Título: "Esperança e o sorriso do Palhaço" conto de Rosa Maria Santos Maio 2021

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Esperança e o sorriso do Palhaço

Conto

Rosa Maria Santos 2


Ficha Técnica

Título Esperança e o sorriso do Palhaço Tema Conto Autora Rosa Maria Santos Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa Maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições

Editado em E-book em Maio 2021 https://issuu.com/rosammrs/docs 3


Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar – Coletânea de Poesia de Natal de 2020. 4


É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018.

E-Books - Poesia Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.

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E-Books - Contos Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - 12 Contos de Natal, capa de Madalena Macedo - imagens com arranjos da autora, Natal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn - Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris – Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; - O Menino da Lagoa - Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020;- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; - Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; - Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; - O Jardim em Festa, Julho 2020; - Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; - Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; - Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; - A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o 6


Menino que queria sorrir – Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto – Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões – Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado – Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor – Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente – Março 2021; Janota, a guardiã do ervilhal – Março 2021, Zâmbia, a macaquinha que queria casar – Março 2021; Tuly e o cavalinho de baloiço – Março de 2021, Maria, a menina que não conseguia dormir – Abril 2021; A Lenda da Menina Lua – Abril 2021; Estrela Silente, a Princesa cativa – Abril 2021, Marly, a pequenina duende – Abril 2021; Mariana no País do trevo Dourado – Maio 2021; Esperança e o sorriso do Palhaço – Maio 2021.

Histórias da Bolachinha Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) - Capa: Glória Costa - Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia - Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; - Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo - Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018 Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil - Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; - Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020. 7


Aventuras de Maria Laura Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; - Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020.

Distinções 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017. 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019. 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema. Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione 2020. Menzione d'onore con la poesie “Il mio quadro” – (Meu quadro). Itália julho 2020. 8


Segunda Classificada no Prémio Poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesiavideopoesia e racconti dal titolo: Poesia Esteri “Ouve” (Ascolta) dezembro 2020. Menzione di Merito de poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Racconti “Esmeralda” dezembro 2020. Ebook: https://issuu.com/rosammrs/docs

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Esperança e o sorriso do Palhaço

- O Circo chegou à aldeia! – anunciava a quatro fôlegos Golias, calcorreando desvairado cada rua, Golias era o sacristão da Igreja da Nossa Senhora da Hora. Temente a Deus, de pequena estatura, qual anão, executava com zelo todas as tarefas de que era incumbido. Esguio, conseguia penetrar com mais facilidade em lugares a que muitos outros teriam dificuldade em ultrapassar.

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- Meu povo, o Circo chegou Gritava o nosso Golias Tudo se entusiasmou No correr daqueles dias. Dias de tristeza e dor! Um bebé desapareceu… Do incógnito raptor Mais ninguém se apercebeu.

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Coitados dos pobres pais, Perderam a filhinha E não deixariam mais De procurar a menina. O céu azul se fez breu Nesse triste entardecer, Uma tragédia se deu, Como pode acontecer? E as gentes lá da Aldeia Olhavam para o passado E de uma ou de outra maneira Buscavam o resultado.

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Ao longo de muitas paredes e colocados em troncos de árvores, viam-se cartazes a anunciar a chegada do Circo Sandoval. Na Aldeia Piscatória viviam já a magia das artes circenses. Havia já cinco anos que o Circo Sandoval, passara por ali. Fora então que se dera o trágico desaparecimento da menina, uma das três gémeas do desafortunado casal Almoredo, Cindy e Fredy, um casal de bailarinos ligados ao Circo Sandoval. As três meninas gémeas, Esperança, Felicidade e Piedade, com seis meses de idade, estavam cada qual em seu bercinho a descansar, enquanto os pais treinavam o seu número para o espetáculo, cuja estreia se daria naquele dia, pelas vinte e uma horas. 13


Quando regressaram à roulotte, acharam estranho a porta não estar fechada à chave. Entraram e encontraram a empregada encarregada de cuidar das crianças a dormir. Quando chegaram junto dos bercinhos, logo repararam que um deles estava vazio, a menina desaparecera. - Fredy, a nossa Esperança desapareceu! – gritou alvoroçada - O que vamos fazer agora? – questionava desesperada. - Oh! Não pode ser! Vamos à sua procura, Cindy, ela não podia ter saído sozinha, alguém entrou na nossa roulotte e a levou. Valha-nos Deus. 14


Fora um verdadeiro pesadelo. Como poderia ter acontecido? Quem teria feito tão grande maldade? Tão pequenina ainda, tão frágil, o que lhe poderia acontecer? - Rita – questionaram a empregada - a que horas viu pela última vez as meninas? Qual a razão porque estava aberta a roulotte? Mas todas as perguntas ficaram sem resposta.

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São perguntas sem resposta Para aqueles pais aflitos, Contrariedade imposta A seus corações contritos. - O que havemos de fazer? Se ela não aparece? Há que aprender a viver, Mas a angústia permanece. 16


Uma noite mal dormida, Filhas pedindo atenção, Transtornaram sua vida, Destroçando o coração. - Temos que esperar, amor Fredy a Cindy dizia - Meu peito sangra com dor, Com tristeza, em agonia.

Pobres daqueles pais! Inconformados, percorreram cada recanto da pequena aldeia e arredores, interrogando todos que encontravam, trabalhassem no 17


Circo, estivessem ainda nas longas filas para o espetáculo ou, alargando a sua procura por toda a parte aonde puderam ir. Nada, ninguém sabia responder. Olhavam os seus rostos tristes e lamentavam o sucedido. Por ironia do destino, de um momento para o outro, ficaram sem a sua Esperança, perda irreparável, para eles. Cansados, acabaram por cair em si e tomar consciência de que havia duas outras filhas que necessitavam dos seus cuidados, Felicidade e Piedade, as duas outras gémeas. Desde então, o casal Almoredo desenvolveu as mais diversas iniciativas na tentativa de encontrar Esperança. Ao longo desses últimos cinco longos anos, o povo da Aldeia não esquecera jamais a tragédia ocorrida entre essa grande família circense, que olhava com amável ternura.

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- Foi uma tragédia enorme Repetia aquela gente Esse rapto desconforme Sempre em nós está presente. Coitados daqueles pais, Que provação nesse dia, Rádio, TV e nos jornais, Toda a gente o anuncia. 19


Logo o Circo foi embora P’ra não mais aqui voltar, Abre a caixa de pandora, O Circo vai regressar. As outras duas meninas, Eram pequenas então E agora maiorzinhas, Certamente brilharão. Cinco anos se passaram E ao voltar à aldeia Fredy e Cindy encontraram Uma onda de amor cheia

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Decorrido este tempo desde o desaparecimento de Esperança, como iriam encontrar os habitantes da aldeia os pais e as outras duas meninas? No Posto Médico da aldeia, a Doutora Augusta conversava agora com a enfermeira Maria da Luz. - Questiono-me aonde e como estará a nossa pequena Esperança – dizia Maria da Luz. Na verdade, se fosse minha filha, não sei como aguentaria nada mais ter sabido dela após tanto tempo. Pobres pais, sinto 21


tanta pena deles! Que Deus os conforte e lhes dê coragem para enfrentar esta tão grande provação. Ali perto, ouviam os clamores de Golias que, em alta voz anunciava aos quatro ventos o espetáculo programado para o dia seguinte. - Doutora Augusta, Enfermeira Maria da Luz, o Circo chegou, está-se a instalar na Rua do Carmo, junto aos Bombeiros.

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- Vai ser um dia de festa Diz Golias a sorrir Pode ser que seja desta Que a menina vá surgir. Ano Novo é esperança, Se um milagre fosse feito E aparecesse a criança, Então, seria perfeito. Deus sabe quem a levou! Que se possa arrepender, Com esperança eu estou De que vá aparecer. - Sempre altruísta, Golias, Falas com tanta erudição, Quem sabe se nestes dias Não te vamos dar razão.

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No dia seguinte, na Aldeia, festejava-se o Dia do Senhor dos Milagres e o Circo Sandoval, depois de uma ausência de cinco longos anos, voltou com novos espetáculos para alegrar a festa. Quem sabe se o Senhor dos Milagres não venha a fazer um milagre e devolva Esperança ao casal Almorado! A hora aproximava-se. Estavam já em marcha os preparativos para a estreia do novo espetáculo. - Venham ao Circo hoje pelas vinte e uma horas anunciava o altifalante da carrinha que percorria lentamente as ruas da Aldeia - Senhoras e senhores, meninas e meninos, venham e assistam ao maior espetá24


culo do mundo! O casal Almorado e as gémeas bailarinas, a macaca Gicana e as suas trapalhadas, os palhaços Riterite, Saúl e o Foster, o Elefante Pandur, o Leão Luke, entre muitas e muitas surpresas! Venham senhoras e senhores, não percam a estreia hoje às vinte e uma horas em ponto.

E estes anúncios repetiam-se ao longo do tempo, até à chegada da hora do espetáculo. A miudagem lá da Aldeia corria desenfreada para casa, tentando convencer os progenitores a levarem-nos ao Circo. Muitas delas nunca haviam assistido a um espetáculo como este ao vivo, só mesmo através da televisão. Entretanto no Circo, Cindy e Fredy, ajudavam as filhas Piedade e Felicidade na preparação para mais uma 25


sensacional exibição de bailado, ora no palco, ora no trapézio, atividades que, nos seus tenros seis anos, desempenhavam na perfeição. Era vê-las cheias de alegria, quais anjos, a rodopiar no palco. Alguns dos números eram em parceria com os progenitores, mas agora eram elas a atração principal. Por onde passavam, deixavam centenas, milhares de espectadores deliciados e boquiabertos com as suas apresentações de sonho. Na mente de Cindy e Fredy, fervilhava a esperança reverem Esperança de regresso ao convívio familiar. Quem sabe, Deus não operaria um milagre a qualquer momento?

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- Sobe um pouco Piedade, Alonga mais um pouquinho, E tu, ó Felicidade , Mais um salto perfeitinho. Agarra agora a cordinha E coloca-a na cintura, Cuidado com a perninha, Vê que estejas bem segura. Hoje é tempo de estreia, Quero-vos bem preparadas, É noite de lua cheia E vós sereis bem prendadas. Uma lágrima a sondar O teu rosto, Cindyzinha? Vamos lá, vamos limpar, Como sofres, queridinha! Não chores mais, amorzinho, Havemos de a encontrar! Sei que um dia, maridinho, Vai voltar ao nosso lar.

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A noite caiu, o sol estendeu-se sobre o mar, as estrelas iluminaram o espetro celeste e encheram todo o espaço de alegria. O espetáculo vai começar… …. Não muito longe da aldeia, naquela tarde, uma carinhosa velhinha corria a praia em busca de conchinhas. De repente, surge-lhe na frente uma bela criança que dormia sobre a areia. Parecia abandonada. Olhou ao redor, uma, duas vezes, a ver se com o seu cansado olhar alcançava alguém. Nem vivalma. Decidiu então 28


baixar-se e com inexorável ternura despertar a menina. - Acorda, não receies, sou tua amiga. Ao toque carinhoso da senhora, a menina despertou do seu profundo sono. Esta, então, lhe disse com um sorriso:

- És tão linda! Como te chamas? Ainda a esfregar os olhos, algo temerosa, levantou-se de um salto e lançou-se numa correria pela praia. 29


- Volta, não te assustes, não te quero fazer mal – gritou a velhinha - Que mal te pode fazer uma pessoa velha como eu, princesa? Volta, por favor. Respondendo ao apelo e agora mais calma, a menina regressou para junto dela. - Que bom que voltaste! Tens fome ou sede? Vivo perto daqui, vem comigo, vou preparar-te uma refeição quente, deves estar a precisar. Tenho lá leite e fruta. Vem daí. A menina abanou com a cabeça afirmativamente, como aceitando o afável convite. - O meu nome é Marília. E tu, como te chamas e onde vives? Quem são os teus pais? - Meu nome é Esperança, – sorriu – Era esse o nome porque me chamava a minha mãe. - Chamava? O que aconteceu, aonde está a tua mãe? E porque motivo andas por aqui sozinha nesta praia deserta? É perigoso uma menina andar por aqui sozinha a estas horas, não tarda, o sol põe-se e o dia escurece.

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- Não sei da minha mãe. Quando despertei esta manhã, ela não estava em casa. Saí à sua procura e vim parar aqui. Senti-me cansada, deitei-me um pouco e adormeci. Até que de repente fui despertada por ti. - Oh! A tua mãe deve andar preocupada à tua procura! Vem comigo e depois vamos ver se a encontramos. E assim, a bondosa senhora levou a menina para sua casa. O dia ia já longo e decidiu que a menina permaneceria consigo essa noite. No dia seguinte, acompanhá-la-ia ao Posto das autoridades. Quando chegaram, Marília proporcionou a Esperança um reconfortante banho e vestiu-a com roupa da neta

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que tinha guardado. Em seguida, preparou uma generosa refeição que a menina, cheia de fome, saboreou com prazer. Afinal, nada tinha comido ainda naquele dia. A seguir, deitou-a e ela, esgotada pelo cansaço, logo adormeceu.

- Dorme, meu anjinho, dorme Cantava a linda senhora Já sem sede, sem ter fome, Podes descansar agora. E assim adormeceu Na confortável caminha. A velhinha lhe sorriu E a beijou na carinha. 32


A noite foi calma. Quando amanheceu, Marília entrou no quarto e cumprimentou. - Bom dia, Esperança, está na hora de levantar. Vamo-nos preparar e procurar as autoridades que logo te levarão de novo ao lar. - Ao lar? Mas eu não tenho casa! - respondeu Esperança. - Não tens casa? Mas ontem não andavas à procura da tua mãe? - Sim, andava à procura dela, mas não temos casa. Há muito que vivemos num barco abandonado junto à praia. Um dia chegamos de muito longe e instalamo33


nos ali, junto daquele velho barco, aonde nos temos mantido. - Nesse caso, vamos até junto das autoridades e depois vamos à procura desse tal barco e descobrir aonde anda a tua mãe. Depois de preparadas, dirigiram-se à aldeia. Quando ali chegaram, ao ver o Circo, Esperança sentiu-se sobressaltada e disparou a correr até à entrada. Ali, com o olhar irradiado de alegria, reparou na foto das duas meninas bailarinas no grande Cartaz. Oh! São como eu! E começou a chamar Marília, gritando! - São como eu, iguais a mim! São como eu! No meio daquela confusão de gente, perdeu-se da bondosa senhora que, entretanto, fora até ao Posto da Guarda para contar tudo o que aconteceu. Esperança, ali junto à entrada do Circo, não se calava:

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- São iguais a mim – dizia Com o cartaz preso à mão, Via a foto e lhes sorria, Despertando a atenção. Pela fresta da portinha, Descobria curiosa, Através de uma cortina, Uma senhora graciosa. 35


Dançava como ninguém Na ponta dos seus dedinhos E naquele vai e bem Juntava os seus dois pezinhos. E tão delicadamente Via dançar as crianças E o pai que, alegremente, As instruía nas danças. - Eu quero juntar-me a elas, A essa família – dizia Tão pequeninas, tão belas, E tão cheias de energia.

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Foi então que decidiu esconder-se e assistir a tudo o que se passava ao redor. Afinal, não almejava voltar para junto do velho barco ou da mãe. Começava a sentir a ausência, isso sim, de Marília, a bondosa senhora que encontrara naquela praia e que tão bem a acolhera. Ali, perto do Circo, sentia-se em casa, como se desde sempre tivesse feito parte daquela família. - Não, daqui não quero sair mais! Absorta nestes pensamentos, olha para o lado e ouve uma voz:

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- Olá, que fazes aqui? Não vais ensaiar com a mana? Que roupa estranha a tua! Não é própria de uma menina de Circo! Surpreendida e assustada, Esperança nem sabia o que responder. - Que se passa? Hoje não falas comigo? Estás zangada? Já nem consigo distinguir se és a Piedade ou a Felicidade, estou mesmo a ficar velho! – gracejou. E chamou pelo intercomunicador – Ei, Foster, chama Riterite, chega aqui, vem ajudar-me a manobrar este utensílio, mais logo irá ser preciso e quero colocá-lo no lugar certo.

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- Certo, Riterite, vou ajudar-te. Depois, vamos ensaiar, mais logo tem que estar tudo perfeito. Ontem à noite foi um belo espetáculo, o publico adorou, ainda tenho no cérebro as risadas das crianças. Santo Deus, como elas gostaram das nossas traquinices. Adoro ser palhaço e poder ver todos aqueles ingénuos olhos cheios de admiração pelo nosso trabalho. - Pois, pois, se não fosses palhaço, o que poderias ser? Só poderias ser mesmo palhaço. Esperança olhava fascinada todas aquelas cores, as corridas de um lado para o outro. Tudo lhe parecia familiar. Como era bom se pudesse ficar por ali. Então, num rasgo de perícia, decidiu desembaraçar-se do seu anfitrião inesperado e ficar por ali para assistir à sessão das onze da manhã. As crianças da escola viriam ao Circo e haveria essa sessão especial no Dia do Senhor dos Milagres. Gradualmente, as cadeiras iam sendo ocupadas. Esperança, escondida sob a proteção de umas lonas, aguardava pacientemente e ansiosa o começo do espetáculo. De repente, um homem alto, vestido a rigor, chega ao palco e anuncia:

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- Minhas meninas, meninos, A sessão vai começar, Gicana e seus filhinhos Já se vão apresentar. Depois, vem o trapezista E três serão os palhaços Leões, um ilusionista E o rodopiar dos pratos.

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Nossa atração principal, Bailarinas com mestria Num número especial Que trarão muita alegria. - Após a apresentação, Convido-vos a assistir A momentos de ilusão Que vos vão fazer sorrir. Comodamente sentados, Cada um no seu lugar, Assistam, bem humorados, Caladinhos, sem falar.

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E a sessão começou. Os palhaços apresentaram o seu número, tendo sido muito aplaudidos. Os leões, alinhados, lá foram obedecendo às diretrizes do domesticador, rugindo muito, o que fez com que as crianças os olhassem com algum temor, mas fascinados. Gicana, a macaquinha, e os seus filhinhos fizeram as habituais macacadas, enquanto toda a criançada aplaudia sem parar. Quando chegou a vez dos bailarinos, ainda eles não tinham deixado de rir com toda a palhaçada de Riterite e do companheiro. E entraram as 42


gémeas para uma apresentação ímpar. Esperança, encantada com toda a apresentação, sentia agora o seu pequenino coração bater forte. Foi então que, de repente, do seu esconderijo, saltou para o palco e começou a dançar também, como se fora uma bailarina toda a sua vida. Todo o Circo se levantou e aplaudiu sem cessar a inesperada apresentação.

Eis Esperança que dança Com mestria e precisão, A magia da criança Entre o choro e a emoção.

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Rodopia para a direita Bem erguido o seu pezinho - Mas que bem que ela se ajeita Acrescia o palhacinho. - Não pode ser a Piedade, Está no palco a dançar! E nem a Felicidade Que acaba de chegar. - Pessoal venham cá ver Quem apareceu por aqui! O que está a acontecer? Coisa igual eu nunca vi. - Como te chamas menina? - O meu nome é Esperança - Oh, não! É a pequenina Que foi levada em criança! Chamaram o Maldonado Que logo veio a correr E quase caiu de lado, Sem nada poder dizer.

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E logo a mãe, aflita, Veio a correr ao lugar. - A nossa menina! – grita Sabia que ia voltar! Minha linda Esperancinha, Que surpresa para nós, Quantas saudades eu tinha De ouvir a tua voz! E abraçada à filhinha Com tanta ternura, amor, Enlaçou-se em seu colinho Agradecendo ao Senhor!

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- Obrigada, bom Jesus, Por ter voltado p’ra mim, Da treva surgiu a luz, Há mais cor em meu jardim. - Fredy, olha a Esperança Dizia Cindy a sorrir E vai raiar a bonança, No amanhã que há de vir!

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Radiantes de alegria pelo que ali estava a acontecer, Piedade e Felicidade correram de encontro à irmã e ali ficaram longo tempo envoltas no mais caloroso abraço. A genuína alegria chegara por fim ao Circo e o palhaço sorriu!

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