Espraiar ricardo mattos

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espraiar ricardo mattos



espraiar

ricardo mattos

criação: flagrante delito

SP – 2014

ISBN: 978-85 -913155 -2-9



numiar



caminho na margem das águas & crescem língua s nos pés


o sol espia da ponta do mo rro

nasce o nume no leito do rio


a erva volve os sentidos minha verve reverbera


um sa nhaço ro ça meu cílio o luzir do azul gra ssa nos pelos


o nascente estica os dedos da a uro ra o alvor nas รกguas ventre a fo ra


a brisa subleva minha borda me leva enleva alĂŠm


a ma rĂŠ me rema me erma a esmo urgente :uma va za nte no ventre


um pรกssaro transpassa minha sombra & rememora o regato do s meus surto s


a colina me menstrua encosta abaixo & a s o ndas quebra m o tra nse


nascem escamas na brisa estou concha a bailar na lĂ­ngua do mar


me lanço do monte: o falcão com a morte no bico no instante do bote


o cheiro de mato da restinga se mescla c’um mormaço do mar chupo uma uva & vibra uma po ro ro ca na boca


sesta na pra ia : estou disperso em gr達o s


a rede de pesca paira como nuvem na a reia & pesca do res co stura m a barra da lagoa


a canoa penetra o canal & desabotoa a calรงa do cais (o vilarejo ejacula)


um vira-lata se esparrama na ponte & me a tra vessa pro outro lado da dobra


a prainha comprime o mar no a bra ço da s pedras o reflexo da s nuvens expande meus pÊs em ondas onde nado a voar


o albatroz entorta a linha do horizonte & traz o desvio de tudo no bico


o viÊs do mergulho murmulha a magia & a Barra da Lagoa se tra nsmuta em Atlântida


filhotes de guarรก brincam na ma rola & suas patas zanzam no ventre


o gavi達o me flutua a perder de vista & a nuvem bate a porta na minha cara


suado de espuma o surfista trepa na onda penetra no tubo & goza no 창nus do mar


a tormenta despenca de supetão & gaivotas planam no vendaval a dança de Iansã


a gruta me traga sa ngro no útero do mundo

(ca nta ro lava Ka ya la : “Traga! Tra ga a mim, o rena scido!”)


um punhado de grilos gruindo por dentro

a tarde me tomba na relva & o sol se pþe a dançar


o lilรกs lambuza o horizonte & os lรกbios da Lua insinuam a noite


a coruja torce o pescoรงo com a fo rรงa de ver o avesso


a flor de jasmim me abre pa ra a madrugada sorve a forma da estrela & entorna o aroma do lume



Coda

poema: expressão estática da experiência extática

das sensações inscritas no corpo aos sentidos escritos no verso

a vivência do nume & a potência do nome

Barra da Lagoa, 2013



Outro ra jĂĄ fui menino , menina, pla nta , pa ssa rinho e peixe mudo, saltando do mar. EmpĂŠdocles




espraiar



O ĂŞxtase me faz cantar a metamorfose das formas em novos corpos OvĂ­dio, Metamorfoses



espra ia r: volve no pulso o tumulto das ondas

palpita a press達o alta da tormenta


hรก uma gota de meu sangue na pupila do quero -quero a tintura da pita nga co rre na s veia s & a s palmeira s da nรงam ao vento o alvo ro รงo do s meus ca belos


o vento espalma um zumbido o eco da concha no ouvido


uma linha na barriga me liga à nuvem enquanto a pipa desbica na infância


a alvo rada vislumbra a montanha de c贸coras parindo uma cachoeira


a rra sto poeira ladeira acima & um lagarto alastra meu ra stro


um mito corre da cascata faço concha com as mãos & beberico um canto


afago a franja do rio & o saci tira a roupa da mata


a co rredeira leva minhas calรงas de assalto o salto do sapo me ro uba um onde & a folha ao vento me toma um quando fico nu em nume


afloram ramos no s po ro s me planto no centro da Terra


a ra iz penetra na garganta & me derrama na variedade das formas


o sapo duplica o planeta no volteio do olho

o oceano todo pulsa no seu papo


num lampejo sou a massa de girinos que la teja na pedra

pende no umbigo da esfera um ovo alvo refletido na mesma fonte onde um la mpejo lateja a esfera na mesma pedra a lgures o utro ra ago ra


quando o corvo sussurra um assombro co rro com a cachoeira no bolso


a mata se mostra num cheiro violeta num toque do canto do curiĂł num cio salgado na goela

a grama germina na palma da mĂŁo & saiu de lĂĄ sempre engatinhando


há um vácuo no verso onde me inscrevo & espreito perplexo

Peruíbe / Perequê, 2013


Perco rro a va rieda de da s f o rma s do devir. Meu verbo mĂĄgico me confere o poder Sa Ă­da pa ra a Luz do Dia , livro do a ntigo Egito



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