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A reabertura gradual

Esse importante estudo prospectivo foi uma iniciativa que – inédita à época – acabou se tornando fundamental ao permitir antever o que aconteceria nos meses futuros. O material foi apresentado em reuniões entre o Sebrae-SP e várias instituições, entidades de classe e lideranças de diferentes setores. Em um primeiro momento, muitos desses interlocutores não acreditavam que todas essas projeções pudessem se tornar realidade. Entretanto, uma vez alertadas, as lideranças puderam antecipar sua visão e buscar soluções para prevenir problemas futuros.

De fato, o estudo apresentou sugestões de governança, como medidas a serem adotadas no curto, médio e longo prazo nos processos empresariais – entre as quais o trabalho do Sebrae-SP ao lado de órgãos públicos, entidades de classe e setor privado para a formação de uma força-tarefa, visando à proteção das empresas. Sobressai nessa lista o alinhamento da entidade em São Paulo com o Sebrae Nacional e o Sistema S para a formação da Aliança Nacional para a Sobrevivência Empresarial, além de ações como a formação de comitês nacional e estaduais que atuariam em sintonia com federações, confederações e associações, bancos, fintechs, empresas e governos. A hora era de agir para garantir a sobrevida dos empreendimentos. O quadro se apresentava realmente preocupante, mas não paralisante. Ao contrário, foi o que estimulou a direção do Sebrae-SP a pisar mais fundo no acelerador e entregar soluções que de fato fizessem a diferença.

A reabertura gradual

Em 22 de abril, o governo paulista anunciou o plano de reabertura de estabelecimentos no estado, programada para 11 de maio, no que seria o fim oficial da quarentena decretada em março. O retorno das atividades deveria ser feito de modo heterogêneo, com base no cenário e nos índices locais de cada região durante a pandemia.

Desse modo, os municípios foram segmentados por níveis de risco, para facilitar o monitoramento da evolução da pandemia em cada região. Além disso, seriam levados em conta o número de leitos disponíveis nas cidades e a implantação de protocolos gerais e específicos em cada ambiente de trabalho. Até aquele momento, dados da Secretaria Estadual de Saúde indicavam que o estado de São Paulo contava 15.385 casos confirmados de covid-19. O número de mortes chegara a 1.039, com acréscimo de 5% nas últimas 24 horas.

As medidas anunciadas foram bem-vindas, mas ainda eram tímidas ante o cenário de tragédia que se avizinhava cada momento mais rápido. Para ficar apenas nos temas preocupantes para o empresariado, o volume de crédito liberado pelos governos estadual e federal se mostrava insuficiente. Projetava-se que seria necessária a injeção de R$ 80 bilhões mensais para a amortização das contas das micro e pequenas empresas, considerando que cada uma delas precisaria, em um cálculo estimado, de R$ 40 mil mensais para continuar em operação. Isso sem falar na demora em disponibilizar os recursos, na burocracia e na lentidão na liberação

Capítulo 2

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e nas informações desencontradas. Ainda não estava claro como seriam tratadas a questão dos impostos e a redução de 50% nos salários para manter os segmentos considerados não essenciais, que, portanto, não poderiam voltar a funcionar.

Tendo em vista esse quadro, o Sebrae-SP deu início ao que foi previamente divulgado em seu estudo de cenários. A entidade passou a realizar uma série de encontros, reuniões e debates com lideranças públicas e privadas e com empresários de diferentes segmentos essenciais e não essenciais. O objetivo foi o de obter consenso para uma proposta de medidas emergenciais, concentradas nos quatro problemas que mais preocupavam os empreendedores: pagamento de aluguel, manutenção de pessoal, aquisição de matéria-prima e pagamento de impostos e empréstimos bancários.

No âmbito tributário, foram sugeridas à época, e em parte acatadas, medidas como a postergação por seis meses da incidência de todos os impostos (federais, estaduais e municipais), o parcelamento do saldo devedor em 36 meses e a implementação de um novo e adequado sistema, via reforma tributária, que vinha sendo postergado durante décadas. Quanto ao financiamento, a sugestão foi a de facilitar ao máximo o acesso às linhas de crédito emergenciais e incrementar ações de orientação para a negociação positiva de dívidas. Para manter o nível de emprego, deveriam ser flexibilizadas ao máximo as relações trabalhistas no período da crise, com autorização de livre negociação salarial, além da liberação do empregador dos encargos de pagamento de férias, 13º salário e outros direitos, da disponibilização, por meio digital, de modelos de contratos aditivos à CLT e da articulação com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para reformular os processos trabalhistas. Também foi proposta a realização de uma nova rodada para ajustes da legislação relativa às relações de trabalho.

No que diz respeito ao aluguel, o Sebrae-SP sugeriu que se ampliassem a divulgação e a orientação a respeito da negociação e do acesso a linhas de crédito específicas, bem como fossem discutidas com a OAB possíveis mudanças nos processos judiciais de despejo e cobrança. Também surgiu a ideia da criação de uma campanha que conscientizasse os locadores da conveniência de redução do valor do aluguel. Para minorar os efeitos da crise na aquisição de matéria-prima, foram feitas essas propostas: facilitar o acesso a financiamentos emergenciais, sensibilizar fornecedores a postergar o prazo das dívidas, reforçar a orientação para a negociação e subsidiar segmentos industriais com alto poder de geração de empregos.

Relembrando a máxima que diz que “não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”, o recado dado aos empresários pelo Sebrae-SP era o mais simples: que todos façam sua “lição de casa”. A única saída seria construir novos caminhos e aplicar as melhores práticas, numa verdadeira aliança pela sobrevivência dos negócios de pequeno porte. A saída para superar os imensos desafios que se apresentavam estava na real

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oportunidade de garantir que as empresas reorganizassem suas operações, fortalecessem suas estruturas e pusessem em prática aquilo que fazem com relevância: gerar trabalho e renda.

Foi o que aconteceu com centenas de milhares de empreendedores atendidos pelo Sebrae-SP. Como as irmãs Márcia, Maria Ângela e Rosa Abbud, da Art Esfiha, restaurante libanês localizado na capital paulista. Elas começaram vendendo esfirras de carne e quibes sob encomenda e agora têm um lugar aconchegante no bairro do Paraíso. A pandemia as acertou em cheio, como a maioria dos estabelecimentos tradicionais de alimentação fora do lar. Mal sabiam que um almoço no salão vazio, para dois especialistas do Sebrae-SP, seria o ponto de virada da empresa. Após uma longa conversa, ali mesmo na mesa do almoço, receberam um diagnóstico do Sebrae-SP e sugestões de ações de curtíssimo prazo. Em menos de 90 dias, a situação era outra, segundo Márcia: “Seguimos as dicas e estamos trabalhando muito, atendendo pedido via WhatsApp e com delivery até de domingo”. Na estratégia proposta estavam renegociação de contratos, ajuste de custos e entrada no mundo das vendas online e do delivery, além de utilizar as redes sociais como ferramenta digital de negócios.

Este é o checklist que as irmãs da Art Esfiha e outras centenas de milhares de empreendedores receberam dos especialistas da entidade, por meio do “kit de enfrentamento”, e que mudou os rumos dos negócios:

1 - Certifique-se de que a saúde financeira da sua empresa está ok. Proteja seu caixa, ajustando custos fixos e variáveis. Renegocie compromissos com fornecedores, parceiros, prestadores de serviços; redimensione, se necessário, o número de colaboradores; racionalize o estoque.

2 - Crédito orientado: existem diversas linhas de financiamento acessíveis. Entretanto, só contrate crédito após analisar os custos da empresa.

3 - Inicie ou reforce sua presença online: invista em mídias digitais, com perfil nas redes sociais e em marketplaces. O Sebrae-SP concentra na plataforma compredopequeno.sebraesp.com.br diferentes iniciativas de diversos parceiros. Para divulgar, marque presença nas redes, dê dicas, relacione-se com seu público e conheça suas dores e desejos (quem sabe surja daí um produto ou serviço inovador).

4 - Garanta as medidas de segurança de seus colaboradores e de seus produtos/ serviços e comunique claramente aos seus clientes.

5 - Atue em cooperação, expanda sua rede.

6 - Aprimore seus conhecimentos em gestão e no aperfeiçoamento de suas técnicas.

O impossível gerando o extraordinário. Um relato da atuação do Sebrae-SP na pandemia de covid-19

Em 10 de junho de 2020, depois de passar mais de 80 dias fechados, o comércio de rua e o setor imobiliário na cidade de São Paulo foram autorizados a reabrir. A retomada das atividades econômicas fazia parte do plano de flexibilização já anunciado pelo governo do Estado e pela prefeitura da Capital, na Fase 2 – Laranja da pandemia. Ainda havia restrições, como o funcionamento limitado a quatro horas diárias (entre 11 e 15 horas) e a adoção dos protocolos de higiene recomendados pelas autoridades de saúde, para evitar o risco de contágio e propagação do vírus, como o uso de máscaras por clientes e funcionários e a oferta de álcool em gel (70º) nos estabelecimentos.

Os shopping centers reabriram no dia seguinte, 11 de junho, com duas opções de funcionamento: das 6 às 10 horas ou das 16 às 20 horas, com público limitado a 20% da média habitual. O protocolo também determinou que os estabelecimentos permitissem que os funcionários com filhos pequenos fossem mantidos em trabalho remoto.

Uma das medidas do governo federal para proteger os direitos dos trabalhadores e dos empregadores nesse período foi a Lei n° 14.020, de 6 de julho de 2020, que criou o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. A proposta era criar um auxílio do governo aos trabalhadores, o que faria com que houvesse também uma redução de despesas quando o funcionário tivesse a jornada de trabalho e o salário reduzidos, e/ou a suspensão de contratos. A norma também tratou das regras do benefício emergencial que é pago aos trabalhadores de empresas em que o proprietário optou por fazer parte do programa. O benefício se baseia em dois tópicos: redução da jornada de trabalho, associada à redução do salário de acordo com o tempo reduzido, e permissão para suspender os contratos.

Para os pequenos negócios, a melhor notícia veio antes, com a criação do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe), por meio da Lei nº 13.999, de 18 de maio de 2020. Criado para auxiliar as pequenas e médias empresas atingidas pela pandemia, o Pronampe passou a fornecer empréstimos com juros reduzidos, subvencionados pelo Fundo Garantidor de Operações (FGO). No ano em que foi lançado, cerca de 500 mil empreendedores foram beneficiados pelo Pronampe, com mais de R$ 37 bilhões em empréstimos.

Além disso, desde o mês de abril, o governo federal passara a disponibilizar o auxílio emergencial, instituído para atenuar o impacto econômico da pandemia ao garantir renda mínima aos brasileiros mais vulneráveis. De acordo com as regras do programa, seriam repassados cerca de R$ 359 bilhões em nove parcelas pagas em 2020 e as demais até outubro do ano seguinte, medida que veio em ótima hora.

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