Título: "Lino, o menino que sonhava ser astronauta" conto de Rosa Maria Santos, julho 2021

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Lino O menino que sonhava ser astronauta

Conto

Rosa Maria Santos 2


Ficha Técnica

Título Lino, o menino que sonhava ser astronauta Tema Conto Autora Rosa Maria Santos Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa Maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições

Editado em E-book em Julho 2021 https://issuu.com/rosammrs/docs 3


Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar – Coletânea de Poesia de Natal de 2020.

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É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018.

E-Books - Poesia Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.

E-Books - Contos Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - 12 Contos de Natal, capa de Madalena Macedo - imagens com arranjos da autora, Na5


tal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn - Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris – Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; - O Menino da Lagoa - Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020;- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; - Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; - Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; - O Jardim em Festa, Julho 2020; - Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; - Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; - Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; - A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o Menino que queria sorrir – Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto – Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões – Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado – Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor – Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente – Março 2021; Janota, a guardiã do ervilhal – Março 2021, Zâmbia, a ma-

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caquinha que queria casar – Março 2021; Tuly e o cavalinho de baloiço – Março de 2021, Maria, a menina que não conseguia dormir – Abril 2021; A Lenda da Menina Lua – Abril 2021; Estrela Silente, a Princesa cativa – Abril 2021, Marly, a pequenina duende – Abril 2021; Mariana no País do trevo Dourado – Maio 2021; Esperança e o sorriso do Palhaço – Maio 2021; Uma Aventura na Floresta Encantada – Maio 2021; Esmeralda, umas férias diferentes – Junho 2021; Raitira no Planeta Ricoicoi – Junho 2021; A lição do Dente-de-Leão – Julho 2021; Lino, o menino que sonhava ser astronauta – Julho 2021.

Histórias da Bolachinha Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) - Capa: Glória Costa - Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; - Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo - Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018 Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020.

Aventuras de Maria Laura Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; - Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020.

Diferentes mas iguais Tomás e o infortúnio de não ter mãos – Junho 2021; 7


Lolita, a menina que não tinha pés – Junho 2021; Duda, o Menino que queria mudar o Mundo – Julho 2021.

Distinções - 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017. - 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019. - 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). - Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. - Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema. - Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione 2020. - Menzione d'onore con la poesie “Il mio quadro” – (Meu quadro). Itália julho 2020.

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Segunda Classificada no Prémio Poeti Internazionali - 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Poesia Esteri “Ouve” (Ascolta) dezembro 2020. - Menzione di Merito de poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Racconti “Esmeralda” dezembro 2020. Ebook: https://issuu.com/rosammrs/docs

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Lino, o menino que sonhava ser astronauta

Lino era um menino de sete anos de idade, criança sadia, inteligente e muito observadora. Tinha cabelo castanho, nariz arrebitado e era muito irrequieto. O pai trouxera-o ainda bebé para casa da mãe, avó do menino, tendo-lhe dito:

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- Mãe, este é o Lino, o teu netinho. Cuida dele, por favor, vou-me ausentar e mais tarde, se Deus o permitir, virei buscá-lo. O tempo foi passando e decorridos já sete longos anos, nem uma notícia, ela nada mais soube de Estevão, o filho. Da mãe do menino, mistério absoluto, nada conhecia. Bem que tentou saber quem era, mas Estevão nunca lhe dissera.

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- Trata bem dele, mãezinha, Um dia o virei buscar, Toma-o como uma prendinha Que eu aqui te vou deixar. A mãe o abandonou, Logo que ele nasceu E como pai dele sou… - Fizeste bem – respondeu. E o menino cresceu Com amor e carinho Para a avó, era o seu Amado principezinho.

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E assim, Lino foi crescendo rodeado de amor e de carinho na casa da avó Marieta, que tudo fazia para que ele não sentisse a falta dos seus progenitores. - Lino! - chamava a carinhosa avó do alpendre da cozinhaVem, meu querido, está quase na hora de jantar. Tens que tomar o teu banhinho, retirar esse pó que tens entranhado no teu corpo, depois, jantar e caminha. - Já vou, avó. Posso deitar-me um pouco mais tarde hoje? 13


- Tens alguma razão para isso? Sabes que gosto que te deites cedo, ainda és pequeno e precisas descansar. Mas diz-me, qual a razão para esse pedido? Não te chegou o tempo que passaste a brincar e a ajudar a avó? Não te sentes cansado? - Ó avó, estou de férias e amanhã não preciso de me levantar ao cantar do galo – sorriu - Posso ficar mais um pouco? Não me digas que não vais deixar!

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- Ai que menino este! Quando chega a hora de vir para casa, é sempre a mesma cantilena!

- “Deitar cedo e cedo erguer” Diz o povo e com razão “Dá saúde e faz crescer E alegra o nosso coração”.

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Por isso, meu bom netinho, Já chega de brincadeira. Vamos ao nosso banhinho, Depressinha p’rá banheira!

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- Olha, Lino, a avó já te ensinou que na tua idade precisas de descansar. O povo, na sua sabedoria, aprendeu também isso: … «dá saúde e faz crescer» queres crescer e ter saúde, não queres? - Avó, vem fazer-me companhia, observar o céu, olha como é belo, cheio de magia. Gosto de assistir ao pôr- dosol daqui.

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- Olha este céu, avozinha, Está lindo de se ver, Gosto de o ver à tardinha Até desaparecer. Fico aqui mais um pouquinho, Diz-me que sim, queridinha - Vou preparar teu banhinho Disse ela com voz meiguinha. Logo que a avó foi embora, Lino de olhos no céu E quando chegou a hora, O seu banhinho esqueceu.

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Surpreendida com a sua ausência, a avó decidiu ver o que se passava com ele. - Como é lindo tudo isto, avó! Que quantidade de animais a vaguear neste espaço infinito! Olha, lá vai uma cabrinha a correr! Parece correr atrás da borboleta! Talvez esteja com fome e como sabe que as borboletas procuram as plantas, deve acreditar que ela o vai levar até junto de um prado verdejante, aonde abundará comida para si. Com a noite a chegar, há que aconchegar o estômago. 19


- Que imaginação prodigiosa a tua meu querido netinho. Perdes-te a olhar o céu. Vá, vem daí. Vou deixar correr um pouco mais de água quente para te sentires mais confortado no teu banhinho. A água já deve ter arrefecido. Mas agora, não te demores de novo! - É só mais um pouquinho, avó, só quero observar bem estes belos animais que se passeiam por aí. Um pouquinho só e já vamos ao banhinho. 20


- Já vou, minha avó querida, Um instante, por favor, Olha aquela nuvenzinha, Tão pura, de branca cor. O céu vermelho dourado, Como a seara outonal E um peixinho no lago, Eu nunca vi coisa igual! 21


Olha um urso poderoso No céu azul a pescar E um gato preguiçoso Lá no céu a ronronar. O por do sol a chegar, As nuvens se dispersaram E todas vão descansar Das fadigas que passaram.

Regalado com essa selva de nuvens, Lino levanta-se e despede-se do céu que a seus olhos mais se assemelha a um 22


imenso jardim zoológico cheio de animais que se passeiam naquele infindo manto dourado. O sol vai decaindo no horizonte, as aves regressam aos ninhos de cada árvore, ali na quintinha da avó Marieta. Corre depois para o alpendre, em resposta ao chamado insistente da avó. Antes, volta-se para trás como que num gesto de despedida do sol. Quando chega a este momento, fica com a sensação de que as nuvens se tornam cada vez menores e que os animaizinhos vão reduzindo de tamanho. Então, lança-lhes um olhar triste e despedese. Ele sabe que a avó tem razão, há muitas horas que está para li a correr e a saltar. Sente-se um pouco cansado. Ao fim e ao cabo, foi bom ter participado com ela nas lides domésticas.

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A partir de agora, a noite não tarda a chegar e o céu logo dará lugar a uma Via Láctea repleta de estrelas que brilhará com tanta intensidade que iluminará tudo ao seu redor. Depois, vem a noite. Então, ele gosta de espreitar pela janela do seu quarto, situado na parte lá no andar da modesta casa da avó Matilde. - Lino - chamava a avó Matilde - Vem daí, a água está mesmo no ponto, como gostas! 24


Prontamente, o menino correu ao seu encontro. - Então, meu querido, que lágrimas são essas nos teus lindos olhos cor de amêndoa? - Nada, avó, não é nada, fico triste quando me despeço das nuvens e do sol, só isso. É como se não mais os fosse ver. - Pronto, não fiques triste, amanhã o pôr do sol, será mais belo e já vais deliciar-te de novo. - Eu sei, avó, cada amanhecer traz consigo algo de novo para aprender.

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- Bom é ver o sol raiar Quando está a amanhecer, Os raios cruzam o ar Com tons rosa a aparecer. Nuvens no céu a correr Nele gostam de brincar, Depois, ao entardecer Vão-se embora, descansar. Quero dormir e sonhar Que um dia à lua eu irei, Nas nuvens me vou deitar, No alvo manto dormirei. Um dia, avó, tu verás Que astronauta serei - Sim, meu príncipe, serás Eu mesma te ajudarei.

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- Vamos lá saltar para a banheira ou daqui a pouco a água fica de novo fria e eu sei que tu não gostas nada disso. Vê bem se já se viu um futuro astronauta a não gostar de água fria! – sorriu - Vai ser lindo, vai… - Sabes, avó? Tenho andado para aqui a matutar. Todos os meninos têm um pai, uma mãe. É esse o desejo de qualquer criança. Mas… Bem, tu és a melhor mãe e o melhor pai do mundo, ao mesmo tempo. Digamos que tenho uma avozinha que vale por dois – sorriu, disfarçando essa necessidade intrínseca que lhe vai na alma – Desculpa, avó, 27


sei que não devia falar disso. Afinal, o meu pai é também teu filho e deves ter muitas saudades dele. Eu nem sei o que é ter saudade. Só o vi em fotos metidas no teu álbum de recordações, mas não é a mesma coisa. Fotos são fotos, quase nada valem para mim. Mas eu sei quanto valem para ti!

Mergulhada numa onda de saudade, a avó não consegue evitar que umas lágrimas rolem pelo rosto. Criara aquele filho com tanto amor e carinho e agora, estava ali preocu-

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pada e saudosa. Desde que ele lhe entregara o seu pequeno Lino, somente recebeu duas cartas. E mesmo essas, pouco diziam dele. Somente que estava bem de saúde e que um dia voltaria para os rever, a si e ao seu pequeno Lino. Ainda não era o momento certo de regressar à sua linda aldeia do Monte Santo. Disfarçadamente, retira um lenço do bolso do avental de chita, limpa as lágrimas que teimavam em cair daqueles olhos azuis gastos pelo tempo, enquanto olhava o neto: - Desculpa, querido, as lágrimas traíram-me, não as pude evitar. A saudade inunda a minha alma. Como estás parecido com ele, quando tinha a tua idade! Quão bons esses momentos lindos, mas o tempo não volta atrás.

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- É tão bom o recordar, Ver o passado de volta, Contigo desabafar… Quanto ao resto, pouco importa! - Avó, sei que tens saudades, Tens um álbum para o ver, Essas contrariedades Eu sei, te fazem sofrer.

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- És tão bom querido, netinho, Iremos vê-lo ao jantar, Já tomaste o teu banhinho! E agora, vou-te secar. - Avó, já sou crescidinho, Eu consigo-me limpar. - Pois bem, vou ao jantarinho E o álbum procurar.

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Lino tinha consciência que a avó sofria com a ausência de Estevão, o seu pai, mas o que podia fazer? Não o podia segurar, para que não partisse. Tinha a esperança de que um dia ele ia voltar e então seriam uma família feliz. Depois do jantar, a Avó Marieta sentou-se no sofá e convidou o neto a partilhar consigo aqueles momentos lindos. Pegou no velho álbum já amarelecido com o tempo e desfolhou folha após folha, situando o menino sobre quem era cada um dos personagens que ali iam surgindo, família e amigos. Recordou com saudade Quinito, seu marido e avô do menino que falecera muito novo. Depois, as fotos do pai, naquele formato minúsculo e carcomido pelo tempo.

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- Naquela altura era assim – explicava, envolta em suspiros disfarçados, enquanto passava a mão por cada uma, como que as afagando, era o Tião, como carinhosamente o tratava. Distraída com o tempo, ouviu o velho relógio que anunciava as vinte e duas horas.

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- Lino, já é tão tarde! O tempo voa! Vá, toca a levantar do sofá. Já estás a bocejar sem o notares – sorriu – Já passaram cerca de duas horas e nem demos por isso. Vamos lá lavar os dentinhos e caminha. Silas, o gatinho, no seu sono profundo, encostado a Lino, despertou de repente e miou com desagrado, como que a dizer: «Tinham mesmo que me despertar agora, que estava a entrar em órbita. Gente esta que nem respeita o meu descanso».

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E Silas, a ronronar, Levanta-se lentamente E no seu espreguiçar Parece dizer contente: - Vou te fazer companhia, Dormir juntinho de ti, Voltar ao sonho, à magia De onde agora saí. Seguiu os passos de Lino Que foi lavar os dentinhos Foi prá cama co’o menino E ei-los enroladinhos. Num dia de tropelias, O sono chegou depressa E um mundo de fantasias Logo surgiu: - Vamos nessa!

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Cansado pelas fadigas do dia, Lino depressa adormeceu. Quando a avó Marieta entrou no quarto para lhe aconchegar o lençol e lhe dar um beijo de boas noites, já ele dormia profundamente… e sonhava com a almejada viagem ao firmamento. - Que belas nuvens! – dizia estupefacto, ao contemplar todo aquele cenário. Subiu para as nuvens e viu-se a voar através daquela imensidão de azul. - Reu, réu, miau, miau

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- Silas, o que fazes aqui? Volta para casa, o firmamento não é lugar para ti. - Ai, essa é que não vou. E logo agora que descobri essa gatinha linda ali encostada ao arco-íris!

E lá foi ele a correr em direção a uma nuvem em forma de gata que mais parecia feita de algodão doce, daquele que era vendido nas feiras e festas lá da aldeia. - Oh, fantástico! – desabafou Lino olhando ao redor. E, distraído, acabou por tombar sobre outra nuvem em forma de urso que ia a passar. 37


- Ai - resmungou a nuvem - O que me está a acontecer? De repente sinto-me invadida… e pesada! Já estou a adivinhar, deve ser a gata Farruca, aquela doida, que passa o tempo todo a subir na trompa do elefante Mané e depois se atira a torto e a direito. E quem está por baixo é que se trama, quem apanha com o peso das suas tropelias.

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- De novo gata Farruca, Um dia vais ficar mal, És uma grande maluca Mas também especial! Atenção, vou-te ajudar, Dá-me a pata, por favor. Lino vê, nem quer falar Ao vê-lo mudar de cor. Porque não encontra a pata, O urso fica intrigado - Onde estás, de que se trata? Outro intruso deste lado? Quando avistou o menino, Perguntou-lhe admirado: - O que fazes, rapazinho, Nas minhas costas, deitado? Me desculpe, amigo ursinho, Quando me senti cair, Aterrei no teu dorsinho E pronto! – disse a sorrir.

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- Mas, porque permaneces em cima de mim? Quem és tu, afinal? - O meu nome é Lino. Passo todo o tempo que posso a olhar cada nuvem, tanto ao amanhecer como ao entardecer. Sonhei tanto um dia me sentar no dorso de cada nuvem e poder descansar, até dormir uma sesta. Imagino quão bom é adormecer e acordar no conforto duma nuvem. - Bem que precisava de me virar para te poder ver, mas se me viro cais e não sei o que te vai acontecer! Deixa ver se Molina, a borboleta, anda por aí. Talvez ela possa segurar40


te e assim possamos conversar mais descansados. Mas diz-me, como vieste aqui parar? Não é normal termos visitas por aqui.

- Uma pergunta difícil de responder. Nem eu sei como vim aqui ter! Se calhar, devo estar a dormir! Só me recordo de estar com a minha avó. Depois, adormeci e pronto. - Molina, Molina, chega aqui! - Bom dia nuvem Urso, em que te posso ser útil? - Este é o Lino.

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- O Lino? Mas, é um menino! Os meninos supostamente não se andam por aí a pavonear nas nuvens e muito menos montado nelas. O que faz em cima do teu dorso? - Chega de perguntas, Molina! Queres ajudar, ou não? - Ajudar? Como posso ajudar! - Seguras nele para que não caia, eu viro-me e tu voltas a colocá-lo sobre o meu ventre.

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- Lino, diz-me, por favor, Que fazes no firmamento? Sinto em ti algum temor De caíres num momento! Irei chamar a Girafa, Nuvem de pescoço alto, Não há nada que não faça E sem qualquer sobressalto. … E a girafa Mariela Que era muito prestativa, Juntou-o à cabeça dela E devolveu-o em seguida. Urso sorriu à criança E falou-lhe com carinho, Incutindo confiança Ao assustado menino. Lino contente ficou E ao ver-se tão bem tratado, Logo se maravilhou: - Estrelas por todo o lado! Um novo plano esboçou: - O Universo é só um! E o firmamento observou Desse lugar incomum. 43


- Lino - chamava a avó Marieta. - O Galo Rico já cantou há tanto tempo e tu nem tuges nem mujes. Toca a levantar, a esta hora já costumas andar por aí a saltitar! Como o neto não respondeu, Marieta deslocou-se ao seu quarto e encontrou-o a dormir num sono tranquilo e profundo. - Será que está doente? - interrogou-se. Assustada, a avó, pé ante pé, aproximou-se e colocou-lhe a mão sobre a testa a fim de avaliar a sua temperatura. 44


- Parece normal, não tem febre - suspirou aliviada. Voltou-se e ouviu-o chamar. - Bom dia, avó. Sabes? Não sei o que o mundo me prepara, mas já sei o que quero ser quando crescer. Um dia disseste-me que o sonho comanda a vida. Lembras-te? Esta noite descobri que tinhas razão. Tive um sonho e despertou-se em mim a vontade de um dia seguir o meu sonho.

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- Ó miúdo, és ainda tão novo! Vais ter muitos sonhos, uns realizáveis outros nem por isso. Mas de tudo o mais importante é que continues a sonhar e a estudar para que um dia consigas concretizá-lo. - Sim, avó, vou estudar muito e vais ver que quando crescer vou ser astronauta! - Muito bem. O que precisas é de força de vontade e empenho. Depois, serás o que desejas. De momento, o que é mesmo necessário é que te levantes, faças a tua higiene, venhas ter comigo para um belo pequeno almoço a dois. Já está colocado na mesa à nossa espera. Depois, conto contigo para me ajudares nas tarefas habituais. Vamos a isso? - Claro que sim, avó, são apenas uns instantes e já vou ter contigo à cozinha. Com ternura, a extremosa avó abraçou-o ao ponto de o ouvir suspirar. - Adoro-te, avozinha, és tudo para mim.

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- Pois, pois – argumentou – vou ver se quando cresceres e te transformares num astronauta famoso, me ligas ainda alguma coisa! O menino olhou-a com surpresa e com toda a convicção, respondeu: - Nunca te vou esquecer, serás sempre a minha avó querida, o ser que soube transformar-se para mim no pai e na mãe que nunca tive. A avó não pode impedir que lhe escapasse uma gargalhada: - Ah, ah, ah, ah! – três em uma. És na verdade um menino muito especial. Mas essas coisas dizê-las agora que és 47


uma criança. Quando cresceres, nem tempo tens para te lembrar desta velha que te ama – sorriu. - Espera e vais ver. Vais estar sempre na minha vida, quero sentir o teu carinho e o modo como cuidas de mim. Afinal, durante todo este tempo, nunca permitiste que algo me faltasse. E eu não vou esquecer isso jamais. Em qualquer lugar onde estiver, estarás a meu lado. Até lá nos confins das nuvens! – gracejou.

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- Minha avozinha querida, Melhor não podia ter, És essa fada madrinha Que jamais vou esquecer. Meu pai me trouxe até ti Quando ainda era menino E ao teu lado cresci Com tanto amor e carinho. Tudo te devo, avozinha, Estás no meu coração, Sempre que rezo à noitinha, Peço a Deus nos dê a mão. - Protege a nossa casinha, Dá-nos paz e união A minha avó acarinha Com toda a tua afeição

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- Deixas-me sem palavras, Lino. Cá por mim, não me canso de agradecer a Deus pelo encanto de teres vindo parar a meu regaço pela mão de teu pai. Que privilégio! Sem ti e o teu pai, a minha vida não faria qualquer sentido, estaria aqui na nossa casinha envolta em solidão. É gratificante ter-te aqui comigo, usufruir desta alegria incondicional que me proporcionas cada dia da minha vida. Sois vós, afinal, a razão do meu viver, o ar que respiro a cada alvorecer.

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- Sabes, avó? Não sei se sou tudo isso que dizes, mas de uma coisa tenho a certeza: adoro a tua companhia, cada amanhã posso afirmar que vale a pena viver.

- Sinto amor, fraternidade, Nesta linda vida em flor, É grande a felicidade Em sentir o teu amor.

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- Os netos são o futuro, Presentes que Deus nos dá E o nosso porto seguro No porvir, no amanhã.

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