FERNANDA SUAIDEN | C. SOUZA DE MELO MARIA JOÃO PESSOA | MORGANA RECH MARTA CORTEZÃO| PEDRO BELO CLARA ESTEVAN DE NEGREIROS KETZER | TÂNIA ARDITO
5ª Edição | NOV 2014
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SubVersa | literatura luso-brasileira |
© originalmente publicado em Novembro de 2014 sob o título de SubVersa ©
4ª Edição
Responsáveis técnicas: Morgana Rech e Tânia Ardito
Os colaboradores preservam seu direito de serem identificados e citados como autores desta obra. Esta é uma obra de criação coletiva. Os personagens e situações citados nos textos ficcionais são fruto da livre criação artística e não se comprometem com a realidade.
4ª Edição Novembro de 2014
PEDRO BELO CLARA | NO TEMPO DO AMOR | 4 MORGANA RECH |MANIFESTO DAS DISTÂNCIAS | 6 MARIA JOÃO PESSOA | PELO CAMINHO |12 ESTEVAN DE NEGREIROS KETZER | SOBRE A INFELICIDADE DE ESCREVER: VILA-MATAS E COMPANHIA | 13 MARTA CORTEZÃO | ATREVA-SE | 15 TÂNIA ARDITO | HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA | 16 FERNANDA SUAIDEN | EU ESTOU POR UM FIO | 23 C. SOUZA DE MELO | JANELA | 26
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NO TEMPO DO AMOR PEDRO BELO CLARA LISBOA, PORTUGAL.
No tempo do amor eram alvas todas as rosas, azuis os horizontes de promessas e canções, verdes os céus dum oceano sem fim, doiradas as aves que a cada entardecer ao sol retornavam. No tempo da saudade todas as rosas são pedras.
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MANIFESTO DAS DISTÂNCIAS
MORGANA RECH PORTO ALEGRE, RIO GRANDE DO SUL, BRASIL
Fica terminantemente proibido o afastamento do namorado e da namorada por mais de 20 (vinte) dias, a contar das lágrimas da ida até o momento do reencontro. Em casos de obrigação de afastamento por motivo profissional, o afastado fica livremente convidado a enviar mensagens de amor ao remanescente, que de modo geral deve responder satisfeito e fazer o afastado sentir-se bem, mesmo longe, preferencialmente aliviando-lhe a culpa de ter se afastado. O afastado fica carinhosamente instruído a não sobrecarregar o remanescente de preocupações e ciúmes desnecessários, poupando-o da dor do desconhecido e do medo de perder o seu amor durante o afastamento. O remanescente também não deve criar motivos propositadamente agoniantes no afastado, e colaborar durante o período da espera com compreensão, carinho e sobretudo bastante saudade.
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Em casos de noivado, os dias de afastamento podem se estender até o período máximo de 30 (trinta) dias, comprometendo-se afastado e remanescente a aproveitarem o momento para cuidar de si e da sua individualidade antes da experiência do casamento, preferencialmente tendo preparado uma surpresa agradável. Todas as recomendações acima descritas a respeito das investidas no contato amoroso, mantémse. As empresas públicas, privadas e mistas estão terminantemente proibidas de contratar noivos ou noivas para trabalhar em outra cidade, se ambos não estiverem de acordo. Em caso de discórdia amorosa em relação ao local
de residência, a instituição
contratante
fica
responsável por recolocar o profissional em cargo semelhante ou superior ao antigo. Em caso de grandes amores dificultados pela distância, poderá ser ativado o aviso de calamidade afetiva, em que as imobiliárias, as agências de emprego e inclusive os bancos públicos e privados devem contribuir e facilitar a vida do casal onde quer que queiram fixar as suas vidas, impedindo que a rotina árdua de adaptação desgaste o relacionamento. Em casos de amores que se comprove grande dispêndio de energia, dinheiro e tempo em função de sucessivos afastamentos, em que ambos estão deslocados de sua residência, mesmo tendo sido acionado o aviso de calamidade afetiva, a natureza, os búzios, os autos de fé e os anjos da guarda devem unir-se numa só força e conspirar a favor do relacionamento até quando ainda existir amor, mesmo que diminuído pela luta diária que é a vida.
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PELO CAMINHO MARIA JOÃO PESSOA LISBOA, PORTUGAL
Pelo caminho, fui engravidando de desilusões e desesperanças, deixando rastos de incertezas e migalhas de falsidades, restando os bolsos mais leves para a caminhada. Amadureci entretempo desejos, colhi silêncios das mãos do tempo e percebi, como o poeta, que só se ganha a viagem, que o castelo no alto da montanha é feito com as pedras do caminho. Que o tempo não se ganha, e quando passa, apenas pisa connosco o mesmo chão na busca interminável da estrada para o nosso coração.
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SOBRE A INFELICIDADE DE ESCVREVER: VILA-MATAS E COMPANHIA
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ESTEVAN DE NEGREIROS KETZER PORTO ALEGRE, RIO GRANDE DO SUL, BRASIL
Me deterei tão somente em uma breve passagem de Bartleby e companhia, do escritor espanhol Enrique Vila-Matas. Tão coerente e prazeroso em seu processo de escrita, fica nítido o quanto orgulhoso está de sua obra repleta de escritores do “não”. Como veremos, o escritor espanhol mais celebrado da atualidade, saboreia o estudo minucioso e inventivo da famigerada tradição do “não” na literatura. A potência do delicado “prefiro não fazer” (I prefere not do) exaltada na história de Bartleby, de Herman Melville, um homem que preferia não fazer o que lhe fosse mandado em um escritório de advocacia em Wall Street. Melville não ficou conhecido por este conto durante sua vida. Talvez daí seu fracasso tenha sido tão celebrado pela crítica tardia,
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como
sempre
acontece
com
relação
aos
escritores.
Este
reconhecimento tardio de suas criações, como o próprio Vila-Matas aponta, se dá justamente na mudança de sua prosa, pois Melville decide se dedicar à vida urbana, deixando de lado suas aventuras nos mares do sul. Foi a partir da decisão de ser um escritor “propriamente dito”, seguindo uma tradição típica dos lampejos místicos da famosa década de ouro da literatura estadunidense, em 1850 (dos autores Emerson, Thoreau, Hawthorne, Whitman). O discurso tão reconhecido do escritor representando as “antenas da sociedade”, na qual somente homens de uma pura e distinta sensibilidade são possuidores, tornou-se o elemento basilar da afirmação de uma identidade da cultura burguesa e sua gradual elitização. O que tornou Melville tão especial foi justamente seu caráter diferencial diante de um tema cotidiano: a negação de qualquer tarefa executiva em um ambiente de trabalho (não farei as comparações ao grupo Occupy Wall Street e a possibilidade de sermos aviltados por um ócio altamente mobilizador). Fica evidente que as viagens para os mares do sul chamam a atenção da classe média em ascensão, talvez muito mais, em um primeiro momento, do que a brancura assustadora da baleia Moby Dick. Tomada esta afirmativa, gostaria de pensar o que parece ser a bandeira de Vila-Matas em Bartleby e companhia. Uma passagem me tomou de assalto, na página 23 da edição brasileira: “Na verdade, a doença, a síndrome de Bartleby, vem de longe. Hoje chega a ser um mal endêmico das literaturas contemporâneas essa pulsão negativa ou atração pelo nada que faz com que certos autores literários jamais cheguem, aparentemente, a sê-lo.” A questão que me coloquei é porquê o não escrever literário seria justamente uma pulsão de morte? Que implicações danosas ela traz? Para um defensor da literatura sua resposta parece óbvia, mas para uma pessoa comum, destituída do conhecimento dos signos acadêmicos e avessa aos deleites da alta
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cultura, essa afirmação parece justamente sem sentido. O prazer de um literato (ainda um prazer para manter a distinção de Roland Barthes entre prazer, completo, e gozo, parcial) estaria justamente no meandro dos pensamentos, na exposição da linguagem de forma a que esta jamais seja comunicativa, mas exigência de uma produção de bem infinito, pluridade de significados, uma crítica sobre o mal estar da modernidade e seus deletérios avanços que destroem as relações humanas. Pensando com a tese proposta por Vila-Matas não haveria nada mais letal que deixar de escrever, portanto, essa afirmativa nega por completo qualquer outra coisa que um “escritor” possa de fato realizar de melhor em vida. Conhecer as trajetórias de Franz Kafka, André Gide, Paul Valéry, Ludwig Wittgenstein e Robert Walser pode não apenas nos divertir, mas também auxiliar na real reflexão de que eles tinham alguma coisa muito melhor para fazer do que passar a vida inteira dedicada à literatura. Essa constatação não parece tão clara em VilaMatas. Esses escritores parecem ter mudado o rumo de uma trajetória aparentemente idealizada devido à incidência da literatura em algum nível de suas vidas. Essa mudança drástica na vida de um ser como o escritor parece ser apenas uma entre muitas outras atividades da vida humana desejada (Kafka queria se tornar jornalista em Berlim; Gide ansiava escrever um livro que nunca escreveu; Valéry cria um personagem avesso a todo o livro que não seja importante para sua vida; Wittgenstein publica dois livros em vida e resolve se tornar jardineiro; e Walser após muitas atividades discrepantes, entre elas a subserviência de um mordomo, termina por passar seus últimos anos de vida internado em um manicômio). Habita em cada um deles um homem completamente comum, incidental, em nada especial. A literatura nesses casos parece ser justamente o desejo de não ser comum, narrar uma história mais real do que o próprio real,
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ultrapassando inclusive o desejo de viver de um jeito simples. O que seria a salvação para Vila-Matas torna-se a desgraça para a vida pessoal dos escritores. Escritores com forte temor de se tornarem brancos, neutros, postos em pedestais de marfim que estão ao lado de títulos acadêmicos e prêmios literários de altíssimo mérito, certamente (ainda que as bancas julgadoras sejam, muitas vezes, escaladas por incompetentes e leitores diletantes, como bem denunciou Thomas Bernhard). A questão que fica parece ser, ao contrário de uma pulsão de morte, justamente a exigência por uma pulsão de vida. Talvez aqui a ingerência para tratar desse assunto seja menos especulativa, mas talvez mais conflituosa do que imaginávamos, pois, afinal, estamos diante de um desejo, de uma possibilidade em meio ao caos e talvez, mais diametralmente iconoclasta, há o desejo de não receber nem mesmo o rótulo de ser um formidável escritor. Escrever pode, nestas circunstâncias, ser menos auspicioso e tendencioso à formação de uma realização pessoal, ser mais penoso e difícil do que estar inscrito em uma cena literária. A possível inovação da escrita como um elemento de entretenimento e glamour contraria em muito um viver galgado nos afazeres
ordinários
da vida
cotidiana
com
seus
desafios
mais
“concretos” (onde comer e respirar também são importantes!). Não escrever é a realização de um desejo, ainda mais além do princípio do prazer, mais além do que o “prefiro não fazer” de Bartleby, ao evitar o desprazer a qualquer custo, mesmo que com isso a literatura deva perecer e dar lugar a outra coisa mais congruente com nossas possibilidades internas. Isso é, no mínimo, aprender a respeitar um limite que se coloca a cada um de nós.
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ATREVA-SE MARTA CORTEZÃO TEFÉ, AMAZONAS, BRASIL
Atreva-se! Vire a página. Reinvente-se. Seja audácia, Imprudência, Alvoroço, Eloquência. Atreva-se! Perca a linha. Refaça-se. Seja brisa, Tempestade, Alquimia, Vanidade.
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Atreva-se! Arrisque dribles. Precipite-se. Seja Ícaro, Desobediente, Afoito, Inconsequente. Atreva-se! Esqueça o medo. Fortaleça-se. Seja rochedo, Imponente, Colossal, Envolvente. Atreva-se! Renuncie mágoas. Desapegue-se. Seja pássaro, Renascente Fênix. Poente. Atreva-se! Pinte o sete. Liberte-se. Seja cromático, Multifacetado, Crepuscular, Rio-mar.
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Atreva-se! Faça mudanças. Dinamize-se. Seja confiança, Mutante, Temporão, Desafiante. Atreva-se! Lute sempre. Revolte-se. Seja estrela, Radiante, Constelação Gigante.
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HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA TÂNIA ARDITO SÃO PAULO – PORTO
Júlio César conheceu Cleo em uma viagem de negócios, ele estava encarregado de solidificar uma sociedade com um empresário conhecido como o rei da cerveja, pai da dita moça. Apesar de bonita, Cleo não caiu nas graças de César – o poderoso, que preferia ser chamado só pelo segundo nome. Já que para ele, Cleo não passava de uma herdeira mimada e meio boba com aquela franjinha. Sem se conformar em ter passado meio despercebida e desafiada pelas amigas a fisgar o executivo, Cleo decidiu conquistar o mais novo sócio da família (segundo consta ela já tinha arrastado as asinhas para alguns outros sócios do pai, mas nenhum tão importante e poderoso quanto César). O pai, orgulhoso do súbito interesse da moça pelos negócios, que até o momento, junto com os irmãos, apenas cuidava de gastar a fortuna da família, resolveu que dentre os herdeiros, Cleo, seria a
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escolhida para estar à frente do império formado pelas inúmeras empresas. A herdeira, no seu terninho chic para ganhar um ar mais sério, tratou de se apróximar e conhecer melhor os negócios dos sócios, aliás, tudo o que ela queria era conhecer o négócio de César, que por sua vez viu o seu sossego acabar, já que com um divórcio nas costas e dois filhos já feito homens não estava para se enroscar. Entretanto, esqueceu-se da prudência quando Cleo apareceu em seu quarto de hotel, com dois botões do terninho abertos, deixando entrever uma interessante renda e dizendo que adoraria experimentar a maciez do tapete. Como protagonistas de um filme hollywoodiano iniciaram um ardente romance, que a cada cena ganhava contornos mais sérios, pois a moça percebeu que se amarrasse de vez o bonitão juntaria fortunas e acumularia um grandioso poder. Depois de tanta insistência da amante, César finalmente a levou para uma festa de família, o que foi um erro crasso, pois lá estava o primo Marco António, sorrindo com todos os dentes para Cleo, que correspondia com olhos cobiçosos. Não demorou muito para César ser colocado para escanteio, Cleo descobriu que o prestígio de César estava em declínio na medida inversa de Marco, além do mais o rapaz era mais jovem e charmoso. Porém, a história de Cleo com Marco foi daquelas entre tapas e beijos, acabando a pobrezinha com uma depressão após saber que Marco se casara e estava feliz em lua-de-mel na Itália. Mas, como a avó da moça costumava dizer, não há mal que sempre dure e este acabou até que rápido quando em um ensolarado domingo, a moça viu o motorista da família lavando o carro. Esquecida das esperanças do pai de vê-la comandando o seu império de cerveja, resolveu que seria uma boa passar as férias na Grécia, a ex-futura imperatriz partiu para um cruzeiro pelo Mediterrâneo, onde encontrou o seu verdadeiro amor, um biólogo especialista em serpentes venenosas. Quanto a César, acabou
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morrendo de um ataque cardíaco fulminante quando viu o filho participando de um abominável reality show, sem sequer conseguir dizer as suas últimas palavras.
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EU ESTOU POR UM FIO ______________________________________
FERNANDA SUAIDEN LONDRINA, PARANÁ, BRASIL
Eu estou por um fio A paciência Por um fio A calma Por um fio Um fio de náilon Um fio Que parece nunca estourar Um fio Para destruir a casa Para sair gritando Para te surrar a cara Um fio Para sair com uma automática Pela rua
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Pela escola Pelo cinema Atirando Por um fio Para me libertar Mas o fio nĂŁo se rompe E fica me dependurando de um lado para o outro Enquanto o banquinho caĂdo Goza.
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JANELA C. SOUZA DE MELO BELO HORIZONTE, MINAS GERAIS, BRASIL
Olho pela janela. Sem luz nos postes, sem lua alguma. A rua inteira no silêncio. Não há vento, ou transeunte, Não há nenhuma distração. Não chove. Olho para a janela. E dentro dela, eu Vejo a morte.
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Edição e revisão: MORGANA RECH E TÂNIA ARDITO
Recepção de originais: CONTATO.SUBVERSA@GMAIL.COM Diretrizes para publicação: WWW.CANALSUBVERSA/DIRETRIZES
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