CINEMA DE ARTE EM DOSE DUPLA: FRANCIS FORD COPPOLA E PEDRO ALMODテ天AR
Ano XIV 窶「 nツコ 240 Junho de 2015
R$ 5,90
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Outro excelente presente em matéria de artes plásticas é a inauguração, no dia 1º de julho, de A magia de Miró, com acervo de 69 obras do mestre catalão (1893/1919) e 23 fotografias de autoria de Alfredo Melgar, flagrantes em preto e branco do artista em pleno processo criativo. Estarão lá preciosidades como os trabalhos produzidos por Miró em seus últimos anos de vida, esboços traçados em lixa ou papelão, notas feitas com lápis, giz de cera, desenhos e gravuras. Dose dupla de bons programas, também, na seção Graves & Agudos: a homenagem ao Moleque Gonzaguinha, que faria 70 anos se por aqui ainda estivesse explodindo corações, e a festa a Nelson Sargento, sumidade da mais alta patente do samba que virá a Brasília participar de tributo à sua pessoa por nove décadas de vida dedicada ao mais brasileiro dos ritmos (página 27). E a fórmula da dobradinha se repete, finalmente, na seção Luz Câmera Ação, que destaca duas mostras imperdíveis dos mais importantes cineastas contemporâneos: Francis Ford Copolla, o cronista da América, e El deseo – O apaixonante cinema de Pedro Almodóvar. A primeira ocupa as telas do CCBB e do Cine Brasília entre 25 de junho e 20 de julho, enquanto a segunda estará no cinema da Caixa Cultural entre 30 de junho e 5 de julho. As similaridades – ou não – das obras dos dois cineastas estão à sua disposição na página 30. Razões mais do que dobradas, portanto, para conferir esses destaques e muitos outros nas páginas desta edição de número 240 que realizamos com muito carinho para você. Boa leitura e até julho.
Divulgação
A arte, para ele, é uma espécie de religião. Não o que se entende convencionalmente como religião, “essa coisa chata e cheia de regras”, mas a permanente busca do renascer, do sonhar. Estamos falando do artista plástico que há nove anos fincou seu cavalete, com suas telas e tintas, em vários pontos de Brasília. E a retratou com maestria. Estamos falando do pintor para quem a arte não tem limites, não tem regras; é o caminho escolhido por ele para buscar Deus. Estamos falando de Carlos Bracher, o mineiro de Juiz de Fora que volta à cidade para apresentar Bracher – Pintura & Permanência, exposição montada no CCBB até 27 de julho. Tema de nossa matéria de capa, foi visitada por 120 mil pessoas em Belo Horizonte, 90 mil em São Paulo e mais de 200 mil no Rio de Janeiro (leia na seção Galeria de Arte, a partir da página 22).
22 galeriadearte Chien, de 1976, é uma das 69 obras do catalão Joan Miró expostas na Caixa Cultural a partir de 1º de julho.
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Maria Teresa Fernandes Editora ROTEIRO BRASÍLIA é uma publicação da Editora Roteiro Ltda. | Endereço SHIN QI 14 – Conjunto 2 – Casa 7 – Lago Norte – Brasília-DF – CEP 71.530-020 Endereço eletrônico revistaroteirobrasilia@gmail.com | Tel: 3203.3025 | Diretor Executivo Adriano Lopes de Oliveira | Editora Maria Teresa Fernandes Diagramação Carlos Roberto Ferreira | Capa André Sartorelli | Colaboradores Adriana Nasser, Alessandra Braz, Akemi Nitahara, Alexandre Marino, Alexandre dos Santos Franco, Ana Vilela, Beth Almeida, Cláudio Ferreira, Eduardo Oliveira, Elaina Daher, Heitor Menezes, Júlia Viegas, Luana Brasil, Lúcia Leão, Luís Turiba, Luiz Recena, Mariza de Macedo-Soares, Melissa Luz, Pedro Brandt, Sérgio Moriconi, Silvestre Gorgulho, Súsan Faria, Vicente Sá, Vilany Kehrle | Fotografia Eduardo Oliveira, Fabrízio Morelo, Gadelha Neto, Marx Farias, Sérgio Amaral, Zé Nobre | Para anunciar 9988.5360 Impressão Editora Gráfica Ipiranga | Tiragem: 20.000 exemplares.
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Boa gastronomia em texto e fotos Lúcia Leão
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m cafezinho, acredite, já foi capaz de mudar sua vida! Muitas votações importantes para o destino de cada brasileiro foram decididas nas conversas de pé de ouvido entabuladas por parlamentares, entre um gole e outro da bebida fumegante, numa pequena lanchonete estrategicamente localizada ao fundo do plenário da Câmara, restrita aos deputados, assessores e jornalistas credenciados. Quem diz que a qualidade do café não contribui para um bom acordo? E não só lá nem só café. O que melhor para aplacar os ânimos, clarear as mentes e promover o entendimento do que uma boa refeição? É, certamente, o que acontece a cada dia no sofisticado Restaurante dos Senadores, onde suas excelências, enquanto se obrigam a uma pausa para alimentar o corpo, podem até elevar os espíritos antes de decidir o que é melhor para o país. Será?
Mas vamos abstrair aqui as polêmicas e os desencantos da política e caminhar pelo Congresso Nacional apontando os holofotes para o que ele tem, indiscutivelmente, de bom: a comida. Tirando um ou outro que reclama, por exemplo, da falta de feijão nos cardápios, as opções de alimentação oferecidas pela rede de empresas-escolas do Senac no complexo do Legislativo, na Praça dos Três Poderes, são dos raros – raríssimos! – temas que conseguem aprovação com a maioria absoluta dos votos e em primeira votação. Os quatro restaurantes, as quatro lanchonetes e o Café do Plenário são ilhas de satisfação e excelência na prestação de serviços para os milhares de trabalhadores e visitantes que passam por ali todos os dias – e figuram entre os melhores estabelecimentos da cidade em seus respectivos nichos. O primeiro restaurante-escola montado pelo Senac na Praça dos Três Poderes foi o da Câmara dos Deputados. A entidade assumiu o espaço em agosto de 2009, pondo fim a um longo período de aban-
dono e degradação que se seguiu a denúncias de má gestão. Investiu, na época, R$ 1,5 milhão e montou uma equipe formada por professores, instrutores e aprendizes, entre cozinheiros, assistentes de cozinha, copeiros e garçons, capaz de atender até três mil comensais por almoço. O “10” – como é tratado na intimidade pela equipe do Curso de Gastronomia do Senac por conta da localização no 10º andar, o último do anexo da Câmara – deve atender prioritariamente aos deputados, que dispõem de uma sala reservada se preferirem privacidade nas refeições. Mas, como os demais restaurantes e lanchonetes-escolas do Congresso – à exceção do Café do Plenário –, é aberto ao público e rapidamente entrou para o circuito turístico da capital federal. Está indicado, com generosos elogios, nos principais sites de turismo, como o Trip- Advisor, não só pela localização e a vista espetacular, mas principalmente pela qualidade da comida e do serviço. “Maravilhoso”, corrobora a advogada
reduto de políticos paraense Elza Camargo, que, de passagem pela capital para tratar de assuntos profissionais, visitou pela primeira vez o Congresso e, por indicação de conterrâneos, almoçou no “10”. “O lugar é lindo, o serviço é muito bom e a comida ótima, especialmente as sobremesas”, avaliou a advogada, destacando justamente um dos itens que têm atenção especial no curso de gastronomia do Senac: a pâtisserie. Sem a surpresa da visitante, o jornalista Sérgio Chacon, que almoça quase que diariamente ali, é mais contido nos comentários, mas não resiste a elogiar os grelhados. “São muito bons”. Outra especialidade do bufê, os grelhados não são apenas de carnes nobres, também de queijos e legumes, no melhor estilo da comida mediterrânea. Além deles, e das sobremesas, o bufê do “10” oferece uma grande variedade de frios e saladas e ao menos quatro pratos quentes, que variam todos os dias. Para quem prefere uma comida mais frugal e barata – o bufê custa R$ 47 – no
mesmo 10º andar, com a mesma vista e ainda com um espaço externo, com as mesas entre um agradável jardim suspenso, há um misto de lanchonete e restaurante – também do Senac – que oferece pratos executivos, saladas, sanduíches e salgados. “São muito bem servidos, gostosos e com ótimo preço”, avalia Guilherme Medeiros, funcionário da Câmara e cliente fiel da lanchonete do “10”, como o colega Fábio Marques (o executivo, com opções de carne, peixe ou frango, custa R$19). Sem o charme da vista panorâmica de Brasília, os restaurantes-escolas do Senac no Senado Federal não deixam a desejar no quesito “gastronomia”. O Restaurante dos Senadores, comandado pelo chef Gustavo Maragna, um dos brasilienses selecionados pela Embaixada da França, meses atrás, para apresentar a culinária daquele país no evento Gôut de France, atende à la carte, com todo o ritual que esse tipo de serviço exige. “Como um restaurante-escola, aqui nesta unidade nós preparamos profissio-
nais para atender aos clientes com todo o requinte e todos os detalhes que um bom restaurante à la carte exige não apenas na cozinha, no preparo e arrumação dos pratos, mas também no salão, desde o posicionamento das mesas, a disposição dos copos e talheres, a recepção e o atendimento dos clientes”, explica Maragna, que também vivencia, com seus alunos e colaboradores, os desafios que isso implica. Bem mais despojado, o restauranteescola Senac Massas e Risotos, no Anexo I do Senado, oferece três opções de massas e quatro molhos, que podem ser acrescidos de vários ingredientes à escolha dos clientes, assim como os risotos. Um bufê de saladas completa a refeição, que é uma das opções mais concorridas entre os funcionários da casa e grupos organizados que vêm a Brasília acompanhar votações.
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Delícias árabes Por Beth Almeida Foto Sérgio Amaral
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om a popularização da cozinha árabe, nos habituamos a achar tudo que experimentamos muito parecido, seja um simples quibe ou um elaborado charuto envolto em folhas de parreira. Por isso, é uma agradável surpresa degustar a culinária árabe praticada por chefs como a síria Sana Massouh, que há dois meses abriu na 408 Sul o Arabetto – Mistura Árabe, em sociedade com o filho, Adonis, e Ricardo Morhy, amigo de Adonis dos tempos de escola. “Vi muitas casas de comida árabe e sempre achei que a que eu preparava era muito melhor, com sabores bem mais característicos dessa cozinha”, afirma Sana, que tomou a decisão depois de pilotar, por quase 20 anos, um restaurante comercial no Setor de Diversões Sul, onde servia comida brasileira. De fato, os pratos têm sabores bem peculiares e marcantes, sem falar na leveza das tradicionais pastinhas, como o homus ou o smid, uma salada de grãos que Sana chama de “primo rico do tabule”. Entre os
quibes, além dos tradicionais, há versões preparadas com abóbora, recheadas com nozes e hortelã, e com beterraba, recheadas com cebola e salsa, uma concessão da chef à cozinha ocidental. Aberto a partir das 11 horas, a casa atende para almoço e jantar à la carte ou com pratos executivos, em que a clientela pode escolher os itens para compor a refeição. São seis opções, a preços que variam de R$ 19,90 (o duplo Arabetto, com dois quibes ou esfirras, arroz com lentilhas e três possibilidades de saladas) a R$ 49,90 (o carré de cordeiro acompanhado de arroz com hortelã e castanhas e uma das três opções de saladinha). Sim, os preços são bem acessíveis, podendo-se fazer uma refeição completa por cerca de R$ 30 – se não se optar pelo cordeiro, é claro. É uma boa pedida também para um lanche da tarde, já que a casa não fecha entre as refeições, algo raro em Brasília nos últimos tempos – a maioria dos restaurantes opta por fechar as portas às 15 horas e só reabrir a partir das 18 horas. A casa ainda não tem delivery, mas o pequeno empório que ali funciona é ideal
para quem quer fazer a festa em casa sem entrar na cozinha. Tem todas as opções de quibes servidas no restaurante, congelados e prontos para fritar ou assar, inclusive em versões menores, estilo coquetel. Também esfirras, diversos tipos de pastas, pães sírio e folha, massa para preparo de falafel e, como não poderia faltar em uma casa árabe, o carneiro, já temperado e pronto para ir ao forno. O empório, aliás, é responsável por 60% do faturamento, segundo cálculo dos proprietários. O restaurante é pequeno, com apenas 25 lugares, mas já está nos planos do trio de proprietários abrir mais um, até o fim de julho, no Setor Sudoeste, este um pouco maior, com 40 lugares, e outros dois em Águas Claras, até o fim do ano. “Também estamos com o projeto de franquear nossa marca”, revela Adonis.
Arabetto – Mistura Árabe
408 Sul – Bloco B (3244.2079). De domingo a 5ª feira, das 11 às 21h; 6ª e sábado, das 11 às 22h.
Fotos: Gerson Lima
O Madero vem aí Brasília vai receber o restaurante de número 50 de Junior Durski, um chef apaixonado desde sempre por hambúrguer. Por Maria Teresa Fernandes
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he best burger in the world, ou, em bom português, o melhor hambúrguer do mundo. Esse é o lema, nada modesto, da rede Madero de restaurantes, nascida no Paraná há apenas dez anos e que terá filial em Brasília no mês de julho, no Pátio Brasil. Resolvemos perguntar ao chef, nascido em Prudentópolis, cidade distante 200 km de Curitiba, qual o segredo do sanduíche que é o carro-chefe do Madero. “Não temos um segredo, temos vários. O primeiro é fazer um hambúrguer com carnes selecionadas, assado na churrasqueira para garantir mais sabor. Tem pouca gordura e calorias, porque contamos com outras fontes de sabor que não a gordura”, explica. A maionese, feita segundo a receita da avó de Junior, é muito saborosa, ele garante. Por isso, não há necessidade de colocar muita quantidade. “O pão produzido na rede também contribui muito para o conjunto da obra, pois é muito saboroso, sem contar a qualidade do queijo, o melhor do mercado”, diz o chef. Quando morava em Prudentópolis, ainda menino, Junior ia de ônibus para Ponta Grossa, cidade próxima, só para comer um X-salada, ou melhor, dois. “Era a minha alegria”, lembra. Anos mais tarde, já morando em Curitiba, abriu o restau-
rante Durski e partiu então para realizar seu sonho, ou seja, fazer o melhor cheeseburger do mundo. Foi aos Estados Unidos duas vezes e experimentou muitas receitas. Visitou 70 restaurantes só para provar hambúrgueres e se inspirar para criar sua fórmula do sanduíche perfeito. Em 2005, Junior Durski inaugurou o primeiro Madero, no centro histórico de Curitiba. Depois vieram filiais em outros bairros da capital paranaense e a expansão de seus domínios para cidades de Goiás, Santa Catarina e São Paulo. Em 2014, criou o projeto Madero Container – restaurantes desenvolvidos em containers e localizados em pontos estratégicos das estradas brasileiras. No mês passado, inaugurou a loja de número 49 em Piracicaba enquanto cuidava da instalação da primeira casa fora do país, em Miami, em julho próximo, e colocava os pés também em Brasília para montar a quinquagésima Madeiro por aqui. E por que decidiu vir para a capital? – perguntamos a Junior. “Porque Brasília é uma cidade fantástica, onde temos consumidores muito exigen-
tes, que buscam a melhor qualidade e o melhor serviço, exatamente aquilo que procuramos e trabalhamos muito para entregar sempre”, concluiu. Um Cheeseburger Madero (pão crocante, hambúrguer de 180g e fritas) custa R$ 29 nas lojas da rede. O Cheesebacon Madero (pão crocante, hambúrguer de 180g e bacon grelhado, com fritas), é um pouco mais caro: R$ 35. Já o Cheeseburger Super Madero, com dois hambúrgueres de 180g cada e fritas, custa R$ 38. Para os apetites mais modestos, a opção será o Cheeseburger Madero Junior (um hambúrguer de 130g com fritas), a R$24. Os projetos de suas casas são assinados pela própria mulher, a arquiteta Kethlen Ribas Durski, que procura manter sempre o mesmo conceito em todas elas: muita madeira, tijolos aparentes e uma releitura da fachada original do primeiro restaurante. Além da filial do Pátio Brasil, Junior Durski pretende inaugurar até o fim do ano mais um Madero em Brasília, dessa vez no Shopping ID. Que venham, então, os hambúrgueres do chef paranaense! 9
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Por Súsan Faria
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e junho a novembro, o Brasil colhe aquele que é um dos seus grandes produtos, orgulho da nação, que traz divisas para o país, muito trabalho, cheiros e reminiscências; e atrai política, encontros, enriquecimento e opulência. Estamos em plena safra do café, o grãozinho nobre que também dá ânimo, diminui a sonolência e o cansaço e não falta na casa dos brasileiros. Entre os 390 mil produtores do nosso café, lá no pequeno município de Cristina, na região da Mantiqueira de Minas Gerais, encontra-se o agricultor Sebastião Afonso da Silva, 53 anos, colhendo o grãozinho vermelho. Sebastião venceu – junto com o irmão Antônio Márcio da Silva – o 4º Concurso de Qualidade dos Cafés do Brasil (Cup of Excellence para Cafés Naturais), disputado em Araxá, em janeiro deste ano. O concurso, uma espécie de Oscar do café, é realizado pela Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Bra-
sil), Alliance for Coffee Excellence (ACE) e Sebrae. Com o título, o produto dos irmãos Silva, cultivado no sítio Baixadão, a 1.350 metros de altitude, passou a ser cobiçado por grandes torrefadoras e cafeterias nacionais e internacionais. Hoje, eles exportam para Estados Unidos, Austrália e Alemanha. E conseguiram o inacreditável preço de R$ 9.384 a saca de 60 quilos para um lote de 17 sacas adquiridas pela americana Starbucks Café, enquanto o preço de mercado não passa de R$ 800. “A empresa comprou pela qualidade que consegui”, explica Sebastião (na foto ao lado). Nada na vida dele, no entanto, foi fácil. “Não me iniciei no café. Éramos 15 irmãos vivos, de 21 nascidos, e sem estudo. Plantávamos arroz em terra arrendada e muitas vezes não conseguíamos nem cobrir o custo de produção”. Em 1995, Sebastião resolveu investir na lavoura de café e, depois, na melhoria da qualidade do produto. “Comecei sozinho. Fui prestando atenção nos erros e nos acertos e me apaixonando pelo café. Não queria qualquer grão”. Ainda hoje, ele é o primeiro a chegar e o último a sair na colheita do ca-
Sebrae Nacional
E o Oscar do café vai para...
fé, de olho nos detalhes, corrigindo qualquer falha, de sol a sol, de domingo a domingo, nos 85 hectares de sua propriedade. Pai de dois filhos, um de 17 anos e outro de 20, Sebastião é um vitorioso. Um dos rapazes é seu braço forte e o outro estuda Medicina. No entanto, continua com seu jeito simples, fala baixa e ponderada.
Sebrae Nacional
Qual é o tamanho da satisfação pelo prêmio conquistado? “Até esqueço do dinheiro, o que importa mais é a satisfação”, responde o agricultor, que veio a Brasília participar de um workshop promovido pelo Sebrae- DF para produtores, baristas, empresários e especialistas em cafés especiais produzidos em oito Estados. Sebastião e outros 7.800 pequenos agricultores da Serra da Mantiqueira, no sul de Minas Gerais, colocam sua produção em cooperativas que intermedeiam as vendas dentro e fora do Brasil. Com tradição secular na produção do grão de qualidade, a região é uma das mais premiadas do Brasil. O café vendido por Sebastião está sempre acima de 88 pontos (as 17 sacas vendidas logo após o prêmio deste ano chegaram a 95,18 pontos). A Mantiqueira, com 7.800 produtores (89% são pequenos) e 1.340.000 sacas anuais, em 25 municípios com altitude entre 900 a 1.400 metros, é um dos quatro terroirs do café no Brasil. O engenheiro agrônomo Juliano Tarabal, superintendente da Federação dos Cafeicultores do Cerrado, chama a atenção para a importância do terroir: “Assim como existem os terroirs do vinho na Europa e no Novo Mundo, ou o do presunto de Parma na Itália, é importante que no Brasil se estabeleçam e se denominem as regiões típicas do café de alta qualidade. São exclusivas, têm peso diferente, têm produtos nobres”. A ideia é tornar famosas essas regiões. Além da Mantiqueira, outras três estão estabelecidas: Alta Mogiana (SP), Café do Norte Pioneiro (PR) e Região do Cerrado Mineiro (MG). Estão em processo de certificação o Café Oeste da Bahia e a Região das Matas de Minas Gerais. Garantia de origem e qualidade, valorização da região, reconhecimento do produtor e diferenciação para o consumidor são vantagens de se estabelecer regiões geográficas do café. “É um grande estímulo ao turismo também, pois turismo não é só ir para a praia. Essa é uma realidade que o Brasil precisa trabalhar”, diz o agrônomo. Para o diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria do Café (ABIC), Nathan Herszkowicz, o café, uma bebida milenar, renasceu nos últimos 35 anos. Em sua avaliação, café com mistura é coisa do passado no Brasil. “Há 30 anos o índice de impureza era entre 25% e 30%, hoje não chega a 2%”. A ABIC monitora e certifica hoje 576 marcas do produto. Realiza 3.500 cole-
O workshop do Sebrae reuniu em Brasília produtores, baristas, empresários e especialistas de oito Estados.
tas e análises por ano em todo o país. E a versão de que o melhor café o Brasil exporta e a gente fica com o resto? Quem responde é o presidente do Grupo 3 Corações, Pedro de Alcântara Lima: “Isso não é uma verdade absoluta. Somos o maior produtor do mundo, o maior exportador. Isso gera um sentimento forte de retirada do café de ótima qualidade, mas os tradicionais têm melhorado muito. Temos orgulho do café produzido no Brasil”. O café chegou ao Brasil em 1727, trazido da Guiana Francesa para Belém do Pará pelo Sargento-Mor Francisco de Mello Palheta. que aproximou-se da esposa do governador de Caiena, capital da Guiana Francesa, e conquistou sua confiança. Uma pequena muda de café arábica lhe foi oferecida clandestinamente e trazida escondida em sua bagagem. As condições climáticas do Brasil ajudaram o cultivo, que se espalhou rapidamente pelo Maranhão,
Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Minas Gerais, com produção voltada inicialmente para o mercado doméstico e depois se transformando em produto-base da economia brasileira. Atualmente o Brasil é o maior produtor mundial de café, sendo responsável por 30% do mercado internacional, volume equivalente à soma da produção dos outros seis maiores produtores. É também o segundo mercado consumidor, atrás somente dos Estados Unidos. A origem do café está na Etiópia, no centro da África, há mil anos. No Século 16, o produto passou a ser torrado na Pérsia, mas foi a Arábia quem propagou a cultura do café, que a partir de 1615 começou a ser consumido no continente europeu, trazido por viajantes em suas frequentes viagens ao oriente. Até o Século 17, somente os árabes produziam café.
A cafeicultura brasileira • Dos 390 mil produtores, 80% representam pequenas propriedades. • 1.900 municípios de 14 Estados produzem café. • São 2,32 milhões de hectares de área plantada. • A atividade emprega 40 mil pessoas. • O café está presente em 98,2% dos lares brasileiros. • Estima-se haver 3,5 mil cafeterias no país. • Somando a padarias, este número chega a 10 mil. • O país tem mais de 1,2 mil baristas e 300 degustadores. Fonte: Sebrae.
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Fotos: Divulgação
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Prático e gostoso Por Regina Almeida
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r ao mercado, escolher os ingredientes, preparar tudo com cuidado e mais: acertar a receita. Isso não é pra qualquer um. Às vezes bate aquela vontade de receber os amigos e servir pratos deliciosos, mas muita gente desiste no meio do caminho só de pensar no trabalho que tudo isso dá. Aberto há pouco mais de seis meses na 208 Sul, o Lá em Casa Cuisine d’Amis é o que os franceses chamam de traiteur, empresa ou pessoa que prepara pratos para serem levados e degustados em casa. E é exatamente isso o que propõe o Lá em Casa: ser o elo entre o cuidado e a preocupação com os detalhes que você teria com a sua comida, mas sem a necessidade de passar pela cozinha. A proposta, muito tradicional na França, começa a surgir aqui em Brasília. A ideia é proporcionar a possibilidade de re-
ceber os amigos ou familiares em casa sem trabalho, com comida gostosa, diferente, feita com carinho, ingredientes frescos e muita qualidade. No Lá em Casa, as receitas já estão prontinhas. É só escolher entre os quitutes da loja, que não é bistrô nem bufê, mas fornecedora de comida pronta para levar pra casa, explica a proprietária, Fernanda Pinella Arbex. O ponto forte do cardápio são as terrines, as saladas especiais e os pratos quentes, todos vendidos sob encomenda. A loja atende a pedidos feitos com antecedência de 48 horas, desde jantares íntimos até reuniões de amigos com uma dúzia de pessoas. “Fazemos pouco porque não temos nada congelado nem semi pronto. Tudo aqui é feito no dia”, enfatiza Fernanda. A cada três meses um novo menu é criado, sempre pensando nas frutas e verduras da estação. O cardápio novo já está disponível e tem sopa de abóbora com chips de copa defumada, para aquecer o
friozinho que já chegou (R$ 12 a unidade de 250ml, para uma pessoa), filé mignon ao molho de sálvia e vinho branco (R$ 145 o quilo) e filé suíno recheado com ervas, espinafre e copa defumada, com molho de sua marinada ao alecrim, uma receita com sabores e aromas finos, mas marcantes (R$ 90 o quilo, para cinco pessoas), e confit de carneiro com mel e alecrim cozido com cenouras (R$ 150 o quilo, suficiente para oito pessoas). Tem ainda couscous marroquino com um toque de especiarias e uma mistura de amêndoas, nozes e castanhas (R$ 33 o quilo, para quatro pessoas), tortas variadas com salada e sobremesas como o tiramisú de frutas vermelhas (R$ 8,50) e a clássica tarte tatin de maçãs com chantilly (R$ 7,50). Lá em Casa Cuisine d’Amis
208 Sul – Bloco C (3710.9700) De 2ª a 6ª freira, das 10 às 19h; sábado, das 9 às 13h.
DOIS ESPRESSOS E A CONTA cláudio ferreira claudioferreira_64@hotmail.com
Caro ou barato?
Almocei, num sábado desses, em um self-service absolutamente convencional – nem “pebinha” nem sofisticado – em uma entrequadra da Asa Norte. Ao ouvir o total da conta, um susto: um prato com arroz, feijão, muitos vegetais e um pedaço de peixe, junto com o suco de laranja, tiraram R$ 40 do meu cartão de crédito. Apesar de ler todos os dias sobre inflação e de comer fora sempre, foi essa ida ao self-service que acionou o alarme. Estamos em junho, falta meio ano para 2015 acabar e, empiricamente, já percebi uns dois reajustes gerais de preços de comida pronta em Brasília. O quilo do self-service é um bom parâmetro, mas não é o único. Os custos aumentaram, explicam os proprietários, e eu entendo perfeitamente. Como manter os preços quando a conta de luz de maio está tão diferente da de janeiro? Como equilibrar as contas com os produtos alimentícios, mesmo comprados em grande quantidade, com variações de preço tão grandes? E os aluguéis comerciais? Pela hora da morte, resultando em muitas placas de “passo o ponto”. Como consumidor, o que me resta é tentar entender o que é caro e o que é barato – minha cabeça de não economista ainda não chegou a uma equação definitiva. Na mesma semana em que paguei R$ 40 no self-service, comi em um restaurante à la carte, na mesma Asa Norte, onde os pratos mais baratos custavam entre R$ 30 e R$ 40. Comida de ótima qualidade! Não só nesses dois exemplos, mas em geral, 2015 não me mostra com clareza quem está sendo justo comigo ao cobrar tal ou qual preço. Pratos principais, sobremesas, bebidas e cafezinho têm, individualmente, variações no
valor final que provocam mais dúvidas do que certezas. Se o self-service me cobra R$ 40, o à la carte vai se sentir no direito de me cobrar, no mínimo, R$ 60, e não preciso me esforçar muito para pagar uma conta individual – prato + bebida não alcoólica – de R$ 100 em um restaurante com número médio de estrelas. Isso porque não frequento as constelações mais brilhantes do céu de Brasília... O que podem fazer os donos de bares, restaurantes e similares neste tempo de crise? Em primeiro lugar, não abusar da minha confusão mental e querer prever a inflação futura às custas do meu bolso. Onde houver exageros na conta, o cliente desaparece rapidinho, porque Brasília já tem bastante concorrência nesta área. Em segundo lugar, não deixar cair a qualidade do que se serve. Nem a quantidade – já percebi, em duas oportunidades, que o volume de comida do prato à la carte diminuiu, apesar de o preço ter subido. Mesmo os clientes que gostam de novidades culinárias voltam sempre aos seus restaurantes preferidos, para comer seus pratos preferidos. Merecem ser bem tratados, não acham? Vários estabelecimentos já estão colocando a alternativa do prato “inteiro” ou “meio”, uma opção para quem quer pagar menos – e comer menos – sem perder a qualidade. A hora é de usar a criatividade para encontrar outras soluções para um período que esperamos todos seja breve. Ainda mais que, hoje em dia, além do preço, o consumidor quer comida saudável. A preocupação com os quilos a mais – na balança do self-service e no próprio corpo – é real. Menos quilos, menos R$, mais qualidade. É essa a equação difícil.
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GARFADAS&GOLES Luiz Recena
lrecena@hotmail.com
Em nome do parque
Perto de 50 mil pessoas em dois dias. Essa é a estimativa de público no final do Festival Brasil Sabor, no Parque da Cidade. O tempo ajudou com manhãs e tardes esplêndidas, o que estimulou a galera a sair de casa. Além das belas moças do tempo, que não só estão na moda pelas previsões, mas politicamente corretas até nas cotas raciais, os preços também deram um empurrãozinho para que a turma do sofá corresse para o parque. E a cereja do bolo, claro, foi, é, e continuará sendo a qualidade da comida oferecida pelos quase setenta estabelecimentos associados da Abrasel-DF que participaram do evento. A comida era muita e se acabou. Não faltou nem sobrou. Doces e sorvetes talvez tenham faltado, mas nada que tenha comprometido o brilho da festa. Até aniversários de chefs foram “comebebemorados”... Como foram! E o verde que te quero verde mostrou de novo porque o Parque da Cidade é a melhor opção para esses momentos. É um dia inteiro de sombra e frescor cercando as barracas. Ao contrário do asfalto quente dos eixos, é mais saudável. Com tantos parques e tantas áreas verdes na cidade, é mais do que hora de se rever a demagogia do eixão do lazer, que além de tudo é nociva à saúde. O resto é papo furado de burocratas e preguiçosos, no governo, nas casas, na mídia de plantão domingueiro. A moda é voltar ao passado? Então, por que não voltar ao início dos tempos dessa demagogia, ou seja, eixão fechado das seis às onze da manhã? Quando a seca chegava ao meio-dia, inclemente e assassina silenciosa, acabava a orgia da preguiça: plantonistas tinham matéria, burocratas recheavam estatísticas e mamitas e papitos buscavam o verde e a água para seus filhotes em locais saudáveis e ecologicamente apropriados. E tudo voltava a seu normal: o eixão abria, a polícia policiava, os mijões sumiam, os estacionamentos ilegais se desmanchavam e as senhorinhas que de tudo reclamavam, principalmente do barulho, perdiam o motivo e dormiam suas tardes. Sem ser ecochato, a natureza e o verde são melhores.
Mais Fausto e Manoel
Encontrar amigos é sempre bom. Na 209 Norte, o grande Cabo continua firme no bar, que vai abrir nova casa nos próximos dias, na 406 Sul, antigo F. Chopin. Na Asa Norte tudo continua funcionando direitinho. Espetinhos, pastéis, cartas de amor e discórdia, peixes, carnes, pratos executivos no almoço. Um clássico omele te, clássico mesmo, é grande pedida. Os preços dos vinhos só ajudam a Lei Seca. “Convencem” o cidadão a pensar que
a lei é boa e o melhor é não beber. Ou, quem pode, ficar na cervejinha. O reencontro, porém, foi o ponto alto da noite.
Outro reencontro
Os anos passaram, o colunista mudou, viajou, envelheceu. E o Martinica Café está lá, na 203 Norte, firme e forte. Um quibe assado dos melhores. Jurema continua no comando, o que é sempre uma garantia.em outros pontos da
cidade, onde a frase “foi aqui que tudo começou” é de longe a mais repetida.
Lágrimas sentidas
Danúsia Bárbara, a grande referência da crítica gastronômica do Rio de Janeiro, nos deixou. Seus guias eram bíblias para encontrar as boas comidas cariocas. Sentiremos falta da competência e elegância com que sempre tratou o tema. Vá em paz!
Massagem fisioterápica e linfática, tratamento complementar de celulite e obesidade. Técnica japonesa. 14
Mariinha, profissional com mais de 40 anos de experiência. 910 Sul, Mix Park Sul, Bloco I sala 18. Tel.: 3242.8084
PÃO&VINHO ALEXANDRE FRANCO pao&vinho@agenciaalo.com.br
Longo e tenebroso inverno
O inverno chegou, nem tão longo, muito menos tão tenebroso. Afinal, cá pelos trópicos as temperaturas de um pretenso inverno são comumente amenas e, aliás, muito mas propícias ao nosso estimado consumo de vinhos tintos. O título desta coluna, em verdade, procura fazer alusão ao longo período em que passei sem frequentar feiras de vinhos das importadoras que por aqui atuam. Já há alguns anos parei de frequentá-las, não porque as ache um mal caminho para o conhecimento dos vinhos, em especial de novos rótulos, mas porque vim assumindo a postura de realizar minhas próprias degustações, com mais foco, mais profundidade e partindo, pois, sempre de uma seleção mais cuidadosa dos vinhos a serem degustados para apreciação, o prazer e a crítica, inclusive com o objetivo de gerar matérias para esta querida coluna. Isso se deu, diga-se de passagem, muito em razão das constantes viagens ao exterior, nas quais pude me brindar com garrafas muito especiais às quais por aqui não teria acesso, fosse pelo custo por vezes exorbitantes dos importadores brasileiros, fosse pela inexistência no nosso mercado de muitas das boas garrafas que trouxe de fora. Valeu! Foi muto bom e não pretendo parar com essa prática. Mas há duas semanas me animei a ir novamente, aí sim, “após longo e tenebroso inverno”, a uma feira de vinhos de um dos grandes importadores do Brasil, a Grand Cru, e pude, para meu deleite, relembrar o quanto isso também pode ser prazeroso e proveitoso. Realizada na Casa da Fazenda, em São Paulo, um agradabilíssimo local no bairro do Morumbi, em um final de dia, apresentou um interminável número de rótulos das mais variadas origens e dos mais variados preços, para todos os gostos e bolsos.
O melhor é que, desta feita, já mais preparado e evoluído do que dantes, pude navegar pelos expositores da forma que creio seja a ideal para esse tipo de evento: escolhendo com cuidado o que degustar e o que não provar, de forma a poder tirar o melhor proveito de tudo, sem me impossibilitar de retornar à morada conduzindo meu próprio carro (não que, se eu fosse parado por uma blitz da terrível Lei Seca, não houvesse problemas – eu os teria, com certeza – mas cheguei em segurança ao destino do doce lar). Os vinhos provados foram muitos e muitos, mas escolhi alguns das minhas preferências para aqui comentar. Antes de tudo, claro e como sempre, as borbulhas que tanto amo. Bons espumantes, principalmente alguns exemplares italianos, mas esbanjei mesmo no ótimo Champagne Gosset Brüt Excellence, intenso, com muita panificação, mas equilibrado pelo frescor e a boa acidez. Uma delícia! Um branco? O Klein Constantia Estate Sauvignon Blanc, fresco e com aromas sutis, mas muito típicos da casta, como lima, limão e maracujá. Ótimo! Tinto não teve pra ninguém: uma vertical do icônico Clos de Lambrays, Grand Cru da Borgonha para poucos: de 2006 a 2009, cada ano com seu toque, mas todos maravilhosos, elegantes por mais que tudo, saborosos como poucos – numa próxima coluna comentarei só esta vertical. Sensacional! Por fim, um doce: o Klein Constantia Vin de Constance, caro, mas no mínimo inesquecível, com belos aromas de casca de laranja e pêssegos, na boca quase melado – podia ter um pouquinho mais de acidez. Gostosíssimo! Enfim: que venham as feiras...
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Guardiã
da comida
sertaneja Por Lúcia Leão Fotos Túlio Borges
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Ela aprendeu a dar tratos às panelas na cozinha rústica da Fazenda São Pedro, em São José do Egito, região do Alto Pajeú, no semiárido pernambucano. Aprendeu vendo e ouvindo a mãe, as tias, as mulheres agregadas à família, as comadres e vizinhas... uma ou outra vez consultando cadernos de receitas minuciosamente descritas em letras desenhadas e guardados por gerações com o cuidado de joias. Aprendeu fazendo. Prima-irmã de Ariano Suassuna, com quem dividiu as traquinagens de infância na Fazenda São Pedro, a atenção do pai Manoel Dantas – que o mestre folclorista assume como principal esteio e mentor – e as descobertas intelectuais do mundo adulto, ela saiu da fazenda já moça para cursar faculdade no Recife, se fez educadora e pesquisadora com foco no modo de viver e sobreviver sertanejo. Construiu a vida acadêmica e depois profissional mesclando os ensinamentos que trazia da Fazenda São Pedro com os assimilados de mestres co-
mo Câmara Cascudo, Gilberto Freyre, Josué de Castro, Mauro Mota e Nelson Chaves, que emprestaram sua inteligência também a estudos sobre a cultura alimentar brasileira. Temperou tudo isso com poesia. De Raquel de Queiroz aos repentistas do Pajeú, que tanto versejam sobre a comida e o modo de comer sertanejo, prato cheio de cultura. E assim foi andando pelo mundo, aumentando sempre a bagagem na vida de andarilha, mas também esvaziando sempre o alforje, para poder se reabastecer. “Se a gente não passa pra frente, não ensina tudo o que sabe, fica sem espaço para receber coisas novas”. Ela é Ana Rita Dantas Suassuna, que chegou em Brasília há 47 anos acompanhando o marido Umberto – que, concursado, iria integrar a primeira equipe civil do Hospital das Forças Armadas. Fez daqui seu porto seguro para viver e criar família, sem, no entanto, jamais se desprender das raízes no sertão. O gosto e o dom para a cozinha, aliados ao preparo intelectual e à curiosidade dos cientistas – sem falar da sensibilidade poética que está
no DNA do povo do Alto Pajeú, especialmente de São José do Egito –, traçaram o caminho natural para fazer dela o que é hoje: a maior especialista brasileira em gastronomia do semiárido nordestino, tido pelos estudiosos como berço da “nacionalidade” brasileira, onde primeiro se misturaram europeus, negros e índios para produzir a cana e processar o açúcar. E também produzir e processar nossa cultura miscigenada. Moradora desde o início da década de 1970 no recanto mais aprazível do Lago Sul, onde a cidade se encontra com a mata preservada pela Aeronáutica nas cercanias do Aeroporto, há exatos oito anos ela foi instigada pelo filho, o jornalista Luciano Suassuna, a preparar um jantar tipicamente sertanejo para um seleto grupo de chefs, entre os quais Alex Atala, Rodrigo Oliveira, Ana Luiza Trajano e Mara Salles, comandantes de algumas das mais tops cozinhas paulistanas. Para deleite geral, desfilaram pela mesa, naquela noite, mocotó com mungunzá, maxixada com carne de sol, cabrito com arroz de leite e farofa de jerimum, pernil de
carneiro, mel de rapadura com inhame... e por aí vai! “Eles ficaram encantados. Depois foi aquela conversa gostosa, porque a comida é sempre pretexto para uma boa prosa, eles querendo saber dos ingredientes, das receitas, onde encontrá-las... Mas não tinha receita! Era tudo feito de memória, aprendido no fazer das cozinhas, com conhecimento passado de mãe pra filha. Não havia registro. Aí surgiu a ideia do livro”. Dois anos depois daquele jantar, Ana Rita lançava o livro Receitas que contam histórias, editado pela Melhoramentos, ganhador do prêmio Jabuti e tido como “definitivo” quando se trata de culinária do sertão. Sobre a publicação, a autora e o tema têm assunto que não acaba mais. Por isso, vamos logo ao capítulo que aqui especialmente nos interessa: as comidas de São João. As festas juninas são ligadas às tradições culturais e religiosas rurais de todo o país. Pedem e agradecem a Santo Antônio, São Pedro e São João a fartura à mesa onde quer que se plante e colha especialmente o milho, seu símbolo maior. Mas é no sertão nordestino que estão mais enraizadas e suas manifestações afloram mais exuberantes. Ao longo do mês de junho, todo o Brasil, até o mar, realiza a profecia: vira sertão. Pois veja se a cena não é familiar: “Quando termina a celebração religiosa, todos vão para o pátio da igreja, onde há fogueira, bancas de comida, leilão de galinhas, de ovos, queijos, bolos, jerimuns,
melancias... O ambiente é iluminado com lamparinas que complementam a claridade da fogueira”. O trecho da abertura do capítulo sobre festas juninas fala do ritual na pequena São José do Egito, na primeira metade do Século XX. Mas certamente todos nós, brasileiros, já vivenciamos alguma coisa parecida e até hoje, mesmo aqui em Brasília, que era só um sonho naquela época, as quermesses se repetem à profusão, com
as mesmas características e, principalmente, com as mesmas comidas. E são elas, as comidas juninas e seus aromas, que afloram aos quatro cantos o que poderíamos nos atrever a chamar de “identidade” de uma nação, que pode mesmo ter nascido no sertão. Receitas que contam histórias
Ana Rita Dantas Suassuna Editora Melhoramentos, 202 páginas Preço: a partir de R$ 120.
Orelha de pau (também conhecida como “bolo de caco” ou “chapéu de couro”)
Ingredientes • 1 e ½ xícara de massa de milho (grãos do milho debulhado e socado ou batido) • 3 ovos • 1 pitada de sal • ½ xícara (chá) de açúcar • 2 colheres (sopa) de farinha do reino (farinha de trigo fina) • 1 colher (sobremesa) de fermento • ½ xícara (chá) de leite • Manteiga ou banha de porco Modo de preparo Umedecer e peneirar a massa de milho. Bater as claras em neve e juntar as gemas, o sal e o açúcar. Misturar à massa a farinha do reino e o fermento peneirados. Juntar os ovos, alternando com o leite. Esquentar numa frigideira um pouco de manteiga ou banha de porco e colocar ½ concha da massa para fritar. Tampar a frigideira, esperar um pouco e virar a massa para assar no lado oposto. Retirar do fogo e escorrer a gordura. Servir quente.
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Don Quixote e Shekherazade são as obras que a companhia Russian State Ballet apresentará, dia 20, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Com direção artística do coreógrafo Viacheslav M. Gordeev, do Bolshoi de Moscou, 40 solistas conhecidos como “as joias do balé russo” encenarão os clássicos que vêm encantando gerações. Entre eles estão a estrela do KirovMariinsky, Anton Korsakov, e do Teatro Kremlin, Valeria Vasiliev. De acordo com Augusto Stevanovich, produtor responsável pela vinda dos bailarinos à América Latina, a iniciativa tem por objetivo popularizar o balé russo. “Trata-se de um espetáculo muito grandioso que estará percorrendo dezenas de cidades brasileiras e países vizinhos, do Uruguai ao México, incluindo o Suriname e as Guianas Francesa e Inglesa”, acrescenta o produtor. Shekherazade conta a história do rei da Pérsia, que descobre a traição de sua mulher com um escravo cada vez que ele viaja. Decepcionado e furioso, mata a mulher e o escravo e decide então dormir com uma mulher diferente a cada noite, mandando matá-la na manhã seguinte. Já Don Quixote (foto) conta a saga do pequeno fidalgo castelhano que perdeu a razão em função de muita leitura de romances de cavalaria e passa a imitar seus heróis preferidos. O romance narra suas aventuras em companhia de Sancho Pança, fiel amigo e companheiro, que tem uma visão mais realista. Duas apresentações, às 15 e às 20h. Ingressos a partir de R$100, na Central de Ingressos do Brasília Shopping. Informações: 3364.2694.
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nervosàflordapele “Hora Amarela é diferente de tudo que já fiz. Logo que recebi o convite de Deborah Evelyn e Mônica Torres, fiquei resistente. Nunca havia imaginado encenar uma ficção científica. Mas aos poucos fui me dando conta de que, embora a história se passe no futuro, tudo o que acontece em cena já foi, de uma forma ou de outra, produzido pelo homem, tem uma base real que a torna assustadora e nos faz ref letir sobre os caminhos da humanidade”. É a diretora Monique Gardenberg quem resume o espetáculo ainda em cartaz – até o dia 21 – no CCBB. A ação se passa em uma New York sitiada e arrasada por uma guerra misteriosa. Com texto do dramaturgo norte-americano Adam Rapp, tem no elenco Deborah Evelyn, Isabel Wilker, Michel Bercovitch, Darlan Cunha, Daniel Infantini e Daniele do Rosario. Escondida há três meses no porão de seu prédio, Ellen (Deborah Evelyn) faz de tudo para sobreviver e não perder a esperança de rever o marido desaparecido. No desenrolar da peça, ela é surpreendida com a chegada de diferentes personagens. De quinta a sábado, às 21h, e domingos, às 20h. Ingressos a R$ 10 e R$ 5. Mais informações: 3108.7600.
A dupla caipira Welder & Pipo promete botar lenha na fogueira do arraial cultural que vai ser montado no Teatro da Caixa, dia 24, às 20h. É o Jogo de cena, projeto mensal com direção de James Fensterseifer que segue o modelo de programa de auditório, sempre tendo como foco a divulgação da arte produzida em Brasília. Inspirada nas festas juninas de Santo Antônio, São João e São Pedro, a produção prepara brincadeiras comandadas pela dupla de integrantes da Cia. de Comédia Os Melhores do Mundo e com trilha sonora do DJ Chuchu. Criado em agosto de 1985, o Jogo de cena é dividido em quadros entremeados pela participação do público, que tem a oportunidade de experimentar ser artista por uma noite ou simplesmente participar das brincadeiras para receber prêmios. Ingressos a R$ 20 e 10. Não recomendado para menores de 14 anos.
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Em turnê por diversas cidades e capitais do país, chega a Brasília, também no dia 20, o show de Tom Cavalcanti, com novos personagens, músicas e imitações. Cada apresentação é diferente, pois Tom trabalha suas crônicas e piadas em cima da atualidade brasileira e de outros países, com boa dose de improviso. As observações do comportamento humano e o olhar atento sobre a política do país somam-se às performances dos personagens criados por ele, como João Canabrava, o velho contador de causos Sr. Venâncio e a petulante doméstica Jarilene, conhecida pelo famoso bordão “com licença, obrigada!”. Os arranjos musicais têm a direção dos maestros Lucas Lima e Eduardo Lages. Às 21h, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Ingressos a R$ 75, à venda nas Lojas Cia Toy e na Belini Pães e Gastronomia (113 Sul).
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Baseado no filme homônimo de Julie Taymor (2007), vem aí o musical Across the universe, que finalizará aqui em Brasília, no dia 1º de agosto, em local ainda a ser definido, sua turnê por cinco cidades brasileiras. Trata-se da história de um garoto de Liverpool que, insatisfeito com seu trabalho no porto, decide cruzar o Atlântico em busca do pai. Após conhecer alguns estudantes rebeldes, partem rumo a Nova York e acabam se envolvendo com emergentes movimentos de contracultura como forma de contestar o caráter social e cultural da sociedade, conf litos militares, psicodelia, movimentos estudantis, amor livre e protestos contra a Guerra do Vietnã. Mais de 15 músicas dos Beatles servem de pano de fundo para as histórias contadas no espetáculo, entre elas Let it be, Yesterday, Come together, Revolution, All you need is love, I want you, Because e Blackbird, além da canção-título. Doze atores cantam e dançam, acompanhados de uma banda ao vivo. Informações em www.acrossmusical.com.br.
Quem perdeu a oportunidade de assistir ao musical Cazuza – Pro dia nascer feliz tem agora a grande chance de vê-lo de graça. Assistido por mais de 200 mil pessoas na turnê por teatros do Brasil, o musical começou agora a ser exibido em locais abertos, em 13 cidades brasileiras, sempre em apresentações gratuitas. Com texto de Aloísio de Abreu e direção de João Fonseca, tem no elenco a participação de Emílio Dantas no papel de Cazuza. Quem for poderá relembrar os maiores clássicos do cantor e compositor, em carreira solo ou quando integrava o Barão Vermelho, entre eles Codinome beija-flor, Bete Balanço, Ideologia, O tempo não para, Exagerado e, claro, a música que dá nome ao musical. Como a vida do personagem foi curta e, ao mesmo tempo, muito intensa, o autor procurou contar a história de forma ágil, avançando sempre a partir dos momentos de virada na carreira e na vida dele: a descoberta do teatro, o gosto pelo rock, o momento em que resolve cantar, montar uma banda, profissionalizar-se, o estouro, as brigas, a mudança no estilo de sua obra, o estrelato solo, a descoberta da doença, a urgência poética no fim das forças. Dia 28, às 19h, na praça em frente ao Museu da República.
Matilda é uma garotinha muito inteligente que não se comporta como as crianças de sua idade. Filha de pais negligentes, foi deixada de lado desde muito cedo. Cansada de ser insultada em casa e na escola, ela resolve dar uma lição nos adultos que a maltratavam e apronta algumas traquinagens com a ajuda de suas amiguinhas e o olhar atento de uma professora que reconhece sua capacidade intelectual. Com direção de Felipe Vasques, está em cartaz, até o dia 28, no Teatro do Brasília Shopping, a peça Matilda. Inspirada no livro homônimo de Roald Dahl, a história convida as crianças a visitar um mundo mágico onde tudo é possível, desde que elas sejam corajosas e não desistam ao encontrar o primeiro problema. E sugere ao público que sempre é possível promover boas mudanças ao nosso redor e fazer do mundo um local melhor e mais justo. Sábados e domingos, às 16h, com ingressos a R$ 40 e R$ 20. Mais informações: 2109.2122.
fernandacabral Ela nasceu em Brasília e já é conhecida no Japão, onde chegou a cantar no Blue Note de Tóquio, e em vários festivais de world music em países como Escócia, França, Holanda, Rússia, Itália, Portugal e Espanha. Neste último, onde morou por 14 anos, ela se apresentou com o músico galego Carlos Núñez, o cineasta Pedro Almodóvar, o duo espanhol de jazz-house Wagon Cookin e o cantor canário Pedro Guerra. Agora, Fernanda Cabral se junta aos músicos brasilienses Bosco Oliveira (violão) e Ocelo Mendonça (violoncelo e f lauta) para apresentação no Instituto Cervantes (707/907 Sul), no dia 25. No repertório, a poesia é o elo principal, seja através de La tarara, de autoria do espanhol Federico García Lorca (1898/1936), ou El garrotín, rítmo f lamenco de origem asturiana, apresentado com letra de Hugo Perez de la Pica, ou Canto de ordeño, canção composta por Antonio Estevez. Fernanda também interpreta composições próprias. Em seu currículo está a participação no filme de Pedro Almodóvar A pele que habito, no qual fez a preparação vocal da cantora espanhola Ana Mena. O show Cantares de la tierra será às 19h30, com ingressos a R$ 30 e R$ 15, à venda no Instituto Cervantes.
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Steve Vai, o virtuoso guitarrista norte-americano em turnê pelo Brasil, apresenta curso com debate sobre mercado e identidade musical no Colégio La Salle da Asa Sul, dia 26, a partir das 20h. As inscrições custam R$ 160 para participação na aula e R$ 300 para aqueles que desejarem ter um encontro com o músico. O inscritos ouvirão Steve discorrer sobre teoria musical, técnicas de guitarra, mercado e, sobretudo, métodos para descobrir e liberar a identidade musical de cada artista. A carreira de Steve já está associada à história da guitarra, instrumento ao qual se doou por toda a vida. Nascido em 1960, em Nova York, o guitarrista, compositor e produtor musical venceu o Grammy e é doutor em Música pelo Musicians Institute. Tem sua carreira associada ao rock e à música experimental e foi responsável pela ressurreição das guitarras de sete cordas na música popular, instrumento que não era visto desde as décadas de 1930 e 1940, nas mãos do guitarrista jazístico George Van Eps. Inscrições: GTR Instituto de Música (111 Sul e 708/9 Norte) ou www.bilheteriadigital.com. Mais informações: 3245.7140.
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mergulhouruguaio Durante cinco dias, de 15 a 19 de junho, o cinema, a literatura, a música, o teatro e a culinária do Uruguai estarão em evidência na Semana da Língua Espanhola. Entre os destaques da programação, o documentário O pai de Gardel (foto), de Ricardo Asas, a ser exibido dia 19, às 18h30. Produzido em 2013, tem como foco a polêmica criada em torno da nacionalidade do cantor Carlos Gardel. Pretende esclarecer qual é a verdadeira relação de parentesco entre o cantor e o coronel Carlos Escayola, uma história oculta por décadas. Personagem complexo e chefe político da “Califórnia do Sul”, o coronel Escayola teve 50 filhos naturais, além dos 14 filhos que teve com as três irmãs Oliva, esposas perante a Lei e a Igreja. O filho do escândalo tinha que sumir do Uruguai e se converteu, na Argentina, no Carlos Gardel que todos conhecemos. Programação em http://brasilia.cervantes.es/br/ cultura_espanhol/atividades_ cultura_espanhol.htm
Vai até o dia 28, no Brasília Shopping, a mostra Ciclo de arte, um acervo de 60 trabalhos de novos artistas brasilienses organizados por Pedro Ivo Viçosa e Felipe Cavalcante. Com curadoria de Ralph Gehre, pretende fazer do shopping uma galeria viva, democratizando o acesso à produção artística da cidade. Faz parte do projeto o Sem/Registro, álbum de gravuras que, a cada edição, convida cinco artistas ligados a pintura, desenho, gravura, quadrinhos, moda, ilustração e design a experimentar a serigrafia como suporte. A iniciativa gera uma edição impressa manualmente com tiragem restrita e periodicidade definida, onde as páginas são apresentadas soltas. Participam das suas quatro edições Alline Luz, AX, Daniel Gizo, Diogo Blanco, Douglas BSF, Eduardo Belga, Felipe Cavalcante, Gabriel Góes, Gabriel Mesquita, Grande Circular, Gregório Marangoni, Ismael Árabe, Jean Matos, Júlio Lapagesse, Lucas Gehre, Luisa Malheiros, Luisa Vieira, Leno Veras, Ludmilla Alves, Matias Monteiro, Natinho RSD, Pedro Ivo Verçosa, Pollyanna Morgana, Rafael Coutinho, Renato Reno, Rodrigo Cruz, Rogério Lionzo, Vanessa Cavalcante e Virgílio Neto. Das 10 às 22h, com entrada franca.
O esporte local é foco das lentes de Luiz Alberto Cortes Silva, ou simplesmente Beto Barata. Seu trabalho, 24 fotos em preto e branco, pode ser visto na mostra Vamos jogar bola, em cartaz no recéminaugurado Espaço Cultural ION (601 Norte) até o dia 30. Com imagens inéditas que documentam a história do futebol não profissional do DF, a iniciativa da exposição partiu da ideia de se registrar e divulgar essa atividade esportiva que é considerada patrimônio cultural e imaterial do Brasil e está presente na vida de muitos brasilienses. Durante a Copa do Mundo de 2014, as fotos foram editadas em um livro fotográfico, distribuído gratuitamente em todas as bibliotecas e escolas públicas de Brasília. Beto completa, em 2015, 19 anos de profissão, durante os quais atuou em vários veículos de comunicação. Em 2010 foi convidado a fazer parte do acervo permanente da galeria de fotografias Fine Art, A Casa da Luz Vermelha, de propriedade do fotógrafo Kazuo Okubo.Diariamente, das 9 às 18h. Entrada franca.
Luiz Alberto Cortes Silva
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Bruno Baptistelli
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alfinetegaleria Fotos de Diego Bresani e pinturas e desenhos de Renato Rios são as novas atrações da galeria localizada na 116 Norte, de 20 de junho a 28 de julho. A primeira, intitulada Tuer-Matar, é fruto do tempo em que Bresani ficou em Paris, a partir da necessidade que teve de se distanciar de seu próprio trabalho e de sua terra natal. As imagens estão relacionadas às suas sensações, estranhamentos e indagações como artista e estrangeiro. Fotógrafo e diretor de teatro, Bresani formou-se em Artes Cênicas pela UnB e estudou retrato em grande formato no ICP – International Center of Photography, de Nova York. A segunda atração, batizada de Doces Laranjais, sob inspiração de poema do espanhol Garcia Lorca, apresenta duas séries de pinturas e outra de desenhos, nas quais o artista apresenta uma espécie de documentação da observação de seu mundo de retratista e paisagista. O espectador é convidado a olhar o horizonte, a paisagem, os pontos de fuga. Uma das séries é composta por miniaturas, 90 pequenas telas de paisagem (4,5 por 7cm) que, colocadas em linha, reproduzem o horizonte plano de Goiás. De quarta a sábado, das 15 às 19h30. Entrada franca.
arraialdoiate As bandas Terminal Zero e Rastapé, além da dupla Roniel & Rafael, uma a cada dia, estão encarregadas de animar a festa junina mais tradicional da cidade, dias 18, 19 e 20, a partir das 19h. Com o tema "a capital do forró", a festa do Iate Clube vai trazer as inf luências das principais capitais nordestinas que promovem o tradicional São João. Durante os três dias, um DJ e o grupo Xamego Bom vão contribuir com forró e dança country para ninguém ficar parado. Barracas de comidas típicas, bebidas diversas, fogueira, shows, danças, fazendinha e brincadeiras para a criançada são atrações garantidas do arraial. Entrada franca para os sócios, R$ 40 para os não sócios e R$ 20 para crianças até 12 anos, à venda somente na tesouraria do Iate, no Setor de Clubes Norte, Trecho 2. Mais informações: 3329.8700.
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Renato Rios
A Galeria Fayga Ostrower, do Complexo Cultural Funarte, abriga até 12 de julho a exposição Narrativas cotidianas, de Bruno Baptistelli. Com curadoria de Tomás Toledo, a exposição-instalação apresenta trabalhos realizados pelo artista plástico paulistano – fotografia, pintura, objetos – após uma viagem de pesquisa à capital brasileira. Nas obras, Baptistelli investiga as relações de seu imaginário sobre a cidade, evidenciando elementos como arquitetura, urbanismo e contexto social e político. “Eu só conhecia Brasília por imagens, o que motivou meu projeto. Após visitar a cidade, reparei como ela é realmente o ápice de um projeto modernista, uma grande invenção, como um grande 'portfólio', majoritariamente, de Oscar Niemeyer. Reparei na horizontalidade da cidade, nas distâncias, na presença da religião, na setorização, na dificuldade de estrangeiros em conseguir se deslocar, na racionalidade, na manutenção, e falta dela, nos prédios públicos, no design presente nos edifícios, na natureza decorativa, nos gramados com terra vermelha”. O projeto que virou a exposição foi contemplado pelo Prêmio Funarte de Arte Contemporânea 2014 – Atos Visuais Funarte Brasília. De segunda-feira a domingo, das 9 às 21h, com entrada franca.
brasilidadejazz João Bosco, Maestro Spok e Raúl de Souza, com suas respectivas bandas, se apresentam ao ar livre na tarde de 26 de junho, no estacionamento ao lado do Museu dos Correios (SCS, Quadra 4). Ao longo de seis horas, das 16 às 22h, eles participam do Brasilidade jazz, projeto que privilegia MPB e jazz, ritmos contemporâneos que ditam moda e estilos de vida mundo afora. Na abertura, sobe ao palco o Quinteto Raúl de Souza. Considerado um dos maiores trombonistas do mundo, Raúl destacou-se ainda menino no programa de Ary Barroso, que ficou impressionado com seu talento. Em 2015 ele comemora 60 anos de carreira e apresenta show inédito em Brasília. Em seguida, é a vez do pernambucano Spok Quinteto, com repertório de choro, baião, maracatu e frevo. João Bosco fecha a tarde com show que comemora 40 anos de carreira. Ele e seu quinteto participam do projeto com a realização de show que explora um rigoroso trabalho de canção pura: sem ornamentos e com canto despojado. Entrada franca.
arraiádooutrocalaf A banda Chinelo de Couro comanda a festa junina repleta de forró, xote e baião que vai tomar conta do bar Outro Calaf (Setor Bancário Sul) no dia 25. Formado somente por mulheres – Júlia Carvalho (zabumba, pandeiro e vocal), Letícia Fialho (cavaquinho, violão e vocal), Maísa Arantes de Amorim (rabeca e vocal) e Shária Ribeiro (pandeiro, triângulo e vocal) – o Chinelo de Couro apresenta repertório de canções que vão da ciranda ao xaxado, de Marinês a Caetano Veloso, além de um vasto repertório com clássicos do forró pé de serra, releituras, autorais e títulos de compositores brasilienses. Na abertura, a DJ Tamara Maravilha promete aquecer o arraial com os sons mais diversos da música brasileira. Os ingressos custam R$ 15, até as 23h, e R$ 20, após esse horário. O chef Venceslau Calaf, no comando das panelas, promete menu caprichado composto por canjica (R$ 10), caldo de feijão (R$ 10), baião de quatro – arroz, feijão, carne de sol, queijo coalho e cheiro-verde (R$ 15) – e o imprescindível quentão (R$ 10).
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Miguel Aun
galeriadearte
A arte como
transcendência
Por Alexandre Marino
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om 57 anos de carreira, o artista plástico Carlos Bracher transforma cada movimento de suas mãos diante de uma tela em um ritual mágico e transcendente. Essas mãos, que constroem catedrais, enriquecem paisagens, dão vida a naturezas mortas e revelam a alma dos personagens de seus retratos, estão em busca do caminho para a liberdade. “Estamos na vida para isso”, diz ele. “O destino do ser é se libertar. É a razão de nosso tempo de viver.” Carlos Bracher é mineiro de Juiz de Fora, onde nasceu em 1940. Em seu trajeto de vida, a relação com a pintura se aprofundou e se tornou fonte de enorme ener-
gia. Desde a primeira exposição, realizada em 1960 em sua cidade natal, ao lado dos irmãos Nívea e Décio, até a retrospectiva Bracher – Pintura & Permanência, que os brasilienses podem ver no Centro Cultural Banco do Brasil até 27 de julho, fez inúmeras mostras no Brasil e tornou-se o artista brasileiro que mais expôs no exterior, em galerias e museus da França, Itália, Inglaterra, Holanda, Espanha, Portugal, Rússia, Japão, China, Uruguai, Chile e outros países. E, no entanto, ele ainda é o menino que vivia no Castelinho, como a casa da família em Juiz de Fora é conhecida até hoje, enriquecido pela genialidade que a vida e a dedicação à arte fertilizaram e fizeram florescer. Essa fusão de imagens e pa-
lavras é fruto de um longo caminho de iluminação, ao longo do qual ele vem plantando sua arte frondosa, regada com poesia. A arte, para Bracher, é uma espécie de religião. Não o que se entende convencionalmente como religião, “essa coisa chata, cheia de regras”, mas a permanente busca do renascer, do sonhar. “Quero inventar a minha santidade”, afirma ele. “Com minha vivência, vou chegando a isso. Criando novos signos, complexos, mágicos. Renascendo sempre. Sem limites. Porque a arte não tem limites, não tem regras, não quer chegar a coisa alguma, não quer provar nada. É a minha busca por Deus, que nada tem a ver com religião.” Seguindo seu caminho, Bracher se de-
Arquivo pessoal Miguel Aun
fine como “um sujeito que não pensa em nada”. Selvagem, sem regras, sem método. “Quero ilações só com a emoção. Pintar, escrever, viver.” Um sujeito que gosta de “conversas de almas”. Nessa busca transcendental, um dia ele chegou a Ouro Preto, cidade mágica entre as montanhas de Minas, que entrou em sintonia com sua viagem interior. A riqueza cultural de Ouro Preto, onde a arte brota da terra como nos séculos 17 e 18 brotava o ouro, faz da cidade o ambiente perfeito para Carlos Bracher. A força dessas montanhas embelezadas pelo barroco, pela arquitetura colonial, pelas “igrejas pastoreando casas”, como descreveu o poeta Carlos Drummond de Andrade, está impregnada em sua pintura. Carlos Bracher não tem a intenção de descrever a matéria. “Quero a essencialidade imaterial da paisagem”, afirma. Não é por outra razão que suas telas causam tamanho impacto e despertam no espectador sua capacidade de se elevar, de alcançar a “cena cósmica” que se esconde na
Árvores e casas, da série Homenagem a Van Gogh (1990).
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Divulgação
Blima Bracher
galeriadearte
essência das igrejas, montanhas, paisagens, personagens dos retratos, incluindo os autorretratos. “Não sou um sujeito criativo”, Bracher diz. “Sou apenas um pintor. Pinto as mesmas coisas de sempre.” A exposição no CCBB, que tem cerca de 80 quadros, é oportunidade para quem quiser ver ou rever uma parte de sua obra e também conhecer um pouco da alma desse homem que direcionou sua vida na busca da transcendência pela arte. Lá está seu olhar sobre Ouro Preto, sobre Van Gogh, uma de suas paixões, e sobre Brasília, cidade que o encanta. A forte ligação de Bracher com Brasília, retratada por ele em mais de 60 quadros, em 2006, vem desde o berço. Sua avó, Josefina, era vizinha da casa de Juscelino Kubitschek em Diamantina, e sua mãe, Hermengarda, era amiga de infância do futuro construtor de Brasília. A lembrança de Juscelino o emociona. “Um homem notável, que nasceu de uma família muito pobre, mas sempre dedicado à leitura, e que aos 38 anos se tornou prefeito de Belo Horizonte, transformando a cidade, e depois construiu Brasília, um projeto que vinha desde o império.” Na exposição do CCBB estão, além
de algumas de suas obras mais representativas, alguns ambientes de sua intimidade, como o ateliê de sua casa, em Ouro Preto. “Dos meus 74 anos, 44 os passei aqui dentro, sessenta por cento do que sou nesses parcos metros quadrados, o meu ateliê”, conta, em um de seus textos para a mostra. E também lá está o lugar de sua infância, o Castelinho, sua casa de Juiz de Fora, “ambiente sem regras”, como ele descreve, mas transbordante de arte – podem ser vistos vários quadros de seus irmãos, e no vídeo pode-se ouvir seu pai, Waldemar, ao piano. Esse ambiente familiar tem tudo a ver com a retrospectiva de Bracher, porque a habilidade manual vem de várias gerações. Desde o bisavô suíço, Cristiano, que era floricultor, passando pelo avô Frederico, tipógrafo e violinista, o tio Frederico Júnior, pintor, o pai, músico amador que também trabalhou com cerâmica, Lótus Lobo, prima, gravadora de renome, além de Décio e Nívea, irmãos, também pintores. Mas a arte permanece na família, com Fani, a esposa há 50 anos, pintora, as filhas Larissa, atriz, casada com o músico Paulinho Moska, e Blima, jornalista e videomaker. A concepção da mostra é de Larissa
Bracher, com seleção de Olívio Tavares de Araújo e do próprio artista, produção executiva de Carlos Chapéu e concepção cenográfica de Fernando Mello da Costa. Blima Bracher cuidou da pesquisa, da documentação e dos vídeos. “É uma das exposições mais bem estruturadas que já vi”, observa Carlos Bracher, elogiando o trabalho da equipe e especialmente das filhas, que se dedicam a divulgar a obra do pai. “O Brasil tem 9 mil exposições por ano, e essa aqui é uma epopeia, a cenografia, a sonoplastia, um trabalho enorme para mostrar que a pintura é uma arte linda, linda e atual. A Larissa, a Blima e a Fani estão comigo nisso, é muito bonito.” A mostra Bracher – Pintura & Permanência foi contemplada com o Prêmio Destaque Especial 2014 pela Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA), superando exposições de artistas clássicos, como Salvador Dali, Kandinski e Picasso. Foi vista por 120 mil pessoas em Belo Horizonte, 90 mil pessoas em São Paulo e mais de 200 mil no Rio de Janeiro.
Bracher – Pintura & Permanência
Até 27/7 no CCBB (SCES, Trecho 2). De 4ª a 2ª feira, das 9 às 21h, com entrada franca. Classificação indicativa: livre.
Fotos: Alfredo Melgar
Miró em ação Por Júlia Viegas
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o início dos anos 1970, um dos maiores artistas de todos os tempos, conhecido pelo temperamento recluso e introvertido, convidou um fotógrafo iniciante para ir até seu ateliê registrar seu processo de trabalho. Assim nascia a amizade entre o catalão Joan Miró e Alfredo Melgar, que viria a se tornar conde de Villamonte, conhecido galerista de Paris e fotógrafo renomado. Uma amizade que cria uma ponte até o Brasil. Explico melhor: depois de tomar contato com as obras de Miró, Melgar encantou- se pelas artes e tornou-se um grande colecionador. Do próprio catalão ele reuniu uma bela e importante coleção de pinturas, desenhos e gravuras – além das fotografias, naturalmente. Um recorte dessa coleção chega agora a Brasília com a exposição A magia de Miró, que a partir de 1º de julho vai estar na Caixa Cultural. Na verdade, a mostra encerra por Brasília uma turnê brasileira que já a levou por cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba. Pelas paredes da Galeria Principal da Caixa desfilarão 69 obras do grande Miró, entre desenhos e gravuras, e 23 fotografias que flagram o artista em pleno processo criativo. É de emocionar ver Miró parecendo diminuto diante das imensas dimensões de seu ateliê, caminhando entre telas que hoje vemos princi-
palmente na Fundació Miró, em Barcelona, que reúne grande parte de seu acervo. Uma das mais originais do Século 20, a obra de Joan Miró (1893-1983) caracteriza-se pela busca da essência, da relação entre pintura e poesia, da representação do universo onírico. O artista nunca abandonou a espontaneidade e a simplicidade das formas – alguns de seus trabalhos têm a liberdade dos desenhos infantis. No entanto, o que pode parecer uma ingênua linha de cor contém em si todo o significado da obra de Miró. Por isso, especialistas sempre aconselham o especta-
dor a ficar atento aos títulos das obras: muitas vezes, são eles que conduzem às melhores descobertas e surpresas. Contemporâneo de outro grande nome que se tornou sinônimo de Barcelona – Antoni Gaudí (1852-1926) –, Miró experimentou muitas técnicas artísticas em sua trajetória – pintura, escultura, gravura, cerâmica, colagens, aquarelas etc. Experimentou também os suportes, pintando sobre tela e até sobre chapas de cobre. As obras da coleção de Alfredo Melgar que serão expostas em Brasília percorrem vários anos da carreira do artista, de 1962 a 1983. São preciosidades, como as produzidas por Miró em seus últimos anos de vida. Esboços traçados em lixa ou papelão, notas feitas com lápis, giz de cera, desenhos únicos e gravuras, técnica na qual Miró foi considerado um mestre. E o que promete diferenciar esta de outra exposição que já se tenha feito com obras do artista é a série de 23 fotografias tiradas por Alfredo Melgar a partir da década de 1970. Nelas, Miró aparece registrado em preto e branco, dentro de seu ateliê. São instantâneos que capturam o catalão em pleno processo criativo, ou que revelam um pouco de sua intimidade. E, convenhamos, não é sempre que se pode compartilhar da intimidade de um dos maiores nomes das artes em todos os tempos.
A magia de Miró
De 1/7 a 30/8 na Galeria Principal da Caixa Cultural (SBS, Quadra 4), com entrada franca. De 3ª a sábado, das 10 às 20h; domingos, das 10 às 19h.
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graves&agudos
Tributo aos
velhos regionais
Por Vicente Sá Fotos Gadelha Neto
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Em 1951, quando Clodo nasceu, os conjuntos regionais estavam no auge. Não havia uma só rádio na capital do Brasil – o Rio de Janeiro, na época – que não tivesse seu próprio regional para acompanhar cantores e cantoras nos programas de auditório transmitidos ao vivo. As gravações desses conjuntos em discos long play eram reproduzidas em todas as rádios, Brasil afora, e é provável que a infância de Clodo tenha sido embalada pela rica música dos regionais de Pernambuco do Pandeiro, Benedito Lacerda ou Canhoto. É quase possível vê-lo jogando pião ou finca no quintal de sua casa em Teresina,
enquanto a música balança as pernas na janela da cozinha, ou olhando o rádio e imaginando um conjunto de homenzinhos do tamanho de um soldadinho de chumbo tocando aquelas músicas maravilhosas dentro daquela caixa de madeira. Talvez por isso, depois de tantos anos de carreira, ele tenha resolvido fazer uma pequena homenagem a esses mestres da música brasileira. Em seu décimo primeiro CD, intitulado Clodo Ferreira, o músico é retratado na capa por um inspirado Darlan Rosa, que recria seu rosto com notas musicais. Uma tradução mágica da vida artística desse criador brasileiro tão respeitado em Brasília e em qualquer recanto do país por sucessos como Revelação, composta com o irmão Clésio, ou Cebola corta-
da, com Petrúcio Maia. O novo CD de Fagner traz a música Se o amor vier, composta por ele em parceria com Clodo. Chegando ainda novo em Brasília, Clodo “adolesceu” na 312 Norte em meio à alegre presença da mãe, às criações musicais e poéticas dos irmãos Climério e Clésio e à parceria mágica com Zeca Bahia, que rendeu muitas canções e histórias. Uma delas, reza a lenda, aconteceu num bar da própria 312, onde eles costumavam ficar ao final da tarde tomando uma ou outra cerveja que o dinheiro estudantil permitia e mostrando a quem quisesse suas novas composições. O dono do bar, entusiasmado com a música dos “meninos”, propôs que eles trabalhassem mais ainda em suas composições. E, para incentivá-los, garantiu
Dupla homenagem N
elson Sargento, sentido! Assim falou a Voz Superior, acrescentando em tons divinos: “Não obstante os 90 anos, ainda tens muito a ensinar. Prepara-te, pois tens muitos shows pela frente e muitos querem te ouvir. Lembra-te das palavras de Paulinho da Viola: estão acabando com a síncope”. Se a Voz não falou, devia ter falado, pois o cantor, compositor, escritor e pintor carioca, nascido Nelson Mattos, em 1924, é pessoa ungida, orgulho nacional, sumidade da mais alta patente do samba. Caras assim tem um quê de sintonia com os de lá de cima e atendem por nomes diversos como Assis Valente, Cartola, Adoniran Barbosa, Nelson Cavaquinho, Zé Keti, Ismael Silva, Carlos Cachaça, numa linhagem que viaja no tempo, e nele embarcam autênticos viajantes, sempre tendo em mente o seguinte: o samba agoniza, mas não morre. E o mais bacana: o autor desse samba, Agoniza mas não morre (1979), o monumental Nelson Sargento, volta a Brasília para protagonizar show comemorativo de 90 anos de muita luta e defesa do gênero como autêntica expressão cultural brasileira. Quando um músico se diz primeiro um grande ouvinte, vale acreditar. Tem sabedoria envolvida nisso. Durante quatro dias, de 25 a 28 de junho, o teatro da Caixa Cultural recebe o
Divulgação
Por Heitor Menezes
projeto Nelson Sargento, 90 anos de samba, no qual o velho soldado se junta aos amigos do grupo Galo Preto (na foto abaixo) e a Pedro Miranda, da nova geração do samba da Lapa. É aula magna de samba, show pra todo mundo prestar reverência, cantar junto e voltar pra casa feliz da vida. Isto é Brasil, amigo, o bom Brasil, acredite. E por falar em homenagem, o mês reserva outra justa reverência, desta vez a Luiz Gonzaga do Nascimento Júnior, o Gonzaguinha, que nos deixou em 29 de abril de 1991, aos 46 anos de idade. Só pelos versos “Viver e não ter a vergonha de ser feliz / Cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz / Eu sei que a vida devia ser bem melhor e será / Mas isso não impede que eu repita: é bonita, é bonita e é bonita”, Gonzaguinha tem luDivulgação
duas cervejas para cada nova canção a partir daquele dia. Na tarde seguinte, os dois rapazes sentam-se à sua frente e começam a mostrar músicas que fizeram na noite anterior. Dez no total. Encabulado, o proprietário reconheceu que os dois tinham direito a 20 cervejas, mas considerou findo o trato. “Senão, vocês me quebram”, justificou-se. O novo CD traz um Clodo renovado, com parcerias férteis com Dominguinhos, Cezinha, Sérgio Magalhães, Nonato Luiz e Evaldo Gouveia e a companhia de um regional de peso composto por João Ferreira no violão, Marcos Farias na sanfona, Evandro Barcellos no cavaquinho, Pedro Ferreira na percussão, Davi Farias no triangulo e a participação especial de Valerinho Xavier. Os destaques são os arranjos inspirados e os solos de cavaquinho e sanfona que nos levam por caminhos há muito tempo não trilhados. No regional de Clodo, saliente-se que os músicos João e Pedro, há tempos conhecidos no cenário musical brasiliense, são seus filhos. João, inclusive, assina a direção musical do CD. Dois outros instrumentistas, Evandro Barcellos e Marcos Farias, são oriundos de outros regionais – portanto, estão em casa ao acompanhar Clodo nessa viagem/homenagem.
O CD será lançado dia 20 de junho no Clube do Choro, com um show onde o regional de Clodo demonstrará, ao vivo, o charme e criatividade da música brasileira. Para os apressadinhos que não querem esperar para comprar o CD no dia do show, uma boa notícia: ele já está à venda no Google Play, Spot Fly e Deezer. Clodo Ferreira
Show de lançamento dia 20/6, às 21h, no Clube do Choro. Ingressos: R$ 20 e R$ 10.
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Paola Terranova
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Amora Pêra, filha de Gonzaguinha (ao centro), participará da homenagem ao pai com o grupo As Chicas, acompanhando Elza Soares e os irmãos Daniel (acima) e Fernanda.
gar garantido no coração deste povo ao sul do Equador. Querem melhor antídoto baixo-astral para este momento bocó? Sim, ele existe através da música. Moleque Gonzaguinha – 70 anos, dia 28 de junho, na área externa do Centro Cultural do Banco do Brasil, é a homenagem ao septuagenário autor de grande coleção de canções que continuam encantando aqueles que cultivam a arte de ouvir. Olha quem vem: Elza Soares e o grupo Chicas, que traz em sua formação atual Paula Leal, Isadora Medella e uma das fi-
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lhas de Gonzaguinha, a cantora Amora Pêra. Outros dois filhos de Gonzaguinha, Daniel Gonzaga (responsável pela direção musical do show) e a cantora Fernanda Gonzaga, também estarão presentes nas releituras e reinterpretações da obra paterna. Daniel costuma destacar que “a obra de Gonzaguinha é marcada por um encontro de sonoridades que dialogam com várias vertentes musicais nacionais, desde o baião até a música popular brasileira”. A homenagem a Gonzaguinha ocorre
no contexto da tradicional festa junina do CCBB. Isso significa ambiente “arraiá”, com comidas, bebidas e balacobacos típicos, além de palco alternativo com a apresentação de grupos de forró pé de serra. Nelson Sargento, 90 anos de samba 25, 26 e 27/6, às 20h, e 28/6, às 19h, no Teatro da Caixa Cultural (SBS, Quadra 4). Ingressos: R$ 20 e R$ 10.
Moleque Gonzaguinha – 70 anos
28/6, às 18h, no CCBB (SCES, Trecho 2). Ingressos: R$ 10 e R$ 5.
Vanessa Cerqueira
Hudson Vagner
Hudson Vagner
artepopular
Brincadeiras ancestrais C
ertamente a garotada de hoje não sabe, mas, ao abrir uma roda ou montar uma rede para iniciar um jogo de peteca, está repetindo um autêntico ritual ancestral. Peteca, a nossa peteca, feita com areia e penas de aves, é brinquedo que nasceu nas aldeias brasileiras e que leva até no nome o selo de origem: peteca, em tupi, significa “bater com a mão”. Essas e outras curiosidades – além, é claro, de um verdadeiro banquete de cores e formas – são a essência da exposição Brinquedos à mão – Coleção Sálua Chequer, que a partir de 24 de junho ocupará a Galeria Vitrine da Caixa Cultural Brasília. No total, são 900 brinquedos feitos à mão por artesãos e recolhidos pela pesquisadora e colecionadora baiana Sálua Chequer, ao longo de mais de 30 anos de trabalho, em comunidades do interior do Nordeste. As peças são de encantar até o coração mais impermeável. Como não fazer uma viagem no tempo ao topar com carrinhos, caminhões, trenzinhos, bicicletas e aviões confeccionados a partir de latas de alumínio recicladas? Ou com aquele mobiliário minúsculo, criado para os pequenos seres que habitam a infância, feito com sobras de madeira, caixas de fósforo,
garrafas pet? Tudo exala encantamento. Brinquedos à mão reúne apenas uma parte da grandiosa Coleção Sálua Chequer. A seleção de objetos – feita pela própria pesquisadora em parceria com o artista Zé da Rocha – levou em consideração três critérios: o olhar de quem criou o brinquedo, o olhar da colecionadora que o escolheu e o olhar do espectador. São peças coletadas principalmente em comunidades do interior da Bahia, Pernambuco, Piauí, Sergipe, Paraíba, Ceará e Alagoas. Elas evidenciam a imensa capacidade criativa e de superação do artesão brasileiro, que consegue burlar a falta de recursos com a inventividade. E assim, pedaços de pau e latas velhas convidam ao toque, ao movimento, à fantasia. Distribuídos pela galeria estarão bonecas (feitas de pano ou sisal), bichos (de madeira, papelão, retalhos de tecido), veículos, parques de diversões, mobiliário, piões, cenas de trabalho (moagem da cana, carro de boi, moinho, pilação de café etc) e vários outros brinquedos tradicionais, como as Cinco Marias (feitas de saquinhos de tecido ou pedrinhas), o Mané Gostoso (o homenzinho que dá cambalhotas no trapézio), o Burrinho Teimoso (que se movimenta quando a base é pressionada), fantoches, marionetes e mui-
to mais. Sálua Chequer é apaixonada pelos brinquedos desde menina e nunca mais quis deixar de brincar. Educadora, musicista, pesquisadora e brincante, ela atua desde 1980 na área da cultura popular. Começou, primeiro, percebendo a grande presença dos brinquedos em feiras livres e mercados populares do interior nordestino. Depois, quis saber quem os confeccionava, como, com que material. Em seguida, quis ter alguns. E assim começou tudo. De lá para cá, Sálua já fez Mestrado em Arte, Educação e Gestão Cultural, tendo como objeto de pesquisa o Brinquedo Popular, pela Universidad Internacional Menéndez Pelayo/Instituto de Educação Brasil-Espanha (IEBE) e é hoje uma autoridade no assunto. Para a criançada, a exposição vai contar com um “cantinho do brincar”, onde ficarão disponíveis vários brinquedos para a interatividade.
Brinquedos à mão – Coleção Sálua Chequer
De 24/6 a 23/8 na Galeria Vitrine da Caixa Cultural (SBS, Quadra 4). De 3ª a domingo, das 9 às 21h, com entrada franca. Mais informações: 3206.9448 / 3206.9449 Vanessa Cerqueira
Por Júlia Viegas
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luzcâmeraação
O tempo de
Coppola e
O poderoso chefão
A partir do dia 25, no CCBB e no Cine a obra completa de dois dos mais imp Por Sérgio Moriconi
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Peggy Sue – seu passado a espera
Fotos: Divulgação
Drácula de Bram Stoker
Cotton Club Francis Ford Copolla: o cronista da América 30
De 25/6 a 20/7 no CCBB e Cine Brasília. Ingressos: R$ 4 e R$ 2 no CCBB e R$ 6 no Cine Brasília.
erguntar se existe alguma similaridade entre os cinemas de Francis Ford Coppola e Pedro Almodóvar pode parecer tão esdrúxulo quanto buscar semelhanças entre bananas e abacaxis. No entanto, circunstâncias históricas distintas, mas muito específicas, possibilitaram o surgimento de ambos. Ao lado de Robert Altman, Paul Mazursky, Martin Scorsese e Arthur Penn, Coppola aca- baria por se transformar no chefe de fila de uma nova geração de realizadores, responsável pelo que muitos consideram um renascimento de Hollywood. Na segunda metade dos anos 60, a chamada “fábrica de sonhos” andava obsoleta e moribunda. O sucesso de Sem destino (1969), de Dennis Hopper, deixava claro que Hollywood necessitava de sangue novo para se reinventar. Do outro lado do Atlântico, Pedro Almodóvar propiciaria o exorcismo dos fantasmas depositados pela ditadura do general Franco, que deixara o ambiente cultural espanhol como uma árvore seca. Mais do que qualquer outra região da Espanha, a província de Madri experimentou um ambiente muito mais desolador, por ser identificada como a sede da ditadura. Com a morte de Franco, em 1975, todo um novo horizonte se abriu. E se abriu como um vulcão, um vulcão chamado movida (agito), a onda pop que se espalhou como um vírus por todos os campos da arte madrilenha, resgatando a cidade do obscurantismo, da desinformação, do provincianismo. Os protagonistas da movida, especialmente Almodóvar, faziam um amálgama da provocação punk,
da vulgaridade kitsch, da androginia do glam rock, da cultura e do cinema camp de John Waters, para espanar a poeira do que poderia ser reconhecido como a identidade espanhola. Os jovens rebeldes da movida queriam ser alienígenas, estrangeiros, tinham vergonha de ser espanhóis, porque a tradição estava identificada com Franco. Com o distanciamento de quatro décadas, El deseo – O apaixonante cinema de Pedro Almodóvar, de 30 de junho a 5 de julho na Caixa Cultural, vai nos possibilitar perceber o quanto o cinema de Almodóvar, desde os primeiros filmes, tem uma natureza essencialmente espanhola, a despeito das tentativas exasperadamente alucinadas de negação dos caracteres varonil, católico e cavalheiresco do espanhol. Almodóvar cria personagens que são a antítese, a negação funambulesca dessas qualidades mencionadas. O macho e a beata se liquefazem no cinema do diretor. O espírito da movida madrileña está especialmente documentado nos curtas produzidos entre 1974 e 1978, mas também nos primeiros filmes do diretor. Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão (1980), Labirinto de paixões (1982) e Maus hábitos (1983) apresentam o bairro do Rastro e as figuras bizarras que foram a alma da movida em seus primeiros tempos. No seguinte, Labirinto de paixões, Almodóvar já apresentava um sensível progresso técnico e a mudança da atitude pseudo- punk para o melodrama tradicional. Matador e A lei do desejo, os dois feitos em 1986, estabeleceram o diretor como um dos nomes mais representativos da nova geração de diretores espanhóis.
Almodóvar Carne trêmula
Brasília, e do dia 30, na Caixa Cultural, ortantes cineastas contemporâneos. Orchestra, sob a batuta de Toscanini. A mãe, Italia Coppola, era atriz. Coppola filho, antes de se tornar cineasta, tocava tuba. Depois de se formar em cinema na UCLA, tentou alguma experiência no cinema fazendo um pouco de tudo (alguns roteiros e produções soft pornô como The peeper and the belt girls e The playboy). O engajamento junto ao mítico produtor Roger Corman possibilitou o direito de dirigir o filme de horror Demência 13 (1963). Em seguida, deu continuidade ao seu aprendizado fazendo a comédia Agora você é um homem (1966), o musical O caminho do arco-íris (1968), último filme de Fred Astaire, e o drama Caminhos mal traçados (1969), este considerado seu primeiro filme pessoal, de autor. Mas foi o sucesso conseguido com o roteiro para Patton, dirigido por Franklin J. Schaffner, que lhe fez dar o pulo do gato: a saga de O poderoso chefão. Estabelecido como um dos grandes de Hollywood, Coppola constrói uma obra em que as superproduções estão sempre alternadas a produções menores e mais autorais. Francis Ford Coppola: O cronista da América, em cartaz no CCBB e no Cine Brasília até 20 de julho, vai nos permitir testemunhar o que alguns críticos chamam de trajetória esquizofrênica (uma esquizofrenia benigna, bem entendido) de Coppola: filmes que o próprio autor chamava de “negócio” – aqueles que fazia junto aos grandes estúdios e com grande orçamento, como Apocalipse now, Cotton Club etc – e filmes (nos termos de Coppola) “pessoais”, como O fundo do coração e Peggy Sue, seu passado a espera, entre tantos outros.
Pepi, Luci, Bom e outras garotas de montão
Tudo sobre minha mãe Fotos: Divulgação
Com o que o crítico Frédéric Strauss chamou de “o brilhante balé cômico de Mulheres à beira de um ataque de nervos” (1987), Almodóvar ganhou as graças do público. O mesmo se daria com Ata-me (1990). De salto alto (1991) e Kika (1993) marcariam o início de um processo de sofisticação hollywoodiana no trabalho de Almodóvar. “Sofisticação hollywoodiana” à sua maneira. Desde De salto alto e Tudo sobre minha mãe (1999) até seu penúltimo filme, A pele que habito (2011), ele segue na mesma direção. O modelo sempre beirando o melodrama kitsch, numa referência nunca declarada ao americano Douglas Sirk. Em ambos, o melodrama, em essência conservador, é subvertido, ganhando caráter libertário. Almodóvar, subversivo do gênero e dos gêneros, se é que vocês me entendem. Além das circunstâncias históricas que possibilitaram o surgimento de Almodóvar e (antes dele) de Coppola, há ainda outro aspecto que aproxima os dois realizadores, tão dessemelhantes, muito embora igualmente relevantes no contexto do cinema mundial. Coppola surge num momento em que não é mais possível ignorar as conquistas da contracultura no contexto da sociedade norte-americana. No final dos anos 50, Hollywood havia se tornado uma galocha anacrônica. Pela primeira vez, os jovens realizadores norteamericanos chegaram com a informação do cinema europeu – antes inteiramente ignorado pela velha guarda – e com espírito experimental. Coppola vinha de uma família italiana ligada à arte. Carmine Coppola, o pai, era o primeiro flautista da NBC Symphony
A pele que habito El deseo – O apaixonante cinema de Pedro Almodóvar De 30/6 a 5/7 na Caixa Cultural. Ingressos: R$ 4 e R$ 2. Mais informações: 3206.9448.
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diáriodeviagem
Calor humano para
compensar o frio
Texto e fotos Cláudio Ferreira
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ma viagem ao Alasca parece tão distante para um brasileiro quanto ir para Marte. Mas é menos complicado do que parece. O maior Estado norte-americano (duas vezes maior do que o segundo, o Texas) vale uma visita tanto no verão quanto no inverno – temperaturas médias chegam a 18º C no primeiro e a - 6º C no segundo. Há atrações turísticas para ambas as estações, uma paisagem indescritível e a sensação de que, apesar de não ter ido mesmo a Marte, o lugar é um dos mais inusitados em que já se esteve. No inverno, é melhor chegar de avião. Há voos diretos de várias cidades dos EUA para Anchorage, a maior cidade do Alasca (291 mil habitantes). As viagens são longas: de Seattle, por exemplo, três horas e meia; de Denver, mais de seis horas. A aterrissagem no aeroporto é incrível: primeiro, um pedaço de mar entre o Canadá e o sul do Alasca, que, no inverno, fica parcial-
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mente congelado; depois, montanhas parcialmente cobertas de neve que, a gente percebe mais tarde, cercam a cidade (a cordilheira se chama Chugach). O aeroporto é pequeno para os padrões norte-americanos. No inverno, é difícil obter as informações mais básicas, como o melhor transporte para o hotel. Há poucos táxis a postos e, como o terminal é próximo do centro da cidade, a corrida fica em cerca de US$ 20. Há também ônibus – a opção depende do tamanho de sua mala – e os shuttles (vans que fazem o traslado para o hotel), mas, para usá-los, é bom procurar antes na internet e fazer a reserva. No verão, imagina- se que o aeroporto tenha mais agilidade e os balcões de informações estejam funcionando a todo vapor. Na estação mais quente, uma opção bem interessante é fazer um cruzeiro até o Alasca. Nesse caso, a capital do Estado, Juneau (32 mil habitantes), é tida como a porta de entrada dos grandes navios de passageiros, mas Anchorage também tem
um porto grande. Muitos desses cruzeiros saem de Seattle, no noroeste dos EUA (a cerca de 2.300 km de distância do Alasca), e têm como atrativos, além dos barcos em si, a possibilidade de ver zonas costeiras bem recortadas e se encantar com os glaciares, paredões parentes dos fiordes da Escandinávia. Outro item do cardápio é a migração de várias espécies de animais originários da região polar – com sorte, o turista pode avistar mamíferos e aves nesse vaivém em busca de temperaturas melhores. É no verão que os visitantes chegam para o chamado “turismo de aventura”. Boa parte do território do Alasca está protegida por parques nacionais, onde há trilhas, esportes radicais, ciclismo e lições de proteção à fauna e à flora. No Denali National Park, por exemplo, uma das atrações mais procuradas é o Monte McKinley, o pico mais alto dos Estados Unidos, com 6.168 metros de altitude. É possível chegar aos parques de carro, ônibus, trens e até em pequenos aviões.
Anchorage Acostumado às cidades gigantescas do Brasil, o turista destas bandas fica impressionado com o tamanho reduzido da maior cidade do Alasca. Em termos de população, basta imaginar Samambaia com neve. Mas Anchorage é espalhada, porque o que não falta no Alasca é espaço. O centro da cidade é onde fica a maioria dos hotéis. Parece uma cidade de brinquedo, um quadradinho de ruas onde as horizontais, a partir do porto, são a 1ª, 2ª ou 3ª e assim por diante. As verticais têm nomes de presidentes e outros famosos. A 4ª e a 5ª são as ruas mais movimentadas. A primeira tem a maioria das lojinhas de artesanato que encantam os turistas. Repare que quase todos os souvenires aproveitam o nosso imaginário sobre o Alasca. As figuras são sempre de alces, ursos, corujas e salmões. A outra rua, a 5ª, tem a maior parte dos restaurantes e um dos shoppings da cidade. Notícia ruim: preços, em geral, são em média mais caros do que no resto dos Estados Unidos. A explicação possível é a distância que alguns produtos têm que percorrer para chegar lá. Notícia boa: não é cobrado o imposto sobre mercadorias e serviços que reina em outras partes do país. Por isso, é possível comer bem sem estourar o orçamento. De pizza a comida mexicana, tem de tudo por lá. Mas quem quiser aproveitar os pratos típicos da terra não pode deixar de comer salmão. Um salmão mais fresco do que a gente tem aqui, com um vermelho mais vivo e um gosto mais apurado, preparado de todas as formas possíveis. Outra iguaria local é o king crab, o caranguejo gigante que também compõe diversos pratos. Para beber, recomenda-se explorar os produtos feitos nas chamadas microcervejarias. Quase todas as cervejas locais têm teor alcoólico maior do que as brasileiras. Apesar de pequena, Anchorage tem uma vida cultural diversificada. Um dos grandes responsáveis por isso é o Alaska Center for the Performing Arts, complexo cultural que fica bem no coração da cidade, em frente ao centro de convenções. São várias salas de espetáculo com programação que vai dos grandes musicais dos Estados Unidos – montagens que chegam de outras partes do país – a espetáculos de música erudita, teatro e dança. Mesmo no inverno é possível encontrar boas atrações, mas o cronograma é mais recheado no verão.
Nativos Um dos mitos que caem por terra numa visita rápida ao Alasca diz respeito aos esquimós. Originários das regiões mais extremas do Estado, já próximas ao Pólo Norte, muitos deles vivem nas cidades grandes e não é difícil reconhecê-los, por causa do tipo físico, que lembra nossos vizinhos da Bolívia e do Peru. O olho brasileiro só os confunde, às vezes, com alguns asiáticos, porque há muitos habitantes de países do continente vizinho vivendo em Anchorage. O mito que cai diz respeito à própria palavra “esquimó”, uma generalização que mostra o tamanho do nosso desconhecimento. Na verdade, são vários grupos de nativos, com nomes complicados, dezenas de línguas e dialetos e uma cultu-
ra riquíssima. Para saber mais, vale a pena ir ao Anchorage Museum, também no centro da cidade, que tem uma ala dedicada aos nativos. A exposição é didática, separa o material de cada grupo, localiza-os em um mapa e há um vídeo rápido sobre cada uma das culturas. Os artefatos expostos vão de um casaco feito com intestino de vários animais até outro produzido a partir das peles de 90 esquilos. Parece horroroso? A diferença é que os nativos matam animais para sobreviver e não por esporte. O museu também tem outras coleções, que detalham parte da história do Alasca, comprado pelos norte-americanos aos russos em 1867 e que só em 1959 se tornou o 49º Estado norte-americano (o 50º é o Havaí). Uma das alas,
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diáriodeviagem sociais e meios de sobrevivência. Além da cultura dos nativos, os animais típicos da região gelada também merecem atenção especial. Afinal, não é todo dia que se vê, a metros de distância, um urso polar. Dois exemplares estão num viveiro imenso do Zoológico do Alasca, junto com uma vizinhança igualmente exótica para nós, brasileiros. O zoo é de difícil acesso para quem não tiver carro: uma alternativa é pegar uma das várias linhas de ônibus que vão de downtown até o terminal que fica ao lado do Dimond Mall (o outro shopping de Anchorage, distante do centro) e, de lá, tomar um táxi que vai custar, em média, US$ 12. Novamente o esforço vale a pena. É possível apreciar ursos marrons e pretos, alces (e algumas espécies similares), linces, um leopardo das neves, alguns lobos, porcos-espinho, alguns tipos de corujas mais adaptadas ao frio, águias, cabritos monteses, marmotas (que estavam hibernando em fevereiro, escondidas na toca) e corvos enormes. Atração à parte são os animais marinhos: em dois viveiros grandes, que misturam partes de água e terra firme, focas e lontras fazem gracinhas para os turistas, que podem vê-las tanto na superfície quanto debaixo d´água. Ao ir embora, a sensação é de que se deixou um lugar especial. Como nas cidades pequenas, os habitantes são cordiais e cumprimentam mesmo os desconhecidos ao se cruzarem nas calçadas. Nos bares e restaurantes, os garçons se apresentam e dizem que, naquela noite, irão “tomar conta da gente”. Um calor que contrasta com a temperatura ambiente e que só aumenta o conforto do visitante que quiser escapar, pelo menos uma vez, dos destinos turísticos mais padronizados.
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por exemplo, reproduz, em tamanho natural, as casas dos habitantes das partes mais remotas do Alasca desde o Século XIX, mostrando de roupas a utensílios domésticos, além dos animais que viviam na região. Se a sede de conhecimento das culturas nativas ainda persistir, a próxima parada é o Alaska Native Heritage Center (Centro de Patrimônio Cultural Nativo). Este fica bem mais distante: a dica é pegar o ônibus 75 (a passagem custa US$ 2 e é paga dentro do ônibus, perto do motoris-
ta) e ter disposição para andar cerca de um quilômetro a partir da parada. O esforço vale a pena. O prédio, que parece uma grande casa, tem auditório e cinema, onde sempre há programação cultural e venda de produtos artesanais. No quintal imenso, a reprodução, também em tamanho natural, das casas dos diversos grupos nativos, com uma guia igualmente originária dos primeiros povos da região. Há moradias coletivas e individuais, subterrâneas e na superfície, com explicações sobre hábitos, relações
Exposição
Bracher:
catártico, figurativo, expressionista, intenso, dramático e, acima de tudo, imperdível. De 10 de junho a 27 de julho no CCBB Brasília. De quarta a segunda, das 9h às 21h.
Entrada franca. bb.com.br/cultura SAC 0800 729 072 Ouvidoria BB 0800 729 5678 Deficiente Auditivo ou de Fala 0800 729 0088
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