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Timo um ratinho irreverente
Conto
Rosa Maria Santos 2
Ficha Técnica
Título Timo, um ratinho irreverente Tema Conto Autora Rosa Maria Santos Capa Arranjo de José Sepúlveda Ilustrações Rosa Maria Santos Revisão de textos e Formatação José Sepúlveda Publicado por Rosa Jasmim Edições
Editado em E-book em Agosto 2021 https://issuu.com/rosammrs/docs 3
Rosa Maria Santos Naturalidade – S. Martinho de Dume, Braga. Muito pequena, foi viver para a freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas de Poesia, portuguesas, italianas e brasileiras. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi assistente de produção e recolha na coletânea de postais do grupo Solar de Poetas, Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de poemas e postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar para Ele; Vale do Varosa: Uma Tela, um Poema, do Solar de Poetas, para promoção do Evento: Tarouca Vale a Pena; Belém Efrata; Então, Será Natal; Vi Uma Estrela, todas editadas em e-Book; O Presépio de Marco – inspirado nas imagens do presépio de Natal 2019, elaborado por Marco Penna e seus familiares; Quando o Menino Chegar – Coletânea de Poesia de Natal de 2020. 4
É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena também a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó - A Música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online; Poetas Poveiros e Amigos da Póvoa; Hora do Conto e O Melhor do Mundo, todos do grupo Solar de Poetas. A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa Jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018.
E-Books - Poesia Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado – Natal 2017; - Ucanha terra de encanto Poesia) - Capa: Glória Costa – Maio 2018; - Sinos de Natal, Natal de 2018; - Glosa, Arte e Poesia, Pinturas de Glória Costa, poesia da autora, Agosto 2019; - Entre Barros, Arte e Poesia Bordadas à Mão – pinturas de Bárbara Santos, poesia da autora, Outubro 2019; - Maviosa poesia, a arte de rialantero" Pintura de Silvana Violante; poesia da autora; Em Palhas Deitado – Poesia de Natal, Dezembro 2020.
E-Books - Contos Pétalas de Azul (contos) – Fevereiro 2019; - Estórias em Tons de Rosa (contos) Abril 2019; - Pena Rosada, Crónicas do Quotidiano, Julho 2019; - 12 Contos de Natal, 5
capa de Madalena Macedo - imagens com arranjos da autora, Natal 2019; - O Veado Solitário, na Aldeia do Chefe Lyn - Edição bilingue (português/italiano), Janeiro 2020; - Esperança no País do Arco Íris – Edição bilingue (português/italiano), Abril 2020; - O Menino da Lagoa Edição bilingue (português/inglês), Abril 2020; - A Menina Raposa, capa de Ana Cristina Dias; - Rufo, o Cãozinho desaparecido – Edição bilingue (português/espanhol), Abril 2020; - Ana Rita e o fascínio dos ovos – Maio 2020; - Milú, o Chapeuzinho que gostava de cirandar, Maio 2020; - Contos ao Luar, Maio de 2020; - Patusca, no Reino Misterioso - Edição bilingue (português/italiano), Maio 2020;- O bolo na casa da Avó Doroteia, Junho 2020; - Sonega, o Coelho Mandrião, Julho 2020; - Rosalina e a Sombra Rebelde, Julho 2020; - O Jardim em Festa, Julho 2020; - Ritinha, salva a Sereia Serena, Julho 2020; - Ana Clara, em tempos de pandemia, Novembro 2020; - Josefina, a menina que veio do mar, Novembro 2020; - Luizinho, protetor do ambiente, Novembro 2020; - A Girafa Alongadinha e a Pulga Salomé, Novembro 2020; O Dia de Natal, Dezembro de 2020; O Natal de Afonso; Dezembro de 2020; Um Milagre na Ilha Paraíso, Dezembro de 2020; Ventos de Mudança, Dezembro de 2020; Gisela e a Prenda de Reis, Janeiro de 2021; Dany, o Menino que queria sorrir – Janeiro 2021; Marquito, o menino irrequieto – Janeiro 2021; Joaninha, a menina que vendia balões – Janeiro 2021; Vicentina, uma avó aventureira – Fevereiro 2021; Juliana e os sapatinhos encarnados – Fevereiro 2021; Tomás, o Pinguim Desastrado – Fevereiro 2021; Silas e o Triunfo do Amor – Fevereiro 2021, Bogalha, a macaquinha irreverente – Março 2021; Janota, a 6
guardiã do ervilhal – Março 2021, Zâmbia, a macaquinha que queria casar – Março 2021; Tuly e o cavalinho de baloiço – Março de 2021, Maria, a menina que não conseguia dormir – Abril 2021; A Lenda da Menina Lua – Abril 2021; Estrela Silente, a Princesa cativa – Abril 2021, Marly, a pequenina duende – Abril 2021; Mariana no País do trevo Dourado – Maio 2021; Esperança e o sorriso do Palhaço – Maio 2021; Uma Aventura na Floresta Encantada – Maio 2021; Esmeralda, umas férias diferentes – Junho 2021; Raitira no Planeta Ricoicoi – Junho 2021; A lição do Dente-de-Leão – Julho 2021; Lino, o menino que sonhava ser astronauta – Julho 2021; Bia, Mitra e o Tufão Esperança – Agosto 2021; Sericaya, a Ponte Misteriosa – Agosto 2021; Timo, um ratinho irreverente.
Histórias da Bolachinha Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) - Capa: Glória Costa - Maio 2018; - Bolachinha vai à Hora de Poesia Edição bilingue (português/ francês), Outubro 2018; Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo Novembro 2018; - O Natal de Bolachinha, Natal 2018 Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de Teresa Subtil Edição bilingue (português/Mirandês), Fevereiro 2020; Bolachinha e a Hora de Poesia, a visita de José Sepúlveda - Edição bilingue (português/francês), Julho 2020.
Aventuras de Maria Laura Maria Laura, a Menina da Página dezasseis, Agosto 2020; - Aventura no Castelo sem nome, Agosto 2020. 7
Diferentes mas iguais Tomás e o infortúnio de não ter mãos – Junho 2021; Lolita, a menina que não tinha pés – Junho 2021; Duda, o Menino que queria mudar o Mundo – Julho 2021.
Distinções - 2º Prémio de Poeti Internazionali. Poema Rosa de Saron, no Concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria, Itália; Maio 2017. - 3º Prémio de Poeti Internazional - Itália. Com o poema “Violino”; 5° Biennale del Festival Internazionale Delle Emozioni, Itália - Maio 2019. - 10° Edizione Del Concorso Di Poesia e Narrativa: Prémio d’Onore Concurso de Premio Letterario Internazionale di Poesia “Gocce di Memoria“, Itália, Junho 2019 con la poesia Sfera di cristallo (Bola de Cristal). - Concorso “Il Meleto di Guido Gozzano” Sezione Autori di lingua straniera - ATTESTATO DI MERITO, 14 settembre 2019 com la poesia Assenza (Ausência). Itália, agosto de 2019. - Jogos Florais Vale do Varosa 2019 – Concurso Literário Tarouca - “O rio, o vale e as gentes”: Menção Honrosa, categoria de Poema. - Concorso di Poesia Internazionale " Gocce di Memoria" VI edizione 2020. - Menzione d'onore con la poesie “Il mio quadro” – (Meu quadro). Itália julho 2020. 8
Segunda Classificada no Prémio Poeti Internazionali - 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Poesia Esteri “Ouve” (Ascolta) dezembro 2020. - Menzione di Merito de poeti Internazionali 11ª. Edizione del Concorso Internazionale di Poesia-videopoesia e racconti dal titolo: Racconti “Esmeralda” dezembro 2020.
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Timo, um ratinho irreverente
Timo não era um ratinho qualquer, vivia no seu mundo do sonho e era muito irreverente. Bem que a mãe lhe tentava incutir algum juízo naquela cabecinha, mas qual quê, ele tinha ideias muito suas e respostas na ponta da língua para dissuadir quem quer que fosse. A mãe Clotilde, uma ratinha muito astuta e senhora de si, tudo fazia para orientar o pequeno Timo, mas era muito difícil. 10
Quando aquele danado metia qualquer coisa na cabeça, nada o conseguia desviar dos seus propósitos.
Tinham passado já três anos desde que Clotilde perdera o marido por algo tão fútil como um simples pedaço de queijo. Desde aí, encontrou-se sozinha na vida, apenas podendo contar com a companhia do seu pequeno Timo que mal conhecera o pai. Sabujo, era esse o seu nome, era um garboso rato, esbelto e que inteligente. Mas tinha um defeito, era um verdadeiro glutão e então quando via queijo, perdia a cabeça, fosse esse de que espécie fosse, 11
todas as qualidades o deliciavam. Dizia: queijo é queijo! E isso bastava. Agora, Clotilde andava sempre com o coração nas patas, pois parecia profetizar que um dia, mais tarde ou mais cedo, a irreverência do filho ia trazer consequências imprevisíveis.
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- Clotilde minha querida Temos queijo para jantar? Dá-me tanto gosto à vida, Mas não o pude encontrar. Vou procurar por aí, Pode ser que encontre queijo. - Meu querido, vem aqui, Timo quer-te dar um beijo - Tens razão, minha adorada, Vou-lhe dar um abracinho, Vou, mas não demoro nada. … E dá um beijo ao filhinho E lá saiu porta fora A cantar com alegria Com queijinho a toda a hora, Delícia, que bem sabia. As horas foram passando E ele não regressava E Clotilde rezando Até longa madrugada. - Senhora da Agrela, Vai, protege o meu marido, É frágil - dizia ela Vem e ouve o meu pedido! 13
Sabia bem. Na verdade, Por queijo tinha paixão, Sentia necessidade De o ter perto da mão.
E foi assim que naquela noite de muita chuva, com o vento a fustigar as janelas do seu frágil esconderijo, enquanto os trovões ribombavam e se ouviam por toda a 14
Ratalândia, ali estava ela, aflita, preocupada, à espera do seu querido Sabujo. Corria de janela em janela, as horas teimavam em não passar, até que chegou a madrugada. O dia surgiu fresco, sem chuva, com pouco vento. Enfim, a bonança. Clotilde foi de casa em casa e alertou a comunidade sobre a ausência de Sabujo que não regressou a casa. A comunidade mobilizou-se e repartiu-se em grupos que partiram à procura de Sabujo.
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Chegara a hora de iniciar a sua labuta, de partir. E enquanto uns partiram à procura de alimentos para alimentar a sua comunidade, outros iriam dedicar o seu tempo a tentar encontrar Sabujo, ele não podia andar longe, afinal, o perímetro de segurança da aldeia era por demais conhecida de toda a comunidade. Os grupos que foram incumbidos da busca, bem que procuraram, mas não havia forma de o encontrar, parecia que tinha sido tragado pela chuva e pelo vento, nem um único vestígio. - O que terá acontecido? – perguntavam. Mas nenhum elemento da comunidade encontrava qualquer resposta. Ao fim de muito tempo de buscas, eles regressaram. A tragédia estava, por certo, consumada.
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E foi assim que Clotilde se sentiu sozinha com o seu pequeno Timo para criar. Coitado, mal conhecera o pai, quase não tivera tempo de partilhar com ele os momentos que tanto almejava. É certo que Clotilde, jovem e bonita, tinha muitos pretendentes a fazerem-lhe a corte. Mas ela não conseguia esquecer Sabujo, aquele que fora o grande amor da sua vida. E por isso, preferiu trabalhar redobradamente para criar Timo que foi crescendo ao lado da progenitora rodeado de amor e carinho, a qual não deixava que nada lhe faltasse. Mas aquele lado sonhador e irreverente do 17
filho trazia-lhe preocupações redobradas e fazia com que ela estivesse sempre atenta a tudo o que ele fazia.
- Meu Timo, filhinho amado, Como o pai tão sonhador, Fica comigo, a meu lado E Jesus, nosso Senhor. Teu pai um dia perdi, Mas por ti, fiquei, lutei, As incertezas venci Nas noites em que chorei. 18
Cresceste muito, filhinho, És o meu maior tesouro, Nunca vais ficar sozinho Hoje e no tempo vindouro. Vem comigo, vem dormir No teu leito sossegado, Minha alma fica a sorrir Quando te vê descansado.
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Cada dia, pela noitinha, antes de se dirigir para o seu quarto e descansar, dirigia-se ao quarto do filho, aconchegava-o com o lençol e despedia-se com um carinhoso beijo, enquanto cantava:
- Algum dia, meu querido, Hás de ter teu próprio lar, Na vida bem sucedido E sempre, sempre a sonhar. Sonhos quem os não tem? Alguns vais concretizar Outros, esquecer, meu bem, Não os vais realizar. 20
Sonhos, como os sentimentos, Realizáveis ou não, São minúsculos fragmentos Que temos na nossa mão. Dorme, meu filhinho, dorme O teu sono descansado E que ele se transforme Em algo concretizado Estarei sempre contigo E nada te vai faltar. Contarás sempre comigo A ver teu mundo a girar.
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Como era bom! Timo gostava de ouvir a mãe cantar, esses momentos enchiam-lhe a alma e sempre que isso acontecia, o dia que se seguia parecia sempre melhor. Mas aquele sonho, ai esse sonho! Um dia partiria e iria dar a volta ao mundo. Como desejava conhecer as terras ao redor, descobrir outras gentes, fazer amigos. Ele bem sabia que isso era a preocupação da mãe, mas o que poderia ele fazer se era esse o seu anseio? Havia dias em que Timo fazia de conta que dormia, mas não, apenas engendrava o plano que o levaria a viajar. Quem sabe, nessa sua aventura viesse a encontrar o rato 22
Sabujo, o pai, apesar de no seu intimo acreditar que podia ter caído numa armadilha ou mesmo ser tido apanhado por qualquer felino ou outro predador. Não faltaria já muito tempo. Entretanto, era tempo de preparar a mãe para a sua partida.
- Mãezinha, quando crescer mais um pouco, bem sabes que é meu propósito partir para conhecer o mundo. É esse o meu sonho, bem sabes, um sonho que quero concretizar, é um propósito de vida que, tenho a certeza, me vai fazer feliz. Mas prometo que vou regressar para de novo te abraçar e ficar contigo em nosso lar. 23
Clotilde olhava-o com olhar triste. Como poderia entender o seu propósito? Como iria ele aventurar-se através dum mundo tão cheio de perigos e incertezas? Com voz trémula, soltava pequenas frases, quase sem sentido, olhando para o filho que tanto almejava um olhar de consentimento para a sua pretensão.
- Sabes, filho, o quanto estou apreensiva. O mundo fora desta pequena Aldeia é obscuro e perigoso! Não sabemos o que aconteceu a teu pai. Ainda me parece que o estou a ver a sair por aquela porta para procurar queijo. Como ele gostava de queijo, Santo Deus! 24
- Não chores, mãe, prometo-te que vou ter o maior cuidado e que regressarei, vais ver. Vais sentir-te orgulhosa de mim! - Está bem, meu querido, deixa passar mais algum tempo e depois voltamos a falar, sim? - Certo, mãe, mas peço-te, não fiques triste comigo. - Prometo, meu querido. Vem, vou preparar algo para comermos. Quando Clotilde se afastou um pouco, as lágrimas caíam-lhe copiosamente pelo rosto. A tristeza entranhara-se no corpo e na alma e o seu coração saltava com receio de que algo viesse a acontecer.
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- Ó meu Deus, tem piedade, Dá sossego à alma minha E com a tua bondade Cuida da minha casinha. Vem proteger meu filhinho E se entrar em aventuras, Ilumina o seu caminho Nos tormentos ou agruras. Se sonhar é o seu destino, Não o abandones, Senhor, Velarei por meu menino Aqui, neste lar de amor. 26
O tempo foi passando e Clotilde ia sentindo o coração mais apertado. Ela bem sabia que mais dia, menos dia, ele partiria, estava-lhe no sangue o desejo de aventura. Na verdade, o que mais desejava, era que ele fosse feliz. Isso levava-a a partilhar consigo esse seu sentimento enraizado, mesmo que um tormento para si. Depois de uma noite de pesadelos recorrentes e constantes, Clotilde, levantou-se sobressaltada e, preocupada, dirigiu-se aos aposentos de Timo. Estupefacta, verificou que não se encontrava na cama. Aflita, correu cada espaço, mas nada, não conseguiu encontra-lo. Dirigiu-se à portinhola do esconderijo e gritou:
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- Timo, Timo, onde estás? - Mas nada de Timo. O que teria acontecido? Era ainda tão cedo! - Bom dia, Bagunça, não viste por aí o meu Timo? - Bom dia, Clotilde, não, não o vi. O que foi que aconteceu para andares para aí aflita? - Nem eu sei ao certo, mas não estou a gostar do sentimento, isso não.
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- Olha, minha amiga, tu sabes o que penso a respeito do Timo. Gosto muito dele, mas o miúdo anda sempre com a cabeça no ar, a navegar no seu mundo de fantasia. Fazlhe falta alguém que fosse assim como que uma referência, um Rato de peso aí em casa.
- De novo essa cantiga? Tu sabes bem o que penso! - Desculpa-me, minha amiga, O tempo não é propenso. 29
- Preciso o Timo encontrar, Que lhe pode acontecer? - Está bem, vou procurar, Prometo que o vou trazer! Nossa Senhora da Agrela Possa ajudar nesta hora, E tu também - pediu ela Meu mundo se desmorona. - O nosso tempo escasseia, Achá-lo é bem premente, Vou partir nesta odisseia E muito rapidamente.
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E enquanto o via partir à procura do filho, questionou: - Quanto a essa pretensão de eu ter um Rato em minha casa, deixa-me adivinhar. Serias tu, certo? Nem mais nem menos! - Olha, Clotilde, há quantos anos vives só, sem teres um companheiro que te ame, respeite e defenda? - Entende, Bagunça, o meu coração pertence a Sabujo. Jamais outro Rato vai tomar o seu lugar na minha vida. Agora, a prioridade é encontrar Timo. - Está bem, mais tarde abordaremos de novo o assunto. Agora, diz-me. O que se passou com Timo? 31
- Não sei dele, quando acordei não o encontrei. A cama estava arrumada. - Não sabes a que horas saiu? - Não, não me apercebi. Vai agora, por favor. Como vou eu sobreviver sem ele?
- Meu coração apertado Pede ajuda, por favor, Procura por todo o lado Para que alivie a dor. 32
- Não percas a confiança, Havemos de o encontrar, É ainda uma criança, Não vai longe, há de voltar. - Um sonhador, meu amigo, E age com imprudência, Não tem noção do perigo Nem sabe a consequência. Distante não deve andar, Logo vai aparecer E a casa regressar, É mesmo isso, vais ver. …
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Entretanto, não muito longe dali o ratinho Timo sonhava como percorrer o mundo e atravessar o mar. Lembrava a mãe. Como estaria ela? Não, ela vai ficar bem – pensava. Já sou maior, quero correr mundo. Depois de algum tempo, calcorreava a praia e observava as crianças a brincar. Uma delas aproximou-se das ondas com um barquinho de papel nas mãos.
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- Que lindo barquinho! – pensou - Se me pudesse esconder nele, podia viajar para longe e concretizar o meu sonho de viajar. Escondido atrás de um arbusto viçoso, Timo magicava no modo como o alcançar. - O meu barquinho! – pensava - Como posso alcança-lo e ali entrar?
E logo surgiu uma oportunidade. Num momento, apanhou a criança distraída, a procurar uma pequena pá e um balde que se encontrava a escassos metros. Nesse 35
entretanto, Timo correu e conseguiu lançar-se no pequenino barco, agitar as águas com as mães e lá partiu à descoberta a enfrentar as ondas daquele mar imenso. Como era bom sorver a maresia que lhe entrava pelas narinas! A sua respiração tornara-se ofegante e como que embriagado, enfrentou as imensas águas. Quão diferente do lado de Ratalândia! Agora, sim, ia viver o seu sonho.
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- Céu azul, o azul do mar, A maresia sorver, Finalmente a viajar E nisso sentir prazer. - Trá lará, lará, lará, É grande a felicidade Acordar pela manhã E sentir-me em liberdade. - Não temas, minha, mãezinha Pois saí sem avisar Logo vais ler a cartinha Em que prometo voltar. Eu sei que vais entender Que sou um rato do mundo, Não te quero ver sofrer, O meu sentir é profundo.
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Entrementes, lá no mar… - O que está a acontecer, meu Deus? – Grita, esbracejando perdido naquelas imensas águas – Ó meu Deus, ajuda-me! Aonde está o meu barquinho de papel? Como vou sair agora desta imensa corrente de água tão fria? Ao ver o barquinho de papel dissolver-se no meio daquele mar, Timo assustou-se, não sabia o que fazer. A sua situação era agora muito delicada. Sentia que as forças o estavam a abandonar. Pensou na mãe, no aconchego do seu colo e começou a pensar que nunca mais a veria. Ai, 38
se ao menos tivesse o pai ali ao seu lado! Corajosamente, pensou: - Não, não posso morrer assim! Sou ainda demasiado jovem para morrer. Além do mais, não consegui ainda concretizar os meus sonhos. Com estes pensamentos, lutou com todas as suas forças e tentou atingir a praia. O desalento era grande e o receio de perder a vida assaltava-o.
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- Não irás, mundo cruel, Não vais destruir meu sonho, Antes de mel, ora fel, Um pesadelo medonho. Ó doce Mãe lá do céu, Pelo amor de teu filhinho, Faz de mim filhinho teu E conduz-me em meu caminho. Mandai-me um aviãozinho Para daqui eu sair, Ainda sou tão novinho, Muito jovem p’ra partir. Ó Pai nosso, olha por mim Nesta hora de aflição, Dá-me asas de querubim Nesta triste ocasião! Anjos do céu e da terra, Vinde em minha proteção! Eu sei que errei. Quem não erra? A todos peço perdão!
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Aflito a lutar com as águas, ouve um barulho ténue e vê um pequeno avião de papel ali mesmo ao alcance da mão. Fora preparado com velhas folhas de jornal e revestido por uma camada de cola insolúvel. Lentamente, viuo pousar a seu lado como convidando-o a entrar. Sem perder tempo, Timo alcança-o com genica e logo se tentou acomodar o melhor que pode. Dentro, encontrou um Rato garboso que, sem perder tempo, a si se dirige: - Timo, o que fazes aqui em pleno mar? Como ousaste tu viajar num barquinho de papel? Quanta imprudência! - Como sabes o meu nome? 41
- Lembrei-me do meu filho querido. Também eu um dia fui jovem como tu… e imprudente também. Essa imprudência levou-me a perder a minha querida companheira e o meu filhinho, o Timo.
- Não me vais dizer que o teu nome é Sabujo! - Sou sim. Como sabes o meu nome? - O meu nome é Timo, na verdade, e sou o teu filho.
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- Ó filho meu, que alegria! Ainda bem que te encontro. Quero pedir-te que não deixes que os teus sonhos possam interferir na tua vida e colocar a tua vida em perigo, arrastando-te a ti e a tua mãe a uma vida de sofrimento. - Eu sei, pai, tornei-me um sonhador incorrigível e também temo por minha mãe. Ainda hoje chora por ti. Como foi possível teres desaparecido assim da nossa vida? Como fui eu encontrar-te aqui a pilotar este avião? Porque não regressaste nunca a casa? A mãezinha todos os dias te espera!
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- Não posso regressar, meu filho. É uma longa história. - Então, conta-me para que eu a entenda. Além disso, a mãezinha precisa saber também o porquê do teu desaparecimento! - Sabes, filho? Eu já não pertenço ao mundo dos vivos. Há muito tempo que vivo no Além. A razão porque aqui vim, foi com o propósito de te salvar. Não ponderaste que colocaste a tua vida em risco? Não pensaste no sofrimento da tua mãe, meu rapaz? 44
- Estava tão ávido de concretizar os meus sonhos, de viajar, de conhecer o mundo, que nem me despedi dela. Apenas lhe deixei um pequeno bilhete de despedida.
- Ai, ai, meu filho, não devias ter feito isso. Temos que agilizar a nossa partida sem perder mais tempo. Vou deixar-te em casa. Mas vais-me prometer desde já que não voltas a entrar noutra aventura assim. - Ainda não me contaste o que te aconteceu! 45
- Fui apanhado numa ratoeira com queijo. Só Deus sabe quando sofri no momento em que me vi ali encarcerado. Mas nem quero lembrar isso. Antes, quero que me prometas que vais ganhar juízo. - Prometo, pai, vou tentar ser melhor e deixar de pensar em coisas sem sentido. Olha, estamos a chegar. Não fales à tua mãe do nosso tão irreal encontro, não ia acreditar. Além do mais, ia sofrer, certamente. Tenho que voltar, meu filho, deixa-me abraçar-te.
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- Vai, sim, querido paizinho, Amor do meu coração, Não estarei mais sozinho Levado na tua mão. Sonharei, mas um pouquinho, Sonhar faz parte da vida, Sou ainda pequenino, Preciso da mãe querida - Ama-a sempre em seu viver, Fá-la sentir teu amor E não a faças sofrer Com um novo dissabor
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E logo, o rato Sabujo colocou o menino à porta de casa e voou pelo imenso azul em direção ao Além. Num misto de tristeza pela partida e de felicidade por este encontro inesperado com o pai, Timo olhava o horizonte e seguia o rasto do pequenino avião de papel, até o ver desaparecer para sempre. Lançou os olhos para o alto e contemplou no lindo céu azul, agora repleto de avezinhas a esvoaçar. E olhou os campos dourados, como se foram raios de sol. Sorriu cheio de felicidade e entrou em casa, aonde os lençóis 48
do seu leito cheiravam a maresia e a madressilva. Ajoelhou-se a agradeceu a Deus pelo seu lar, por sua extremosa mãe. E logo se levantou e procurou a mãe.
- Mãezinha, que bom que te encontro. De novo. A mãe correu ao seu encontro e perguntou: - Oh, meu Deus!, És tu, Timo? Aonde andaste, meu filho? Receava ter-te perdido, como a teu pai. - Voltei, mãe, estou vivo! – disse sorrindo carinhosamente – Desculpa toda a minha leviandade. Nunca deveria ter partido desse modo. Prometo que a partir de 49
hoje vou ser mais obediente. Depois, vou contar-te o meu encontro inesperado com meu pai. A mãe ouvia o filho surpreendida e de olhos arregalados, sem poder suster as suas lágrimas.
- Terá sido um pesadelo, Descansa um pouco, querido. - Naveguei num barco belo E passei por grande perigo. 50
A vida faz-nos pensar Que há um tempo para tudo. - Nada nos vai separar, Vais ser sempre o meu miúdo. - Vamos sorrir e sonhar, Que o sonho comanda a vida E eu sempre te hei de amar, Minha mãezinha querida. Nosso pai está no céu Sempre por nós a velar, Sei, como filhinho seu, Quanto amor tem p’ra nos dar. Foi por um pouco de queijo Que tudo isso sofreu Mas agora é meu desejo Ter a mãe que Deus me deu.
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