ “Eu repito que Deus os criou senhores de seu próprio destino, senhores de sua própria sorte, e vocês não podem pagar tributo maior ao seu Senhor Divino do que funcionar como homem, como Ele os criou.”

Akínwálé Òkòtó

“Imagina a dor, adivinha a cor” são variações do mesmo tema da piedade, da dependência, da impotência. É a posição do irresponsável, que precisa ser tutelado. É lição já dada que a vala é o destino dos grupos que entregam à mão de outros a sua própria sorte. Cedo ou tarde, um grupo que assim procede perecerá, já nos foi dito de diversas formas. Muitas vezes nem resta quem conte a história, pois há ainda a vala da história. Mas os Pretos, coletivamente, aderiram a essa imagem infantilizante, sem vergonha. Há ainda percepção de mérito, valor nessa figura do bom crioulo apequenado, chorão.

26.MAI.21

16

N

ada mais distante dessas imagens que Garvey lançou cerca de 100 anos atrás do que essas marolas para sensibilizar branco. A nova, que um monte de marmanjo e marmanja anda vestindo, é o “imagina a dor, adivinha a cor.” É a

atualização dessa posição de um homem fraco, de uma mulher fraca, que imploram por simpatia, por tolerância, por cuidado ao seu eterno agressor. Vão mais de 2000 anos de agressão sem intervalo, vão mais de 2000 anos que essa imagem cola aos pretos.


#020

19

Quando figuras, personalidades como Garvey são descartadas como expressão de um radicalismo sem propósito, o que fica evidente, para além do medo dos inimigos do povo preto, é o medo dos próprios pretos, que não é o medo do radicalismo. É, antes, o medo de nos olhar no espelho, de encarar honestamente a nossa condição e, daí, dar o nome certo aos bois, aos porcos e às piranhas. O medo de dizer para nós mesmos que esses que nos tomaram há milênios por inimigo são, logicamente, nossos inimigos. Vestidos de lobo ou de raposa, são, logicamente, inimigos.

REVISTA ÒKÒTÓ

Palavras-chave: Negrescagem

Essa imagem deprimente de um sujeito apequenado e “apaixonado” pela própria destruição e pela injustiça de que é vítima (é ‘paixão de cristo’, o nome da cena, não é?) é vista por muitos de nós como bela, como reflexo de uma moral superior. Já colaram meninos pretos e travestis na mesma na cruz. Até no sambódromo correu esse cortejo da piedade. Nesse pique de sequestro

O perigo em não jogar o jogo é real, não se pode negar, mas é mesmo feio, intolerante? Existe aí um jogo de inversão em que a “alternativa” ao radical, ensinada tanto por uma militância preta, sem vergonha, financiada pelos agressores brancos, e veiculada pelos pretos doutrinados nas instituições culturais, religiosas, políticas, educacionais, econômicas, midiáticas brancas, é a colaboração na morte contínua do seu povo. Ela vem pela bala, pelo cárcere, pela boca, como vem pelo embranquecimento, essa forma de morrer, aplaudindo a própria morte. “Se vocês não podem fazer o que outros homens fizeram, o que outras nações fizeram, o que outras raças fizeram, então é melhor vocês morram!”, faz cerca de cem anos que Garvey deu esse papo. E se nossa escolha for essa fita aí de desresponsabilização e da sensibilização dos agressores, na base do completo desrespeito, sejamos ao menos honestos em assumir que a gente combinou de morrer mesmo, e da forma mais desonrosa possível.

26.MAI.21

18

No reflexo, o espelho projeta a imagem de homem/mulher de coluna ereta de que fala Garvey e dos sacrifícios, em tempo, suor e sangue, que a postura exige e que não queremos bancar. Do outro, temos a imagem do covarde, aquele que, pelo menos intimamente, já tendo dito a si o mesmo o que é preciso fazer, se faz incapaz de se mover em direção condizente. No terror da encruzilhada (esse termo tá na moda falar, mas, de novo, só por falar mesmo, no pique de cortejar simpatias) a imagem que seduz o nosso povo – afinal ninguém fica bem na posição do covarde – é essa aí do penitente, do injustiçado, do clemente. Se isso tudo remete à imagem do Cristo na cruz, não é por acaso.

Não à toa são tantas as vozes em que eles colaram a imagem de “radicais” a insistir sobre a importância de o povo preto resgatar o respeito próprio. E respeito próprio, como nos lembra Frances Cress, compreende o respeito por si mesmo, no íntimo e pessoalmente, e o respeito pela coletividade (Preta). Não existe um sem o outro. Garvey foi outro que, muito antes, tanto martelou sobre a necessidade de desenvolver a confiança em si mesmo e no seu grupo racial para quem deseja, de fato, sair da vala. É doido, penso eu, que falar nesses termos seja visto como radical. Pensa só, diz aí. Confiança e respeito individuais e coletivos sejam coisa de radical e, em consequência, coisa perigosa, feia e intolerante.

EDIÇÃO 19

É o medo das consequências desse sol que não topou se esconder atrás da nossa peneira. Já que, nisso, ele escancara a nossa posição de fraqueza diante da ação a tomar ou negligenciar, e o que isso diz sobre quem nos tornamos. Isso dá medo. Essa posição de decisão e sacrifício que toda escolha demanda faz muitos de nós, treinados a correr das responsas e se esconder atrás dos erros, querer correr do problema e da imagem refletida.

espiritual, em culto à fraqueza, segue o gado dos pretos, orgulhoso, rumo ao eterno calvário. Esse horror se faz bonito aos olhos dos pretos, que suplicam por piedade. É dessa seara que saem as variações de súplicas: “parem de nos matar”, “vidas pretas importam”, “tolerem a nossa religião”, e, agora, “imagina a dor, adivinha a cor”.


#020

21

PORQUE A FILANTROPIA MATA AO INVÉS DE CONSTRUIR Iza Oliveira:

U

m militante (ou vários) se colocam contra a vaquinha que aparentemente daria 1 milhão para um homem preto. Aí, quem é favor se sente ofendido, e acha que o militante está ali pra estragar, roubar, matar e assassinar a felicidade de todos. A incapacidade de entender a lógica do outro é TÃO grande assim? Não se pergunta ou não tenta responder porque isso acontece? É TÃO simples entender que 1. A necessidade de erguer um homem de cada vez (sempre o mais midiático) é o sentimento usado pelo branco pra escravizar todos. Tipo damas, dá boi em uma peça pra comer cinco;

REVISTA ÒKÒTÓ

Isso significa que o argumento de: “faço os dois, filantropia e organização! Um não impede o outro”, é uma hipocrisia sem tamanho, ou muita cegueira. Bem provável que seja meia mussarela meia calabresa aqui. Meia hipocrisia meia cegueira.

Rodjéli Nyack Ra

Tal como é o corpo e a pornografia em relação ao sexo, é a filantropia em relação à consciência. Vicia pra baixo, treina para a impotência e a ineficiência. (Acho que é óbvio que falo dos efeitos no indivíduo, e não o fato de ser um ato bonito ou degradante, certo?! Vocês não querem ser chamados de burro fazendo

O consumo de álcool se adapta ao capitalismo porque ele também promove alívios pontuais da tensão e do estresse cotidianos, quando o saudável seria agir para esse cotidiano não ser doentio. É uma gestão de dopamina. O álcool esvazia a discussão e a construção de um cotidiano saudável. Essa gestão moldada para a improdutividade vai acontecer em ABSOLUTAMENTE TODOS os processos em que você tem eventos pontuais distribuídos durante os meses, ao invés de ser a sua realidade prática cotidiana, ritualística, que você realiza antes e após o café da manhã. Coloque eventos pontuais para resolver problemas coletivos estruturais e veja a potência e a autonomia morrer, enquanto a escravização e a dependência só aumentam. Esse texto é a prova que a didática nunca funciona, porque é o mais didático possível, e quando não conduz à uma conclusão gostosinha, as pessoas se revoltam. E é aí que eu defendo a chacota política. Porque eventualmente eu sou pedagógico como forma de testar o mercado. E SEMPRE falha. SEMPRE! GADO não pode ser educado com lições em que a moral da história não leva pra Disneylândia. Aprenderam que toda história tem que terminar com final feliz e dando prazer. Aprenderam isso sofrendo com a gestão de endorfinas.

Palavras-chave: Pretagogia

26.MAI.21

20

Na PRÁTICA, quem ergue organização pode até fazer filantropia eventualmente. Mas quem faz filantropia, não tem configuração de endorfinas no cérebro que O TORNE CAPAZ de erguer organização. Porque a filantropia fornece prazer de auto realização mais instantânea, e isso vicia quem pratica.

Todo viciado em pornografia, diz que sua ação pontual não repercute negativamente. Assim como os viciados em filantropia também fazem. Ambas são sequências eternas de ações pontuais que criam cérebros e corpos incapazes de construir nada. A dopamina manda em TUDO. Perceba também, os efeitos colaterais: são os mais depressivos, ansiosos e com necessidade de atenção especializada. Os mais adoecidos.

EDIÇÃO 19

2. O efeito psicológico da filantropia cria um alívio e uma esperança, que NA PRÁTICA faz o indivíduo desistir sistematicamente de organização preta. Porque quem faz práticas pontuais, isoladas de um PROJETO cotidiano, configura seu cérebro para REAGIR, e não para construir. Reativo jamais será construtivo. Jamais pautará, sempre será respondedor de pautas. Quem controla a pauta controla o destino.

essa associação, certo?!). Então, em síntese, é isso.


#020

23

ATIRAR ERRADO

PODE NOS MATAR

M

Você pode reconhecer se “tá funcionando” de acordo com a ideia e ações que um futuro pode nos exigir? Você consegue se planejar?

Sem muitas delongas, o futuro exige base. Exige planejamento. Exige que nós passemos a entender que existe um amanhã. E esse amanhã no geral é o que faz a gente viver o dia de hoje.

Seja para cozinhar, seja para estar fazendo algo que gosta, seja para trabalhar.

Aquela velha história da plantação, que tem seu tempo para dar os frutos. E esses frutos dependem de como cuido da minha plantação.

Se a gente não consegue dar conta de planejar o amanhã, quem dirá planejar um futuro?

Se você planta branco, sem dúvidas, irá colher branco. Se você planta preto, sem dúvidas irá colher preto. Muitos de nós, desenvolvemos hábitos (não por acaso) construídos em cima do imediatismo do “eu preciso” “ tem que ser aqui e agora”. Pode não parecer, mas a confusão começa aí quando o pensamento é voltado para EU e não para o NÓS.

Você consegue planejar o dia de amanhã?

Estar organizado nos ajuda a conceber perspectivas, algo inédito e até meio novo para nós. Nos ajuda a ter um alvo e a lançar a flecha pra esse alvo. Nos ajuda a olhar para longe.

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

uitos vão dizer que sim, eu diria que sim até começar a entender que o comportamento é a melhor régua para medir nossa vitalidade, nossas perspectivas.

Temos direito de viver bem (sem romantizar) temos direito a um futuro, junto da comunidade que nos mostra diariamente o quanto é preciso planejar

Iza Oliveira :

21 98484- 2272

Palavras-chave: Pprt

26.MAI.21

22

Roselaine Òkòtó


#020

25

NADA É ALEATÓRIO QUANDO SE FALA EM ÁFRICA

T

No nosso corpo é formado por 50% do DNA da nossa mãe e 50% do DNA do nosso pai, porém isso é diferente em um lugar. Na nossa mitocôndria! Eu não vou entrar na explicação do que é uma mitocôndria aqui, mas o que interessante dela em relação ao assunto que estávamos falando é que na mitocôndria é o único lugar do nosso corpo em que o DNA é totalmente herdado da nossa mãe. Isso explica totalmente a linhagem matrilinear, se você quer que o reino

Olhando para o método organizacional europeu, você percebe que eles com tanto foco no homem e no patrilinearnismo conseguiram o contrário do que eles queriam. Passando o trono pro filho do rei, acabaram passando o reinado na verdade para a família da rainha, mesmo que apenas biologicamente, eles deturparam a sua própria ordem. A parada da mitocôndria é tão louco que me fez pensar também em relação a organização matriarcal da áfrica, em como faz muito mais sentido olhar o mundo desse ângulo, além da questão da mulher que dá a vida ela é também que vai te

A nossa educação, ciência, espiritualidade e organização social nunca foram coisas separadas, as coisas sempre foram bem explicadas e definidas, com propósito, a gente volta naquele papo sobre os estudos das leis da vida a parada da conexão, tá tudo conectado, até aonde a gente não vê explicação por esta tão afundado no mundo branco, mas tem, nada é aleatório quando se fala da África.

: Iza Oliveira

Stephanie Manu

Palavras-chave: Ancestralidade

26.MAI.21

24

organização, que era mais simples passar o trono pro filho do rei” eu lembrei de uma parada da biologia.

acompanhar por toda a sua vida, não que o papel do homem seja menos importante (feministas saiam daqui), mas a mulher é o centro da vida, da continuidade, da ancestralidade isso é muito louco. E o foda é perceber que isso provavelmente não foi aleatorio, a questão é que nosso povo, nossos ancestrais já sabiam disso. É aquela parada onde o branco chega e acha que tá inventando a roda, sendo que ela já existia há séculos, eles que não conseguiram entender e agora que tão entendendo tão querendo dizer que “descobriram”.

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

ava fazendo uma pesquisa sobre o império de Gana para um texto que ia escrever para a página, acabei sem querer esbarrando no tema da matrilinearidade. No império de Gana, a sucessão do rei era feita através dessa organização, onde quem recebe o trono é o filho da mulher da família, geralmente o sobrinho do rei, esse assunto não era novo pra mim sempre soube que na África a sucessão era feita na grande maioria das vezes através da matrilinearidade, mas neste momento de estudo ouvindo o branco ridículo que tava falando que “não sabia porque eles utilizavam essa

continue no poder da família que reinava ali você não vai oferecer o trono ao filho do rei e sim ao homem filho de uma das mulheres da família, por que ele carrega o DNA da família, ele carrega o DNA mitocondrial da mas antiga ancestral dessa família, então essa escolha esse estilo de organização é o mais sensato, o mais correto de acordo com o objetivo.


#020

27

FAMÍLIA REVISTA ÒKÒTÓ

sobre suas famílias! Me faz realmente feliz. Há alguns anos minha família diminuiu

de membros drasticamente, perdemos

minha tia Lúcia (que era a mais velha) e

nem se tinha um ano da passagem dela,

tia Silvia (que era a caçula dos irmãos) se

foi também, um mês depois dela meu tio Gilberto (marido da tia Silvia) partiu.

Hellen Kinga

Enfim, estava contando um pouco sobre eles porque vivemos dizendo que família não se escolhe, mas na verdade escolhemos sim! Inclusive escolhemos, nos distanciar, nos excluir, nos fragmentar, a moda virou dizer que o parente tal é tóxico, que a mãe é isso, o pai aah o pai aquele invisível que só sabe se matar para por o sustento na mesa, nada de tão grandioso né? Ele não lansou aquele HB20, né?! A relação que tem sido construída com o núcleo familiar, vem se desmantelando na medida que, vamos caindo no conto do vigário, acreditando na ilusão da maternidade real, nas mães solo, nesses tipos de ladainhas, que estão sendo criadas e alimentadas, a fim de desarticular, fragmentar as famílias pretas, que por conta do racismo são atravessadas na esfera: intelectual, corporal e espiritual. Assim, fomos sendo conduzidos a desejar que nossa família fosse se esvaziando, se

Nesse novo lugar, não tem espaço para as tias Lúcias e nem tia Silvias, que brigavam, que cuidavam, que tinham palavra também na criação. Esse tipo de comportamento, para as mães modernas, é chamado de tóxico, justamente, por não atender prontamente os desejos e expectativas dessas mães. Para nós não há sentido, criar uma criança sozinha, na real não se é capaz disso, a partir do momento que as demandas financeiras se fazem mais presente, é necessário se trabalhar para garantir o sustento da menozada, precisamos então do envolvimento de toda a comunidade na educação da criança. As nossas crianças precisam desse envolvimento para se desenvolver, eles precisam dessa conexão, e nós também, não dá pra cancelar a família eternamente, ainda mais se vocês entenderem que tudo para nós parte do lugar de atravessamento do racismo, somos pessoas quebradas, famílias quebradas, que tiveram que se adaptar nesse merdelê branco, para não morrerem de vez. Enfim, bateu mó saudade das nossas falações, das zoações, das picuinhas, dos muitos nãos que disseram, e dos sim também, das idas aos ballet, de chegar da escola e te avistar no portão nos esperando, de ser cobaia da mary kay da vendedora de boa lábia. Hoje seria esse dia de rir, de dar pijama combinando para usar no natal pra tia Lúcia, e coisas mais pra frente pra tia Silvia. Ai, ai, viu!

Palavras-chave: Ancestralidade Continuidade

26.MAI.21

26

Iza Oliveira :

É neguin não foi mole não, fomos findando aos poucos, nossos fins de semana teve outro rumo, já não colocamos a mesa para os almoços, não se tinha falação alta da tia Silvia e minha, não se tinha mais gritos dizendo que não tínhamos nada pra oferecer quando ela chegava no portão. Não tinha mais com quem desabafar e reclamar quando brigava com minha mãe, não tinha conselhos, não tinha mais duas mães.

desconectando, e por fim ficando brancos.

EDIÇÃO 19

F

amília é uma parada muito louca. Amo ver a negada postando e falando

Minhas tias sempre foram minhas mães também, participavam ativamente na nossa criação, era médico, apresentação de ballet, formatura de cursinho, todas as etapas eles estavam lá, nos apoiando e incentivando. Sendo nosso abrigo, Tia Lúcia era a rocha da família, todos que queriam desabafar, reclamar ou simplesmente jogar conversa fora, assistir televisão era só chegar nela. Até no silêncio muita coisa era dita, muita coisa era sentida. Já a tia Silvia, era a festeira, nos aconselhava sobre festa, sobre romances e tudo mais. E por fim tio Gilberto, esse era o dj, mas também era o barraqueiro, aquele que zoava, mas não aguentava a zoação rs.


#020

PATERNIDADE

E REFERÊNCIAS

Omowale . . Apókan

Hoje, minha relação com meu filho é melhor do que a de muitos pais que têm a oportunidade de estar fisicamente com seus filhos. Essa relação foi construída e estabelecida porque eu internalizei esse propósito desde o começo. No dia que soube (que confirmei) que seria pai, acordei minha mãe no meio da noite chorando e dizendo que de manhã já ia procurar trabalho em Salvador porque eu precisava criar meu filho de perto. Sensata, ela me acalmou e me fez entender que agir com desespero não iria ajudar em nada. Mas também devo a construção dessa relação ao

Eu ia dizer que “se eu pudesse ter escolhido nada disso teria acontecido dessa forma”. Mas dizer isso é me eximir da responsabilidade de arcar com a irresponsabilidade das ações e omissões dos fatos que desencadearam nesta realidade. Então, digo que, se naquele momento eu tivesse agido com responsabilidade, tivesse pensado nas consequências, eu não teria permitido tais ações. E entender muito cedo toda a minha responsabilidade nessa história é um outro fator que possibilitou seu sucesso. Mas hoje digo que são quase 16 anos de muito aprendizado e de muito crescimento. Meu filho e essas circunstâncias de paternidade têm um peso absurdo na construção do homem que me tornei. Se tudo isso não estava nos planos já traçados para o meu Orí, minha maturidade espiritual me deu a capacidade de tirar o melhor proveito de toda essa situação. Pra mim e pro meu moleque. Perdi muitos momentos incríveis que uma paternidade vivida ao lado do meu filho poderiam ter me proporcionado. Me senti frustrado por isso por muito tempo. Mas ao mesmo tempo, estar “livre” do cuidado presencial me permitiu aproveitar inúmeras oportunidades que talvez não teriam sido possíveis em outro contexto. E no fim, tudo o que consegui construir se deveu a capacidade de administrar as perdas e ganhos de toda essa situação. A grande sacada disso tudo é entender e observar o peso das referências. Os espelhos são fatores primordiais pra construção de homens e mulheres que serão também referenciais para os que virão depois. Eu venho trabalhando pra ser essa referência. A paternidade nessas circunstâncias não convencionais e em grande parte tempestuosa me fez compreender a necessidade de deixar um legado que beneficiará meu filho. E essa é uma das formas de contribuir com a mudança de uma realidade. Existem outras várias. Entenda seu papel no universo que te cerca e trabalhe pela mudança. As circunstâncias são muitas. Mas o objetivo é o mesmo: progresso para os nossos.

Palavras-chave: Continuidade Elementares Fertilidade

26.MAI.21

28

Já falei por aqui sobre minha família e de como sua estrutura, calçada em valores trazidos e moldados pelos meus avós de ambos lados, contribuíram na minha formação. Quando me tornei pai, todos esses ensinamentos trazidos por uma experiência vivida foram cruciais pra que eu pudesse encarar e superar todos os desafios que a paternidade, nesse contexto, me trariam. Ter homens como meu pai e meus tios como espelhos já teria sido suficiente pra moldar o bom caráter de qualquer pai preto e guiá-lo nas suas decisões.

movimento feito pela mãe dele de sempre fazer questão de que o menino soubesse que tinha um pai. Seja em diálogos entre os dois, seja na ação de me pôr a par de tudo que o cercasse e me levando a participação de todas as (ou a maioria das) deliberações que o atingisse direta ou indiretamente.

EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

Iza Oliveira :

O que venho falar mesmo é sobre uma experiência enquanto pai. Fui e sou pai num contexto de distância (filho há 1.600km de mim ou eu dele) e uma relação muito conturbada com a mãe. Houve momentos de extremo adoecimento e desespero por diversas questões. Mas fora isso tudo (que não foi nem é pouca coisa), eu tive muita sorte. E não digo sorte no sentido de graça aleatória, casual. Não. É sorte no sentido de benção, de uma luz que sempre esteve ali pra me guiar a vida toda, mesmo nos momentos em que eu não a enxergava. Tive apoio incondicional tanto da minha família quanto da família dos avós maternos do meu filho. Mas na verdade, sempre foi uma família só (5 novelos pra desenrolar essa prosa toda). E esse foi um dos pontos de maior relevância no que considero uma história de enorme sucesso.

29

E

u tive e ainda tenho uma experiência de paternidade muito foda. E aqui falo enquanto pai e não como filho. Como filho, por mais dificuldades que tivesse rolado, ainda assim dá pra avaliar como um mar de rosas pq não chegou a faltar nada. Nem materialmente nem subjetivamente. Houve um período de uma escassez material pesada, mas quando se vive em uma família preta, não nuclear, não existe desamparo. Mas isso é papo pra outro texto.


#020

31

ALIMENTAÇÃO E ANCESTRALIDADE

C

omo tem sido a frequência e a quantidade de frutas, legumes, vegetais e oleaginosas que vocês têm comido? Ou tem sido aquele arroz feijão com um bifão/frango e pronto?

REVISTA ÒKÒTÓ

Sobre a alimentação dos nossos ancestrais, conforme as evidências históricas e antropológicas e arqueológicas, é possível afirmar que: “(…) não dependiam apenas da carne, mas também se utilizavam amplamente de recursos vegetais.” Pág. 558

“(…) Todos se localizam perto da água, onde as árvores forneciam sombra e frutos comestíveis e a caça tendia a se concentrar à medida que a estação seca avançava. Todos ficam em locais onde hoje existem associações de vários tipos distintos de vegetação.” Pág 568 (trecho História Geral da África — Volume I) Apesar da prática da caça ter feito parte da vida dos primeiros seres humanos, esta acontecia em momentos de escassez de recursos vegetais. Assim, a base da alimentação dos nossos ancestrais durante um longo período teve como pilar, os

frutos que a terra os dava. Não há dúvidas do quanto o consumo de frutas, legumes, oleaginosas são de extrema importância para a saúde humana. Já parou pra pensar que, as suas alergias, gripes constantes, prisão de ventre, indisposição, dores, são oriundas de uma alimentação escassa desses alimentos? Comece aos poucos a introduzir esses alimentos na sua rotina, que sem dúvidas mudanças no seu estado de saúde acontecerão e serão perceptíveis, e isso vai muito, mas muito além da questão estética

EDIÇÃO 19

Você sabe, mas não custa repetir: A Humanidade nasceu no Continente Africano. Ao contrário das mentiras baseadas no euro centrismo, que aprendemos aí afora, os fósseis mais antigos que se tem registro, são encontrados na África. E porque a África? Apesar do clima, relevo e condições em gerais da Terra terem sofrido drásticas mudanças de milhões de anos até os dias de hoje, o continente africano é o local

do planeta que propiciou primeiramente a evolução da espécie humana, devido ao surgimento de condições climáticas favoráveis à vida humana, como calor, presença de água doce e por consequência solo fértil que diversificou a quantidade de frutos e proporcionou uma alimentação rica em nutrientes para esses seres humanos.

Cristal Nyamekye Òkòtó

Palavras-chave: Nutrição

26.MAI.21

30

: Lagos City Photo Blogspot


#020

33 EDIÇÃO 19

REVISTA ÒKÒTÓ

O MOVIMENTO LGBTQIA+ NÃO REPRESENTA

PESSOAS PRETAS!

Q

ue a esquerda é racista, isso até negros de esquerda não ousam questionar. Mas então qual a razão de apoiar tanto essa ideologia e os restos de Europa que a seguem?

Lula e Dilma e continuam crescendo e se mantendo altos em comparação com jovens brancos, pobres ou não. Entre os 15 e 29 anos há mais chances de um jovem negro não voltar para casa vivo.

Em 2019, a parada LGBT de São Paulo movimentou 403 milhões de reais na cidade e me recordo de um homem preto e gay postar a notícia debochando de quem dizia a frase ‘quem lacra não lucra’.

Olhando para os dados do país que ‘mais mata LGBTs no mundo’ responda: se a travesti negra, por exemplo, fosse um homem negro cis de 25 anos, estaria em segurança pelo fato de ser “macho” (como dizem as empoderadas)?

Há uma frase do movimento de esquerda LGBT que diz que o Brasil é o país que mais mata LGBTs no mundo. ISSO É MENTIRA!

Saulo Ricardo

Bom… Observando os números do genocídio dos jovens negros, observamos que ele cresceu muito nos governos

A atriz Nany People, já disse em entrevistas disponíveis na internet que deixou de apoiar a parada LGBT a mais de 20 anos, pois naquela época um carro era alugado por x e passou a custar 3x após ser obrigatório alugar o carro da associação

da parada. Ela disse que questionou para quem iria esse dinheiro e não teve resposta até hoje e os lucros aumentam a cada ano. Então, com base nessas informações acima respondam: quantos reais dos 403 milhões entraram no bolso desses LGBTs negros? Me recordo de ter saído com um negro de esquerda para um encontro, quando eu ainda tinha estômago para as cadelas de Marx, e conversando sobre questões de raça eu disse que a violência contra a população negra aumentaram nos governos de esquerda e ele disse “idaí, aumentou o número de pessoas pretas nas faculdades”. Enfim, se quiser odiar a esquerda é só conviver com eles. Ser a pessoa que mais sofre violência, ter seus semelhantes no topo dos mais mortos e não ter benefício algum de lutas que

visam acabar com tal opressão enquanto LGBTs brankus têm voz, representação de seu amor na TV, filmes e séries, mais acesso a dinheiro, saúde e estudo para mim já seriam motivos suficientes para mostrar que esse movimento não seria para nós. Se querem chamar o fato de ser usado por branku para benefício e lucro deles enquanto você se fode de antirracismo, fique à vontade. Se a luta antirracista é de esquerda, como disse Silvio de Almeida, é fato que estão fazendo um trabalho bem porco. Ser boi de piranha, escada e escudo para manutenção de privilégio branku não é para mim e eu to bem tranquilo. O inferno do homem branco é o paraíso do homem negro, até onde posso ver brankus se sentem muito bem com esse movimento, ou seja, corre negrada É CILADA!

Palavras-chave: Pprt

26.MAI.21

32

Segundo dados, mais de 80% das trans mortas no país são negras. SÃO PESSOAS TRANS QUE ESTÃO SENDO MORTAS?

As pessoas negras, que estariam nessa sigla, seriam as que mais sofrem com a lgbtfobia, certo? Certo!

: Iza Oliveira



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.