19 minute read

Agricultura regenerativa

Next Article
Formação

Formação

AGRICULTURA REGENERATIVA “NA NATUREZA É TUDO UMA SINFONIA“

Advertisement

POR ANDRÉ ANTUNES Agricultor, Consultor Agrícola e Médico Veterinário chaoricolares@gmail.com instagram.com/chao.rico.colares

A DETERIORAÇÃO PROGRESSIVA DOS SOLOS E A CONSEQUENTE PERDA DE FERTILIDADE E RENDIMENTO, OBRIGARAM OS GESTORES DA SOCIEDADE AGRICOLA MUNDOS NUEVOS A PROCURAR OUTRAS FORMAS DE FAZER AGRICULTURA. DONOS, POR HERANÇA, DE UMA EXPLORAÇÃO AGRÍCOLA COM CERCA DE 600 HECTARES PERTO DE RETAMAL DE LLERENA, NA PROVÍNCIA ESTREMENHA DE BADAJOZ, OS IRMÃOS JUAN LUIS E PEDRO DOMINGUEZ CAMPA COMEÇARAM, HÁ CERCA DE 8 ANOS, A IMPLEMENTAR UMA SÉRIE DE MUDANÇAS, NA PROCURA DA ABORDAGEM ACERTADA PARA CONTRARIAR O PROCESSO DE DESERTIFICAÇÃO QUE ASSOLA ESTA ZONA, FRUTO DE MÁS PRÁTICAS AGRÍCOLAS ANCESTRAIS E PRECIPITAÇÕES ANUAIS MÉDIAS DE 200 A 250MM NOS ÚLTIMOS 4 ANOS.

Entrevista a Juan Luis Dominguez Campa e Pedro Dominguez Campa, donos e gestores Sociedade Agricola Mundos Nuevos.

Na altura da chegada da PAC, quando Juan Luis Campa (JLC) e Pedro Campa (PC) tomaram conta da exploração, que tinha estado 40 anos dedicada à produção cerealífera, foram convertendo mais solo à agricultura, inclusivamente as manchas cobertas por giestas. Durante os 10 primeiros anos, como conta PC, as produções foram satisfatórias: “Atribuímos isso às práticas agrícolas – uso de charrua, grade de discos, aplicação de herbicidas e fertilização inorgânica com base em análises regulares ao solo. Pensávamos que éramos bons profissionais mas, entretanto, as produtividades foram baixando.”

Do maneio dito convencional passaram então, em 2014, a integrar progressivamente, práticas regenerativas com base na produção de ovinos cruzados de Merino, como nos contou JL: “O uso correto do gado, a boa planificação do pastoreio são a chave da fertilidade do solo e esta, por sua vez, é a chave da vida, da produção, da sustentabilidade e da resiliência a longo prazo. De momento não vemos outra alternativa.”

A transição para as práticas regenerativas teve início com a identificação dos elos mais frágeis da cadeia, como explicou PC: “No nosso caso eram a falta de água e de pastagem. A partir daí, tentámos perceber o que fazer para aumentar as suas disponibilidades. Para aumentar a água no solo implica tê-lo coberto e não mobilizar. Assim também não perdemos o solo fértil por erosão. O primeiro passo foi deixar de lavrar com charrua e aplicar mobilização superficial apenas nas zonas mais planas. Outra medida foi determinar a topografia do terreno e subsolar seguindo as linhas determinadas pela metodologia key-line. Quanto ao pastoreio, aumentámos o número de parques, tanto os provisórios elétricos como os fixos."

André Antunes (AA): Que obstáculos encontraram na implementação dessas medidas?

PC: No início, quando aplicámos o keyline “puro” em 20 ha demo-nos conta de que os parques ficavam demasiadamente estreitos e longos para se adaptarem à topografia. As ovelhas não se sentiam cómodas, para além de esse desenho implicar a construção de imensos caminhos para aceder a todos os parques. Tivemos que chegar a um compromisso entre o mais hidrologicamente aceitável, o mais económico possível e o mais prático para os animais e a logística.

AA: Que diferenças veem desde que adotaram este modo de gestão do pastoreio?

PC: A distribuição homogénea do esterco é evidente. Dantes não o era. Agora produzimos mais erva. Com o solo coberto, a pouca humidade que existe no ambiente aproveita-se mais. O orvalho aguenta-se mais tempo do que antes – é fácil de observar. Em relação ao solo é cedo para ver. Acreditamos que o solo ainda não está bem estruturado. O risco de compactação, mesmo através do pisoteio animal, especialmente quando chove, é alto. Ainda não tem suficiente matéria orgânica.

"Neste momento, como mudámos a abordagem para pastoreio, a giesta traz-nos um extrato produtivo a mais. A semente é rica em proteína que aparece na altura em que é mais necessária, no final do verão, e as folhas podem ser comidas."

AA: Como conseguem incorporar a Gestão Holística na planificação de atividades e na tomada de decisões?

PC: No que diz respeito ao pastoreio, planificamos a curto prazo (2 semanas), e anotamos tudo o que podemos em relação a cada parque: quantas ovelhas entram, a data, o tempo de permanência, o tempo de descanso da parcela. Não fazemos tanto a planificação a longo prazo porque as condições variam muito.

AA: Fazem atualmente algum tipo de sementeira de modo convencional para forragem?

PC: De momento, absolutamente nada. O esforço não compensa. Não produz mais do que apenas com a gestão do pastoreio. O solo capacita a germinação das sementes que estão naturalmente no banco natural. Assim, prosperam em cada momento as espécies que mais capacidades têm. Se semearmos, estamos a perturbar este equilíbrio.

AA: A experiência de misturar algumas sementes no distribuidor de tacos de ração para as ovelhas deu resultado?

PC: Sim, em algumas parcelas onde havia menos cobertura vegetal usámos algumas sementes nativas recolhidas por nós com uma ceifeira. Ao colocá-las no distribuidor juntamente com a ração, as ovelhas, ao comer, acabam por enterra-las com as patas. Notámos que essas zonas melhoraram, não sabemos ainda se pelas sementes que adicionámos ou apenas pelo impacto animal. Apercebemo-nos que em algumas zonas onde não pusemos sementes também se instalou um prado biodiverso apenas pelo impacto animal.

AA: Fazem colheita e conservação das pastagens naturais?

PC: Sim, em anos em que há excedente de pastagens ricas e biodiversas, fazemos feno. Quando o tempo está mais húmido e não há tempo de secar, fazemos fenossilagem.

AA: Em relação à vegetação arbustiva predominante, têm duas situações completamente distintas: a esteva (Cistus ladanifera) que traz dificuldades e a giesta (Retama sphaerocarpa) que se apresenta como uma solução.

PC: Numa das nossa quintas, que não possuí árvores, havia antigamente muitas giestas. Para a produção cerealífera eram um problema porque estorvavam a maquinaria pesada. Neste momento, como mudámos a abordagem para pastoreio, a giesta traz-nos um extrato produtivo a mais. A semente é rica em proteína que aparece na altura em que é mais necessária, no final do verão, e as folhas podem ser comidas. É um recurso nutricional de alta qualidade. Para além disso, as giestas são uma proteção contra o vento, sol e geadas e mantêm o orvalho por mais tempo. Por baixo das giestas a erva é mais alta e mais verde. Providenciam sombra para os animais e abrigo e alimentação para a fauna auxiliar e abelhas. Também têm uma raiz pivotante que recicla água e nutrientes e, como leguminosas, fixam o azoto atmosférico.

A esteva, como não tem tantas utilidades, tentamos controlá-la.

AA: Fazem uma aplicação composta de biofertilização e mineralização com pó de rocha, carvão vegetal e estrume. Como funciona?

PC: Misturamos o estrume de limpeza dos estábulos das ovelhas com carvão vegetal e pó de pedra de pedreiras locais. Inoculamos esta mistura com microrganismos locais para ajudar a decompô-la. Aplicamos uma vez por ano em zonas onde achamos mais necessário.

AA: Diz-se que as árvores necessitam ser visitadas. O que pensam sobre isto?

JLC: Os animais são um elemento fundamental dos sistemas e os ruminantes ainda mais. Estabelece-se um diálogo entre a microbiologia do solo e do ruminante. As árvores não se deslocam e, se pensarmos que produzem muito mais frutos do que é necessário para a sua reprodução, facilmente chegamos à conclusão que isso é um modo de atrair os animais para o seu perímetro. Estes oferecem fertilização, distribuição de sementes, controlo de doenças... enfim é uma simbiose que devemos compreender e saber tirar proveito e que o sistema convencional vai destruindo. É cada vez mais raro encontrar pecuária e agricultura combinadas, como era costume no passado, porque parece que se atrapalham uma à outra. Na realidade, na Natureza é tudo uma sinfonia e é muito mais barato dar-lhe a mão do que lutar contra ela. Os pastos melhoram com o impacto animal planeado e as árvores também beneficiam dessa relação. Solos mais cobertos representam estimulação da microbiologia subterrânea e isto fortalece todo o sistema.

AA: Inclusivamente, as ovelhas podem interromper os ciclos de alguns parasitas das árvores...

PC: Sim – Como é o caso de um escaravelho parasita da azinheira, Curculio elephas, que põe os ovos nas bolotas em julho. A partir de setembro, a larva desenvolve-se dentro do fruto. Quando passam os animais, as bolotas que estão afetadas e caíram são comidas pelas ovelhas, interrompendo-se assim o ciclo completamente.

AA: No que respeita ao maneio reprodutivo, qual a raça que utilizam, quais as características e como é feita a planificação dos partos?

PC: A raça que usamos é do tipo Merino – a mais usada por cá. É muito rústica e está adaptada às condições climáticas da zona, parasitas, etc. Temos 1200 a 1300 reprodutoras, divididas em 2 lotes iguais. Num ano, um dos lotes pare 2 vezes e o outro 1 vez. No ano seguinte, inverte-se. Temos uma parição de meados de janeiro a meados de fevereiro, outra de meados de junho a meados de julho, e uma outra de meados de setembro a meados de outubro. Em média conseguimos desmamar 1,2 borregos por ano, dependendo da ação de predadores, doenças, etc. Na parição de janeiro/fevereiro vendemos os animais diretamente do campo, ainda a beber leite. Não se desmamam. Quando têm ± 23kg, aquilo que o mercado nos pede aqui, vamo-los vendendo. Nas outras duas parições desmamamos os animais com cerca de 45 dias e põem-se a ração e palha. Acabam também por vender-se com 23kg.

AA: Fazem algum tipo de melhoramento genético ou refugo controlado?

PC: Trazemos carneiros Merino que demonstraram ser de boa genética, de outras explorações, introduzindo assim bons sementais. Este ano estamos a começar a escolher as borregas da parição de primavera cujas mães melhor

k-line Charca Charca

se adaptaram no ano transato à não suplementação para futuras reprodutoras, favorecendo assim fenótipos mais rústicos dentro do rebanho.

AA: O objetivo de fazer um pastoreio não seletivo, com elevado efeito de manada, por vezes complica a gestão da condição corporal dos animais tão importante em épocas-chave como a prenhez, parto e lactação. Como gerem o aporte de energia, proteína e matéria seca?

JLC: Há que encontrar o meio termo entre a condição corporal dos animais e o benefício que proporcionam como ferramenta de melhoramento do solo. Há muita teoria de como se deve deixar o pasto após o pastoreio – 10 cm de altura, 20 cm... é relativo, depende da época de crescimento da erva e também da condição corporal dos animais. Os animais, ao serem obrigados a um pastoreio total, acabam por quebrar a condição corporal. O equilíbrio é a chave. No caso dos ovinos, e com muitos partos, o ciclo natural (que é de um parto por ano na Primavera) permite maior descanso aos animais. Por outro lado, como existe mais erva nessa altura, torna tudo mais fácil, mas a realidade do mercado não nos permite tal luxo.

AA: Portanto, há que dar suplementação quando necessário.

JLC: Temos que escolher. Se quisermos fazer o pastoreio ideal na altura seca temos que suplementar, senão os animais vão sofrer.

AA: Passando para a área da veterinária e saúde animal, como organizam as vacinações e desparasitações?

PC: Há já 12 anos que não usamos vacinações. Temos cuidado no maneio para que as variações não sejam muito bruscas para que os animais se vão adaptando às novas condições. Verificamos que isso é mais eficaz que vacinar. Antes tínhamos mais problemas, mesmo vacinando, sempre que não cuidávamos do maneio. Desparasitamos uma vez por ano com closantel, no verão, porque temos um problema importante com Oestrus ovis. Não usamos ivermectinas porque sabemos que têm um efeito destruidor nos insetos que incorporam o estrume e nas minhocas. Um solo que não está vivo irá produzir pouco pasto. Para problemas de ectoparasitas, como as bicheiras, fazemos aplicações tópicas de inseticidas.

AA: Em relação à gestão da biodiversidade, qual a sua importância para a produção?

PC: O valor da biodiversidade na exploração é incalculável. Por exemplo, o facto de existirem mais umas centenas de minhocas por m2 aumenta exponencialmente a capacidade de produzir solo e, logo, pasto. O mesmo se aplica para formigas, escaravelhos da bosta ou insetos polinizadores.

AA: Ou seja, em agricultura regenerativa devemos atuar primariamente ao nível da fauna do solo e apenas depois dos animais superiores e das plantas.

PC: Sim, o trabalho que esses seres fazem, em quantidade e qualidade, é difícil de quantificar. Não conseguimos imaginar a capacidade produtiva de um solo vivo.

AA: Passemos à parte financeira. Quais são as vossas principais fontes de rendimento e o papel da pecuária regenerativa?

PC: Substituímos toda a agricultura de sementeira anual por pecuária. Continuamos a ter rendimentos das ajudas e subsídios da PAC. Depois temos, como é óbvio, o rendimento da venda

Nas herdades foram instaladas 75 caixas de biodiversidade que funcionam como um complexo de ninhos para diferentes espécies. Têm proteção contra predadores, como formigas e roedores e contra as condições climatéricas. Têm também um compartimento para morcegos com capacidade para 50-60 morcegos e outro para insetos da fauna auxiliar – vespas parasíticas por exemplo. Estas caixas são um excelente investimento no capital biológico.

dos borregos. Desde que passámos para a pecuária regenerativa tivemos uma quebra de produção de ± 30% por ovelha/ ano mas, simultaneamente, uma forte redução dos custos de produção. Esta redução depende muito do que chove em cada ano. Em média, nos últimos anos poupámos cerca de 40-50% em fatores de produção.

AA: Qual o ganho médio diário de peso por animal (GMD)?

PC: Nas condições ideais, 250g por dia. Aumenta quando chegam aos 45-50 dias.

AA: Quais são as principais despesas na vossa exploração? PC: Sobretudo mão-de-obra e alimentação externa dos animais.

AA: Consideram que recebem o preço justo pelos borregos?

JLC: Neste momento o preço está favorável porque, desde o incidente do covid-19, abriu-se um canal de comercialização com países árabes a partir do porto de Cartagena, em Espanha. O preço não está nada mal – ronda os €78 por animal. Não sei se é justo mas em relação a outros anos não nos podemos queixar. Contudo, o mercado não favorece estes animais de qualidade premium, até os penaliza porque como vêm diretos do campo sofrem um grande stress no barco pela mudança brusca de alimentação.

AA: Fazem também comercialização direta?

JLC: Estamos a tentar mas, curiosamente, em Espanha, que deve ser o primeiro produtor europeu de borrego, não existe a tradição de comer esta carne fora das épocas festivas do Natal e Páscoa. O mercado não pede e, por outro lado, a carne convencional apresenta uma competição muito forte a nível de preços. Se conseguíssemos abrir mercados em restaurantes e talhos onde o consumidor começasse a encomendar esta carne de erva, isso funcionaria. É exemplo disso o movimento que nos chegou através dos Estados Unidos da carne 100% de pasto. Já temos uma associação de produtores em Espanha chamada deYerba – La Carne de Pasto, da qual somos sócios fundadores. O caminho é por aí mas vai ainda muito devagar.

AA: Como corre a vossa página de vendas on-line?

JLC: Começámos recentemente mas vai andando bem. Principalmente, comercializamos os produtos dos nossos porcos ibéricos de montanheira, tanto carne fresca como charcutaria e alguma carne fresca de borrego. Aqui ganhamos a margem do revendedor e isso pode merecer a pena mas exige muito trabalho de processamento, marketing e vendas que nós subcontratamos a especialistas. Seguimos o nosso estilo e vamos criando uma carteira de clientes fiéis que cresce desde do início em 2017.

AA: Comercializam a lã?

JLC: A lã não é um produto rentável, há anos em que não chega a pagar a tosquia.

AA: Apostaram desde cedo numa componente pedagógica na vossa exploração – tiveram visitas de ilustres nomes do mundo da Agricultura Regenerativa como Allan Savory, Joel Salatin, Jairo Restrepo. Qual a importância para vós deste facto?

JLC: Foi muito importante. Para nós, que estávamos a começar a ver este mundo, foi muito inspirador ter, por exemplo, o Joel Salatin que já leva quase 40 anos de caminho feito partindo de uma exploração tão degradada que nem sequer conseguia

espetar os postes no chão. Prende-te muito o entusiasmo destas pessoas, a sua maneira de ver o mundo. A visita de Allan Savory ao Mundos Nuevos foi um orgulho imenso para nós, foi incrível!

AA: Mundos Nuevos é uma quinta demonstrativa do aleJAB, o hub ibérico do Savory Institute.

JLC: Sim, criou-se esse satélite do Savory Institute na Península Ibérica dos quais também somos sócios fundadores. Temos gente que vem aqui fazer monitorização de parâmetros. É uma forma de estarmos ligados a uma rede que permite não estarmos isolados. É uma espécie de comunidade de produtores que usam as mesmas práticas.

AA: Analisando casos de sucesso de transição para a agricultura regenerativa por esse mundo fora, verificamos que em muitos casos esta transição foi feita em desespero de causa por produtores que estavam sem nenhum outro tipo de alternativas, quer seja pela queda das ajudas estatais à agricultura quer por mudanças drásticas nas condições de mercado ou devido às alterações climáticas. É possível fazer uma transição profilática consciente antes de se estar "com a corda ao pescoço"?

JLC: As mudanças são sempre difíceis e complexas. Levam-te a sair da zona de conforto – ainda que esta não seja nada de especial, mas é o que tu conheces, o trabalho que tens feito e mudar não é fácil se não houver uma razão. O normal é que seja a necessidade – por exemplo financeira — que leva à mudança. O ideal seria que as pessoas se dessem conta, antes da catástrofe, de que estão a perder solo fértil, mas isso não é nada fácil.

AA: Em Espanha existem já algumas associações de apoio à Agricultura Regenerativa como a Associación Iberica de Agricultura Regenerativa, a aleJAB, a Actyva S. Coop, etc... Sentem o apoio necessário às vossas práticas?

JLC: É impressionante o que essas associações conseguem fazer com os poucos meios de que dispõem. São ainda de pequena escala. Vejo que agora com a ajuda europeia de, por exemplo, os projetos LIFE cria-se possibilidade de ter orçamento. Toda a ajuda é importante.

AA: A Agricultura é mais excitante agora para vós. Estão mais apaixonados pelo que fazem?

JC: Muito mais! Agora estamos na Dança da Vida, estamos a compartilhar território com muitos mais habitantes não humanos da nossa zona e isso é muito estimulante. Ir pisando o solo e ver quem habita nele, e o que pode estar a fazer sem pedir nada em troca. Nos últimos 6 anos percorri mais terreno a pé na minha exploração do que no resto da minha vida. O ar livre, o contacto com o solo – sentir se está mais duro ou mais húmido, mais quente ou mais frio. Isso no tractor, com o ar condicionado e o rádio ligados, janelas fechadas é impossível de perceber – estás totalmente desligado. Assim é muito mais estimulante – sentes-te parte do sistema – do ambiente. É muito bonito!

AA: Se quando começaram soubessem o que sabem agora, o que fariam diferente?

PC: Teríamos tido mais cuidado com alguns passos mais precipitados que demos, levados pelo entusiasmo quando descobrimos tudo isto. Por exemplo, em relação ao que falámos sobre o equilíbrio entre a condição corporal dos animais, o tipo de pastoreio e o solo; algumas vezes o rebanho foi-se um pouco abaixo e tivemos diminuição dos partos. Acho que faríamos as mudanças mais devagar, testaríamos em pequena escala e iríamos pouco a pouco. Mas as coisas são assim mesmo, há uma curva de aprendizagem para cada um.

AA: E o que fariam igual?

PC: Igual, claramente, a abordagem ao tema da importância da água e de ter o solo coberto. Isso continua a ser prioritário na nossa opinião.

JLC: A mudança para esta abordagem, que passa de uma estratégia de fertilização para uma que funciona a energia solar, independentemente dos erros que por vezes se possam cometer. Isso é normal, é a aprendizagem. Aumentar a biodiversidade e melhorar o solo são objetivos inquestionáveis.

AA: Para terminar, digam-nos algo que desejariam que todos os produtores de gado soubessem mas que não é do conhecimento geral.

PC: Não sei até que ponto estamos conscientes da deterioração dos nossos solos em geral e das implicações catastróficas desse facto a nível mundial. A rotina da agricultura convencional dificulta esta tomada de consciência.

JLC: Quando estamos muito perto das coisas, às vezes perdemos a perpectiva. Mesmo quando olhamos todos os dias para elas. Como quando lavras com o tractor e vêm todos os pássaros a comer a bicharada que está no solo. O modelo atual da agricultura convencional, que separa a parte vegetal, dependente de imensos aportes externos da animal, acaba a produzir resíduos e a poluir, leva à dissociação. Os resíduos de uns são a comida de outros – não se pode dissociar. Na Natureza há imensa riqueza e optimização de recursos e sinergias várias. O modelo vigente atual não pode durar muito tempo tanto pelos gastos energéticos como pela criação de desperdício.

PC: Gostaria de complementar dizendo que o sistema agrícola industrial, que parece que é muito eficaz, que produz muito, que dá de comer a muita gente tem gastos ocultos enormes que não se consideram, nomeadamente a contaminação de aquíferos e a extinção de muitos seres vivos, e que não se refletem no preço dos produtos. Envenenamo-nos constantemente pela água, ar e comida. Isso é difícil de quantificar e está vinculado a este modo de produzir. É uma questão a que se presta pouca atenção, mas para mim é uma verdade suprema!

Nuno Marques (NM): Desde que mudaram para o sistema regenerativo, se as vossas ovelhas falassem o que diriam?

PC: Acho que estão mais felizes: passam mais tempo no campo fazendo o que lhes dá mais prazer que é pastar. Antes havia muitos comedouros e muita competição pela comida. Agora, muito menos – acho que este sistema está mais de acordo com a sua natureza apesar de ainda termos de suplementar alguma coisa. Acho que nos agradeceriam!

JLC: Poderá haver uma ou outra ovelha, dependendo da genética, que está habituada ao comedouro, aos estábulos e não gosta de sair para o campo. As raças industriais de engorda passam muito mal quando são introduzidas ao campo. Mas a ovelha Merina, a raça de referência desta zona acho que nos agradece.

LINKS DE INTERESSE Mundos Nuevos https://mundosnuevos.es AleJAB http://www.manejoholistico.net Actyva S. Coop http://www.cooperactyva.org

Agricultura Regenerativa Ibérica

https://www.agriculturaregenerativa.es De Yerba https://www.lacarnedepasto.com

DE QUEM É A MELHOR FORRAGEM?

CONHEÇA OS VENCEDORES DAS 3 CATEGORIAS NA PRÓXIMA EDIÇÃO DA REVISTA RUMINANTES

* Ver Regulamento CNF em www.revista-ruminantes.com

This article is from: