L E I T U RA N Ã O R E C O M E N D A D A A M E N O R ES D E 1 8 A N O S
índice
mercado..................................04 hiv.............................................06 fé..............................................10 top 10.......................................14 crack........................................18 coletores...................................22 trans..........................................24 swing........................................28 pílula.........................................32
EXPEDIENTE Revista Ensaio - ano I - ed.01 Revista Ensaio é uma publicação dos alunos do 6º, 7º e 8º períodos de Jornalismo da Faculdade Pitágoras Divinópolis/MG, da disciplina Jornalismo Impresso Aplicado. contato.revistaensaio@gmail.com
Coordenação Editorial: Prof. Ricardo Nogueira Coordenação de Fotografia: Prof. Douglas Fernandes
Uma das grandes utopias do Jornalismo é a independência: aquela busca desenfreada pela liberdade em reportar o que quer que seja, sem a preocupação de ferir interesses comerciais e financeiros, mantendo os princípios éticos e de interesse público. Essa é a proposta da Revista Ensaio, que chega a sua primeira edição repleta de reportagens especiais, bem diferentes do jornalismo diário ou dos infomerciais, que estamos cada vez mais acostumados a ler. Em época de excesso de informação ou de “mensagens líquidas”, nosso objetivo é ter perenidade. Por isso optamos por textos longos, ricos em detalhes e informações úteis e emocionantes. Ao pretendermos buscar a independência, é bom deixar claro ao leitor que compreendemos isso diferente de imparcialidade: ao procurar ver a realidade com os olhos de nossos personagens, saímos do lugar-comum e buscamos oferecer um novo jeito de produzir e consumir informação. Uma forma que encanta, agride, provoca, mas, antes de qualquer coisa, cumpre seu papel social: informa. Também não queremos convencer: isso não é papel do Jornalismo! O intuito é apenas informar, de modo diferente, mas sem perder a essência da produção, apuração e redação, que são o tripé de nossa atividade. Impossível não ressaltar o empenho de toda a equipe envolvida nesse projeto e afirmar, com veemência, que esse projeto só sai do no papel graças ao trabalho verdadeiramente em equipe desenvolvido por estes futuros profissionais da informação. Não conseguiríamos também dar vazão aos materiais produzidos sem o apoio dos parceiros que acreditaram no projeto piloto e nos apoiaram, sem a pretensão de pautar ou interferir nas reportagens da revista. A eles nossos agradecimentos pelo apoio e, sobretudo, pela maturidade de entender que a veiculação de uma marca em um bom produto independe de uma matéria paga. A todos que contribuíram com suas histórias, seu suor, sua “sola de sapato”, muito obrigado! A semente está plantada. Que ela dê bons frutos e nos conecte a realidades invisíveis para tantos, mas vivenciadas por outros todos os dias. Até os próximos desafios!
Reportagem: Laiana Modesto, Giovane Abreu, Pollyanna Martins, Thulio Oliveira, Luiz Felipe Enes, Lorrayne Andrade, Allef Rundynelle, Fabrício Salvino, Geovanna Brittes, Marcelo Lopes, Fabiano Máximo, Nayara Lopes, Paloma Guimarães, Sílvio Júnior.
Logo: Prof. Marcelo Tumati Capa: Prof. Marcelo Tumati Comercial: Arlete Santos, Irwin Queiroz, David Noronha, Carolina Policarpo, Paulo Coelho, Marcelo Santos, Débora Cabral, Kizzi Almeida.
Revisão: Prof. Ricardo Nogueira, Prof. João Valério Administrativo: Paloma Guimarães, Bruno Mendes, Germano SanFotografias: Fabiano Máximo, Fa- tos, Rafael Castro, Juliana Lelis. brício Salvino, Fernando H. Oliveira, Prof. Douglas Fernandes Impressão: Gráfica Del Rey
Direção de Fotografia: Fernando H. Oliveira
Diagramação: Daniel Michelini, Tiragem: 3000 exemplares Raphael Rocha, Prof. Ricardo Nogueira Agradecimentos:
Produção de Fotografia: 3º e 4º périodos de Jornalismo
Arte: Raphael Rocha, Willian Neves
Editores: Bárbara Almeida, Daniel Fotos Capa: Fernando H. Oliveira / Michelini, Luiz Felipe Enes, Sílvio Prof. Douglas Fernandes Júnior, Prof. Ricardo Nogueira
TEXTO FABIANO MÁXIMO FOTO FABIANO MÁXIMO FABRÍCIO SALVINO
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istória e modernidade andam lado a lado em uma obra bonita por fora e valorizada por dentro, principalmente pelas pessoas que ali trabalham e frequentam. A correria e a falta de tempo às vezes limitam nossas atividades e nos impedem de conhecer novos locais, novas realidades. Balela! Boa comida, iguarias, produtos diversos e itens que remetem à vida do campo, além, claro, da velha hospitalidade mineira: tudo isso pode ser encontrado bem no centro de Divinópolis, no Mercado Municipal. Em 1º de julho de 1961 o Mercado Municipal de Divinópolis surgiu como uma grande obra arquitetônica para a época. A estrutura moderna e arrojada foi uma novidade: seu formato chega a lembrar o antigo estádio Maracanã. A obra se destacava tanto que uma reportagem de “O Globo” de março do mesmo ano elogiou a construção do moderno estabelecimento chamando-o de “a mais arrojada obra arquitetônica do gênero em todo o Brasil.” Depois do lançamento da pedra fundamental, em 1957, as obras foram iniciadas em junho do ano seguinte pelo engenheiro e prefeito da época, Luis Fernandes de Souza, sendo inaugurada na gestão de Sebastião Gomes Guimarães.
Hoje, alguns comerciantes reclamam do descaso da prefeitura com o Mercado. Citam o condomínio caro, às vezes a falta de limpeza e segurança ao redor do espaço, principalmente depois que a delegacia de Polícia Civil, que ficava em frente, foi transferida de bairro. Eles reclamam também que algumas lojas poderiam ser mais bem aproveitadas. José da Silva, conhecido também como o “Zé”, da “Pastelaria do Zé”, é o síndico do Mercado e, embora não quisesse falar muito, disse que, entre reformas e obras de melhorias, o estabelecimento hoje conta com 54 lojas e 54 boxes, praticamente todos alugados. Mas não foi o que registramos em algumas voltas dentro do mercado: algumas lojas foram reformadas recentemente, mas há muitas outras fechadas, com cara de poucos visitantes há muito tempo. Ainda de acordo com o síndico, aos sábados ocorrem shows que costumam levar público ao local.
Boa parte dos comerciantes, especialmente os mais antigos, se acostumou com o Mercado, viveu o seu auge e hoje continua “enclausurada” na decadência do local. Márcio de Resende, ou simplesmente Marcinho, do “Marcinho Verduras”, está estabelecido no mercado há quase 40 anos. “Aqui é de onde tiro o sustento da minha família. Eu não tenho nada a reclamar do Mercado. Antes era praticamente só aqui, não tinha esse tanto de sacolão e supermercados como tem hoje,” conta. Desde sua criação, o Mercado Municipal era o centro comercial da região, atraindo pessoas de vários lugares. Com o surgimento de sacolões e supermercados, houve queda no fluxo de pessoas, que passaram a fazer compras em outros lugares da cidade. Entretanto, muitas pessoas mantêm o hábito de ir ao Mercado, principalmente aos sábados, comprar produtos que nem sempre encontram nos grandes estabelecimentos. “Eu sempre venho aos sábados aqui, há mais de 20 anos. Eu não gosto de comprar verduras nos supermercados. Além do preço, a qualidade aqui é melhor,” explica Milton Batista, aposentado.
Aqui é de onde tiro o sustento da minha família. Eu não tenho nada a reclamar do mercado. Antigamente era praticamente só o mercado, não tinha esse tanto de sacolão e supermercados como tem hoje. Márcio de Resende - comerciante Muitos dos frequentadores são fiéis ao Mercado, para comprar artigos ou sentar à mesa de um bar e bater papo com velhos amigos. A tradição de estar ali, para essas pessoas, é algo sagrado, e há quem diga que o mercado faz parte da própria vida. “O Mercado é tudo pra mim. É de casa pro Mercado, do Mercado pra casa. Se eu saio na rua é para ir ao Mercado”, conta empolgado o aposentado Alnil Oliveira. O também aposentado Antônio Nelson pergunta: “Você já comeu o pastel lá no Zé? É o melhor da cidade!” Em sua história, auge e decadência. O importante na vida do Mercado é a presença de pessoas simples que o fazem funcionar. Para a maioria delas é a sua segunda casa e é importante a manutenção de um local tão marcante. Mesmo que ele hoje não seja o que foi no passado, é fundamental para suas vidas. Atualmente o Mercado, que já foi o maior centro de compras de Divinópolis, tem em sua maioria bares, que são frequentados, em grande parte, por clientes antigos. Muitos têm vergonha até de dizer que estão ali, não gostam de falar e muito menos de aparecer em fotos ou filmagens. São os remanescentes de uma história muito importante da cidade, mas que, aos poucos, vão desaparecendo, assim como o brilho que o Mercado já teve.
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TEXTO THULIO OLIVEIRA FOTO F.H.OLIVEIRA
Medo. Essa era a sensação de Leonardo* ao passar em frente a um Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA). Mas, em abril de 2015, a história foi diferente. Se antes o medo tomava conta e o impedia de fazer o exame, naquele mês algo o impulsionou. “Passei em frente e vi a placa. Suspeitava (que tinha Aids), mas tinha medo do resultado. Foi por impulso”, diz. Após colher sangue para o teste, foram mais 15 minutos de espera para saber o resultado. Tensão. Foram os 15 minutos mais longos e importantes de sua vida. Ele foi chamado para saber o resultado. A suspeita havia sido confirmada: Leonardo era portador do vírus HIV. Não bastasse o impacto de ser apresentado ao vírus, ele descobriu também ser portador de sífilis. A doença já estava no terceiro estágio de desenvolvimento e também poderia significar a morte do rapaz. Não tinha volta. Leonardo não poderia mais voltar no tempo e evitar a doença. Após aquele diagnóstico, o impacto do resultado ainda o incomodava. Então ele decidiu levar uma vida de forma despreocupada, mas com riscos. “Saía quase todos os dias, bebia muito e até comecei a usar drogas pesadas. O primeiro mês foi bem difícil”, conta. “Não fiquei desesperado, mas vivi intensamente, como se o mundo fosse acabar amanhã”.
da sífilis, Leonardo descreve a experiência como um crescimento espiritual. Antes mesmo desta reportagem ele revelou estar receoso para a entrevista. Mas, no mesmo dia, mudou o conceito. “Pensei: ‘nossa, parece que eu mesmo tenho preconceito comigo’. E acredito que eu tenho que ter esta aceitação”, diz. Ele também conta que o processo de conviver com a doença é uma espécie de descoberta diária de uma nova etapa para procurar entender o que significa a Aids. Mais lúcido quanto à doença (que está controlada) e aos novos cuidados com a saúde, Leonardo reconhece que nunca teve cuidado com a prevenção sexual: “Nunca fiz exames periodicamente. Sempre tive informação, mas nunca pensava que iria acontecer comigo. Não gostava de usar preservativo. Então, de certa forma, já esperava. Sabia que estava acontecendo alguma coisa.”
A vaidade foi uma característica que Leonardo precisou deixar de lado para encarar a doença. Ele chegou a emagrecer 15 quilos e ter os sentidos afetados. Se olhar no espelho se tornou uma tarefa árdua. “A sífilis prejudicou minha visão. Não enxergo bem. Tive ainda queda de cabelo. Sempre fui muito vaidoso e me ver daquele jeito me deixou muito para baixo”, explica. Aceitação. Foi somente a partir do segundo mês que o rapaz começou a olhar para o HIV com outros olhos. As consultas com médicos e psicólogos do CTA o ajudaram a amadurecer. “Eu mesmo tinha muito preconceito”, confessa. Após entender melhor sobre a Aids, Leonardo passou a fazer promessas e decidiu mudar os hábitos. Alimentação saudável e prática de atividades físicas estão entre os seus propósitos. Após seis meses convivendo com o vírus e curado
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O Ministério da Saúde estima em 734 mil o número de brasileiros portadores do HIV. Os soropositivos ainda enfrentam muitos preconceitos, mas dizem levar uma vida normal.
Ele não é a única vítima deste descaso com o cuidado nas relações sexuais. Segundo o Ministério da Saúde, desde o início da epidemia, em 1980, até junho de 2012, o Brasil tem 656.701 casos registrados de Aids (condição em quem a doença
já se manifestou). Ainda de acordo com o levantamento, a forma mais comum de transmissão entre os maiores de 13 anos é a sexual. Nas mulheres, 86,8% dos casos registrados em 2012 decorreram de relações heterossexuais com pessoas infectadas pelo HIV. Entre os homens, 43,5% dos casos se deram por relações heterossexuais, 24,5% por relações homossexuais e 7,7% por bissexuais. O restante ocorreu por transmissão sanguínea e vertical, passada de mãe para filho. Soropositivos têm uma doença crônica, mas sofrem o preconceito de muitas pessoas. “A doença veio à tona entre 1980 e 1990 e carrega o traço de que ‘quem pega vai morrer’. É um pré-conceito que muitos pais passam para os filhos e que a mídia também trata como uma coisa banal”, diz Leonardo. Talvez exista um soropositivo bem ao seu lado. E quando terminar de ler esta matéria, você mesmo pode se identificar tão preconceituoso que nem imaginava.
caminho da felicidade Leonardo tinha uma difícil missão: contar para os familiares mais próximos que era um portador. Ele encarou o desafio e contou para poucos, mas importantes familiares. O retorno foi excelente. “A aceitação deles foi a melhor possível. Tive apoio total e não tiveram nada contra. Foi o que mais me motivou na luta contra a Aids”, conta. O mesmo aconteceu com os amigos. Ao todo, apenas seis sabem que ele é soropositivo. Alguns são de longa data e outros nem tanto. Segundo Leonardo, o que o impede de falar para todos é o preconceito que poderia sofrer de pessoas com quem conviveu parte da vida. “Aos que contei, nenhum virou a cara para mim. Mas, acredito que, se outros soubessem, iria acontecer um preconceito”, afirma. Sobre relações, ele conta que segue uma vida normal, mas que ainda não se acha pronto para fazer sexo com outras pessoas. Tudo se resume a preliminares e com uma condição: somente com o uso de preservativos. “Mantenho relações sexuais, mas não completas. Ainda não tive a cabeça e a coragem de fazer sexo por completo”, relata. Muitos se perguntam se uma pessoa que tem HIV ainda se considera feliz. E Leonardo não hesitou em responder esta pergunta: “Minha vida
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é bem mais saudável do que antes de saber que eu tinha contraído o vírus. Vivo bem melhor do que antes. Sinto arrependimento porque penso que poderia não ter que passar por estes cuidados pelo resto da minha vida, mas não é algo pelo qual fiquei deprimido. Se tivesse a oportunidade de voltar atrás sabendo que a minha personalidade seria a de atualmente, voltaria. Mas se fosse a personalidade que tinha antes de ter o HIV, preferia continuar da forma como estou”, finaliza.
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Mesmo em diferentes formas, religião é refúgio para solucionar problemas pessoais TEXTO POLLYANNA MARTINS FOTO F.H.OLIVEIRA
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oincidência ou não, você entra no terreiro de umbanda e começa a bocejar. Depois chegam os arrepios e, por fim, uma dor enorme no pescoço. O local é pouco iluminado. Imagens, velas, tambores e bancos completam o ambiente. Pra ser atendido tem que chegar cedo, pois 40 fichas são distribuídas. A sessão é aberta com uma leitura de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec. A Prece de Cáritas é feita e, então, começam os cânticos para evocar os pretos velhos, exus, caboclos, pombagiras e outros espíritos trabalhadores da casa. O frequentador pode escolher ser atendido do lado de fora, onde os rituais são feitos, ou em uma salinha escura, atrás da sala de atendimento. Após minutos de espera e uma conversa com quem já frequenta o local há tempo, decido ir ao fundo, pois “ele [o guia] é ótimo, você vai gostar”. Entro na sala sem nenhuma iluminação e recebo um cumprimento: “boa noite, moça”. O exú que me atende segura os meus pulsos, fica alguns segundos calado e diz: “é, o trem tá feio né, moça?” Afirmo com a cabeça e o atendimento continua. A Umbanda é uma religião brasileira que juntou elementos de outras, como o catolicismo, espiritismo, candomblé e a cultura indígena. Criada no Rio de Janeiro por Zélio Fernandino de Moraes em 1908, a Umbanda tem como princípios ajudar o próximo e a fé em Deus. Cultuam pretos velhos, exus e caboclos. Cada entidade tem o seu canto.
A entidade que me atendeu chama-se “Zé Pelintra”. Ele começa a soprar meus ombros e sinto como se não comandasse mais meu corpo. Na sala há sempre um ajudante. Ao ver minhas pernas bambearem, ele auxilia e sussurra em meu ouvido: “não precisa cair, porque a carcaça é boa”. O exú está na minha frente dizendo algo para o espírito que, segundo ele, está me acompanhando há um tempo. Meu corpo se enrijece, minha cabeça vira para o lado direito e meu pescoço “trava”. Nenhum membro do meu corpo se mexe enquanto um espírito toma conta do corpo do ajudante. O pai de santo M.G.S. encabeça um terreiro em uma pequena garagem. Segundo ele, as pessoas vão ao centro à procura de “socorro”. A religião trabalha com a mediunidade e é através da incorporação que esta ajuda é dada. Muitas vezes, ela é feita por meio dos trabalhos, conhecidos popularmente por “macumba”. “Os materiais utilizados são definidos pelas entidades, de acordo com a necessidade de cada um. O trabalho ajuda a limpar e controlar a energia ao nosso redor. Não cobramos porque o que vem de Deus é dado de graça”, explica o pai de santo. O exú que me atendia conversava com o espírito incorporado no ajudante. Eu acompanhava tudo como mera espectadora. Sem conseguir me mexer, apenas rezava e pedia à Deus para tudo acabar logo. “Vai para a luz, você precisa de ajuda”, dizia o exú. “Ela tem muita luz, para de atrapalhar a vida dela”, retrucou o espírito. A conversa do exú com o espírito durou cerca de dois minutos. Mas pareceu uma eternidade.
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Também usando cantos e danças para chegar a Deus, ou Olorum, como é chamado, o Candomblé se diferencia da Umbanda na forma de cultuar seus orixás. A incorporação é usada na religião também para ajudar ao próximo. Vou à casa do zelador de santo, Galvoni Nogueira. Ao entrar é possível sentir uma energia diferente. Da entrada é possível ver o local onde as reuniões são realizadas, no quintal. Vestido de branco, com um turbante na cabeça e colares africanos no pescoço, ele me recebe com um largo sorriso. Na residência há muitas ervas, artigos de decoração que remetem à África, além de tambores e berimbau. Galvoni está no Candomblé há 22 anos. A iniciação do zelador de santo foi na Umbanda, quando ainda era garoto. Ele conta que a mediunidade avançada, aos sete anos de idade, assustou a família: “Metade da minha família é católica e a outra metade é evangélica, então eu meio que sou a ‘ovelha negra’. Minha mãe me colocou no catecismo, mas eu era cismado com aquela luz que nunca apagava na imagem do Espírito Santo, até que um dia a professora me pegou abrindo a imagem para saber o que era aquilo e então não me aceitaram mais na igreja.” No Brasil, apenas 16 orixás são cultuados. São eles que definem quem será o(a) zelador(a) de santo que os cultuará na Terra. Galvoni chegou a ser enviado ao seminário aos 12 anos, mas a estadia durou apenas quatro meses. Após esse período, ele começou a frequentar um centro de Umbanda e depois foi para o Candomblé, quando descobriu a diferença entre as religiões. Ele relembra que, como tinha a mediunidade muito forte, passava mal ao final de cada sessão no terreiro de Umbanda. A indicação para ir para o Candomblé veio de um pai de santo. “A Umbanda é uma religião nova, criada no Brasil. Já o Candomblé vem de muitos anos antes de Cristo. Para nós, nosso criador é o Olorum, que é Deus. A gente acredita na força de todas as energias juntas ligadas aos orixás”, explica.
As reuniões são realizadas às segundas-feiras, quinzenalmente. O atendimento foi restrito, pois, segundo o zelador de santo, muitas pessoas procuravam a religião por problemas banais. Ele ressalta que, ao participarem de uma reunião no Candomblé, as pessoas vão acompanhar um ritual de louvor feito aos orixás e exús, feitos com cantos, danças e orikis. “Quantidade não é sinônimo de qualidade dentro de uma casa. Às vezes a pessoa sai com a sensação de que não teve o problema resolvido. Aqui não é uma casa de comércio, não se vende fé. A pessoa não vem comprar um marido, a saúde, a união familiar. Muitas pessoas vêm até aqui e falam que só vão ter fé depois que conseguirem isso ou aquilo, e aqui, como em todas as outras religiões, é uma casa de ensinamentos”, pondera.
IGREJA MESSIÂNICA MUNDIAL DO BRASIL Continuando a busca por uma religião que acalme meus anseios, vou à Igreja Messiânica Mundial do Brasil. Duas senhoras me recebem na porta com um amor maternal no olhar. Digo que estou à procura do ministro. Elas informam que ele já está a minha espera. Entro em uma sala com algumas cadeiras e bancos para quem busca receber o seu johrei. Imagine passar anos a fio se medicando contra uma doença e não curá-la? Agora, imagine se alguém dissesse que você pode ser curado por meio de uma troca de energias? A princípio pode parecer inacreditável, mas foi o que acorreu com Rodrigo Prata Valério, ministro da Igreja Messiânica Mundial do Brasil. Ele nasceu com problemas cardíacos e os médicos avisaram a mãe que o filho teria, no máximo, quatro anos de vida. Nesse período ela foi apresentada ao método Johrei, utilizado pela Igreja Messiânica. Rodrigo foi curado e os médicos não souberam explicar os motivos. Desde então não precisou tomar mais os remédios. Além disso, o pai, que era alcoólatra, arrumou um emprego e a mãe foi contemplada com uma casa popular. A crença usa a ajuda ao próximo como ligação direta com Deus. Na sede da igreja em Divinópolis, é comum ouvir depoimentos de cura de doenças, mudanças profissionais e pagamento de dívidas dos frequentadores. Porém, isso se deve a uma série de johreis, ou orações feitas na religião. Mas, para que o desejo seja alcançado, o inte-
ressado deve passar pelo momento de troca de energias: você se senta de frente para o membro da igreja, faz o pedido mentalmente, deixa suas mãos livres e, em seguida, com as mãos em sua direção, ele começa a fazer a oração, sem trocar uma palavra sequer. O processo, nas palavras de Rodrigo, é a “transmissão da luz de Deus para purificar o espírito.” A religião foi criada em 1945 pelo japonês Mokiti Okada, cujo nome religioso é Meishu-Sama. Além do Japão, existem Solos Sagrados no Brasil e na Tailândia. Em Divinópolis, os primeiros adeptos à doutrina surgiram em 1977. Hoje a igreja da cidade conta com cerca de 150 membros. Uma vez ao mês eles se reúnem para o Culto de Gratidão. Recebi um johrei e confesso que toda a agonia que estava no meu peito no dia passou.
DE VOLTA Ainda na Umbanda, o exú conversou com o espírito que estava no corpo do ajudante. Deu um recado a ele: “você não atrapalha mais nada lá, porque agora quem está cuidando daquela casa sou eu”. O espírito foi embora e o exú passou as mãos sobre a minha cabeça. Como em um passe de mágica, meu corpo voltou a me obedecer. O ajudante me perguntou se eu estava bem e mandou que passasse álcool nas mãos e na nuca. Eu disse apenas que estava com dor no pescoço. O exu pediu licença e me benzeu. A dor passou milagrosamente. Ele me fez uma solicitação: “óia, fia, ocê tem que fazer seu rezador todo dia antes de durmi. Ocê num esquece disso não, viu?” Eu agradeci e, ainda anestesiada com tudo o que vivi, fui embora. Cheguei em casa, fiz o meu “rezador” antes de dormir ainda na esperança de dias melhores.
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FOTO REPRODUÇÃO INTERNET
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omeçamos por ela, cidade cosmopolita, com cara de metrópole, considerada por muitos, a capital do centrooeste mineiro. É a terra do Divino, princesinha do oeste: Divinópolis. Trazendo um pouco da “pegada” da capital, os bares têm boa frequência de pessoas. Alguns deles chamam a atenção pelo ar familiar e rústico. Um em especial fica a 20 quilômetros do centro da cidade: o Tõe do Beijo, uma típica casa rural. Em seu amplo terreiro embaixo de pés de siriguela e manga, os clientes se esbaldam na sombra. Pratos como Frango ao Molho Pardo e Buchinho Recheado fazem enorme sucesso aos fins de semana, onde é quase impossível achar alguma mesa vazia.
Localizada a 76 km da capital mineira, Itaúna é conhecida por muitos pela universidade ali instalada. Mas quem gosta de agitação deve conhecer a avenida Jove Soares. Repleta de bares, sorveterias, restaurantes, lanchonetes, pizzarias e choperias. No início do dia e no fim da tarde, a extensa avenida é preenchida por pessoas que buscam fazer atividades físicas, como caminhada, cooper e bicicleta. Nos fins de semana é considerada um dos lugares mais badalados da cidade. Em alguns estabelecimentos chega a haver fila para aguardar uma mesa livre. Para os amantes do rock há um bar em especial: o Vinnil Rock Bar atende ao público desde 2010, oferecendo música ao vivo de quinta-feira a domingo. Se você ficou com vontade de conhecer, dá uma passadinha na avenida Jove Soares, nº 2.035, bairro Nogueira Machado.
Terra de gente simples, acolhedora e com uma simpatia sem igual. A região Centro-Oeste de Minas Gerais se desenvolveu em meados do século XVIII, quando os tropeiros vieram em busca de ouro. Isso foi decisivo para que se instalassem em pequenos vilarejos. A região cresceu e, hoje, é uma das mais importantes do Estado. Além do desenvolvimento econômico, o Centro-Oeste mineiro reserva seus encantos e atrativos para quem gosta de diversão e aventura. O bar se localiza na comunidade rural de Djalma Dutra
Distante 14 km de Divinópolis está o cartão postal da cidade vizinha, Carmo do Cajuru. O Morro da Cruz é um lugar para fazer trekking e curtir uma bela paisagem. A subida é um pouco íngreme, mas o visual é compensador. De cima a visão é ampla e dá para ver boa parte do relevo do município e de cidades vizinhas: toda a cidade de Carmo do Cajuru, a barragem do Rio Pará e grande parte de Divinópolis. A cruz colocada no cume e que dá nome ao morro possui algumas pichações de nomes de possíveis visitantes. Entrada da trilha: Rua Nove, bairro Jardim Alvorada.
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A capital nacional de calçados esportivos, Nova Serrana está localizada a 40 km de Divinópolis. A Praça José Batista de Freitas e a Matriz da Igreja São Sebastião são considerados os mais famosos pontos turísticos da cidade. A torre da Matriz desperta a atenção daqueles que passam pela praça. Mas é um bar que tem agitado a cidade: a Taverna Jardim do Eden reúne um mix de cultura com várias características: natureza, rock, MPB, artesanato e poesia. O bar está localizado na Rua Antônio dos Santos, nº 325, no bairro Morada do Sol.
O carnaval de Lagoa da Prata é um dos mais concorridos da região. Em outras épocas, seu principal atrativo é a Praia Municipal: uma lagoa artificial no centro da cidade onde pessoas praticam caminhada, vôlei, futebol e outros esportes na areia. O local possui uma orla bem estruturada. Reza a lenda que, além das boias demarcatórias da lagoa, há algumas espécies de piranhas vivendo por lá e que já houve vítimas de ataques. Endereço: Avenida das Palmeiras, Centro.
Praticamente ao lado de Divinópolis está Itapecerica. Durante quase todo o ano o município é palco de festas culturais, como reinado, festivais de gastronomia e inverno. Mas quem curte o lado radical da vida sobe para as montanhas. Os 1150 metros de altitude da Serra do Barão tornaram-se um atrativo para os apreciadores do parapente, modalidade de voo livre. Diferente de um paraquedas, o usuário pode controlar a direção para onde vai. Devido à intensidade dos ventos, principalmente no fim do inverno e começo da primavera, vários praticantes se reúnem para voar livremente sobre a cidade.
A cidade do doce, como é conhecida, tem população estimada em 11.475 habitantes. No turismo, a pequena São Gonçalo do Pará chama a atenção pela a igreja da Matriz, com traços barrocos, paredes de adobes e arquitetura marcada pela simplicidade. A mãode-obra escrava ficou registrada na cidade com a construção do cemitério em 1855. Seu muro é de alvenaria de pedra, chamando a atenção dos que passam por São Gonçalo. Uma dica para quem passar pela cidade: não deixe de experimentar o prato típico desta terra: o doce.
Em Oliveira está um dos maiores complexos de entretenimento do estado: o Parque Hotel Pimonte. Fica localizado no caminho entre Oliveira e Campo Belo, com acesso bem fácil e sinalizado, tanto para quem vem de Belo Horizonte como de outras partes do estado. Com uma área total de 850 mil m², o visitante tem várias atrações para se divertir, como piscina de onda, termas, passeio de caiaque e cachoeiras. Tudo isso em sintonia com o meio ambiente, clima de montanha e extremamente familiar. Endereço: BR-369, km 25.
Fundada há 300 anos como uma das sete vilas do ouro de Minas, Pitangui preserva nos tempos atuais um pouco do que os Bandeirantes Paulistas encontraram no século XVIII. O Centro Histórico abriga acervos arquitetônicos da época, como as Igrejas Matriz de Nossa Senhora do Pilar, de São Francisco de Assis e da Penha. Todo esse passeio ainda conduz ao Instituto Histórico de Pitangui, prédio que abrigou a cadeia da Vila por muito tempo. Nos arredores, com acesso por estradas de terra, existem fazendas coloniais, cachoeiras, matas e minas de ouro desativadas para vivenciar parte do cenário encantador do “Portal do Centro-Oeste”.
Situada às margens da BR-262 e com mais de 90 mil habitantes, um dos principais encantos dos moradores de Pará de Minas é a estátua do Cristo Redentor. Inspirada na estátua carioca, o monumento fica no alto da Serra de Santa Cruz, com acesso pelos 608 degraus da escadaria que começa no bairro Vila Raquel ou pelo lado oposto, no bairro Redentor, onde há uma rua que chega aos pés da estátua. De cima, abre-se uma vista que todo visitante ou até mesmo moradores da cidade admiram. Para chegar lá é fácil: basta seguir a escadaria pela Rua Celso Grassi, bairro Vila Raquel ou pelo acesso asfaltado pela Rua Antônio Martins Rezende, bairro Redentor.
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TEXTO LUIZ FELIPE ENES LORRAYNE ANDRADE FOTO F.H.OLIVEIRA
Existe razão nas coisas feitas pelo coração? Qual o limite do amor (desespero) de uma mãe pelo filho, um dos 370 mil brasileiros usuários de crack?
Já passava das 23h. Frio e chuva. Só relâmpagos clareavam o céu. Tereza, já deitada, escutou o seu nome baixinho pelas gretas da janela lateral. Levantou e ouviu o recado do vizinho. “Tereza*, venha ver o Paulo, seu filho. O Paulo Cézar* tá (sic) meio desnorteado na rua. Com essa chuva, achei melhor vir te avisar”, alertou Mário Cláudio*. Sem hesitar, já estava com o casaco de Paulo estava em seus braços. Não importava a hora, o coração de mãe não tem relógio. Sozinha e cheia de esperança de abraçar seu primogênito, a matriarca gritava por ele. Bem ali, em um cantinho escuro, ele se escondia. “Filho, vem. Vem, Paulinho. Vamos pra casa, larga disso, venha, Paulo Cézar. Por amor, por favor. Trouxe uma blusa pra você. Veste?!”, pediu. Palavras em vão, ele não ouvia. Não sentia. Estava longe demais, atordoado demais. Distante demais de voz de mãe. Sem responder aos estímulos, Tereza sentou ali. De mãos dadas com o filho. Já passava das 01h. Sono, frio? Não, só dor: Tereza só sentia dor no coração. Mais lúcido, Paulo Cézar aceitou os pedidos da mãe. Paulo dormiu. Apagou. Efeitos dos entorpecentes que Tereza já conhecia bem, muito bem. Há mais de 30 anos a história se repetia. Paulo acompanhava os passos do pai, o falecido Júlio Cézar*. Amanheceu. Latidos, conversas, passos na calçada acordaram Tereza, que, sem perceber, dormiu sentada na cadeira de plástico da cozinha. Abriu o olho, sentiu as vestes ainda molhada. Mas não pensou em si, foi direto para o quarto. Ali estava Paulo. Um beijo na face do filho. Uma oração e uma esperança de ser a última vez que a cadeira seria sua companhia. *Nomes alterados para preservar a identidade dos personagens
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20 48 horas se passaram. Paulo estava sem apetite, mas tranquilo. Hora de agradecer pelos dias amenos. Igreja lotada, mãos de encontro ao peito. Paulo estava bem. Há dois dias não tinha viaturas e cassetetes na grade da casa de Tereza. Alívio que durou pouco. O vício, a fraqueza e o desejo do jovem pela droga falavam mais alto. Costurando em casa para sustentar o barracão onde morava com o único filho, Tereza tinha companhia: o radinho do lado da máquina de costura. Tocava Zé Ramalho, lembrava velhos amores de uma mulher de cinquenta e poucos anos. A porta de alumínio com adesivos pelos vidros abriu com bravura. Era Paulo, com as pupilas dilatadas, temperatura nas alturas, hiperativo. Pronto! Tereza caiu em prantos, era mais um recomeço. Sempre calma, resolveu agir diferente. Trancou o garoto no quarto escuro. Os gritos dele a faziam suar. Uma mistura de raiva e amor. Colocou cadeiras atrás da porta. Como um bicho, o garoto ali permaneceu. Eufórico, ele sentiu todos os efeitos do crack sozinho no quarto destruído pelas próprias mãos. Tereza não ligava mais para os vizinhos. Podiam falar e pensar o que for. Silêncio. Horas depois veio o silêncio. Ela resolveu abrir a porta. Marcas de sangue nas paredes. Paulo tanto se debateu que sua marca ficou ali. Tanta euforia o deixou cansado. Pálido, deitava sobre as roupas que jogou no chão. Lágrimas eram a única reação de Tereza. Nada mais aconchegava o coração de uma mãe. Um beijo no rosto de Paulo. E um suspiro fundo. Saiu para espairecer. Decidida em se livrar de toda essa montanha russa de altos e baixos, ela
se sentou debaixo de uma árvore. A mesma árvore onde entregou o resultado do teste positivo a Júlio Cézar. A confirmação da gravidez, do esperado e único filho do casal. Ali, ela pensou e chegou a uma conclusão: conviver com essa dor, sofrendo menos. Mais calma, Tereza sussurrou bem baixinho palavras de que ela mesma queria se convencer. Voltou para casa, mas antes foi visitar aquele que vendia o que seu filho mais almejava. Mastigando um chiclete já sem gosto, o dono da boca de fumo recebeu a senhora com desconfiança: “Hum, vai querer o que aqui? Acho melhor ir falando rápido dona, não temos muita paciência para ouvir chororô não.” Sem hesitar, ela sacou R$ 22 em notas amassadas e disse: “Quero o que você tem aí e que dá para comprar com esse dinheiro aqui.” Surpreso, ele olhou para os dois lados da rua, viu que estava limpo e entregou o que Tereza pediu. De volta para a casa, ela guardou a droga, limpou o filho e decidiu que, se não dava para vencer o crack, iria se unir a ele.
Deste dia em diante, todas as vezes que o filho ficava eufórico ela dava a dose da droga que o satisfazia. Conivente com a situação, ela aliviava o sofrimento com a chance de poder conviver mais um dia com o filho e saborear os momentos em que ele estava “limpo”. Há cinco anos os dias se repetem e Tereza e Paulo Cézar vivem cada dia como se fosse o último.
Recente pesquisa sobre drogas no Brasil realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) trouxe à tona uma realidade já conhecida: de acordo com os dados, cerca de 370 mil pessoas usam crack regularmente no país. Em junho e julho de 2015, as Polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros, Ministério Público e Prefeitura visitaram os pontos onde os usuários de drogas costumam ficar concentrados em Divinópolis. Duas operações encaminharam os dependentes químicos para assistentes sociais. Mais de 100 usuários foram abordados, receberam banho, alimentação, carinho e tratamento psicológico e químico. Os marginalizados foram recebidos com um olhar nem sempre dado pela sociedade. Tratados como mais que dependentes químicos, foram conhecidas a fundo as histórias de vida de cada um. Após a ação, a Polícia Militar registrou uma baixa no número de roubos e furtos nas regiões onde os dependentes químicos ficavam aglomerados. A PM informou que não tem um número exato de quantos abordados aceitaram a ajuda, mas acreditam que menos de 50% permanecem em tratamento.
FOTO FABRÍCIO SALVINO TEXTO FABRÍCIO SALVINO GEOVANNA BRITES ALLEF RUNDYNELLE MARCELO LOPES
Divinópolis, 230 mil habitantes produzindo a todo o momento um verdadeiro turbilhão de lixo. O material nem sempre é descartado da maneira correta, mesmo que as populares lixeiras estejam instaladas em várias esquinas. A Via Solo é a única empresa que presta o serviço de coleta de lixo doméstico, com 22 setores distribuídos por regiões na cidade. Para dar conta da demanda no município, que produz em média 150 toneladas de lixo por dia (cerca de quatro mil toneladas por mês), um quadro de aproximadamente 80 funcionários é empenhado. Trabalho constante, pesado e “muito cansativo, além do que, não é qualquer um que faz”, garante Lázaro Raimundo, coletor há cinco anos. Eles se dividem em seis caminhões compactadores que percorrem a área central e demais bairros da cidade alternadamente, de domingo a domingo, dia e noite. A equipe geralmente é formada por três coletores acompanhados pelo motorista. O trabalho em equipe garante mais leveza ao dia a dia. “Precisamos ser rápidos do começo ao fim. Durante esse período a gente ri, brinca e descontrai com
os amigos que encontramos na rua, se não o serviço não sai”, conta Lázaro. Conforto não se encaixa nesta rotina. Eles seguem em pé na traseira do caminhão e se restringem a um verdadeiro “desce e sobe” para recolher o lixo descartado e depositar no caminhão. O mecanismo formado por uma pá impressora e alavancas se encarrega de comprimir o lixo. Ambiente que demanda, acima de tudo, atenção redobrada para evitar acidentes. “Esta é uma preocupação da empresa. Os funcionários admitidos passam por treinamento no setor de segurança do trabalho e recebem os equipamentos individuais de segurança (EPI’s). Durante o ano, passam por reciclagem do treinamento e outro estímulo é um bônus salarial de R$ 100 a cada mês para o funcionário que atende a todos esses requisitos”, explica Rodolfo Coelho, supervisor operacional da Via Solo.
Além de lidar com tudo isso, o preconceito da população ainda é um problema. Uma pesquisa realizada pela reportagem na cidade para entender qual a concepção das pessoas sobre os coletores revelou que, de 20 pessoas abordadas, 13 consideram o trabalho como bom, outros sete pensam o contrário. Do total, 17 admitem que a profissão merece mais reconhecimento, apenas três disseram que não. Quando perguntados se algum deles já presenciou alguma atitude preconceituosa, nove disseram ter passado pela situação. Os comerciantes da área central também foram questionados sobre como se sentem com a presença constante dos coletores e do caminhão de lixo próximos ao seus estabelecimentos. A cada 10 entrevistados, cinco disseram não se sentir confortáveis. A justificativa apontada por eles é que os clientes se incomodam com o mau cheiro e a “sujeira deles”. A discriminação é sentida na pele: “se pedimos água nas casas, ninguém dá, porque o preconceito ainda é grande. Precisa ter união, nosso trabalho é difícil, se não fosse por nós a cidade estaria suja”, relata o coletor Adriano Silva.
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As associações, geralmente, fazem a rota contrária a dos caminhões de coleta de lixo doméstico. Na tentativa de recuperar o máximo de itens que iriam para o “lixão”, eles são separados dentro dos galpões e reaproveitados pelas empresas que compram os materiais.
COLETA SELETIVA De acordo com a pesquisa Ciclosoft, realizada anualmente em todo o país, a coleta seletiva está presente em 17% dos municípios no Brasil, número correspondente a 927 cidades. Os dados ainda revelam que a grande concentração destes programas está nas regiões Sudeste e Sul, que representam 81% de participação nacional.
Divinópolis conta com duas associações neste setor. Em uma delas, a Associação dos Catadores de Materiais Recicláveis de Divinópolis (Ascadi), são recolhidos, em média, 1.500 kg de recicláveis por dia. Já na Associação dos Coletores de Material Reciclável (Ascomari), o número chega a duas toneladas por dia.
Diferente da primeira impressão que se tem sobre o catador de lixo doméstico, este trabalho seletivo é visto com importância pelas pessoas, possivelmente pelo incentivo imposto pela própria mídia sobre a separação correta do lixo reciclável. Mas, na prática, tal percepção também não é representada. “Falta identificação das pessoas com o catador, considerado como lixeiro. Mas lixeiros são aqueles que produzem o lixo. Nós somos catadores, assim como o gari é um coletor de lixo. Falta entendimento”, conta Raimundo Nonato, presidente da Ascomari. Ele, que é pai de cinco filhos e, como a grande maioria dos funcionários, tira todo o sustento da família desta profissão, garante que o reconhecimento é uma busca constante. “Mantemos nossa família precariamente, a exemplo de todo brasileiro hoje em dia. Nós não garantimos apenas o nosso sustento, mas também um benefício para a nossa cidade”, relata.
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Discriminação e falta de oportunidades levam transsexuais a cotidianos nada fáceis - Moçaaaaa, vem aqui, por favor. - Oi? - Tudo bem? Isso que você está vestindo é um vestido ou uma saia? - Ah! É uma saia. Gostaram? - Tá linda! Parabéns! Foi assim que eu conheci a Stela e a Marcela, ao buscar uma cerveja no boteco, naquela sexta-feira, 40°C. Como rendi assunto para não ir embora da mesa delas, não me lembro bem, mas sei que ficamos best friends naquela noite. Conversamos sobre moda, beleza, o bar e... homens. Como um amigo meu diria: “papo de mulher.” No caso, papo de uma mulher cisgênera com duas transgêneras. E o assunto só chegou até homem porque elas estavam ali a trabalho, fazendo programa. Não nego: os pensamentos foram cruéis comigo. Ao invés de dormir relaxada após uma semana tensa de estudos e trabalho, encerrada com uma merecida cerveja, fiz um paralelo da minha realidade com a das duas amigas temporárias da sexta: eu, mulher, aceita pela sociedade pela minha identidade, estava feliz e me divertindo. Elas, também mulheres, estavam trabalhando na sexta à noite para garantir a felicidade de uma sociedade que as rejeita pelo o que são. Voltei quase uma semana depois em busca de encontrá-las para um papo mais profundo. Subi uma das principais vias da cidade, atenta a todos os pontos até chegar ao bar. Aquele, lá no alto da Goiás. Estava com um amigo que comprou a minha ideia e me levou até lá. Desci sozinha do carro, me apresentei e procurei pelas duas. Sem sucesso. Porém, desta vez fiz novas amigas. Fui recepcionada pela Sabrina. Sabrina Tiffany, 21 anos, é faxineira do local. Um amor de pessoa, tímida, fala baixo e não gosta muito de exposição. Sentei e pedi a ela para sentar comigo. Antes de pedir para ela abrir o diário e revelá-lo para mim, contei os meus motivos de estar ali. Disse que estava indignada por saber que 90% das mulheres trans* se prostituem por falta de oportunidade, devido ao preconceito. Ela consentiu com a cabeça. Então, percebi que teríamos uma longa conversa pela frente.
TEXTO NAYARA LOPES FOTO F.H.OLIVEIRA
Não perguntei o nome de registro, que, por sinal, nem vem ao caso. Só sei que ela se assumiu mulher aos 14 anos, em Bom Sucesso, cidade natal. Ela tem três irmãos. Na verdade, dois, já que teve uma irmã travesti, a Jully, morta há dois anos, vítima de transfobia. Sabrina criou asas cedo: aos 12 anos saiu da casa da mãe e foi morar com a ex-madrasta. Por quê? “Ah, a gente tem uma idade em que tudo é festa. Eu saí e conheci o mundo nova. Gostei e falei pra minha mãe: tô indo!” Como o bom filho à casa torna, ela voltou aos 19. Até sair temporariamente para morar em Campo Belo. Esse foi o ponto chave da nossa conversa. Sabrina foi morar com algumas amigas. Elas saíam para fazer programa e ela ficava por conta de arrumar a casa, lavar, passar e, no fim do mês, recebia um pouco de dinheiro. “Chegou um ponto em que eu não aguentei. Procurei serviço, mas, infelizmente, nesse mundo que a gente vive hoje em dia, o preconceito vence. Na verdade, vencia, porque hoje a gente é forte. Na época eu tive que tentar (fazer programa). Tentei e eu vi que não era pra mim.” Sabrina se prostituiu por três meses. Era mais uma na estatística. Na falta de oportunidade e no excesso de ojeriza àquela situação, voltou para Bom Sucesso. Segundo ela, lá é raro ver alguma travesti se prostituindo, já que a maioria trabalha, de serviços rurais a salões de beleza. Há um mês, Sabrina está em Divinópolis. Veio porque o campo em que atua, a beleza, anda mais pra lá do que pra cá. Aqui ela trabalha como cabeleireira e manicure durante o dia e faz faxina à noite. Viva! Sabrina entrou para os 10%. Realidade diferente da peça Haretuzy Braccelli (pedi a ela para escrever), de 24 anos. Diferente em todos os aspectos: Haretuzy gosta de falar, posou quase o tempo todo para o meu amigo, é vaidosa (nota-se pela maquiagem) e... estava ali por causa do programa. Capixaba, saiu de Vila Velha aos 11 anos quando se assumiu mulher. O pai não aceitou e se separou da família. Já a mãe a apoiou e as duas vieram para Minas. Sempre muito preocupada com a beleza, fez cursos de cabeleireira, maquiagem e megahair. Há seis anos faz freela em um salão
conceituado na cidade. Mas aí surge a pergunta: por que se prostituir? “Tô aqui pra ganhar dinheiro. No salão eu tiro mil e pouco por mês, aqui dá pra tirar de dois até sete mil”, explicou. A média, segundo ela, é R$ 3,5 mil: “Eu me garanto!” Para isso, Haretuzy trabalha de quinta a sábado. Cada programa dura, em média, 30 minutos, e o valor varia de R$ 80 a R$ 100. “Por menos? Aloka, jamais!(sic)” Ainda assim, imagine se ela tivesse um emprego legalizado, trabalhasse o dia todo e recebesse os mesmos R$ 3,5 mil? Bom, tem coisas que só nós, cisgêneros, podemos imaginar mesmo, porque a realidade... “Depois que eu comecei a ver o tanto que quem tá na pista ganha dinheiro fácil, eu vou ficar sofrendo, igual sofria? Escovando muito cabelo, muita maquiagem, fazendo muita coisa e ganhando mixaria?” Por fim, a pergunta que não queria calar: você está aqui por sexo ou dinheiro? “Dinheiro, lógico. O que uma pessoa tira em um mês eu tiro em uma semana”, respondeu. Haretuzy apenas confirmou o óbvio. Todo mundo (ou quase todo mundo) gosta de sexo. Sentir e dar prazer são consideradas as maiores maravilhas do mundo, mas o tabu deixa a gente falar isso apenas entre quatro paredes. O que muitos não entendem é que o prazer não está só no gozo, e, sim, na livre e espontânea vontade de estar ali por querer estar. Por sentir vontade (e não necessidade). Se ainda está confuso, vou esclarecer com as palavras daquele livro famoso: Deus ama quem dá com alegria. Entendeu? Mentira! Deus ama quem dá por necessidade também! Mas não sei se Ele curte muito quem consente vendo o coleguinha fazer isso sem vontade, porque nós não damos oportunidade dele fazer o que realmente gosta. Coloquei Deus na história porque o preconceito muitas vezes está ligado a questões religiosas. Mas se a função da religião é pregar amor, a si mesmo e ao próximo, creio que não estamos fazendo isso de forma correta. E quando mais de 90% de um segmento da população vive em situação de risco (violência, estupro etc) porque nós somos incapazes de aceitar as pessoas como elas são, está na hora de rever nossos conceitos. Fui me despedir da minha mais nova amiga e ela quis deixar um recado pra gente, mas não estava encontrando as palavras certas. “Pode falar, mulher! O que é?”, perguntei. “Nunca deseje para os outros o que você quer que não aconteça dentro da sua casa. Porque a língua é o chicote do corpo e o chicote da alma. Exclua da sua mente e da sua vida discriminação e preconceito, porque, mais cedo ou mais tarde, pode vir pior de quem você conheceu e falou mal. Sempre é assim.” “Huummmm. Fui bem ou não fui?” Foi ótima, Haretuzy!
*Glossário: Cisgênero ou Cissexual: termo designado ao indivíduo quando sua identidade de gênero está em consonância com o gênero que lhe foi atribuído ao nascimento. Exemplo: A pessoa nasce com vagina e se reconhece como mulher. Transgênero: Ao contrário do indivíduo cis, o transgênero não se reconhece com o sexo biológico. Logo, uma mulher trans é aquela que nasceu com pênis, mas sua identidade de gênero é feminina.
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Q
uarta-feira à noite, lua cheia... é dia de sexo, bebê! Às 23h, partimos eu e um casal de amigos para o nosso destino: uma elegante mansão na orla da lagoa, ponto nobre de Belo Horizonte. Por fora, a aparência de uma simples casa em meio a mansões. Por dentro, um clima quente, onde predomina a troca de casais, orgias, voyeurismo e sexo a três. Ao chegar nos deparamos com três seguranças, que garantem a proteção da casa e fizeram a nossa revista, com direito a detectores de metal. Tudo com muita organização. Seguimos para a retirada dos ingressos. Enquanto aguardava minha vez, não paravam de chegar casais. Alguns montados (simulados, não necessariamente cônjuges), o que é frequente acontecer, já que homens solteiros pagam R$ 260 para entrar enquanto casais, nas quartasfeiras, R$ 40. As mulheres solteiras, neste quesito, têm vantagens: pagam R$ 20. O local é bem diversificado: vi jovens ca-
sais, na faixa de 25 a 40 anos, senhores e senhoras de 50 a 60. Eles entravam sem o menor constrangimento, em êxtase, e nós fomos atrás. Na entrada, um scotch bar e uma pequena boate. O DJ tocava “Wake Me Up”, do Avicii, enquanto os casais dançavam e se conheciam. Alguns strippers também participavam da festa e aguçavam a imaginação dos presentes. Mas o show de striptease acontece após às 00h. Neste local conheci a Senhorita B.. Ela estava só, numa mesa, onde bebia muito e questionei o porquê daquela situação: “meu marido está lá em cima, se divertindo com outras mulheres, mas eu não tenho ciúmes”, contou. O clube também possui uma parte externa, no primeiro andar, com varanda e um jardim maravilhoso. Neste local há algumas mesas e os casais se reúnem para conversar. Naquele ambiente conheci um grupo de swing que já mantinha contato nas redes sociais, mas era a primeira vez que se encontravam.
TEXTO LAIANA MODESTO FOTO F.H.OLIVEIRA
O casal Sr. e Srª. Smith disse estar bastante empolgado. Tanto o homem quanto a mulher possuíam conta no Sexlog e trocavam mensagens, vídeos e fotos com outros casais. “As redes sociais de swing são muito parecidas com as demais, como Facebook e Twitter, porém o conteúdo é pornô. Existe o Sexlog, o SWC e o D4, onde só é permitido o acesso se um casal indicar o outro”, afirmou o Sr. Smith. Decidimos ir para o segundo andar. Naquele momento a curiosidade e a ansiedade se misturavam e a expectativa era grande. Subi as escadas vagarosamente. As pessoas nos olhavam com vontade. De vez em quando arriscavam apalpar ou chegar para conversar conosco, mas não era esse o objetivo.
Chegamos e rapidamente entrei num quarto branco, onde havia uma cama, sofás de canto e dez casais. Foi neste local que as expectativas foram superadas. Muitos gritos e gemidos, cheiro de sexo impregnado no ar. Cinco dos dez casais se exibiam transando na cama, enquanto a outra metade observava a performance, ansiosos para chegar a vez de entrar em cena. Muita gente gozava. Muita gente fingia gozar, mas todos se satisfaziam e realizavam diversos fetiches. A sensação é de estar na gravação de um filme pornográfico, em que a qualquer momento você será chamado para ser o(a) protagonista. Não fiquei naquele cômodo por muito tempo e segui para os famosos darkrooms, que se diferem em três. Um deles é sem iluminação e privativo para aqueles que preferem o sexo tradicional, a dois. Neste local o casal tem liberdade para ficar sozinho e ousar bastante. Confesso que, ao passar perto desses quartos, senti que ali pegava fogo: homens e mulheres pareciam subir nas paredes.
O quarto das tríplices é também um darkroom e liberado para a prática de troca de casais. Mas não é muito frequentado por ser demasiadamente escuro. Neste ambiente conheci o casal Holly & Paul, que aguardava a liberação dos quartos privativos. Paul, que observava a algazarra, afirmou que aquele local era o único da casa que ele não gostava. “O pessoal vem nesse quarto só para passar a mão, porque é impossível ver rostos ou reconhecer alguém. Vem para fazer gracinha, depois de ter ‘trepado’ muito. Tenho até medo das mãos bobas”, riu.
O úitmo darkroom é um cômodo dividido por salas muito pequenas onde mal cabe um casal. No local os casais assistem os demais e transam, um ao lado do outro, sendo comum a prática do sexo oral. Após assistir muito sexo nos quartos escuros, fomos para o aquário, onde há, também: sexo explícito! Pouca luminosidade. Os casais transam entre paredes de vidro para as pessoas observarem. Quando entrei no corredor ouvia muitos gritos. Me deparei com dois aquários: na esquerda, sexo entre três homens e uma mulher; na direita, sexo duplo, com troca de casais. Nesse ambiente existem algumas surpresas: as paredes possuem aberturas e, enquanto eu passava, senti mãos me apalpando. É estranho, mas o pessoal adora. O Freddy, que frequenta a casa há mais de um ano, disse que já viu homens colocando a genitália nessas aberturas, para que as mulheres, enquanto transam, aproveitem-nas.
A Holly me contou que a primeira vez que veio à casa se assustou muito. Para se acostumar foi preciso repetir a visita por algumas vezes. Além disso, afirmou que o casal deve estar bem envolvido e aberto para a prática de swing. “Meu marido já conhecia o clube. O nosso sexo já havia caído na mesmice; queríamos algo diferente e ele sempre falava comigo que me imaginava com outras mulheres ou até realizando trocas de casais. Eu achava estranho, mas um dia aceitei a proposta. Ele veio me preparando o caminho todo, eu estava muito ansiosa e com medo. Mas, quando cheguei, a sensação foi agradável. Claro, depois de umas cinco visitas que consegui me desinibir totalmente. Hoje eu adoro, estamos sempre por aqui. Mas, para que o casal entre nesse clima, deve haver muita cumplicidade, confiança e desejo”, explicou.
O casal Holly & Paul me relatou várias histórias do clube, nas quais acabei me envolvendo. Porém, acabei dando brecha para acharem que eu estava a fim e chegaram até a me convidar para participar de um sexo a três. Me pareceu que a mulher estava muito entusiasmada, mas volto a dizer não era esse o objetivo. Terceiro andar, até que enfim! Aqui a orgia rola solta: diversos casais transam juntos em uma cama gigante, conhecida como tatame área voyeur ou “camão”. Neste último andar, além de muito sexo, sexo entre mulheres e trocas de casais, a vista também é maravilhosa. É possível ver toda a lagoa, é lindo! Mas poucos se importam com isso (risos). Quando cheguei no clube, junto ao casal de amigos, pouco mais de 23h, chegava também Antônio Carlos e sua acompanhante, os dois são amigos. Porém, eu percebi que ele não estava se dando bem na casa, por muitas vezes o encontrei sozinho. No terceiro andar as coisas mudaram. Enquanto sua amiga fazia oral em outra mulher no tatame, ele saiu acompanhado para um dos darkrooms. Quando a transa acabou, nós dois conversamos. “Eu sou tímido, apesar de estar neste local onde quase tudo é permitido. Ainda tive dificuldades em transar. Mas estou muito feliz, tive uma transa gostosa agora. Vim com minha amiga, porque assim pago mais barato e tenho acesso a todos os quartos”, disse.
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Além do tatame área voyeur, no terceiro andar há um cinema, onde encontrei um senhor, de aparentemente 60 anos, juntamente com a cônjuge, de uns 30. Os dois se masturbavam enquanto assistiam a um filme pornô. Pouco tempo depois uma mulher foi ao encontro deles tentar convencê-los a participar de um sexo duplo com o marido. Flertou com o senhor por muito tempo, mas pelo desfecho da história o filme parecia estar mais interessante. Saí daquele local com muitas histórias e com outros conceitos de swing. Ainda tenho dúvidas se teria coragem de experimentar aquela prática. Mas não escondo de ninguém: a curiosidade é grande...
PS: A senhorita B. não se chama assim, nem mesmo tem a inicial com a letra B. O nome foi usado pois a moça é do Mato Grosso do Sul e lá existe uma loja famosa de roupas com esse nome. Tanto o casal Holly & Paul quanto o casal Sr. e Sra. Smith não são chamados dessa forma. Optamos por preservar os nicknames de swing e usamos estes codinomes, pois faz alusão aos clássicos Bonequinha de Luxo e Sr. e Srª Smith. O Freddy também não chama Freddy, mas foi bacana colocar esse nome, pois no momento em que o encontramos tocava Queen. Já o nome Antônio Carlos é porque ele sempre encaixa bem no texto.
TEXTO THULIO OLIVEIRA FOTO F.H.OLIVEIRA
A acne, a cólica e o alto fluxo menstrual eram problemas enfrentados por Carolina Garrôcho quando tinha apenas 17 anos. Preocupada, a jovem não pensou duas vezes e logo procurou um ginecologista. Após indicação médica, Carolina iniciou o uso de anticoncepcionais, buscando uma solução para o caso. Ela usou o remédio por sete meses e fez a pausa no uso por um ano e meio. Em setembro de 2014, aos 19 anos, ela voltou a tomar a pílula para ajudar no tratamento de uma anemia. A partir daí passou a fazer uso do medicamento em períodos não contínuos, até ser diagnosticada com uma trombose em agosto de 2015.
33 A doença é a formação de um coágulo sanguíneo numa ou mais veias localizadas na parte inferior do corpo, geralmente nas pernas. Porém, em Carolina, o coágulo se formou na altura da bacia. “Foi um caso rápido e raro”, conta a jovem, hoje com 20 anos. “Não havia nenhum sinal. Precisei de muitos exames para descobrir se realmente era trombose.” Como poderia uma garota de 20 anos ter desenvolvido uma doença grave tão cedo? A resposta estava nos anticoncepcionais. A ginecologista Marina Gomes Neves confirma o risco maior da trombose em casos desta natureza durante os primeiros meses do uso. “Alguns efeitos colaterais comuns são náuseas, dor nas mamas e retenção de líquido. O risco da trombose também aumenta no primeiro ano. É um diagnóstico de exclusão. Geralmente em mulheres jovens, sem outros fatores de risco”, explica.
Com a doença, Carolina alterou sua rotina. Além da prática diária de exercícios físicos, o uso de qualquer anticoncepcional está descartado. Como parte do tratamento, a jovem passou a utilizar meias de compressão para ajudar na circulação sanguínea. A estudante diz que sabia dos riscos, mas nunca apresentou sintomas ou passou por uma pesquisa genética. “Eu já tinha conhecimento da doença, mesmo nunca tendo apresentado sintomas. Nenhum ginecologista propôs uma pesquisa genética para se certificar dos riscos”, confessa. Carolina faz parte de uma parcela da população conhecedora da doença, mas que não conseguiu evitá-la. De acordo com uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope) feita em 2010, os brasileiros desconhecem quais os riscos, sintomas ou métodos de prevenção da trombose. Dos entrevistados pelo Instituto, 56% afirmaram ouvir falar da doença, mas 57% afirmaram não saber os sintomas ou as consequências. Outros 43% dos entrevistados não souberam apontar medidas preventivas. “A dificuldade em identificar a trombose vem da falta de informação e conscientização sobre a doença, dificultando a situação aos leigos no assunto”, explica a ginecologista Marina Gomes. E a baixa difusão das informações sobre a doença é uma das causas da alta taxa de mortalidade de mulheres. Segundo dados do Ibope, cerca de 85 mil pessoas se internaram por causa da doença entre janeiro de 2008 e agosto de 2010. Deste total, 2,38% dos pacientes morreram, o que corresponde a aproximadamente 2.020 óbitos. O Instituto não tem dados de quantos destes casos são causados por anticoncepcionais, mas poucos sabem que o perigo pode estar ao lado.
O uso de anticoncepcionais para a prevenção de gravidez e tratamentos é intenso. Mas quais são os cuidados e os efeitos colaterais que as mulheres podem apresentar com o uso do medicamento?
O
surgimento da pílula anticoncepcional causou uma revolução sexual na década de 1960 e, de lá para cá, foram várias mudanças. Atualmente, existem dois tipos de pílulas: as combinadas, que contêm estrogênio e progesterona, e as que contém somente a progesterona. Ambas são inibidoras da ovulação, porém, as combinadas são mais eficazes para a boa previsibilidade da menstruação. Apesar das pílulas de progesterona não oferecerem este benefício, elas são utilizadas por quem tem contraindicação para o estrogênio. “As combinadas são as mais usadas e disponíveis no mercado. O que diferencia é de acordo com o perfil de indicações, contraindicações e efeitos colaterais”, explica Marina Gomes Neves. Entretanto, poucas pessoas sabem distinguir os medicamentos, aumentando a frequência dos problemas com anticoncepcionais. A pílula é contraindicada para pessoas que tiveram doenças tromboembólicas, hepática ativa, história pessoal atual ou pregressa de câncer de mama ou sangramento genital anormal sem diagnóstico. Também não devem fazer uso pacientes com hipertensão arterial grave, tabagistas com mais de 35 anos ou enxaqueca com aura. Além da trombose, o medicamento pode causar acidente vascular cerebral (AVC), necrose e coagulações. Mesmo com as contraindicações e os vários cuidados que devem ser tomados, muitas mulheres ignoram a avaliação médica e fazem o uso da pílula por conta própria. “A paciente deve ter seu estado de saúde geral avaliado para investigar possíveis contraindicações, além de receber orientações corretas de uso. Os anticoncepcionais são medicamentos, por norma da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), de venda sob prescrição médica”, alerta a ginecologista Marina Neves.
benefícios? Mesmo com os riscos, a pílula anticoncepcional também traz benefícios. Segundo Marina Neves, o medicamento é comum para regular a menstruação, reduzir o fluxo e o controle de cólicas menstruais, além de auxiliar o tratamento de acne, como no caso de Carolina. “Existem descritos benefícios não contraceptivos das pílulas, como proteção contra o câncer de endométrio, redução do risco de desenvolver carcinoma epitelial de ovário e efeito protetor do componente progestínico sobre as doenças benignas das mamas”, explica. Ainda de acordo com a especialista, a mulher poderá fazer o uso ininterrupto do medicamento, dependendo do seu estado de saúde e com consultas periódicas ao ginecologista. “O inconveniente é que, com o uso contínuo prolongado, a mulher pode ter pequenos sangramentos uterinos irregulares e imprevisíveis, chamados de spottings, que incomodam bastante. Quando isso ocorre, uma pausa geralmente resolve”, explica. Independentemente dos benefícios, Carolina foi uma dentre tantas outras pessoas que foram atingidas pelos efeitos colaterais dos anticoncepcionais. Atualmente em tratamento, ela não pode fazer o uso das pílulas, mas espera nunca mais ter que usar o medicamento. “Mesmo que os médicos autorizem o uso, não vou fazer, porque não vou me colocar em uma situação de risco novamente”, conclui.