Título "Sonega, o Coelho Mandrião", conto de Rosa Maria Santos, julho de 2020

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Sonega O coelho mandriĂŁo

Conto

Rosa Maria Santos 2


Ficha Técnica Título Sonega, o Coelho Mandrião Tema Conto Autora Rosa Maria Santos. Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda

Editado em E-book em Julho de 2020 https://issuu.com/rosammrs/docs

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Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; VALE DO VAROSA: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens 4


do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Massimo e seus familiares. É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – julho 2018. E-Books: Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) – Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia – Outubro 2018; - Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo – Novembro 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018; Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, 5


Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - 12 Contos de Natal, capa de Madalena Macedo. Imagens com arranjos da Autora, Natal 2019; - Veado Solitário, na Aldeia do Mestre Li - Edição bilingue (português e italiano), Janeiro 2020; - Bolachinha e a Hora de Poesia, a Visita de Teresa Subtil – Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris, Abril 2020; - O Menino da Lagoa, bilingue (português e inglês) Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido, Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Stellina, nel regno misterioso - Conto de Rosa Maria Santos Tradução de Massimo Penna, Edição bilingue (português/italiano) Maio 2020.- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020. A editar, em breve: Histórias da Bolachinha – Capa e ilustrações de Glória Costa.

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Distinções: 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema.

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Sonega, o Coelho Mandrião

Na pacata aldeia de Coelhândia habitavam várias espécies de coelhos, correndo de um lado para o outro, numa verdadeira azáfama. Um deles, porém, era diferente de todos os outros que por ali havia, bem diferente, sim. Era na verdade especial. Os habitantes da Aldeia, apelidaram-no até de Sonega, o Coelho Mandrião. Os pais já não sabiam mais o que fazer. Passavam o tempo todo a chamar a sua atenção, tentando incutir-lhe responsabilidades, mas o coelhito fazia ouvidos moucos às chamadas de atenção e marimbavase para tudo e todos.

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Um certo dia, ao romper da aurora, os pais resolveram ter com ele uma conversa muito séria. Afinal, tinha que se fazer à vida. Além disso, não podia ser toda a vida apelidado por todos de Sonega, o Coelho Mandrião. Não lhe augurava nada de bom para o seu futuro. Ao longo da aldeia, toda a gente ironizava e era muito triste ouvir a cada instante, de forma depreciativa, o sarcástico apelido. - O Sonega é um mandrião! Diziam, por brincadeira. Ele não ligava, não, Era uma pasmaceira.

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Os pais viam com tristeza O que se estava a passar E viviam na incerteza Se não o vissem mudar. Ele, impávido, sereno, Passava o tempo a dormir Muita erva, muito feno, Tudo para o seu provir. - Trabalhar – disse a sorrir Mas para quê, Santo Deus? Eu quero-me divertir! Dizia para os pais seus. -Tenho casa, um doce lar, Que mais preciso afinal? A mim nada vai faltar Neste canto especial.

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E lá voltava ele, para se aconchegar no seu cantinho. Enroscando-se numa suave colcha de feno e ali ficava acomodado, para adormecer até à chegada da próxima refeição. Era assim todos os dias. Depressa se passou mais um ano. Sonega, o Coelho Mandrião, sem nada temer da vida, seguia naquele ram-ram, despreocupado da vida. Deixara já a lura dos pais, sob o olhar estupefacto da colónia de coelhos que, estupefacta, se espantava com tanta inércia.

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O que havemos de fazer Perante a situação? Não irá sobreviver Até que chegue o verão. Olhavam os velhos pais Que, constrangidos, estavam, - Já lá vai tempo demais Entre eles, cogitavam. - Isto é insustentável, Tem mesmo que trabalhar E não ser irresponsável, Há que se modificar. 13


E com os pais a alertar: - Já é hora de aprender, Se assim continuar, O que vai acontecer?

Salir, o governador da colónia, um dia chamou seus pais e lhes disse: - Rabeca, Artur, algo tem que mudar, tendes que falar ao vosso filho! O rapaz precisa mudar a sua atitude, aprender a defender-se. Precisa assentar na vida, como todos os coelhos cá da aldeia, Sonega, precisa

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crescer, aprender a ser responsável! Onde já se viu um mandrião assim?

- Tem que aprender a viver E tornar-se responsável, Não irá sobreviver, Assim, isso é impensável. Os pais bem se entreolhavam, Não sabiam que dizer, Conversas já não bastavam, Ele tinha que crescer. 15


- Sonega quer boa vida, Descansar, comer, dormir, Uma vida destruída Que nos está a afligir. Iremos nos reunir E falar com o Mandrião, O tempo está-se a esvair, Trazei-o à reunião.

Cabisbaixos, com o olhar tristonho, os pais de Sonega deixaram o campo do governador Salir e dirigiram-se 16


a casa, para de novo se reunirem com Sonega. Ele podia ter todos os defeitos do mundo, mas continuava a ser o seu filho. Deram-lhe o nome de Sonega quando numa tarde de primavera a mãe o trouxera ao mundo. A mãe alimentou-o com todo o seu carinho, sonhavam então com um risonho futuro para ele. - Afinal – pensavam - o que correu mal na educação que ao longo do tempo lhe tentaram incutir? Era essa a pergunta que todos os dias lhe assaltava os pensamentos, na ânsia de encontrar uma resposta aceitável que tardava em chegar. Quando chegaram a casa, foram ao seu cantinho e lá estava ele dormindo, como sempre. Entreolharam-se com aquele olhar de amor que só os pais sentem e logo uma lágrima lhes rolou pela face, neste confronto com as vicissitudes da vida.

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- O que foi que aconteceu Na educação do pequeno? E, olhando, se enterneceu: Vê como dorme sereno. Sem qualquer preocupação, No seu sono angelical. E afagou-o com a mão Com instinto maternal. Deitam os olhos ao céu À espera duma resposta, Esta não apareceu, E isso logo a desgosta.

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- Bem - disse o pai - temos que o acordar para lhe falar da reunião. Ele não vai gostar nada. Quem sabe se nem lá quer ir! Vai achar uma perda de tempo. Ai, esposa minha, em que foi que erramos na sua educação? - Quantas vezes já fizemos essa pergunta, marido. Mas a resposta é tardia, nunca chegou. - Sonega precisa mesmo de crescer, o tempo passa depressa. Os outros coelhos da colónia quase todos constituíram família. Os que não o fizeram ainda, estão a concluir os seus estudos com a Sábia Coruja. E foi então que decidiram acordar Sonega que logo os olhou e saudou. - Bom dia, mãezinha. Bom dia, meu cota. Porquê esse olhar triste neste belo dia de sol? - Meu filho, precisamos conversar contigo. Hoje bem cedo, fomos chamados ao espaço do governador Salir. - Foram? Que queria ele? - Avisou-nos que tinha marcado uma reunião com a colónia, para mais logo ao entardecer e pedem-nos para que estejas presente. - Só me faltava essa! Não vou a reunião nenhuma! Vai ficar a falar para as paredes! Eu não vou estar presente. - É melhor estares, filho, pode ajudar-te a preparares o teu futuro! - O meu futuro? Ele que trate do futuro dos dele! Em mim não vai mandar.

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- Meu filho, do coração!... Dizia a mãe preocupada. - Não sei qual é a razão Para estares chateada! Olhava a mãe com ternura, Não sabia o que dizer. - Hoje parto à procura De outro lugar para viver.

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Ele gostava dos pais, Não se queria exaltar, Mas agora era demais, É hora de debandar.

Afastou-se e aconchegou-se no seu pequeno cantinho para descansar, alheio a todos os cochichos ao redor. Seus pais olhavam-no desanimados. Como amavam o seu filho! O que iria ser dele quando chegasse a sua hora de partir?

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Disse de si, para si: - Um lugar hei de arranjar, Viver aqui, ou ali, Questão de me habituar. Olhou os pais com tristeza, Não sabendo o que dizer, E a mãe disse: - Com certeza, Tu connosco vais viver. - Queridos pais, na verdade, Quero convosco ficar, Morreria de saudade Ao deixar o vosso lar.

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Os dias passavam devagar. Sonega, o Coelho Mandrião, lá foi marcando o seu dia a dia sem qualquer preocupação. Certo dia, sem que nada o fizesse prever, havia um ruidoso alarido na pacata Aldeia da Coelhândia. Abrira a época da caça ao coelho. E muito embora a aldeia estivesse situada dentro de um espaço onde a caça era proibida, um sentimento de medo estava estampado em todos os habitantes. Salir, o governador, estava perplexo, sem saber como reagir. Sabia que o ser humano não olhava a princípios para atingir os fins a que se propunha. E isso era preocupante. Em tempos similares, sentiu bem na pele o que era perder família e amigos, nessas selvagens 23


caças. Havia que tomar medidas e todos os cuidados seriam poucos para garantir a segurança da sua comunidade. Assim, reuniu toda a gente e redobrou a vigilância ao longo do domínio da aldeia.

- Há que ter muita cautela, Não podemos confiar, Pois, quando menos se espera, Eles podem atacar.

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Estejamos vigilantes, E abramos nossa mente, Eles, em parcos instantes, Nos aparecem na frente. Meus amigos, bem alerta, Por nossa comunidade E se a aldeia for aberta, Fugiremos p’rå cidade. Agora, bem avisados Do que podia surgir, Cobriam todos os lados Para saber como agir.

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A dado momento, um dos vigilantes deu um alerta: - Caçador à vista. E por toda a aldeia se ouviam já rufar os tambores, alertando toda a gente. - Um caçador tão cedo, à caça por aqui? Logo Rabina, o coelho Vigilante, procurou ao redor. E gritou: - Daqui não o consigo avistar! De imediato, Lotus da ala Oeste, enviou uma mensagem: - Por aqui, tudo sossegado. Faltava apenas o alerta do Vigilante Lampur. - Alerta geral – gritava Salir, o governador – Reúnam a comunidade e estejam preparados para o que der e vier. Salir há dias que não descansava, tal a preocupação. Que podia acontecer? Sabia que logo que desse o sinal, toda a gente se deveria recolher no abrigo preparado, onde arquitetaria uma possível fuga, se se mostrasse necessário.

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- Tudo alerta no lugar, O perigo é eminente, Quando a corneta tocar, Saem ordenadamente. Nada precisam levar, Armazenamos comida, Se tudo colaborar, A luta será vencida. E quando chegar a hora E surgir um caçador, Corremos daqui p’ra fora Com todo o nosso vigor. 27


Aquele espaço, se bem que fosse zona de caça proibida, podia num momento tornar-se num campo de massacre dos seus pequenos habitantes. Bastava que os caçadores, na sua sede insaciável de caçar, não cumprissem com os preceitos da lei estabelecida, como acontecera tantas vezes no passado. No meio de toda aquela ansiedade, o Vigilante da ala Norte, ouviu uns estalidos por debaixo da árvore onde ele estava de vigia. Era o Rato Timo. Depressa, se enfiou na toca. Foi então que ouviu o grasnar da águia Safira, que desviou a sua atenção. Sem querer, confrontou-se com aquela placa: “PROIBIDA A CAÇA AO COELHO”. 28


O ruído do pequeno roedor foi também ouvido por um caçador que vigiava e preparava, escondido, o momento de atacar. Ao largo, um caçador, olhou de soslaio, ora para a esquerda, ora para a direita, e avançou.

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- Era uma águia, somente, Não há nada mais por perto Assim, sem ela presente, Ninguém me irá ver, por certo. Apenas uns coelhitos Para comer ao jantar. Aponta, ao ver uns olhitos, A arma: - Vou disparar! Logo, o ratinho, assustado, Corre sem ter direção. Um tiro sai disparado E cai tombado no chão - Bem feito, rato malvado, Que me enganaste, palerma. E viu então, espantado, Que a águia o levou p’la perna. - Lá vai ela nas alturas Com alimento p’ra cria É com estas desventuras Que começo este meu dia.

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Com os coelhos recolhidos à ordem de Salir, viram entrar no refúgio os pais do Sonega, o Coelho Mandrião. Eles que bem tentaram acordar o filho amado. Mas este, rebelde como sempre, não se apressou a sair da lura. - Vão, que eu já vos apanho. E os pais logo partiram desenfreados em direção ao abrigo. Apenas faltavam agora os vigilantes, previamente cientes do plano B, caso não pudessem chegar ao refúgio e se sentissem perseguidos. - Como sempre, falta o Sonega! - Que mandrião o teu filho nos saiu. Rabeca bem que quis voltar ao seu encontro, mas Salir não a deixou sair. Rabeca ficou em choque. Foi então 31


que o marido, constrangido com a sua dor, pensou ir em seu encalço. Sabendo o perigo que iria enfrentar, a sua saída não foi permitida. - Daqui ninguém sai – gritou o governador. Vou verificar quem falta e depois encerro o abrigo até que o perigo passe. Salir contou um a um.

- Alguém viu a coelha Mimi? Vamos ter que a procurar. Quando Salir se preparava para sair do abrigo, viramna a correr espavorida na direção do abrigo. Parecia já tarde. O caçador Furtivo já estava com a arma apontada à pequena Mimi. - Corre Mimi, gritavam todos aflitos. - Coitada! Vai ser alvejada! 32


Mas algo aconteceu, o tiro foi desviado e foi atingir uma das árvores ali próximas. Foi então que avistaram espantados Sonega, o Coelho Mandrião, carregando nas patas uma fisga qualquer que encontrara pelo caminho, deixada por alguma criança que por ali tivesse andado a divertir-se.

- Sonega salvou-me. - gritava Mimi enquanto entrava no esconderijo – Quase desmaiei de susto. Agora, ele era o herói! Com as portas do esconderijo franqueadas, agradeciam ao Sonega tamanha abnegação, logo sendo nomeado como o vigilante-mor de Fisga, na Aldeia da Coelhândia.

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Antes era o Mandrião, Mas, agora, é respeitado E viu o seu coração Por Mimi apaixonado. Mimi, sua coelhinha, Ganhara sua afeição, Já tem a sua casinha E uma prole em gestação. Sonega, desde esse dia, Transformou-se e, na verdade, Novo coelho seria Na sua comunidade. 34


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