Roteiro 260

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BRASÍLIA É CENÁRIO DE DOIS FILMES QUE ESTREIAM EM AGOSTO

Ano XVI • nº 260 Fevereiro de 2017

R$ 5,90

O tradicional Sirloin Steak, do Outback

Novo polo

gastronômico

Três dezenas de opções no mix de sabores do repaginado Venâncio Shopping


_ Eu sou dinâmica. Cada hora em um lugar.

_ Eu sou o seu banco no celular.

APP


EMPOUCASPALAVRAS Divulgação

Quem assistiu ao excelente documentário Cícero Dias, o compadre de Picasso, de Vladimir Carvalho, premiado em setembro do ano passado durante o 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, saiu do cinema com uma vontade danada de conhecer mais da obra do pintor pernambucano que bebeu da fonte do modernismo, mas deu um toque de surrealismo e poesia à sua arte. Pois essa vontade pode ser satisfeita agora com uma visita à exposição Cícero Dias – Um percurso poético, que ocupa as galerias do CCBB até 3 de abril. Lá estão 125 trabalhos do artista que nasceu num engenho e, aos 30 anos, fugiu da ditadura Vargas e se mudou para a Europa, onde viveu até sua morte, em Paris. Não tem como não mergulhar nesse rico universo sem se encantar (página 28). É para se encantar, também, com o surgimento de novos projetos gastronômicos em tempos de pequena-luz-no-fim-dotúnel na economia brasileira. Um deles é a padaria colaborativa Castália, da 102 Norte, tocada por um grupo de jovens amigos que partiram de um modelo empresarial ímpar e vêm conquistando a simpatia dos clientes pela qualidade dos pães artesanais e do atendimento (página 8). Outra iniciativa de destaque, essa de peso, está localizada no repaginado Venâncio Shopping, um novo polo gastronômico da cidade, ainda incompleto, mas já contando com marcas consagradas como o Outback e o Merkadão Paulista (que, curiosamente, tem sua matriz em Goiânia, não em São Paulo). São três dezenas de operações, em três pisos do shopping, que atraem o enorme público primário do Setor Hoteleiro, do Setor de Rádio e TV e do Setor Comercial Sul (página 4). Para quem se amarra em Bossa Nova, a pedida da vez é assistir ao show Bossa Nova in Concert, que traz a Brasília a nata dos cantores e compositores do movimento que já dura seis décadas. Ou não é tudo de bom se deliciar, na mesma noite, com os talentos de Ivan Lins, Leila Pinheiro, Roberto Menescal, Roberta Sá, Wanda Sá, Paula Morelenbaum e Jaques Morelenbaum? ( página 26). Finalmente, quem prefere um bom filme na telona tem a ótima chance de conhecer – ou rever – a partir do dia 15 o universo do cineasta francês Jean Renoir, um dos grandes mestres da cinematografia mundial (página 32). Boa leitura e até março! Maria Teresa Fernandes Editora

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galeriadearte

Cena rural é uma das 125 obras do pernambucano Cícero Dias em exposição no CCBB até 3 de abril.

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águanaboca picadinho garfadas&goles pão&vinho happyhour dia&noite queespetáculo graves&agudos brasiliensedecoração luzcâmeraação crônicadaconceição

ROTEIRO BRASÍLIA é uma publicação da Editora Roteiro Ltda. | Endereço SHIN QI 14 – Conjunto 2 – Casa 7 – Lago Norte – Brasília-DF – CEP 71.530-020 Endereço eletrônico revistaroteirobrasilia@gmail.com | Tel: 3203.3025 | Diretor Executivo Adriano Lopes de Oliveira | Editora Maria Teresa Fernandes Diagramação Carlos Roberto Ferreira | Capa Carlos Roberto Ferreira, sobre foto de divulgação | Colaboradores Alessandra Braz, Akemi Nitahara, Alexandre Marino, Alexandre dos Santos Franco, Ana Vilela, Beth Almeida, Cláudio Ferreira, Conceição Freitas, Eduardo Oliveira, Elaina Daher, Heitor Menezes, Júlia Viegas, Laís di Giorno, Luana Brasil, Lúcia Leão, Luís Turiba, Luiz Recena, Mariza de Macedo-Soares, Pedro Brandt, Ronaldo Morado, Sérgio Moriconi, Silvestre Gorgulho, Súsan Faria, Teresa Mello, Vicente Sá, Victor Cruzeiro, Vilany Kehrle | Fotografia Fabrízio Morelo, Gadelha Neto, Rodrigo Ribeiro, Sérgio Amaral, Zé Nobre | Para anunciar 99988.5360 | Impressão Editora Gráfica Ipiranga Tiragem: 20.000 exemplares. 3

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ÁGUANABOCA

Novo polo gastronômico POR TERESA MELLO

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uem costumava passar em frente à fachada envelhecida do Venâncio 2000 agora tem bons motivos para frequentar a área de alimentação do shopping, hoje inteiramente repaginado. Em três pisos existem três dezenas de estabelecimentos que fazem do local um novo polo gastronômico da cidade, atraindo o público que trabalha ou circula pela vizinhança. Há pratos e

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quitutes tradicionais e especiais. É o caso do cardápio do Mr. Fit, um fast-food de comida saudável no qual o consumidor monta a refeição e escolhe a proteína, as folhas e o carboidrato; e do restaurante Happy House, que, apesar do nome, é coreano e está no Venâncio desde a década de 1990, tão antigo quanto o selfservice Salada Mista, ambos no subsolo. A reforma do shopping foi mesmo radical. De Venâncio 2000, como foi batizado em 1977 pelo pioneiro Antônio

Venâncio da Silva, passou a Venâncio Shopping, reaberto em 30 de março do ano passado pelos filhos Rafael e André. Foram dois anos de reforma, com projeto assinado por Dória Fiúza Arquitetos, de Curitiba, a um custo de R$ 200 milhões. “Mudamos a fachada, as instalações elétrica e hidráulica, repaginamos o mix de lojas”, explica Rafael Venâncio. Na entrada, à esquerda, a franquia Fran’s Café lembra um aquário, com suas paredes de vidro, enquanto à direita a ge-

As delícias do Civitá Cafés Especiais estão no piso superior do shopping e as iguarias japonesas do Pacífico Sushi na área reservada aos self-services, no subsolo


Fotos: André Zimmerer

lateria Lo Voglio remete à alegria do Carnaval no balcão multicolorido, no uniforme das funcionárias e nas cadeiras azulturquesa. As varandas laterais estão muito bem ocupadas pela rede internacional Outback e pela goiana Merkadão Paulista, casas amplas com capacidade para cerca de 300 pessoas, cada uma. Durante a semana, na hora do almoço, as mesas da Chocolateria Brasileira estão sempre ocupadas; às sextas-feiras, o Outback costuma ter fila de espera, e o Merkadão agita a happy hour com muito samba. As opções de lanches são bem variadas. Tem açaí puro do Pará, pão de queijo recheado de calabresa e ainda tapioca, crepe, sanduíche, taco. E 115 sabores de milkshake. No café Civitá, há bolo de banana sem glúten, muffin de limão-siciliano com mirtilo e torta de doce de leite, cacau e rum. A última novidade é a versão express do Restaurante do Rubinho, um dos mais tradicionais de Águas Claras, que abriu as portas na sexta-feira, dia 10. “Nossa ocupação está em 65%, com mais de 7.000 m2 de área locada, e estamos em negociação com várias empresas de médio e grande porte”, informa a gerente de marketing do shopping, Ana Lúcia Rodrigues. “O Venâncio é um shopping multiuso, em que se pode resolver tudo em um só lugar”, reforça o superintendente, João Marcos Mesquita. A maioria dos restaurantes fica no térreo. Três amigas almoçavam ali na última

sexta-feira de janeiro. “A área de alimentação ficou muito melhor”, aprovou a secretária Michelle Aquino, 38 anos, moradora de Águas Claras. “E o estacionamento também melhorou, antes era escuro, sujo”, comparou a administradora Alessandra Lisboa, 34 anos, também de Águas Claras. “O shopping antigo era mais voltado para negócios e tinha poucas opções de restaurantes”, avaliou a funcionária do Banco Central Aline Dourado, 26 anos, moradora de Taguatinga. As âncoras

“A localização do shopping é excelente, e nossa parceria com o Venâncio é para fazer um diferencial, oferecer comodi-

dade a pessoas na região”, diz a sócia-proprietária do Outback, Andrea Gomes, que comanda uma estrutura com 150 funcionários e capacidade para 300 pessoas, em funcionamento desde 16 de junho do ano passado. Segundo ela, os carros-chefes do cardápio são o Ribs on the Barbie e o Bloomin’ Onion, cebolas gigantes em formato de flor. Diferentemente da praça de alimentação, a casa fecha as portas às 23 horas, de segunda a quinta-feira; à meia-noite, na sexta e no sábado; e às 22h, no domingo. Inaugurado em 10 de outubro, o Merkadão Paulista – que, curiosamente, tem sua matriz em Goiânia, não em São Paulo – acolhe o freguês com samba e

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fartura. Há pratos do dia, a preços em torno de R$ 40. O PF vem com bife ancho a cavalo, o “risoto do sertão’’ leva charque e queijo coalho e a feijoada reina na sexta-feira. “Durante a semana, o movimento é muito bom”, afirma o gerente, Plínio Salgado, de 32 anos. Uma atração são os sanduíches gigantes: o Lendário, feito com 400 gramas de mortadela, e o Churrasco Paulista, com 300 gramas de carne. Foi o que almoçaram três funcionários da Rede Sarah. “Nós passamos a frequentar aqui agora. Há boas alternativas de alimentação no shopping”, disse Igor Barbosa, de 40 anos, ao lado de Danísio Souza, 37, e Vanderlande dos Santos, 57. Além do menu saboroso, os cuidados aparecem na decoração da casa, nas imagens sem áudio das telas de TV e no som ao redor. Nas paredes pintadas de preto existem prateleiras com objetos antigos, como rádios e máquinas de escrever, além de discos de vinil. No lavabo, pneus emolduram espelhos e pias. Toda sextafeira tem samba a partir das 18 horas. Comida saudável

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Danísio Souza, Igor Barbosa e Vanderlande dos Santos almoçam os sanduíches gigantes do Merkadão Paulista

cliente é incentivado a escolher o que colocar no prato executivo. Como opções estão listados carboidratos (arroz, batata doce, macarrão integral), proteínas (frango, alcatra, salmão etc), sementes (chia, quinoa, girassol e linhaça) e folhas (rúcula, alface etc), além de molhos e outros acompanhamentos. Há omeletes, caldos, wraps e nove tipos de suco detox, cada um com texto informativo. Os sucos são naturais: “Só trabalhamos com a fruta mesmo”, garante a funcionária Sandy, 20 anos. “Tudo é feito aqui, só o pão e o açaí vêm prontos”, emenda o gerente. No Açaí Bravo, o freguês escolhe a fruta pura e com açúcar demerara – no modelo paraense – ou com extrato de guaraná. Para acompanhar, há seis tipos de granola, como a de frutas amarelas e a superfibras. Crepes, tapiocas, sanduíches e chá verde gelado completam o quadro de lanches.

Com uma prateleira enfeitada por bules e chaleiras, o Pão de Queijo Original, desde agosto no shopping, oferece a delícia mineira simples ou recheada com mortadela, peito de peru, calabresa, doce de leite. “O movimento não está ruim, mas pode melhorar, quando as outras lojas no térreo abrirem”, comenta o gerente, Alessandro Pereira dos Santos, 33 anos. Eleuza Maria da Silva, de 52 anos, concorda: “Depois que houver um mix maior de lojas vai melhorar ainda mais”, prevê. Ela é dona da Chocolateria Brasileira, franquia aberta há um ano e que já tem público cativo. “Durante a semana, eu não tenho lugar na hora do almoço”, afirma. Trufas e barrinhas de chocolate estão entre os destaques da casa, ao lado de cafés nos sabores de baunilha, chocolate trufado, avelã e amêndoas. A extensa Bio Mundo, varejo de produtos naturais, acomoda pequena lanFernanda Furtado

Giuliano Lucas Lopes Frigo

Marcas conhecidas vão surgindo no piso principal: Subway, Panelinhas do Brasil, Sushi-Loko, Giraffas. Na Tomatzo, o arroz mediterrâneo (R$ 12,90) leva berinjela e abobrinha refogadas. A franquia Mr. Fit aterrissou na praça de alimentação em 24 de janeiro e o gerentegeral da rede no Distrito Federal, Eliseu Millan, comemora: “Durante a semana, o movimento está ótimo, superou a nossa expectativa”. Sem óleo ou manteiga nas refeições, a proposta do fast-food saudável começa com o cardápio inteligente, no qual o

André Zimmerer

ÁGUANABOCA

. Duas boas novidades no mix de alimentação do shopping: a comida saudável da Mr. Fit chegou no dia 24 de janeiro e os deliciosos sorvetes da Lo Voglio no último dia 7


muffins de limão siciliano com mirtilo são perfeitos para acompanhar o café. “Trabalhamos com grãos do Cerrado mineiro, da Serra do Caparaó (ES) e de Mogiana (SP)”, conta o dono. A casa segue o horário do shopping: de segunda a sextafeira, das 9 às 19 horas; e sábado, das 10 às 18 horas. Não abre aos domingos. Self-services

No subsolo existem dez lanchonetes e restaurantes self-service, a maioria transferida da antiga praça de alimentação. Com a reforma do prédio, houve uma reclassificação dos estabelecimentos, como explica Ana Lúcia Rodrigues: “No térreo, agora, estão os restaurantes de fast-food e a varanda gourmet; os de self-service foram para o subsolo e temos três cafés no primeiro andar”. Salada Mista, Sabor da Roça, Braseiro, Pacífico Sushi, Picanha Grill, Naturallez, Beth Lanches, Mil Milkshakes, Ta-

pioquinha, Happy House e um quiosque do McDonald’s ocupam o subsolo do shopping. O coreano Happy House funciona à la carte e com bufê a quilo, e um dos destaques é o Bibimbap, risoto feito em panela de barro, com óleo de gergelim torrado, ovo frito e carne de boi. Custa R$ 45. Há sopas, empanados, ensopados e pratos das culinárias brasileira e internacional no self service. Pra finalizar, que tal um milk-shake? Difícil escolher um entre as 115 variedades e combinações. Há os clássicos, os de frutas, os trufados e os de chocolate. Segundo a funcionária, os mais pedidos são o de Nutella com Ovomaltine e o trufado de Leite Ninho. Então, que você faça uma boa escolha! Venâncio Shopping

SCS, Quadra 8 (3208.2000) De 2ª a 6ª feira, das 9 às 19h; sábado, das 10 às 18h. Domingo só funcionam o Merkadão Paulista, das 12 às 20h, e o Outback, das 12h as 22h.

Os coloridos bufês da Happy House e do Braseiro são fartos, variados e saborosos Fotos: André Zimmerer

chonete na qual a coxinha assada, feita com massa de batata doce, é vendida a R$ 6,90. Em frente fica o conhecido Fran’s Café, com pratos quentes e lanches, onde a refeição e o suco saem por R$ 26,90. No lado oposto está a Lo Voglio, gelateria brasiliense com três lojas no aeroporto, uma no Boulevard Shopping e outra na 104 Sul. Aberta em 7 de fevereiro, a loja tem área externa com ombrelones e interior claro e colorido – desde o avental das funcionárias até as cadeiras na cor maximum blue green, ou azul-turquesa mesmo. “A diferença entre o gelato e o sorvete é que o gelato não leva gordura hidrogenada, é um alimento, não é uma sobremesa”, explica o brasiliense Niéliton Leite Gomes, um dos sócios ao lado do paulista Eduardo Nogueira e do italiano Maurizio Mandala. São 18 sabores sem corante nem conservante, o que permite que o gelato de pistache, por exemplo, apareça na tonalidade certa: um leve esverdeado. “Nosso pistache vem do Irã e é torrado e moído aqui na cidade”, informa. Banana com avelã, limão siciliano, coco, açaí e tapioca são alguns dos sabores. Uma torre ainda despeja chocolate Callebaut nas casquinhas artesanais. “Decidimos apostar no novo Venâncio, que é uma referência em Brasília”, resume Niéliton. “Este é um shopping central, bem posicionado”, completa Eduardo. A cada copinho entregue ao cliente, a funcionária bate uma campainha e diz: “Lo voglio” – eu quero, em italiano. No piso superior há apenas três cafés. O Civitá, aberto em outubro de 2015, rende homenagens à cidadania (civitas, em latim) e ao Plano Piloto de Lúcio Costa: “É uma grande oportunidade de valorizar o espaço central da cidade, que não é bem-visto pelo brasiliense, mas faz parte da história de Brasília”, analisa o biólogo brasiliense Fernando Bakker, 32 anos. Com formação de barista e cursos de degustação sensorial, ele fez adaptações no menu para atender ao público na hora do almoço, servido das 11h20 às 14h20. No cardápio há filé bovino ao molho de goiabada cascão picante e risoto de queijo brie, filé suíno ao molho barbecue, espaguete com peito de frango e risoto vegano. Para o lanche, as tortas atraem olhares no balcão: o cheesecake tem cobertura de frutas vermelhas e a Doce Cacau mistura doce de leite, cacau e rum. O bolo de banana não apresenta lactose e os

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Lúcia Leão

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Padaria colaborativa “T

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omai e comei dele todos. Este é o meu corpo”. O rito católico da missa, que no momento da consagração reproduz o episódio da Santa Ceia em que Cristo repartiu e distribuiu o pão, foi decisivo para torná-lo o alimento mais mítico do mundo ocidental. E já naquele tempo ele foi escolhido pelo significado que tinha para os povos da Mesopotâmia que, no marco zero do calendário Cristão, o consumiam há mais de 10 mil anos. Tão cercado de simbologias, nada mais apropriado do que o nome da mitológica fonte da inspiração poética para batizar uma oficina de produção de pão: Castália, a ninfa que Apolo transformou numa vertente d’água, a qual despertava o gênio da poesia em quem a bebesse. Cheia de charme e com um modelo empresarial ímpar, em menos de um mês de funcionamento a padaria Castália já é uma coqueluche de Brasília. Sem se afastar da simplicidade intrínseca ao fazer do pão artesanal – a mistura de farinha, água e paciência para a fermentação natural e lenta – ela apostou na qualida-

de dos ingredientes, no cuidado extremo com o processo de produção e na criatividade para chegar ao produto de excelência que surpreende, conquista e fideliza a cada dia mais consumidores. “Eu a conheci por acaso, logo que ela abriu. Agora só consumo o pão daqui e, sempre que possível, passo para um cafezinho no final da tarde”, conta a admi-

nistradora Maria Helena Moura. “Gostei do estilo!”, completa a amiga Meireane, acreana que, de passagem por Brasília, a acompanhou na parada para o lanche. Do estilo falamos na sequência. Vamos começar pelo modelo empresarial, que batizamos de “rede fraterna” e que surgiu mais ou menos assim: Eduardo Tavares era designer gráfico, produzia exDivulgação

POR LÚCIA LEÃO


Lúcia Leão

Divulgação

posições de arte e, num dado momento, aprendeu a fazer pão. E foi fazendo pão, e fazendo pão, e fazendo pão... até que um dia percebeu que era isso que queria da vida: fazer pão. Podia largar a vida profissional bem sucedida e embarcar num projeto alternativo, fazendo pão caseiro e vendendo para os amigos ou, no máximo, distribuindo numa restrita rede de produtos naturais. Ou podia pensar grande, profissionalizar-se e produzir o mesmo pão caseiro, mas em larga escala, comercial. Consultou o irmão e economista André Neiva Tavares – eles são filhos do embaixador do Brasil na Áustria, Ricardo Neiva Tavares – e recebeu o sinal verde para embarcar para a Califórnia e cursar a escola de panificação na San Francisco Baking Institute. Quando viajou, deixou a muda do fermento que preparara para os seus primeiros pães caseiros – e que usa até hoje na Castália – sob os cuidados da namorada e também designer Caroline de Oliveira. E assim começava, com Eduardo, André e Caroline, a rede fraterna da Castália. Daí veio o convite ao primo Pedro Abbott Tavares, que cursara a Ferrandi de Paris (uma das mais renomadas escolas de gastronomia francesa), andara por importantes restaurantes ao redor do mundo e, à época, estava no Canadá. Vieram então Pedro e a namorada Joana Guimarães, jornalista com carreira recém-iniciada em São Paulo. E a rede fra-

terna crescia. Como um pão repartido em nacos, o sonho de Eduardo já alimentava cinco almas. A arquiteta Manoella Otero, namorada de André, também quis participar da ceia e fez o projeto arquitetônico das áreas de produção e venda da Castália. Eram seis, todos dispostos a emprestar suas inteligências, força e capital ao projeto. Colocado o preto no branco, eles precisariam de R$ 280 mil, bem mais do que poderiam arrebanhar com suas economias. Surgiu, então, a ideia do crowfunding, um tipo de fundo de financiamento colaborativo, utilizado normalmente para projetos artísticos e culturais. Com mais de dez colaboradores, entre familiares e amigos, conseguiram levantar o capital e viabilizar o empreendimento. Na primeira semana de janeiro começaram a sair as primeiras fornadas preparadas no subsolo e vendidas na pequena loja de canto da 102 Norte. Em duas semanas, já era um endereço de referência em qualidade e sabor. Ainda no quesito “modelo ímpar”, um detalhe faz toda diferença nas mesas e no balcão, como sentiu a publicitária Cris Lagos. “Amei conhecer os pães da Castália. Brasília precisa de pães de qualidade. E a equipe que atende é muito simpática. Parece que eles escolhem os funcionários pela simpatia, disposição, entrega. Gostei muito!” Um esclarecimento à publicitária: eles

não escolhem, eles são! São os próprios integrantes da rede – especialmente André, Caroline e Joana e, eventualmente, os próprios padeiros Eduardo e Pedro – que atendem os clientes nas mesas e no balcão. Fora do grupo fraterno, apenas dois funcionários: Alan, segundo barista, e Dina, auxiliar de cozinha. Com a proposta de inovar sempre, hoje a Castália oferece 12 tipos de pães, com destaque para o pão da casa (R$ 12). É um pão rústico tipo sourdough (denominação inglesa para o pão feito com leveduras selvagens). A massa, de trigo francês, fermenta por 24 horas, tempo suficiente para os açúcares subirem para a crosta, deixando-a caramelizada, escura e grossa. Outras vedetes são os croissants (R$ 8), deliciosamente macios, e o multigrãos 100% integral (R$ 22), decorado com o desenho dos dois candangos. “Ficou muito interessante. Vou levar para uma amiga em São Paulo como uma lembrança de Brasília”, decidiu a paulistana Aurora Lopes de Miranda, apresentada à iguaria por André Tavares. E essa é a receita da jovem bem sucedida Castália: misture bons ingredientes com conhecimento e criatividade, tradição e ousadia. Tempere tudo com amor e sirva com alegria. Castália Padaria e Café

102 Norte, Bloco D (3081.8899) De 3ª a 6ª feira, das 7h30 às 19h30; sábado, das 7h30 às 17h30.

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Ítalo-nordestino T

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udo começou em um quiosque no Cruzeiro, onde o italiano Dilson Rossoni vendia pastel e caldo de cana. Pouco a pouco, a freguesia foi se ampliando e se fidelizando. Para comportar a demanda, o neto Dilson Fávaro Rossoni Júnior abriu há 17 anos a Rossoni Pastelaria & Carne de Sol. A casa erguida em ambiente rústico, que comporta cerca de 300 pessoas, está sempre cheia. E há quatro meses chegou à Asa Sul, fiel à tradição da matriz de provocar água na boca especialmente pelos pastéis e pela carne de sol com mandioca na chapa quente. “Pesquisamos e ficamos sabendo que 60% de nossos clientes no Cruzeiro eram de outras regiões, sobretudo da Asa Sul. Mesmo com a crise, sentimos que havia mercado, pois nossa marca é forte”, explica Dilson, 51 anos, capixaba de Colatina que já contava com a ajuda da irmã Susani no restaurante do Cruzeiro e ganhou o reforço do sobrinho Bruno – filho de Susani – na nova empreitada. Segundo Bruno, a opção por manter o nome no novo restaurante/bar se deu “pela tradição, pelo padrão de qualidade e o trabalho com excelente matéria-prima”. De raízes italianas, o jovem empresário de 26 anos lembra que a Rossoni mantém o

costume familiar de servir porções fartas, como a carne de sol com mandioca (frita ou cozida) – 400g para duas pessoas (R$ 45 ou R$ 52, com queijo) e 800g para quatro pessoas (R$ 78 ou R$ 92). A Rossoni serve 12 tipos de pastéis, desde o simples, de queijo (R$ 5), ao de hambúrguer, queijo, tomate, bacon e presunto (R$ 10,20). Deliciosos são o de goiaba com queijo e o de canela, queijo e açúcar (R$ 5,50). Outro destaque do cardápio são os camarões empanados com cream cheese (dez unidades por R$ 25). O restaurante serve os caldos vaca atolada, de abóbora e verde (R$ 13,50). As sobremesas que mais têm feito sucesso são as tortas de chocolate e de morango, churros, pudins, açaí e mousses, além da coxinha de brigadeiro, recheada com morango (R$ 7,50). Assim como a matriz, a Rossoni da Asa Sul aceita encomendas de kit festa, como, por exemplo, um quilo de torta, 100 salgados, 60 docinhos e dois refrigerantes por R$ 128. A policial militar Andrea Souza Rosa, carioca, 43 anos, ouvia falar da Rossoni pelas colegas de trabalho, que sempre às sextas-feira vão ao restaurante do Cruzeiro. Quando abriu a da Asa Sul, foi logo experimentar o pastel com caldo de cana de que tanto ouvia falar. Voltou mais quatro vezes e, na última,

junto com o filho Henrique, de 14 anos, experimentou a carne de sol com mandioca. “É tudo muito gostoso e o atendimento é vip”, elogia. Aos sábados, das 12 às 16h, tem feijoada com caipirinha ao som de chorinho ao vivo (R$ 39,90 para homens e R$ 31,90 para mulheres). Com capacidade para até 200 pessoas, a Rossoni da Asa Sul mantém no visual o estilo despojado e as cores da matriz: verde, vermelho e branco. Serve café da manhã, almoço e jantar, e pode ser uma boa opção também para a happy hour. Rossoni Pastelaria & Carne de Sol

307 Sul, Bloco B (3541.5569). De 3ª a domingo, das 9 à 1h. Quadra 1, Bloco A, Cruzeiro Velho (3234.1119). De 2ª a sábado, das 9 à 1h. Fotos: Divulgação

POR SÚSAN FARIA


Fotos: Divulgação

Deliciosas obras de arte POR VILANY KEHRLE

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elicados, coloridos e, acima de tudo, deliciosos. Confeccionados de forma artesanal, nos sabores mais variados, os doces e bolos produzidos por Renata Diniz são verdadeiras obras de arte, um colírio para os olhos, um deleite para o paladar. Especializada em doces finos, chocolateria e bolos artísticos, a chef pâtissier abriu, no final de janeiro, as portas da confeitaria que leva seu nome. A Renata Diniz Chocolatier fica na sobreloja do Bloco C da 410 Sul e possui três ambientes: recepção, cozinha e vitrine. A casa oferece mais de 30 tipos de doces finos, além de diversas opções de tortas, mini tortas, sobremesas e bolos especiais, mas só funciona sob encomenda. Quem quiser se deliciar com alguma das maravilhas do cardápio tem que se dirigir à Padaria da Corte, no térreo do mesmo edifício onde funciona a confeitaria. Formada em Direito, aos 30 anos Renata abandonou a advocacia para montar seu próprio negócio, pois sua grande paixão sempre foi cozinhar. Depois de frequentar escolas gastronômicas de São

Paulo, ela montou um bufê que há três anos oferece sobremesas para restaurantes, bistrôs e para as mais variadas celebrações – casamentos, formaturas, aniversários. Atualmente, ela é a responsável pelas sobremesas servidas nos almoços e jantares oferecidos pelo Palácio do Itamaraty. “Desde os tempos de estudante, quando morava em república, eu era a cozinheira do grupo”, revela, acrescentando que hoje está muito feliz por ter tomado a decisão certa, seguido outro caminho. A chef pâtissier diz que a criatividade nos cardápios e a qualidade fazem parte da rotina da casa, onde o cliente participa da escolha dos ingredientes e até mesmo do design dos produtos encomendados. Todos os menus são adaptados aos desejos e necessidades de cada um e concebidos para as mais diversas ocasiões: cafés da manhã, coffee-breaks, brunchs, almoços, jantares, coquetéis e eventos temáticos. O bombom de morango com champanhe, o levíssimo verrine de damasco com coco, a rosinha de coco, os brigadeiros de café, de crème brûlée e o amargo de chocolate belga são algumas das guloseimas produzidas por Renata. “Minha intenção é trazer de volta a antiga confei-

taria. Eu tenho o controle de toda a produção, desde a seleção dos produtos até a finalização dos doces, como também o controle de qualidade”, afirma. Além dos docinhos finos e bolos, é possível saborear, nos balcões da padaria Pães da Corte, muitos outros doces saídos das mãos da chef, que se diz uma grande apaixonada pelo chocolate amargo. Entre eles, os bolos de pote (R$ 5), tarteletes (R$ 5) e cupcakes (R$ 2,50 e R$ 4) nos sabores abacaxi, limão, morango, chocolate belga, baunilha, prestígio e baba de moça (feito com gema de ovos, leite de coco e calda de açúcar). Renata estudou no Instituto de Gastronomia da América, em Campinas. Ficou em primeiro lugar no concurso realizado pelo instituto, em 2012, o Interiga São Paulo, e em terceiro no Interiga Nacional. Fez cursos com chefs renomados como Ana Toscano, Diego Lozano, Edu Guedes, Marcos Livi e Simon Lau. E participou do reality show Que seja doce, comandado por Felipe Bronze, no Canal GNT. Renata Diniz Chocolatier

410 Sul, Bloco C, Sobreloja 5. Encomendas pelo site www.rdchocolatier.com.br ou e-mail rdchocolatier@gmail.com.

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ÁGUANABOCA

Um festival

100% brasiliense

Até 26 de fevereiro, 25 restaurantes participam do Panelas da Casa

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ntrada, prato principal e sobremesa criados por chefs brasilienses com produtos locais, ao preço de R$ 43,90. Para harmonizar com o cardápio exclusivo, uma cerveja artesanal goiana. Ampliado em relação à última edição, o festival gastronômico Panelas da Casa acontece em 25 endereços das marcas Belini Pães & Gastronomia, Belini Café, Bhumi Cozinha Orgânica e Saudável, Café Savana, Cantucci Bistrô, Carpe Diem, Dona Lenha, El Paso, Empório Árabe, Genghis Khan, Jambu, Jamón Jamón, Piccolo Emporium, Nossa Cozinha Bistrô e Veloce. Cada casa elaborou entrada, prato principal e sobremesa, só que esta última será servida em outro restaurante participante, numa troca divertida entre os chefs. “A ideia é compartilhar o conhecimento, aguçar a criatividade e ampliar o intercâmbio dos membros da confraria Panelas da Casa. Foi um desafio que todos toparam e se tornou divertido. A troca de sobremesas também vai ampliar a parceria entre os membros e permitir que o público conheça, na mesma experiência, sabores de mais de uma casa”, explica o empresário Andrei Prates, um dos criadores do festival, junto com Mateus Takano e o chef Alexandre Albanese.

De acordo com Albanese, o festival não quer apenas movimentar a saúde financeira das casas participantes, mas fortalecer a economia local. “Priorizando a compra de insumos de fornecedores do Centro-Oeste, buscamos promover um crescimento econômico em cadeia, desde o produtor até o restaurante”, afirma. Justamente por isso a cerveja goiana Colombina foi escolhida novamente como patrocinadora oficial por ser a cervejaria artesanal pioneira a valorizar ingredientes do Centro-Oeste, como pequi e cagaita. Cada prato foi cuidadosamente harmonizado com um dos rótulos da marca, que será sugerido no menu por R$ 18,90, mesmo preço das edições de 2016. A expectativa de crescimento é em torno de 10%, em relação à última edição realizada em 2016. “Ano passado, superamos a meta, foram mais de dois mil pratos vendidos, nas 12 marcas participantes”, informa o empresário Mateus Takano. Confira, a seguir alguns dos cardápios que estarão nas casas participantes: El Paso (110 Norte, 404 Sul e Terraço Shopping, almoço e jantar). Entrada: ceviche clássico peruano incrementado com maracujá do cerrado e flores comestíveis. Prato principal: filé mignon flambado com cebolas roxas e romates, cre-

me e cogumelos. Sobremesa criada pelo Piccolo Emporium: raviolli com brownie de doce de leite servido quente com sorvete de creme. Harmonização: Colombina Pepper Lager/Colombina IPA. Jamón Jamón (109 Norte, apenas jantar). Entrada: escalibada com queijo de cabra gratinado, pimentão e berinjela assados temperados com azeite, alho e salsinha e queijo de cabra gratinado. Prato principal: prato típico catalão com macarrãozinhos tostados em azeite cozidos em caldo de peixe e frutos do mar, e finalizados com camarões salteados. Sobremesa criada por Belini Café: afogatto, sorvete de creme banhado em café especial torrado e finalizado com Palmie. Harmonização: Colombina Weiss. Cantucci (403 Norte, apenas jantar). Entrada: arancini de pernil suíno com páprica recheado com muçarela de búfala. Prato principal: filé em crosta de manteiga e ervas com linguine aos três cogumelos. Sobremesa criada por Bhumi: cheesecake vegano, massa crocante de castanhas e frutas secas, coberto com geleia fresca de frutas vermelhas. Harmonização: Colombina Pepper Lager. Festival Gastronômico Panelas da Casa

Até 26/2 em 25 endereços. Cardápios disponíveis em www.facebook.com/panelasdacasa/ Fotos: Divulgação

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Piccolo Emporium

Dona Lenha


Fotos: Alexandre Fonseca - Colabora Comunicação

Em boas mãos POR SÚSAN FARIA

“M

ãos do chef” ou “aos cuidados do chef”. É o que significa “Omakase”, que, abreviado para Oma, deu nome ao mais novo restaurante japonês de Brasília, instalado na 411 Sul, onde funcionava tempos atrás o Corrientes 348, transferido para o Setor de Clubes Sul. Antes de pedir um ou mais pratos no Oma, o cliente é indagado sobre suas preferências culinárias, se gosta mais de cítrico, amargo ou salgado, por exemplo. A partir daí, o desafio está posto na busca do melhor atendimento. “No Japão, o contato do chef com o cliente é próximo”, explica o sushi-chef Marcos Akaki, paulistano, 41 anos, neto de japoneses. Com a experiência de conviver com 17 sushi-chefs da família, entre primos e cunhados, trabalhar em famosos restaurantes de São Paulo e viver dez anos no Japão, onde também se aprimorou na culinária, tudo o que Akaki quer é ver o cliente satisfeito e voltando outras vezes à casa. No Oma, o serviço é à la carte, mas os pratos são compartilháveis. Entre as estrelas do cardápio figuram o risoto oriental de frutos do mar, feito com arroz ao

dente (R$ 42), e o atum foie gras temperado com teriyake, gengibre, cebolinha e flor de sal, finalizado com flocos de caramelo (R$ 39). Quem gosta de sushi pode pedir o misto especial, com salmão, atum, peixe da estação, camarão e kani (R$ 56). A Yakisoma Oma, com macarrão Sobá, tentáculos de lula, mexilhão, camarão, cubos de salmão e mix de legumes, custa R$ 43. O almoço executivo tem pratos quentes e frios, a preços que variam entre R$ 69,90 e R$ 98. Não faltam, é claro, os temakis, hossomakis, uramakis, teppan e tori tataki. Entre as sobremesas, destaque para o Choco Oma, preparado com mousse de chocolate em base de ganache de chocolate meio amargo crocante e sorvete sem lactose (R$ 21,90), e o Oma Gota, que leva gelatina de hagar, bolo gota, frutas do bosque e sorvete de lichia (R$19). “Os clientes demonstram estar muito satisfeitos com a qualidade e o atendimento do Oma”, diz Akaki, que se mudou de vez de São Paulo para Brasília, cidade pela qual está tomando gosto. Da capital paulista ele trouxe bons cozinheiros, como o chef de cozinha Sávio Lopes, 33 anos. “Os desafios são grandes. É um restaurante novo, com pegada e conceitos

diferentes. Nosso propósito é servir o melhor”, afirma Sávio. Na entrada, o restaurante exibe a imagem da bandeira do Japão, um vidro redondo com luz vermelha. Na parte superior há o espaço de tatame, com mesas e bancos baixos, de onde se vê a decoração de árvores vermelhas que “prenunciam o inverno”, como no Japão onde o frio deixa as folhas das árvores vermelhas e onde se comemora todas as estações do ano. O Oma nasceu a partir de uma viagem do empresário Thiago Boita Laude a São Paulo. Depois de degustar sushis, sashimis e afins, além doses de sakê, em um excelente restaurante, Thiago pediu a conta e perguntou ao sushiman: “O que é omakase?”. Gostou da resposta e “naquele momento uma luz brilhou”, diz. Saiu do restaurante com a certeza de que havia encontrado o nome e o sentido do desafio que procurava, pois “na verdade, sempre que um cliente vai à mesa de um dos nossos restaurantes, ele está se colocando em nossas mãos e aos nossos cuidados”. Oma Japanese Experience

411 Sul, Bloco D (3245.8235). De 3ª a 6ª, das 12 às 15h e das 19 às 23h; sábado, das 12 às 16h; domingo, das 12 às 16h e das 19 às 23h.

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Executivo do Gero Até mesmo restaurantes de alta gastronomia, como o Gero (Iguatemi Shopping, primeiro piso, tel. 3577. 5520), têm procurado se adaptar aos novos tempos de vacas magras.

Divulgação Rafael Lobo-Zoltar Design

Vocês querem bacalhau? Até o final do mês, segue no Dom Francisco da ASBAC (SCES, Trecho 2, tel. 3226.2005) o tradicional festival do bacalhau, ao preço de R$ 99 (para duas pessoas). O cliente pode escolher entre cinco versões, servidas apenas no jantar: à Gomes de Sá (ao forno com cebolas douradas em azeite, batatas em cubos fritas em óleo e ovos cozidos); Desfiado Tradicional (ao forno com batatas, cebolas, pimentões verdes, azeitonas pretas e azeite); à Brás (na panela ou frigideira em fundo de azeite e alho, com ovos cozidos picados, batata palha, salsa, cebolinha e azeitonas pretas); Aromático (na panela com azeite, folhas de louro, orégano, alho poró, tomates sem sementes picados, salsa e cebolinha); e o clássico Bacalhau de Natas (ao forno com azeite, batatas, cebolas e natas).

Você é o chef

O chef Ronny Petterson acaba de lançar um menu executivo, com couvert, entrada, prato principal e sobremesa, para os almoços de segunda a sexta-feira, ao preço de R$ 104 – o que não é muito, para os padrões do Gero. Os pratos variam diariamente e também podem ser escolhidos entre as muitas opções do cardápio, como o salmão com molho de maracujá e tagliolini verde na manteiga da foto abaixo, o nhoque três cores com fonduta de parmesão e shitake, e o risoto zaferano com aspargos e ragu de linguiça toscana.

World Wine BSB Brasília acaba de ganhar uma nova loja de vinhos e espumantes. A primeira unidade da World Wine fora de São Paulo funciona desde janeiro na 410 Sul (Bloco C, tel. 3526.6168) com uma adega de mais de 1.000 rótulos das mais variadas procedências. No piso inferior há uma pequena cozinha e mesas para reuniões corporativas, degustações, encontros de confrarias e outros pequenos eventos. “Aqui você pode pedir um prato, um tira-gosto, ou mesmo cozinhar e tomar um bom vinho com os amigos”, explica o somellier Jaime Sousa.

Que tal bancar o chef por uma noite? Quem oferece essa oportunidade, todas as quartasfeiras, é o Santé 13 (412 Sul, Bloco A, tel. 3037.2132). O cliente pode criar seu próprio cardápio, utilizando todos os ingredientes disponíveis no restaurante. É uma espécie de desafio para o chef Divino Barbosa, a quem cabe preparar os pratos segundo as orientações de cada cliente. Mas são apenas 15 pedidos por noite, daí a necessidade de fazer uma reserva. Os preços se baseiam em pratos semelhantes do cardápio, como esse bobó de lagosta servido na panela de ferro (R$ 89). “Uma das nossas características é a flexibilidade de alteração nos pratos, que às vezes nos deixa loucos, em dias de grande movimento, mas que fazemos com muito carinho, para que todos comam o que realmente querem. Então, decidimos dedicar uma noite exclusiva para isso”, afirma o restaurateur Oswaldo Scafuto. A promoção não tem data para acabar: vai depender da demanda.

Rener Oliveira

Divulgação

PICADINHO

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Porco na cataplana

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O restaurater Manuelzinho Pires inspirou-se em sua terra natal para criar a principal novidade deste início de ano no cardápio do seu Tejo Restaurante (404 Sul, Bloco B, tel. 3267.7005). Trata-se da carne de porco à alentejana (R$ 77), temperada com pimentão, azeite, alho e sal grosso e preparado na cataplana, recipiente metálico da região do Algarve (foto), com a própria banha do porco, um pouco de azeite, louro e coentro, e acompanhada de amêijoas (vôngoles). É possível optar também pelo menu completo, com caldo verde de entrada e, de sobremesa, a tradicional sericaia, que nada mais é do que versão portuguesa da crema catalana e do creme brulée. Para escoltar o banquete, bons vinhos portugueses, indicados pelo sommelier Eugênio Cue.

Menu personalíssimo Já no Empório Árabe (Avenida Castanheiras, Ed. Vila Mall, Águas Claras, tel. 3436.0063, e 215 Sul, Bloco A, tel. 3363.3101) o cliente pode montar seu menu executivo escolhendo, entre algumas sugestões do cardápio, a entrada, o prato principal e a sobremesa, ao preço de R$ 45,90 – mas somente nos almoços de segunda a sexta-feira. A entrada, por exemplo, pode ser tabule, mix de pastas ou salada de damasco; o principal, paleta de cordeiro ao molho de especiarias (foto), frango ao molho de amêndoas, espetinho de kafta acompanhado de arroz com lentilhas e tabule, picadinho de filé ou, para os veganos,


abobrinha recheada com grão-de-bico; e, de sobremesa, folhado de nozes, mousse de damasco ou bolinho de chocolate com sorvete de creme.

Rodízio de guarnições

Rener Oliveira

Outro restaurante da chef Lídia Nasser, o Dolce Far Niente (215 Sul, Bloco A, tel. 3345.4267, e Avenida das Castanheiras, Edifício Vila Mall, Águas Claras, tel. 3254.2263), optou por introduzir em seu almoço executivo o rodízio de guarnições. O cliente escolhe a proteína – filé à parmegiana (R$ 48,90), frango ao pesto (R$ 37,90), medalhão de filé ao molho mostarda (R$ 50,90) ou salmão ao molho de maracujá (R$ 61,90) – e os acompanhamentos são servidos à vontade (batata rústica, fettuccine ao alho e óleo, tomate italiano recheado e gratinado, risoto de parmesão, legumes salteados e chips de batata doce).

Preparar bebidinhas exóticas, servidas em recipientes inusitados, é uma especialidade do Tabuada Tábuas & Drinks (101 Sudoeste, Bloco B, tel. 3526.8592). Suas mais recentes criações, inspiradas no clima de verão, atendem pelos nomes de Luvallim, Sai do Armário, Sangria e Summer Time. O Luvallim leva vodka, geleia de pimentão vermelho e limão e custa R$ 26. A Sangria (foto) é feita com vinho branco, rum, água com gás, frutas diversas e soda (R$ 60 o litro). O doce seco de seriguela está presente no Summer Time, misturado a vodka, suco de maçã e espuma de limão (R$ 26). Já o Sai do Armário, que custa R$ 100, vem com 12 shots preparados com tequila, laranja, curaçau blue, grenadine e limão.

Leonardo Arruda

Drinques divertidos

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GARFADAS&GOLES

Números, cozidos, ritmos, vida Seis mais cinco onze. Cenoura, maxixe e mandioca são mais duros e dão trabalho para chegarem ao ponto. Cinco mais seis onze. Batata e abóbora são mais tenras e demoram menos na panela. Sete mais quatro onze. As carnes e os embutidos requerem escolhas antecipadas, bem como um cozimento prévio de pelo menos um dia. É para que desmanchem. Ou quase. Há mais algarismos que, somados, chegam a onze. São iguais às folhas, que podem variar na presença, ou não, no prato. Assim são os amigos, se comparados a um bom cozido português: têm tipos, origens, histórias próprias, cada um deles. Sem falar nas idades ou no tempo de cozimento, digo, de conhecimento com o colunista, que aportou a gloriosos 65 portos nem sempre de calmarias, mas a boas baías, depois de mares bastante procelosos. O número 65 é considerado por muitos um número redondo, um pouco pela plasticidade dos dois algarismos lado a lado, e muito pelo número que resulta da soma deles: onze, esse sim uma entidade maior no universo numerológico e nas interpretações e projeções da vida. As metáforas não param. Ainda bem. Há os amigos e amigas doces, tipo abóboras novas, jerimunzinhos macios de pele fina: cozinham rápido, se dissolvem e deixam sabores eternos... Também os cascas grossas, desses que a existência moldou e forjou em bigornas de ferreiros medievais. Homens e mulheres com belas armaduras. Talhadas com fineza, mas duras pelo ferro forjado, nem sempre penetráveis por qualquer aço. Para nossa felicidade, as cascas dos legumes e as peles das carnes não ofereceram resistência maior e obedeceram às mordidas, estalos de línguas, eventuais sucções nos meandros dos ossinhos. E o pirão rolou solto,

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LUIZ RECENA

lrecena@hotmail.com

amálgama de quantos ingredientes passaram pelas panelas e quantas bocas, ávidas, os buscaram depois com apetite e luxúria. O líquido amarelo, espumante e gelado, muito gelado, esvaziou o barril em ritmo alegórico de carnaval e terminou em apoteose ao final da passarela. Uns e outros, cozido, pirão, chope, espumantes, pessoas, pessoas e pessoas todos juntos celebrando. Um parabéns, dois, onze! Para dar sorte e afastar os maus olhados. Vazinhos com sal grosso. Textos de poesias escolhidas com carinho e sentimento d’alma voaram pelas mesas. Varais com fotos antigas linkaram os tempos passados e presentes, projetando futuros. Para novos cozidos, dobradinhas, rabadas. Sucos de frutas, laranja e maracujá. Ou talvez um cuscuz. Sem novas metáforas, plágios ou jogos de palavras: foi bonita a festa pá! Cá estou contente. Madame M. pensou em tudo, do atacado ao detalhe. Grato. Alda cozinhou três dias e serviu tudo e todos no tempo e na hora. Obrigado. Érico segurou o som, Marina o bolo, JG&M o chope, meu querido editor o espaço. Iemanjá, os santos e os salmos limparam o ambiente. O céu chorou chuva até a hora de servir. Depois limpou. Deve ter descido para comer. Pode crer! Até o velho Lenin materializou-se em forma de bandeira vermelha. E a imortal Mercedes Soza, em dia de Violeta Parra, mandou um recado mais do que claro:

“Gracias a la vida, que me ha dado tanto; me ha dado la risa y me ha dado el llanto”... E mais, muito mais, que me foi trazido pelos amigos e pelo tempo. Gracias! A todos y a la vida!


PÃO&VINHO

Saldão de 2016 – Segunda parte Conforme escrevi em nossa última coluna, vou seguir com a apresentação do saldo de vinhos de 2016 que não foram comentados à época e que o merecem. Hoje falaremos de alguns franceses e espanhóis. Da excelente produtora de espumantes Juvé y Camps consegui obter, no ano passado, uma rara garrafa de sua Reserva de La Familia 2007. Um espumante safrado no nível dos bons champanhes. Com nove para dez anos de garrafa, o único detalhe foi um perlage já não mais tão intenso, mas ainda assim um vinho de exceção. Antes de mais nada, trata-se de um Brut Nature, portanto sem acréscimo de licor de dosagem e, por consequência, muito seco, o que para mim é ótimo. De cor dourado palha, traz aromas de pêssegos brancos, pão torrado e toques de chá verde e limão. Na boca, os aromas se confirmam em um bom mousse. Não é à toa ser este o Cava de escolha da família real espanhola. Nos tintos, uma ótima descoberta, o Avante 2011, um Ribera Del Duero bastante típico. Ao menos para mim foi uma novidade que traz um nariz bastante complexo e cheio, com nuances de café, chocolate e muita fruta negra madura. Um vinho já muito bom, mas que certamente terá muito a ganhar com mais anos de garrafa. Na boca, marca ameixa envolta em potência de taninos macios e ótima acidez. Vinho muito gastronômico e de excelente relação custo-benefício. Por fim, da Espanha, um doce natural de estirpe, o Alvear Solera 1927. Realizados com a casta Pedro Ximenez, ou PX para os íntimos, esses vinhos de sobremesa do sul da Espanha, feitos pelo sistema de Solera, misturam várias safras e levam no rótulo a mais antiga. O exemplar que experimentei teve em sua composição, dentre outras, a safra de 1927. Um verdadeiro néctar. De cor âmbar escura e grande densidade, quase um xarope para aliviar os males

ALEXANDRE FRANCO pao&vinho@agenciaalo.com.br

da alma. O nariz logo é impactado com frutas secas e amêndoas e vai trazendo novas nuances a cada minuto de taça. Muito intenso, é um vinho para meditação. Não é simplesmente um “vinho de sobremesa”, mas a própria sobremesa. Maravihoso! Da minha amada França começamos com o Esprit de Pavie 2009. Trata-se do terceiro vinho do afamado Château Pavie. De cor rubi intensa, traz ao nariz toques de violetas e muita fruta do bosque, como amoras, mirtilos e cassis. Em boca, é sedoso e muito equilibrado. Ideal para acompanhar o confit de canard que comemos com ele. Ainda de Bordeaux, um conhecido nosso, o Grand Cru Classé de Graves Domaine de Chevalier 2004. Vinhaço. Vinho sério, de rubi intenso e aromas complexos que expressam grafite, cereja, morango e cedro, com toques finais apimentados e defumados. Na boca, apresenta corpo médio, rico, com muita textura e equilíbrio. Excelente para a gastronomia. O auge foi o Vosne-Romanée 1er Cru, Les Beaux Monts do Domaine Michel Noellat et Fils 2005. Minha denominação preferida em todo o mundo. Um borgonha de alta qualidade, já com 11 anos de garrafa, só poderia ser fantástico. E foi. Vermelho claro, quase um claret, no nariz algum morango e cerejas negras maduras, húmus, cogumelos, complexo e ótimo. Na boca, seda pura, um vinho sensual, delicioso. De equilíbrio perfeito, presta-se majestosamente à meditação e à gastronomia. Excelente! E, para terminar, outro vinho de sobremesa, o Château Loubens 1989, um Grand Cru de Sainte-Croix-Du-Mont. Ao perfeito estilo de Sauterne, realizado com uvas botitrizadas. De um dourado intenso, traz ao nariz aromas de pêssego, manga e mel. Na boca, é doce, mas equilibrado, e com a ótima acidez confirma os aromas, especialmente a manga e o mel com retrogosto longo e intenso. Maravilhoso!

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HAPPY HOUR

O bar

RONALDO MORADO @ronaldomorado

“Os bebedores solitários de cerveja são poucos e não estão bem, ou falta-lhes, no momento, um amigo”. Antonio Houaiss, intelectual, enciclopedista, foi presidente da Academia Brasileira de Letras e Ministro da Cultura.

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Cerveja não é uma bebida que isola as pessoas. Desde as mais remotas manifestações de sociabilização, a humanidade procura locais para se reunir e manifestar sua alegria e afetividade fora dos circuitos de competição e trabalho, onde seja possível relaxar as barreiras sociais e convencionais. Ponto de encontro de gerações de pensadores, filósofos, poetas, artistas, músicos, conspiradores, políticos, revolucionários etc, isto é, de todo tipo de tendência e de matiz ideológico, o bar é um espaço aberto e democrático. Assim como a cultura de muitos países está ligada, de alguma forma, aos bares, a brasileira também está. Músicos e grupos de intelectuais do país tradicionalmente se referem ao bar como local de encontro, de criação e de inspiração. Entre eles, Pixinguinha, Cartola, Vinicius de Moraes, Tom Jobim, Chico Buarque, Glauber Rocha, a turma do Pasquim e inúmeros outros. A palavra bar vem do inglês e tem relação com o balcão, originalmente uma barra (em inglês, bar) instalada entre o freguês e a prateleira de bebidas para impedir o acesso direto ao estoque. Bar, pub e biergarten são locais de convivência, encontro e amizade e, às vezes, de celebração – em qualquer lugar do mundo. Uma das grandes criações ocidentais, o bar é uma sala de estar por excelência, que reúne a galera descontraída, a família, os colegas e os refugiados sociais da cultura moderna. A atmosfera meio mística, meio festiva ajuda a atrair os frequentadores, oferecendo aconchego e privacidade para alguns e sociabilidade e liberdade para outros. Bar, boteco, botequim, botica (em Portugal), bodega (na Espanha) e todas as suas variações, conforme a criatividade do povo, são uma “instituição” – tão séria

quanto merece ser e tão descontraída quanto deve ser. No Brasil, o ambiente é muito similar ao de qualquer bar de qualquer região do mundo. Mas, de norte a sul do país, a diversidade de tipos e de decoração, de apelo comercial e de estilos reflete a riqueza da população brasileira. Mesas, cadeiras e bancos podem ser metálicos, de plástico ou de madeira; rústicos ou modernos. As toalhas, então, quando postas, podem revelar simplicidade e discrição ou muita sofisticação. E o balcão? Aquele lugar de frente para o “altar”, meio profano meio sagrado – como a favorecer uma prece – em total intimidade com o garçom e com a casa. Ali o freguês se sente participante do movimento da cozinha e dos serviços internos, como alguém da família. Se a cultura brasileira é fortemente marcada pela música e pelo futebol, é impensável imaginá-los sem a cerveja e o bar. Mesmo num bar improvisado na areia da praia – um tosco refúgio para se abrigar do causticante sol tropical – a cerveja gelada está sempre presente. A folclórica filosofia de boteco é exemplo da sabedoria mundana e, tal qual as frases de para-choques de caminhão ou de portas de banheiros, reflete o bom humor e as verdades bem ditas ou não ditas do dia a dia dos frequentadores de bares. A música brasileira – o samba, a bossa nova, o chorinho e até a música caipira ou sertaneja – não fica afastada desse ambiente ou das rodas de cerveja. Ao contrário, ali é inspirada, ali se desenvolve, ali se exibe. Muito mais que simples local aonde se vai para beber, o bar tem um poder de atração social que não se mede em litros. Se ali se vai para celebrar, namorar, conversar, paquerar, jogar ou divertir-se, não importa. Há mais sabedoria na mesa de um bar do que em muitas rodas de políticos ou de empresários.


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teatrogestual O cenário é uma instalação plástica composta por estruturas de colchões de mola que vão se transformando em objetos insólitos. Em alguns momentos, esses colchões formam labirintos de onde os personagens procuram uma saída. Em outros, é um quarto para um encontro amoroso. No palco estão dois atores trabalhando com teatro gestual e transformando seus próprios corpos em bonecos de proporções humanas, como se estivessem refletidos no espelho. Assim é o espetáculo inédito Gestos, em cartaz no CCBB até 5 de março, com interrupção durante o Carnaval. A montagem da companhia franco-brasileira Dos à Deux tem colaboração da marionetista russa Natacha Belova e do brasileiro Bruno Dante, que esculpiram em gesso partes dos corpos dos atores André Curti e Artur Luanda Ribeiro e depois trabalharam as esculturas em diferentes materiais. “Essa pesquisa, na fronteira entre artes plásticas, formas animadas, teatro e dança, nos fez ter uma nova sensação gestual que, até então, não havíamos experimentado. Um gestual potente, complexo e contido”, explica Artur. Inspirada em temas da atualidade, a dramaturgia surgiu durante o processo de criação artística e coloca foco nas pessoas invisíveis da sociedade, no preconceito e no desprezo. Os refugiados, a guerra e o amor permeiam três poemas que dão vida ao espetáculo. De quarta a domingo (15 a 19/2 e 2 a 5/03), às 20h, com sessão extra às 17h do dia 5. Ingressos a R$ 20 e R$ 10.

homossexualidadenaperiferia

Diego Bresani

Uma homenagem à escritora Clarice Lispector (1920-1977) e a todas as mulheres, que têm seu dia internacional a 8 de março. Essa é a proposta da coreógrafa Jana Marques, diretora de Clarice Lispector em movimentos, a ser apresentado dias 3 e 4 de março, na Caixa Cultural, e também dias 1º e 2 de abril, no Teatro Sesc Garagem (713/913 Sul). Em dois atos, o espetáculo de dança fará um tributo à escritora, revivendo seu lado revolucionário para a época. Ela será lembrada em textos, movimentos fortes e impactantes executados pelos dançarinos, objetos cenográficos, entrevista pessoal, poesias gravadas e obras que não são tão famosas. “Eu quis sair do comum. Quando comecei a pesquisar a escritora, vi que existem muitos contos seus ainda pouco conhecidos. Foram esses contos que quis trazer para a dança, para os palcos”, explica Jana, carioca radicada em Brasília. Nascida na Ucrânia, mas naturalizada brasileira, Clarice tornou-se uma das mais importantes escritoras do Século 20. Participam do espetáculo 16 bailarinos do grupo Azzo Dança. Ingressos a R$ 20 e R$ 10. Informações: 3445.4401.

Vai até dia 26 de fevereiro, no Teatro Goldoni (208/209 Sul), a peça Felicidade, montagem produzida em oficina de teatro ministrada pelo diretor Alexandre Ribondi na Cidade Estrutural. Realizado em parceria com o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e com recursos do Fundo de Apoio à Cultura, o espetáculo pretende mostrar como um jovem homossexual morador de periferia lida com questões como aceitação, preconceito e autoestima. Inspirada em histórias reais dos jovens em cena e com dramaturgia construída em processo colaborativo, a peça aborda relatos de preconceito sob múltiplas camadas. Temas como violência sexual, morte e prostituição estão presentes no texto e se tornaram fontes de aprendizado, emoção – e até terapia – para toda a equipe envolvida no processo. Sextas e sábados, às 21h, e domingos, às 20h. Os ingressos custam R$ 20 e R$ 10, e a classificação indicativa é de 14 anos.

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festivaldehumor Entre 15 e 19 de fevereiro Brasília recebe a segunda edição do Hilaridade Fatal – Festival de Brasília do Bom Humor Brasileiro, na Sala Plínio Marcos, da Funarte, com entrada franca. Para apresentar novos talentos da cidade, o festival promove uma mostra competitiva, a Riso Aberto, com 24 esquetes de comédia de até dez minutos, humor livre e stand-up, que comporão a programação do festival durante três dias de eliminatórias (seis apresentações de esquetes por dia), terminando com a apresentação dos finalistas e de três vencedores, dia 19 de fevereiro. Realizado pela Arteviva Produções Artísticas e pela Universo Criativo Produções, o festival tem apoio da Secretaria de Cultura do Distrito Federal e da Fundação Nacional das Artes. A programação completa pode ser acessada em www.facebook.com/hilaridadefatal.

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Renato Mangolin

DIA&NOITE


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aquarelas O artista plástico espanhol Javier Zorrilla é conhecido por transformar cenas cotidianas de paisagens urbanas em aquarelas. Com suas pinceladas, ele retrata lugares como o Congresso Nacional ou a Ponte JK, além de praias do Rio de Janeiro, de maneira marcante. Seu trabalho pode ser conhecido na mostra Aquarela, em cartaz até 25 de fevereiro no espaço Pátio Galeria, do Pátio Brasil. Especialista em paisagens urbanas, o artista madrilenho estudou pintura nos estúdios de José Luís Ferrer e Teresa Muñiz. É professor de aquarela na Escola de Arte e Galeria Alda con Limón, em Madri, e membro da Agrupación Española de Acuarelistas, da Agrupación de Acuarelistas Vascos e da Asociación de Pintores y Escultores de España. Participou de mais de 100 exposições coletivas e foi selecionado em vários concursos nacionais e internacionais. De segunda a sábado, das 10 às 22h, e domingos e feriados, das 14 às 20h, com entrada franca. Informações: 2107.7400.

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carnavalcomotema

Diana Blok

Francisco Alves, Toninho de Souza, Gilson Filho e J. Vicente são os quatro artistas plásticos que expõem seus trabalhos na Galeria do Templo da Boa Vontade, até 27 de fevereiro. Em comum, suas concepções sobre o Carnaval de rua, inspiração para pinturas, objetos, gravuras, cerâmicas, artes digitais, desenhos e instalações. Na mostra As cores do Carnaval do Brasil o público vai notar as diferenças de culturas ou a união de ideias sobre o mesmo tema explorado no Brasil, no mundo imaginário dos quatro artistas. Diariamente, das 8 às 20h, com entrada franca. Informações: 3114.1070.

trêsemduas Uma artista plástica brasiliense, uma norte-americana e uma holandesauruguaia dividem dois espaços da Galeria Alfinete (103 Norte), até 4 de março. Na Sala Um, a brasiliense Raquel Nava apresenta a mostra Besta fera pop fauna, com trabalhos que utilizam crânios e animais taxidermizados e objetos do cotidiano, como porcelanas e lâmpadas fluorescentes, “uma proposta de reflexão sobre a relação dos humanos com os animais e com a natureza”. Na Sala Dois, a norte-americana Ilene Sunshine e a holandesa-uruguaia Diana Blok apresentam Diálogos subterrâneos (foto), uma aposta na relação entre fotografia e videoinstalação e desenhos em duas e três dimensões. Em foco, a presença do humano no mundo e na natureza e a comunhão dos opostos. Às quintas e sextas-feiras, das 14h30 às 18h, e aos sábados, das 15 às 20h, com entrada franca. Informações: 3443.8891.

fotografia Estão abertas, até 28 de março, as inscrições para curso de fotografia contemporânea promovido pela Galeria Ponto. O objetivo é estimular a produção autoral e experimental usando a linguagem fotográfica, reunindo artistas, fotógrafos, designers, arquitetos, escritores e todos aqueles que já tenham conhecimento básico da técnica fotográfica e estejam interessados em desenvolver um projeto a longo prazo. Serão propostos exercícios para desenvolver novas linguagens dentro da prática individual de cada um, leituras críticas e dinâmicas das imagens produzidas, edição do material em um portfólio, discussões sobre o lugar da fotografia na atualidade e uma análise do mercado de arte brasiliense. A edição de 2017 contará com a participação do artista plástico Ralph Gehre como professor e terá duração de seis meses. O formulário de inscrição dos interessados pode ser acessado em www.galeriaponto.com.br/nucleo-fotografia/. Eles deverão enviar até dez imagens (jpg) para cursos@galeriaponto.com.br, para seleção de portfólios. Os selecionados serão avisados do resultado por e-mail até 4 de Abril. Informações: 3447.4891.

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relatosdepoder O Império Romano organizava-se com base em regras e ações políticosociais específicas, comandadas por um imperador e um senado. Atualmente, as ações sociais relacionadas com a obtenção de poder levam a uma espécie de impérios pessoais. Esse é, em resumo, o teor do texto Impero, de André E. Teodósio, que inspirou o português Vasco Araújo a realizar o vídeo de mesmo nome, um dos nove a serem exibidos em sua primeira mostra individual em Brasília. Até 5 de março, o Museu da República apresenta a mostra Potestad, que revela o olhar poético de Vasco Araújo sobre as relações de poder em filmagens com suporte na literatura e na filosofia. Selecionados por Maria João Machado, curadora da exposição, os vídeos têm como premissa os “relatos de poder”, temática central no trabalho do artista. As obras cruzam referências contemporâneas com as grandes narrativas e temáticas da cultura clássica e promovem uma reflexão sobre questões políticas universais. “É a primeira vez que os vídeos são apresentados juntos num contexto museístico”, afirma a curadora. E conclui: “Trabalhando em distintos suportes como a escultura, o vídeo, a fotografia e a performance, Vasco Araújo tem estruturado seu discurso em uma particular forma de desconstruir e reconstruir os códigos de comportamento”. Nascido em Lisboa, em 1975, Vasco Araújo licenciou-se em Escultura pela Faculdade de Belas Artes de Lisboa e frequentou o Curso Avançado de Artes Plásticas da Escola Maumaus, também na capital portuguesa. Desde então tem participado de diversas exposições individuais e coletivas em Portugal e no exterior. De terça a domingo, das 9h às 18h30, com entrada franca.

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Estão abertas as inscrições para a quinta edição do Festival Internacional de Entretenimento Latino-africano, que acontece de 20 a 25 de abril com aulas, palestras, festas e a presença inédita da dupla norte-americana Ataca & Alemana. Zouk, salsa, samba de gafieira, kizomba, bachata, danças urbanas, forró e outros ritmos tradicionais da América Latina e do continente africano estão na programação do festival, que traz todos esses ritmos das academias diretamente para os palcos. Idealizado pelos professores de dança de salão Caio Victor, o K-Yo, e Irineu Alves, promove o encontro de dançarinos e também de iniciantes que querem aprender a dança de salão no Vila Velluti Hotel Spa & Convenções (km 24 da BR-060). As inscrições devem ser feitas em www.vounofiel.com.br. O full pass, que dá direito a todas as aulas, atividades e bailes, custa R$ 450. Informações: 3363.9339.

Um mergulho em quatro mil anos de história da cultura grega, berço da civilização ocidental. De 18 de fevereiro a 19 de março, a Praça Central do ParkShopping recebe a exposição Legados da Grécia, com mais de 150 artefatos e esculturas inspirados em objetos encontrados nos principais museus do mundo. Lá o visitante encontrará réplicas das dez principais heranças gregas ao mundo moderno: arquitetura, artes plásticas, filosofia, literatura, medicina, ciência, política, esporte, teatro e música. Entre as atrações estão uma maquete do Partenon, o mais célebre dos templos gregos, com 1,80m de comprimento, reproduções em tamanho natural de esculturas da arte e mitologia grega, como Vênus de Milo (Louvre), Apolo Belvedere (Vaticano) e Vitória Samotrácia (Louvre). Não faltarão ainda os doze deuses do Olimpo e uma réplica do famoso “presente de grego”, o Cavalo de Troia, com 6 metros de altura. Um dos pontos altos da exposição é a interatividade presente no Oráculo de Delfos, por exemplo. A pitonisa, como eram chamadas as sacerdotisas de Apolo, fornece mensagens de otimismo aos visitantes, através de um aplicativo especialmente desenvolvido para a exposição. De segunda a sábado, das 10 às 22h, e aos domingos, das 14 às 20h, com entrada franca.

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oparqueagradece Quantos litros de combustível os aviões que transportaram os artistas para participar do projeto Na Praia gastaram? E qual foi a quantidade de gases emitidos pelos caminhões que trouxeram areia para montar a praia artificial instalada em Brasília durante dois meses? Tudo isso foi levado em conta num cálculo bastante preciso realizado pela organização CO2 Zero. O resultado foi nada menos que 150 mudas de árvores, total necessário para compensar todo gás carbônico gerado. Elas estão plantadas, desde o último dia 4, no Parque da Cidade, em área próxima ao Carrera Kart, e correspondem a cerca de 30% do total do plantio a ser realizado durante o semestre. O Parque da Cidade foi o local escolhido por ser um dos grandes pontos de encontro dos brasilienses e também porque os organizadores do projeto irão realizar lá o Carnaval no Parque. O Na Praia também realizou duas ações de mergulhadores para limpeza do Lago Paranoá, retirando quase uma tonelada de lixo das águas. Bravo!


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revelaçãocapixaba Se você é daqueles que adoram uma novidade musical, não pode deixar de conhecer o trabalho de Ana Muller. Com mais de seis milhões de visualizações no Youtube apenas com canções autorais em voz e violão, ela fará show no Pier 21 às 19 horas da sexta-feira, 10 de março. Vinda do Vitória, Ana se lançou em carreira solo após sair da banda Aurora, que hoje criou fama abraçada pelo público jovem da MPB na internet. Tendo como marca registrada sua voz suave, Ana lançou, no fim de 2016, seu single Me cura, e faz parte do Garimpo, um selo musical sob a tutoria do Brasileiríssimos, responsável pela divulgação e pelo lançamento de novos talentos nacionais. A abertura do show está a cargo da brasiliense Mila Cavalhero. Entrada franca.

paraospequeninos

gleniolançalivro

O Mundo Bita é um planeta localizado na Galáxia da Alegria, ao lado do Planeta Música e do Planeta Circo. Está de volta, dias 11 e 12 de março, o espetáculo Bita e os animais, montagem teatral baseada na animação O mundo Bita, atração infantil do canal Discovery Kids. Todas as músicas têm foco nos diversos ambientes da natureza em que vivem diferentes espécies. Então, o Bita sai em suas viagens musicais cantando e brincando com muitos tipos de animais, apresentando os habitats, os costumes e principais características dos bichos, sempre com muita alegria. Junto com os amiguinhos Lila, Dan e Tito, as crianças são convidadas a viver grandes descobertas e compartilhar momentos com mais amor e solidariedade. Sábado e domingo, às 15h, no Teatro da Unip (913 Sul). Ingressos a R$ 100, R$ 60 (mais um quilo de alimento não perecível) e R$ 50. Venda com taxa de serviço em www.naoperco.com, nas lojas Cia Toy e na Belini Pães e Gastronomia (113 Sul). Informações: 4101.1121.

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Em 2010, o artista plástico Glenio Lima viveu quatro meses no México, onde desenvolveu um trabalho de residência artística junto com outros 39 artistas iberoamericanos de 16 países. A experiência está contada em texto e fotos no livro Códice, a ser lançado dia 15, às 19h, no anexo do Museu da República. Na obra de 140 páginas, em três idiomas, Glenio conta a experiência de produzir uma exposição que ocupou casas de famílias na cidade mexicana de Oaxaca. Lá ele teve a oportunidade de mergulhar na cultura e na sociedade locais para desenvolver um projeto de pintura de grandes formatos que tinha como temática a arte dos contemporâneos Yanomami, do Brasil, e os pré-hispânicos Mixteca, do México. A cidade onde o artista se instalou é também o lugar onde ainda habitam algumas comunidades de povos pré– hispânicos, que preservam suas antigas culturas. Um diferencial do trabalho de Glenio foi usar a casa dos moradores como galeria de exibição das peças que desenvolveu. “A ideia era aproveitar o ambiente natural das moradias e criar um cenário para compor, com cada pintura, um retrato de família,” explica o artista. O livro custa R$ 90 e após o lançamento estará à venda na Banca da Conceição (108 Sul).

paraospequeninos2 O Coletivo Antônia estreia este mês o espetáculo Voa, voltado para crianças de um a cinco anos. Em cena, Cirila Targhetta e Tatiana Bittar manipulam objetos de papel em jogo de luz e sombra para contar uma fábula sobre liberdade. Livremente baseada no conto A menina e o pássaro encantado, de Rubem Alves, o espetáculo é sensorial e físico, criado para compartilhar com as crianças a poesia dos gestos, da melodia, do olhar e do movimento. Com direção de Rita de Almeida Castro, o projeto tem patrocínio do FAC, Fundo de Apoio à Cultura do Governo de Brasília. Dias 16 e 17, no Centro Cultural da AdUnb/ Casa do Professor, às 11h e às 16h30, com entrada franca.

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QUEESPETÁCULO

Amores e canções Espetáculo teatral leva para o palco vida e obra de Vinicius de Moraes POR PEDRO BRANDT

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m 1957, Vinicius de Moraes e Tom Jobim estiveram em Brasília, ainda na construção da cidade, para buscar inspiração, in loco, para o que viria a ser a Sinfonia da Alvorada, composição encomendada à dupla por Juscelino Kubitschek para a inauguração da nova capital. Quase seis décadas depois, Vinicius está novamente em Brasília. Não em corpo, evidentemente, mas em música, poesia e – por que não? – em espírito. Nos dias 18 e 19, a Cia. Infiltrados encena no Teatro Mapati o espetáculo Vinicius, inspirado em vida e obra do compositor carioca. Com concepção, direção e roteiro de Abaetê Queiroz, codireção de Juliana Drummond e direção musical de Edu Moraes, a montagem foi desenvolvida e levada ao palco pela primeira vez em 2015, mesmo ano de nascimento da companhia teatral brasiliense. Em cena, o elenco – que conta com os diretores e ainda Amanda Coelho, Bárbara Franco, Clovis Leoncio, Cris Mendes, Eric Naves, Flávia Limoeiro, Kayla Valladares, Lara Patty, Maíra Kirosvsky e Tathyana

Lopes – se reveza nos papéis de amigos, músicos, familiares e outras pessoas que conviveram com Vinicius para retratar recortes de sua vida. “A morte do poeta, suas formas de escrita e composição, a relação com esposas e filhos, a boemia com os amigos, o ocultismo e sincretismo em sua obra”, detalha Abaetê Queiroz. Conhecido principalmente como cantor, compositor e poeta, Vinicius de Moraes (1913-1980) foi também diplomata, dramaturgo e jornalista. Boêmio, casou-se nove vezes e teve cinco filhos. Tom Jobim, Baden Powell, João Gilberto, Carlos Lyra, Chico Buarque e Toquinho foram alguns de seus notórios parceiros de composição. Para suas poesias e letras, inspirava-se nas relações amorosas, no cotidiano e também nas tradições afro-brasileiras. O roteiro musical do espetáculo passa por canções emblemáticas como Garota de Ipanema, Eu sei que vou te amar e Canto de Ossanha, em interpretações de Wander Britto e Edu Moraes. Entre as referências para a montagem está o documentário Vinícius (2005), de Miguel Faria Jr., que serviu como base para a narrativa mostrada no palco. Para o diretor, o espetáculo permite ao espec-

tador conhecer um outro Vinicius. “Nota-se a jovialidade do artista. Vejo que a plateia chega com uma visão idosa sobre ele. Comparo, hoje em dia, Vinícius de Moraes com os roqueiros setentistas. Para mim, ele é um Jim Morrison. O espetáculo é muito jovem, como Vinicius”. Durante a encenação, a plateia é convidada a interagir com a apresentação. Para criar uma intimidade entre as partes, a produção teve uma ideia: “Como fazer com que o público participe, que se sinta na casa de Vinicius? Daí veio a ideia de oferecer uísque, que era a bebida favorita dele. E chá, para quem não bebe álcool. O ingresso é um copo personalizado, com frases memoráveis do Vinicius, que você recebe assim que chega no teatro”, conta Juliana Drummond. O resultado dessa ação, dizem os diretores, tem sido interessantíssimo. “Primeiro, por não sabermos quem está bebendo ou não. Segundo, pela reação eufórica da plateia. Literalmente dionisíaco, todos comungando lisergicamente”, avalia Abaetê. Vinicius

18 e 19/2, às 20h, no Teatro Mapati (707 Norte, Bloco K, Casa 5). Duração: 80 min. Ingressos: R$ 50 (à venda em www.sympla.com.br). Classificação indicativa: 18 anos.

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Washington Possato

GRAVES&AGUDOS

Leila Pinheiro e Roberto Menescal

A nata da Bossa Nova N

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enhum outro ritmo musical brasileiro foi tão feliz quanto a Bossa Nova. Melhor dizendo, nenhum outro como a Bossa Nova e sua bela alegria produziram tantos artistas de sucesso, sucesso internacional. Antonio Carlos Jobim, João Gilberto, Luiz Bonfá, Sérgio Mendes, Marcos Valle, João Donato, Ivan Lins, Bebel Gilberto, Baden Powell, Leny Andrade, Rosa Passos – a lista é gigante. De onde vem a conclusão óbvia: de qualidade indiscutível, a Bossa Nova fez história como uma revolução na música popular brasileira, mas não é coisa do passado, é perene, nunca nos deixou, em que pese a mina de ouro ter sido descoberta naquela virada dos anos 50 para os 60 do século passado. Pois chegando aos 60 anos dos marcos iniciais – dois discos lançados em 1968: Canção do amor demais, de Elizeth Cardoso, e Chega de saudade, de João Gilberto – temos o privilégio de conferir os grandes da Bossa Nova, ao vivo e em bom som, sempre em clima de comemoração. Bossa Nova in concert é o evento que vai

reunir, dia 17, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, a nata da nossa melhor música. Ivan Lins, Leila Pinheiro, Roberto Menescal, Roberta Sá, Wanda Sá, Paula Morelenbaum e Jaques Morelenbaum, espécie de “Bossa Nova All-Stars”, celebram a BN, seus autores e as mais belas canções que este país já produziu. O espetáculo desse dream team tem conexões com outro evento comemorativo, realizado uma década atrás, em 2005, com um elenco igualmente estelar, àquela altura com os saudosos Miéle (19382015) e Oscar Castro Neves (1940-2013), e outros ainda na ativa, como João Donato, Leny Andrade e Marcos Valle, que desta vez estão ausentes. E se olharmos no retrovisor veremos outra conexão, com o show Chega de saudade, de 1992, produção de Miéle e Ronaldo Bôscoli (1928-1994), baseado no famoso livro homônimo de Ruy Castro. A propósito, consta que a turnê do Chega de saudade terminou em Brasília, naquele 1992, com corações machucados – caso de Luizinho Eça e Fernanda Quinderé – e uma bebedeira federal, no Hotel Nacional, sob o comando de Bôscoli. Um certo cheque sem fundos passa-

do à produção teria sido o estopim, para que, como vingança, o Rei do Charme tenha ordenado descer o estoque de uísque do hotel. Voltando ao Bossa Nova in concert de 2017, qualquer semelhança com a o amor, o sorriso e a flor cantados em ouCristina Granato

POR HEITOR MENEZES

Wanda Sá


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tros verões não é mera coincidência. Basta que as estrelas passem em desfile títulos assinados por Antonio Carlos Jobim e seus ilustres parceiros (Vinicius de Moraes, Newton Mendonça, Aloysio de Oliveira) ou da lavra de Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli, autores de O barquinho, para que a gente se renda a tanta beleza. Como Wanda Sá está presente, não devem faltar Vivo sonhando (Tom e Vinicius) e outras que consagraram sua parceria com Roberto Menescal: Telefone e A morte de um deus de sal (ambas da dupla Menescal e Bôscoli). E sem detrimento de ninguém, uma atenção especial a Paula Morelenbaum e sua bela voz forjada no coro da Banda Nova, que acompanhava o velho Tom. Como é possível esse sucesso perene, sempre empolgante? Para a Roteiro, o guitarrista e violonista Roberto Menescal fez a seguinte análise: “A Bossa Nova tomou caminho semelhante ao do jazz. Nunca foi um sucesso popularesco, mas está aí há quase 60 anos”. Um dos artífices do movimento, presente em momentos decisivos, como o cé-

Ivan Lins

lebre concerto de 1962 no Carnegie Hall, em Nova York, Menescal diz que não participou daquela bebedeira no Hotel Nacional. “Participei só do primeiro show da turnê, pois vi que seria um projeto muito louco, com muito maluco junto e também muita bebida. Avisei logo que não viajaria”, afirma o ex-predador dos mares, o agora tranquilo Menescal. “Não faço mais pesca submarina. Fui

um terrível predador, mas que hoje luta pela natureza e paga pelos seus pecados”. Justo, isso não combina com o amor, o sorriso e a flor. Isso é muito natural, isso é Bossa Nova. Bossa Nova in concert

17/2, às 21h30, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Ingressos: R$ 50 (poltrona superior), R$ 70 (poltrona B), R$ 80 (poltrona A), R$ 90 (poltrona lateral), R$ 100 (poltrona gold) e R$ 150 (poltrona frontal).

Volta e meia surge um artista com aquilo roxo, para nos lembrar que, se não for a transgressão, a ousadia, ficamos todos fadados ao mundinho conformista, à falsa e perigosa sensação de mesmice. É assim em diversas áreas, e na música popular – principalmente – não poderia ser diferente. Portanto, deixe o preconceito de lado (as antigas Frenéticas diziam “solte suas feras”), dê uma chance para ampliar os seus conhecimentos e vá conferir o show do Johnny Hooker, sábado, 18, no clube da Asceb (904 Sul). Não é o John Lee Hooker, nem poderia ser, pois o velho bluesman norte-americano pegou a encruzilhada faz tempo: partiu para outra em 2001. Johnny Hooker é a alcunha artística do jovem cantor pernambucano John Donovan, nascido em Recife, em 1987. Assumidamente gay, Hooker não é exatamente um novato e o grande público sabe dele por causa da participação na novela Geração Brasil, exibida pela Rede Globo ao longo de

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Transgressão é com Johnny Hooker

2014. É desse folhetim um de seus sucessos, Alma sebosa, que, aliás, diz tudo sobre a estética Johnny Hooker: o som meio brega, com influências do glam rock, o amor gay, o glamour do cabaré, o bas-fond, uma coisa de pirar o público, seja ele LGBT ou hétero, digamos, cabeça aberta. Convenhamos. Alguém que solta um disco chamado Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito!, como o (a)

artista mandou ver em 2015, tem que ser muito macho. Quanto à questão de gênero, se pintar a dúvida se é o Johnny Hooker ou a Johnny Hooker, pouco importa. Lembrando o Chacrinha, tem gente que veio para confundir. (H.M.) Johnny Hooker

18/2, às 22h, no Clube 904, da Asceb (904 Sul). Ingressos (meia): R$ 50 (2º lote) e R$ 60 (3º lote). À venda em www.sympla.com.br.

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GALERIADEARTE

Escola (década de 1920)

O goleiro (década de 1920)

Mormaço (1941)

Entre a opressão e a luz POR ALEXANDRE MARINO

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pintura resplandecente de Cícero Dias, feita de emoções líricas, como a descreveu o próprio artista, ocupa amplo espaço do Centro Cultural Banco do Brasil até 3 de abril, com a reunião de 125 obras de uma trajetória feita de originalidade e pioneirismo. Da exposição Cícero Dias – Um percurso poético constam obras vindas de algumas das mais importantes instituições brasileiras, além de coleções particulares do Brasil e da França, país onde viveu entre dois extremos – desde o prestígio que obteve pela sua pintura, a convivência com alguns dos mais importantes artistas da Europa, até os terrores da guerra, que desumaniza os homens e os rebaixa à insignificância. A mostra, que tem curadoria de Denise Mattar, traz um panorama completo da vasta produção de Cícero Dias (19072003) e é dividida em três grandes núcleos, para melhor entendimento de sua obra. A primeira parte, Brasil, revela o artista que surge, a partir de 1928, com características modernistas, porém diferentes do que vinha sendo feito na época.

Seu trabalho era telúrico, com toques de surrealismo e referências do cordel, de onde surgiam personagens como príncipes e princesas. Também é forte nessa fase a influência da memória da infância, do ambiente rural e das experiências eróticas da juventude. O núcleo Brasil é subdividido em Entre sonhos e desejos, composto de aquarelas produzidas entre 1925 e 1933, com trabalhos líricos, sensuais e poéticos, seguido de E o mundo começava no Recife..., com pinturas que retratam sua experiência urbana, com casas coloniais, interiores dos sobrados, jardins e paisagens do mar. Nesse momento, Cícero trocava a aquarela pela pintura a óleo, interferindo nas características de sua obra. O núcleo seguinte, sob o título de Europa, aborda sua chegada a Paris, em 1937, fugindo do clima opressivo da ditadura de Getúlio Vargas. O subnúcleo Entre a guerra e o amor começa por desenhos e aquarelas de pequeno formato, realizados em condições precárias durante a Segunda Guerra Mundial, quando Cícero, depois de ser bem recebido por importantes artistas que faziam eferves-

cer a cena cultural na capital francesa, e ganhar prestígio internacional com uma exposição na Galerie Jeanne Castel, começou a sentir o sufocamento em função do conflito, que resultou na invasão de Paris pelas tropas nazistas. Novamente fugindo da opressão, Cícero Dias se estabeleceu, a partir de 1942, em Portugal, já ao lado da esposa, Raymonde, francesa filha de amigos do poeta Benjamin Péret, uma das pessoas mais próximas do artista em Paris. As obras constantes do subnúcleo Lisboa – Novas artes são coerentes com essa mudança, marcadas pelas buscas cromáticas, traços ousados, temas irreverentes. São dessa fase quatro pinturas que pela primeira vez estarão juntas numa exposição: Mamoeiro ou dançarino?, Galo ou abacaxi?, Moça ou castanha de caju? e Guardachuva ou instrumento musical?. O segmento seguinte, A caminho da abstração, marca nova fase do artista, conhecida como fase vegetal, quando começou a abandonar a figuração e incorporou novos elementos plásticos. No subnúcleo Geometria sensível, percebe-se sua passagem para a abstração plena,


Fotos: Divulgação

Sem título (1951)

quando se tornou o primeiro artista brasileiro a trabalhar com figuras rigorosamente geométricas. Abstração plena é o título do primeiro segmento do terceiro núcleo da mostra, Monsieur Dias – Uma vida em Paris. Neste momento, como destaca a curadora da exposição, Denise Mattar, ele é mais uma vez pioneiro, agora trabalhando com o abstracionismo, porém pessoal, vibrante e colorido, distante do concretismo. Com o fim da guerra, em 1945, Cícero Dias voltou para Paris, onde permaneceu até sua morte, em 2003. No entanto, Recife permaneceu em sua memória. Sua juventude na capital pernambucana é a fonte de inspiração de sete obras produzidas na década de 1960, que encerram a exposição, no subnúcleo Nostalgia. Em seu livro de memórias Eu vi o mundo (Cosac Naify, 2011), Cícero Dias observou que “propunha emoções líricas, belas visões que surgiam pelas várzeas pernambucanas, um estado poético, uma pureza da alma”. “Não cultivo a penumbra, mas a resplandecência”, escreveu. Falando de sua trajetória, que reuniu experiências ricas, prazerosas e dolorosas, lembrou que, ao expor no interior de Pernambuco, havia “um vigário a dominar, um povo de feira a opinar. Depois, me atirei num mundo culto, onde grandes civilizações se encontravam. Mas eu acreditava que nada mais universal do que falava um povo através de suas lendas, seus

mitos, seus elementos naturais.” Cícero foi amigo de Picasso, Paul Éluard, Di Cavalcanti, André Breton e grande número de artistas plásticos e escritores que tornavam Paris uma cidade culturalmente efervescente. Mas seu talento ele trouxe lá das profundezas do Brasil, do Engenho Jundiá, onde nasceu em 1907. Lá aprendeu a educar sua sensibilidade e seu olhar, talvez já a partir dos três anos de idade, quando a passagem do Cometa Halley fez surgirem fantasias, lendas e crendices entre as pessoas.

“Sempre me entendi perfeitamente com o mistério do mundo. A tentação da pintura desde o começo de minha existência atenuava meu lado introvertido. O que vivia dentro de mim era o sonho. Contradições que a natureza criava: o invisível e o visível.” Assim Cícero Dias se descreveu. O resto é a obra. Cícero Dias – Um percurso poético

Até 3/4 no CCBB (SCES, Trecho 2, tel. 3108.7600). De 4ª a domingo, das 9 às 21h, com entrada franca.

O compadre de Picasso O 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, realizado em setembro do ano passado, deu os prêmios de melhor direção e melhor roteiro na Mostra Brasília a Vladimir Carvalho, pelo filme Cícero Dias, compadre de Picasso. É um documentário impecável sobre a vida e a obra do artista pernambucano. Vladimir Carvalho foi professor na Universidade de Brasília e tem em seu currículo alguns importantes documentários produzidos no Brasil, entre eles Cabra marcado para morrer, O país de São Saruê e Conterrâneos velhos de guerra. 29


BRASILIENSEDECORAÇÃO Lúcia Leão

Simplesmente Moa POR VICENTE SÁ

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uando, em 2 de agosto de 1953, nasceu o menino Moacyr, pela janela aberta do hospital ainda se podia ouvir repetidas vezes o samba Zé Marmita, de Luiz Antônio e Brasinha, no rádio da casa vizinha. O samba havia estourado no Carnaval daquele ano, tinha virado uma verdadeira mania dos paulistas e acabaria entrando para a história da música popular brasileira, sendo tocado até hoje. Talvez venha daí a ligação de nosso personagem com o samba – ou talvez venha de sua mãe, dona Marília, que era professora de piano. O certo é que o samba seria parte importante de sua vida, assim como a política e o jornalismo. Hoje, Moacyr Oliveira Filho, ou simplesmente Moa, como todos o chamam, é nome indissociável de entidades carnavalescas como Pacotão, Aruc e Portela, tendo trazido uma contribuição imensa para a cultura da capital da Repú-

blica. Mas vamos contar isso do começo. lar, onde completou sua formação polítiMoacyr era um menino magrinho, ca. Ingressou na AP e mais tarde, já na mas dinâmico. Não era um craque no fuuniversidade onde cursava economia, fitebol, mas batia suas peladas e amava o liou-se ao PCdoB. O rapaz vivia perigosaCorínthians. Em casa, ouvia muita músimente, para dizermos o mínimo. No início de 1972, na comemoração ca brasileira e gostava de samba. O rock o dos 50 anos da Semana de Arte Moderassustava e ainda assusta um pouco. No colégio, era bem articulado e falante e acana, Moa e centenas de paulistanos assistibou se envolvendo em ram a um show que megrêmios e organizações esxeria com suas almas de forma inesquecível: Pautudantis – o que, no início da ditadura militar, linho da Viola e a Velha não era uma prática muiGuarda da Portela. O show aconteceu na Funto conveniente nem saudável. Assim, em 1967 ele dação Getúlio Vargas e foi despachado do Coléteve um final apoteótico em que Paulinho, só gio Coração de Jesus, oncom o violão, cantava de estudara desde o priPortela, passado de glórias, meiro ano, por, vamos dide Monarco. Ao final da zer, comportamento inaprimeira parte da músidequado. Passou a estudar então no Vocacional, ca, as cortinas se abriram um colégio politizado, doe surgiram a Velha Guarminado pela Ação Popu- Infância no Braz, em São Paulo, nos anos 50 da e a bateria da Porte-


Na eleição do Centro Acadêmico da Faculdade de Economia da USP, em 1971

Com o amigo Samuca no desfile do Pacot ão de 1978

Com Jamelão e Cristovam Buarque,

em 1995

Nos braços dos cruzeirenses, comemorando mais um título

Fotos: arquivo pessoal

la cantando em coro com ele, enquanto Tia Vicentina descia do palco distribuindo sua famosa batida de limão. Todo mundo chorou e Moa jurou que iria amar a Portela para sempre. Uma semana depois, seu grupo caiu, como se dizia naqueles tempos, ou seja, foram todos presos e torturados. Nas raras noites em que no Doi-Codi não havia ninguém sendo torturado, Moa e o os outros presos de sua cela, entre eles o poeta Luís Turiba, inventavam um programa de rádio e cantavam alguns sambas. É claro que os da Portela estavam lá. Solto três meses depois, Moa ficou sem espaço na universidade e acabou abandonando o curso. Um dia, num boteco, um amigo o convidou para trabalhar com ele em um jornal. Ele foi, e gostou. Começou na Tribuna de Santo Amaro e depois foi para a Folha de S. Paulo. Em 1977, com o começo da chamada abertura política ou distensão, e a provável extinção da censura, os jornais resolveram reforçar suas sucursais em Brasília e assim ele e o amigo Roberto Stefanelli, também jornalista, vieram para a capital da República ver o diabo de perto. Aqui, ajudou na retomada do Sindicato dos Jornalistas, que estava nas mãos de pelegos, e na criação do Clube da Imprensa, do qual foi presidente. E para ver se existia mesmo a tal da abertura política, criou com outros colegas de ofício o irreverente bloco carnavalesco Pacotão. O bloco era tudo o que a cidade queria e foi tomado pelas pessoas ansiosas de liberdade. No ano seguinte, Moa ajudaria na composição da música do bloco, criando em parceria com Samuca o clássico Aiatolá, que é cantado até hoje. Foi nessa época agitada que conheceu outro jornalista ligado ao samba de Brasília, Wilson Miranda, mais conhecido como Brother, que o levou a um ensaio da Associação Recreativa Unidos do Cruzeiro, a Aruc. Foi outro amor à primeira vista. E como amor exige dedicação, filiou-se à Aruc, tornou-se membro da diretoria, criou enredos e sambas e acabou se tornando seu presidente por vários mandatos. Hélio dos Santos, outro nome de ouro da Aruc (já foi por cinco vezes presidente da agremiação) diz que o nome de Moa hoje é interligado com o da Aruc: “É impossível falar da Aruc e de suas conquistas sem falar do Moa. Ele é uma pessoa que ajudou a Aruc em todos os sentidos, como carnavalesco, como sambista e como diretor”, afirma. Por um desse caprichos do destino, a Portela é madrinha da Aruc, e com isso Moa estreitou seus lanços com sua paixão dos anos 70. Ainda nos anos 90, trouxe os compositores da Velha Guarda da Portela para tocar no Feitiço Mineiro e acabou por ligar-se de vez com os sambistas e a diretoria da escola. Desde 1994, ano em que não houve desfile de escolas de samba em Brasília, Moa desfila no carnaval do Rio de Janeiro pela Portela, e em Brasília, quando há desfile, pela Aruc. Como presidente, nos seus cinco mandatos revelou-se um tremendo pé quente. Sob sua batuta a Aruc chegou a suas maiores conquistas. Completou 50 anos com ele na presidência, conquistou o octacampeonato e foi declarada Patrimônio Cultural Imaterial do DF. Em seu atual mandato, a Aruc conseguiu regularizar o terreno onde funciona sua sede. Não são poucas conquistas, não. Sobre o fato de não haver desfile no Carnaval deste ano, ele se diz tranquilo e espera que pelo menos no ano que vem as escolas possam desfilar: “Não creio que neste modelo atual, com 21 agremiações, mas talvez com seis escolas no grupo especial. Vamos ver e estudar com o governo, vamos achar uma solução”, promete. E, otimista, encerra nossa conversa cantando o samba de Cartola que escutou nos idos de 70: “A sorrir eu pretendo levar a vida...”

Em 2012, com o Corinthians na final do Mundial de Clubes, em Tóquio

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LUZCÂMERAAÇÃO

A regra do jogo (1939)

Clássicos do cinema

mudo ao moderno

CCBB exibe mostra com 30 filmes de Jean Renoir, um dos grandes mestres da arte cinematográfica mundial. POR SÉRGIO MORICONI

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o seu país natal, não são poucos os críticos que consideram Renoir o mais francês dos cineastas, mesmo que ele tenha se naturalizado norte-americano nos anos 40 do século passado, quando cruzou o Atlântico para evitar os constrangimentos da guerra no velho continente. O autor de incontáveis clássicos, entre eles o insuperável A regra do jogo (1939), filmou no velho e no novo continentes, e também na Índia, numa trajetória que incluiu os períodos mudo, falado e moderno, sem nunca perder a mão, o que não deixa de ser um fato extraordinário. Filho do pintor Pierre August Renoir, Jean é a implausível confirmação do provérbio “filho de peixe, peixinho é”, a ponto de outros tantos críticos afirmarem sem hesitação que ele transcendeu fron-

teiras para se consolidar como um dos grandes do cinema mundial. A carreira de Renoir, iniciada em 1925, com A filha da água, e finalizada (no cinema) em 1962, com O cabo ardiloso, de alguma forma sumariza a evolução da arte cinematográfica. O diretor ainda faria alguns trabalhos para a TV antes de vir a falecer, em 1979, aos 84 anos. Essa trajetória incomum vai ser objeto de debate (com entrada gratuita e tradução em libras), no dia 2 de março, com os críticos Pablo Gonçalo, Felipe Furtado e Júlio Bezerra, quando serão discutidas as principais características do estilo do mestre francês, destacando sua enorme influência naquilo que chamamos de cinema moderno. Em relação a esse último aspecto, não custa lembrar que o azedo François Truffaut o adorava. Quando crítico, Truffaut costumava trucidar a

Jean Renoir

maioria dos rea­lizadores franceses das gerações que antecederam a futura Nouvelle Vague, da qual faria parte, como um dos fundadores, ao lado, entre outros, de Jean-Luc Godard. Num artigo escrito em 4 de março de 1978 (reproduzido no livro O prazer dos olhos – escritos sobre cinema), um ano antes da morte de Renoir, Truffaut faz conjecturas sobre o tormento do cineasta face à hipótese de não fazer mais filmes, considerando “que podia ter feito mais e melhor”. E Truffaut acrescenta: “Mas sabemos, nós, que conhecemos seus filmes de cor e que o amamos, que foi ele quem fez


mais e melhor”. Vindo de quem veio, essa rara declaração de amor incondicional tem um enorme peso. O cinema de Renoir, embora seja identificável com a visão de uns poucos planos, não é fácil de codificar. Herdeiro de toda uma tradição das mais nobres linguagens da arte, Renoir tinha como mentores Zola, Maupassant, Flaubert, Beaumarchais (na literatura), seu pai, Lautrec, Degas (na pintura), assim como todo um patrimônio do grande teatro francês. No entanto, seu cinema não era literário, esteticista, nem teatral. Da mesma maneira, seu aludido “realismo” era carregado de onirismo, como atestam seu primeiro e seu último filmes, além de tinturas francamente influenciadas pelo cinema fantástico em quase toda a obra (algumas vezes de forma sutil, outras vezes nem tanto), especialmente em La nuit du carrefour (1932), Madame Bovary (1934) e Bas-fond (1936). Renoir dizia não gostar de seus filmes da fase muda, com exceção de um ou outro, entre eles Nana (1926). Normalmente, críticos e estudiosos se debruçam sobre seu período mais prolífico, entre 1931 e 1939, quando trabalha sobre os mais diferentes gêneros: melodrama rea-

A besta humana (1938)

lista (A cadela/1931), thriller (La nuit du carrefour/1932), farsa (Boudu salvo das águas/1932) e exame da sociedade francesa e de suas classes sociais, aspecto presente em quase todos os seus filmes realizados no país, notadamente em O crime de monsieur Lange (1936), A grande Ilusão (1937), A Marselhesa (1938), A besta humana (1938) e, claro, A regra do logo. Em todos eles, o realismo é de uma grande crueza, sem um pingo do “sentimentalismo” de René Clair, para citar aqui outro grande realizador considerado (também) o “cineasta francês por excelência” e de trajetória semelhante à de Renoir, com um percurso que igualmente vai do mudo ao falado. Clair é autor dos clássicos incontornáveis O milhão e À nós a liberdade, ambos de 1931. Todas as melhores qualidades do cinema de Renoir estão presentes no filme que é considerado a culminância da dramaturgia clássica/moderna do cinema. Detestado quando surgiu em 1939, A regra do jogo permanece, hoje, olímpica e teimosamente nas listas dos melhores filmes de todos os tempos. Nele, Renoir faz um retrato nada abonador das classes dirigentes francesas – aristocratas, burgueses, ofi-

A vida lá fora: O cinema de Jean Renoir

De 15/2 a 13/3 no cinema do CCBB (SCES, Trecho 2). Ingressos: R$ 10 e R$ 5 (meia para estudantes, clientes do Banco do Brasil e maiores de 60 anos). Classificação indicativa: 12 anos (todos os filmes). Informações: 3108.7600. Programação completa, fichas técnicas e sinopses em bb.com.br/cultura. Fotos: Divulgação

A filha da água (1925)

ciais etc – num momento histórico delicadíssimo. A Segunda Grande Guerra estava virtualmente declarada, portanto, a sátira farsesca do filme feria como uma agulha. Com encanto fresco e surpreendente, A regra do jogo tem uma complexidade inesgotável e surpreendente. A influência do teatro se faz presente no estilo de atuação dos atores e também no tratamento de “comédia de boulevard” que Renoir imprime à ação. Diretores de todas as épocas prestaram homenagens de todos os tipos a essa comédia dramática que tem a leveza e a finesse de um divertimento de Mozart, aspectos mesclados à impiedosa mordacidade típica de Renoir. A regra do jogo se inicia com uma referência a O casamento de Figaro, do compositor alemão, cuja música pode ser escutada nos créditos iniciais e finais do filme. Pois bem, em A noite americana, François Truffaut reproduz a cena em que um chef de cozinha diz a célebre e reveladora frase: “Eu suporto as dietas, mas não as manias”. O alvo da ironia era a futilidade dos ricos. Em 2002, Robert Altman praticamente refilma A regra do jogo – inclusive a antológica sequência da caçada – em Assassinato em Gosford Park. Onde está a atualidade da obra de Renoir? Poucos filmes trataram a questão da moralidade sexual com tanta perspicácia, liberdade e ausência de preconceitos. Isso inclui patrões e empregados. As subtramas com os serviçais são hilariantes exemplos disso. Para Renoir, a prevaricação não conhece barreira de classe. Os homens seriam movidos por impulsos irrefreáveis e alheios à moral estabelecida.

French Cancan (1955)

O cabo ardiloso (1962)

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CRÔNICADACONCEIÇÃO

Crônica da

Conceição

A invenção do amarelo

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o escritório de Béla Tarr, cineasta húngaro, há uma frase de Godard na parede: “Van Gogh inventou o amarelo quando queria pintar e já não havia sol”. Indagado por um jornalista sobre a frase, o diretor de O cavalo de Turim comentou: “Não há outro remédio senão passar a vida a inventar o amarelo”. Béla Tarr é um cineasta visceral. Só vi um filme dele, o acima citado, mas foi suficiente para saber quem ele é. Mas não será cinematográfica esta crônica. Será amarela, desesperadamente amarela. Não está fácil, sabemos todos. Mas se Van Gogh, na sua grandeza atormentada, teve de inventar um sol para fazer o que tinha de ser feito – pintar, pintar, pintar –, os meros mortais que somos também haveremos de encontrar um lápis de cor que seja para inventar raios de sol. O amarelo pode ser azul, roxo, vermelho, verde. O pantone é quase infinito, se infinito não for. Mesmo em Brasília, onde a cartela de cores quase se resume a meia dúzia de variações,

ao azul do céu, o verde e o cinza do chão, a cor triste do concreto, o branco dos mármores e, fora do Plano, o ferrugem da terra. Quase, não fossem a escala cromática das flores, dos azulejos do Athos, das pastilhas das fachadas antigas dos blocos das superquadras, e das explosões que vão do amarelo ao vermelho, a cada nascer e a cada pôr do sol. E de luminâncias inesperadas. As cores brotam em Brasília como um fio de mato que surge nas fendas do concreto. As cores na cidade cinza são um desespero de viver, são o amarelo de Van Gogh. E elas estão liricamente catalogadas no e-book Brasília Pantone, de Gabriela Bilá e Marília Alves, lançado há pouco mais de um ano. As duas fotografaram o Plano Piloto, do céu ao chão, e catalogaram as cores de acordo com a padronização Pantone (aquela escala das lojas de tinta). As duas autoras deram nome às cores brasilienses: cinza armado (do concreto), laranja urbi (dos ônibus urbanos), azul mar. Registraram

em fotos a paleta brasiliense, das passagens subterrâneas às luzes da noite. No Nicolândia, com a pirotecnia colorida dos brinquedos acesos, nos painéis faiscantes do Conjunto Nacional, na iluminação que anima as colunas do Itamaraty. Há cores até no cinza bruto do concreto. O tempo vai lhe impondo nuances, sujeiras, rachaduras, dando vida e movimento onde antes só havia maquete e cimento. Há cores nas escadarias das passagens subterrâneas – um suave marrom alaranjado. É marrom, mas é laranja. É triste, mas alegre. Quão sublime é o violeta dos vitrais da Igreja Dom Bosco. Quão clementes e vivos são os vitrais e o tapete vermelhos que acolhem a cripta mortuária de Juscelino no Memorial JK. Brasília inventa cores que são só suas. Inauditas, como se um estranho arquiteto criasse um projeto para iluminar o lado escuro da Lua. Só nos resta, como disse Béla Tarr, passar a vida inventando amarelo. Nem que seja cinza, mas amarelo.


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