ROSA MARIA SANTOS
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Índice Ficha Técnica Biografia Nota de Abertura O ABC da Vida Toninho, o Menino que queria Ser Poeta Janita, a Lagartinha do Pomar Carnavalina, a Princesa Menina Dona Lesma e Felisberto, o Caracol Juliana e a Estrela de Fogo Lenda do Coelho de Páscoa Na Aldeia da Couvelândia O Circo Juvenal Sininho Flor, a Bailarina da Herdade Vaidosa, a Pera que não queria ser Pera Duda, o Menino que queria Mudar o Mundo
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Ficha Técnica Título: ESTÓRIAS EM TONS DE ROSA Autor: Rosa Maria Santos Género: Contos Capa: Arranjo de José Sepúlveda Coordenação Editorial: José Sepúlveda Rosa Maria Santos Edição: Rosa Maria Santos Formatação: José Sepúlveda Fotos: Net (Printrest)
Publicado em ISSUU Rosa Maria Santos Abril. 2019 6
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Biografia Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, entre elas no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria. 2º Prémio de Poeti Internazionali. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. 7
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Foi Assistente de produção e recolha na coletânea de postais do Solar de Poetas Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar; VALE DO VAROSA Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal, todas editadas em e-Book. É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó, a música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto, do Solar de Poetas.
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A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018 E-Books: Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado - Dezº 2017; Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio de 2018; Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) – Capa: Glória Costa – Maio 2018; Bolachinha vai à hora de poesia – Outubro 2018; Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo – Novembro 2018; Sinos de Natal, Natal de 2018; O Natal de Bolachinha, Natal de 2018; Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019. A editar: Histórias da Bolachinha – Capa e ilustrações de Glória Costa – Em breve. 9
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Nota de Abertura Para dar sequência à sua nova fase de pequenas histórias, a Autora apresenta-nos agora uma séria de trabalhos, mais propriamente, doze, através dos quais mergulha no sonho e fantasia, aos quais já nos habituou, sempre com uma clarividência imaginativa que nos surpreende. A diversidade das suas temáticas cria em nós uma grande expectativa sobre o que virá a seguir. Não posso deixar de vos convidar a ler cada uma das suas criações e deliciarem-se com a sua fértil imaginação. Boa leitura. José Sepúlveda 11
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Havia grande alvoroço no Reino das letras. Nessa manhã, a letra A despertou mal arreigada, aos gritos: Hoje não vou ligar-me a letra alguma, sou bem mais importante que quaisquer de vós. Afinal, sou a primeira, como sempre! - Sou a primeira daqui E não irei alinhar Pois no início surgi E assim vai continuar. - Mas que grande confusão, Gritava o abecedário Vamos ver porque razão Não hás-de ser solidário
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- Letra A, vem, por favor, Vem aqui juntar-te a nós! Porque te sentes maior? Disse o B, em alta voz Já disse, sou a primeira, Todas estão após mim - Somos iguais, que canseira Dizia o Z lá do fim Todas as outras letras do Abecedário olhavam atónitas, perante tal atitude. - O que lhe havia de dar agora, birrar com todas nós – diziam incrédulas umas para as outras entrou em greve! Que rabugenta! A letra Z, do extremo do abecedário, reclamava: - Sua excelência Dona A, quer explicar-nos a razão de tal atitude?. 16
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Que petulância, Z, não vês que és a última do grupo? Como te atreves a questionar-me nesses termos?
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- Que petulância letra Z, não vês que és a última do grupo? Como te atreves a questionar-me nesses termos? Ofendida, a letra Z logo ripostou: - És mais importante, amiga? Só pode ser a brincar! Para que não haja briga Ninguém se vai afastar. Nós somos sete vogais A E I O U, então? As consoantes são mais, Bem diferentes o são. - Somos um corpo único, vinte e seis letras neste conjunto que convencionaram ser um Abecedário. 18
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Até podes ser a primeira da lista, mas não é por isso que é mais importante que qualquer das demais, tenha isso em mente, menina A. - Inconformada com toda essa atitude da companheira, a W levantou-se e disse: - Ouve bem, amiga A, olha o meu exemplo. Eu até posso ser lida como vogal ou como consoante, sou única neste nosso mundo das letras. Posso ser lida das duas formas e não é por isso que me sinto mais importante que qualquer uma de nós. - No abecedário – acrescentou o Y – todas somos importantes, todas temos funções bem específicas e se a dado momento uma de nós faltar, todo o circuito da escrita perde o seu sentido..
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- Falem, falem, eu vos digo Que vou ser sempre a primeira - Quando olhas p’ró umbigo, Entra mosca ou sai asneira! - Permitam-me – volveu a letra Z. - Sinta-se livre, menina – adiantou a letra W. - Diz-nos, A, o que se passa consigo? Tão má cara para connosco, não te sentes bem? - Olha-me bem esta! – reclamou – Agora deu em psicóloga. Guarda para ti os conselhos ou vai dálos a quem deles precisar. Não tenho satisfações a dar-te. Primeira, primeirinha e ninguém vai fazer-me recuar. Olha-me bem esta, logo a que está lá no fundo, na cauda do Abecedário! - Cale-se, insolente – disse zangada a letra Z – começo a perder a paciência com tanta arrogância. 20
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Cala-te, insolente – disse zangada a letra Z – Começo a perder a paciência com tanta arrogância
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- Mas que mau humor por estes lados – interrompe a letra E. Mas o que É que se passa afinal? Já viram que sE não EstivEssE aqui como que um realcE da frasE, a mEsma não tinha qualquEr sEntido? QuEm É pois mais importantE do quE quEm? REspEitE, mEnina, rEspeitE! Somos 26 lEtras, todas com as suas EspEcificidadEs. NinguÉm É mais quE ninguém. Algumas dE nós vogais Entram mais numas palavras, outras, noutras. Na vErdadE, todas somos importantEs. SEm nós, no nosso lugar próprio, nada faria sEntido. Achas-te mais importante, porque o abecedário começa no A! - Ah ah ah ah! Gostei – acrescentou o J – bela intervenção, amiga E. -HomeEssa! – continuou - quão convEncida, amiga letra A. 22
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- Não sei bem porque razão Dizes ser mais importante Presta bem mais atenção E não sejas petulante Juizinho, amiga A, Nada de greve ou gazeta. Não é maior nem será A não ser bem mais pateta! Nesta quezília cerrada, entrou em cena a letra M. - Ora, vamos pensar um pouco. Sou a M, M de Maio, mês das Margaridas, das Maravilhas dos Milagres. Mesmo assim, não me sinto mais importante que ninguém. Vou contar-vos uma história. Um DIA andava o AMOR, a passear, quando encontrou um BEBÉ. 23
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Pegou nele ao colo e levou-o para CASA, para que não se sentisse tão sozinho. Quando lá chegou, a ESPERANÇA chegou a si, desejou formar uma FAMÍLIA. E desejou dar um nome ao seu BEBÉ, o seu novo HERÓI: IVO JOSÉ. Desde esse dia, olhava ao redor e tudo lhe parecia ter sentido. UM dia IVO adoeceu. Com ZELO, tomou-o no colo e levou-o ao HOSPITAL. O MÉDICO, receitou-lhe um XAROPE, QUE fez com que IVO depressa RECUPERASSE. - E foi assim, amiga A. Todas fazemos parte desta máquina imensa que faz girar o mundo. Todas, cada uma no seu lugar, com a sua função específica, mas sem as quais nada faria sentido. Connosco se criam as frases, os textos, com que a humanidade comunica entre si.
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‌ E foi assim, amiga A, todas fazemos parte desta måquina imensa que faz girar o mundo.
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- Nós, as letras verdadeiras, Cada uma no seu lado Sentimo-nos as primeiras Num texto bem alinhado Agir com sabedoria Não é nada complicado Escrever com harmonia É preciso em qualquer lado. Sozinho, ninguém é ninguém neste mundo em que vivemos, neste espaço feito de pequenos nadas, aonde unidos faremos a diferença, num lugar aonde em cada espaço seremos um por todos nós.
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Nota de Abertura Uma vez mais, a autora, Rosa Maria Santos, nos surpreende, agora, oferecendo-nos um conjunto de pequenas histórias, às quais, sem preocupações estéticas ou pudores académicos, a autora chama contos. Histórias vivas e com uma criatividade que não deixa de nos prender a cada página. O sugestivo título Pétalas de Azul é a expressão simples da sua personalidade onde impera a fantasia e o desfolhar da Rosa que há em si. Através duma leitura atenta, somos levados a viajar no rasto do seu imaginário, fazendo-nos retroceder a uma infância aonde eram férteis as
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- Bom dia, S’tora – saudavam alguns alunos, cantarolando, à entrada quando chegou a sua jovem professora à sala de aulas. A campainha acabara de tocar e logo os alunos do quinto D a esperavam, como sempre, à espera de ordem para entrar na sua sala, a dezanove. Lúcia, a linda professora, mostrava-lhes o seu peculiar sorriso, saudava-os e convidava-os a entrar. - Bom dia. Vamos entrar, mas com ordem, sim? À sua ordem, os alunos sentaram-se e mantiveram-se em silêncio. - Como todos sabem, meus queridos, hoje é o dia vinte e um de março, um dia muito especial. Sabem porquê? - Sim, S’tora - responderam a uma só voz. É o início da primavera – acrescentava Toninho, um rapazinho de dez anos, vivo e esperto. 29
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- Mas, não só! – continuou Lúcia, é também o Dia Internacional da Floresta. E… - O Dia Mundial da Poesia – gritou Luizinho entusiasmado. - Isso mesmo – retorquiu Lúcia – o Dia Mundial da poesia. - É dia de conversar Sobre a bela poesia. Quem daqui sabe rimar? Com carinho lhes dizia. - Eu sei - dizia o Pedrinho Esfusiante de alegria. - Tu és poeta, Toninho! - Sim, eu gosto de poesia.
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Vamos a isso – respondeu Lúcia, contagiada pela alegria sentida na sala.
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O Pedrito, envergonhado, Levanta-se a gaguejar Com o seu dedo apontado Para o teto, para o ar. Dizia com seus botões: - Vamos todos versejar? Pois sim, lembremos Camões Que tem versos de encantar - Um poema vou fazer – Retorquia a Heleninha - Vamos quadras escrever Acrescentava Ritinha. - Muito bem, gosto desse entusiasmo. Vamos a isso - respondeu Lúcia, agradada com toda a alegria sentida na sala. 32
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Toninho foi-se à Estante e logo volta com os Lusíadas nas mãos e por ali ficou em silêncio por uns instantes. Depois, chamou a professora e perguntou: - Professora, posso falar consigo? - Claro que sim, Toninho, eu vou aí. Quando lá chegou, Toninho acabara de escrever algumas quadras. - Se algum dia for poeta Eu hei de escrever em verso E em poesia aberta Vou abrir-me ao universo Poeta, sim, mas um dia, E seja o que Deus quiser. Hoje, dia da Poesia Só quadrinhas vou fazer! 33
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Vejo em mim um sonhador, Quero ser como Camões? Cantar, cantar com fulgor Com ou sem contradições. Viver no mundo da lua, Navegar em tempestades, E a vida nua e crua Cantar, mas sem falsidades. Tanta lágrima vertida Entre guerras escusadas Tanta gente cai perdida Ao troar das espingardas. Escrever com emoção Como Pessoa ou Camões E coberto de ilusão, Hei-de arrasar corações. 34
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E, solenemente, comeรงou a ler as quadras. Toda a turma ficou encantada
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- Ena, poeta! Mostra o que estás a escrever. Dizme, o que querias perguntar? - Sabe, S’tora, o que eu gostava mesmo de ser era um poeta. Mas não posso, não sei escrever poesia. Vou rabiscando umas quadritas, mas não passo daí. - Deixa-me ler o que escreveste, posso? - Sim, S’tora, quadras simples. Lúcia tomou o papel escrito, colocou-se frente a toda a turma e com olhar sério e feliz, disse: - Meninos, pedia um pouco de atenção. Vamos ouvir o que o Toninho acaba de escrever neste lindo dia consagrado à poesia. E, solenemente, começou a ler as quadras. Toda a turma ficou encantada. Hoje havia festa nos corações dos alunos do quinto D, nasceu um poeta. - Alguém fez mais quadras? - perguntou a professora. 36
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- S’ tora – disseram - depois de ler as quadras do nosso poeta, não vale a pena ler as nossas, são tão simples! - Vale sim - respondeu Lúcia - venham essas quadras. Um a um, cada aluno foi desfiando o seu rosário poético, sob o olhar entusiasmado de toda a turma. No fim, a professora, agradada com o decorrer de tão agradável aula, disse: - Sinto-me orgulhosa. A sala dezanove é hoje uma sala de cultura, a sala dos poetas. Poetas de excelência. Muitos de vós serão amanhã estrelas a brilhar no espectro da poesia, tenho a certeza. Agradados com tal elogio, lançaram um grato sorriso à sua querida professora e Toninho, tomando a dianteira, improvisou:
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- Se um dia poeta for Irei ser muito feliz, Não vou perder meu melhor, O meu tempo de petiz. Lá fora há sol a brilhar, Pétalas de várias cores, Borboletas a voar Que poisam nas lindas flores. Se hoje lemos Camões Celebrando a poesia, Eu penso com meus botões Se vou ser poeta um dia. Ser poeta é ser capaz De abraçar o universo Num mundo tão incapaz De fazer magia em verso. 38 37
Que bom, vamos fazer deste dia um dia de alegria.
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Falar de amor e carinho, Mesmo que sinta tristeza, Vai ser esse o tal caminho Que vou trilhar com certeza. - Muito bem, Toninho. Como hoje é também o Dia Internacional da Floresta, vamos acabar a nossa aula ao ar livre, desfrutando das sombras que as árvores nos oferecem cada dia. Concordam? - Que bom, vamos fazer deste dia um dia de alegria, venham daí – gritava o Toninho. E logo, S’tora Lúcia improvisava: - Viva a nossa poesia, Liberdade e pensamento, Descobrimos neste dia Um poeta em crescimento. 140
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O quinto D, descobriu Alegria e afeição Que a poesia fluiu Entre a nova geração!
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Janita era uma pequena lagartinha que vivia dentro duma suculenta maçã encarnada. Todos os dias, mal o sol despontava, abria a portinha da sua casinha e espreitava para ver como estava o dia. E logo saudava a mãe natureza.
- Bom dia, mãe natureza, Mas que belo amanhecer, Perfeição e singeleza E a vida a renascer. Mais um dia vai surgindo, O sol prestes a raiar, E a lagartinha sorrindo Neste belo e bom lugar.
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Acho que vou palmilhar Os ramos da macieira E Respirar esse ar Que irrompe da laranjeira. Era, na verdade, um belo romper da aurora. Janita deixou para trás o seu buraquinho na maçã e lá se foi rastejando. Gostava de calcorrear por ali ao despontar cedo da manhã, antes do sol aquecer. Correu a macieira e, no seu trajeto, ia cumprimentando outras lagartinhas como ela que iam surgindo ao longo do caminho. Depois dum curto percurso matinal e do breve tagarelar com as amigas, voltou ao seu buraquinho na rubra maçã onde vivia. Ali podia disfrutar de algum conforto e descanso. Mas, qual o seu espanto quando ao chegar verificou que a sua maçã tinha desaparecido 46
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Sem saber o que fazer, gritou tĂŁo alto que logo o eco se espalhou ao longo de todo o pomar.
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Sem saber o que fazer, gritou tão alto que logo o eco se espalhou ao longo de todo o pomar. - Aonde estás, casinha minha? – Gritava desesperada – - Que aconteceu, lagartinha? - A casa desfez-se em nada! - O que foi que aconteceu? - Estava aqui, já não está! Olhava o chão e o céu, Não via a casa maçã.
Em que grande aflição A lagarta se encontrava. No meio da confusão, Coitada, como ela estava!
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Uma outra lagartinha, a mais antiga ali na macieira, ouviu tal algazarra que logo foi tentar aperceber-se do que ali se passava. - Afinal, o que se passa? Perguntava a anciã! - Olha bem minha desgraça, Perdi a minha maçã! - Arranja-se solução Disse a amiga sorridente Busquemos outra e então Atiras-te para a frente. Agora, era a comunidade de lagartinhas que ajudavam a encontrar uma nova maçã para a pobre Janita.
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Mas ela, esquisita, parecia não gostar de nenhuma. Esta por isto, a outra por aquilo, parecia não haver ali maçã que não tivesse defeito. Doidinha, como desejava ver de volta a sua maçã! E elevava preces aos céus para que o Pai a devolvesse. - Senhor, ó bom Pai do Céu, Vem ouvir minha oração, Se a maçã desapareceu Devolve-a, por compaixão - Há muitas maçãs aqui Mas nenhuma é a teu gosto. Estou-as vendo daqui E melhores, aposto. De repente, ouviu-se um ruido de passos ali perto. 50
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- Faltava agora mais essa. Estas lagartas inĂşteis quererem dar-me ordens.
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- Quem será? – perguntavam. E, escondidas, espreitaram para o solo. - Um coelho! – gritaram. - Coelho? Que atrevimento! Não vedes que sou uma lebre? - Pareces um coelho! - Olha! – grita Janina – A minha maçã! - Atrevido! – gritaram em coro – O que fazes com a maçã de Janina na mão? Passa-a para cá, seu ladrão de maçãs!- gritava a velha lagarta - Essa maçã tem dono! - Faltava agora mais essa. Estas lagartas inúteis quererem dar-me ordens. - Inúteis, nós, coelhinha Feita lebre inteligente? Se comes a maçãzinha Vais ter que te haver com a gente! 52
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- Olha-me estas destemidas! Como ousam falar assim? Metam-se nas vossa vidas, Não se aproximem de mim. - A maçã tem um buraco, Pouco presta para comer. - Quando ia em meu recato Caiu no chão, ‘stá-se a ver! - Pensava deitá-la fora Mas logo vocês gritaram Olhem, desculpem, agora Vou-me daqui. Se enganaram! Num gesto rápido, a lebre Laroca lançou a maçã em direção à macieira e foi-se dali. Até que as lagartinhas ficaram com pena, parecia ter ficado triste. 53
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- Laroca, volta aqui, por favor. A nossa amiguinha tinha acabado de perder a sua casinha e ficou desconsolada. Desculpa o modo como te tratamos. Aqui neste pomar somos um por todos e todos por um. Queríamos ajudá-la. Janita bem que tentava recolocar a sua maçã no sítio. Mas nada, não conseguia. Ao mínimo toque, lá estava ela a cair desamparada e nada. Tornara-se um perigo constante para si. Logo, chamou o grupo e desabafou: - Queridas amigas, a minha casinha já não é a mesma. Antes, era segura para viver. Agora, mesmo que conseguisse fixá-la, logo ia morrer. Por isso, vou arranjar um novo lar para viver. E, virando-se para a lebre: - E tu, Laroca, toma – entregando a maçã – comea com prazer e que te saiba bem.
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… e olha, sempre que te apeteça uma suculenta maçã, vem ter connosco
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E olha, sempre que te apeteça uma suculenta maçã, vem ter connosco, logo te arranjamos a melhor da nossa árvore. - Quem me quer vir ajudar A encontrar a maçã Onde possa descansar E ver o sol pela manhã? …. Todas elas se espalharam Para a tentar ajudar E logo que a encontraram Surgia um lar, doce lar. Lebre Laroca, sentada, A sua maçã tragou E aos murros, à dentada No seu ventre a instalou. 56
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E no seu pomar, nesse dia, A paz se reencontrava Respira-se alegria E tudo feliz ficava.
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No Reino das Camélias, havia uma tristeza enorme. Carnavalina, a filha querida da Rainha Ricardina, desaparecera quando ainda bebé de tenra idade. Alguém a levara do seu bercinho enquanto dormia o seu sono tranquilo.
- Minha querida menina, - Aonde estás? Quem te levou? Perguntava Ricardina Quando no chão se prostrou. - Meu Senhor, vem me ajudar! Traz nossa filha de volta! Não consigo aguentar, O mal nos bateu à porta! E a Rainha soluçava Estendendo a sua mão Para o berço que embalava Em busca de proteção. 61
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- Meu bom Deus, zela por ela E tem de mim piedade Gostava tanto de vê-la, Quase morro de saudade Naquele dia, tudo aconteceu. O carnaval estava à porta. A azáfama era enorme, o Rei Artur comandava os preparativos para os festejos. De repente, é assaltado pelos gritos de Ricardina, a Rainha amada. Correu para casa e viu-a banhada em lágrimas. - A nossa menina desapareceu! – clamava em alta voz. Logo, arautos, foliões, guardas, toda gente partiu reino fora em busca da Princesa, a linda Carnavalina. Mas, nada! Um a um, voltavam desconcertados, perplexos.
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Parecia ter sido engolido pela terra. Aonde estaria a crianรงa?
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Parecia ter sido engolido pela terra. Aonde estaria a criança? Artur nem queria acreditar no que estava a acontecer. Impotente, inconformado, abandonou tudo e foi reino fora tentar procurar a filha querida.
- Quem é que a levou de mim, Desgraçado, humano e vil! Prepara-te, agora o teu fim Quando entrares no meu covil. - Minha desgraça, senhora, Não me faz temer pela vida, O meu peito, triste, chora Por minha filha querida.!
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- Que dizes tu, miserável, Será que me destratais? Vai daqui, imperdoável, Mas vai e não voltes mais! - Por favor, por piedade, Estende-me a tua mão, Ela tem tão pouca idade E precisa de afeição. - Tua filha não a vi, Vejo que estás a sofrer, Mas, por favor, vai daqui Ou irás te arrepender! Artur saiu dos confins da terra mais abatido ainda do que quando chegara. Como gostava de encontrar Carnavalina. 65
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Não lhe passava pela mente que tivesse de regressar a casa sem a filha. Apressado, saiu dos confins da terra e galopou por lá fora, desenfreado. Ainda por cima, o Carnaval que se aproximava a todo o gás. Ao fim de algum tempo, chegou a um vasto areal de areia branca. O sol brilhava e refletia sobre aquele manto de alvura. Estava cansado, muito cansado. Tinha percorrido léguas e léguas. O suor escorria-lhe pelas têmporas. Foi junto do mar e refrescou-se. Ao tocar na água, ouviu um burburinho, algo semelhante a um ondular estranho. De repente, o céu toldou-se, o mar agitou-se e o sol logo se escondeu. Atrapalhado, desequilibrou-se e logo foi engolido pelas ondas. Este, desesperado, apenas gritava: - Quero a minha filha, quero a minha filha!
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- Eu sei que tu tens razĂŁo, NĂŁo fiques desesperado.
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- Diz-me, ó mar, estás zangado? Acalma-te, por favor, Sou um pai preocupado E é grande a minha dor. Não viste a Carnavalina? Penso que alguém a levou Sendo ela pequeninha Logo o tempo a tragou. - Eu sei que tu tens razão, Não fiques desesperado. - O meu pobre coração Vive triste, amargurado. Vem ajudar-me. Bem sei Que és forte, conhecedor; Por isso, te pedirei Que acabes com esta dor.
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- O saber morreu de velho E sei que aqui não passou Mas vai junto a teu espelho, Quem sabe se lá ficou. Talvez lá no firmamento Num pôr de sol anilado, Ela surja e num momento Possas ficar descansado. Desalentado, Artur soltou-se daquele ondular bravio e disparou de novo por essas terras além. Foi quando foi surpreendido pelo grasnar duma gaivota. Era Merlim, que andava por ali à procura de alimento. - Merlim, gaivota linda, como gostava de encontrar o sol anilado!
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- Qual a razão que te leva, ó Rei, a procurar o sol de anil? - Levaram-me Carnavalina, a minha menina. Preciso encontrá-la. - Lamento, meu Artur! O que tem o sol de anil a ver com o desaparecimento de tua filha? - Não sei, só sei que preciso de a encontrar. - Desce do teu corcel e monta sob as minhas asas. Vou levar-te ao sol anil. Segura-te bem, não podes cair. Seria o teu fim.
- Vamos lá nesta aventura Procurar essa criança, Voemos a grande altura, Não temas, tem confiança. E voaram pelo céu À procura da menina E logo o sol se escondeu Atrás da nuvem branquinha. 70
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E eis que um arauto se aproximou com uma notĂcia intrigante.
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- Nada tenho a te dizer, Volta à terra fria e nua, O mais que podes fazer É procurar, continua. No reino das Camélias, Ricardina, a Rainha, andava triste e deprimida, sem alento para enfrentar cada dia, chorando a filha querida. Solidário, o filho, bem que tentava animá-la, passando todos os seus momentos tentando encontrar a irmã. E eis que um arauto se aproximou com uma notícia intrigante. Corriam rumores que Carnavalina teria sido vista nos confins do norte, onde nada há. - Vamos procurá-la – convidou Solidário, decidido:
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Ricardina, mãe, rainha, Lamentava a sua sorte Levaram sua menina Lá para os confins do norte. E o príncipe, solidário, Com toda a sua energia, Já preparava um cenário Para a encontrar algum dia. - Vamos daí, mãe querida, Senhora deste castelo Em troca da minha vida Dar-te-ei um novo anelo! - Não lamentes teu passado Olha em frente, p’ró futuro, E ficarei ao teu lado Neste tempo novo e puro. 73
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Ó Virgem, junto a teus pés Nossa vida vimos por Pedindo-te que nos dês A menina, por favor. Então, terei a certeza Que findará nosso mal E com a nossa princesa Gozemos o Carnaval. Cansado e quase sem esperanças, eis Artur a explorar o alto dos céus. De repente, uma estrela brilhou ao longe como que chamando por si. - Estou aqui, Sua Alteza. Carnavalina está comigo, venha ver. Durante o sono, viajou no sonho de fantasia e quando menos esperava, estava aqui, no Reino das Estrelas.
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Louco de alegria, Artur lançou-se para a menina e, com ela ao colo, enlaçou-a num abraço sem fim. - Como é bom o reencontro, filha minha. Logo, subiram os dois para o dorso da gaivota e retomaram seu caminho de regresso ao lar. Merlim, feliz por este inesperado desfecho, cheia de fulgor, voava a grande velocidade. Lá no reino, ainda o príncipe Solidário e sua mãe Ricardina se preparavam para partir e logo surgem no ar a bela gaivota, planando sobre o paço, transportando o Rei e sua amada Filha. E enquanto a feliz notícia se espalhava por todo o reino, no Paço se viviam momentos de imensa alegria. E logo os festejos do Carnaval foram retomados. - Vamos, apressem–se, o Corso está a sair.
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Aos vossos lugares, dizia o Rei, olhando orgulhosamente para a sua prole. O povo aplaudia feliz o desfecho de toda esta aventura e clamava: - Viva o Rei, viva a nossa princesa Carnavalina!
O povo saiu à rua P’ra ver o corso passar E até ao chegar da lua Não parou de desfilar Eis a Família Real No seu reino reunida Viva, pois, o Carnaval Que é razão da nossa vida!
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Andava o Ti Manel das Couves a calcorrear a sua herdade, procurando ver se estava tudo bem, quando de repente ouviu uma conversa interessante atrás duma moita, onde tinha plantado uma bela horta de couves. Surpreendido, aproximou-se e exclamou: - Mas que raio vem a ser isto? Que conversa mais estranha! Parecem discutir a divisão do terreno, como se a horta fosse deles! Ti Manel coçava a cabeça, espreitava, mas não via ninguém. E a conversa continuava. A Menina Lesma e Felisberto, o caracol, ali estavam na sua horta a observar e a disputar as couves que eram suas. - Que desplante! – dizia – a planear a forma de dividirem entre si o pitéu.
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Felisberto, o caracol, esperto que nem uma raposa, ambicioso, pensou enganar Dona Lesma. Esta ficaria com a menor porção de terreno. Ele, já se sabe, com a outra parte, a que tinha mais couves. Ora vejam bem esta esperteza saloia. - Olha-me bem, Lesma – dizia – Deixaste o aconchego da tua toca? Ou será que o perdeste?
- Perdeste a casa, menina? Será que foste assaltada? Coitada da pobrezinha: Sem um lar, estás tramada! E logo ela, que de parvinha tinha muito pouco e percebeu que ele se referia à couraça que possuía, quedou-se num silêncio sepulcral, acabando por desabafar:
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- Pois, pois - respondeu Felisberto – Treta, só treta. Como sabes, o teu corpo até que não é muito diferente do meu.
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- Sabes, Felisberto? Nós, as lesmas, não temos o hábito de andar com as casas às costas. Confiamos na natureza que a cada momento nos proporciona um esconderijo onde podemos repousar em segurança. - Pois, pois - respondeu Felisberto – Treta, só treta. Como sabes, o teu corpo até que não é muito diferente do meu. Viscoso, repelente… enfim, coisas do destino. Um mínimo descuido e logo quase somos assadas ao sol. Todo o cuidado é pouco! Quando sinto calor, enfio-me no conforto da minha carapaça e pronto, logo fico protegida. E tu? Se de repente o sol aparece, onde te metes?
- O sol, não tarda em romper, Mais um dia de calor, Se não te pões a mexer… Bem, seja lá o que for! 82
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- Disparate, Felisberto… Vá, não te enfades comigo. Aqui feito Chico esperto A ver se me arranja abrigo! Há muita verdura aqui, Pois, não se enfade, compadre, - Desta metade até ali É toda sua, comadre! Vou preparar meu jantar No meio desta verdura E quando o sol espreitar A minha casa é segura. Ti Manel estava pasmado. Sorrateiro, esgueirou-se pelo pequeno carreiro onde plantara couve-flor, na expectativa de descobrir a origem de tão estranhos sons. 83
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E quando se depara com Dona Lesma e Felisberto, o caracol, ficou estupefacto.
- Ó, não posso acreditar Desabafava abismado Dois moluscos a falar Aqui mesmo, ao meu lado!
Que raio fazem aqui, Cá dentro do meu terreno? Vão lá embora daqui Ou trato-vos com veneno. - Não, Ti Manel! – gritava Felisberto, o caracol com os seus corninhos brilhando ao sol – Há tanta couve por aí!
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Confuso com tudo isso, Ti Manel nem queria acreditar.
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Que mal tem podermo-nos alimentar dumas pequenas folhas que a pródiga natureza tanto nos oferece? Isso não lhes faz mossa, Ti Manel, também temos o direito de viver. - Sim, Felisberto tem razão. Deixe-nos comer em paz e meta-se a caminho, Ti Manel! Confuso com tudo isso, Ti Manel nem queria acreditar. Que arrogância! - Se pensas que me assustas com esses cornitos de nada, estás enganado, caracolinho dum raio. moluscos arrogantes Dona Lesma, assustada, aconchegou-se atrás dumas frondosas folhas, para que não fosse mais vista. - Felisberto que se vire – pensava – não vou meterme em apuros.
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- Aqui fico mais segura, Ele que tenha cuidado, No meio desta verdura Tenho o assunto arrumado Ti Manel nem acreditava. - Estar aqui a discutir com um caracol! Sรณ mesmo a mim!
- Bem podia te esmagar Mas, nรฃo o quero fazer No couval podes ficar, Tens teu direito a viver. E comeรงou a pensar para consigo:
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- Primeiro: os caracóis não falam; segundo: até que o caracolito tem razão, não faltam para aí couves. E, afinal, quando cortamos os pés de couve-flor, deixamos por aí espalhadas muitas folhas de couve. E alguém tem que dar cabo delas. Para que me vou preocupar com dois moluscos insignificantes? Agora, o que não me passou pela cabeça, é que me viessem confrontar e falar comigo. Bem, deixa-me ir dar uma volta por aí que começa a fazer-se tarde. Já perdi tempo bastante hoje.
- Podem ir à vossa vida Não me vou arrepender Temos cá muita comida Para que possam comer.
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Nós por cå, tudo bem, continuaremos a fazer as nossas vidas‌
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Comei com moderação Para não a estragar Esta a minha condição Que quero ver respeitar. Agradecido e contente, Felisberto logo chamou sua amiga Lesma e desabafou: - Coitado, do Ti Manel, no fundo, é boa pessoa. Pensa ser o dono disto tudo, que se há-de fazer? – sorriu – Deixa que o pense. Nós por cá, tudo bem, continuaremos a fazer as nossas vidas… e a saborear as tenrinhas couves do Ti Manel, que dizes? E soltou uma gargalhada. - Que convencido – adiantou Dona Lesma – Nós, os seres vivos, somos todos iguais.
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- Santo Deus, esqueci completamente, minha amiga. Já viste como está quente o sol? Ainda ficas assada com o calor. - Obrigada, meu amigo, estou atenta. É só mesmo acabar de encher a minha barriguinha com estas tenrinhas folhas de couve-flor e lá vou à minha vida. Não descures tu a tua proteção, enfia-te lá na tua carapaça enquanto eu me regalo a comer estas saborosas couves! – sorriu.
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- Julianaaaa! – alguém chamava. Esta, com grande alegria no olhar, virava-se em todas as direções, mas nada via. Mas o mesmo chamado – Julianaaa – esse não parava de ouvir. Por fim, algo temerosa, respondeu: - Sim, estou aqui, quem me chama?
- Quem é que chama por mim Nesta noite sem luar? Diz-me quem és e assim Talvez me possa acalmar. Nesta noite peregrina. Quem quer a minha presença? Um qualquer ser que caminha E me rouba a paciência. 95
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Não me queiras assustar, Diz quem és tu, afinal? Se alguém que quer conversar, Vem daí, não levo a mal. Quero ouvir a tua voz, Deixa que te possa ver Que na escuridão atroz Não quero permanecer. Vem comigo conversar, Só quero ver quem tu és E até pode, se calhar, Seres amiga, bem vês. Agora. Silêncio absoluto. Neste ambiente de mistério, algo a incomodava.
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- Estou aqui, que pretendes de mim? Aparece, estou assustada!
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Juliana colocou-se nas pontas dos dedos dos pés e tentou lançar o seu olhar até onde a vista alcançava. De repente, sentiu um tremendo arrepio. Nunca a noite a assustara tanto. - Julianaaaa! – ouviu de novo. - Estou aqui, que pretendes de mim? Aparece, estou assustada!
- Pretendes-me amedrontar? Pois estás a conseguir! …E uma voz de encantar A convidou-a a subir - Para onde vou viajar? Não vejo porta de abrir! Como poderei entrar Se não sei para onde ir? 98
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… E logo surge uma escada Que a convidou a subir. Ao longe, uma longa estrada Entre estrelas a sorrir. Olhava o lado direito E a seguir o lado esquerdo. E pensou: - Mais que perfeito! Parecia não ter medo. - Que belo – dizia deslumbrada – Se minha mãe soubesse, nem ia acreditar. E ei-la agora frente a algo que nunca tinha visto. - Diz-me, quem és? O que procuras em mim? – perguntou. E logo, uma luz muito forte, quase a cega. Sente algo tocar-lhe. Assustada, grita: 99
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- Ai, queimas-me! - Eu sei. Não temas, apenas uma sensação de calor. - Quem és tu? O que procuras em mim? - Chamam-me a Estrela de Fogo. Tenho calor próprio. Para que não se aproximem de mim, só lentamente e com grande precaução ou, sem querer, queimam-se. - Como assim? Todas as estrelas têm calor próprio. - Não. São diferentes. Tu podes ajudar-me a ser como as outras estrelas. - Porquê eu? Quem te disse isso! – perguntou. - Durante um sonho, uma voz me disse: Estrela de Fogo, procura uma menina chamada Juliana. Ela pode ajudar-te! - Espera! Agora entendo, um sonho estranho! É isso, só posso estar a sonhar!
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Se neste sonho eu entrei, Hei-de ver o que fazer.
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- Como vim aqui parar? Terei eu uma missão? Se assim for, vou-te ajudar, Não posso dizer que não. Se neste sonho eu entrei, Hei-de ver o que fazer. O meu lugar não deixei Para te ver a sofrer. - Vem, vamos dar uma volta Por entre nuvens. E a chuva Se aparecer, pouco importa, Assentam que nem a luva. Pega bem na minha mão, Na nuvem vamos entrar, Talvez seja a solução, Iremos experimentar. 102
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E lá foram elas nuvem dentro que ao vê-las, perguntou? - Eh, lá, uma invasão? Quem sois vós? - Não temas, somos tuas amigas. Eu sou a Juliana e trago como companhia a minha amiga Estrela de Fogo! Viemos até ti porque necessitamos dos teus préstimos. Vaidosa, ouviu atentamente as duas amigas. - Fico feliz por poder ser-vos útil. Lá vai então um pouco de água, preparem-se. E logo uma valente chuvada caiu sobre Juliana e a Estrela de Fogo. Esta, estava radiante de alegria. - Ena, que bom, sinto-me mais fresca. Obrigada, boas amigas, como é bom contar convosco. - Espera, nada de precipitações – gritou Juliana. Deixa a nossa Nuvem acabar o seu trabalho.
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Passados uns minutos, Juliana aproximou-se da amiga e tocou-lhe. Não, já não era mais aquela estrela repelente em quem mal se podia tocar. Felizes e contentes, voltaram a casa da sua amiga Estrela, desfazendo-se em agradecimentos junto da sua amiga nuvem.
- A casa vamos voltar, Minha Estrela, estás curada E lá devemos chegar Bem antes da madrugada. -Antes, vivia sozinha, Sem ninguém com quem falar, Lamentava a triste sina Mas tinha que me afastar. Juliana a acompanhou E a ajudou a vencer O tempo a ensinou A uma nova Estrela ser. 104
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Felizes e contentes, voltaram a casa da sua amiga Estrela
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Na planície alentejana, havia uma bela herdade propriedade do Senhor Floriano. Na frente dum recatado anexo havia uma frondosa e generosa árvore, muito antiga, que fora plantada já no tempo dos seus bisavós. Era uma árvore incontornável e sempre que o Senhor Floriano tinha visitas ei-los encantados com aquela copa frondosa, cheia de beleza. O Senhor Floriano tinha dois lindos netinhos gémeos, com sete anos de idade. Eram eles o Guy e o Toy. Ai, como adoravam passar os fins de semana e as férias na casa do seu querido avô! Logo que chegavam, quase que era tarefa obrigatória trepar aquela velha árvore, trauteando uma melodia que todos conheciam, mas da qual ninguém sabia quem era o autor. Era uma melodia tradicional, que entrava bem no ouvido e que, quase inadvertidamente, andava de boca em boca ali pela aldeia. 109
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- Já o meu avô a cantava – dizia tantas vezes o avô, o velho Floriano.
Quem quer dormir acolá Na árvore da magia E acordar a cada manhã Ao cantar da cotovia Há burburinho no ar No cantar das mariposas E o catavento ao girar Lança pétalas de rosas
Há sorrisos de criança De que o vento espalha o som São mensagens de esperança Que batem no coração.
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O avĂ´ Floriano era uma pessoa muito atenta e preocupada para com os seus queridos netinhos.
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Em cada instante, a saudade Dos velhos tempos de outrora Onde a nossa liberdade Nascia ao raiar da aurora. - Como é gratificante ter crianças na herdade – dizia feliz o velho Feliciano - mas é também uma grande responsabilidade, mas vai tudo correr bem. O avô Floriano era uma pessoa muito atenta e preocupada para com os seus queridos netinhos.
- Ó, saltai com alegria, Não esqueçam de almoçar! O seu avô bem sabia Que só queriam brincar. Descansavam à sombrinha Lá pertinho do regato E só mesmo p’la tardinha Voltavam ao seu recato 112
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-E assim passam o dia Por toda a herdade, a correr Com muita, muita alegria! Como é bom vê-los crescer! Naquela fresca manhã de primavera, Floriano esperava os netos. Chegavam as férias da Páscoa. Era tempo de os ver calcorrear a herdade cheios de entusiasmo. Como era divertido! - Vou preparar-lhes umas férias diferentes, cheias de surpresas – dizia para consigo. - Pó… póooooo… - ouvia-se ao longe. - Uma buzina, são eles! – dizia cheio de entusiasmo – Vamos ver se gostam da surpresa que lhes preparei! O avô tinha-lhes preparado um coelho mágico. Ia convidá-los a brincar à Caça ao Tesouro, ia ser divertido à séria. 113
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- Avô - gritaram as crianças entusiasmadas – chegamos! - Que bom – dizia, enquanto corria na sua direção – Venha daí esse abraço!
- Quem é o avô mais feliz? Dizia-lhes a sorrir – Ó Guy, meu lindo petiz, Vamo-nos lá divertir! - Avô, eu não sou o Guy! - És o Toy, que parvoíce! Nem sequer vos distingui, Sois iguais, mas que chatice! Correm para o abraçar E o avô, feliz, contente, Não parava de os beijar E logo diz, sorridente: 114
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Neste caso o Tesouro ĂŠ um coelhinho cor do arco iris,
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- Tenho uma bela surpresa Mas vão ter que a descobrir - A árvore! Que beleza! Avô, podemos subir? - Pronto, a vossa perdição – dizia sorrindo – vão lá para a vossa árvore, a surpresa fica então para mais tarde. Correram desenfreados e qual não foi o seu espanto quando viram um pequeno coelho a saltar frente a si. - Avô – gritaram – descobrimos a surpresa! Vamos à obra, começou a Caça ao Tesouro – sorriam. Neste caso o Tesouro é um coelhinho cor do arco iris, já o vimos a saltitar e escondeu-se na verdejante copa da sua árvore. O avô aproximou-se e, virando-se para cima, perguntou: 116
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- Eh, rapazes, desçam daí. Querem ouvir a história do Coelho de Páscoa? - Coelho da Páscoa? Queremos sim, avô. E num ápice, desceram da grande árvore e sentaram-se para ouvir o avô. - Conta, avô, estamos em pulgas para a conhecer. - Vamos a ela, ouçam bem: Certo dia, perto da casa do Menino Jesus, um passarinho construiu o seu ninho. O seu canto era um hino à liberdade e todas as manhãs Jesus despertava ouvindo essa linda melodia. Mas, certo dia, o canto cheio de harmonia não se fez ouvir. Despertou, sim, com o cantar aflito dum passarinho. Jesus levantou-se, aproximou-se do ninho e viu a mãe da pequena avezinha que chorava desconsolada. 117
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– O que se teria passado – pensava o Menino. Pois, adivinhou, a malvada raposa tinha-lhe levado os seus ovinhos. Triste, Jesus meteu-se campo fora, pedindo a todos os bichinhos que ia encontrando que o ajudassem a procurar os ovinhos da pobre avezinha. - Gatinho lindo, acaso viste onde a raposa escondeu uns ovinhos? - Não – disse, continuando a correr – desculpa, mas estou muito apressado. Tenho ainda muitos ratos para apanhar hoje. Estão a dar cabo do queijo da minha dona. - Ó, que pena! E seguiu: - Lindo cachorrinho, acaso não visto por aí uma raposa com uma mão-cheia de ovinhos de ave? 118
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Nisto, surgiu-lhe na frente um pequenino coelho
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- Não, não vi. Tenho a casa dos meus donos para guardar. E seguiu campo fora, correndo. Uma formiguinha andava numa correria desenfreada, carregando pequenas folhas que encontrara no caminho. - Não, não tenho tempo, há que arrecadar comida para poder sobreviver no inverno. E logo o grilo: - Não, não vi, tenho andado aqui de um lado para o outro a cantar e a comer. Cansado demais, aos pulos, para não ser apanhado. - Nada a fazer – pensava Jesus – tudo muito atarefado. Pobre avezinha! Nisto, surgiu-lhe na frente um pequenino coelho que, ao ver a aflição do Menino, perguntou:
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- Estás triste? Conta-me o que se passa. Ao ouvir a história do roubo dos ovos da avezinha, logo lhe disse: - Vem daí, vamos os dois procurar os ovos. - disse decidido - Havemos de os encontrar. E lançou-se numa correria louca na direção do esconderijo da raposa. Mas quando lá chegou, desilusão, esta já havia tragado todos os ovinhos. Com lágrimas nos olhos, na tentativa de consolar o Menino, o coelho foi de ninho em ninho pedir a cada uma das avezinhas que encontrava que lhe dispensassem um dos seus ovinhos para que pudessem entrega-los a Jesus que, assim, os poderia oferecer à pobre avezinha. Quando voltou, trazia uma mão-cheiinha de novos ovos, que entregou a Jesus. Depois, lá foram os dois, campo fora, de regresso ao ninho, em busca da ansiosa ave. 121
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Quando chegaram, Jesus colocou com carinho um a um os ovinhos no ninho. A pequena ave, cantarolando de alegria, nem desconfiou que não seriam os seus. Depois, agradecido pela bela ação do coelhinho, Jesus convidou-o a ano após ano, na altura da Páscoa, distribuir ovinhos pelas crianças, mas agora, ovinhos de chocolate. - Que história mais linda – diziam os netos – ficamos comovidos. - Vamos ver se na verdade o coelhinho continua a levar a cabo a sua missão? - Como assim, avô? Olharam pelo canto do olho e viram o pequeno coelho que o avô lhes oferecera a entrar numa pequena abertura natural existente no tronco da árvore. 122
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Desconfiando de algo, correram para lá e qual não foi o seu espanto quando se confrontaram com o coelhinho a ajeitar cuidadosamente alguns ovinhos de chocolate. - Surpresa – gritava o avô. - Ó, ovinhos de chocolate para nós! – dizia Gui entusiasmado - Que lindos, todos coloridos. - São para nós, mano! - Correram para o Avô e, abraçando-o, gritaram: - És, na verdade, o melhor avô do mundo!
- Sim, meus queridos netinhos, A Páscoa vamos passar, Com muita, muita alegria, Neste querido lugar.
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Adivinhava-se uma linda manhã de sol. Antes do aparecimento dos primeiros raios no alvor da manhã, Malaquias - assim se chamava o galo que despertava toda a Aldeia da Couvelândia, levantava-se sobre as suas patas, na sua rocha preferida e soltava o seu toque da alvorada:
Coco…ó…corococó Toca tudo a levantar Não gosto de ficar só Neste rochedo a cantar! E logo, ao toque da alvorada, os legumes, as frutas e todos os animais da Couvelândia bocejavam, abriam os olhos e a uma só voz cumprimentavam o Galo Malaquias. - Bom dia, Malaquias - saudava Couve Flor, bemdisposta e toda arranjadinha: 127
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- Belo dia, Malaquias, Como vai? Bem, com certeza! - Vou como em todos os dias Cantando na natureza! Sempre linda e elegante, Amiga Couve-Flor! Não és tão só bem-falante, Mas um grande cantador. - Pois, aqui na nossa herdade Nada nos pode faltar E para falar verdade Eu gosto de aqui morar! O Galo Malaquias, que há muito não tirava os olhos da viçosa couve, gracejou:
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- Acho que vou procurar algo novo para me arranjar!
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- Sempre tão linda e elegante, amiga Couve-Flor! - São os teus olhos, Malaquias. Eu bem sei, se tu pudesses… era uma vez uma couve, tenra e apetitosa. Não sobrava nem um pouquinho, pobre de mim! - O que é isso, Couve Flor, como podes pensar isso de mim? Estimo-te muito. - Pois, pois! Vem-me com cantigas. Não fora a rede que nos separa e…. era uma vez uma couve! É a sina dos legumes na Aldeia da Couvelândia. Digo mais, Malaquias, apesar do risco que corremos, nada me assusta ou me rouba a minha boa disposição. Deixa-me preparar, pôr-me linda, afinal, sou uma das mais belas couves - Acho que vou procurar algo novo para me arranjar! - Como vês, sou a couve mais linda da Aldeia.
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Babadinho, Malaquias olhava para a Couve-Flor e pensava: - Pudesse eu e não me escapavas, ai não! Mas assim, o melhor mesmo é ir comendo umas ervas e os pequenos grãos de milho que vou encontrando por aí, sobras de ontem, do jantar.
- Meu amigo Malaquias, Não me comas, por favor, Deixam passar mais uns dias, Depois serei bem melhor! - Mas que grande confusão Neste lindo amanhecer, Que dizes, pequeno grão, Que não te devo comer?
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- Logo após eu germinar, Se boa terra sentir, Nova planta hei-de ficar Pois daqui não vou fugir. - Ai, nessa não caio eu, Pois seria parvoíce Depois, não te como eu, Vais embora, que chatice! Sem mais demoras, Malaquias, dispara o bico para o chão, mas logo o vento, de repente, soprou forte e lançou o pequeno grão para bem longe da capoeira.
- Só me faltava mais isto Diz Malaquias zangado Dum modo tão imprevisto Do milho me vi privado! 132
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- Acho que vou procurar algo novo para me arranjar!
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- E o milho agradeceu Ao vento por ter soprado. O galo se aborreceu E saltou alvoroçado. Entretanto, Couve-Flor andava ocupada à procura de algo que a fizesse ainda mais bela. Aproximouse dum milheiral e pediu à espiga: - Espiga linda, dá-me as tuas barbas lindas para que possa embelezar-me, apenas um pouco, sim? - Com todo o prazer, minha amiga, tira o que precisares. E logo se abriu e baixou para que dona Couve-Flor pudesse recolher as barbas que precisasse.
- Obrigada, linda espiga, Pela generosidade Com tuas barbas, amiga Vou ser linda, na verdade. 134
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- Porque te queres arranjar Se és tão bela, Couve Flor? - Quero os demais inspirar Nos caminhos do amor. E agora, minha querida, Vou à horta regressar, Irei mais feliz da vida Por tuas barbas levar. - Um encontro, Couve Flor? – pergunta, intrigada, a espiga - Quem é o afortunado que contigo se vai encontrar? - Segredo, minha amiga! Logo verá. Não sejas curiosa – ri – Vai, vai, até mais logo. E lá foi ligeira, campo fora, em direção à sua horta. Afinal, os pretendentes eram muitos, na Aldeia da Couvelância. 135
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Não faltava quem suspirasse quando a viam passar. Mas, bem lá no seu íntimo, apenas um era o seu eleito. Mas esse… ó, esse nem dava pela sua presença. A hora da festa chegou. Ao dirigir-se para o arraial, Couve-Flor, encontrou Chico Brócolo, a Couve de Bruxelas, a Alface Laroca, a Cenoura Lamy, quantos outros amigos lá da sua Couvelândia.
- O baile vai começar, Vamos ver quem cá está E vamos, toca a dançar Até que chegue a manhãChá-chá-chá, salsa, lambada, Tango, danças de salão E até de madrugada Elas nos animarão! 136
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- JĂĄ todos os habitantes da Aldeia andam na lida e vĂłs na boa-vai-ela.
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E bem que se divertiram noite fora Couve-Flor e os seus amigos. Quando surgiram os primeiros raios de sol, regressaram à Couvelândia, felizes e contentes. Lá estava o Galo Malaquias, zangado, a cantar sem parar. Eram horas de regressar a casa? - Pois, Malaquias – respondeu – foi uma noite em cheio. E agora, cala-te, deixa-nos dormir. Esta madrugada, já chega de cantoria – disse sorrindo. - Já todos os habitantes da Aldeia andam na lida e vós na boa-vai-ela. Que hortaliças estas! - Pois bem, mas vá agora descansar, como nós que bem precisamos. Ufff, que cansaço!
- O dia já vai no ar, Malaquias, vou dormir, Preciso de descansar, Quero viver e sorrir! 138
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Pela primeira vez, na pacata Vila de S. Nunca, o Circo Juvenal ia fazer a sua estreia
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O Circo Juvenal chegou à cidade. Ruas fora, o altifalante daquela carrinha anunciava insistentemente: “Não percam, senhoras e senhores, hoje pelas 20 e 30 horas, o maior espetáculo do mundo, malabaristas, ilusionistas, venham conhecer os palhaços Malandreco e Tristão, o tigre Lelé, a chita Lily, venham senhores venham, não mais se vão esquecer”. Pela primeira vez, na pacata Vila de S. Nunca, o Circo Juvenal ia fazer a sua estreia, a primeira apresentação. “Venham senhores, meninas e meninos – insistia aquela voz alta e sonora chegou, o Circo Juvenal”. A pequenada corria atrás do colorido veículo do circo. Com olhar de espanto, olhavam para a cena. Muitos deles nunca tinham assistido a um espetáculo de circo ao vivo, somente em momentos ocasionais, quando algum dos canais da televisão os transmitia. 142
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Ritinha brincava com seu irmão Marinho e com outros meninos no parque infantil que a Junta de Freguesia tempos atrás, numa iniciativa iluminada, resolvera construir. Logo após a passagem da carrinha, entusiasmados, correram cada qual para suas casas. Tião, o sacristão da pequena igreja lá da aldeia, ao ver a criançada correr desenfreada, abordou-os e questionou:
- Hei, miúdos, aonde vão A correr nessa euforia? - Vamos para casa, Tião, Hoje há Circo, que alegria! - Logo aos pais vamos pedir Que nos leve p’la noitinha Ver os trapézios subir E sorrir co’a palhacinha. 143
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- Marinho, vamos embora Temos que nos despachar Comprar os bilhetes agora Porque podem esgotar. - Ainda é cedo, tendes tempo Respondeu o sacristão Não vão já. Neste momento Vão meter-se em confusão. É só depois do jantar, Ide lá ter co’a mãezinha - Eu tenho que me apressar, Há missa na capelinha. - Até logo, Tião. - Vem, Marinho.
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‌o circo chegou à nossa terra! Goståvamos tanto de ir ver!
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Ritinha agarra a mãozita de Marinho e lá vão eles numa correria desenfreada para casa. Objetivo: pedir à mãezinha que à noite os leve ao circo. - Mãezinha – dispararam ao chegar a casa, mesmo não estando ela à vista dos seus olhos - o circo chegou à nossa terra! Gostávamos tanto de ir ver! Deixas? Como não conseguiam enxergar a mãe, Ritinha corre a casa toda e na salinha de visitas, por fim, ouviu-a a conversar com alguém. - Ouve, Marinho, temos visitas, vamos esperar que ela termine. Depois, pedimos-lhe que nos leve a ver o Circo Juvenal. Ansiosos, esperaram que a mãe saísse da sala. - Olá, meninos, tenho uma surpresa para os dois! - Diz, diz, mãezinha, gostamos tanto de surpresas! Vais-nos levar ao circo? – perguntou Ritinha cheia de ansiedade. 146
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- Circo? Que Circo Ritinha? - O Circo Juvenal chegou hoje à nossa aldeia. Gostávamos tanto de ir! Levas-nos, Mãezinha? Eu e o Marinho gostávamos mesmo de ir ver. Nunca tivemos essa oportunidade, ia ser mesmo bom. - Vamos ver. Não vai ser, certamente, a última vez que o Circo vem à aldeia de São Nunca. Depois penso nisso. - Mãezinha - questiona Marinho – não tinhas uma surpresa para nós? Qual é? - Venham comigo à Salinha, ali vão ficar a saber. Ritinha e Marinho seguiram curiosos os passos da mãe, entram na pequena sala e exclamam: - Que bela surpresa! Os nossos primos Julinha e Dany. - Ola, priminhos, que bom terem vindo passar as férias da Páscoa connosco, vai ser muito divertido! 147
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- Vai ser sim, Ritinha e Marinho, vamo-nos divertir imenso, tenho a certeza. - Mãezinha, porque não irmos todos ao circo nesta noite? Vá lá, diz que sim! - Está bem, convenceram-me. Esta noite vamos ao circo. Afinal, é a primeira vez que ele vem à nossa terra.
- Meninos, vamos ao circo Ver palhaços e animais No pequeno semicírculo A correr. Vai ser demais! Trapezistas a subir, Os tigres, os leõezinhos E toda a gente a sorrir C’as graças dos palhacinhos. 148
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-“Meninos e meninas, aos vossos lugares. O espetáculo vai começar!”
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Logo que abram as cortinas, A um ritmo acelerado, Dançarinos, dançarinas A Bailar por todo o lado. Entrem, senhoras, senhores, O espetáculo começa, Eis artistas dos melhores, A magia que regressa! -“Meninos e meninas, aos vossos lugares. O espetáculo vai começar!” Ritinha, Marinho, Julinha e Dany, de olhos esbugalhados, assistem ao melhor espetáculo do mundo. Que maravilha! Um mundo de cor e de alegria ao seu redor! - Obrigado, mãezinha, não mais vamos esquecer esta noite. A nossa gratidão ao Circo Juvenal. 150
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Era mais uma entre as muitas flores do jardim
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Sininho era uma linda florzinha nascida de um arbusto de textura semilenhosa e ramagem farta e refulgente. Era mais uma entre as muitas flores do jardim, sobressaindo daquele viçoso arbusto, ali mesmo junto ao portão que dava acesso à Herdade da Urtiga. Joãozinho, neto dos proprietários, com seis anitos apenas, passava tempo sem fim a ver os sininhos que ornavam o lindo arbusto. Adorava vê-los descaindo sob os ramos, agitados pelo vento num bailado estonteante, ali junto do portão da quinta da avó Júlia. Entre as pequenas flores, havia uma que caprichosamente parecia lutar para se libertar do braço do arbusto e, por mais que este - qual progenitora - tentasse evitá-lo e a repreendesse, nada havia que a demovesse do seu intento. Queria mostrar os seus dotes de patinadora artística.. 154
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- Sininho, presta atenção Dizia-lhe com carinho Não sei porque razão Queres deixar-me sozinho. Aqui tens tudo, querida, Gozas paz no coração, Não vás estragar a vida Lá fora deste portão? - Minha mãe, talvez um dia Compreendas a razão, Patinadora queria Ser um dia, uma paixão. O comportamento de Sininho Flor não era como o das demais irmãs. Não parava, era irrequieta por natureza. 155
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A mãe-arbusto passava o seu tempo admoesta-la, quando com gestos estranhos tentava fazer sobressair as suas habilidades artísticas. Irreverente como era, acabava por colocar em perigo todas as outras florzinhas que se agarravam como podiam para não se verem desmembradas do tronco. Sininho Flor não queria apenas ser bailarina, queria, isso sim, ser patinadora. Metera isso na mente e nada a fazia demover. Quanto mais cedo se libertasse do tronco da mãe, melhor. Num dia de calor, em segredo, preparou tudo. Ao entardecer, quando a mãe se preparasse para o merecido repouso, iria embora sem que ninguém o percebesse. E assim foi. Preparou uma pequena mensagem e partiu.
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- Vou em busca do meu sonho, almejo aprender a patinar
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- Mãe, vou partir, mas não chores, Quero viver o meu sonho, Os dias são promissores, O meu futuro, risonho Quando puder, voltarei Para um abraço apertado Mas agora, apenas sei Que vou partir. Obrigado. - Vou em busca do meu sonho, almejo aprender a patinar e, quando chegar o inverno, estar presente em qualquer certame de patinagem onde possa brilhar e me sinta uma estrela. Joãozinho, que passava ali perto, assistia àquela estranha despedida. Aproximou-se de Sininho Flor e perguntou-lhe: - Que fazes, Sininho Flor? Vais soltar-te do pé do arbusto que te dá a vida? 158
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Não vês que vai ser o teu fim? - Ai, Joãozinho, como almejo ser uma patinadora, dançar num recinto e ser aplaudida por uma multidão de gente. Quero seguir o meu sonho. - Mas isso é uma loucura, Sininho! - Por favor, sei que gostas deste lindo arbusto que me deu a vida. Acarinha minha mãe, sim? - Como podes sonhar assim? Não entendo, és uma frágil flor. Que sonhos pode ter uma flor? Confuso, pensava: - Estou aqui a falar com uma
flor, uma flor que diz ter sonhos. Que estranho! Quem deve estar a sonhar sou eu! – E, nervoso, beliscava o seu bracito, tentando despertar. - Tenho que ir, Joãozinho, se não vou agora, não sei se algum dia poderei ir. E com ar triste, passou aquele portão rumo ao desconhecido.
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A mãe arbusto, em sobressalto, abre os olhos e ainda consegue ver ao longe a sua querida Sininho Flor, que se afastava ligeira.
- Minha filhinha – gritava Volta p’ra mim, por favor! E Sininho caminhava Não ouvindo o seu clamor. Joãozinho foi com ela Falando-lhe com carinho - Eu hei-de ser uma estrela - Volta para casa, Sininho. No jardim irei erguer Um lugar para patinar E à Herdade trazer Gente para te ver dançar. 160
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Passados dias, a azรกfama crescia na Herdade da Urtiga..
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- Ouve o vento, o nosso amigo Que com sua melodia Te chama: - Volta comigo E esquece essa euforia. Sininho Flor não consegue conter as lágrimas. O medo e a incerteza cercam-na. Resolve então ouvir a voz do vento e do seu amiguinho João e regressa a casa. - Filhinha - chorava a mãe, agora cheia de alegria – que bom que voltaste. - Enlaçadas num grande abraço, ali ficaram sob o olhar feliz de Joãozinho que, comovido, chorava também. Passados dias, a azáfama crescia na Herdade da Urtiga. Eram as cabras, os bois, os cavalos, todos unidos, para construir um espaço onde Sininho Flor pudesse exibir para eles os seus dotes de patinadora. 162
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Vivia-se felicidade em todo o espaço. Quando acabaram a construção, era já inverno. E a neve caiu e encheu o recinto de gelo. E era ver Sininho Flor, cheia de alegria, a patinar num rodopio louco ao redor de todos os amigos da Herdade que com prazer a aplaudiam e incentivavam. As suas irmãs – os outros sininhos da árvore – assistiam orgulhosas às acrobacias de Sininho Flor. A mãe, feliz e contente, não parava de aplaudir, agradecendo aos céus tão grande graça.
- Obrigada, Pai do céu, Por ter uma filha assim Seu sonho se converteu Numa alegria sem fim.
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E até mesmo Joãozinho Esta mais feliz aqui, Ajudou a Flor Sininho E a vida nos sorri. Sininho Flor, é vedeta No seu ringue a patinar, Parece uma borboleta Que vive a rodopiar. E toda a herdade acenava a Sininho Flor que, imparável, não deixava as suas acrobacias. E o vento, com o seu sopro delicado, ameno, agitava os restantes sininhos num bailado suave, fazendo-as sentir-se assim, como Sininho, fazendo parte desta singular companhia de bailado da Herdade da Urtiga.
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Na quinta do Senhor Rocha, encontrávamos as melhores peras de toda a região. Ele, todos os dias logo de manhã bem cedo, levantava-se e ia por lá abaixo, para conversar com as suas meninas – as peras. Chegava, saudava-as e ali ficava a tagarelar como se fossem humanas.
- Bom dia, belas meninas, Que tal vosso amanhecer? Parecem doces, tenrinhas, Quase prontas para colher! Observava cada ramo, cada pereira e ficava a gozar o sol ainda suave de mais um dia dessa linda primavera! Elas pareciam sorrir para o simpático agricultor e, ao seu modo, respondiam: 167
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- Sinta-se bem, Sr. Rocha Como vai o nosso amigo? Aqui esta pera ”chocha” Já nem ouve o que lhe digo. Acho julgar-se a mais bela De todas as que aqui estão, Deve pensar-se uma estrela, Digo eu: que presunção! Se lhe falo com jeitinho Para ver se ela me entende, Leva para mau caminho E nem responde, se ofende. Tento chamá-la à razão, Que tenha mais humildade, Mas não houve a opinião, Falta de maturidade! 168
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A mãe pereira lamentava-se, não sabia lidar com a doença.
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Já não sei o que fazer P’ra que faça pela vida, “Olha, se algo acontecer, Tem paciência, querida!” Coitada, pensa que o mundo Gira todo ao seu redor E o seu olhar iracundo Não agrada, por favor! A mãe pereira lamentava-se, não sabia lidar com a doença. - Ai, Sr. Rocha, sinto-me doente. Estes parasitas são uma verdadeira praga, estão a dar cabo de mim. - Tem calma, vamos tratar disso. Rapidamente, vou dar cabo dessa bicharada.
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- Mosquinha inconveniente Que seu ovo quer deixar E molestar nossa gente Que não as pode aturar Ao correr do tempo, nas manhãs frescas de primavera, o Senhor Rocha gostava de as mimar, de as tratar com carinho. E elas, como retribuição por tanto carinho, lhe ofereciam generosas colheitas, com peras amarelinhas e muito suculentas. Era a forma de melhor corresponder ao seu estimado cuidador, naquele que era o seu reino, o pomar da quinta do Sr. Rocha.
Ó Sr. Rocha, obrigada Por tratar tão bem de nós Não nos deixa faltar nada E nunca nos deixa sós. 171
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Dava gosto ver aquele pomar. Os vizinhos apreciavam-no e perguntavam: - Hei, Rocha! O que fazes às tuas pereiras? Essas peras até nos fazem crescer água na boca, homem! Ele olhava-os com um sorriso franco e alegre e respondia: - Nada de especial, meus amigos, apenas lhes dedico muito carinho. - Pois, vem-me com essa – retorquia Ti Jaquim – Como se as peras vivessem de amor e carinho! - Que disparate, Jaquim - interrompe Malaquias – claro que as plantas sentem, como nós. Elas não vão gostar do que estás para aí a dizer. Melhor fora se te calasses – sorriu. - Homessa! – voltou Ti Jaquim - Ganha juízo, homem! Qual sentimentos, qual carapuça. As peras não pensam. 172
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No pomar, as pereiras pareciam assistir surpresas ao desenrolar de toda aquela conversa.
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- Ai, não que não têm! – acrescenta o Sr. Rocha Isso pensas tu! Posso-te garantir que as minhas têm sentimentos, falam comigo, quando o mal lhes chega, queixam-se e pedem ajuda. - Pois sim! Fiquem com a vossa. Cá por mim, não acredito. No pomar, as pereiras pareciam assistir surpresas ao desenrolar de toda aquela conversa.
- Que gente sem sentimentos Murmuravam entre si Não hajam ressentimentos, Eles não mandam aqui. Neste entretanto, as peras tagarelavam entre si e questionavam as suas progenitoras, as pereiras:
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- Esperança, ouve lá esta! E no que está a falar Me parece, vai ser desta Que daqui nos vão levar. - Ainda não estás madura, Até ao cantar da rola, Tu vais estar bem segura, Não vais parar a uma escola. - Não sei bem, chega-se a hora? Vou pôr-me atrás duma folha E quem sabe, vão embora Sem que caia em sua escolha! E logo alguém observava As pereiras, uma a uma E as peras apalpava: - Não vai ficar cá nenhuma! 175
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Maria Inês, assim se chamava a netinha do Senhor Rocha, estava de férias escolares. Aproveitava esses dias para passear na Quinta do avô. Adorava percorrer aquele fértil pomar, tagarelar sozinha como que a conversar com cada pera. Seguia todas as pisadas do avô. As pereiras já a conheciam muito bem, gostavam de a ver por ali, mesmo quando, numa ou noutra tropelia, arrancava uma e, à sombra duma árvore, a saboreava. No fim, era para isso que elas, as peras, ali estavam. E pareciam não se incomodaram com isso. Caprichosamente, a pera mais suculenta do pomar era a Vaidosa, gostava de apanhar uns banhos de sol e isso a tornava mais bela e apetitosa. Inês bem que tentava chegar-lhe, mas estava alta e não conseguia apanhá-la. 176
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- Adoro as peras do meu AvĂ´. Mas, pronto, hoje escapas
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- Deixa te cair, menina – gritava – és mesmo a perinha que agora me estava a apetecer. Vaidosa, percebendo as intenções da menina, reclamou:
- Não, não quero ser comida Quero a vida conhecer, Reproduzir-me na vida E uma pereira vir ser. - Não me venhas com ideias, não. Não quero ser comida por ninguém! Deixa que venha a cumprir a minha missão, reproduzir-me e vir a proporcionar o aparecimento de novas árvores e peras, sim? - Adoro as peras do meu Avô. Mas, pronto, hoje escapas – sorriu. E foi-se campo fora de regresso a casa. Passaram-se alguns dias. 178
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Ei-las agora lindas e apetitosas, prontinhas a poderem apresentar-se à mesa para uma bela sobremesa. Agora, demasiado madura, Vaidosa atingiu o seu objetivo. Ninguém a apanhou. A mãe, algo insatisfeita porque ela não atingiu o objetivo para que a criara, disse: - Quem tudo quer, tudo perde!
- Recusaste ser manjar Duma inocente criança E ao chão irás parar E morrer sem esperança. Bem podias ser mais tarde Uma árvore frondosa, Mas já podre, não nos cabe Cuidar mais de ti, Vaidosa. 179
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- Ei-la agora caĂda no solo, sem objetivo, como alimento para vermes rastejantes, sem atingir o objetivo para que havia nascido. A semente, mesmo a terra a rejeitou. E por ali ficou‌
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Eduardo, o Duda, para a família e amigos, era um menino diferente. Não conseguia locomover-se por seus próprios meios. Usava por isso uma cadeirinha para se poder deslocar. Quando nasceu, tudo era diferente. Mas uma doença, a poliomielite, afetou-lhe as suas frágeis pernas e arrastou-o para aquela condição. Ficou com paralisia. Duda era uma criança esperta e inteligente. Foi adotado por um bondoso casal que, embora com um filho, abraçou esse sacerdócio. O casal tinha um filho um ano mais velho que Duda. O menino tinha vindo de África para ser tratado em Portugal. Os seus pais não resistiram à malária. De Duda, não se conheciam parentes próximos. Quando chegou a Portugal, fora internado para fazer uns tratamentos. Vinha muito frágil e debilitado. 183
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A Doutora Inês, uma pediatra reputada, quando o menino lhe caiu nos braços, sensibilizou-se com a sua condição e logo se inteirou de conhecer toda a sua história. Como gostava de vir a ficar com ele, como parte integrante do seu lar! Logo que Ricardo - Rico, como lhe chamavam os pais – teve o primeiro contacto com Duda, nunca mais conseguiram andar longe um do outro. Foi uma amizade espontânea e muito forte. Quando chegou o momento da alta hospitalar, Inês conseguiu autorização para o poder levar consigo. A Proteção de Menores rapidamente procurou desenvolver os procedimentos para que a criança pudesse ter uma vida estável e feliz. E em Inês surgira essa possibilidade. Duda viu-se assim acolhido no seio daquela simpática família, que o recebeu de braços abertos, assistindo-o com todo o seu empenho e carinho. 184
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Duda viu-se assim acolhido no seio daquela simpĂĄtica famĂlia
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Duda tinha um sonho. Era conhecer meninos como ele, sem família, sem lar. Crianças que, dizia, eram filhos do mundo. Os seus novos pais, Inês e Danilo, tudo faziam para o ver feliz e logo providenciaram para que Duda pudesse concretizar esse sonho, afinal, de tão simples realização. Numa linda tarde de Outono, ei-los a preparar a comemoração do aniversário do seu novo filho. Rico, o seu mano, estava entusiasmado e cheio de alegria. Duda nem imaginava a surpresa que preparavam para si.
- Diz-me, Inês como vai ser? Logo o dia vai chegar- Grande surpresa vai ter, Sei que Duda vai gostar.
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Tudo isto vai dar certo. Neste mundo tão pequeno Logo o longe se faz perto, Há que mantê-lo sereno. Nada de o preocupar, Sua saúde é inconstante. - Ele pode viajar? Assunto preocupante! - Danilo, não te apoquentes, Tomei minhas precauções, Não vamos ser imprudentes E enfrentar as reações. - Duda e Rico vão ficar eufóricos quando descobrirem a tramoia que estamos a preparar. Vai ser uma bela festa com família e amigos. 187
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Amanhã estará tudo preparado, se o médico de Duda der consentimento, aí vamos nós em viagem. Felizes com o desenrolar dos acontecimentos, Inês chamou os pequenos: - Meninos vamos descansar, está na horinha! Duda, amanhã é dia de consulta. Nada de tropelias, precisas ir relaxado, sim? Vamos para a caminha.
- Eu sinto-me bem, mãezinha, E o maninho também. Amanhã de manhãzinha Vais ver que está tudo bem. Vou poder ir para a escola, Conhecer a professora, Carregar minha sacola… - Tudo bem, vamos embora 188
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As luzes apagam-se, a porta fechase e ei-los prontos para uma bela noite de sono.
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Disse o pai recém-chegado Ao quarto dos pequeninos. Um beijo de cada lado No rosto dos seus meninos. - Boa noite pai querido. - Dorme bem, meu rapaz, Tem um sonho colorido, Dorme bem, se fores capaz. E logo Inês a sorrir Olha os filhos divertidos - ‘Stá na hora de dormir Tenham sonhos coloridos As luzes apagam-se, a porta fecha-se e ei-los prontos para uma bela noite de sono. É de manhã. 190
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O sol espreita por entre a frondosa árvore no jardim. O tempo promete um ameno dia de Outono. Inês prepara tudo ao pormenor, está ansiosa por levar Duda à consulta. - Ai, se Duda puder viajar! – pensa – Deus nos ajude. Era um dia importante na vida da criança. Se Duda puder viajar, vão fazer uma bela viagem. O casal precisa relaxar, os filhos também. – Vai ser uma maravilha – pensava. A consulta correu bem. O médico anuiu a que fossem viajar. Com precauções, muita cautela. Num instante, Inês telefonou ao marido que tratou logo de preparar a viagem. - Queridos filhinhos, vamos ausentar-nos de casa por uns tempos, vamos viajar, sim? O dia do aniversário de Duda aproxima-se. 191
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O médico concordou e lá vamos nós de férias. Amanhã bem cedo, estamos de partida. Há que preparar as malas. E, ao romper da Aurora, lá vão eles de partida. - Aonde vamos mãezinha, - À Itália, Espanha, Japão, França, Malásia e China, Israel, Afeganistão? - À Grã-Bretanha, à Turquia, À Alemanha e ao Brasil, À Holanda e à Hungria, À Guatemala e ao Chile. P’ra longe do nosso berço, Bem podem imaginar E neste rumo diverso Ver ilhas no imenso mar. 192
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E ei-los a viajar ao longo da Europa. Pelo caminho, vão conhecendo muitas crianças, como eles, com sonhos.
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O avião vai apanhar Assim que amanhecer Depois, vamos viajar Até ao entardecer. Vai ser longa esta viagem, Precisamos descansar. Depois, é ganhar coragem E partir a viajar. E ei-los a viajar ao longo da Europa. Pelo caminho, vão conhecendo muitas crianças, como eles, com sonhos. Outras, porém, cheias de medos e de incertezas. Seguiram para a Ásia, atravessaram a Oceânia e cruzaram a América. As mesmas crianças, os mesmos sonhos, a repetição de medos e frustrações. 194
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Mas uma coisa tinham em comum: Ricas ou pobres, todas desejavam paz, saúde, amizade, alimentação, educação e respeito. Todas procuravam um mundo mais justo e que os homens deixassem a guerra e cuidassem melhor a pródiga natureza. Pareciam estender as mãos uns para os outros e transformar esta bola imensa que é o mundo num enorme coração. Até Lulu, o cãozito de Lorena – a sua nova amiga que conheceram em Itália - parecia ladrar feliz da vida. Farrusco, o gatinho do brasileirinho Jair, ronronava e saltava de felicidade para o colo dos pequenos. Seruruca, a linda mexicana, não largava um momento a sua iguana:
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Este Mundo é um tesouro Que devemos preservar E nem com petróleo ou ouro O devemos maltratar. As crianças são iguais, Todas elas com direitos E as coisas essenciais Precisam em lares perfeitos A terra é um coração Aonde impera a amizade Toma, pois, a minha mão, Abaixo a desigualdade O tempo passou a correr. No regresso ao lar, voltaram mais ricos.
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Traziam um coração cheio de amizade e com altos ideais. O tempo voou, mas a sua mensagem lá ficou semeada pelos quatro cantos do mundo. Duda nem cabia em si de contente. Sem palavras para agradecer, agradeceu ao Criador o tê-lo feito chegar a este acolhedor lar onde impera o amor fraternal e um mundo cheio de sonhos e de alegrias.
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Estórias em tons de Rosa Edição Abril 2019 https://issuu.com/rosammrs
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