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HONG-SANG SOO
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HONG-SANG SOO
APRESENTAÇÃO
Esta é a primeira mostra especial dentro do CineSesc dedicada a um diretor contemporâneo, vivo e em plena atividade. O ritmo de produção de Hong Sang-soo vem impressionando a crítica especializada, de um lado por sua abundância, e de outro por sua qualidade e pela marca inconfundível de sua autoralidade. Na última década, os filmes desse coreano começaram a chegar ao Brasil, despertando admiradores, descontentes e até mesmo alguns desinteressados em relação à sua obra. Mais de dez de seus filmes nunca aportaram por aqui, mas felizmente, suas mais recentes obras vêm sendo exibidas e distribuídas em nossos cinemas. O forte das tramas de Hong Sang-soo é a abordagem do cotidiano de seus personagens. Na maioria das vezes, eles se confundem com o próprio cinema, em um exercício metalinguístico fascinante e permanente em sua obra. Suas produções ora são realizadas na Coreia do Sul, ora em países da Europa, em especial na França. Cinema, vida, celebração, foco em pontos de vista diferentes, imprevisibilidade, incongruências do amor e relações entre verdade e mentira são temas recorrentes em seus filmes, que apesar de possuírem uma superfície aparentemente fácil, guardam reflexões profundas sobre a difícil tarefa de viver neste mundo cada vez mais mediado pela tecnologia e sobre as amplas camadas de sentido que suas obras nos permitem perscrutar.
Em um filme de Hong Sang-soo, tudo que nos é mostrado na tela parece trivial e banal, beirando mesmo ao casual. Só que não. Sua proposta estética é sempre muito trabalhada para que tudo apenas aparente ser de uma simplicidade que beira o sem-graça. Uma de suas especialidades são as cenas sempre repletas de diálogos deliciosos e intrigantes, quase sempre filmados em planos-sequências muito bem estruturados, com uso de aproximações ditadas por diversos e invasivos movimentos em zoom, que além de mudarem enquadramentos, com aproximações de imagens antes mais distanciadas, provocam ainda uma quebra na narrativa, pois nos lembram sistematicamente que estamos assistindo a um filme. Tendo como ponto de partida um olhar sobre o cotidiano e a intimidade de seus personagens, o diretor reafirma seu traço inconformista em relação ao modo como estabelecemos nossos laços afetivos na contemporaneidade, o que faz dele um artista cultuado por muitos e torna seus trabalhos obrigatórios para os cinéfilos do século 21. Na carreira de Hong Sang-soo, a metalinguagem em seus filmes se tornou mais evidente ainda depois de 2015, quando filmou Certo agora, errado antes e conheceu a atriz Kim Min-hee, com quem se envolveu amorosamente e que se tornou sua musa e sua protagonista nas obras subsequentes. O filme Na praia à noite sozinha aborda a relação entre um diretor de cinema e sua atriz, e o imbricamento entre vida pessoal e vida profissional invade de vez sua carreira, ganhando manchetes em jornais e holofotes em prestigiados festivais de cinema. Só no ano de 2017 Sang-soo realizou três filmes, uma proeza realmente incontestável. Essa produção tão caudalosa e profícua nos chamou a atenção para um curioso detalhe: o quanto sua obra adquire um sentido único quando analisada em seu conjunto, com a descoberta de seus temas mais recorrentes e estilos muito próprios de filmar. Analisar um filme seu isoladamente costuma resultar em uma visão apressada e superficial.
HAHAHA
ORIGEM: COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2010 DURAÇÃO: 116 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SOO ELENCO: KIM SANG-KYUNG, SORI MOON, YU JUNSANG
SINOPSE O diretor de cinema Jo Moon-Kyeong faz uma viagem para uma pequena cidade costeira de Tongyeong, na Coreia do Sul. Lá ele encontra um amigo, o crítico de cinema Jong-sik Bang, e os dois se sentam para conversar e tomar algo. Durante a conversa, eles falam sobre uma viagem que fizeram para o mesmo lugar e acabam por descobrir que conheceram as mesmas pessoas: um poeta e guia cultural e uma encantadora mulher.
BREVE REFLEXÃO O filme, que data de 2010, embora não seja seu primeiro trabalho, foi o primeiro de Sang-soo a ser exibido no Brasil. Já se notam nesse filme certas características de seu estilo, mas também alguns afastamentos, em comparação com os mais recentes. Estamos aqui falando de menos de dez anos na trajetória de um diretor que desanda a fazer novos filmes. Em Hahaha, tudo acontece a partir de uma conversa de bar entre dois amigos. Os dois narram encontros e desencontros da vida deles. Nada de surpreendente, tratando-se de um filme de Sang-soo: afinal, o espaço bar ocupa realmente um destaque em sua filmografia. O interessante é que, no caso de Hahaha, esse encontro nos é mostrado por meio de fotos em preto e branco, enquanto ouvimos o áudio da conversa entre eles. Esse áudio, antes de tudo, é o que impulsiona a própria narrativa do filme. Eles vão enumerando de forma fragmentada os seus “causos” amorosos, flertes e relacionamentos, e assim o filme se constrói por histórias cujas narrativas aparentemente são desconexas e que, aos poucos, vão se amarrando e dialogando entre si. As conversas de bar, entretanto, não se restringem a cenas estáticas, já que nos filmes de Sang-soo as conversas entremeadas de bebidas alcóolicas são fartas e sistemáticas, assim como o uso do zoom ótico, que de dentro da cena modifica o enquadramento do plano inicial.
Deve ser mencionado que as grandes personagens do filme são as femininas. Elas são empoderadas, decididas, enquanto os homens são indecisos e infantis. Todas estão no mercado de trabalho, enquanto os homens estão perdidos ou são “poetas”, “cineastas” e “professores”. As aspas estão aqui colocadas porque nada se vê neles que possa reafirmar essas carreiras. Quando o poeta é chamado para recitar uma poesia, ele se esquiva e vai tocar um piano de qualidade bem questionável. Hahaha pode não ser um Sang-soo dos melhores, todavia traz muitas de suas marcas e provocações narrativas que são importantes para melhor compreensão da sua obra.
A CÂMERA DE CLAIRE
ORIGEM: FRANÇA | INGLATERRA | COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2017 DURAÇÃO: 69 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SOO ELENCO: ISABELLE HUPPERT, KIM MIN-HEE
SINOPSE Numa viagem de trabalho ao Festival de Cannes, Jeon Manhee (Kim Min-hee) é demitida por sua chefe, que não revela o real motivo da demissão. Ao mesmo tempo, Claire (Isabelle Huppert), uma professora que sonha em trabalhar como poeta, sai pelas ruas tirando fotos em sua câmera Polaroid. Essas duas mulheres se conhecem e tornam-se amigas. Por acaso, as imagens de Claire ajudam Jeon a compreender melhor o momento pelo qual está passando.
BREVE REFLEXÃO Em A câmera de Claire, Hong Sang-soo aborda um de seus temas preferidos, o da metalinguagem, como inclusive o próprio título do filme já sugere. O fato de o filme se passar em pleno Festival de Cannes também evidencia sua afeição por essa abordagem. É impressionante como a obra é concebida com uma naturalidade atroz. Tudo parece estar rigorosamente no seu lugar, até as tragédias cotidianas inesperadas como a da demissão da personagem de Kim Min-hee. A personagem Claire (Isabelle Huppert) revela-se uma típica flâneur, aberta aos encontros casuais e à alteridade. O diretor consegue fazer tudo soar muito espontâneo e os diálogos são tão banais que reforçam ainda mais essa concepção do todo. É claro que a presença do talento de Isabelle Huppert, ao lado desse outro encanto que é Kim Min-hee, valoriza por demais o filme. A química entre elas é fundamental para que a fluência da mise-en-scène de Sang-soo funcione.
Assim como em outras obras de Sang-soo, nessa também a simplicidade das situações salta aos olhos, como se observa na longa conversa travada em um bar, outra cena bem ao feitio do diretor. O cinema dele se estabelece mesmo numa aparente banalidade, privilegiando o poder das relações humanas, as mais comuns, vindas dos encontros corriqueiros e fortuitos, mas que podem se revelar inesperadamente transformadores. Todavia, o que parece ser o ponto forte em A câmera de Claire é a forma como o próprio cinema se insere na trama. Por meio de fotos vindas de uma câmera Polaroid, Claire impõe uma relação com o outro. O mais importante de seu ato de fotografar é o resultado dessa ação: a foto fica para o fotografado, não para a fotógrafa. Mais uma vez, o cinema de Sang-soo cria um diálogo com o espectador, pois o que importa aqui é como uma imagem produzida impacta diretamente o interlocutor. Por isso o cinema de Sang-Soo é tão potente, mesmo quando parece não ser, por nos mostrar que a vida é um processo, um constante construir com um outro em um aparente improviso. Demonstra que esse poder transformador não está no cinema, mas sim no cineasta, e mais ainda no sujeito. Com isso ele corrobora que esse impulso pode permear também qualquer outra relação humana.
A VISITANTE FRANCESA
ORIGEM: COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2012 DURAÇÃO: 89 MIN CLASSIFICAÇÃO: 12 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SO ELENCO: ISABELLE HUPPERT, YU JUNSANG, YUMI JUNG
SINOPSE Anne (Isabelle Huppert) é uma mulher francesa em uma pequena cidade na Coreia do Sul, onde visita um amigo que está prestes a ter um filho e trabalha como diretor. Ao visitar uma praia, conhece lá um empolgado salva-vidas (Yu Jun-sang), que tenta conquistá-la. Pouco tempo depois, outras duas mulheres francesas, ambas chamadas Anne, chegam ao local e lidam com os mesmos personagens.
BREVE REFLEXÃO Aqueles que consideram o cinema de Hong Sang-soo letárgico, uma bobagem só, encontram em A visitante francesa um prato cheio. É nesse filme que a sua estrutura narrativa se vislumbra mais fluida. Mas é justamente nele que a proposta do diretor se reafirma, inclusive na metalinguagem. O filme nos mostra três hipóteses de roteiro, construídas por uma estudante de cinema, em que três situações são criadas a partir da visita de uma francesa a uma praia da costa coreana. Assim, Sang-soo faz um paralelo interessante entre vida e cinema. Da mesma forma que a vida é um sem-fim de possibilidades, o cinema também pode ser entendido da mesma maneira. A partir de um simples tema, muita coisa pode ser dita e todo um universo pode ser (re)construído.
A presença de Huppert sinaliza a influência gritante exercida pelo cinema francês na concepção de Sang-soo. Nesse ponto, lembrar de Eric Rohmer é sintomático, pois talvez essa seja sua referência e inspiração maior em diversos filmes. Como não lembrar o frescor de um Pauline na praia ou de um Joelho de Claire? A atmosfera está ali, inundando a mise-en-scène de Sang-soo.
CERTO AGORA, ERRADO ANTES
ORIGEM: COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2015 DURAÇÃO: 121 MIN CLASSIFICAÇÃO: 12 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SOO ELENCO: JAE-YEONG JEONG, KIM MIN-HEE
SINOPSE Por engano, Ham Cheon-soo (Jae-yeong Jeong) chega à cidade coreana de Suwon um dia antes do previsto. Para passar o tempo, ele vai até um antigo palácio, onde encontra uma artista chamada Yoon Hee-jeong (Kim Min-hee). Juntos, eles vão até a loja de Yoon para admirar suas pinturas, comer sushi e se conhecerem. Em seguida, eles vão para um bar encontrar com amigos de Yoon. Ao ser perguntado se é casado, Cheon-soo admite que sim e decepciona a artista.
BREVE REFLEXÃO Certo agora, errado antes é mais um filme metalinguístico de Sang-soo. Talvez seja nessa obra que essa característica tão comum em seus filmes apareça de maneira mais visível. Provavelmente pelo fato de o protagonista ser um cineasta, mas também porque a própria narrativa favorece essa proposta, já que aqui temos uma mesma história sendo contada duas vezes, mas com diferenças em algumas nuances. Um registro importante é a presença no filme de Kim Min-hee, pela primeira vez sendo dirigida por Sang-soo e que passaria a ser sua musa e esposa. Uma parceria amorosa e profissional, muito comentada pela imprensa sul-coreana. De todas as suas obras lançadas aqui no Brasil, essa talvez seja a que melhor sintetize o estilo e a visão cinematográfica de Hong Sang-soo. Todos os elementos estão postos nesse filme e alguns com uma potência extraordinária. O zoom, o cinema com seus personagens humanizados e – isso é profundamente nevrálgico em sua obra – as conversas à mesa, regadas a bebida e confissões. Há um certo desprendimento em relação ao viver. Se a vida é tão incerta, por que costumamos levá-la tão a sério? Essa talvez seja a grande pergunta que o cinema de Hong Sang-soo nos apresenta. Por isso mesmo, forma e conteúdo em seus filmes dialogam tão bem, com tanta fluidez. Parece sempre haver um leve descompromisso dos personagens pela vida, que coloca em suspenso o próprio filme. Há uma desconfiança em relação ao todo fílmico e isso normalmente gera um enorme incômodo na plateia.
Algo bem interessante na ideia desenvolvida pelo diretor é a fragilidade da memória, fato intrinsecamente relacionado ao cinema se levarmos em conta que em um filme há 24 quadros por segundo, fazendo do esquecimento algo inerente à própria natureza do cinema. Quantas imagens registramos quando assistimos a um filme? Qual a permanência de uma imagem em nosso consciente? E no nosso inconsciente? São questões fascinantes que fazem dos filmes um atrativo em si. Porém Sang-soo vai além. Em Certo agora, errado antes, ele se utiliza do seu humor habitual para nos brindar com mais um de seus jogos cinematográficos. O humor nesse filme está na própria forma de organização da narrativa, que já incorpora a ideia de duas histórias no enredo. A repetição aqui adquire um viés filosófico, mas também cômico, pois são pequenas atitudes que provocam mudanças e novas possibilidades na vida das pessoas. É inevitável sairmos do filme tentando imaginar nossa vida a partir dessas pequenas subversões cotidianas. Pensamos ainda que nosso dia a dia não é assim tão repetitivo quanto imaginamos, que a rotina tem uma dinâmica, mas que nela cabem sempre possíveis alterações.
NA PRAIA À NOITE SOZINHA
ORIGEM: COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2017 DURAÇÃO: 101 MIN CLASSIFICAÇÃO: 14 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SOO ELENCO: MIN-HEE KIM, YOUNG-HWA SEO
SINOPSE Younghee (Kim Min-hee) é uma atriz famosa que tem a sua vida pessoal exposta após um caso com um homem casado. Ela acaba então decidindo deixar sua cidade, passar um tempo em Hamburgo, na Alemanha, e dar uma pausa na carreira. Ao retornar à Coreia, reencontra os velhos amigos e começa a refletir sobre suas possibilidades de futuro. Em noites regadas a álcool, ela se libera e diz o que realmente sente, gerando conflitos bem complexos com eles.
BREVE REFLEXÃO A maioria das cenas de Na praia à noite sozinha se constrói praticamente a partir de conversas, quase todas em volta de uma mesa, seja em um bar, uma cafeteria ou na casa de algum personagem. O filme se divide em duas partes, uma passada na Alemanha, outra numa praia da Coreia do Sul, distante de Seul. Sang-soo é mesmo chegado a estruturas narrativas divididas em partes, e assim ele constrói seu estilo inconfundível. O tom empregado em seus filmes também se assemelha: o de rir da grande comédia que somos e, apesar de adultos, aceitarmos o patético como algo inerente a nossas existências. Um traço marcante da filmografia de Sang-soo, e também presente em Na praia à noite sozinha, é o da imprevisibilidade e da incerteza acerca do futuro, que é sempre colocado como algo plenamente aberto onde tudo pode acontecer, inclusive ser modificado por um detalhe banal. Para Sang-soo, nada é mais incerto que o amor. Os diálogos sempre esbarram nesse questionamento: o que é o amor, qual a sua qualidade e sua efetividade em nossas vidas. A protagonista é uma atriz em crise com sua carreira, sua beleza, seu inevitável envelhecimento, e descrente do amor. O diretor brinca habilmente com o próprio ambiente do cinema como espaço de criação artística, onde o sonho da personagem encontra-se com a do público numa metalinguagem que nos abala e nos tira da nossa zona de conforto, remetendo-nos a uma fronteira que nos confronta com a própria noção do que é o real. E é sempre muito interessante a forma com que Sang-soo utiliza o álcool como agente catalisador de conflitos, de delírios, extravasamentos e acirramento das emoções humanas.
Um dos pontos marcantes neste novo trabalho do diretor é a presença da praia no desfecho das duas partes do filme. Logo a praia, esse ambiente da repetição, onde as ondas vêm e voltam interminavelmente, mas que contraditoriamente também é marcado pelo vento e pelo espaço amplo, tão inspiradores da liberdade e do devaneio. Mesmo flexibilizando seu estilo, se tomarmos Certo agora, errado antes como referência, mais uma vez Sang-soo surpreende com um filme delicioso, narrativamente fluido e agregando até pitadas surrealistas na trama, como a do homem obstinado em limpar a vidraça do apartamento, sem notar nem ser notado, como se fosse mais invisível do que o próprio vidro que ele limpa com tanto esmero. Apesar de invisível para os personagens, ele não o é para nós espectadores, que ficamos incomodados com a apatia dos personagens frente àquele desconhecido. O jogo de Sang-soo é assim mesmo, o de inesperadamente colocar o espectador, com a partida em curso, numa situação de também ser um jogador.
FILHA DE NINGUÉM
ORIGEM: COREIA DO SUL ANO DE PRODUÇÃO: 2013 DURAÇÃO: 90 MIN CLASSIFICAÇÃO: 12 ANOS DIREÇÃO E ROTEIRO: HONG SANG-SOO ELENCO: EUN-CHAE JEONG, LEE SEONG-GYON, YE JI-WON, KIM JA-OK
SINOPSE Haewon (Jeong Eun-Chae) é uma jovem adulta que vive deslocada em Seul, capital da Coreia do Sul. A estudante de cinema também sonha em se tornar atriz e admira a francesa Jane Birkin. Quando descobre que sua mãe (Kim Ja-ok) está se mudando para o Canadá e que seus colegas de faculdade estão falando mal dela por conta do relacionamento que teve com um professor casado (Lee Sun-kyun), Haewon se enche de dilemas existenciais.
BREVE REFLEXÃO Apesar de manter a sua estrutura fluida de sempre, Filha de ninguém é um dos trabalhos de Hong Sang-soo em que se encontram mais reflexões filosóficas sobre a vida. Esse é o seu filme onde o lado cômico praticamente desaparece, não está nem nos diálogos nem nas situações. A história de Haewon, que sonha ser uma atriz francesa e precisa tomar decisões típicas do presente, é o motor dessa obra. Filha de ninguém se sustenta basicamente em dois personagens, na bela Haewon e no seu ex-professor, com o qual ela teve um relacionamento no passado. Mas a narrativa de Sang-soo é ardilosa, repleta de elipses e descontinuidades. Durante todo tempo ficamos desorientados em relação à narrativa. Personagens entram e saem da história sistematicamente. Parece que Sang-soo almeja nos deixar perdidos tal e qual os seus personagens também se encontram. Mesmo sem o humor habitual de suas histórias, em Filha de ninguém o jogo cinematográfico é preservado como uma das marcas da filmografia desse audacioso diretor coreano. Tudo nesse filme nos desconcerta. Haewon se encontra com a atriz Jane Birkin; encontra-se com a mãe que está partindo para ir morar em outro continente; passeia com amigos em um parque; estabelece uma relação amigável e inesperada com um professor que lhe é estranho; encontra-se algumas vezes com seu ex-amante; frequenta a biblioteca para estudar e dormir. Enfim, tudo aparece dessa forma fragmentada no tempo e espaço, causando uma confusão no espectador, pois a não linearidade parece ser a mola mestra de sua proposta narrativa.
Os limites entre realidade e sonho delineiam as ações dos personagens. Haewon vive uma crise emocional, está visivelmente abalada por não conseguir lidar com a partida da mãe para o estrangeiro. O seu ex-professor também quer abandonar um relacionamento no qual tem um filho para reatar com Haewon. Ela dorme sistematicamente na biblioteca, o que sugere que muito do que vemos pode fazer parte do seu sonho, mas como Sang-soo não cria uma atmosfera onírica (muito pelo contrário, prefere aderir ao naturalismo na composição das tramas), tudo fica nebuloso. Este é o grande mérito dessa obra: nos manter absorvidos em seus mistérios, da primeira à última cena, e até mais do que isso, pois levamos para casa mais dúvidas do que certezas sobre seus personagens.
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CONTEÚDO DIRETORIA DE CULTURA
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Todo ano, o CineSesc adquire os direitos de exibição de longasmetragens que são levados para todo o Brasil nas programações dos Departamentos Regionais do Sesc. O projeto é organizado por mostras temáticas com filmes contemporâneos em que há uma seleção específica de um movimento estético ou diretor(a) importante na história do cinema. A área audiovisual do Sesc busca ofertar obras com formas narrativas impactantes e que trazem reflexões para todo o público, alinhadas com os princípios sociais que movem a instituição. A principal marca do CineSesc é o foco no cinema independente. Vale dizer que os filmes participantes têm muitas dificuldades para adentrar no circuito comercial, e até quando conseguem entrar em cartaz ficam restritos a uma ou duas salas nas maiores capitais brasileiras. Fazer esses conteúdos atingirem um público mais amplo é o nosso desafio e uma de nossas tarefas mais importantes.
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