Título: Florbela, a Zebrinha Endiabrada, conto de Rosa Maria Santos, setembro 2022

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Florbela a Zebrinha Endiabrada

Conto

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Rosa Maria Santos

Arranjo de José Sepúlveda

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Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições

Rosa Maria Santos

Editado em E book em Setembro 2022 https://issuu.com/rosammrs/docs

Ilustrações

Ficha Técnica

Título

Rosa Maria Santos Capa

Florbela, a Zebrinha Endiabrada Tema Conto Autora

Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras.

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Rosa Maria Santos

Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga.

Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar Coletânea de Poesia de Natal de 2020.

É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome.

E-Books - Poesia

É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas.

Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) Capa: Glória Costa Maio 2018; Sinos de Natal, Natal de 2018; Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.

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A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de Livrosexistir.editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018; Vidas Suspensas (romance) – Janeiro 2022.

E-Books - Contos

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Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; 12 Contos de Natal, capa de Madalena Macedo imagens com arranjos da autora, Natal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; Esperança no País do Arco Íris Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; O Menino da Lagoa Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; Ana Rita e o fascínio dos ovos Maio 2020; Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; Contos ao Luar, Maio de 2020; Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020; O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; O Jardim em Festa, Julho 2020; Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o Menino que queria sorrir Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões

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– Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente Março 2021; Janota, a guardiã do ervilhal – Março 2021, Zâmbia, a macaquinha que queria casar – Março 2021; Tuly e o cavalinho de baloiço Março de 2021, Maria, a menina que não conseguia dormir Abril 2021; A Lenda da Menina Lua Abril 2021; Estrela Silente, a Princesa cativa Abril 2021, Marly, a pequenina duende – Abril 2021; Mariana no País do trevo Dourado – Maio 2021; Esperança e o sorriso do Palhaço Maio 2021; Uma Aventura na Floresta Encantada Maio 2021; Esmeralda, umas férias diferentes Junho 2021; Raitira no Planeta Ricoicoi Junho 2021; A lição do Dente-de-Leão – Julho 2021; Lino, o menino que sonhava ser astronauta – Julho 2021; Bia, Mitra e o Tufão Esperança Agosto 2021; Sericaya, a Ponte Misteriosa Agosto 2021; Timo, um ratinho irreverente Agosto 2021; Pipinha, um resgate atribulado Agosto 2021; Aline e o Pequeno Ratinho – Setembro 2021; Tia Felisberta regressa à Aldeia – Setembro 2021; Milaidy, a vaquinha bailarina Outubro 2021: Carolina, a pequenina sereia Outubro 2021: O Pássaro de Fogo Outubro 2021; Rosy e a bonequinha de papelão Novembro 2021; Um Milagre de Natal – Dezembro 2021; Selina e o sonho da liberdade – Março 2022; O ABC da Vida –Março 2022; Salicas no Paraíso do Garrafão Agosto 2022; Florbela, a Zebrinha Endiabrada Setembro 2022.

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Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) Capa: Glória Costa Maio 2018; Bolachinha vai à Hora de Poesia Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018

Diferentes mas iguais

Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020.

Tomás e o infortúnio de não ter mãos Junho 2021; Lolita, a menina que não tinha pés Junho 2021; Duda, o Menino que queria mudar o Mundo Julho 2021.

Aventuras de Samir e os amigos

Samir, o Ratinho Um rasgo de coragem Setembro 2021.

Histórias da Bolachinha

Aventuras de Maria Laura

Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020.

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Distinções

Vale do Varosa 2019 Concurso Literário Tarouca “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema.

- Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione Menzione2020.d'onore con la poesie “Il mio quadro” (Meu quadro). Itália julho 2020.

10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal).

2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017.

3º Prémio de Poeti Internazional Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália Maio 2019.

Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto deJogos2019.Florais

SegundaClassificadanoPrémioPoetiInternazionali-11ª.EdizionedelConcorsoInternazionalediPoesiavideopoesiaeraccontidaltitolo:PoesiaEsteri“Ouve”(Ascolta)dezembro2020.

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-MenzionediMeritodepoetiInternazionali11ª.EdizionedelConcorsoInternazionalediPoesia-videopoesiae raccontidaltitolo:Racconti“Esmeralda”dezembro2020.

11 Ebook: https://issuu.com/rosammrs/docs Blog: https://romyflor.blogspot.com/p/blog page.html

Reinava o silêncio e a paz na Aldeia dos Animais naquela manhã de primavera. Diferente, mas igual a tantas outras, Florbela, a Menina Zebra levantava se cedo e logo começava o reboliço na Aldeia. Vaidosa e irrequieta, critica na forma de agir, tinha uma inclinação nata para a intriga que a fazia mentir muitas vezes. Toda a gente sabia que gostava dessa forma de agir, mas era apenas para exibir os seus pretensos dotes de tudo saber, para chamar as atenções para si. Muito do seu tempo, dedicava-o a criticar os outros animais, ora porque trabalhavam muito, ora porque dormiam demais, ou tão somente

Florbela, a Zebrinha Endiabrada

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porque estavam gordos ou magros, não importava. O que pretendia transmitir era que não eram perfeitos como ela. Coitada da Hiena, a pobre era a mais criticada e sempre que a via rir, pronto, lá estava a nossa zebra tonta a zombar até se cansar.

- Feia hiena, porque ri? Não tem motivos p’ra isso Coisa tão feia não vi, Nem sequer no pobre ouriço.

Pelo sem graça, eriçado. Vai tomar banho p’ró rio! Seu olhar desajeitado Toldava-se, sem dar um pio.

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Com um banho, coitada, E uma boa escovadela, Ficaria mais arrumada E ninguém troçava dela!

Sê como eu, elegante, Com um porte de donzela, Eu sou chic, espampanante, E brilho como uma estrela.

Ah, podes rir te à vontade, afinal, não passas de uma pobre pateta que quase nada tem e o pouco que lhe resta, é fútil, não presta. E virando as costas à hiena, lá foi encosta abaixo, espampanante e num rodopio em forma de dança, convencida que estava a desempenhar um grande papel e acenava a

Micas, a infeliz Hiena, não dava pio nem mio, olhou para ela de soslaio e esboçou um sorriso, como sempre fazia, o que irritou deveras Florbela que sentiu que o seu estatuto de miss lá da aldeia estava a ser ameaçado.

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quem passava, a sua fragância do seu perfume extravagante que se estendia aos quatro cantos da Aldeia, não passando despercebida o que não passava despercebido a nenhum animal, muito menos a Zaragaio, a zebra macho, tomado como o conquistador de serviço lá da Aldeia dos Animais Todos Diferentes Todos Iguais.

Oh lá, lá, quem vem aí! Com este perfume horrível, só pode ser Florbela, a Menina Zebra. Esgueirou-se como pode por entre o matagal e ficou à espera de a ver passar. Logo que lhe pôs os olhos em

Olha bem quem ele é, O Zaragaio, catita, Vá. Ergue te, põe te em pé, Vem daí, não faças fita.

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cima, deu um salto de tal maneira que nem se apercebeu do buraco que o tigre Jeremias tinha feito essa manhã, para seu aconchego. E catrapus-pus-pus, lá foi ele aterrar precisamente aos pés da Menina Zebra que, claro está, não perdeu a oportunidade de se rir com ar de troça.

Fixa bem, Zaragaio, As tuas cenas de amor São como as do papagaio Que tem no bico uma flor.

Pois que se vá, minha amiga, Esse não tem serventia, Não há zebra que o persiga Nem que seja num só dia.

Não te chateies, Florbela, Venho conversar contigo, Quando mais que o magricela Já recebeu seu castigo.

Olha, zebra, por favor, Não faças troça de mim Porque senão, esta dor? Vais senti-la tu no fim.

Olhem me bem que desplante! Logo ao despertar do dia! E o Zaragaio, expetante, Ouviu o que não previa.

Ele, espalmado no chão, Ainda todo emaranhado, Se levantou e então, Gritou-lhe muito zangado!

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É certo que se foi embora, Estando a sentir se mal, É vê lo a correr agora E a fugir p’ró pantanal.

Logo que se desprendeu, De um salto se levantou E quando se escafedeu, Lá no pantanal entrou.

Pobre Zaragaio, logo ele, que pensava ser um grande conquistador. Ao ver que não conseguia “apanhar a sua presa”, logo se escapou ao longo daquele pantanal imenso. Tudo correra tão mal na presença de Florbela, aquela zebra atrevida, que o melhor foi mesmo desaparecer dali para fora o mais rápido possível. Quem sabe se, ficando por ali alguns dias, até esquecer o sucedido, mais tarde, voltaria a tentar abordá la. Lá no fundo, apesar daquela zebra ser um tanto desmiolada, ele gostava mesmo dela. No mesmo lugar desse encontro inesperado, Florbela conversava agora com Zica, o papagaio. Este, por sua vez, passava todo tempo a idolatrá la. Ó, como ela gostava de ser o centro das atenções! Retorcia os olhos, balançava o corpo para a direita e para a esquerda e ficava ali tempo sem fim a ouvi lo tagarelar.

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Contudo, com o maior cuidado, tentava que ninguém a visse na conversa com esse papagaio tagarela. O que iam dizer? Afinal, como se dizia lá pelo Sitio de Todos Diferentes, Todos Iguais, cada espécie tinha era que se entender com os pares da sua espécie. Imagina o que iriam dizer se vissem uma zebra a namorar com um papagaio! Se isso acontecesse, lá viriam os falatórios, as maledicências. Era um pretexto como outro qualquer, o que queriam era coscuvilhar. Zica, o papagaio, gostava era de conversar com todos os animais, fossem quais fosse. Depois, achava imensa

Sim, Florbela, na verdade, A intriga não vale nada, Trocamos a liberdade Por uma vida encrencada.

Tu tens sempre os pés no chão, Eu passo a vida a voar, Amar nos é ilusão, Não serás nunca o meu par.

graça à desmiolada da Florbela. Na verdade, considerava a uma criatura diferente, mas daí a querer namorar com ela, valha-me Deus, lagarto, lagarto, lagarto!

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Tu és boa companhia, Gostei de conversar, E depois, quem sabe, um dia Tu me ensinas a voar.

“Mas que raio de conversa, O que quer ela dizer? Lá me vou que vou com pressa, Melhor desaparecer!”

E ela, muito agitada, Sem saber o que pensar, Seguiu sua caminhada Em busca de algo encontrar.

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Vou seguir a minha estrada, Voarei pelas alturas, Encontrarei uma amada Entre papagaias puras.

- Acho que percebi mal o que Zico disse, mas não vale a pena matar a cabeça a pensar nisso, são apenas parvoíces. Se cabe na cabeça de alguém pensar que eu, a mais bela zebra deste prado, me iria apaixonar por um pássaro tagarela. Só mesmo o Zico e as suas doidices. Papagaio maluco.

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Quando o papagaio partiu no seu voo desenfreado, a zebra Florbela ficou ali por momentos a pensar nas palavras de Zico, o seu amigo papagaio.

Então, menina Ginete, Onde vai toda vaidosa?

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E apressada lá foi ela cantarolando e correando o Sítio. Um pouco mais à frente, apareceu saída do nada Ginete, a macaca mais doida daquelas bandas.

- Para um grande banquete? Lá na casa da Felosa?

Cá ninguém brinca comigo Ria de si para si E se é fama que persigo, Vou procura la por aí!

Mas Ginete, a macaquinha, Que sorria descarada, Olhava para a caixinha Vazia, sem lá ter nada.

A minha já vai aqui Nesta caixa redondinha. Vou comprá la mais ali Numa pequena lojinha. -

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Essa traquina quisera Fora enganar a Florbela, Por saber como ela era E assim fazer troça dela.

Quando esta, foi buscar Um ramalhete de flores Para a sua amiga dar, Tão recheada de cores.

Esqueci me? Ela faz anos? Ó pobre cabeça, a minha! Ou será dia de enganos? Vou comprar-lhe uma prendinha.

Quanta euforia na mente de Ginete, a macaquinha! Ao mesmo tempo, tinha agora uma certa sensação de apre-ensão.Porque

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será que ela me ofereceu estas flores? Será que reparou que a caixinha está vazia? Não, não creio. Ela não pode ter adivinhado. Tenho que ter o maior cuidado, pela certa, este ramo de belas flores deve tratar se de alguma das suas partidinhas. Sim, na verdade, Florbela, a Menina Zebra, era perita em pregar partidas. Quase todos os animais já tinham passado por isso, apreciando as ou não. Uma ou outra, às

vezes até que achavam piada à genialidade das coisas que fazia para as provocar. Mas Ginete, a macaquinha, também se esmerava em traquinices.

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E quando se apercebeu duma pulga a saltitar entre as pétalas das flores, logo se apercebeu da marosca de Florbela, e engendrou de imediato um plano para lhe responder. Chamou Matreiro assim se chamava a pulga que era danado para brincar e entrou num pacto com a macaquinha marota. Iriam pregar a essa zebra endiabrada uma valente partida.

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- Oi, minha Felosa, amiga, Como estás esta manhã?

Disfarçadamente, arrastou Matreiro para a crina de Florbela, que logo se acomodou como pode naquela floresta de pelo. E lá foram elas, a zebra e a macaquinha, em direção ao lar da Dona Felosa. Logo que se apercebeu destas visitas inesperadas, esta a recebeu de asas abertas.

Entra, Ginete querida, Zebrinha, que linda está!

Uma caixinha vazia Para a minha coleção, Mas que bela companhia! E as flores, p’ra quem são?

São p’ra si, certamente, A Florbela as comprou, És tão amiga da gente Que ela de ti se lembrou.

Depois deste encontro agradável com a amiga Felosa, Ginete e a amiga regressaram a casa. Florbela, a Menina Zebra, nem imaginava que levava na sua crina a pulga

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Matreira, que preparava já uma das suas traquinices safadas. Assim a pudesse levar à prática. Florbela estendeu se um pouco sobre a relva. O dia tinha sido intenso e era hora de repousar um pouco. Matreiro tentou então aconchegar se na crina do seu hospedeiro e quando Florbela passava pelo sono, zás, saltou da crina para uma das largas costas da hospedeira e toca a banquetear se, pregando lhe uma série de ferradas para sugar o seu sangue. Esta sentiu-se um tanto agitada não entendeu de imediato o que se estava a passar. Como as ferradas continuavam, levantou se de um salto, mas sentiu umas dores imensas. Logo, desata numa gritaria louca para quem a quisesse ouvir:

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Tenho minha perna inchada, Sinto-me louca, a morrer E não posso andar, nem nada!

Era o belo papagaio Que gritava da oliveira Eu não vou aí, não caio Em mais uma ratoeira.

Tão aflita que estava Mas ninguém a acudia, Quanto mais ela gritava Por ali ninguém ouvia.

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O que está a acontecer?

Acudam! pedia ela Por favor, alguém me ajuda! Fui cair numa esparrela E a dor é muito aguda!

Cale se aí, por favor, Tenha outros termos, menina, E se quer chame o doutor Que mora ao dobrar esquina. -

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Com o tempo, a vizinhança tinha aprendido que a desmiolada da Menina Zebra, passava a vida a mentir e a pregar partidas e já ninguém a levava a sério. Pobre zebra que se viu assim abandonada e a sofrer sozinha as investidas daquela pulga sinistra que foi arribar ao longo do seu corpinho esbelto e perfumado. Cada animal que passava por perto, tentavam evitá la, não fosse tratar se apenas mais uma das suas artimanhas para os provocar. Agora, ali sozinha e abandonada, sofria as agruras daquela pulga enfadonha sem ninguém que a acudisse.

Lá de longe, Ginete, a macaquinha, bem que ouvia os gritos, mas refastelava se ao ouvi la berrar. Bem sabia que umas ferradelas de pulga, por alguma dor que provocassem, nunca lhe trariam grande mal. Por isso, olhava e divertia se ao vê la espernear se continuamente.

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Sozinha, NãoNinguémdesamparada,aiaajudarEla,aliespecada,paravadegritar.

E sem mais tempo perder, A amiga acariciou E sem saber que fazer Logo o médico chamou.

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Mas os berros que ela dava Se espalharam no lugar, Quando menos esperava Zaragaio viu chegar.

Condoído, junto dela, A viu tão debilitada Nem parecia a Florbela Que a todos provocava.

Logo se preocupou Em ver o que a amiga tinha E ela grata ficou Por não ficar tão sozinha.

Quando viu Zaragaio tão aflito, Jibas, um leão, médico conceituado da Aldeia dos Animais Todos Diferentes Todos Iguais, que vivia na Casa Amarela situada ao dobrar da esquina, tanto que ouviu os gritos deste que logo se prontificou a ajudar. Ele bem sabia que essa zebra danadinha era desmiolada e que provocava todos os que lhe passassem pela frente, mas ele era médico, houvera jurado que protegeria e trataria quem dele necessitasse. Sem perder tempo, pegou na sua maleta de primeiros socorros e logo foi no encalço de Florbela, seguido de

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perto por Zaragaio, o galanteador apaixonado. Quando chegaram, Florbela estava ainda a contorcer se de dores.

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- Acuda, senhor doutor, Que não sei o que se passa, É muito grande esta dor, Que vem p’ra minha desgraça.

- Deixe-se disso, menina, Tudo na vida tem cura. Já vou ver essa perninha, Mas que grande mordedura.

Mordedura? Mas de quem?

Vou colocar esta pomada Para tratar a alergia, Massaja bem na picada E repousa todo o dia.

Nada de andar por aí Sempre com o seu mau sizo Mais logo estarei aqui, Veja se ganha juízo!

Estou tão grata, doutor! Zaragaio, foi na Farmácia Compra me isso, por favor, É um unguento de acácia.

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Ando sempre com cuidado! Mas será que foi alguém Que viu meu pelo tratado?

Nem dá para acreditar! Quem será esse safado? O doutor vai me ajudar? Vou dar conta do danado!

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tenho que me despachar, tenho pacientes à espera. Vida de médico é sempre a correr - Ao fim do dia, passo por aqui para ver como essa pernita está, mas não te esqueças de espalhar de quando em quando o óleo de acácia na ferida e em seguida refrescar o corpo com o sabão de espinhosa que te receitei, a fim de te proteger de novo desse animalzinho indesejado que pretenda invadir esse teu macio pelo.

Concluída a desinfeção da ferida, Jibas, o médico, despediuBem,se:

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Obrigada, senhor doutor, assim farei logo que Zaragaio volte.Quando

se sentiu sozinha, Florbela começou a procurar o tal animalzinho que ousara morder lhe a perna e provocar-lhe aquela indesejável alergia.

Foi então que se lembrou da partida que pregara à sua amiga Ginete, a macaquinha. Era a pulga que ela tinha colocado no ramo de flores que lhe oferecera. Como pode ela ter a ousadia de a ter colocado no seu corpo?

Olá, olhem quem está aqui na minha patinha, uma pulga! Mas, porque diabo veio ela aqui parar? Logo a mim, que sou tão precavida e asseada!

Com quem eu me fui meter! Quis pregar uma partida à macaquinha Ginete e acabou por se virar o feitiço contra o feiticeiro. Este meu temperamento impetuoso vai acabar mal, estou a ver. Tenho que me esforçar por ser mais comedida ou vou ser eu a sofrer as consequências dos meus atos.

Não querendo perder mais tempo, procurou expulsar a pulga que a estava a molestar, rodopiando sobre o seu corpo num bailado inusitado. E eis que chegou Zaragaio com os medicamentos que o médico lhe tinha receitado.

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O que foi que aconteceu? Caí em cima de ti! A pulga me endoideceu Na minha pernita a senti!

Quando este se aproximou, nem queria acreditar, ela rodopiava, rodopiava e acabou por cair sobre si, estatelando-se ambos no chão.

Andas sempre tão asseada, Com o pelo luzidio.

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-Com esta perna inflamada, Só mesmo dentro do rio.

Vem, toma a medicação Para a alergia curar.

Queria dar conta dela Quando ali a vi pular.

- Essa dor e comichão! Depressa te vai passar.

- Não te apoquentes, Florbela, Havemos de a apanhar.

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É o castigo por ter sido indelicada e até maldosa com a macaquinha Ginete. Mas acho que aprendi a lição e prometo a mim mesma que de hoje em diante vou modificar o meu procedimento, serei mais amistosa, menos vaidosa, e tratarei os animais, meus congéneres, de igual modo. E tu Zaragaio, desculpa eu ter sido tão indelicada contigo. Prometo que daqui em diante te vou tratar duma forma bem diferente.

Não necessitas pedir me desculpa, na verdade, eu também não procedia contigo como devia. Esqueçamos isso. De hoje em diante, iremos ser bons amigos, contaremos

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sempre um com o outro. De momento, o mais importante é encontrar essa pulguita danada, pois já causou estragos suficientes na tua perna.

E foi assim que Zaragaio a convidou a deitar-se para que com paciência pudesse procurar o animalzinho indesejado.

O unguento vou colocar, Não te mexas, quietinha, Vou a perna massajar E lá se vai a pulguinha!

- Uma lição a aprender: Com pulgas jamais brincar.

Vai e arranja outro lugar! Disse Zaragaio irado. Mas eu quero aqui ficar E não ir p’ra outro lado.

Tem cuidado, ó atrevido, O que estás tu a fazer? Queres acabar comigo? Sou nova para morrer!

Um pouquinho para ali… Com cuidado, devagar! Mais um pouco por aqui E logo a vemos saltar.

Quando desaparecer, Toda essa dor vai passar.

Sou pulga e não um cão, Não te vou tirar a vida.

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Pelo macio, tratado, Bom sangue para chupar, Deixem me estar descansado E assim me possa fartar.

Para quê tanta aflição Ao cuidar duma ferida?

E neste diálogo de surdos, depressa Zaragaio tenta apanhar a impertinente pulga. Oxalá a conseguisse apanhar

Não sejas empertigado! Eu gosto de cá morar! E mesmo se mergulhado, Não faz mal, eu sei nadar!

És insolente, atrevida, Salta daí, por favor, Dou cabo da tua vida, A causa de tanta dor.

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Florbela, assim que encontramos a pulga, o que vamos fazer com ela? Vê se concordas com esta sugestão: Colocá la no pelo de um gato. Que dizes?

- Cá por mim acho bem, desde que longe de mim. Afinal, fui eu a culpada desta situação! Há um gato perto daqui, na florista “Descanso em Paz”. Chama se Zico, o gato Maltês. Assim, a nossa amiga regressa ao seu pouso original.

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sem a matar, não lhe queria fazer mal. Se o conseguisse, iria levá la e coloca la no pelo macio de algum gato maltês que por ali encontrasse, sempre seria mais apropriado para ela. Foi então que decidiu pedir a opinião da FlorbelaDizme

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Zaragaio não perdeu tempo e correu apressado à procura de Maltês, o gato, que andava por aí cheio de lamúrias, a correr todos os cantos, à procura de Galica, a sua pulguita de estimação que misteriosamente tinha desaparecido. Quando Zaragaio o encontrou, deu-lhe a notícia que tanto desejava e logo correram os dois desenfreados ao encontro de Florbela, a Menina Zebra, que os aguardava no seu canto. E a paz voltou a reinar na Aldeia de Todos Diferentes, Todos Iguais.

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Diferentes, mas iguais, Neste mundo inteligente Onde entre os nossos animais São iguais, nenhum diferente.

A vida faz mais sentido Quando a maldade se vai Onde Zaragaio, contido, Como seu marido sai.

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Aprendamos a lição Desta antiga e linda aldeia, Do que vai no coração Nossa boca está bem cheia.

Na vida da zebrazinha, Agora, em seu coração Um novo amor se detinha Prestável com toda a gente, Era feliz Florbela E sentia se contente E cada dia mais bela.

Ele cantava feliz, Mais terno e apaixonado, Aquilo que tanto quis Era a Zebrinha a seu lado.

Foi grande a transformação

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