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Psicologia

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COMO CONVERSAM A MORTALIDADE E A FELICIDADE?

“Um dia vamos morrer. Mas todos os outros não.”

Uma conversa entre Charlie Brown e Snoopy que nos leva a refl etir sobre sentido, sobre propósito, sobre tempo para viver e tempo para morrer.

A felicidade é episódica. E hoje vivemos a ditadura da felicidade constante, dos likes das postagens, do não envelhecimento e da esquiva da finitude. Desafiamos as doenças e a genética criando cremes e pílulas quase mágicas que manipulam desde nossos sentimentos, nossos hormônios, nossos comportamentos até nanopartículas em nossos níveis celulares e assim vamos nos sentindo caminhando impunes rumo à imortalidade. Quando nos deparamos com as dificuldades dos nossos corpos físicos, celulares, articulares, musculares, tendo que lidar com diagnósticos assustadores, deparamo-nos com a lida inexorável sempre à espreita: o tempo.

O tempo da nossa ampulheta é inegociável e sem retorno. Não gostamos de falar do fim, especialmente porque temos dificuldade de estar presente no durante. Diferentemente de todas as demais espécies, nossa racionalidade muitas vezes nos leva para longe da compreensão da parte mais simples, que é estar presente no momento que estamos vivendo. Temos dificuldade com a conjugação do verbo viver. Deixamos muitas vezes de perceber enquanto estamos fazendo a diferença para alguém num momento, criando um sorriso, aparando uma lágrima, construindo um castelo de areia, desenhando um projeto e redesenhando se necessário, porque nos perdemos em porquês e para quês... Perdemo-nos no passado, buscando razões para nossas ações e pensamentos. Perdemo-nos no futuro que nem temos, alimentando as angústias do que precisamos ter. Afinal, precisamos nos manter jovens e felizes, emoldurados em corpos de IMCs baseados em ficção, ditaduras do séc. XXI. E precisamos, sobretudo, produzir... Somos hoje seres do fazer. O que aconteceu com o nosso existir?

Buscamos o reconhecimento dos outros e muitas vezes esquecemos o real propósito para nós mesmos. Nosso fazer sem sentido é um investimento numa bolsa de valores sem rendimento de felicidade. Um empreendedorismo sem fins lucrativos quando sabemos que a vida tem sempre o mesmo final para todos nós, nossa morte. Morrer é um processo e o contrário da vida não é a morte, mas sim a indiferença com a vida. Por isso a vida não pode ser banal, fútil, inútil, pequena e sem direção. Precisamos redimensionar o que é importante. Importante

é o que a gente importa para dentro de nós. Aquilo que nos faz feliz por um instante, aquele instante em que a gente poderia parar o tempo e ali permanecer. Aquele instante que poderia não acabar. Esta é a definição de felicidade. Buscar ser um colecionador de instantes que façam sentido e tenham propósito porque o tempo não volta para perguntar se você fez o melhor por você.

Descartar os excessos, redimensionar a lupa da existência. Pequenas coisas podem nos trazer o mais completo estado de felicidade e saber que estes instantes acabam nos leva a redimensionar o valor. Acreditamos tanto que se morrêssemos rápido seria melhor e pronto, nem se falava mais disso. Mas é tão difícil na vida lidar com a perda de coisas repentinamente, sem preparo. Um assalto que nos leva tudo, uma catástrofe da natureza que nos arranca um bem material, um relacionamento que acaba em desamor de repente sem explicação. Somos tão apegados! Somos apegados a nossa existência, mas o interessante e paradoxal é pensar que muita gente tem tanto medo de morrer, mas vive bebendo além da conta, fumando além da conta, comendo além da conta, sofrendo além da conta e vivendo de jeitos tão insuficientes. Investe tão mal o seu tempo. Tem tanto medo da morte, mas estão flertando tão de perto com ela.

É preciso estar presente em sua vida para que a mortalidade seja uma saída pela porta da frente da sua vida. A consciência de que tudo acaba nos dá uma dimensão de nossas atitudes e escolhas. Saber que somos mortais se trata mesmo de aproveitar o tempo. Schopenhauer já dizia: na dor e na perda que se cria consciência.

Medo e coragem não nos salvam do fim, mas o respeito pela morte traz equilíbrio e harmonia nas escolhas. A imortalidade física não é possível, mas a experiência consciente de uma vida que vale a pena ser vivida.

Margit Mitschke Schmidt Psicóloga Formação em Psicologia Humanista e Pós-Graduação em Psicologia Positiva em fase de TCC CRP 12/07610

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