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SUMÁRIO SG MAG Edição nº 2 Abril 2017
EDITORIAL ........................................................................................................ APRESENTAÇÃO: Decifra-me ou Devoro-te! – por Suzete Fraga ............ CRÓNICA: Crediário – por Maurício Cavalheiro .............................................. APRESENTAÇÃO: Ninguém Leva a Mal – por Isidro Sousa ....................... APRESENTAÇÃO: Mar em Mim – por Isidro Sousa ..................................... REPORTAGEM: Lançamento do livro “Mar em Mim” ............................. ENTREVISTA: Rosa Marques – por Ricardo Solano ...................................... CONTO: Casinha musicada – por Lia Molina ................................................. APRESENTAÇÃO: Almas Feridas – por Manuel Amaro Mendonça ............. CRÓNICA: Serenata em Veneza – por Jeracina Gonçalves .............................. CONTO: Impacto supremo – por Elicio Santos do Nascimento ..................... OPINIÃO: Educação para a cidadania – por Diamantino Bártolo ................. EVENTOS: FILLCAV Brasil 2017 – por Ernesto Moamba ........................... APRESENTAÇÃO: Saloios & Caipiras – por Marcella Reis ......................... CONTO: Paixão frenética – por Tânia Tonelli ................................................. CRÓNICA: Lé com lé, cré com cré – por Darlan Zurc .................................. ENTREVISTA: Paulo Lobo – por Isidro Sousa ............................................... VIAGENS: Baviera – por Estêvão de Sousa ....................................................... APRESENTAÇÃO: Torrente de Paixões – por Isidro Sousa ........................
005 007 013 015 029 034 043 057 063 067 073 077 082 085 093 098 101 107 113
POESIA: Rafa Goudard .................................................................................... POESIA: Isaac Soares de Souza ....................................................................... POESIA: Paulo Galheto Miguel ...................................................................... POESIA: Guadalupe Navarro .......................................................................... POESIA: Isidro Sousa ....................................................................................... POESIA: Deise Zandoná Flores ...................................................................... POESIA: Lucinda Maria .................................................................................... POESIA: Jonnata Henrique .............................................................................. POESIA: Ângela Caboz .................................................................................... POESIA: Isabel Martins .................................................................................... POESIA: Sandra Boveto ...................................................................................
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LIVROS: Sexta-Feira 13 .................................................................................... LIVROS: A Bíblia dos Pecadores .................................................................... LIVROS: Daqueles Além Marão ...................................................................... LIVROS: Irina – A Guerrilheira ....................................................................... LIVROS: Decifra-me... ou Devoro-te! ............................................................ LIVROS: Mar em Mim ...................................................................................... LIVROS: Amo-te Miúdo Tonto ....................................................................... LIVROS: Almas Feridas .................................................................................... LIVROS: A Íris Azul de Cleópatra .................................................................. LIVROS: Ninguém Leva a Mal ........................................................................ LIVROS: Torrente de Paixões .......................................................................... LIVROS: Saloios & Caipiras ............................................................................. LIVROS: Refúgio Misterioso ............................................................................ LIVROS: Amargo Amargar .............................................................................. LIVROS: Terra do Meu Coração .....................................................................
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EXCERTO DE LIVRO: O casamento de Eulália – por Isidro Sousa .......... 151 ANTOLOGIAS SUI GENERIS: Próximas edições .................................... 162 REGULAMENTO: A Primavera dos Sorrisos ............................................. 166 3
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Isidro Sousa Editor da SG Mag
sg.magazin@gmail.com https://issuu.com/sg.mag
EDITORIAL Apresentamos o segundo número desta revista literária, uma publicação Sui Generis ao dispor de toda a lusofonia. A presente edição da SG MAG dá especial atenção à autora madeirense Rosa Marques, que reside na ilha de Porto Santo, destacando-se ainda a entrevista do editor Paulo Lobo, responsável pela Euedito, e vários livros editados. Desde já agradecemos todas as contribuições que tornaram possível esta edição, que inclui também artigos de opinião, crónicas, contos literários, poesia, entre outros conteúdos, e contamos com a vossa colaboração na sua divulgação. Recordo que este Magazine Literário é composto por entrevistas, crónicas, reportagens, artigos de opinião, biografias, crítica literária, poesia, excertos de livros, contos ou outros textos de ficção, e disponibiliza igualmente espaço para outras artes: portfólios de fotografia, pintura, desenho, etc. Se deseja colaborar com a SG MAG, ou publicitar o seu livro (ou algum evento, espaço ou serviço), contacte-nos por email. Boas leituras, e até à próxima edição!
SG MAG – Magazine Literário Ano 1 – Edição Nº 2 – Abril/Junho 2017 Editor e Director: Isidro Sousa Periodicidade: Trimestral ISSN: 2183-9573 Redacção e Publicidade: sg.magazin@gmail.com Endereço na Internet: https://issuu.com/sg.mag Colaboração nesta Edição: Ângela Caboz, Darlan Zurc, Deise Zandoná Flores, Diamantino Bártolo, Elicio Santos Nascimento, Ernesto Moamba, Estêvão de Sousa, Guadalupe Navarro, Isaac Soares de Souza, Isabel Martins, Isidro Sousa, Jeracina Gonçalves, Jonnata Henrique, Lia Molina, Lucinda Maria, Manuel Amaro Mendonça, Marcella Reis, Maurício Cavalheiro, Paulo Galheto Miguel, Rafa Goudard, Ricardo Solano, Sandra Boveto, Suzete Fraga, Tânia Tonelli. Os textos publicados são da exclusiva responsabilidade dos autores que os assinam; os conceitos emitidos pelos autores não traduzem necessariamente a opinião da revista.
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APRESENTAÇÃO
DECIFRA-ME... OU DEVORO-TE! SUZETE FRAGA Nasceu no ano de 1978 em Azurém, Guimarães, e reside em Póvoa de Lanhoso. Experimentou o árduo calejar da lavoura ainda na infância, aprendendo a usar, desde cedo, a escrita e os sonhos como um escape ou até mesmo como um meio de subsistência existencial. Tem textos espalhados em obras colectivas de várias editoras e foi distinguida em três concursos literários. Tem um livro publicado: «Almas Feridas» (Sui Generis, 2016). Página da Autora: www.facebook.com/suzete.fraga
“Decifra-me... ou Devoro-te! é um medicamento altamente eficaz no tratamento de depressões, ignorância crónica, solidão e preconceito, seja qual for a estirpe dominante. Após um longo e trabalhoso processo de inspiração, uma das mentes mais geniais que eu tenho o privilégio de conhecer conseguiu, finalmente, produzir a combinação perfeita para a cura das maleitas acima referidas e não só! Quando consumido atempadamente, ou seja, antes do aparecimento dos primeiros sintomas, o organismo adquire imunidade vitalícia, não deixando espaço de manobra para tédios, frustrações e hipocrisia multirresistente.”
POR SUZETE FRAGA
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ecifra-me... ou Devoro-te! é um medicamento altamente eficaz no tratamento de depressões, ignorância crónica, solidão e preconceito, seja qual for a estirpe dominante. Após um longo e trabalhoso processo de inspiração, uma das mentes mais geniais que eu tenho o privilégio de conhecer conseguiu, finalmente, produzir a combinação perfeita para a cura das maleitas acima referidas e não só! Quando consumido atempadamente, ou seja, antes do aparecimento dos primeiros sintomas, o organismo adquire imunidade vitalícia, não deixando espaço de manobra para tédios, frustrações e hipocrisia multirresistente. Advertências: uma advertência apenas – altamente viciante! E eu que o diga! Em prol da Humanidade, mal recebi tão prestigiante convite, aceitei logo o desafio de ser uma das primeiras “cobaias” a testar os seus efeitos. Como qualquer medicamento, recomenda-se que não ceda à tentação dos empréstimos, pois nunca mais o recuperará. Quem quiser
que compre! Não brinque com a sua saúde! O que deve saber antes de usar e abusar de Decifra-me... ou Devoro-te!? PRIMEIRO – Verifique se não se desmancha com facilidade. Depois de atacar A Estátua de Sal pode não ser capaz de reunir condições para passar ao Colar de Pérolas. E, nesse caso, é melhor nem chegar perto de A Armadura de Sancho». Esta contraindicação pode ser facilmente contornada se dividir as gargalhadas com outras pes soas. SEGUNDO – Não beba, por favor! Sejam bebidas alcoólicas ou outro líquido qualquer (lógico, sólidos não dá muito jeito beber). Eu tentei e fiz uma grande porcaria, além de ficar com soluços, tal foi a desordem. O mesmo se aplica à comida. TERCEIRO – Quando passar pelo Arrepio de Micaela procure estar acompanhado, caso contrário os calafrios podem teimar em não passar voluntariamente.
Uma palavra de apreço à autora
QUARTO – Confira o stock de lenços de papel e, se puder, um barco e umas galochas; acredite, vai precisar para o Totó.
Guadalupe Navarro e os meus sinceros parabéns por esta magnífica obra. Estaria a ser
QUINTO – Se não tem uma religião, espreite Mea Culpa. Quero saber se depois disso ainda continua ateu ou indeciso.
mazinha se confessasse uma pontinha de inveja?... Pronto, um icebergue, tenho de ser
SEXTO – Inveja o aparente sucesso dos outros? Tome uma dose de A Máscara e vai ver o que é bom para a tosse!
sincera. É exímia na construção
dos enredos. O seu nível de cultura geral é imbatível e o
SÉTIMO – Se é uma pessoa suscetível, vá com moderação ao Casarão. Da última vez que confirmei, só andava meio mundo a enganar o outro
sentido de humor é qualquer coisa do outro mundo! 8
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meio. Em caso de sobredosagem arrisca paranóia temporária.
Conservar em lugar de destaque, mas sempre à mão. Por razões de segurança recuse sempre genéricos ou artigos de marca branca. Certifiquese que tem o logo Sui Generis. Quaisquer outras dúvidas é favor dirigir-se à responsável por esta pílula milagrosa, Guadalupe Navarro, ou ao seu técnico assistente, Isidro Sousa. Eu, enquanto “cobaia”, posso garantir que nunca me senti tão bem. Para finalizar: uma palavra de apreço à autora Guadalupe Navarro e os meus sinceros parabéns por esta magnífica obra. Estaria a ser mazinha se confessasse uma pontinha de inveja?... Pronto, um icebergue, tenho de ser sincera. É exímia na construção dos enredos. O seu nível de cultura geral é imbatível e o sentido de humor é qualquer coisa do outro mundo! Resta-me agradecer a confiança depositada na minha humilde pessoa, para tamanha responsabilidade. Não preciso deixar votos de muito sucesso, tenho a certeza de que será um êxito estrondoso! Parabéns, Guadalupe!
OITAVO – Procure saber os resultados do seu eletrocardiograma antes de ir ter com A Mulher de Branco. Convém ter um coração forte como um touro. NONO – Por favor, muita atenção neste ponto! Há um estudo que diz que quem toma café sem açúcar pode ser ou desenvolver tendências psicopatas. Por segurança, esvazie o açucareiro no seu café, antes ir para O Sonho. Eu uso os chocolates M&M’s, também são excelentes para suprir a carência de açúcar no organismo e assim evita males maiores. Prazo de validade e instruções de conservação? Validade: comprar antes que esgote e, para isso, vale tudo, desde atropelamentos, saques e brigas do tipo mulheres em época de saldos. 9
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CRÓNICA
CREDIÁRIO POR MAURÍCIO CAVALHEIRO
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empre achei difícil comprar o presente que superasse ou satisfizesse a expectativa de minhas namoradas. Nunca fui bom nisso, é verdade. Mas me esforçava: gastava o que podia e o que não podia na vã esperança de, pelo menos, receber um elogio. Talvez eu tenha escolhido namoradas insensíveis, materialistas, insaciáveis, que sempre queriam mais e mais e mais. Ou, talvez, eu não soubesse mesmo fazer as escolhas certas dos presentes: ramalhetes de flores, bombons, poesias, peças de vestuário, viagens, jantares... Fato é que todos os meus presentes foram recebidos com indisfarçada insatisfação, mas nenhum fora devolvido. Pensando bem, quem deveria demonstrar insatisfação era eu. Nunca ganhei sequer uma bala. Também nunca me importei com isso. Acredito que o amor não se materializa em presentes, em bobagens efêmeras. O amor é muito mais valioso do que qualquer patrimônio. Se fosse materialista, escolheria namoradas pelo poder aquisitivo delas. Não sou, graças a Deus! Minhas escolhas eram – e ainda são – feitas sob a regência de meu coração. Hoje fui ao shopping. Cheguei agorinha e resolvi escrever esta crônica. Havia muitas pessoas lá. Observei vários casais entrando e saindo das lojas, comprando mundos e fundos. Dia dos namorados é assim. Perambulei sem destino parando diante das vitrines com ofertas irresistíveis de produtos de qualidade. Mas pra que comprar? Mas pra quem comprar? Estou solteiro e não preciso cometer extravagâncias. Por volta das 12 horas, senti fome. Foi difícil encontrar um lugar na praça de alimentação. Depois de longa espera, desocuparam a mesa espremida na pilastra. Sentei-me e pedi algo para comer. Enquanto esperava, vi que na mesa ao lado estava uma linda morena de o-
Vi que na mesa ao lado estava uma linda morena de olhos azuis. Era minha ex-namorada, trocando carinhos com um homem muito feio, de caráter duvidoso, mas empresário bem sucedido na cidade. Lembrei-me das últimas
palavras que ela me dissera ao encerrar o nosso namoro: “A fila anda”. E andou, para ela.
lhos azuis. Era minha ex-namorada, trocando carinhos com um homem muito feio, de caráter duvidoso, mas empresário bem sucedido na cidade. Lembrei-me das últimas palavras que ela me dissera ao encerrar o nosso namoro: “A fila anda”. E andou, para ela. Assim que me viu, exagerou nos carinhos, beijando o pescoço e as orelhas daquele homem; talvez pensasse que me provocaria ciúmes. Nem um pouco. Mas confesso que fiquei com muita raiva quando ela começou a exibir o anel de brilhantes. Perdi a fome. Levantei-me e cancelei o pedido. Aquela exibição provocadora me alertou que a verdadeira razão de eu ter ido ao shopping era pagar uma conta. Paguei a antepenúltima parcela e prometi a mim mesmo que nunca mais compraria presentes à prestação. Nem mesmo um anel. Nem mesmo um anel de... brilhantes.
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APRESENTAÇÃO
NINGUÉM LEVA A MAL “Os homens, transfigurados em silenos e sátiros, não tardaram a aderir às procissões ISIDRO SOUSA Nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, concelho de Moimenta da Beira, e reside em Lisboa. Jornalista e editor de publicações periódicas desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, publicou a primeira antologia em Fevereiro de 2001, colaborou com três editoras, participou em duas dezenas de obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e é o responsável pelos projectos da Sui Generis, que criou em Dezembro de 2015. Publicou dois livros: «Amargo Amargar» e «O Pranto do Cisne». Página no Facebook e Blogue: www.facebook.com/isidro.sousa.2 http://isidelirios.blogspot.pt
femininas e ao “frenesim dionisíaco” e a festança, que durava três dias, encerrava com uma bebedeira colectiva no meio de um “vale-tudo” pan-sexualista. As autoridades (as cortes, os sacerdotes e os ricos) não gostaram desses festejos malucos porque, entre outras razões, eram as vítimas favoritas das sátiras; tentaram reprimi-los. Além de serem uma teatralização colectiva da inversão de tudo, os festejos serviam como um acerto de contas do povo com os seus governantes, ainda que metafórico e psicológico. Neles, o miserável vestia-se de rei, o ricaço de pobretão, o libertino aparecia como guia religioso, a rameira posava como a mais pura donzela, machos vestiam-se como fêmeas e assim por diante.” POR ISIDRO SOUSA 15
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Carnaval é um período de festas profanas que ocorre entre os Reis e a Quaresma, com o seu auge nos três dias anteriores à Quarta-feira de Cinzas, especialmente na terça-feira que antecede o primeiro dia da Quaresma. De todas as celebrações cíclicas anuais, esta é a mais grandiosa e uma das poucas manifestações que consegue envolver todo o público, apresentando maior riqueza de aspectos, grande variedade de elementos e uma característica complexidade de significações. A sua história começa na Antiguidade, com as festas de culto à deusa Ísis, no Antigo Egipto, e eventos relacionados com acontecimentos religiosos e agrários, embora também haja indícios de que tenha origem em festas pagãs e rituais orgíacos. Os romanos, os gregos e os egípcios davam as boas-vindas à Primavera com cultos de fertilidade, rituais de abundância para a agricultura e celebrações fartas, consagradas aos respectivos deuses. Alguns advogam o culto de Ísis, outros as festas em honra do deus Dionísio e outros as bacanais, lupercais e saturnais, festejos romanos de grande licenciosidade em que havia uso de máscaras. Na Grécia clássica, as primeiras seguidoras de Dionísio eram mulheres que escapavam, nos dias que lhe eram dedicados, da vigilância dos maridos, pais e irmãos, para caírem na folia com “danças furiosas e gritos de júbilo”. Nesses dias, saíam
aos bandos, com os rostos cobertos de pó e vestes transformadas ou rasgadas, cantando e gritando pelas montanhas. Os homens, transfigurados em silenos e sátiros, não tardaram a aderir às procissões femininas e ao “frenesim dionisíaco” e a festança, que durava três dias, encerrava com uma bebedeira colectiva no meio de um “valetudo” pan-sexualista. As autoridades (as cortes, os sacerdotes e os ricos) não gostaram desses festejos malucos porque, entre outras razões, eram as vítimas favoritas das sátiras; tentaram reprimi-los. Além de serem uma teatralização colectiva da inversão de tudo, os festejos serviam como um acerto de contas do povo com os seus governantes, ainda que metafórico e psicológico. Neles, o miserável vestia-se de rei, o ricaço de pobretão, o libertino aparecia como guia religioso, a rameira posava como a mais pura donzela, machos vestiam-se como fêmeas e assim por diante. Dionísio, irreverente e debochado, estimulava que virassem o mundo de cabeça para baixo. A tentativa de repressão fracassou e Pisístrato oficializou as homenagens a Dionísio na Grécia, sendo nesta altura (século VI a.C.) que se instaurou o chamado Carnaval Pagão. Outra hipótese difundida entre pesquisadores é a de que o Carnaval tenha iniciado em Itália, com o nome de Saturnálias – em homenagem a Saturno, a Baco (o Dionísio romano) e a Momo. 16
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Saturno, deus da agricultura dos romanos, identificado como Cronos pelos gregos, pregava a igualdade entre os homens e ensinou a arte da agricultura. As comemorações, que se prolongavam por sete dias e incluíam bacanais, realizavamse nas ruas, praças e casas da Antiga Roma e havia uma aparente quebra de hierarquia social quando todos se misturavam na praça pública. A separação da sociedade em classes fazia que houvesse a necessidade de válvulas de escape, através de sexo e bebida. Os festejos revestiam-se de tal importância que todas as actividades e negócios eram suspensos nesse período: tribunais e escolas fechavam as portas durante o evento, os escravos ganhavam liberdade temporária e as restrições morais eram relaxadas. As pessoas dançavam e trocavam presentes, um rei era eleito por brincadeira e comandava o cortejo pelas ruas e as tradicionais fitas de lã que amarravam aos pés da estátua de Saturno eram retiradas, como se a cidade o convidasse para participar na folia. Corridas de cavalo, desfiles de carros alegóricos, brigas de papelinhos, lançamentos de ovos e outros divertimentos generalizavam a euforia. Na abertura dessas festas ao deus Saturno, carros com aparência de navios surgiam na “avenida”, com homens e mulheres nus – estes eram chamados os carrum navalis, para muitos a origem da expressão carnevale. Embora haja muitas teorias sobre a origem do Carnaval, numa ideia todas elas convergem: a transgressão, o corpo, o prazer, a carne, a festa, a dança, a música, a arte, a celebração, a inversão de papéis, as cores e a alegria fazem parte da ma-
triz genética de uma das manifestações populares mais belas do Mundo, que foi frequentemente alvo da repressão de quem não tolerava a subversão de um mundo virado do avesso. A opinião de historiadores sobre o Carnaval não é unânime, tanto em relação à data do seu surgimento como à origem da própria palavra “Carnaval”. Há efectivamente duas correntes distintas nesta abordagem, que se baseiam em duas oposições presentes nas actuais celebrações do Carnaval. A primeira é a oposição entre a ordem e a desordem, entre o mundo visível e quotidiano e as pulsões inconscientes, entre a representação e a vontade, entre o mundo que vemos e o mundo visto de cabeça para baixo. Nesta linha, a palavra “Carnaval” teria origem no vocábulo latino carrum
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navalis, os carros navais que faziam a abertura das Saturnálias e das Dionísias Gregas nos séculos VII e VI a.C. e onde a euforia e a inversão de valores se estendiam pelas ruas das cidades. A segunda oposição, com origem nitidamente cristã, é entre o Carnaval e a Quaresma, ou entre a Terça-feira de Carnaval e a Quarta-feira de Cinzas, que marca a entrada na Quaresma. A palavra terá surgido quando o início da Quaresma foi transferido para a quarta-feira (sendo a terça-feira legitimamente a noite do Carnaval) antes do sexto domingo que precede a Páscoa. Ao domingo anterior deu-se o título de dominica ad carne levandas, expressão que se abreviou sucessivamente para carne le-
vandas, carne levale, carne levamen, carnevale e carnaval, todas variantes de dialectos italianos e que significam acção de tirar, isto é, “tirar a carne” ou “adeus à carne”. Com o advento da era cristã, a Igreja Católica começou por tentar conter os excessos do povo nestas festas pagãs e uma solução foi incluí-las no calendário religioso. Então, o Carnaval Cristão passa a existir quando a Igreja (em 590 d.C.) oficializa a festa. Antes, a instituição condenava os festejos pelo seu carácter “pecaminoso”. A civilização judaico-cristã fundamenta-se na abstinência, na culpa, no pecado, no castigo, na penitência e na redenção, renegando e condenando o Carnaval. Não obstante, as autoridades eclesiásticas da época viram-se num beco sem saída dada a força e espontaneidade das celebrações. Foi aí que houve a imposição de cerimónias oficiais “sérias” para conter a “libertinagem”. No entanto, é só em 1545, no Concílio de Trento, que o Carnaval é reconhecido como uma manifestação popular de rua. A Igreja Católica, que considerava tais festejos mundanos, decidiu adoptar essas festas de origem pagã e obscena, transformando-as em libertárias na tentativa de domesticá-las. E determinou que fossem promovidas na véspera do início da Quaresma, como uma espécie de compensação para o período de jejum e abstinência que antecede a Páscoa, momento em que os cristãos comemoram a ressurreição de Cristo, a vitória da vida sobre a morte. Assim, o Carnaval ficou sendo uma festa que termina em penitência na Quarta-feira de Cinzas. Os cristãos iniciavam as suas comemorações no fim de Dezembro, compreendendo os festejos do Natal, do Ano Novo e dos Reis, onde predominavam os jogos e os disfarces. Mas estas acentuavam-se no pe18
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Como a Igreja proibira as manifestações sexuais no festejo, novos divertimentos adquiriram forma: corridas, desfiles, fantasias, deboche e morbidez. Estava o Carnaval reduzido à celebração ordeira, de carácter artístico, com bailes e desfiles alegóricos. No Renascimento, as festas carnavalescas passam a incorporar os bailes com as suas ricas fantasias, os carros alegóricos e os corsos – o baile de máscaras é introduzido no século XV, mas ganha força e tradição no século seguinte, por causa do sucesso da Commedia dell’Arte. O Pierrô, a Colombina e o Arlequim datam dessa época, tendo origem na Comédia Italiana, companhia de actores que se instalou na França para difundir a Commedia dell’Arte. As mais famosas máscaras confeccionam-se em Veneza e Florença, muito utilizadas pelas damas da nobreza a partir do século XVII como símbolo máximo da sedução, verdadeiras peças de arte indis-
ríodo que antecedia a Terça-feira Gorda, o último dia que se comia carne antes do jejum da Quaresma, durante o qual também havia, tradicionalmente, a abstinência de sexo e até mesmo das diversões, como circo, teatro ou festas. Desse modo, a origem da palavra “Carnaval” estará, igualmente, relacionada com a ideia de “festa do adeus à carne” e marcada pela junção de duas palavras latinas como carnis (carne) e valles (prazeres) ou carnis (carne) e levale (retirar). Após o Concílio de Trento, a Igreja considerava o Carnaval pecaminoso somente em círculos restritos, como a Corte Francesa anterior à revolução, onde os bailes de máscaras se transformavam em bacanais. Não entre o comum do povo entregue a ingénuos bailados e banhos de cheiros, revelando o vigoroso e sadio espírito de festa, a culminar nos cortejos expressando não só o pitoresco, mas frequentemente a crítica aos costumes e aos poderosos. 19
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val europeu sobrevive ainda hoje; aliás, o Carnaval moderno, feito de desfiles e fantasias, é produto da sociedade vitoriana do século XX e a cidade de Paris foi o principal modelo exportador desta festa para o Mundo. Cidades como Nice, Nova Orleans, Toronto e Rio de Janeiro inspiraram-se no Carnaval parisiense para implantar as suas novas festas carnavalescas. Já o Rio de Janeiro criou e exportou o estilo de fazer Carnaval com desfiles de escolas de samba para outras cidades do Mundo, como São Paulo, Tóquio e Helsínquia. Um dos principais rituais de Carnaval na Europa que se deve salientar é o Entrudo. Esta palavra vem do latim, significa introdução à Quaresma e existe desde que o Carnaval Cristão foi oficializado. O povo comemorava, comendo e bebendo, para compensar o jejum, mas o ritual tornou-se, aos poucos, bruto e grosseiro, atingindo o máximo de violência e falta de respeito em Portugal, no século XVI, quando um homem do povo atirou uma “laranjada” a um nobre. Nessa época, atiravam água suja e ovos das janelas e dos balcões, nas ruas havia guerra de laranjas podres e restos de comida e cometia-se todo o tipo de abusos e atrocidades.
pensáveis à libertinagem dos burgueses. Os excessos continuam associados aos festejos; não obstante, a Igreja Católica absolve-os de pecado e autoriza os fiéis a disfrutarem dos prazeres da carne, pois tudo será perdoado a seguir – desde que cumpram com rigor os quarenta dias de jejum da Quaresma, a purificação do corpo e da alma estão garantidos. E assim se manteve o Carnaval até ao século XIX, quando adquiriu outro vigor. Perdia em festa “bufa” e de rua, ganhava em elegância, alegoria, ordem e requinte artístico, além de tocar agora as classes mais abastadas, antes arredadas dos festejos populares. Na Europa Ocidental, bailes e desfiles organizados tomavam o lugar das turbas de gente etilizada e aos gritos. Este novo Carna20
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Foi assim que a festa de Carnaval chegou a Portugal, recebendo o nome de Entrudo, através de uma brincadeira agressiva. O evento tinha uma característica essencialmente gastronómica e era marcado por um divertimento violento, cujas partidas incluíam brigas e vassouradas, baldes de água (e de outras coisas) despejados das janelas, lixo arremessado, cal esfregada nas roupas e nos cabelos, escadas ensaboadas à espera do trambolhão; faziam-se esferas de cera com o interior cheio de água-de-cheiro que eram atiradas aos transeuntes e os mais ousados começaram a injectar, no interior das “laranjinhas” ou “limõesde-cheiro”, substâncias malcheirosas e impróprias, o que fez que a festa fosse perdendo a sua alegria. No entanto, estas práticas foram proibidas e o Carnaval entrou na ordem dos cortejos, nas batalhas das flores e nos salões de baile. Em finais do século XIX, nas aldeias portuguesas, o Entrudo era um momento de transgressão calendarizada e aceite por todos: uma catarse de pulsões, a purga necessária ao regresso à ordem, um momento de igualdade e de liberdade para todos, aceite pelos poderosos. Nas cidades, o Carnaval transformou-se numa forma de “luta
de classes”, com uma insolência e irreverência (e montras de lojas partidas) que assustavam os burgueses. Todavia, os exageros do Carnaval urbano foram regulamentados e domesticaram-se os festejos, com a criação dos desfiles. Dentre as comemorações características de cada região, um especial destaque para as máscaras dos Caretos e os próprios Caretos. São máscaras
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assustadoras, misteriosas e fascinantes, que andam à solta no Inverno transmontano, uma tradição que tem raízes milenares e transforma pacatos rapazes em diabos, chocalheiros, zangarrões e caretos, que afugentam e animam aldeias inteiras e os forasteiros que lá vão só para as ver. Os preparativos para os dias de festa começam antes do Inverno chegar ao Nordeste português. Os artesãos trabalham a madeira, o cabedal, o latão, a lã. Aos poucos aparecem as caras e os fatos que vão esconder a identidade dos rapazes. Assim, temíveis e divertidos, os mascarados quebram a rotina do quotidiano rural. O disfarce é a chave destes rituais que anunciam um novo ciclo: na Natureza e na vida dos homens. Os mascarados transmontanos simbolizam a vida que se renova na Primavera, a entrada num tempo fecundo e próspero, a passagem da puberdade à idade adulta. A comunidade revitaliza-se e reforça laços nestas festas organizadas pelos rapazes. De chocalhos à cintura e vara na mão, eles têm o diabo no corpo – correm, saltam, dançam, perseguem as raparigas solteiras, intimidam os visitantes. A brincar a brincar, este Carnaval recicla tradições e enche de orgulho o povo aldeão, cujas festas de Domingo Gordo e do dia de Carnaval são da inteira responsabilidade dos Caretos, seres mágicos que vivem nas máscaras e nos trajes exuberantes, que invadem as ruas da aldeia para expurgar os males e purificar. E, claro es22
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tá, para dar umas “chocalhadas” nas raparigas casadoiras. Esta forma de celebrar o Carnaval, que é hoje uma atracção turística, vem do tempo dos romanos, embora alguns autores reportem as festividades ao período do Neolítico. Além dos Caretos, outros foliões como Cabeçudos e Matrafonas continuam de pedra e cal no Carnaval lusitano. Mesmo em tempo de crise, o espírito de festa mantém-se vivo, as tradições carnavalescas são cumpridas à risca, razão pela qual a expressão “a vida são dois dias e o Carnaval três” soma e segue ao mesmo ritmo com que se preparam os festejos em várias regiões do País. Sempre com a alegria e o simbolismo próprio desta época. De Norte a Sul, são diversos os cortejos, as máscaras e os bonecos que respeitam a tradição, enchendo as ruas de cor e fantasia. Organizam-se os corsos, enfeitam-se bonecos e importa-se o samba do Rio de Janeiro, mas nem por isso perdemos a nossa identidade cultural. O Carnaval de Torres Vedras, por exemplo, é considerado “o Carnaval mais português de Portugal” e não tem espaço para introduzir hábitos ou costumes oriundos do estrangeiro. Tudo leva a crer que as suas facécias tenham emergido no rescaldo da luta dos Republicanos contra a dinastia dos Braganças, no início do século XX. A imponência das vestes reais, que integram elementos de ridículo como o ceptro régio transmudado em corno ou o leque de Sua Sereníssima Alteza, a Rainha, alterado para abano de fogareiro plebeu, parecem credibilizar esta génese. A festa mantém-se fiel às tradições que a popularizaram na rua, desde 1923, altura em que se fez a recepção ao Rei e ao qual se juntou, um ano depois, a figura da Rainha. O modelo dos Reis do Carnaval ainda hoje persiste, mas fazendo jus às sátiras sociais e políticas, à base de caricaturas de personalidades públicas, é composto por duas figuras masculinas, uma delas trajada de Rainha. O centro da cidade serve de
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palco a brincadeiras, aos corsos nos quais participam os carros alegóricos, de grandes dimensões, Matrafonas (homens vestidos com roupas de mulher), Cabeçudos (bonecos gigantes), grupos de desfile e os Zés Pereiras, terminando com o enterro do Entrudo – condenação do Rei – e fogo-deartifício. O Carnaval brasileiro, por sua vez, tem origem no Entrudo português e surgiu com as primeiras caravelas da colonização. Mais precisamente: o Entrudo desembarcou no Brasil no século XVI, com a chegada de portugueses das ilhas da Ma-
deira, Açores e Cabo Verde, e a principal diversão dos foliões era atirar água uns aos outros. Tal como em Portugal, era uma festa cheia de inconveniências, na qual participavam tanto os escravos quanto as famílias brancas. Após insistentes intervenções e advertências da Igreja Católica, substituíram os banhos de água suja por limões de cheiro, esferas de cera com água perfumada ou água de rosas e bisnagas cheias de vinho, vinagre ou groselha. Esses frascos deram lugar ao lançaperfume, bisnaga ou vidro de éter perfumado de origem francesa. No final do século XVIII, o Entrudo era já praticado em todo o território de Vera Cruz. Embora muitos da elite na Corte Imperial o considerassem uma festa suja e violenta, a maioria dos senhores libertava os escravos para a folia, cujas brincadeiras e folguedos variavam conforme os locais e os grupos sociais envolvidos. Com a mudança da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro, surgiram as primeiras tentativas de civilizar a festa carnavalesca no Brasil, através da importação dos bailes e dos passeios mascarados parisienses, colocando o 24
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Entrudo popular sob forte controlo policial. A partir de 1830, sucede-se uma série de proibições na tentativa, sempre infrutífera, de acabar com a festa grosseira. O evento brasileiro recebeu também muitas influências das fantasias e máscaras italianas, que começaram a ser difundidas no século XIX, e só no século XX é que recebeu elementos africanos, considerados fundamentais para o seu desenvolvimento. Com essa mistura de costumes e tradições tão diferentes, o Carnaval do Brasil é, presentemente, um dos mais famosos do Mundo e atrai imensos turistas dos cinco continentes. Os primeiros grandes clubes carnavalescos no Rio de Janeiro surgiram em 1855. Outro importante movimento foi o dos cordões, nascido em 1885, que originou os blocos e, mais tarde, as escolas de samba – é a primeira manifestação de Carnaval influenciada pela cultura e religião africana, formada por negros, mulatos e pessoas humildes, que
saíam às ruas animando o povo ao som de instrumentos de percussão e músicas compostas especialmente para os desfiles comandados pelo apito do mestre que estava sempre à frente dos músicos. No início do século XX, já diversos cordões e blocos desfilavam nas cidades. A primeira escola de samba foi fundada em 1928, no Rio de Janeiro; a Praça Onze, nesta cidade, tornou-se no local mítico de concentração das escolas nos dias de Carnaval, incentivando, 25
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de ano para ano, o aparecimento de novas escolas, que foram surgindo até chegarem à grande festa que se vê hoje e faz do Carnaval uma das maiores manifestações populares do Brasil. Actualmente, existem outras formas de Carnaval por todo o País, como o da Bahia, de tradição africana e com sonoridades e ambientes diferentes do do Rio de Janeiro (vejase o cortejo dos Afoxés), ou os de Olinda e Recife, igualmente animadíssimos e marcados pelas músicas de ritmo frenético e contagiante, em batidas sincopadas a par de instrumentos de sopro. E o frevo, uma “combinação de canto, toque e dança”, classificado como património imaterial da cultura brasileira, domina ainda o Carnaval de alguns estados do Nordeste, como Pernambuco e Paraíba. Quanto às escolas de samba, são hoje autênticas empresas de espectáculos e há regras próprias dentro delas, quer de admissão, quer de permanência, quer de actuação dentro de um desfile de Carnaval. Porém, são elas que mais animam o evento carnavalesco, atraindo uma miríade de colaboradores ao longo do ano e um frenesim inusitado na época do Carnaval.
Posta esta explanação, para que possamos ter algumas noções sobre a história do Carnaval ao longo dos tempos, e pegando numa das imensas expressões populares – É Carnaval, ninguém leva a mal – organizámos esta obra colectiva [Ninguém Leva a Mal], para a qual se seleccionaram três dezenas de estórias de trinta autores lusófonos, ambientadas ou inspiradas no Carnaval, e estão presentes, entre elas, dois textos que ocorrem no Halloween, já que este é considerado um “Carnaval fora de época” em algumas comunidades. Ordenadas alfabeticamente a partir dos nomes dos autores, são estórias totalmente distintas entre si, cujos registos variam do drama à comédia, da aventura ao romance, passando pela fantasia, sobrenatural e biografia, ou seja, incluem um pouco de tudo, independentemente das sensibilidades, culturas, experiências de vida e estilos dos seus autores. Alguns foram já distinguidos em concursos literários e certames similares, conquistaram prémios e menções honrosas e têm livros individuais editados, e outros continuam a fazer a estreia literária numa edição Sui Generis; as suas biografias (resumidas) estão incluídas no apêndice desta antologia. Boas leituras! Prefácio de Isidro Sousa incluído no livro Ninguém Leva a Mal – Antologia de Estórias Carnavalescas
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APRESENTAÇÃO
MAR EM MIM “Era raro o dia em que não me abordava ISIDRO SOUSA Nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, concelho de Moimenta da Beira, e reside em Lisboa. Jornalista e editor de publicações periódicas desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, publicou a primeira antologia em Fevereiro de 2001, colaborou com três editoras, participou em duas dezenas de obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e é o responsável pelos projectos da Sui Generis, que criou em Dezembro de 2015. Publicou dois livros: «Amargo Amargar» e «O Pranto do Cisne». Página no Facebook e Blogue: www.facebook.com/isidro.sousa.2 http://isidelirios.blogspot.pt
pelo Facebook com um “bom dia”, “boa noite” ou “bom fim-de-semana”. E a troca de opiniões tornou-se uma constante. Foi assim, de dia para dia, que fui conhecendo a essência de Rosa Marques. Pude vislumbrar não só o incrível ser humano que ela é, mas também familiarizar-me, de modo crescente, com a sensibilidade e a delicadeza que impregnam a sua escrita. Quer na prosa, quer na poesia. Sim, na prosa e na poesia... porque esta autora madeirense move-se com bastante à-vontade tanto no universo da prosa como nas ondas da poesia. Daí a trocarmos ideias sobre a possibilidade de ela editar um livro (individual) foi um passo.” POR ISIDRO SOUSA
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edijo com imensa satisfação este texto Daí a trocarmos ideias sobre a possibilidade de para prefaciar Mar em Mim, o primeiro ela editar um livro (individual) foi um passo. E, na livro de Rosa Marques. Conheci esta autoparte que me toca, confesso: após ter firmado as ra no segundo semestre de 2015, por intermédio primeiras antologias com o selo Sui Generis, era da Internet, na mesma altura em que eu organizameu objectivo evoluir para a publicação de obras va a obra inaugural da Colecindividuais. De minha autoria ção Sui Generis. Uma simples e não só. A Rosa Marques foi manifestação de interesse em amadurecendo, igualmente, o Mar em Mim resulta de participar na antologia A Bíblia seu desejo, até que a decisão dos Pecadores gerou diversos fosse tomada. Vencido o imum conjunto de emoções contactos através das redes passe sobre o género literário sentidas perante a beleza sociais e a comunicação entre que marcaria a sua estreia nós foi-se desenvolvendo. (prosa, poesia ou um livro dessas duas ilhas Com o decorrer dos meses, infantil), optou por uma obra banhadas pelo Atlântico surgiria uma amizade plena de poética – este livro que se muita cumplicidade. Pude, enacha nas vossas mãos: Mar e o fascínio que o mar tão, conhecer melhor a escrita em Mim. e a Natureza exercem desta autora, à medida que E porquê uma obra que rerecebia (novas) participações úne 73 poemas dedicados, (sempre exerceram) para outras obras colectivas. maioritariamente, à Natureza, na autora. Emoções Além disso, ela passou a mosàs ilhas que a viram nascer e apreendidas desde trar-me, também, textos descrescer (Madeira) e onde resitinados a projectos de outras de e trabalha até à data prea mais tenra idade... editoras, para que os pudesse sente (Porto Santo) e também quando ela interrompia, rever. ao mar que a rodeia – com o Era raro o dia em que não qual sempre conviveu? durante a sua infância me abordava pelo Facebook Porque Mar em Mim resulvivida junto à Natureza, com um “bom dia”, “boa noita de um conjunto de emote” ou “bom fim-de-semana”. ções sentidas perante a beleza as brincadeiras ao ar livre E a troca de opiniões tornoudessas duas ilhas banhadas para contemplar se uma constante. Foi assim, pelo Atlântico e o fascínio que de dia para dia, que fui conheo mar e a Natureza exercem o pôr-do-sol e o cendo a essência de Rosa (sempre exerceram) na autodeslumbramento Marques. Pude vislumbrar não ra. Emoções apreendidas dessó o incrível ser humano que de a mais tenra idade... quandas árvores recortadas ela é, mas também familiarido ela interrompia, durante a no horizonte em ouro. zar-me, de modo crescente, sua infância vivida junto à com a sensibilidade e a deliNatureza, as brincadeiras ao cadeza que impregnam a sua ar livre para contemplar o pôrescrita. Quer na prosa, quer do-sol e o deslumbramento na poesia. Sim, na prosa e na poesia... porque esta das árvores recortadas no horizonte em ouro. autora madeirense move-se com bastante àNessa época, Rosa Marques nada sabia ainda vontade tanto no universo da prosa como nas sobre os fenómenos da Natureza, porém, aqueles ondas da poesia. castelos de nuvens luminosas e alaranjadas que se 30
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transformavam pouco a pouco, atraindo novas formas e cores, cativavam o seu olhar. Um fascínio que se manteria pela vida fora, até aos dias de hoje. Mas não só... A diversidade (e beleza) das flores e de árvores como os pinheiros altos, os plátanos, as acácias e as giestas em flor alegraram, igualmente, a sua infância. E o canto dos pássaros, a Lua formosa e altiva, as mudanças operadas na paisagem em cada estação (cada uma com a sua singularidade e a sua doçura) e o mar sempre presente... O mar como elo fundamental para quem vive nas ilhas, sendo necessário transpô-lo para vencer as encostas íngremes da solidão. O mar amigo que fascina e atrai, mas também o mar adverso, condicionando e interpondo-se com toda a sua imponência, que é preciso respeitar. Todas estas vivências acompanharam a vida da autora como a melhor das recordações. Uma vida inteira passada entre as (suas) duas ilhas. Inicialmente, na Madeira, onde viveu até aos dezoito
anos de idade; posteriormente, em Porto Santo, para onde se mudou após o seu casamento. Da necessidade de registar essas lembranças surgiram os poemas incluídos neste livro, que Rosa Marques, incentivada por familiares e pessoas amigas, decidiu publicar. Mas os textos poéticos aqui apresentados não se debruçam somente sobre o mar, as ilhas e a Natureza. Reflectem também outras situações que preocupam a autora, tais como a instabilidade no mundo e as desigualdades sociais, especialmente as crianças indefesas que sofrem todos os tipos de privações e maus tratos. Com tão variados temas, como organizar, então, estes poemas? Optou-se pela linha das quatro estações do ano, espalhando-os ao longo da obra. Desse modo, podemos encontrar, nas páginas iniciais, além daquele que fornece o título ao livro e de outros que abordam os temas predominantes, alguns mais sobre crianças (Menino que dorme) e as diversas fases do dia (Na claridade di-
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Os textos poéticos aqui
fusa da manhã, Fim de tarde e a importância da leitura nas apresentados não se à beira-mar, A cidade veste-se nossas vidas. de luar, etc). Prosseguem texParticularmente tocantes, debruçam somente sobre tos primaveris na sequência já na derradeira estação: o o mar, as ilhas e a Natude meses relacionados (Abril poema dedicado “aos que viem flor, por exemplo), mesvem nas terras áridas onde reza. Reflectem também clados com a ambiência da nada sobrevive devido à seca, outras situações que mesma estação, sem olvidar como em África, onde todos os os sentimentos do coração dias morrem pessoas à fome” preocupam a autora, que adquirem maior visibiliou Carta ao Pai Natal, que tais como a instabilidade dade à medida que o Verão pede “um pouco de conforto” se aproxima. E as ilhas sempara todas as crianças do munno mundo e as pre lá. E o mar também. Tal do. É com estes textos menos desigualdades sociais, como as crianças, que muito “calorosos”, embora não mesensibilizam a autora (É Venos sensíveis e humanos, que especialmente as rão! / Há sol, há cor e alegria! se vai pintando uma Paisagem crianças indefesas / À beira-mar é grande a azáde Inverno, em que os temas que sofrem todos os fama, / a euforia... / Das criprincipais – o mar, as ilhas e a anças que brincam / falam Natureza – se mantêm vincatipos de privações alto, riem e gritam... / As ondos até à última página. e maus tratos. das inquietas vão e vêm / com Poderia desvendar um pouelas também brincam!). co mais sobre Mar em Mim, Nas páginas subsequentes, esta belíssima obra poética ganham força outras temátique marca a estreia literária de cas... temas nostálgicos... a música que inebria Rosa Marques. No entanto, reservo aos leitores as (Música como bálsamo / libertando da solidão!), o emoções que estes 73 poemas despertam; tudo o amor e a solidão marcando presença, enquanto se que faz bem à alma, o que encanta e toca ao covão sentindo os primeiros Ventos outonais. E ração, a mensagem que cada texto transmite... igualmente a situação daqueles que vivem em Prefácio de Isidro Sousa incluído em Mar em Mim. condições precárias, o valor da amizade, os livros
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REPORTAGEM
LANÇAMENTO DO LIVRO “MAR EM MIM” A sessão de lançamento do livro «Mar em Mim»
para poder fazer as viagens durante o resto do
ocorreu no passado dia 27 de Janeiro, no Salão
ano com a segurança devida.»
Nobre do antigo edifício dos Paços do Concelho, em Porto Santo, tendo contado com o apoio
Não obstante, «correu tudo bem, foi positivo.
de entidades locais, nomeadamente da Câmara
Pude contar com a ajuda e a presença de pessoas
Municipal de Porto Santo e da imprensa regional.
amigas», como a professora Maria José Vital e a Dra. Lucília Sousa, que fizeram a apresentação,
«O evento correu bem na medida das possibili-
assim como o Presidente da Câmara Municipal,
dades que tínhamos e foi um dia especial para
Dr. Filipe Menezes, e o seu executivo, a equipa
mim», afirma a autora, Rosa Marques, «apesar
do Gabinete da Cultura, que «tratou do evento
de a época do ano não ter sido a mais apropriada
com carinho, pela forma como elaboraram
para um evento desta natureza na ilha de Porto
os convites e o cartaz de promoção».
Santo, uma vez que as ligações marítimas para passageiros são inexistentes, apenas um barco
«Mar em Mim» marca a estreia literária de Rosa
de mercadorias assegura o transporte das
Marques e é um dos primeiros livros individuais
mesmas para que nesse campo nada falta na
com o selo Sui Generis. Deixamos, ao longo das
ilha. Podia ter contado com a presença de alguns
próximas páginas, as imagens do lançamento.
familiares e amigos [que residem na Madeira], mas o barco de passageiros “Lobo Marinho” faz,
Parabéns, Rosa Marques! Muitas felicidades na
nesta época do ano, a revisão que é necessária
sua trajectória literária, que acabou de iniciar… 34
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Em cima: Rosa Marques com o Dr. Filipe Menezes, Presidente da Câmara Municipal de Porto Santo. Em baixo: Rosa Marques com a professora Maria José Vital e a Dra. Lucília Sousa, que fizeram a apresentação do livro Mar em Mim.
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ENTREVISTA
ROSA MARQUES Rosa Maria Correia Marques nasceu na Madeira, onde viveu até aos dezoito anos. Após casar, mudou-se para Porto Santo, onde reside e trabalha como administrativa até à data. Preocupa-a a situação precária em que o mundo se encontra, a condição humana (principalmente as crianças) e todos os que vivem em condições desumanas, nos países subdesenvolvidos e nos países em guerra. Gosta de ler e de tudo o que está ligado à literatura e à arte. Participou em diversas obras colectivas em Portugal e no Brasil. Editou recentemente um Notebook, com cinquenta frases poéticas da sua autoria, através do Grupo Múltiplas Histórias, e o seu primeiro livro de poesia, «MAR EM MIM», pela Sui Generis. POR RICARDO SOLANO 43
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Até à (recente) publicação do seu primeiro livro, que percurso desbravou? Que caminhos trilhados? Sempre estive em contacto com os livros, fui autodidacta; insatisfeita com a impossibilidade de continuar a estudar na época em que acabei a escolaridade obrigatória, voltei à escola na fase adulta, já a trabalhar e com dois filhos, também em idade escolar. Nem sempre foi fácil conciliar tudo, mas completei o 12º ano, sem nunca deixar disciplinas para trás. Só comecei a partilhar algumas coisas do que escrevia muito mais tarde, quando surgiram as redes sociais. Participei em diversas antologias, editei um Notebook personalizado, com cinquenta frases poéticas da minha autoria, ao mesmo tempo que editava o meu livro de poesia «MAR EM MIM».
SG MAG – Quem é a Rosa Marques e em que momento surgiram as letras na sua vida? Como despontou o gosto pela escrita? ROSA MARQUES – Rosa Marques desde muito cedo aprendeu a valorizar a Natureza, encantando-se com a sua beleza e simplicidade, observando as mudanças ao longo do dia, das estações... Há na Natureza uma autenticidade, indispensável à vida. Os livros e a leitura são uma paixão e na adolescência foram um grande suporte, um refúgio. Através da leitura compreendeu que o mundo não se limitava àquele espaço onde vivia. E nessa sede de viajar pelo mundo conservou sempre o hábito de ler. Consciente das fragilidades que existem no mundo, e nas sociedades actuais, gosta de dar o benefício da dúvida, de acreditar nas pessoas... e que tudo pode ser mudado para melhor. Por vezes, recusa-se a acreditar na dura realidade tal como ela se apresenta. O gosto pela escrita surgiu ainda na adolescência e manteve-se ao longo dos anos... embora de uma forma sempre muito reservada.
De que modo é que a sua participação em diversas obras colectivas, aquém e além-fronteiras, viria a influir para a concretização de um sonho literário? A participação nas antologias foi muito importante, para conhecer e familiarizar-me com o meio literário. Foi a partir daí que tudo foi evoluindo e amadurecendo, até chegar à publicação de um livro individual.
Que importância atribui às obras colectivas? São uma mais-valia para quem está a começar e não só. Conhecer outros autores e os seus trabalhos, outras culturas... é de grande importância. Participar numa antologia é sempre muito gratificante.
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Como avalia o intercâmbio cultural promovido pela Sui Generis, especialmente entre Portugal e Brasil, através das antologias que organiza?
A participação nas antologias
foi muito importante, para conhe-
Muito positivo! Apesar de vivermos em países diferentes, é bom constatar que existem muitas ideias em comum... e afinidades. O intercâmbio cultural é uma experiência que enriquece e valoriza a cultura e as relações de amizade entre as pessoas dos dois países que falam a mesma língua. Portugal e Brasil, culturalmente, têm muito em comum...
cer e familiarizar-me com o meio literário. Foi a partir daí que tudo foi evoluindo e amadurecendo, até chegar à publicação de um livro individual.
De que consta o Notebook personalizado que editou em 2016? Como é constituído? E que tipo de frases inclui? O que reflecte? O Notebook é composto de uma bonita capa resistente com um magnífico desenho trabalhado, dando a impressão de alto-relevo. Tem cinquenta folhas... cem páginas. Em cada folha consta uma frase poética, que reflecte um sentimento, uma emoção, um breve pensamento... e foi uma forma agradável de utilizar as frases e ao mesmo tempo ter um livro personalizado para tomar notas. Serve para escrever uma poesia, uma dedicatória, etc... Os temas são sobre o amor, a Natureza e impressões de viagens.
Publicou um livro de poesia com o selo Sui Generis. O que a fez preferir a Sui Generis para editar a sua primeira obra? Eu já tinha participado em antologias do grupo Sui Generis e já conhecia o Isidro Sousa das redes sociais e o seu trabalho na área da escrita, até que, no início de 2016, tive oportunida-
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«Mar em Mim» abrange um vasto acervo de poemas que se debruçam sobre vários temas. Porquê uma tão grande variedade de temas numa só obra? Eu escrevo sobre o que me rodeia e isso abrange quase tudo. Gosto dessa liberdade de escrever sobre o que me inspira no momento, é essa a minha forma de estar na escrita; também na prosa acontece o mesmo. Não que eu queira ou escolha... mas é assim que as coisas em mim surgem. Como os temas eram tão variados, então escolhi um pouco de tudo para compor o livro...
A Natureza, o mar e as duas ilhas que fazem parte da sua vida são os temas predominantes na obra. O que a fascina ao escrever sobre eles?
de de conhecê-lo pessoalmente, em Lisboa, na apresentação da antologia «A Bíblia dos Pecadores». E através das conversas que tivemos, a forma entusiasta como ele falou, pude ver que é uma pessoa extremamente dedicada, com muito amor à escrita e aos livros. Foi um prazer conversar com ele... é uma pessoa com uma grande sensibilidade e que coloca empenho e rigor em tudo o que faz. Daí, a minha preferência pela Sui Generis.
Principalmente a beleza de que são dotadas; duas ilhas muito próximas, mas com características diferentes, cada uma com sua beleza. Escrever sobre as ilhas é vê-las na sua plenitude, no que elas têm de mais belo, olhar para além das dificuldades e do isolamento...
E porque optou por um livro de poesia para marcar a sua estreia literária?
Eu escrevo sobre o que me rodeia
Há em mim uma tendência maior para a poesia. As primeiras manifestações que tive na escrita foram na prosa poética. O procurar a rima para embelezar um texto, num trabalho para a escola ou uma carta para um familiar, na época em que ainda se escreviam cartas, e que eram escritas com todo o cuidado e amor. Por escrever mais poesia optei por publicar um livro de poemas.
dessa liberdade de escrever sobre
e isso abrange quase tudo. Gosto
o que me inspira no momento, é essa a minha forma de estar na escrita; também na prosa acontece o mesmo.
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Até que ponto poderemos considerar estes poemas reflexos da vida da autora?
senvolvidos e não só; as pessoas, na maioria crianças, que morrem de fome todos os dias... é revoltante; as guerras, que têm como única finalidade aniquilar e destruir... é lamentável. O ser humano luta pela vida, para consegui-la... e luta para destruí-la com o mesmo ou ainda mais vigor. Até quando esta cegueira? Que tipo de neblina lhes cobre a alma e a mente, para que tenham uma visão tão disforme e distanciada do que deveria ser a vida na Terra? A impotência sentida perante tais situações oprime... e é uma situação que tem vindo a agravar-se de dia para dia... sem solução à vista.
Quando escrevemos sobre o que sentimos em relação a algo, inevitavelmente a parte emocional transparece, principalmente na poesia. De uma certa forma, estes poemas reflectem muito de mim; a emoção, o amor à Natureza, o saudosismo da infância passada em comunhão com a Natureza... Aqui, o sentimento é real.
Mas também existem outras preocupações na sua poesia... Quais foram os critérios de organização dos 73 poemas que compõem o livro? Existe um fio condutor, algo que os interligue entre si, ou são um conjunto de textos poéticos independentes?
Sim, são situações que me causam muito desânimo e preocupação. A pobreza extrema dos países subde-
Como organizar os poemas, sendo os temas tão diversos? Foi a minha primeira preocupação logo no início, quando surgiu a ideia de publicar, mas rapidamente se resolveu. Em conversa com o meu amigo Isidro Sousa, que foi quem organizou o livro, ele desdramatizou logo o problema dizendo-me que sim, que era possível arranjar uma sequência para os poemas. E depois de algumas experiências e troca de ideias, chegámos a um consenso e optou-se por uma forma que acreditamos ser a melhor. No livro existem poemas que foram escritos há já alguns anos, outros são mais recentes, mas todos reflectem o amor à Natureza em geral, o amor aos livros e à leitura, o amor à vida... sentidos pela mesma pessoa. Acabámos por conjugar todos esses temas com a linha das quatro estações do ano, até porque elas também estão sempre, ou quase sempre presentes na minha poesia.
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O que é para si a poesia? E para que serve? A poesia é para mim uma forma de comunicação, um exteriorizar de sentimentos e emoções sentidas perante o que me rodeia, principalmente pelo belo, e quando isso acontece a poesia é sensibilidade, é ternura... por vezes fugaz, mas sempre ternura, deslumbramento... Mas também serve para exteriorizar a revolta, o descontentamento pelo que desagrada, pelo que choca... e magoa.
Existem muitas influências na sua escrita ou nem por isso? Quais são os autores que mais a seduzem? Eu sempre gostei de ler vários autores, mas o que escrevo tem mais a ver com o que sinto. Não sei precisar bem, pelo menos neste momento, se tem influências de outros autores... E porquê «Mar em Mim»? O que pesou na escolha deste título? Quais são as suas referências na literatura em geral? Que livros prefere ler?
O título «MAR EM MIM» surgiu pela grande influência, pelo fascínio que o mar exerce em mim desde sempre. Dividida entre as duas ilhas, Madeira, onde nasci e vivi até aos dezoito anos, e Porto Santo, onde vivo há trinta e oito anos, sempre com o mar por perto... precisando transpô-lo muitas vezes, para vencer as encostas íngremes da solidão. E porque o mar é um elo fundamental para quem vive nas ilhas, é parte integrante das nossas vidas... do qual dependemos. O mar como um amigo, um aliado servindo-nos de caminho, de elo de ligação ao exterior, mas também o mar adverso, interpondo-se com toda a sua imponência, condicionando... aprisionando-nos por vezes na ilha... e que nós apenas podemos respeitar... e esperar. Mas também pela sua incrível beleza, pela alegria das muitas crianças que todos os anos vêm brincar à roda da maré, na areia fina e dourada... por tudo o que o mar nos proporciona de bom.
Apesar de ler um pouco de tudo, na adolescência tive uma maior inclinação para o romance e para a poesia. Li muitos autores portugueses como: Camilo, Eça, Júlio Dinis, Ferreira de Castro, Aquilino Ribeiro, Vergílio Ferreira, Agustina Bessa Luís, Helena Marques, Alves Redol e muitos outros. Na poesia li: Camões, Almeida Garrett, Fernando Pessoa, Guerra Junqueiro, Antero de Quental, Florbela, Sophia M. Breyner, etc... não dá para os enumerar todos. Mas também muitos autores estrangeiros; entre os que me marcaram e estão sempre presentes: Erich Maria Remarque, Erico Veríssimo, Jorge Amado, Louise May Alcot, Charlotte Bronte, Jane Austen, Tolstoi, Dostoiévski, Colleen Mccullough, Colette, os poetas gregos, etc. Actualmente, leio mais autores contemporâneos: Mia Couto, Gabriel Garcia Marquez e, claro, as nossas antologias.
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A Rosa Marques é uma pessoa muito afável e isso transparece na sua escrita. Nota-se, por exemplo, o amor que dedica às (suas) duas ilhas... Eu nasci e sempre vivi nas ilhas... aprendemos a amar aquilo que conhecemos. Embora eu já tenha visitado outros lugares, não fico indiferente à beleza das ilhas, ao que elas nos proporcionam de bom. Apesar das dificuldades, que também existem. A Madeira é uma ilha muito bonita, tem paisagens deslumbrantes, não é por acaso que é considerada a pérola do Atlântico. Devido ao seu clima, tem uma fauna e flora rica em diversidade... magnífica! Tem o vinho que é famoso em todo o mundo, tal como o Vinho do Porto, e um conjunto de eventos que foram criados para o bem-estar da população, mas principalmente para acolher os visitantes, tais como: a festa da flor, o cortejo de carnaval, o espectáculo do fogo-de-artifício no fim de ano... e uma gastronomia excelente. O clima é ameno nas duas ilhas, a luminosidade é única. Porto Santo, uma ilha muito mais pequena do que a Madeira, 2 tem pouco mais de 42 km , mas com uma belíssima praia (com cerca de nove quilómetros), de águas tranquilas e mornas no Verão, com areia fina e dourada... limpa, onde todos os anos milhares de famílias se deslocam com as suas crianças para usufruir desse conforto, de uma paz que não tem preço. São duas ilhas com características muito sui generis, mas ambas muito bonitas!
Como define o meio cultural de Porto Santo, a ilha onde reside?
No que diz respeito à leitura, é um pouco como no resto do País. Existe em Porto Santo uma Biblioteca Municipal, muito bem equipada, com milhares de livros, mas a procura é escassa. É um povo que procura manter vivas as suas Foi muito importante fazer tradições na medida do possível, a apresentação do livro através das festas sacras e profanas. Todos os anos em Porto Santo, para a se festeja o São João, padroeiro divulgação do mesmo. da Ilha, com um bonito cortejo em que desfilam as marchas O evento foi preparado populares e que atrai muitos pelo executivo camarário visitantes, onde são recriados os usos e costumes da ilha: do através do Gabinete da trabalho aos trajes, das comidas Cultura, a quem agradeço à canção. As letras e músicas são feitas por poetas da Ilha. Há um a disponibilidade e todo o grupo de teatro, um grupo de carinho com que trataram folclore e outro de cantares, uma Universidade Sénior e dois de tudo... o cartaz de museus: um Municipal, no centro promoção e o convite da cidade, Museu Casa de Colombo, e o outro de iniciativa ficaram muito bonitos. particular, Museu Cardina, no Agradeço ao Dr. Filipe sítio da Camacha, que pode também ser visitado por quem Menezes, Presidente da desejar. Há uma preocupação Câmara, que mostrou boa com a cultura, mas Porto Santo é uma ilha pequena e por vezes vontade e disponibilidade não é fácil conseguir os meios e imediata, quando eu lhe apoios necessários... dificuldades falei que gostava de apreque se agravaram nesta época de crise, tal como no resto sentar o meu livro no Porto do País.
Santo, a todas as pessoas que compareceram e me ajudaram de alguma forma e às que não puderam
Pelo que transmite, sente limitações em Porto Santo. Enfrenta muitos obstáculos? Como os contorna?
estar presentes, mas que compraram o livro.
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Limitações e obstáculos sempre há, como em toda a parte, mas a conjuntura do mundo actual implica que se consiga fazer
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alguma coisa, mesmo em condições adversas. Baixar os braços não é solução e esperar por tempos melhores é uma incógnita. Manter-se ocupado... fazer algo de que se gosta é a melhor forma de resistir às adversidades.
E como caracteriza o meio cultural da Madeira, onde se desloca com frequência? A Madeira é diferente, é uma ilha maior, muito populosa, aberta ao mundo, visitada por imensos navios de cruzeiro e milhares de turistas. Ao longo dos séculos a Madeira sempre beneficiou de outra atenção por parte dos governantes; por isso, é mais desenvolvida. É uma ilha que vive do turismo... e muitas iniciativas foram promovidas nesse sentido. As instituições principais estão na Madeira.
com a presença do edil. Em que medida se revelou importante este apoio institucional? Foi muito importante fazer a apresentação do livro em Porto Santo, para a divulgação do mesmo. O evento foi preparado pelo executivo camarário através do Gabinete da Cultura, a quem agradeço a disponibilidade e todo o carinho com que trataram de tudo... o cartaz de promoção e o convite ficaram muito bonitos. Agradeço ao Dr. Filipe Menezes, Presidente da Câmara, que mostrou boa vontade e disponibilidade imediata, quando eu lhe falei que gostava de apresentar o meu livro no Porto Santo, a todas as pessoas que compareceram e me ajudaram de alguma forma e às pessoas que não puderam estar presentes, mas que compraram o livro; a todos, muito obrigada!
Utiliza bastante as redes sociais para divulgar o seu trabalho. Até que ponto as considera importantes? Quais as mais-valias do Facebook e afins? As redes sociais são uma grande ajuda, um meio de divulgação, mas também têm muitos riscos e, por vezes, é preciso ter cuidado, contornar os obstáculos... é um mundo por onde facilmente circula bom e mau. Mas foi através das redes sociais (Facebook) que tomei conhecimento com o meio literário... e através desse conhecimento comecei a participar nas antologias.
Sente-se realizada com a publicação deste livro? O lançamento de «Mar em Mim» ocorreu no dia 27 de Janeiro, no Salão Nobre do Antigo Edifício dos Paços do Concelho, em Porto Santo, tendo contado
Sim, sinto-me feliz por ter realizado uma etapa, e que certamente me levará a empreender novos projectos... com a ajuda de Deus.
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Que lhe apraz dizer sobre o trabalho e acompanhamento por parte da Sui Generis? Alguma desilusão?
muitas obras e autores não terão a devida apreciação. E nisso as tecnologias têm também muito a ver. Por exemplo, os jovens de hoje em dia não sentem a necessidade de ler, porque a informação (boa ou má) chega-lhes através das tecnologias e de uma forma mais fácil. Pegar num livro, observá-lo e ler... não diz nada à maioria; não têm paciência para ler, porque têm tudo de uma forma mais facilitada. Os jovens não têm culpa, nem a noção da diferença, porque nasceram na era da tecnologia e usam aquilo que conhecem. Apesar de não conhecer muitas editoras, sei que existem, em Portugal, algumas que são credíveis, que se preocupam para além da parte lucrativa... e isso é muito bom, para termos uma produção de qualidade em todos os sentidos, desde a correcção à impressão. Actualmente, já é possível encontrar livros a um bom preço, principalmente na época das feiras; aparecem boas promoções e é uma excelente oportunidade para adquirir mais alguns livros.
Muito bom, desde o início até à finalização; sempre acompanhei todo o processo através das conversas com o meu amigo Isidro Sousa, até o livro dar entrada na gráfica. E depois até ao envio pelo correio... Como é o Isidro que faz todo o trabalho até o livro ser enviado para impressão, por vezes fica difícil para ele cumprir os prazos estabelecidos de início, isso deve-se ao facto de ele ter também outros trabalhos de revisão de textos e organização das antologias, e do rigor que coloca em tudo o que faz, mas é uma situação compreensível e, afinal, o mais importante é o resultado final.
Após «Mar em Mim», que planos tem para breve? Certamente, já está a pensar noutra obra. Pode levantar um pouco a ponta do véu? Em que consistirá o próximo livro de Rosa Marques? E para quando? Sim, há planos... mas definir um prazo é ainda muito precoce, apesar de eu ter algumas coisas escritas, em prosa e também em poesia. Acabei de editar o livro de poesia «Mar Em Mim» há pouco e estou ainda fazer a sua promoção, a ver como corre. Até agora, tem sido muito positivo, mas há outras coisas a ter em conta... o factor económico também.
Que mensagem gostaria de transmitir aos leitores em geral e autores em particular? Porque acho que todos nós ainda podemos aprender muito com os grandes mestres, deixo duas frases de que gosto muito; uma de Carl Sagan: «Um livro é a prova de que os homens são capazes de fazer magia». E outra de Herman Hesse, que nos mostra bem algumas das vertentes que é ler um livro: «Ler um livro é para o bom leitor conhecer a pessoa e o modo de pensar de alguém que lhe é estranho. É procurar compreendê-lo e, sempre que possível, fazer dele um amigo».
Como vê o panorama literário português? Há um contraste: tem-se publicado muito nos últimos tempos em Portugal, há imensa gente a escrever (e ainda bem) mas lê-se pouco... isso significa que
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CONTO
CASINHA MUSICADA “Eles falam que eu sou muito arteira e tudo que acontece de errado acham que foi minha culpa. Mas, desta vez, foi mesmo. Tudo começou quando, há dois meses, cheguei à escola e vi uma coleguinha ouvindo um radinho à pilha, na hora do recreio. Fiquei encantada. De repente me lembrei de que meu aniversário estava se aproximando e adivinhem o que foi que eu pedi? Papai no momento negou, como sempre, mas no dia seguinte, quando notou meu entusiasmo, acabou prometendo aquele tão sonhado radinho. A cada dia minha expectativa aumentava, mas mesmo assim, às vezes, ficava duvidando e pensando: «Será que vou ganhar mesmo? Será que papai vai cumprir sua promessa?” POR LIA MOLINA 57
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sta é a quarta vez que tento escrever esta história. Fico me lembrando das coisas que aconteceram, mas aí recordo das brincadeiras da tia Elaine e tudo se mistura em minha cabeça. Até parece que ela inventava algumas mentirinhas, só para que a história ficasse mais divertida, e saía contando por aí. Esta história foi motivo de risos e broncas. Riso dos coleguinhas e de meus irmãos e broncas do papai e da mamãe. Eu vou tentar explicar do meu jeito, isto é, do jeitinho que aconteceu. Eu sou uma menina de doze anos de idade. Meu nome é Elizabeth, mas me chamam de Betinha. Eu moro em uma casa com um quintal enorme, com pés de laranja, limão, manga e quase
tudo que tem em uma chácara. Gosto muito de brincar nesse quintal. Em minha casa moram o meu pai, a minha mãe e os meus dois irmãos. Eles falam que eu sou muito arteira e tudo que acontece de errado acham que foi minha culpa. Mas, desta vez, foi mesmo. Tudo começou quando, há dois meses, cheguei à escola e vi uma coleguinha ouvindo um radinho à pilha, na hora do recreio. Fiquei encantada. De repente me lembrei de que meu aniversário estava se aproximando e adivinhem o que foi que eu pedi? Papai no momento negou, como sempre, mas no dia seguinte, quando notou meu entusiasmo, acabou prometendo aquele tão sonhado radinho. A cada dia minha expectativa aumentava, mas mesmo assim, às vezes, ficava duvidando e pensando: «Será que vou ganhar mesmo? Será que papai vai cumprir sua promessa?» Todos os dias eu demorava a dormir, pensando no meu presente de aniversário. O tempo passou e o dia tão esperado chegou. Papai me presenteou com um radinho à pilha alaranjado, bonitinho e brilhoso, que passou a ser meu companheiro inseparável. Ficava longe dele só na hora de dormir e na hora de ir para a escola, como prometi ao papai. Essa promessa não foi nada fácil de cumprir, mas acabei me acostumando. Ficava com ele ligado o dia todo e, na hora de fazer o dever de casa, mamãe zangava comigo, mas combinei com ela que ia ligar bem baixinho. Ainda bem que ela deixou! Quando chegava da escola, mal tirava o uniforme, já ligava meu radinho e só desligava na hora de ir dormir. Um dia, meu companheiro cantor caiu na fossa da casinha do quintal. Levei um grande susto e, pra variar, mais outra bronca da mamãe. Mas não me importei. Fiquei muito triste e preocupada, pensando: «Como vou viver sem o meu amigo cantor? Como vou contar para o papai quando ele voltar?»
Quando chegava da escola, mal tirava o uniforme, já ligava meu radinho e só desligava na hora de ir dormir. Um dia, meu companheiro cantor caiu na fossa da casinha do
quintal. Levei um grande susto e, pra variar, mais outra bronca da mamãe. Mas não me importei. Fiquei muito triste e preocupada, pensando: «Como vou viver sem o meu amigo cantor? Como vou contar para o papai quando ele voltar?» Eu sabia que a repreensão dele ia ser bem maior do que a da mamãe.
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Eu sabia que a repreensão dele ia ser bem maior do que a da mamãe. Ainda bem que tia Elaine estava passando uns dias lá em casa e me orientou como falar com papai. Ela ficava o tempo todo ao meu lado, defendendo-me. A primeira coisa que ela me disse foi: – Eh, menina! Agora temos música todo dia e toda a hora. A nossa casinha virou uma “casinha musicada”. O pior de tudo é que papai já havia dito que se eu perdesse o meu radinho não iria ganhar outro. Ficava ainda mais triste só de pensar nisso, e matutando: «Ah, meu Deus, será que ele irá mesmo cumprir sua promessa? E eu terei então que ouvir o radinho somente de longe, lá da casinha?» Pensei, então, que teria que chorar muito e espernear até conseguir convencê-lo novamente. E tia Elaine, com seu ar de brincalhona, comentou: – Acho que você terá que ficar ouvindo músicas até a pilha acabar. Duvido que seu pai te dê outro. Quando ele promete, cumpre mesmo. Isso me deixava cada vez mais angustiada, e ficava pensando: «Será que papai vai me dar outro radinho?» Essa dúvida me fazia chorar todos os dias. Papai estava viajando e, quando retornou, eu nem sabia como falar a ele o que havia acontecido. Ele me abraçou e comecei a chorar sem parar. Ele então perguntou o que havia acontecido. Depois que eu contei a história, ele me consolou dizendo: – Não precisa ficar tão triste assim, menina! Papai vai te dar outro, mas só se você prometer que irá ficar com ele somente dentro de casa e vai ter mais cuidado para não perdê-lo novamente.
No dia seguinte, papai chegou com um novo radinho e me fez prometer que desta vez eu iria ter mais cuidado. Nesta hora eu disse chorando: – Eu prometo! Eu prometo papai, que não vou perder meu radinho nunca mais! Ele sorriu e perguntou: – O que você está esperando para ligar o rádio, menina? Quando liguei, ouvi a voz do Wanderley Cardoso cantando: “Parece que eu sabia, que hoje era o dia de tudo terminar...” Fiquei ainda mais alegre, pois esse era um dos meus cantores preferidos e, nessa hora, entendi que, depois de tudo isso que aconteceu, essa história terminou mesmo.
Goiana, nascida em São Luís de Montes Belos, em 1955, Lia Molina, pseudónimo de Marilin Manrique Molina, reside em Uberlândia (MG), Brasil. Publicou dois livros: «Dia a Dia em Poesia» (Books Editora) e «A Busca Pela Felicidade e Outros Contos» (Editora Becalete). Participações em obras colectivas: «Sarau Brasil 2014» e «Sarau Brasil 2015» (Vivara Editora); «Emoções Poéticas II» e «Inspiração em Verso II» (Editora Futurama); «Rede de Palavras» e «Memórias e Passagens de um Tempo» (Editora Scortecci); «Poesias Encantadas IX» (Editora Becalete); em Portugal, é co-autora de quatro antologias organizadas por Isidro Sousa: «Boas Festas», «A Bíblia dos Pecadores», «Vendaval de Emoções» e «Graças a Deus!» Página no Facebook: https://www.facebook.com/marilin.molina.5
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APRESENTAÇÃO
ALMAS FERIDAS Primeiro livro da autora Suzete Fraga, uma edição Sui Generis lançada no dia 11 de Dezembro de 2016 “Filha do Minho, esta vimaranense tem o coração perto da boca e as suas palavras são sempre ditas com uma paixão contagiante, própria de quem acredita em si e nas suas capacidades. Põe todo o seu ser em tudo o que faz e por isso estamos aqui hoje a celebrar o lançamento do primeiro livro daquela a quem, com muito orgulho, chamo “irmã das letras”. Se por um lado ela se tornou admiradora dos meus trabalhos e não perde um livro nem um lançamento, por outro lado, a leitura de alguns dos seus escritos deixaram-me ansiando por este momento, onde finalmente deixaria que o mundo espreitasse sobre o seu ombro para ver a qualidade dos textos que saem da sua fértil imaginação.” POR MANUEL AMARO MENDONÇA 63
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s raparigas do Norte têm belezas são sempre ditas com uma paixão contagiante, perigosas, olhos impossíveis. própria de quem acredita em si e nas suas capaciTêm o ar de quem pertence a si própria. dades. Põe todo o seu ser em tudo o que faz e por Olham de frente. Pensam em tudo e dizem tudo isso estamos aqui hoje a celebrar o lançamento do o que pensam. Confiam, mas não dão confiança. primeiro livro daquela a quem, com muito orguAcho-as verdadeiras. Acredito nelas. lho, chamo “irmã das letras”. Se por um lado ela Gosto da vergonha delas, se tornou admiradora dos meus trabalhos e não da maneira como coram quando se lhes fala perde um livro nem um lançamento, por outro e da maneira como podem lado, a leitura de alguns dos puxar de um estalo ou de uma seus escritos deixaram-me anpanela, quando se lhes falta siando por este momento, onao respeito. de finalmente deixaria que o «Todos estes trabalhos São mulheres que possuem; mundo espreitasse sobre o estão repletos de figuras são mulheres que pertencem. seu ombro para ver a qualidaAs mulheres do Norte de dos textos que saem da sua de estilo e descrições deveriam mandar neste país. fértil imaginação. de sentimentos capazes Têm o ar de que sabem Entre as várias coisas que de nos fazer viver tudo o que estão a fazer. sobressaem na escrita da SuMiguel Esteves Cardoso zete, estão a forma como cono que os seus personagens segue fazer-nos sentir e recosentem. É a sensibilidade nhecer coisas do nosso dia-ana observação destes dia, às quais não deitamos importância, mas que fazem parpormenores e a forma te de nós e da “música de funcomo são descritos Este pequeno excerto de do” que acompanha o filme da que me fez perceber um texto de Miguel Esteves nossa vida. No seu conto «InCardoso respeitante ao Norte visibilidade», merecidamente estar perante um sério de Portugal assenta como uescolhido para a coletânea caso de sucesso e prever ma luva na minha amiga Suze«Caprichos & Virtudes», deste Fraga que penso estar a vique o “nascimento” creve aquela pessoa com ver hoje [11 de Dezembro de quem nos cruzamos todos os do seu primeiro livro 2016] um dos dias mais felizes dias, mas fingimos, ou não veseria apenas uma da sua vida. O lançamento de mos de todo. um livro deve ter o mesmo saquestão de tempo.» Vou citar um pequeno exbor que receber nos braços o certo: “O seu passo apressado filho acabado de nascer. E ela engolia a solidão das bermas já pode falar destes dois casos enquanto camuflava a própria por experiência própria. solitude. Palmilhava as ruas da aldeia num incesDesde os nossos primeiros contactos, via Facesante vaivém. Depois, a noite caía e só na madrubook, que parece ser o método natural de se cogada seguinte voltaria a ser vista. Nunca ninguém nhecer as pessoas nos nossos dias, se gerou entre lhe dedicava uns míseros minutos, a menos que nós uma empatia e uma amizade que parece veprecisassem de algum favor. Nunca lhe perguntalha de anos. Filha do Minho, esta vimaranense vam como estava. Não fosse o barulho dos seus tem o coração perto da boca e as suas palavras passos e seria completamente invisível”. 64
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vos anos de maus tratos e acusações infundadas, enche-se de coragem e toma finalmente uma atitude. Noutro ainda, uma jovem, vítima do assédio de um professor da “velha guarda” que agride os alunos e foi responsável pela desgraça de vários dos antigos pupilos, descarrega acusações e “cospe” o seu desprezo numa carta cheia de palavras duras. Todos estes trabalhos estão repletos de figuras de estilo e descrições de sentimentos capazes de nos fazer viver tudo o que os seus personagens sentem. É a sensibilidade na observação destes pormenores e a forma como são descritos que me fez perceber estar perante um sério caso de sucesso e prever que o “nascimento” do seu primeiro livro seria apenas uma questão de tempo e, principalmente, que este livro será apenas o primeiro, pois outros o seguirão.
Os seus personagens são multifacetados e tão diferentes uns dos outros, como se dos diversos heterónimos de Pessoa se tratassem. Noutro dos seus contos, a protagonista é tão supereficiente como supertrapalhona e especialista em arranjar “bodes espiatórios” quando não consegue executar uma tarefa que, diga-se de sua justiça, não lhe foi entregue atempadamente. Num outro, a triste realidade da violência doméstica é cruamente representada e a submissa esposa, alvo de sucessi-
Intervenção de Manuel Amaro Mendonça na sessão de lançamento do livro «Almas Feridas», de Suzete Fraga, no dia 11 de Dezembro de 2016, em Póvoa de Lanhoso
Manuel Amaro Mendonça nasceu em Portugal, em São Mamede de Infesta, reside no concelho de Matosinhos e é licenciado em Engenharia de Sistemas Multimédia pelo ISLA de Gaia. Tem três livros publicados pela CreateSpace e distribuídos pela Amazon: «Terras de Xisto e Outras Histórias» (2015), «Lágrimas no Rio» (2016) e «Daqueles Além Marão» (2017). E tem participações com contos de sua autoria em mais de uma dezena de obras colectivas de várias editoras como a Papel D’Arroz, Sui Generis, Silkskin Editora e Lua de Marfim. Foi distinguido com o 3º Prémio no 6º Concurso Literário da Papel D’Arroz Editora e com o 1º Prémio no 7º Concurso Literário da mesma editora. Mantém o blogue http://manuelamaro.wixsite.com/autor, onde se apresenta publicamente e publica alguns dos seus trabalhos.
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CRÓNICA
SERENATA EM VENEZA POR JERACINA GONÇALVES
“Uma Torre de Babel bem-disposta, neste bar iluminado por uma luz difusa, que convida ao sonho e abre espaço para a imaginação, no convite que me chega na voz jovem, bem timbrada e deliciosamente cantante do italiano, a pequena distância de mim, que me conduz a Veneza, embalada na carícia da voz quente, romântica, do gondoleiro numa toada de amor, que ouvimos durante um passeio de gôndola pelos canais, numa noite de trovoada e chuva torrencial, abrigados sob um tolde amarelo.”
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ntro no átrio do hotel e subo as escadas para o primeiro andar onde decorre o Congresso, agora no intervalo das sessões da manhã. Em pequenos grupos ou individualmente os Congressistas deambulam por ali em volta das pequenas mesas redondas espalhadas pelo átrio, que oferecem biscoitos e bebidas: café, chá, sumos e água. Debicando aqui um biscoito, uma bolacha ali, trocam cumprimentos, discutem aqui a última comunicação, contam além a última anedota recebida ontem por e-mail, visitam os vários stands de propaganda, que procuram atrair os olhares da clientela sobre os seus produtos, oferecendo pequenos brindes: esferográficas, blocos de “postitas” e outras pequenas lembranças. Procuro o Rui derramando o meu olhar por entre aquela miscelânea de stands, mesas e pessoas de todas as idades, sexos e raças, trajando variados estilos, com predominância para a despreocupada e corriqueira calça de ganga complementada por uma t-shirt – tanto homens como mulheres. Não o encontrando em lado algum, fico à espera que apareça, uma vez que já verifiquei a sala de trabalhos, e está vazia. Minutos depois chega junto de mim vindo de um qualquer lado, que não me apercebi, porque, entretanto, distraí-me a observar os stands em volta e a enorme quantidade de objetos disponíveis para oferta, que os visitantes vão metendo em grandes sacos de plástico. Cumprimenta-me com um beijo na face e propõe-me tomar um café, o que aceito. Descemos então as escadas, atravessámos o á-trio do résdo-chão, saímos para a rua e entrámos no pequeno café,
ali mesmo, ao lado do hotel. Pediu um café e uma água para mim. «Já tomei café. A última sessão foi um bocado chata e estava meio ensonado quando saí da sala. Comecei por tomar um café e comer umas bolachas, e depois fui à casa de banho», disse. Tomado o meu café e a minha água, regressámos ao hotel. E, logo depois, recomeçam os trabalhos. «Bom, vou entrar. Também vens?» – Não. Vou ficar por aqui a ler. Daqui a bocado, se calhar, vou dar uma volta por aí. Costumo reger-me por aquele ditado antigo que diz que “o saber não ocupa lugar”. E, embora não faça parte desta mesma “guerra”, e a minha formação seja outra, habitualmente gosto e assisto às comunicações. E não me tenho arrependido. Mas hoje estou com pouca paciência para ouvir falar de doenças, remédios e casos clínicos, e deixo-me ficar sentada no átrio do hotel a ler o conto «Budapeste», de Chico Buarque, que conta a desventura de um brasileiro a lidar com a língua húngara, que “o diabo respeita”, diz ele, numa escrita escorreita e fluente.
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«O Chico escreve bem», dou comigo a pensar, enquanto leio o pequeno conto.
bebericando, enquanto observo o ambiente exuberante e, ao mesmo tempo, elegante, de pessoas, sempre diferentes, que permanentemente entram e saem, e se movimentam de um para o outro lado no átrio do hotel. Bem como as que se encontram à minha volta no bar. E reparo que, do meu lado esquerdo, uma executiva, elegante no seu fato preto, está no “bate-papo” com quaisquer parceiros, em qualquer lugar do mundo, já
*** Aproxima-se a hora do lanche e decido ir para o bar, àquela hora bastante movimentado. Consigo porém arranjar uma mesa vaga, sento-me e peço uma torrada com um chá verde, que vou 69
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que as novas tecnologias assim o permitem. rem por todos os lados e prontos a sugarem-lhes Atentando no tom cantante, mas sério, que o sangue, insinuando-se insidiosamente, iludindodeixa chegar até mim, sem no entanto me chegaas com palavras mansas e promessas traiçoeiras, rem palavras audíveis que possa reconhecer ou fazendo-se passar por amigos. Se não estiverem interpretar, os seus interlocutores devem ser italiavisadas, deixam-se cair e levar para o abismo, anos. Certamente está a tratar de negócios e serespecialmente em algumas fases do seu crescive-se das vantagens das novas tecnologias e das mento. A atenção discreta – para que não se sinfacilidades dos tempos modernos, que colocam os tam vigiadas (isso revoltá-las-ia) – dos pais, é inpontos mais distantes da Terdispensável. ra ao alcance de um pequeno Há que haver muito cuidaclique e permitem as interado e vigilância. ções mais diversas, desde os Mas, claro, tem muitos asHá muita coisa perversa negócios ao amor, passando petos muito positivos e úteis. a espreitar um inadvertido por muitas outras coisas, alComo em tudo, tem de hadescuido nosso. Muitos gumas bem perversas e prejuver sabedoria na escolha dadiciais à humanidade e ao quilo que se usa e saber disperigos nos espreitam, mundo. E começo a refletir socernir e aproveitar os aspetos para os quais temos bre esta facilidade de comunipositivos e afastarmo-nos dos de estar bem avisados cação. Esta facilidade de estar negativos. em contacto com quem quer e sempre de sobreaviso, que seja, em qualquer parte *** especialmente as pessoas do mundo. Gente que não se inseguras, crédulas, conhece, de quem se descoAs mesas do bar, que ennhecem hábitos, carácter, cultretanto se foram esvaziando, tímidas… e, muito particutura, educação… mas que, à vão-se enchendo de novo, larmente, as crianças distância de um clique, são apouco a pouco, de estrangeique, muitas vezes, são migos/as, parceiros/as de neros jovens. Executivos. Hogócios, namorados/as... mens e mulheres vestidos foratraídas para armadilhas Mas, se calhar, esta facilimalmente. terríveis, por vampiros dade de comunicação não tem Chegam da cave por umas a espreitarem por todos apenas vantagens. escadas que me ficam em Infelizmente há sempre frente, pelo elevador, e outros os lados e prontos a quem aproveite para o mal e vêm mesmo de fora, da rua. sugarem-lhes o sangue. para o crime, tudo o que de Todos pertencem ao grupo bom, de útil, de vantajoso pada executiva de fato preto, ra o desenvolvimento humano semtada do meu lado esquerse vai descobrindo, inventando, construindo. Há do, em videoconferência com os seus confrades. E muita coisa perversa a espreitar um inadvertido alguns sentam-se à sua mesa e fazem-me chegar descuido nosso. Muitos perigos nos espreitam, um amalgamado de sons, uma mestiçagem de para os quais temos de estar bem avisados e vozes sem destrinça de palavras capaz. Sons alesempre de sobreaviso, especialmente as pessoas gres: euforia nos rostos, alegria nas vozes. inseguras, crédulas, tímidas… e, muito particularUma Torre de Babel bem-disposta, neste bar mente, as crianças que, muitas vezes, são atraídas iluminado por uma luz difusa, que convida ao sopara armadilhas terríveis, por vampiros a espreitanho e abre espaço para a imaginação, no convite 70
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que me chega na voz jovem, bem timbrada e deliciosamente cantante do italiano, a pequena distância de mim, que me conduz a Veneza, embalada na carícia da voz quente, romântica, do gondoleiro numa toada de amor, que ouvimos durante um passeio de gôndola pelos canais, numa noite de trovoada e chuva torrencial, abrigados sob um tolde amarelo. Sob a ponte dos Suspiros ouvimos a serenata. Lembras-te? Éramos um grupo grande. Um autocarro cheio. Mas a trovoada afastou os outros do passeio de gôndola. Desistiram. Porém, nós não quisemos desistir. Éramos quatro na gôndola: eu, tu, a Laura e o Sílvio. Momentos felizes, de riso espontâneo, alegre, sob o oleado amarelo que nos protegia da chuva torrencial. Riso saído das profundezas da alma. Momentos gravados na minha alma a tinta indelével, que hoje saltaram sob o impacto da voz quente do jovem italiano, que subiu da cave do hotel ao encontro dos seus jovens compatriotas, no recinto do bar deste hotel. Quantos anos já lá vão, meu Deus! Foi durante um passeio a Itália, feito de autocarro, numas férias de Agosto. E aquele momento estava aqui, escondido em mim, preso em qualquer recanto da minha memória, e saltou, espontâneo, como se estivesse à espera da mola que o fizesse despoletar.
JERACINA GONÇALVES Nasceu numa vertente da Serra do Marão. Criada com simplicidade entre o verde dos campos, o alcantilado dos montes foi a sua alma formada e foi-lhe também facultado o ABC das letras, cumulado com o da vida. Desceu depois à cidade, prosseguiu a formação e obteve os requisitos para exercer a profissão. Aquém e além do mar, durante 36 anos, exerceu o Magistério: desbravou virgens terrenos e escreveu páginas belas de amor e devoção. Páginas que também leu. Com as quais se inebriou. Guarda-as no coração. Publicou poemas, crónicas de viagens, contos e um livro de poemas («Janela Aberta», edição de autor). Durante vários anos, organizou os jornais «Rua da Imaginação», da última Escola onde exerceu, e «A Turma dos Estudiosos», ambos agraciados com um prémio do “Público”. Blogue da autora: https://aposviagem.blogspot.pt
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CONTO
IMPACTO SUPREMO ELICIO SANTOS NASCIMENTO Escreve por teimosia e ama parir textos, desde que não sejam estéreis. Tem dois livros publicados e cinco saindo do forno. Participou em dezenas de antologias. Reside em Ilhéus, Brasil. Página do Autor: www.facebook.com/elicio.santos.35
“A mesa do café, antes desmontada, é refeita pela mãe que leva as panelas do fogão às vasilhas especializadas. O bocado das refeições e bate-papos é o mesmo, na mesa comprida e forrada com a velha toalha de flores, diligentemente lavada pela dona da casa. As reuniões digestivas costumavam fluir embaladas por triviais ensejos, ora sobre futebol ora novelas ou fuxicos acerca dos fatos recentes da vizinhança. Mas, há dias, o tema mudou-se para a permanência ou não dos empregos e a ação em suspense nas almas dos maiores prejudicados, a comunidade nativa, entre quilômetros de riquezas florestais e a indiferença, na grande cidade fronteiriça.”
POR ELICIO SANTOS DO NASCIMENTO
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mesa. A menina observa a mistura das conversas, embalada pelo retinir dos garfos e copos e mastigações e assopros. O pai e a mãe comentam, entre dentes, a burrice dos tais “ambestalista”, como de praxe os denominam. O avô se mete berrando maldições, aos mesmos endereçados: «Peste de gente burra, sô!» «Brigar com quem dá sustento pra nós!»... A garotinha lembra, com medo, a parte final do sonho que teve há pouco. Na verdade, um pesadelo que ainda não teve coragem de desfiar para a mãe, a quem jamais negou as confidências infantis. Atiram-se repreensões, temores, farelos de pão, saliva ao ar hostil, cujo alvo é o grupo ligado à natureza (tido como inimigo pelos trabalhado-
res) que ameaça fechar a mineradora, fonte de renda para o lar, cujos membros dependem dos serviços braçais. Findo o diálogo nervoso, a família se despede. Um a um se dirige ao ofício, ensacar e abastecer caminhões. A garotinha fica algum tempo na frente da casa em construção, meio barraco e meio casa de tijolos, ainda com o reboco à mostra. Corre. Puxa a saia da mãe que, de costas a ela, esfrega os talheres que abarrotam a pia. «Que foi, menina?», diz sem atenção. «Mãe, eu tive um sonho ruim e...» «Tá, filha... tá bom.» «Mas, mãe!» «Despois cê me fala, tá bom? Agora a mãe tá ocupada.» A pequena desiste. Entende que não acreditarão nela. Qual adulto daria entusiasmo ao sonho de uma fedelha de nove anos? Corre a manhã. A mesa do café, antes desmontada, é refeita pela mãe que leva as panelas do fogão às vasilhas especializadas. O bocado das refeições e bate-papos é o mesmo, na mesa comprida e forrada com a velha toalha de flores, diligentemente lavada pela dona da casa. As reuniões digestivas costumavam fluir embaladas por triviais ensejos, ora sobre futebol ora novelas ou fuxicos acerca dos fatos recentes da vizinhança. Mas, há dias, o tema mudou-se para a permanência ou não dos empregos e a ação em suspense nas almas dos maiores prejudicados, a comunidade nativa, entre quilômetros de riquezas florestais e a indiferença, na grande cidade fronteiriça. A pequena observa o esforço da mãe, como quem acha no futuro uma grande perda de tempo. Permanece entre as bonecas e os jogos de montar. Vê em cada esboço da genitora e do ambiente repetições. Contudo, não quer mais fugir ou evitar o inevitável, acomoda-se à espera. Um a um acomoda-se à sala para almoçar. Reinstala-se a comunhão barulhenta de alimentos. A menina prolonga-se na brincadeira. Rejeita unir-se aos outros, fato inédito. A mãe estranha, haja vista que a garota sempre amou a comida e o
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Um a um acomoda-se à sala para almoçar. Reinstala-se a comunhão barulhenta de alimentos. A menina prolongase na brincadeira. Rejeita unir-se aos outros, fato inédito. A mãe estranha, haja vista que
a garota sempre amou a comida e o comer entre os parentes, seja para o desígnio comum ou para absorver as falas dos adultos e imitá-los em segredo, quando dada às travessuras fantasiosas misturadas à realidade apreendida. Mas tudo bem. A dona de casa entrega a filha às manias da idade.
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comer entre os parentes, seja para o desígnio comum ou para absorver as falas dos adultos e imitá-los em segredo, quando dada às travessuras fantasiosas misturadas à realidade apreendida. Mas tudo bem. A dona de casa entrega a filha às manias da idade. No meio de uma imprecação atropelada sobre a mineradora, melhor, sobre os adversários dela, a menina se ergue. Caminha até a frente do casebre onde nasceu e constituiu-se. Mira as árvores ao redor e derredor, cujas copas parecem tocar o céu límpido de uma área quase intocada pelo progresso humano, não fosse a visão da grande barragem cercada de construções em forma de pequenos prédios, ao longe, bem próxima ao horizonte que demarca o limiar à estrada empoeirada cujo destino é a metrópole, chegada à menina só de escutar. Nada incomum. O único embaraço vem do lar, a mesma confusão vocal. O peito cân-
dido acredita na mentira do prenúncio, suspira aliviado. A pequena agradece. Volve-se à entrada familiar, como se a certeza do último sonho se dissipasse. Entra. Roga à mãe um prato fundo, cheio de feijão e carne, suas porções favoritas. Algumas colheradas... Estrondo! A mesa e o chão e o teto sacodem ao ponto de jogar a comida aos ares e os comedores à lona. Cada um para um lado, enquanto a menina voa pela janela. Estatela-se consciente... A única testemunha (do mesmo sangue) que contempla a imposição da gigantesca massa cinzenta. Absoluta. Como um rolo compressor sobre qualquer forma de vida, morta... Ou prestes a morrer. 75
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OPINIÃO
EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA “O homem-cidadão é não só o problema mas, com boa vontade e determinação, a solução do problema. Contribuir para a resolução do problema corresponde a dotar o homem de novas competências sociais e cívicas, educá-lo, formá-lo e capacitá-lo para uma nova atitude face à vida, aos homens e ao mundo. Nesse sentido, o pólo de desenvolvimento e fio condutor da presente reflexão sustentam-se neste novo homem, valorizado pela cultura luso-brasileira, em particular, pela lusofonia em geral e pelos valores universais circunscritos pela Educação, pela Formação, pela Filosofia, pelo Direito e pela Religião.” POR DIAMANTINO BÁRTOLO 77
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«O carácter, tanto no domínio das coisas grandes, como no domínio das pequenas, consiste em o homem dar firme continuidade àquilo para que se sente capaz.» (GOETH, 1992:177)
pobreza extrema, desemprego, impostos insuportáveis que travam o desenvolvimento das empresas e dos particulares que, à custa de muito trabalho e poupança, pretendem uma vida melhor para os próprios e família; persistente violação de direitos humanos; insuficiente democratização na asegunda década do bordagem de diferentes situaséculo XXI apresentações; dificuldade no exercício se à comunidade munde uma cidadania plena, endial como uma esperança, tendida na fruição de direitos Do nascimento de um mas também transportando e cumprimento de deveres e, esboço de democracia toda uma carga negativa de finalmente, pouca preparação conflitualidade e indiferença de muitos cidadãos para asna antiga Grécia à depelos mais elementares direisumir as responsabilidade que tos e deveres, que a cada cilhes cabem nos diferentes mocracia do século XXI, adão e aos governos compete contextos societários. A tarefa um longo caminho observar. para reduzir os impactos neA preocupação coloca-se gativos das situações resultanjá foi percorrido e, na impreparação que o indivítes daquelas insuficiências embora os conceitos duo humano vem manifestannão é fácil e a reflexão sobre do e consequente incapacidaestes temas já vai no terceiro clássicos se mantede para: por um lado, evitar milénio. nham relativamente determinados conflitos e, por Do nascimento de um esoutro lado, resolver as situaboço de democracia na antiga atualizados, no que ções que afetam a qualidade Grécia à democracia do século à democracia respeita, de vida ao nível das relações XXI, um longo caminho já foi humanas interpessoais. percorrido e, embora os cona prática e atitudes de A humanidade atravessa, ceitos clássicos se mantenham hoje como no passado, mais relativamente atualizados, no tão importantes valores uma grave crise que se reflete que à democracia respeita, a da cidadania ainda não em vários domínios da sua prática e atitudes de tão imexistência e intervenção, preportantes valores da cidadania se verificam em todo judicando, principalmente, os ainda não se verificam em tomundo, com autenticimais carenciados. Resolver ou, do mundo, com autenticidade pelo menos, contribuir para ue liberdade. dade e liberdade. ma solução que vise reduzir uE se igualmente o século ma conflitualidade latente nalXVIII, ao qual está ligada a Figuns domínios e atuante noulosofia das Luzes, produziu altros, constitui um imperativo do cidadão deste séterações significativas na sociedade, nos regimes culo. políticos e nos indivíduos, também é verdade que O problema nuclear que se coloca centra-se, novos conflitos, novas injustiças, novas desigualessencialmente, na conflitualidade existente na dades acabariam por substituir velhas arbitrariesociedade humana, por razões diversas, destadades, desavenças e regimes. cando-se algumas delas como: crise financeira,
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Quaisquer que tenham sido os processos, os intervenientes e os meios, os resultados que se gostaria de usufruir, hoje, não foram totalmente alcançados, porque outros interesses se interpuseram, outras ingerências dificultaram o sistema democrático e, no centro de todas as polémicas, sempre tem estado o indivíduo humano. Então o problema que atualmente persiste é, precisamente, o homem, o cidadão, o político, o profissional, o membro de família, o religioso, isto é, o homem em todas as suas dimensões. O homem-cidadão é não só o problema mas, com boa vontade e determinação, a solução do problema. Contribuir para a resolução do problema corresponde a dotar o homem de novas competências sociais e cívicas, educá-lo, formá-lo e capacitá-lo para uma nova atitude face à vida, aos homens e ao mundo. Nesse sentido, o pólo de desenvolvimento e fio condutor da presente reflexão sustentam-se neste novo homem, valorizado pela cultura luso-brasileira, em particular, pela lusofonia em geral e pelos valores universais circunscritos pela Educação, pela Formação, pela Filosofia, pelo Direito e pela Religião que, interdisciplinarmente, com as ciên-
cias cognitivas, sociais, humanas e da educação, proporcionarão um vasto conjunto de saberes que este novo cidadão interiorizará e colocará em prática. Tentar formar o cidadão ideal universal seria uma utopia que, na realidade, muito dificilmente se concretizaria, no curto prazo. Mas desenvolver um esforço para no espaço mais restrito a que corresponde também uma área geográfica, BrasilPortugal, bem conhecida e utilizada pelo autor de referência, poderá ser um bom início. Com efeito, Silvestre Pinheiro Ferreira adquiriu parte da sua notoriedade em terras de Vera Cruz, ao serviço da Coroa Portuguesa, como mais tarde, no exílio, em França, nunca deixou de se preocupar com tudo o que se passava em Portugal e também no Brasil. A situação que hoje se vive, um pouco por todo mundo, em grande parte por falta de preparação cívica do homem, que é o principal problema do momento, poderá começar a ser atenuada, precisamente, pelo processo educativo e formativo para a cidadania construtiva e responsável, originando um novo cidadão, que será o objetivo do presente trabalho que, tanto quanto se sabe, tem algo de inédito, pelo menos na conjugação de ele79
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mentos intervenientes, quanto ao reconhecimento da situação e na busca da solução que se reconhece como razoavelmente adequada e exequível. Assumir a cidadania plena, em qualquer parte do mundo, em geral, e no próprio espaço, em particular, postula um conjunto de requisitos institucionais, e também uma capacidade multifacetada, para colocar ao serviço da sociedade todas as potencialidades do cidadão, enquanto tal considerado. Igualmente fundamental é a sensibilidade com que cada pessoa se deve munir para poder enfrentar as mais difíceis e diversas situações. O mundo atravessa um período crítico, no que concerne aos valores que enobrecem a pessoa humana; os países, isoladamente considerados, confrontam-se, diariamente, com problemas complexos que, quando não são resolvidos com: reflexão, bom senso, prudência, conhecimentos e empenhamento, conduzem a situações perigosas e de autêntica violação dos mais elementares direitos humanos. Portugal vem atravessando um longo período de dificuldades (2003-2015) socioculturais e económicas muito difíceis: pedofilia, desemprego, exclusão social, droga, toxicodependência, prostituição, violações, roubos, assaltos, pobreza, fome e maus-tratos a menores, a mulheres e a idosos, são algumas das “doenças” mais profundas que atingem o país. Dir-se-ia que estas são algumas das razões que motivam para um trabalho árduo e prolongado, que impõem o dever de o realizar para, por esta via, se contribuir, decididamente, para uma nova tentativa de se ajudar a formar um outro cidadão, para uma cidadania cada vez mais ameaçada, desde logo a partir da família, origem e
fonte da vida e da sociedade. Isto mesmo é confirmado por Sua Santidade quando afirma que: «A crise da família torna-se, por sua vez, causa da crise da sociedade. Numerosos fenómenos patológicos – indo da solidão à violência e à droga – explicam-se igualmente pelo facto de os núcleos familiares terem perdido sua identidade e sua função. Onde se desagrega a família, tende a desaparecer o entrelaçamento unitivo da sociedade, com desastrosas consequências para as pessoas, em particular as mais frágeis.» (PAULO II, 1999b:8). Os gravíssimos problemas que hoje afetam o mundo, longe de constituírem motivo de desânimo, são, pelo contrário, um estímulo ao trabalho, com sentido realista da situação em que se vive. Quem procurar defender que tudo está bem, isso poderá corresponder a uma posição narcisista, propagandística e demagógica, contrária à assunção de responsabilidades. Independentemente da posição individual, toda a humanidade deve assumir uma nova postura para que se avance na busca de soluções, novos projetos que possibilitem debelar as situações mais desumanas existentes no mundo. O cidadão que se pretende para estes novos século e milénio vai constituir a prova do que se acaba de afirmar. Com a preparação que irá receber, pela via da educação e formação da melhor qualidade, certamente que em duas ou três gerações o mundo será bem diferente e para melhor. BIBLIOGRAFIA GOETHE, J. W. (1992). Máximas e Reflexões, 2ª ed. Trad. Afonso Teixeira da Mota, Lisboa: Guimarães Editores. PAULO II, João, (1999b). “Audiência Geral 01/12/1999”, in Revista Arautos do Evangelho, São Paulo: Associação Arautos do Evangelho, Ano II, (22), Outubro-2003, pp.6-11.
Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo, casado, natural de Venade (Caminha, Portugal). Obra Literária: 7 Antologias próprias; 9 Antologias em coedição em Portugal e no Brasil; mais de 800 artigos publicados em vários jornais, sites e blogs, portugueses e brasileiros. Vencedor do III Concurso Internacional de Prosa: “Prémio Machado de Assis 2015”, promovido pela Confraria Cultural Brasil-Portugal (Divinópolis, Minas Gerais, Brasil). Acadêmico CorrespondenteInternacional, Cadeira XXI, Academia Lavrense de Letras. Membro Efetivo do Núcleo Académico de Letras e Artes de Lisboa. Membro da Associação Portuguesa de Escritores. Telefone: 00351 936 400 689 | Email: bartolo.profuniv@mail.pt Blogue: http://diamantinobartolo.blogspot.com | Facebook: www.facebook.com/diamantino.bartolo.1
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ESCRITOR MOÇAMBICANO
ERNESTO MOAMBA NO FILLCAV BRASIL 2017 Feira Internacional de Literatura Lusófona, Cultura e Artes Visuais pelo terceiro ano consecutivo. Em São Paulo, Brasil.
Ernesto António Moamba, conhecido também como Filho da África, poeta e escritor moçambicano, é autor do livro «Liberta-te Mãe África», editado em 2016 pela Editora do Carmo, em Brasília. Representa oficialmente, em Moçambique, o departamento comercial do consórcio da Fundação Noêmia Bonelli (Brasília) e colabora com jornais nacionais e internacionais. Em 2016 conquistou o terceiro lugar no Prêmio Internacional Buruti e participou em várias antologias. Membro do grupo Intercâmbio dos Escritores da Língua Portuguesa, está actualmente empenhado na formatação de contratos para a FILLCAV Brasil 2017.
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A cidade de São Paulo, no Brasil, acolhe a Feira Internacional da Literatura Lusófona, Cultura e Artes Visuais (FILLCAV). O evento, realizado pela Fundação Noêmia Bonelli, está previsto para os dias 13 a 17 de Dezembro próximo e terá como palco a Expo Center Transamérica em SP. A Feira tem por objectivo reunir, num só local, editoras, distribuidoras, entidades do sector e escritores independentes (dez países convidados) originários dos países da língua portuguesa. Negócios profissionais, venda ao consumidor final, acções promocionais e comerciais serão desencadeadas pelo contacto com o volumoso público esperado de 500 mil visitantes. Ernesto Moamba é um dos escritores moçambicanos com presença confirmada no Festival. E não é para menos: Ernesto Moamba é representante da Fundação Noémia Bonelli e tem como missão recrutar perto de trezentas pessoas, entre escritores, editoras e distribuidores de Moçambique e Angola. Segundo os requisitos para expor na Feira, são da responsabilidade do organizador: o serviço de
segurança geral durante o evento; ao participante cabe apenas o serviço de limpeza do seu “stand” e pagamento de taxas de impostos junto ao Governo Municipal, Estadual e Federal. Ao organizador somente será permitida a montagem do “stand” se todas as responsabilidades desse contrato estiverem quitadas. Não será permitida outra empresa na mesma área que não seja a do contrato. Caso seja constatado, o participante assumirá a responsabilidade pagando ao organizador, neste caso a Fundação Noêmia Bonelli, o valor equivalente a mais de cinquenta por cento, a título de multa contratual, do valor do seu contrato. Embora só se faça em caso extremo. O organizador reserva-se o direito, quando de manifesto interesse do evento, de realizá-lo em outro local ou alterar o período da realização e funcionamento, não tendo o participante, no caso, o direito de cancelar o presente contrato. Ernesto Moamba publicou o livro «Liberta-te Mãe África” pela Editora do Carmo (editora brasileira) no ano passado. Ernesto Moamba
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APRESENTAÇÃO
SALOIOS & CAIPIRAS “Esse livro tem o cheiro das pedras dos rios que correm em cima delas, MARCELLA REIS Nasceu em 1984, em Goiânia (Goiás), Brasil, e reside em Portugal há 18 anos, na zona de Sintra. Tem três obras editadas: «Era Uma Vez a Poesia...» (Chiado Editora, 2012) «O Dia Em Que Pari Minha Mãe» (Edições Vieira da Silva, 2013) e «Lágrima Artificial» (Alma Lusa, 2016). Classificada em 3º Lugar no Concurso Internacional de Contos de Araçatuba, venceu o concurso Peças de Um Minuto com a peça «Beijo de Línguas», obteve Menções Honrosas noutros certames, é membro académico da ALAF (Academia de Letras e Artes de Fortaleza) e participou em diversas antologias. Presença regular nas Antologias Sui Generis, estreou-se, em 2016, na Coordenação de obras colectivas a convite de Isidro Sousa, respondendo ao desafio para coordenar «Saloios & Caipiras»; logo após, coordenou outras obras para a Edições Vieira da Silva. É ainda Agente Literária e classificou-se em primeiro lugar no 1º Concurso Literário da Silkskin Editora; o prémio consiste na edição de uma novela erótica, «Amantes Lepidópteras», que assinará com o pseudónimo erótico Petchella, sua alcunha de criança.
do sol quarando a roupa, das bananas bravas, das mandiocas sendo paridas da terra, dos amores nos milharais, das pamonhas, das papas de milho, dos pequis, jabuticabas, uvas do Douro, do Minho. Ahhh! Saboreiem, pois, cada gota das palavras que aqui se fazem presentes. Elas cheiram à moça com vestido de chita e trança Maria Chiquinha, elas cheiram ao luar estrelado do interior, cheiram a criança pequena, “bacuri”... Esse livro cheira-nos a terra molhada!” POR MARCELLA REIS
Página da Autora: www.facebook.com/marcella.reis.58
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da por Isidro Sousa e editada com a chancela da EuEdito). A vida rural é sinónimo de prazer, simplicidade, alegria, fartura e, paradoxalmente, de muita luta, tristeza, complexidade, pobreza e “fartura” do verbo faltar (termo bastante utilizado pelas pessoas interioranas no Brasil ao trocar o “L” pelo “R”, como calça = carça, valsa = varsa, “faltura” = fartura). Por causa dessa linguagem incomum, popular e informal, falada por Saloios e Caipiras, com imensas palavras desconhecidas e até inventadas, é que há um Glossário no apêndice dessa ilustre Antologia. Ah! O campo... O campo e o interior já inspiraram poetas portugueses como Cesário Verde, que versava o contraste entre o campo e a cidade, Alberto Caeiro já acima referido, o mais simples heterónimo de Pessoa e mestre de todos os outros heterónimos, a poetisa e prosista brasileira Cora Coralina, que cantava em versos e contava em causos estórias de seu Goiás Velho querido e a vida simples do caipira no meio de suas panelas de doces e mãos temperadas de pimentas novas, frescas e cheirosas, e de seu velho “Goyáz”.
«Como o campo é grande e o amor pequeno!» (Alberto Caeiro)
O
sonho desse projecto começou nessa simples e profunda frase do heterónimo mais descomplicado e campesino de Fernando Pessoa, que afirmava: «Pensar é estar doente dos olhos.» Saloios & Caipiras é uma antologia de textos inéditos de grandes autores seleccionados pelo Organizador Isidro Sousa e pela Coordenadora Marcella Reis subordinados ao tema da Vida Rural e Campesina nos dois lados do Atlântico: Brasil e Portugal. É “tale e quale” como o título da mesma sugere: uma Antologia Luso-Brasileira de Contos, Lendas, Causos e Poesias (integrada na Colecção Sui Generis, fundada e dirigi86
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Toda esta vida interiorana, sertaneja e rural, foi também retratada em obras renomadas como Grande Sertão Veredas (Guimarães Rosa), Rosinha Minha Canoa, Chuva Crioula e Meu Pé de Laranja Lima (Zé Mauro de Vasconcelos) e em tantas outras obras portuguesas e brasileiras! E... Foi mesmo por isso que nós desafiámos, afiámos e desafiámos todos os Autores Brasileiros e Portugueses, interessados em participar neste projecto, a criarem Poesia ou um texto sob a forma de Conto e o resultado para essa temática, SALOIOS & CAIPIRAS, teve uma palavra como protagonista: EMOÇÃO em letras garrafais. Foi
Cada texto e poesia tem o sabor do biscoito das prateleiras dos velhos armários das grandes quintas e fazendas... Tem o sabor das risadas dadas nas rodas em volta do fogão de lenha ou da fogueira. Tem o gosto rude da enxada e da foice e o doce
do suor lavado quando se acaba a lida do trabalho do peão... Dos trabalhadores campesinos!
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essa emoção grande, como que vista pelo fundo duma garrafa, que eu senti ao ler cada texto e poesia dos autores seleccionados. Aqui estão plantadas nesse livro que é terra fértil: momentos de comédia, pequenas histórias com grandes romances e laços de amizade que nos fazem render o joelho ao chão e agradecer pelos animais e pela Mãe-Natureza, mininovelas, lendas, dramas familiares e de vínculos muito profundos, intrigas, preces, cânticos em forma de pura homenagem. Homenagem esta onde nomes de artistas e autores estão presentes através do seu trabalho feito de coração, para representar e enaltecer o campo, os seus habitantes e visitantes.
Saloios & Caipiras é uma Antologia gostosa de ler como o biscoito feito pelas mãos enrugadas de uma pessoa que sabe o que vem do escuro da terra. Cada texto e poesia tem o sabor do biscoito das prateleiras dos velhos armários das grandes quintas e fazendas... Tem o sabor das risadas dadas nas rodas em volta do fogão de lenha ou da fogueira. Tem o gosto rude da enxada e da foice e o doce do suor lavado quando se acaba a lida do
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trabalho do peão... Dos trabalhadores campesinos! Esse livro tem o cheiro das pedras dos rios que correm em cima delas, do sol quarando a roupa, das bananas bravas, das mandiocas sendo paridas da terra, dos amores nos milharais, das pamonhas, das papas de milho, dos pequis, jabuticabas, uvas do Douro, do Minho. Ahhh! Saboreiem, pois, cada gota das palavras que aqui se fazem presentes. Elas cheiram à moça com vestido de chita e trança Maria Chiquinha, elas cheiram ao luar estrelado do interior, cheiram a criança pequena, “bacuri”... Esse livro cheira-nos a terra molhada! Pois que: «O saber a gente aprende com os mestres e os livros. A sabedoria, se aprende é com a vida e com os humildes.» (Cora Coralina) Ou... «Coração é terra que ninguém vê», como dizia a poeta Cora Coralina. Posso dizer-vos com alegria de que todos nós escavamos essa terra e, através da semente das palavras plantadas, fizemos brotar o nosso cora-
ção do solo e que ele seja sempre... transparente como a água que rega a vida na sua simplicidade! Todos os Autores Luso-Brasileiros (e de outros Países Lusófonos) foram aqui muito bem acolhidos e colhidos no cesto da admiração, do reconhecimento e o resultado é este: de abundância! De facto vocês nos surpreenderam e sempre que eu sentir saudades do campo voltarei a tirar umas férias nele. Prefácio de Marcella Reis incluído no livro Saloios & Caipiras – Contos, Causos, Lendas e Poesias.
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CONTO
PAIXÃO FRENÉTICA “Luana pediu ajuda dela para tentar TÂNIA TONELLI Escrever contos, livros e artigos são o seu hobby preferido. Incentiva a leitura de boas obras, desejando conhecimentos e diversões aos leitores. Tem várias obras publicadas na Amazon e no seu blogue.
conquistar o grande amor de sua vida,
Blogue da Autora: http://taniatonelli.blogspot.pt
lindo rapaz. Ele estava sozinho desde
pois sempre foi apaixonada pelo cantor e ator Diego. Ela contratou um detetive particular para investigar a vida deste
que terminou com sua última namorada. No próximo final de semana viria à cidade visitar o amigo Zacarias, iriam no sábado na Festa do Milho Verde. Luana não perderia esta excelente oportunidade para fazer sua declaração amorosa. Carolina falou que a ajudaria, pois merecia ser feliz ao lado do Diego.”
POR TÂNIA TONELLI
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decidiu ir embora, então aproximouse dela uma bela mulher e falou: – Desculpe-me pelo atraso, o pneu do meu carro furou, tive dificuldades em trocá-lo. – Sinto muito dona, mas eu não a conheço, falou Carolina chateada. – Meu nome é Luana Lopes, falou a outra moça sorrindo. – Nossa! Aquela menina feia transformou-se em uma bela mulher! Falou Carolina espantada. – O meu pai tornou-se milionário, o dinheiro faz milagres. Eu usei aparelho dentário, fiz uma cirurgia plástica para tirar cicatrizes do meu rosto. Como os meus seios eram pequenos o médico os aumentou com silicone, há quinze dias fizeram uma lipoaspiração na minha barriga, falou Luana. arolina dirigiu-se à praça para encontrar a – Você está linda, falou Carolina e abraçou a sua amiga de infância Luana. Já fazia mais amiga. de dez anos que não a via, pois o pai dela Luana pediu ajuda dela para tentar conquistar ganhou um prêmio milionário em jogos lotéricos. o grande amor de sua vida, pois sempre foi apaiEste homem mudou-se com sua família para São xonada pelo cantor e ator Diego. Ela contratou um Paulo, nunca mais retornadetetive particular para inram à pequena cidade Auvestigar a vida deste lindo rora. rapaz. Ele estava sozinho Enquanto caminhava Cadesde que terminou com Carolina lembrou-se de sua rolina lembrou-se de sua insua última namorada. No fância. Na escola os menipróximo final de semana infância. Na escola os meninos nos comentavam que a meviria à cidade visitar o amicomentavam que a menina nina mais feia da cidade era go Zacarias, iriam no sábaLuana. As meninas suspiramais feia da cidade era Luana. do na Festa do Milho Vervam atrás do Diego, além de. Luana não perderia esta As meninas suspiravam atrás de lindo ele era filho do faexcelente oportunidade pado Diego, além de lindo ele era zendeiro. Atualmente ele ra fazer sua declaração aera famoso, as suas músicas filho do fazendeiro. Atualmente morosa. Carolina falou que faziam sucesso e era ator a ajudaria, pois merecia ser ele era famoso, as suas de novela. A moça chegou à feliz ao lado do Diego. Elas músicas faziam sucesso praça, sentou-se no banco. combinaram encontrar-se Ela esperou por uns vinte e era ator de novela. depois de três dias, Luana minutos, mas a sua amiga deu de presente à amiga não apareceu. Desanimada, dois mil reais.
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Na sexta-feira cedo, disfarçadas, começaram a seguir Zacarias. Passaram várias horas, o moço caminhava sozinho, Luana ficou desanimada. Às catorze horas ele foi à lanchonete, neste local encontrou-se com outro rapaz. Usando o binóculo Luana reconheceu Diego. Passados uns dez minutos, ansiosa, aproximou-se deles. Enquanto conversavam, entraram na lanchonete várias moças. De repente uma delas gritou: – Eu vou desmaiar porque estou vendo o lindo cantor e ator Diego. – Diego está fazendo show no nordeste, falou Zacarias. – Mentiroso! O seu amigo é o galã Diego. Por favor, dê-me o seu autógrafo, falou a moça. – Pois eu quero beijá-lo na boca, falou a outra moça. Zacarias e Diego saíram correndo da lanchonete, as moças os seguiam. Perto da esquina estava estacionada uma moto, Diego pegou a chave, ligou o veículo, junto com seu amigo foi embora da cidade. Luana ficou entristecida, todas as mulheres da cidade ficaram defronte da casa do Zacari-
as. Elas desejavam conversar com Diego, tirar fotografias com o ator e cantor famoso. Às dezenove horas Zacarias voltou a casa sozinho e falou: – Diego quer vir amanhã na Festa do Milho Verde. Ele deseja conversar e tirar fotografias com suas fãs, mas quer ser tratado como um ser humano normal e não como ídolo. Rindo, dois primos gêmeos do Zacarias falaram juntos: – Nós protegeremos Diego das perversas mulheres desta cidade. As mulheres conversaram, combinaram respeitar Diego, pois todos se divertiriam na Festa do Milho Verde. No sábado às vinte horas chegou o rapaz famoso neste evento. Várias pessoas o cumprimentaram, algumas moças pediram o seu autógrafo ou tiraram fotos com ele. Zacarias, seus dois primos gêmeos e o policial João protegiam Diego. Passados alguns minutos sorrindo, o prefeito aproximou-se deles. Pediram para provar milho verde cozido, pamonha, curral, bolo, além de outras comidas. 95
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As pessoas pediram para Diego cantar as suas músicas famosas, às vinte e três horas ele subiu no palco e começou a cantálas. O show durou quase duas horas, a multidão aplaudiu o cantor. De longe Luana, desanimada, chorava, pois não conseguiu conversar com seu amor. Às três horas Diego e o seu amigo Zacarias foram embora da festa. Carolina sentiu pena de sua amiga, telefonou ao Zacarias, pediu para ajudar Luana a fazer suas declarações amorosas ao príncipe encantado. No começo o rapaz tentou despistá-la, como ficou comovido resolveu ajudá-las. Diego estava hospedado na chácara do tio de Zacarias. Ele chegou neste local durante a madrugada, contente; divertiu-se na festa. Dirigiu-se ao quarto de hóspede, tomou banho, depois deitouse na cama. Passados uns cinco minutos Luana entrou neste cômodo e recitou esta poesia:
DEMAIS POR FAVOR, DÊ-ME A CHANCE DE CONQUISTAR O SEU CORAÇÃO PORQUE TE DAREI MUITO AMOR E CARINHO VOCÊ SERÁ O HOMEM MAIS FELIZ DO MUNDO MEU AMOR, MINHA VIDA! Diego ficou comovido, abraçou Luana e se beijaram. Zacarias e Carolina estavam no jardim, chateado o rapaz falou: – Diego arrumou uma namorada nova. – Luana conseguiu realizar o seu sonho de infância, falou Carolina. – Eu nunca vou conseguir arrumar uma namorada, pois sou feio, pobre e não tenho automóvel, falou Diego. – Os meus dentes são tortos, preciso emagrecer quinze quilos e no meu rosto há sardas e espinhas. Eu não tenho dinheiro para frequentar academia e fazer cirurgias plásticas, falou Carolina. – Pois eu adoraria namorar esta moça carinhosa e fofinha, falou Zacarias. – Como você é um cara legal aceito ser sua namorada, respondeu Carolina. Os dois riram, se abraçaram e beijaram-se.
MEU QUERIDO PRÍNCIPE ENCANTADO NOS CONTOS DE FADAS NÃO EXISTE ALGUÉM ESPECIAL COMO VOCÊ SE A BRANCA DE NEVE OU A CINDERELA EXISTISSEM ELAS DEIXARIAM OS SEUS COMPANHEIROS PARA FICAREM AO SEU LADO AMOR! VOCÊ SE LEMBRA DE MIM? EU SOU LUANA, AQUELA MENINA FEIA DA ESCOLA INFELIZMENTE NÃO TENHO A FADA MADRINHA PARA TRANSFORMAR-ME NA BELA PRINCESA MAS O DINHEIRO E ALGUMAS CIRURGIAS PLÁSTICAS TRANSFORMARAM-ME EM UMA BELA MOÇA DIEGO, DESDE A MINHA INFÂNCIA O AMO 96
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CRÓNICA
LÉ COM LÉ, CRÉ COM CRÉ “Os computadores farão tudo, até sexo. Presume-se. A lâmpada acenderá quando a temperatura diminuir e servirá canapés DARLAN ZURC Escritor, professor e historiador, participante da 24.ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo (2016), coautor de antologias como Céus de Chumbo (Andross, 2016) e considerado pelo jornal brasileiro Folha de S. Paulo como “muito crítico”. Páginas do Autor: www.darlanzurc.com www.facebook.com/darlanzurc E-mail: darlanzurc@darlanzurc.com
com carne de baleia. Queimou-se alguma peça? Um sistema de circuitos avisa a uma central, que enviará um ciborgue, o qual fará a troca. O carro voador pifou? Não tem problema: máquinas de recolhimento e reparo, tipo posto de gasolina, existirão em quase todas as esquinas. Seriam pontos de apoio avançadíssimos. Neles, encontraríamos propulsores fantásticos, geradores microscópicos, pílulas instantâneas com antiferrugem para os motores, etc.”
POR DARLAN ZURC
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S
e os objetos inanimados falassem, metade dade, são chatos. dos problemas do mundo estaria resolvida. Acontece que as máquinas superinteligentes As benditas chaves avisariam aonde foram começariam a mandar nas outras. Caixas de sapaparar, o maldito controle remoto – ah!, o controle to, por exemplo, virariam capachos das canetas de remoto – alertaria para ser encontrado, a geladeiraio lêiser com tinta inesgotável. As TVs modernísra de titânio inoxidável e autolimpante nos traria simas estariam juntas com outros objetos no topo o almoço ou o jantar e tudo ficaria à disposição da hierarquia, a exemplo dos próprios celulares, dos caprichos humanos. naves interestelares, drones e coisas do gênero. Por outro lado, coisas como celular, portaNão tardaria para que um surto conspiratório retratos digital, relógio inteligente e até babá elesurgisse entre as parafernálias subjugadas. Talvez trônica já subiram na escala evolutiva, deixaram os humanos não fossem chamados, pois eles esos outros objetos comendo poeira. Alguém invencravizariam as outras coisas, após encontrarem tou até a lixeira que se abre por meio de um senuma oportunidade, como fazem hoje em dia. Resor de presença e avisa quando está preenchida almente, eles não são confiáveis para isso. até a boca. Mas, se os fracos não se unirem, a esculhamImaginando que já chegou ao topo do imagibação continuará. Já se pode até imaginar caixas nável, o terráqueo incauto não esperava pela de fósforo discursando de modo inflamado para chamada Internet das Coisas. A partir disso, não plateias frenéticas, isopores contradizendo a fala tem mais jeito. No mundo dominado pela Internet de uma planta amiga de sandálias cristãs ortodonesse nível, o ser humano virará um fantoche, um xas e pedras de cascalho se unindo a arames farbrinquedinho de luxo. pados do sertão baiano de São José do Paiaiá. Vai Os computadores farão tudo, até sexo. Presuser outra bagunça! me-se. A lâmpada acenderá quando a temperatuÉ preciso que os ânimos se desinflamem e os ra diminuir e servirá canapés com carne de baleia. radicais se tranquilizem. Um acordo de paz é o Queimou-se alguma peça? Um sistema de circuimelhor caminho para que a casa da mãe Joana tos avisa a uma central, que enviará um ciborgue, seja arrumada. Que sejam eleitos os diplomatas o qual fará a troca. O carro voador pifou? Não tem para representar os interesses dos derivados do problema: máquinas de recolhimento e reparo, leite, do grupo dos eletrônicos, das frutas vermetipo posto de gasolina, existirão lhas e assim sucessivamente. em quase todas as esquinas. Embora um acordo desse vá Seriam pontos de apoio avandemorar centenas de milêÉ preciso que os ânimos se çadíssimos. Neles, encontrarínios. amos propulsores fantásticos, Bom seria se tudo estidesinflamem e os radicais geradores microscópicos, píluvesse como antigamente. Ase tranquilizem. Um acordo las instantâneas com antiferrupesar dos descontentes, pelo de paz é o melhor caminho gem para os motores, etc. menos o barulho não existiTudo será controlado, limpo, ria, as intromissões eram para que a casa da mãe adstringente, antisséptico e inmenores. Ninguém ia ver paJoana seja arrumada. Que dolor. Os seres humanos seriam rafuso dando tapa em vaso sejam eleitos os diplomatas recolhidos para uma colônia de sanitário. Cada coisa em seu experimentos. Nesse futuro cidevido lugar. É como ensina para representar os interesbernético, os humanos não cao velho e sábio ditado: lé ses dos derivados do leite, bem porque são muito instáveis com lé, cré com cré. do grupo dos eletrônicos, e imprevisíveis. A bem da ver-
das frutas vermelhas e 99 assim sucessivamente.
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ENTREVISTA
PAULO LOBO O desafio profissional de Paulo Lobo consistiu na possibilidade de criar uma empresa start-up com elevado crescimento e sustentabilidade. Com grande experiência e formação diversificada na área do design gráfico, tendo vários trabalhos elaborados, e também nas áreas da informática, Internet, qualidade e teletrabalho, é o responsável pela operacionalização da editora Euedito, na vertente comercial, gestão do website, arranjo das capas e formatação dos livros enviados pelos autores. É através desta editora que as obras Sui Generis são publicadas. POR ISIDRO SOUSA
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SG MAG – Paulo Lobo, é uma honra entrevistá-lo para a SG MAG. O que o levou a criar uma editora após ter tido formação e experiência profissional tão rica e diversificada noutras áreas totalmente diferentes da literária?
Existem sistemas de patrocínio com os quais os autores não se identificam mas, na minha opinião, podem ser uma opção viável.
A sua convivência com o meio literário, até constituir o projecto Euedito, era esporádica. Alguma razão especial o fez enveredar pela área literária? E porquê somente editar livros? Porque não escrever um livro e lançá-lo? A escrita não o fascina?
O conceito print-on-demand (impressão a pedido) baseia-se na ideia simples de que é possível democratizar a produção livreira, aproveitando a tecnologia que já existe e que se desenvolveu exponencialmente na última década, para eliminar o intermediário – o principal factor de encarecimento Iniciei a minha carreira na área literária com um do livro – devolvendo o controlo convite do meu antigo patrão de todo o processo de edição para rentabilizar o parque e publicação a quem interessa: de máquinas de impressão ao autor. Um conceito amigo e acabamentos existente. Damos sempre a do ambiente, uma vez que não Apalpando terreno, possibilidade ao autor só reduz o desperdício de uma fomos crescendo e aprendendo. forma significativa, como é Confesso ser uma pessoa mais de fazer nascer o livro. baseado em tecnologia vocacionada para a imagem, A poesia é um dos de impressão digital que causa mas não descarto a possibilidade menos impacto no ambiente. de escrever um livro. O que tem principais géneros Foi em torno desta ideia que sido recentemente uma ideia literários editados. nasceu, em 2009, a Euedito. constante... Uma “editora” do autor, de selfContudo, outros temas publishing (auto-edição), onde muito interessantes o autor é o próprio editor. Com Viagens pelo mundo visitando publicados na Euedito autonomia total sobre a obra. museus e galerias e experiências nas artes cénicas, como barman, se têm revelado na organização de espectáculos surpreendentes nas Que barreiras ou obstáculos e, também, em design, fizeramultrapassou para conseguir no adquirir novos horizontes vendas, por força do implementar uma editora sólida que o levaram a experienciar dinamismo dos autores. no mercado e quais os principais outras técnicas e desafios. desafios enquanto editor Até que ponto essas vivências presentemente? influíram na criação de uma marca e estilo próprio Como em qualquer projecto, a dificuldade inicial de trabalho? E quais são essas especificidades? foi a sua introdução/apresentação no mercado, mas rapidamente superada, ganhando credibilidade Essas experiências, gosto pelo design e mundo e fidelização junto de clientes e autores, aspecto fulcral das artes, levaram-me a projectar e criar o logótipo, no crescimento da Euedito. O sucesso deve-se também bem como o nome Euedito, o que foi um início para às parcerias que se foram estabelecendo ao longo dos embarcar este projecto. Essa experiência ajuda-me anos, como por exemplo a Sui Generis, ilustradores bastante na compreensão do autor e resolução e revisores, entre outras. Actualmente, o principal e desenvolvimento das várias etapas da sua obra. desafio prende-se com o aspecto financeiro. Embora Rapidamente me identifico com o autor e apresento a Euedito procure sempre a melhor solução para o que procura. Existe uma relação interpessoal muito o autor, mesmo financeiramente, infelizmente forte com o autor, talvez pela passagem profissional ainda não existe uma linha de crédito para esta área... como barman.
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Qual é o conceito e a filosofia da editora Euedito? Existe uma linha editorial... preferências por algum género de literatura? Que tipo de livros lança no mercado? Bem, como sabe, passam diariamente muitos trabalhos pela Euedito e, de acordo com a nossa filosofia, não descriminamos as obras apresentadas. Damos sempre a possibilidade ao autor de fazer nascer o livro. A poesia é um dos principais géneros literários editados. Contudo, outros temas muito interessantes publicados na Euedito se têm revelado surpreendentes nas vendas, por força do dinamismo dos autores. As antologias Sui Generis, por exemplo, organizadas pelo Isidro, vão muito além da poesia...
O Print On Demand veio romper com a tradicional impressão Off Sett, trazendo vantagens outrora inexistentes que permitem, aos autores, publicar livros de um modo menos dificultado, por vezes até de uma forma autónoma. O que deve um autor fazer quando recorre a este sistema? Que cuidados a ter antes de apresentar uma obra para impressão? Muitas vezes os autores chegam sem ideias, ou com ideias um pouco fracas, e como sabemos uma capa pode vender por si só. Apesar de o POD não se “preocupar” com o aspecto da obra (limita-se a imprimir os trabalhos submetidos), a Euedito tenta contrariar esse aspecto e encaminha, ajuda o autor a “configurar” a sua obra. No entanto, embora o livro possa ter uma capa muito apelativa, a divulgação e apresentação é um factor essencial. Um dos cuidados importantes a ter, antes de avançar com a edição POD, é saber a tiragem a editar. Fazer uma análise dos exemplares que realmente irá necessitar. Com o apoio da Euedito, o autor tem a possibilidade de começar com poucos exemplares, testar o mercado e reimprimir as vezes que desejar. Muitas vezes os autores, infelizmente, não recorrem a ferramentas comuns, como blogues, para apresentar e divulgar
as obras. Ficam na expectativa de vendas milagrosas...
Após a implementação do POD, assistiu-se a um lançamento desenfreado de livros, tanto pelos próprios autores como por pequenas editoras.
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Dir-se-ia que agora qualquer pessoa lança um livro, desde que haja suporte financeiro. Que cuidados devem ter, autores em particular e editores em geral, antes de trazerem um novo livro à estampa? E após o lançamento, quais os procedimentos... que preocupações para comercializar o livro?
Na sua perspectiva, porque não encontramos mais obras nas grandes livrarias, salvo as dos autores consagrados? Que razões aponta para essa ausência? Haverá algum modo de contorná-la? Como? Na minha opinião, a principal razão é simplesmente financeira. O autor não consegue, ou não tem meios próprios, para abraçar uma grande edição. Um outro factor poderá ser o anonimato, mas julgo que não será por aí... Com a Euedito, os autores rapidamente abriram uma janela para o seu projecto e com a facilidade de imprimir pequenas tiragens começaram a distribuir os seus livros e a solicitar reedições com mais frequência.
Em parte é verdade. Houve um boom de auto-edições, ou a facilidade que até então não existia. Mas abriu a porta a muitos autores que guardavam o sonho numa gaveta. Deu-se um despertar na produção livreira e, embora não seja de todo verdade, qualquer pessoa passou a editar um livro. Esta pergunta recorda-me um episódio de um autor que mencionou precisamente esse aspecto. Ao que respondi que qualquer pessoa pode publicar um livro independentemente das suas capacidades “literárias” e usei como exemplo autores Euedito com deficiência motora, paralisia cerebral e até mesmo invisuais. A Euedito realizou o sonho a estes autores, que iriam encontrar dificuldades numa edição tradicional.
Tem-se assistido igualmente, nos últimos anos, a um boom de editoras (pequenas empresas). Há as que realmente apresentam boas obras em circuitos alternativos e outras cujo objectivo visa somente o lucro fácil. A Euedito está firme
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e a sua credibilidade fá-la ser cada vez mais procurada. Em que é que se destaca das editoras congéneres?
Para finalizar esta entrevista, o que gostaria de acrescentar que não tenha sido abordado? E como poderão potenciais autores comunicar com a Euedito?
Julgo responder a esta pergunta com apenas uma palavra: honestidade! A Euedito prima pela sinceridade junto do cliente/autor. Não o conduz a gastos desnecessários e aconselha-o em todos os aspectos, desde gráficos a financeiros, na edição da obra. Um dos slogans da Euedito é precisamente “Estamos sempre ao seu lado!”.
Gostaria de deixar o desafio para que os autores apresentem mais géneros infantis, e até mesmo banda desenhada. Quanto aos contactos, é simples: podem contactar directamente por email para geral@euedito.com ou por telefone para o (+351) 937 096 641. E também através da nossa página (www.euedito.com).
Enquanto leitor, quais são as suas preferências literárias? Que outros livros lê, além daqueles que lhe passam pelas mãos no âmbito profissional? Como sabe, passam diariamente muitas obras pelas minhas mãos, permitindo enriquecer o meu “conhecimento”, e verifico – a nível pessoal – um gosto crescente pela ficção.
CONTACTOS Telefone: (+351) 937096641 Email: geral@euedito.com Website: www.euedito.com
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VIAJANDO PELO MUNDO
BAVIERA “Antes de ser um estado, a Baviera foi um ducado e seguidamente um reino. Enquanto ESTÊVÃO DE SOUSA Nasceu em Lisboa, em 1937. Já aposentado, dedicou-se à escrita. Tem três obras editadas: «Nesta Terra Abençoada», «Tráfico no Rio Geba» e «Irina – A Guerrilheira». Além destas, tem mais duas obras no prelo: «Rapto em Londres», policial, e «Ouro Negro», romance de aventura. Tem ainda trabalhos em cerca de quinze antologias e colectâneas. Página do Autor: www.facebook.com/francisco.estevao desousa
reino, o agora estado da Baviera foi, no reinado de Ludwig I, bastante desenvolvido. Este rei dotou Munique com amplas avenidas, mandou construir numerosos edifícios e palácios e o centro de artes, o qual muito veio beneficiar o reino, com a atração de imensos artistas vindos de fora. O seu homólogo Ludwig II, a quem chamaram o rei doido, mandou construir por toda a Baviera lindos castelos, que mais parecem saídos de contos de fadas. Este rei ficou célebre, não só pela arquitetura dos castelos, por ele mandados construir, mas também pela sua grande paixão – autêntica dependência – pela música de Wagner.” POR ESTÊVÃO DE SOUSA
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uem chega ao Franz Josef Strauss, aeroporto de Munique (Munchen), tem de percorrer 38 quilómetros pela A9 para chegar ao centro (marienplaz) de uma linda e alegre cidade de aproximadamente 1,4 milhões de habitantes, capital do estado da Baviera, considerada a mais bonita região da Alemanha. O rio Isar – afluente do Danúbio – que a atravessa ao centro, empresta-lhe ainda maior beleza com as suas pontes enfeitadas por coloridos vasos de flores. Esta maravilhosa cidade está repleta de magníficos palácios, especialmente no centro histórico. Sendo uma urbe onde existem várias e grandes indústrias com tecnologia de ponta – onde pontificam marcas como a BMW – é simultaneamente um importante centro económico onde as pessoas têm uma elevada qualidade de vida. Tendo sido destruída aquando da segunda guerra mundial, em cerca de cinquenta por cento, soube reconstruir-se no pós-guerra, modernizando-se e surgindo mais pujante, ao mesmo tempo
que reconstruía e mantinha a traça dos seus belos monumentos. Na zona moderna podemos admirar, para além de imponentes e modernos edifícios cilindros, cúbicos ou em forma de pirâmide, o parque olímpico com os seus exóticos estádios, e ainda a torre com 190 metros de altura, de onde temos uma completa panorâmica de toda a cidade. O nome de Munchen significa “monge” e deriva de um mosteiro existente no local onde teve início a cidade velha, fundada por Henrique, o Leão, duque da Saxónia, por volta do ano de 1158, a qual se veio a tornar capital da Baviera em 1506.
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Em Munique, realiza-se a maior festa da cerveja do mundo! A oktoberfest, onde são consumidos cerca de sete milhões de litros e que é levada a efeito no início da segunda semana de Setembro, terminando no fim da primeira semana de Outubro, com uma duração de dezasseis dias. Para além desta, realizam-se mais duas festas da cerveja, anuais; uma entre o Carnaval e a Páscoa e a outra, geralmente, na segunda semana de Abril, com duração de quinze dias. Ainda a não perder, a festa de Carnaval – não tão importante como a da cidade de Colónia – ainda assim, a alegria do povo Bávaro emprestalhe uma vivacidade digna de registo. Celebrado de domingo a terça-feira, com cortejos carnavalescos, música e dança nas ruas, e muita animação nos bares e discotecas. Resta ainda dizer que: na área metropolitana de Munique, que engloba várias outras pequenas cidades, vivem atualmente cerca de 5,8 milhões de pessoas.
Para admirar a beleza de uma das mais belas zonas do planeta, convém fazer a “rota romântica”. Cerca de quatrocentos quilómetros por entre um mesclado de magníficas cores, onde predomina o verde, vendo paisagens de sonho em que existem belos vilarejos, cidades com história, chalés com varandas
de madeira enfeitadas com flores, castelos e palácios de sonho. Tudo isto tendo como pano de fundo os Alpes Bávaros! 109
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Voltando à região da Baviera propriamente dita, esta é atualmente um estado da Alemanha que, localizado a sudoeste, com uma área de 70.553 km2, é o maior estado Alemão, tendo uma população de 12,5 milhões de habitantes. O governo é chefiado por um ministro-presidente, designado pelo parlamento, eleito por sufrágio. É banhado por dois grandes rios: o famoso Danúbio e o Main, para além de vários afluentes destes. O seu ponto mais elevado são os Alpes Bávaros, com 2.962 metros de altitude. Para além das sete divisões administrativas, existem três grandes divisões culturais: a do antigo território originário dos Bávaros, a Francónia e a Snábia, sendo os dialetos e cultura destas duas últimas diferentes do resto da Baviera. Antes de ser um estado, a Baviera foi um ducado e seguidamente um reino. Enquanto reino, o agora estado da Baviera foi, no reinado de Ludwig I, bastante desenvolvido. Este rei dotou Munique com amplas avenidas, mandou construir numerosos edifícios e palácios e o centro de artes, o qual muito veio beneficiar o reino, com a atração de
imensos artistas vindos de fora. O seu homólogo Ludwig II, a quem chamaram o rei doido, mandou construir por toda a Baviera lindos castelos, que mais parecem saídos de contos de fadas. Este rei ficou célebre, não só pela arquitetura dos castelos, por ele mandados construir, mas também pela sua grande paixão – autêntica dependência – pela música de Wagner. Para admirar a beleza de uma das mais belas zonas do planeta, convém fazer a “rota romântica”. Cerca de quatrocentos quilómetros por entre um mesclado de magníficas cores, onde predomina o verde, vendo paisagens de sonho em que existem belos vilarejos, cidades com história, chalés com varandas de madeira enfeitadas com flores, castelos e palácios de sonho. Tudo isto tendo como pano de fundo os Alpes Bávaros! Em presença de uma tal magnificência, sentimo-nos transportados aos contos de fadas das nossas avós. – Que tal, gostou? – Venha daí!!!
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APRESENTAÇÃO
TORRENTE DE PAIXÕES ISIDRO SOUSA Nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, concelho de Moimenta da Beira, e reside em Lisboa. Jornalista e editor de publicações periódicas desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, publicou a primeira antologia em Fevereiro de 2001, colaborou com três editoras, participou em duas dezenas de obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e é o responsável pelos projectos da Sui Generis, que criou em Dezembro de 2015. Publicou dois livros: «Amargo Amargar» e «O Pranto do Cisne».
“A paixão é um sentimento intenso e profundo, por vezes violento, que um indivíduo pode professar por outro, geralmente do sexo oposto mas também do mesmo sexo, e dificulta o exercício de uma lógica imparcial, marcado pelo forte interesse e atracção da pessoa apaixonada por algo ou alguém. Este sentimento possui a capacidade de alterar aspectos do comportamento
Página no Facebook e Blogue: www.facebook.com/isidro.sousa.2 http://isidelirios.blogspot.pt
e pensamento da pessoa, que passa a demonstrar um excesso de admiração por aquilo que lhe causa paixão; não obstante, a impulsividade, o desespero e a inquietação são outras características que costumam estar associadas ao sentimento de paixão.” POR ISIDRO SOUSA
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conceito de paixão, tema fulcral desta obra colectiva, tem diferentes usos. Por um lado, trata-se da acção de padecer, o que constitui uma perturbação ou um afecto desordenado da alma, podendo a palavra “paixão” ser utilizada para explicar, neste caso, um forte falecimento ou sofrimento. Além disso, o termo apresenta um significado especial dentro da doutrina cristã. Se a inicial é escrita com letra maiúscula, refere-se à Paixão de Cristo, a Via Crucis (Via Sacra ou caminho da cruz), sendo representada através de uma série de imagens da Paixão, as (quinze) estações correspondentes a incidentes particulares, isto é, o período de martírio que Jesus Cristo terá vivido antes de morrer para salvar a Humanidade – todos os tormentos físicos e psicológicos que teve de enfrentar desde que foi capturado até ser crucificado e posteriormente sepultado, tais como a sua detenção, a negação por Pedro, a condenação à morte por Pôncio Pilatos e,
entre outras, a crucificação e a sua ressurreição. Noutra acepção, conhece-se como paixão a afeição intensa por algo (por exemplo, “O futebol é a minha paixão”) e a forte inclinação de alguém por outra pessoa (“Amote com paixão”). No primeiro caso (em que se apresenta esse sentimento por um tema específico – podendo ser também por um objecto), é normal que haja um excesso de entusiasmo ao falar ou lidar com algo de que se gosta e em certas situações, e quando a paixão por determinado assunto é extrema o comportamento da pessoa pode estar associado à obsessão ou beirar o fanatismo. No segundo caso, a paixão relaciona-se com o amor e a atracção sexual. Duas pessoas apaixonadas deixam de lado a racionalidade e comportam-se de forma emocional, já que a paixão é dominada pelo coração e não pelo cérebro. E quando um indivíduo responde à sua paixão, a sua principal intenção é satisfazer desejos e expressar sentimentos sem restrições nem limites. A psicologia define a paixão como a manifestação do fenómeno da projecção, isto é, quando uma pessoa projecta as suas idealizações noutra pessoa. Estando apaixonados, somos atraídos pela idealização que fazemos do próxi114
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mo, e não necessariamente pela pessoa como verdadeiramente é, como sucede no acto de amar. As características normalmente mais atraentes para os apaixonados são as físicas, sejam os belos olhos, os lábios, a pele suave ou o sorriso, por exemplo; com o verdadeiro amor conseguimos enxergar muito além das aparências, identificar a chamada “beleza interior” da pessoa, acabando os valores, a autenticidade e a personalidade por serem tão ou mais excitantes do que um belo sorriso.
Qualquer ser humano pode apaixonar-se e a qualquer momento, dependendo de diversos factores associados aos gostos, preferências e referências que cada indivíduo possui. Quando uma pessoa se apaixona por outra, por exemplo,
De facto, a paixão é um sentimento intenso e profundo, por vezes violento, que um indivíduo pode professar por outro, geralmente do sexo oposto mas também do mesmo sexo, e dificulta o exercício de uma lógica imparcial, marcado pelo forte interesse e atracção da pessoa apaixonada
um dos principais sintomas é a intensa atracção sexual e o desejo de estar na companhia da outra.
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por algo ou alguém. Este sentimento possui a capacidade de alterar aspectos do comportamento e pensamento da pessoa, que passa a demonstrar um excesso de admiração por aquilo que lhe causa paixão; não obstante, a impulsividade, o desespero e a inquietação são outras características que costumam estar associadas ao sentimento de paixão.
três anos, em média); após este período, pode chegar ao fim ou transformar-se em amor, que pode durar (ou não) a vida toda. É sobre o tema das paixões que se exprimem os 134 textos poéticos incluídos nesta antologia (poemas tradicionais e prosa poética), ordenados alfabeticamente pelos títulos e escritos por 40 autores lusófonos – de Portugal, Brasil e Cabo Verde. Cada texto apresenta-se num género ou estilo diferente e todos os autores, cujas notas biográficas se encontram nas páginas finais, são importantes. Alguns já viram os seus trabalhos distinguidos em concursos literários, campeonatos poéticos e certames similares, muitos têm obras individuais editadas e outros publicam, pela primeira vez, os seus poemas num livro. Cada texto contém uma paixão; alguns abordam várias paixões. Mas podemos considerar: cada poema, uma paixão. O que faz desta antologia uma verdadeira Torrente de Paixões.
Qualquer ser humano pode apaixonar-se e a qualquer momento, dependendo de diversos factores associados aos gostos, preferências e referências que cada indivíduo possui. Quando uma pessoa se apaixona por outra, por exemplo, um dos principais sintomas é a intensa atracção sexual e o desejo de estar na companhia da outra. Normalmente, alguém apaixonado pensa constantemente no alvo da sua paixão, anseia por estar perto dessa pessoa, sofre de abstinência quando estão separados e sente uma grande felicidade quando estão juntos. No entanto, mesmo sendo uma emoção intensa, alguns estudos sobre o comportamento humano consideram a paixão efémera, podendo durar semanas ou anos (dois a
Prefácio de Isidro Sousa incluído no livro Torrente de Paixões – Antologia de Poesia Lusófona.
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POESIA
RAFA GOUDARD PERDÃO Ninguém na vida é perfeito. Temos qualidades e defeitos, Precisamos nos aperfeiçoar No dia a dia. Nós andamos criando confusões e Intrigas por qualquer coisa, Não medindo as consequências. Colocar-se no lugar do outro Antes de criticá-lo, pois Não sabemos pelo que ele passou. Reconhecendo que todos nós Cometemos erros, É um gesto de humildade Saber perdoar o próximo.
Administrador, músico, pianista, escritor, poeta, cronista e compositor O seu hobby é ler livros; também adora tocar piano nas horas vagas, escrever poesias de madrugada, andar a cavalo quando sobra um tempo e escutar e estudar vários estilos de músicas. Tem poesias publicadas, desde 2015, em várias editoras do Brasil e de Portugal. Em 2016, participou em três concursos e obteve um prémio literário. Página no Facebook: www.facebook.com/rafa.goudard
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ISAAC SOARES DE SOUZA ISAAC SOARES DE SOUZA Nasceu na cidade de Pompéia (SP) e reside em São Carlos (SP), Brasil. Trabalhou nos principais jornais diários da cidade, escreve poesias e letras de músicas desde tenra idade, foi amigo de Raul Seixas e fundou, em 1975, o primeiro fã clube brasileiro em memória ao ídolo e amigo, na cidade de Bariri (SP). Em 1993, iniciou a sua trajectória no segmento literário e biográfico. Participou nas antologias «Mil Poemas a Pablo Neruda» e «Mil Poemas a César Vallejo» e publicou os livros «Raul Seixas, O Verbalóide, Raul Seixas, O Metamorfônico» (1995), «Zé Ramalho: O Profeta do Terceiro Milênio» (2009), «Dossiê Raul Seixas» (2011), «Cantando um Blues» (2012), «Raul Rock Seixas e Raul Seixas, Vômito de Metáforas» (2013), entre outros.
LER LIVROS Ler é o meu prazer de viver Elixir do saber Eloqüência, palavras, Vírus, bactérias, larvas De sabedoria para a alma Não há mestre que não possa ser aluno Nem aluno que não possa ensinar a seu mestre Porque a palavra é metade de quem a pronuncia, Metade de quem a ouve Escrever é um ato solitário E a palavra segue seu itinerário E se torna de domínio popular Escrever é copular com o verbo Mistério mais gozoso que o próprio sexo Por isto vivo – sonhos impressos nos livros Palavras lavam a alma, Livros e muito mais livros Que devoro e mastigo Como tranquilizantes Para as dores que tenho sofrido No peito onde pulsa um coração
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Já carcomido e frágil Pelos ataques cardíacos Induzidos pela falta de cultura, Pelo analfabetismo Deste povo nanico Pigmeu, que nunca um só livro leu... Sinto-me mais vivo por me saber Verbo Pois eis que a palavra é prenha de eternidade Tudo fenece, a vida é pura efemeridade Mas a palavra permanece na sua integridade... Quem não lê livros É indivíduo Passível à ignorância mortal De passar pela vida Sem distinguir o bem do mal Quero um livro para ler Quero ler um livro Só para me saber vivo!!!
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POESIA
PAULO GALHETO MIGUEL O AMOR NÃO SE EXPLICA
PAULO GALHETO MIGUEL Brotou para o mundo em 1962 e cedo se apaixonou pela escrita, como forma de perpetuar aquilo que diz e pensa. Existe melhor perto do mar, bem como do afecto das coisas mais elementares, tais como: sorrir, ler, amar e, finalmente, deixar que a vida faça o resto. Precisa de escrever; é como olhar nos olhos de quem lê as suas palavras, diluída no seu pensar, que se preocupa, sobretudo, com aquilo que à vista desarmada não é visível. É co-autor de várias antologias da Colecção Sui Generis: «Graças a Deus!», «Torrente de Paixões», «Saloios & Caipiras» e tem poemas seleccionados para «Fúria de Viver».
São corpos suspensos no nada... Que fingem que balançam... É o caminhar na chuva descalço... São sentimentos que dançam... Como uma glória ausente... É o corpo por dentro quem mais sente... É o engolir apreensivo, o choro... São os espinhos, do medo que morro... Esta é a vida que me traz no corpo... É o Amor como uma ponte... É a vontade que não está no chão quem me eleva a voz... Sempre será o futuro quem chamará por NÓS!...
Página do Autor: www.facebook.com/paulojorge.galhet omiguel
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
GUADALUPE NAVARRO REFUGIADO Ao ver tua foto, lindo menino, muitos Sequer te olharão Tento escrever algo sobre ti, mais objectivo Mais informativo, mais distante Não sou capaz Um vendaval de emoções Turba meu raciocínio impedindo-me De fazê-lo.
GUADALUPE NAVARRO Nasceu em Lima, Peru. Durante a infância, mudou-se, com os pais e os irmãos, para Londres, Inglaterra. E, numa fase posterior, para o Brasil, onde reside actualmente. É Bacharel em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, com Pós-Graduação em Filosofia Contemporânea. Gosta de música, artes plásticas e História; interessa-se por temas relacionados com Direitos Humanos, refugiados e.protecção de animais. Publicou dois livros: «Poemas da Alma» (Pastelaria Studios, 2015) e «Decifra-me... ou Devoro-te!» (Sui Generis, 2017); este reúne textos de sua autoria publicados em diversas obras colectivas, em Portugal e no Brasil.
A única coisa que logro fazer É pedir-te que, se sobreviveres, Não deixes que o ódio Domine teu coração e Tentes perdoar aqueles Que roubaram tua infância, Que expulsaram-te de tua casa Tornando-te o que hoje és: Refugiado.
Página da Autora: www.facebook.com/rubionav
Foto: MÉDICOS SEM FRONTEIRAS
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
ISIDRO SOUSA OS RAPAZES DA CALÇADA
ISIDRO SOUSA Nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, e vive em Lisboa. Jornalista desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, colaborou com várias editoras, participou em diversas obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e é o mentor de todos os projectos da Colecção Sui Generis, que criou em 2015, cujas antologias organiza e coordena. Em 2016, publicou dois livros de contos: «Amargo Amargar» e «O Pranto do Cisne». Blogue do Autor: http://isidelirios.blogspot.pt Este poema foi incluído na antologia poética «Vendaval de Emoções», lançada pela Sui Generis em Julho de 2016
Sentado na esplanada no silencioso entardecer mergulhada entre a fumegante chávena de café e as páginas do jornal entretenho-me a observá-los... subindo e descendo a calçada – com passadas tão vigorosas quanto eles próprios: os rapazes Algo a despropósito (vindo de nenhures)... insinuam-se os versos musicados de Ary dos Santos – excelente! Mas o Sol implacável obriga a isso mesmo: a deixar-se estar... a não fazer nada... ficar a ver a cidade passar – e os rapazes que (nestas fastidiosas alturas) interessam bem mais do que as inenarráveis manchetes sensacionalistas ou a última discussão no Parlamento Indiferentes a tudo ao seu redor os rapazes limitam-se a caminhar... sozinhos ou acompanhados compondo uma inesgotável sucessão de quadros impressionistas – curioso o contraste entre o colorido das suas tácitas presenças e a solenidade sombria e austera do cenário construído pelas fachadas seculares da calçada Observo-lhes (admiro!) o imponente tronco maciço braços fortes, pescoço largo, ombros enormes, cintura minúscula A postura deles revela-se mais do que irreverente... pouco menos do que arrogante... digamos que empertigada Ainda para mais, mascam (ininterruptamente) a pastilha elástica comprada ritualmente na tabacaria de sempre Alguns usam brinco, os mais conservadores têm barba discreta Se não trazem bonés apresentam cabelos louros ou negros espessos, abundantes, encharcados de gel ou então rapados... à boa maneira militar o que tem a vantagem de lhes sublinhar os contornos firmes dos rostos varonis de vinte e poucos anos de idade 124
SG MAG #02 | MAR 2017
À custa de uma imperceptível conversa ao telemóvel lá se consegue – excepcionalmente – vislumbrar um sorriso escancarado, esporádico, forçado Quanto aos olhos ocultados por detrás dos óculos escuros imagino que sejam castanhos, enormes, luminosos – é indiferente se forem rasgados ou amendoados Ora vestem calças largas ora ficam-se pelos calções e sandálias Outros ainda preferem um frequente modelo compromissório pouco abaixo dos joelhos – e de novo as benditas sandálias! Trazem camisas (geralmente de xadrez) de mangas arregaçadas ou t-shirts de todas as cores e padrões possíveis e imaginários E nas mãos... molhos de cadernos, um livro ou o jornal da bola Para onde se dirigem? Provavelmente para as suas famílias para os empregos, para a escola, para os ensaios, para o ginásio – ou para outras inutilidades e perdas de tempo quaisquer Ressalta de toda esta (terna) observação a sua alienação: desconhecem-se a eles próprios desconhecem este poema desconhecem os magníficos instantes e o verdadeiro turbilhão de sentimentos que acalentam 125
SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
DEISE ZANDONÁ FLORES ESPIRROS DE ENGRENAGEM O telhado tem defeitos e goteiras, mas o forro ainda mantém os cabelos secos. No sótão, ainda chove... Enquanto chovem lágrimas de céu, regados estão os jardins de pensamentos-flores.
DEISE ZANDONÁ FLORES Poetisa, Escritora e Historiadora. Os seus poemas reflectem a intensidade e a inquietude com que sente a vida e percebe o mundo. São fortemente inspirados nos seus interesses por música e leituras nas áreas de cultura e filosofia da antiguidade clássica, mitologia e psicanálise. Nascida em 1977 na cidade de Canoas, RS, Brasil, actualmente mora no estado do Paraná.
Página da Autora: http://www.altasensibilidade.com/
No interior da casa-vida, a poeira provoca espirros e alergias à ressequidão da engrenagem empoeirada, sem manutenção e não-lubrificada da senda diária. Fora da poesia, insistimos em celebrar espirros e amaldiçoar a chuva, enquanto compramos líquidos para descongestionar as narinas... ... tão salgados quanto as lágrimas de céu, que, no charco, atolam os pés e molham o chapéu. Fora da poesia, insistimos em celebrar espirros de rotina-realidade-prática-ressequida e amaldiçoar os loucos e livres pensamentos hidropônicos.
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
LUCINDA MARIA NÃO IMPORTA!
LUCINDA MARIA Lucinda Maria Cardoso de Brito nasceu em Oliveira do Hospital, em 1952. Fez um percurso académico muito bom e tirou o curso do Magistério Primário, começando a leccionar em 1972. Encontra-se aposentada, mas continua a ensinar, agora artes decorativas, na Universidade Sénior de Rotary de Oliveira do Hospital. Tem quatro livros publicados – «Palavras Sentidas» (2013), «Alma» (2014), «Divagando...» (2015) e «Terra do Meu Coração» (2016) – e participações em variadíssimas obras colectivas. Da Sui Generis, participou em «A Bíblia dos Pecadores», «Graças a Deus!», «Vendaval de Emoções» e «Torrente de Paixões». Como autora, gosta de identificar-se apenas por Lucinda Maria e não escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990.
Chegaste, meu amor. Era madrugada E chovia lá fora... bátegas brilhantes, Cristais de neve enregelando a alma... Só eu e tu... e eu, na quentura amada, Senti doce torpor, lágrimas cantantes, Emergindo da ternura que me acalma! Não importa a chuva... a neve... o frio... Aqui, no ninho do abraço que me deste, Há um bordado de luz... e há a poesia, Que me enredaram num beijo... um fio Feito das palavras de seda que disseste Eu sorvi, sofregamente, e mais sorveria! Tu sabes, sabes que estás sempre comigo, Como aquele poema que teci de emoções, Na saudade de ti... do teu olhar cadente... Não importa como, nem sei, mas consigo Ser tua sem ser... intuir puras sensações, Talvez seja este amor... teu eternamente!
Página da Autora: facebook.com/lucindamaria.brito
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
JONNATA HENRIQUE
SEDUZA-ME OU CONTINUE TENTANDO Entrega-me tua alma por inteiro Somente interessa a servidão Mostras o que tens a oferecer Talvez aconteça uma exceção Reveles teu eu pro meu eu Diga aquilo que espero ouvir Elogia-me fomenta este ego Narcisismo dessa forma nutrir
JONNATA HENRIQUE Poeta, escritor, pernambucano, amante das letras, publica os seus trabalhos nas páginas Gloryland e Angola-Brasil Poesias, além de participar em diversas antologias brasileiras e portuguesas.
Domina-me ou vá embora Seduza-me para teu bem Continue tentando devotado Mastigando migalhas que tem
Página do Autor: www.facebook.com/Gloryland.com.br
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
ÂNGELA CABOZ IRONIA DO DESTINO Ironia do destino! Ter-te amado antes de te ter olhado. Ironia que o meu coração te tenha encontrado, por mais distraídos que os meus olhos andassem. Jamais seria capaz de amar sem tocar. De desejar sem conhecer. Por mais, que te conheça sem te ter visto. ÂNGELA CABOZ Tem 50 anos, é natural de Tavira (Santiago) e apaixonada desde sempre por leitura, música e cinema. Escreve com o “coração nas mãos” sobre os sentimentos que lhe habitam na alma e que reflectem a sua maneira de ver e sentir o mundo real, que a rodeia. Publicou, em Setembro de 2014, o seu primeiro livro exclusivamente de poesia «À Procura de Um Sonho»; em Julho de 2016, publicou «Amo-te Miúdo Tonto» e tem várias participações em obras colectivas.
Curioso, como o destino aproxima dois corpos distantes. Como cruza dois caminhos diferentes. Curioso, como se juntam opostos e se aproximam estanhos. O destino conhece mistérios sobre nós, que nunca nos contará. Tem trunfos escondidos de que ninguém suspeita. E, assim a seu tempo, ele escreve uma história de amor de dois seres que jamais sonharam conhecer-se e que de repente não vivem um sem o outro. Ironia do destino. Estava escrito no livro divino, que tu só poderias ser meu!
Página da Autora: www.facebook.com/angela.caboz
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
ISABEL MARTINS O SOL E A LUA
ISABEL MARTINS Leitora atenta que acompanha diversos e variados eventos literários. Escreve pontualmente poemas e divulga-os na sua página do Facebook. Participou em duas antologias organizadas pela Sui Generis: «Graças a Deus!» e «Torrente de Paixões». Reside em Palmela, Portugal.
O sol, radiante, num belo final de tarde E orgulhoso de si, olhou de lado a lua, E perguntou-lhe a idade que ela tinha. A lua, tímida, mas bela, respondeu-lhe: A idade suficiente para te poder amar!... Estou sempre aqui só para te ver passar, Desejar-te boa noite antes de te ires deitar. Mas nem me olhas, nem nada me dizes, E penso que poderíamos ser bem felizes. Mas lua, respondeu-lhe o sol, só sonhas! Não vês sempre tantas estrelas cintilantes? São todas elas as minhas lindas amantes! Tu, ora te vejo a sorrir, ora te vejo de lado, Outras vezes nem te vejo, fico até pasmado. As estrelas dançam comigo, sinto-me amado. Tu nem sequer te moves para nenhum lado. Enganas-te, retorquiu, ando sempre contigo Mas tu és sempre, sempre tão apressado... Qualquer estrela te engana e até foge de ti... Vejo-as a correr, pobre coitado, penso eu... Mas eu, ao contrário, fico, velo e se dormes, Beijo-te ao de leve em noites de lua nova... E sonho, sonho o dia em que serás meu!... E penso quando, finalmente, eu serei tua!...
Página da Autora: facebook.com/isabel.martins.395669
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SG MAG #02 | ABR 2017
POESIA
SANDRA BOVETO À LUCIDEZ
SANDRA BOVETO Reside em Maringá (PR), Brasil. Com formação académica em Letras e Direito, ingressou no universo da escrita em 2015, ao buscar a publicação do seu primeiro livro: «O Mundo Exclamante». Possui poemas e contos publicados em diversas obras colectivas (Brasil e Portugal), destacando-se, pela Sui Generis, as antologias «Graças a Deus!», «Sexta-Feira 13», «Torrente de Paixões» e «Fúria de Viver», para as quais tem textos seleccionados.
Dentro de mim há um enigma. Olho para fora, busco a cura. Não resisto, quero a loucura, essa que cura, loucura benigna. Pois quando louca, sinto-me sã, salva da lucidez que me enlouquece, dessa lucidez que me adoece. Quero a loucura cega, surda e vã. Sim, vã! Pois o que faz sentido maltrata. O significativo não mais me arrebata. Vou-me ajustar a essa vida insana. Não resisto! Tiraram-me a gana! ... Não, não é isso! Fui leviana! Quero a lucidez, a mais cara loucura. Volto à lucidez e me entrego à tortura. Que doa, que maltrate ou que me mate, mas confio à lucidez o meu resgate.
Página da Autora: www.facebook.com/sandra.bovetodasi lveira
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SG MAG #01 | JAN 2017
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SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
SEXTA-FEIRA 13 Antologia de Contos Assombrosos Uma edição Sui Generis com 32 Autores Lusófonos Há muito tempo, certos dias são compreendidos como impregnados de algum tipo de infortúnio ou má sorte. O encontro do dia 13 com a sexta-feira é repleto de lendas e crendices que deixam os mais supersticiosos de cabelos em pé. Em redor do número 13 existem sombras e desconfianças enraizadas em várias culturas: estavam presentes 13 pessoas na Última Ceia, o capítulo 13 do Apocalipse assume que o número da besta e do anticristo é o 666, a Cabala enumera 13 espíritos malignos e Loki, deus da discórdia na mitologia nórdica, surge como o 13º convidado. A sexta-feira, por sua vez, tem igualmente conotações obscuras: Jesus foi crucificado numa sexta-feira, estudiosos da Bíblia crêem que Eva ofereceu a maçã a Adão ao sexto dia da semana, Caim terá assassinado Abel numa sexta-feira e consta que o Templo de Salomão foi destruído, também, nesse dia. De facto, o número 13 está associado a uma série de mitos, lendas, curiosidades e superstições, e se conjugado com o dia da semana de azar (sexta-feira) tem-se, pela tradição, o mais azarado dos dias. Que terá origem num evento de má memória, em 13 de Outubro de 1307 (sexta-feira), quando Filipe IV de França declarou ilegal a Ordem dos Templários e perseguiu os seus membros, executando alguns deles por heresia – caso do grão-mestre Jacques de Molay, cuja maldição que lançou, antes de ser atirado à fogueira, sobre o monarca francês e o Papa Clemente V, se viria a cumprir. Há muitas outras versões acerca da origem da sexta-feira 13 e é difícil deslindar qual é a correcta; o que se sabe é que essa data permanece relacionada com maldições e assombrações. É em torno desse dia que se debruçam os 32 textos incluídos nesta antologia, recheados de mitos e superstições – estórias verdadeiramente assombrosas, ambientadas (vividas ou inspiradas) numa sexta-feira dia 13, redigidas por 32 autores lusófonos, de Portugal, Brasil e Cabo Verde. Organização e Coordenação: Isidro Sousa. Autores: Ademir Pascale, Akira Sam, Ana Paula Barbosa, Angelina Violante, Boriska Petrovna, Carlos Arinto, Carmine Calicchio, Everton Medeiros, Fernanda Kruz, Fernando Magalhães, Florizandra Porto, Guadalupe Navarro, Hélio Sena, Isidro Sousa, Jonnata Henrique, José Teixeira, Júlio Gomes, Manuel Amaro Mendonça, Marcella Reis, Márcio Rafael Lopes, Marizeth Maria Pereira, Paula Homem, Ricardo de Lohem, Ricardo Solano, Rosa Marques, Sandra Boveto, Sara Timóteo, Sertorius, Stephanie Donnovan, Suzete Fraga, Teresa Faria, Wesley Pio. 135
SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
A BÍBLIA DOS PECADORES Do Génesis ao Apocalipse
Esta obra literária revela-se uma Bíblia de pecadores porque as narrativas que a compõem foram inspiradas em passagens ou episódios da Sagrada Escritura e a autoria dos textos é da responsabilidade de 44 humildes pecadores, o que faz desta antologia A Bíblia dos Pecadores. Os 44 textos que apresenta foram redigidos em diversos géneros literários; da crónica ao conto policial, do drama à comédia, da prosa poética à biografia romanceada, da sátira à ficção científica, da fábula à peça teatral, da tragédia à aventura romântica... Os próprios autores, portugueses e brasileiros, escolheram os temas que desejaram desenvolver, independentemente das suas raças, crenças, orientações sexuais e filosofias de vida.
A BÍBLIA DOS PECADORES Do Génesis ao Apocalipse Antologia de textos literários inspirada em episódios bíblicos Organização: Isidro Sousa Autores: 44 Autores Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 378 páginas 1ª Edição: Dezembro 2015 ISBN: 978-989-20-6291-4 Depósito Legal: 402747/15 Encomendas: letras.suigeneris@gmail.com www.euedito.com/suigeneris letras-suigeneris.blogspot.pt
Cada texto inclui uma citação da Bíblia, do episódio em que é inspirado, e o critério de apresentação dos mesmos baseia-se na ordenação bíblica, a partir das citações designadas. Do Génesis ao Apocalipse. Desse modo, surgem, nas primeiras páginas, as narrações inspiradas no Génesis, e nas derradeiras as tramas apocalípticas. Organização e Coordenação: Isidro Sousa. Autores: Akira Sam, Ana Paula Barbosa, Angelina Violante, Antônio Guedes Alcoforado, Bárbara Baptista, Camilo de Lélis, Carlos Arinto, Daniel Vicente, Edson Amaro de Souza, Eduardo C. Duque, Eduardo Ferreira, Estêvão de Sousa, Fernando Morgado, Guadalupe Navarro, Isa Patrício, Isidro Sousa, Jeracina Gonçalves, Joaquim Bispo, Jonnata Henrique, Jorge Manuel Ramos, Jorge Pincoruja, José Duarte Mateus Beatriz, José Teixeira, Lírio de Xangai, Lia Molina, Lucinda Maria, Manuel Amaro Mendonça, Marcella Reis, Mari Marques, Maria Côrrea, Maria de Fátima Soares, Paula Homem, Paulo Rodrigues, Pedro Miguel Ferreira, Ricardo de Lohem, Robert Mar, Sakura Shounen, Sara Timóteo, Sérgio Sola, Suzete Fraga, Tânia Tonelli, Teresa Morais, Ton Botticelli, Yolanda Silva. 136
SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
DAQUELES ALÉM MARÃO «Para além do Marão, mandam os que lá estão» é uma máxima que não se pode contestar. Gente dura, os transmontanos. São filhos da terra e das pedras: gerados sob o tórrido Verão e embalados nas neves que coroam os montes e gelam as casas. Como o ferro bem temperado, das pedras herdaram a dureza e a força e do Sol o calor da simpatia e da lealdade. Nesta obra de Manuel Amaro Mendonça, vamos conhecer camponeses, guardadores de cabras e até salteadores. Mas seja na vivência de uma das muitas lendas da região, nas dores do amor ou nas agruras das invasões napoleónicas, é a sua tempera que vai sobressair e, tal como o azeite na água, assim eles se distinguirão dos restantes. É deles que se fala neste livro, Daqueles Além Marão... daqueles que lá vivem, trabalham, riem e choram. «Mantendo um olho na arma e o outro a vigiar o Xico, Zé recarregou a pistola com pólvora e colocou a esfera metálica que pressionou para o fundo do cano, várias vezes, com a vareta. Em seguida, testou o fecho de pederneira, várias vezes, para se certificar que não se repetia o acidente.» (excerto do conto “O Assalto”, incluído no livro)
DAQUELES ALÉM MARÃO Autor: Manuel Amaro Mendonça Editora: Createspace Publishing ISBN: 978-1517005597 1ª Edição: Março 2017 Páginas: 196 páginas Distribuição: Amazon Encomendas: amaro.autor@gmail.com www.amazon.eu Páginas do autor: http://manuelamaro.wix.com/autor facebook.com/manuel.amaromendonca
«Um lobo, com os pelos do dorso eriçados, enfrentava-o a poucos metros. Conseguia ainda divisar o brilho dos olhos de mais uns quantos. Percebeu que a sua hora chegara. Mesmo que conseguisse salvar-se contra um deles, não tinha qualquer hipótese contra a alcateia. Involuntariamente, vendo os restantes quatro predadores abandonando as sombras, uma prece saiu espontânea dos seus lábios trementes.» (excerto de “Salvo”, outro conto incluído no livro) Daqueles Além Marão é o terceiro livro (contos) de Manuel Amaro Mendonça, um engenheiro de sistemas multimédia que nasceu em 1965, em São Mamede de Infesta, e reside no concelho de Matosinhos. Em 2015 lançou Terras de Xisto e Outras Histórias, o seu primeiro livro (contos), em 2016 publicou Lágrimas no Rio (novela) e participa regularmente em obras colectivas de diversas editoras. 137
SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
IRINA – A GUERRILHEIRA Diz a sinopse deste livro da autoria de Estêvão de Sousa: «Ela viveu uma experiência inesquecível, vendo-se, de repente, envolvida numa aventura que lhe poderia ter custado a vida nas areias escaldantes do Iraque e da Síria. A experiência, aliada ao aliciamento de que foi alvo pelo próprio marido, fez dela uma Peshmerga. Travou batalhas, fez sabotagens, infligiu pesadas derrotas ao exército do autoproclamado Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL). Desiludida e revoltada com tudo o que viu, acabou desertando. De volta ao seu país, iniciou uma campanha de alerta, a toda a juventude mundial, procurando evitar que outros caíssem no logro em que ela havia caído.» Irina – A Guerrilheira é um romance que, pela actualidade e pelo realismo com que aborda um assunto tão melindroso, deve ser lido por todos: pais e filhos. IRINA – A GUERRILHEIRA Autor: Estêvão de Sousa Editora: Pastelaria Studios ISBN: 978-989-8796-31-8 Depósito Legal: 395225/15 Nº de Páginas: 135 páginas Encomendas: estevaodesousa@hotmail.com Páginas do Autor: www.boa-leitura.simplesite.com www.facebook.com/francisco.estev aodesousa www.facebook.com/francisco.deso usa.5473
Estêvão de Sousa nasceu em Lisboa, em 1937. Aposentado, é autor literário de seis obras. Editadas: «Nesta Terra Abençoada», «Tráfico no Rio Geba» e «Irina – A Guerrilheira». Por editar: «Retalhos de uma Vida», «Ouro Negro» e «Rapto em Londres». Tem diversas colaborações em obras colectivas de várias editoras: «A Mulher do Próximo», «Crime Sem Castigo», «Sete Pecados Capitais», «Amar (S)Em Desespero», «Quando o Amor é Cego», «Deitado em Berço Esplêndido», «Obsessões», «Enigmas», «Boas Festas», «A Bíblia dos Pecadores», «O Beijo do Vampiro», «Saloios & Caipiras», entre outras.
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SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
DECIFRA-ME… OU DEVORO-TE! Decifra-me... ou Devoro-te! apresenta doze estórias de personagens bastante peculiares. Como, por exemplo, a bela Micaela, uma jovem um tanto maluca que, em primeira instância, pode mostrar-se confusa ou mesmo desequilibrada. Como o belo e bem-sucedido Afonso, cujo segredo, quando revelado, surpreende e choca, e a enigmática e esquiva Rosana, que revela não ser o que aparenta ser. E também Branca, a editora pouco ortodoxa que, depois de aplicar tantas falcatruas, recebe o golpe de misericórdia de quem menos espera. Ou António, cujo inusitado encontro com uma mulher misteriosa o fará embarcar numa viagem surreal. A obra apresenta ainda a tartaruga Totó que, recordando como foi parar ao jardim zoológico, revela as complexas relações de uma família.
DECIFRA-ME... OU DEVORO-TE! Autora: Guadalupe Navarro Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 150 Páginas 1ª Edição: Março 2017 ISBN: 978-989-8856-07-4 Depósito Legal: 419840/16 Encomendas: grn3006@gmail.com www.euedito.com/suigeneris
Doze enredos absurdamente irreais, doze narrativas escandalosamente verosímeis. Doze tramas pelas quais desfilam diversos tipos de personagens que vivenciam todas as matizes de sentimentos. São textos escritos com uma sofisticada simplicidade... estórias que divertem, emocionam, surpreendem. E, ao serem decifradas, deleitam mentes devorando corações. Guadalupe Navarro nasceu em Lima, Peru. Durante a infância, mudou-se, com os pais e os irmãos, para Londres, Inglaterra. E, numa fase posterior, para o Rio de Janeiro, Brasil. Bacharel em Filosofia, editou o seu primeiro livro, Poemas da Alma, em 2015. Decifra-me... ou Devoro-te! reúne todos os textos de sua autoria publicados em diversas antologias, em Portugal e no Brasil.
Página da autora: www.facebook.com/rubionav
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SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
MAR EM MIM Mar em Mim resulta de um conjunto de emoções sentidas perante a beleza de duas ilhas, Madeira e Porto Santo, e o fascínio que o mar e a Natureza exercem na autora. Emoções apreendidas desde a mais tenra idade... quando as brincadeiras ao ar livre eram interrompidas para contemplar o pôr-do-sol, o deslumbramento das árvores recortadas no horizonte em ouro.
MAR EM MIM Autora: Rosa Marques Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 128 Páginas 1ª Edição: Outubro 2016 ISBN: 978-989-8856-02-9 Depósito Legal: 417594/16
A diversidade das flores, os pinheiros altos, os plátanos, as acácias e as giestas em flor alegraram, igualmente, a sua infância. E o canto dos pássaros, a Lua formosa e altiva, as mudanças operadas na paisagem em cada estação, e o mar sempre presente... O mar como elo fundamental para quem vive nas ilhas, sendo necessário transpô-lo para vencer as encostas íngremes da solidão. O mar amigo que fascina e atrai, mas também o mar adverso, condicionando e interpondo-se com toda a sua imponência, que é preciso respeitar. Rosa Marques nasceu em 1959, na Madeira, onde viveu até aos dezoito anos de idade. Após o seu casamento mudou-se para Porto Santo, onde reside e trabalha. Da beleza das ilhas e da necessidade de registar recordações da infância, surgem os poemas reunidos neste volume. Tem participações literárias em diversas obras colectivas, em Portugal e no Brasil. Mar em Mim é o seu primeiro livro.
Encomendas: rccorreiamarques@gmail.com www.euedito.com/suigeneris Telefone: (+351) 968237834 Página da autora: Facebook: Maria Correia
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SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
AMO-TE MIÚDO TONTO Este novo livro de Ângela Caboz, Amo-te Miúdo Tonto, inclui textos interligados entre si, que contam as confissões e sentimentos de um homem e uma mulher, que se encontram por mero acaso e descobrem o amor. O amor da miúda, que sempre sonhou com o amor, e do miúdo tonto que a conquistou quando um dia lhe beijou o sorriso. A paixão censurada pela sociedade, dois destinos que se cruzaram, duas vidas opostas, um amor sem uma promessa de futuro, apenas o compromisso de viverem momentos de felicidade, sem pensar no amanhã.
AMO-TE MIÚDO TONTO Autora: Ângela Caboz ISBN: 978-989-691-503-2 Depósito Legal: 411877/16 Encomendas: angela.caboz@gmail.com
Ângela Gaspar Caboz tem 50 anos, é natural de Tavira (Santiago) e apaixonada desde sempre por leitura, música e cinema. Escreve com o “coração nas mãos” sobre os sentimentos que lhe habitam na alma e que reflectem a sua maneira de ver e sentir o mundo real, que a rodeia. Publicou dois livros, À Procura de Um Sonho (2014) e Amo-te Miúdo Tonto (2016), e tem várias participações em obras colectivas. Da Colecção Sui Generis, participou em Vendaval de Emoções.
Blogue da Autora: http://confissoesdamiudagira.blogs pot.pt Páginas no Facebook: www.facebook.com/angela.caboz www.facebook.com/angelacabozbl ogpessoal
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SG MAG #02 | ABR 2017
LIVROS
ALMAS FERIDAS Almas Feridas é a soma dos mais diversos sentimentos que acabam, inevitavelmente, por nos ferir a alma; moldados pela imaginação, os contos apresentados neste livro caminham de mãos dadas com as nossas fragilidades enquanto seres humanos.
ALMAS FERIDAS Autora: Suzete Fraga Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 214 Páginas 1ª Edição: Outubro 2016 1ª Reimpressão: Dezembro 2016 2ª Reimpressão: Dezembro 2016 3ª Reimpressão: Março 2017 ISBN: 978-989-8856-03-6 Depósito Legal: 417596/16 Encomendas: suzetefraga@hotmail.com www.euedito.com/suigeneris Telefone: (+351) 966326916
Esta obra mergulha a sangue-frio na sede de vingança e nas relações entre irmãos (bem ao estilo de Caim e Abel), passando pelo dilema da fidelidade no matrimónio. Permite-nos ainda viajar para cenários campestres, recuar no tempo até aos anos 80 do século passado, pregar partidas carnavalescas, espreitar vidas desfeitas pelo álcool e pela violência doméstica, desvendar traições, amores desmedidos, reencontros no Além e narcisismos que levam à loucura, encarar a vida com os olhos de quem não vê, herdar veredictos cruéis, testemunhar actos verdadeiramente altruístas, ler cartas de amor, desfolhar sonhos, sentir a emoção da despedida, conviver com sogras encantadoras, descobrir o dom da humildade ou conhecer videntes muito peculiares. Suzete Fraga nasceu no ano de 1978 em Azurém, Guimarães, e reside em Póvoa de Lanhoso. Experimentou o árduo calejar da lavoura ainda na infância, aprendendo a usar, desde cedo, a escrita e os sonhos como um escape ou até mesmo como um meio de subsistência existencial. Tem textos espalhados em colectâneas e antologias de várias editoras e foi distinguida em três concursos literários. Almas Feridas é o seu primeiro livro.
Página da autora: www.facebook.com/suzete.fraga
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LIVROS
A ÍRIS AZUL DE CLEÓPATRA A Íris Azul de Cleópatra é a primeira distopia do autor Júlio Gomes. Apareceu originalmente na antologia Deitado em Berço Esplêndido, organizada por Antônio Guedes Alcoforado, no Brasil. Depois foi transformada num ebook que está sendo vendido na Internet, nos sites da Amazon e da Saraiva. Diz a sinopse da obra: «No passar dos anos a contrafação alcançou níveis devastadores. No ano de 2050 uma vacina inibidora de todo o tipo de corrupção é desenvolvida com sucesso por um governo autoritário. Todos são obrigados a tomá-la. Chegamos ao tempo do fim da corrupção. Mas um homem decide fugir para defender a sua família e a sua liberdade de escolha. Na sua jornada ele encontrará um grupo rebelde e uma mulher misteriosa que poderá salvá-lo. Será realmente o fim da corrupção? Há um antidoto para a vacina? Leia essa aventura distopia e seja você também conquistado pela Íris Azul de Cleópatra.» A ÍRIS AZUL DE CLEÓPATRA Autor: Júlio Gomes Publicado no Brasil São Paulo, 1ª edição, 2016 Disponível na Amazon Essencial eBooks essencialebooks@gmail.com Contacto do Autor: fabiogbp@hotmail.com Facebook: Fábio Gomes
Júlio Gomes é o pseudónimo de Fábio Gomes Borges. Nascido no Rio de Janeiro, morador no bairro de Campo Grande, professor de História da rede pública, fã incondicional de Ficção Científica, Suspense, Terror e Fantasia, iniciou a carreira de escritor em 2015. Desde então, publicou vários contos em antologias de diversas editoras, no Brasil e em Portugal, e o ebook A Íris Azul de Cleópatra em 2016. Da Colecção Sui Generis, participou nas antologias Graças a Deus!, Ninguém Leva a Mal e Sexta-Feira 13.
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LIVROS
NINGUÉM LEVA A MAL Antologia de Estórias Carnavalescas
A antologia Ninguém Leva a Mal, organizada sob o lema É Carnaval, ninguém leva a mal, reúne textos de trinta autores lusófonos, de Portugal, Brasil e Cabo Verde, que abrangem diferentes estórias carnavalescas, ou ambientadas no período do Carnaval, recheadas de aventura, suspense, humor, fantasia, acção, mistério e (muita) sensualidade. No entanto, porque o Carnaval nem sempre é sinónimo de folia ou diversão, Ninguém Leva a Mal contempla igualmente enredos dramáticos que incluem laivos de romantismo, intriga policial, biografia romanceada e outras narrações fascinantes que deambulam pela História, sem olvidar fortes emoções como a paixão arrebatadora, a obsessão destrutiva e o amor genuíno.
NINGUÉM LEVA A MAL Antologia de Estórias Carnavalescas Organização: Isidro Sousa Autores: 30 Autores Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 226 páginas 1ª Edição: Março 2017 ISBN: 978-989-8856-33-3 Depósito Legal: 423332/17 Encomendas: letras.suigeneris@gmail.com www.euedito.com/suigeneris letras-suigeneris.blogspot.pt
Cada autor escolheu os ingredientes que desejou abordar e deixou-se ao sabor de cada um o modo como desenvolveram os seus enredos, porém, o resultado global traduz-se num conjunto de contos literários que privilegiam a ambiência festiva do Carnaval – tramas vividas ou simplesmente inspiradas na época carnavalesca, podendo ser reais ou ficcionadas. Organização e Coordenação: Isidro Sousa. Autores: Adeilton Lima, Ana Paula Barbosa, André Varela, Angelina Violante, Apolo, Augusta Silva, Carlos Arinto, Denise Berto, Florizandra Porto, Guadalupe Navarro, Isidro Sousa, Ivan de Oliveira Melo, João Santos, Jonnata Henrique, José António Loyola Fogueira, José Teixeira, Júlio Gomes, Marcella Reis, Maria Isabel Góis, Marizeth Maria Pereira, Rosa Marques, Sakura Shounen, Sara Timóteo, Sérgio Sola, Sertorius, Sidney Rocha, Suzete Fraga, Teresa Faria, Tito Lívio, Vânia de Oliveira.
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LIVROS
TORRENTE DE PAIXÕES Antologia de Poesia Lusófona
A paixão é um sentimento intenso e profundo, por vezes violento, que um indivíduo pode professar por outro, geralmente do sexo oposto mas também do mesmo sexo, e dificulta o exercício de uma lógica imparcial, marcado pelo forte interesse e atracção da pessoa apaixonada por algo ou alguém. Este sentimento possui a capacidade de alterar aspectos do comportamento e pensamento da pessoa, que passa a demonstrar um excesso de admiração por aquilo que lhe causa paixão; não obstante, a impulsividade, o desespero e a inquietação são outras características que costumam estar associadas ao sentimento de paixão.
TORRENTE DE PAIXÕES Antologia de Poesia Lusófona Organização: Isidro Sousa Autores: 40 Autores Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 226 páginas 1ª Edição: Março 2017 ISBN: 978-989-8856-34-0 Depósito Legal: 423611/17 Encomendas: letras.suigeneris@gmail.com www.euedito.com/suigeneris letras-suigeneris.blogspot.pt
É sobre o tema das paixões que se exprimem os 134 textos poéticos – poemas tradicionais e prosa poética – incluídos neste livro, ordenados alfabeticamente pelos títulos e escritos por quarenta autores lusófonos. Cada texto apresenta-se num género ou estilo diferente e contém uma paixão... o que faz desta antologia uma verdadeira Torrente de Paixões. Organização e Coordenação: Isidro Sousa. Autores: Alma Brota, Amélia M. Henriques, Ana Clara Marinho, Ana Paula Barbosa, Anderson Furtado, Angelina Violante, Carlos Arinto, Carmine Calicchio, Cristina Sequeira, David Sousa, Fernanda Helena, Fernanda Kruz, Florimundo Carvalho, Florizandra Porto, Glória F. Pais, Goreti Ferreira, Isabel Martins, Isidro Sousa, João Almeida, Jonnata Henrique, Lucinda Maria, Madalena Cordeiro, Manuel Fernando, Manuel Timóteo de Matos, Marcella Reis, Maria do Pilar Santos, Maria Isabel Góis, Marizeth Maria Pereira, Natália Vale, Paulo Galheto Miguel, Paulo Rodrigues, Rafa Goudard, Rosa Maria, Rosa Marques, Sandra Boveto, Sara Timóteo, Suzete Fraga, Teresa Faria, Tiago Gonçalves, Tito Lívio. 145
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LIVROS
SALOIOS & CAIPIRAS Contos, Causos, Lendas e Poesias
Antologia Luso-Brasileira de contos, causos, lendas e poesias subordinada ao tema da Vida Rural e Campesina nos dois lados do Atlântico: Brasil e Portugal. Nesta obra que é terra fértil estão plantadas pequenas histórias com grandes romances e laços de amizade que nos fazem render o joelho ao chão e agradecer pelos animais e pela MãeNatureza, momentos de comédia, mininovelas, lendas, dramas familiares e de vínculos profundos, intrigas, preces, cânticos em forma de pura homenagem... Homenagem esta onde nomes de artistas e autores estão presentes através do seu trabalho feito de coração, para representar e enaltecer o campo, os seus habitantes e visitantes.
SALOIOS & CAIPIRAS Antologia Luso-Brasileira Contos, Causos, Lendas e Poesias Organização: Isidro Sousa Coordenação: Marcella Reis Autores: 31 Autores Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 250 Páginas 1ª Edição: Abril 2017 ISBN: 978-989-8856-41-8 Depósito Legal: 425238/17 Encomendas: letras.suigeneris@gmail.com www.euedito.com/suigeneris letras-suigeneris.blogspot.pt
Este livro tem o cheiro das pedras dos rios que correm em cima delas, do Sol quarando a roupa, das bananas bravas, das mandiocas sendo paridas da terra, dos amores nos milharais, das pamonhas, das papas de milho, dos pequis, jabuticabas, uvas do Douro, do Minho... Saboreiem, pois, cada gota das palavras que aqui se fazem presentes. Organização: Isidro Sousa. Coordenação: Marcella Reis. Autores: Aldir Donizeti Vieira, Angelina Violante, Antônio Guedes Alcoforado, Apolo, Cadu Lima Santos, Carla Santos Ramada, Carlos Arinto, Carmen Jara, Diamantino Bártolo, Eloy Rondon, Espedita China, Estêvão de Sousa, Fernanda Kruz, Guadalupe Navarro, Hélverton Baiano, Isidro Sousa, Jonnata Henrique, Jorge Manuel Ramos, Letícia Álvares, Luís Altério, Luiz Carlos Rodrigues, Manuel Amaro Mendonça, Marcella Reis, Paulo Galheto Miguel, Rafa Goudard, Rosa Marques, Sara Timóteo, Suzete Fraga, Tânia Tonelli, Teresa Morais, Tito Lívio.
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LIVROS
REFÚGIO MISTERIOSO
REFÚGIO MISTERIOSO Autor: Sara Timóteo Editora: Lua de Marfim Colecção: Lua Cheia Formato: 15,00 x 22,00 cm Género: Conto PVP: 10,00 euros Nº de Páginas: 70 páginas 1ª Edição: 2012 ISBN: 978-989-8724-26-3 Encomendas: luademarfimeditora@gmail.com http://luademarfim.com Páginas da Autora: www.facebook.com/wind.sidh www.facebook.com/sara.timoteo.5
Camila, com 15 anos, sabe que quer ser escritora. No entanto, tudo parece impedi-la. Numa vila sem nome, num tempo marcado apenas pela consciência interna do passar dos dias, a mãe quer que ela seja uma mulher como as outras. As amigas querem que ela lhes seja subserviente. Os rapazes e homens deste espaço-tempo desconhecido desejam o seu corpo – mas também a sua alma e, eventualmente, o seu espírito. Neste livro acompanhamos a veloz degradação de uma vida. Ficamos também a conhecer de perto a linha ténue que separa a genialidade da desagregação total e irreversível da personalidade. Afinal, todo o escritor tem um pouco de ilícito dentro de si. Numa cadência ritmada pelo sentir e pensar de cada um, encontramos ecos da voz interior de todo o ser humano. A paixão, a obsessão, o amor, o crime e o resgate são os cinco compassos que compõem o andamento deste refúgio misterioso onde ninguém está a salvo, nem mesmo o leitor. O fantasma estético da loucura vive nas personagens, convertendo-se em complexo de perseguição, episódios a que se segue uma total amnésia e dissolução de todas as regras e convenções socialmente correctas. O arrependimento e a culpa são apenas aparentes. O verdadeiro terror não vem de fora de nós, antes acompanha cada um dos nossos passos… Sara Timóteo, a autora, nasceu em 1979 em Torres Vedras e reside na Póvoa de Santa Iria há 28 anos. Escreve para responder a uma compulsão interna e para tomar conhecimento de vários desafios. Publicou diversos livros: Deixai-me Cantar a Floresta e Chama Fria ou Lucidez (Papiro Editora, 2011); Refúgio Misterioso (2012), Os Passos de Sólon (2014), Elixir Vitae (2014) e Os Quatro Ventos da Alma (2014) pela Lua de Marfim; O Telejornal (Cadernos de Santa Maria, 2015); O Corolário das Palavras (Rui M. Publishing, e-book, 2016); Refracções Zero (Orquídea Edições, 2016). 147
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LIVROS
AMARGO AMARGAR As protagonistas deste livro entregam o corpo e a alma ao amor. Porque amar não é pecar. Mas pode ter um sabor a fel... A aristocrata Manuela Valente adoece consumida pelo remorso, após atentar contra a vida da rival. A sofrida Beatriz torna a entregar-se ao amor quando conhece um homem bondoso, porém, misterioso. A camponesa Celina julga-se abandonada pelo namorado rico pouco antes de descobrir que alberga no ventre a semente desse amor. A estudante Helena Reis assume uma atitude surpreendente para restituir a saúde do seu amado. A recatada Matilde, viúva de dois homens que amara em simultâneo, desvenda a sua verdadeira natureza quando é vítima de um assalto. A solitária Eulália Belmonte torna a enviuvar no momento em que surpreende o marido numa situação assaz comprometedora com a sua própria mãe. AMARGO AMARGAR Autor: Isidro Sousa Edições Sui Generis Editora EuEdito Nº de Páginas: 170 Páginas 1ª Edição: Outubro 2016 ISBN: 978-989-8856-08-1 Depósito Legal: 418611/16 Encomendas: letras.suigeneris@gmail.com www.euedito.com/suigeneris
Eis a trajectória de seis mulheres... Mulheres que amam. Mulheres que sofrem. Mulheres que amargam amargamente o cálice do sofrimento. Isidro Sousa nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, e vive em Lisboa. Jornalista desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, colaborou com diversas editoras, participou em duas dezenas de obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e organiza todos os projectos da Colecção Sui Generis, que criou em finais de 2015. Amargo Amargar é o seu primeiro livro.
Blogue do autor: http://isidelirios.blogspot.pt
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TERRA DO MEU CORAÇÃO
TERRA DO MEU CORAÇÃO Autor: Lucinda Maria Edição: Município de Oliveira do Hospital 1ª Edição: Dezembro 2016 Depósito Legal: 419055/16 Encomendas: cindamar@hotmail.com Página da Autora: facebook.com/lucindamaria.brito
«Este livro contém prosa. Este livro contém poesia. Este livro contém algumas memórias... algumas recordações... Acima de tudo, contém sentimentos, que brotaram da minha alma e, com alma, transpus para o papel», diz a autora de Terra do Meu Coração, Lucinda Maria. E prossegue: «Este livro é uma viagem... uma viagem onde encontrei pessoas, gente da minha terra, desta terra que tanto amo! Lembrando-as, fi-las reviver, quase perpetuei as suas vidas sacrificadas... as suas vidas úteis e genuínas... Este livro é fruto também da minha saudade de outros tempos... da nostalgia que sinto, ao recordar o passado... ao vivenciar acontecimentos que protagonizei ou de que ouvi falar... Este livro é uma homenagem a tantos oliveirenses que já só vivem no coração de quem, como eu, não os olvidou... jamais os olvidará... Este livro é um grito... um alerta... uma reflexão... porque o “ser” é sempre mais importante do que o “ter”... e os bens materiais são isso mesmo: materiais e, portanto, perecíveis e efémeros. Este livro é meu? Não, este livro é de quem o ler, porque foi a pensar na gente da minha terra que ele se foi construindo.» Lucinda Maria nasceu em Oliveira do Hospital, em 1952. Fez um percurso académico muito bom e tirou o curso do Magistério Primário, começando a leccionar em 1972. Encontra-se aposentada, mas continua a ensinar, agora artes decorativas, na Universidade Sénior de Rotary de Oliveira do Hospital. Tem quatro livros publicados – Palavras Sentidas (2013), Alma (2014), Divagando... (2015) e Terra do Meu Coração (2016) – e participações em variadas obras colectivas. 149
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EXCERTO DE LIVRO
O CASAMENTO
DE EULÁLIA “A viúva notou que ele interessava-se ISIDRO SOUSA Nasceu em 1973, numa aldeia remota das Terras do Demo, concelho de Moimenta da Beira, e reside em Lisboa. Jornalista e editor de publicações periódicas desde 1996, fundou, dirigiu e editou revistas, jornais e guias turísticos, publicou a primeira antologia em Fevereiro de 2001, colaborou com três editoras, participou em duas dezenas de obras colectivas, foi distinguido num concurso literário e é o responsável pelos projectos da Sui Generis, que criou em Dezembro de 2015. Publicou dois livros: «Amargo Amargar» e «O Pranto do Cisne». Página no Facebook e Blogue: www.facebook.com/isidro.sousa.2 http://isidelirios.blogspot.pt
por ela mais do que deveria. A princípio, assustou-se. Parecia-lhe estar a ser desleal para com Miguel. Por outro lado, as emoções que Frederico deixava transparecer descompassavam-lhe o coração. O seu amor com Miguel fora calmo, tranquilo. Insegura e inexperiente, frente aos primeiros contactos com a vida, desde muito cedo procurara no marido o amparo, a compreensão e o carinho que lhe deram segurança e paz. Assustou-se diante de um possível interesse amoroso de Frederico Borgonha e resolveu evitar a presença dele que, ao contrário de Miguel, lhe provocava inquietude e um certo temor.” POR ISIDRO SOUSA
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E
ulália Belmonte aproximou-se da porta envidraçada que dava para a varanda e espiou as três crianças que brincavam no jardim: os seus filhos, Francisco e Catarina, e o pequeno Afonso, filho do ilustre deputado Frederico Borgonha. Observando os miúdos entretidos, sentiase feliz. Francisco e Afonso estimavam-se desde o primeiro momento em que se viram; fora uma amizade sincera entre dois meninos quase da mesma idade. Francisco era órfão de pai, Afonso perdera a mãe no ano anterior. Com a morte de Madalena Borgonha, Eulália apiedou-se daquele infeliz, desejosa de lhe ofertar um pouco do carinho de que os seus próprios filhos desfrutavam; a figura delicada de Afonso causava-lhe emoção, sentindo despertar no seu coração maternal um grande afecto por ele. Por esse motivo, após as cerimónias fúnebres da mãe dele, solicitara permissão ao Sr. Deputado para convidar o menino a passar as tardes na sua vivenda. Afonso era sóbrio, educado, introspectivo e bastante maduro para os seus oito anos de idade. Chegara triste e abatido, mergulhado no seu luto rigoroso, à residência dos Belmonte, contudo, as gentilezas da anfitriã e os agrados de Francisco e Catarina tiveram o poder de devolver-lhe a alegria de viver. Na
companhia dos amigos, ele expandia-se; sorria e brincava, tornava-se mais falante e aquele ar adulto desaparecia do seu rosto, embora Eulália lhe surpreendesse sempre um fulgor de tristeza no olhar vivo e brilhante. – Senhora Dona Eulália, o Sr. Deputado Frederico Borgonha pede licença para ser recebido – anunciou a criada. A inesperada visita provocou-lhe justa surpresa. Desde que lhe solicitara permissão para receber Afonso na sua residência, nunca mais se encontrou com Frederico, embora o menino viesse, com muita frequência, brincar com os seus filhos. No princípio, julgou que ele retomasse as actividades mundanas das quais se afastara desde a fatalidade que vitimara a sua esposa. Mas não. Frederico continuava a levar uma vida retraída, imerso em profunda solidão. – Que entre o Sr. Deputado – ordenou à criada, afastando-se da varanda, admirada. Viu, então, a figura esguia de Frederico Borgonha desenhar-se através do vitral da porta principal. Conduzido ao salão, ele inclinou-se, beijando a mão que a jovem senhora lhe estendeu, dando-lhe as boas-vindas. – Sinto-me honrada em recebê-lo, Sr. Deputado. Acomode-se. – Peço perdão pela intromissão, mas preciso falar-lhe – murmurou Frederico após sentar-se numa poltrona, fixando o rosto singelo da bela viúva. – Sou muito grato pelo que tem feito ao meu filho. Só um coração maternal como o seu poderia ter-lhe oferecido tanto carinho. – Pode crer que o considero como a um filho, Sr. Deputado – volveu a anfitriã, sorrindo com prazer. – Sinto-me feliz por poder dar-lhe um pouco de alegria, mas sei que ninguém poderá, jamais, substituir no coração dele o amor da mãe que perdeu. – O Afonso adora-a – sussurrou Frederico, suspirando imperceptivelmente enquanto a sombra de tristeza que lhe era habitual se reflectia no seu rosto. – A Madalena representava muito para ele. Porém, a Senhora Eulália ajudou-o imenso, prestando-lhe uma assistência que eu diria de um anjo
Eulália sentiu-se emocionada. A voz de Frederico estava vibrante e um tanto embargada e nos seus olhos havia o brilho de uma lágrima que ele conseguira reter. Que homem estranho!, pensou. Vira-o sempre tão discreto, tão reservado; jamais pensara que pudesse acumular toda aquela emoção.
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guardião. Fala com ele, explica-lhe coisas e orienta-o de tal sorte que o Afonso, mesmo no seu sofrimento, conseguiu conservar a alegria e a esperança. Não sei como lhe hei-de agradecer tanta generosidade! Eulália sentiu-se emocionada. A voz de Frederico estava vibrante e um tanto embargada e nos seus olhos havia o brilho de uma lágrima que ele conseguira reter. Que homem estranho!, pensou. Vira-o sempre tão discreto, tão reservado; jamais pensara que pudesse acumular toda aquela emoção. – A sua amabilidade confunde-me, Sr. Deputado. Se quiser demonstrar gratidão, permita que o Afonso nos visite mais vezes. Os meus filhos e eu sentimo-nos muito felizes com a presença dele. Frederico calou-se, pensativo. Momentos depois, revelou:
– Vim justamente para despedir-me, Senhora Eulália. – Suponho que esteja de regresso à Câmara dos Deputados... – Tão cedo não tornarei a Lisboa. Necessito de afastar-me das convulsões sociais, destes ódios e revoltas propícios à violência. Embora a demissão do governo de João Franco pelo novo soberano me tranquilize, a sequência política do regicídio tem tido consequências nefastas que não me agradam. Alguns membros do partido a que pertenço já começaram a ser implicados no assassinato de D. Carlos I e do seu filho Luís Filipe, o Príncipe Real. Esta crise e as políticas conturbadas que têm assolado o País desgastam-me. Por outro lado, a morte da minha esposa... Urge que o Afonso e eu nos afastemos, compreende? Precisamos esquecer... 153
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– Se não vai regressar à assembleia parlamentar, não entendo porque se despede, Sr. Deputado. – Tenciono viajar para Itália. Talvez durante seis meses, talvez por um ano, não sei ainda. – Tanto tempo! – exclamou Eulália, sentindose triste. – Vamos ficar muito sós sem o Afonso... Nos últimos anos, o reino lusitano era governado por um poder político totalmente desacreditado; o sistema político baseado na alternância dos partidos Regenerador e Progressista entrara em colapso e os partidos deixaram de ter capacidade de encontrar soluções viáveis para a resolução dos problemas vigentes. Vivia-se um clima de enorme tensão de índole política, com crescentes instabilidades sociais, sendo iminente o desencadear de um confronto aberto entre aqueles que pugnavam pela mudança de regime (os republica-
nos) e aqueles que pretendiam a manutenção do regime monárquico constitucional. Em Maio do ano anterior, o rei Dom Carlos vira na entrega do Poder a João Franco a possível tábua de salvação da Monarquia; no entanto, o governo de Franco agiu de um modo irascível, sujeitando o povo a uma apertada ditadura, com os direitos individuais fortemente condicionados, a Constituição e o Parlamento suspensos, muitos jornais encerrados e censurados os poucos que se podiam publicar, aumentando assim a agitação social e a animosidade em relação à Monarquia. Isso desencadeou, em Janeiro seguinte, uma tentativa gorada de afirmação republicana por via revolucionária. Embora os Republicanos almejassem o Poder, a revolução organizada pelo Partido Republicano, no qual Frederico Borgonha militava, não teve êxito; mas teve como consequência a detenção das principais figuras do movimento (após prenderem os membros mais evidentes do partido, passaram à caça dos revolucionários subalternos, fazendo a desordem e o pavor lavrarem nas fileiras republicanas) e o lançamento de um decreto que punia os revolucionários com a pena de degredo. – Existe o risco de ser degredado? – alarmouse Eulália quando Frederico mencionou o decreto assinado pelo monarca logo após o fracasso da revolta. – É por esse motivo que vem despedir-se de nós? – Eu não participei na luta, Senhora Eulália. Pelo menos, não directamente. Não podia expor-me. Só os manifestantes se encontram na iminência de serem banidos do País, degredados para África ou Timor. No dia seguinte ao decreto, quando a carruagem da Família Real (que regressara de Vila Viçosa) rumava ao Palácio das Necessidades, consumou-se o regicídio na Praça do Comércio. Do atentado, resultara a morte de D. Carlos I e do herdeiro do trono, D. Luís Filipe. Os próprios dirigentes republicanos ficaram estupefactos, não esboçando qualquer acção para explorar o momento de pânico e de debandada geral que a morte do soberano provocou nas forças monárquicas. Ainda
A causa republicana empolgava Frederico Borgonha, consubstanciava-se com ele. Não obstante, o falecimento precoce da esposa em
circunstâncias misteriosas, das quais só ele tinha conhecimento, fragilizara-o de tal modo que o fizera afastar-se da agitação política, retirando-se para os seus domínios, nos arredores da Capital. E o facto de o Parlamento estar suspenso há quase um ano também pesara nessa decisão.
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taria os presos políticos, amnistiaria os marinheiros que se haviam revoltado dois anos antes e consentiria que se fizessem comícios republicanos. Iniciavase, assim, o período da Monarquia Nova, até que, dois anos mais tarde, os republicanos triunfassem, derrubando a Monarquia... A causa republicana empolgava Frederico Borgonha, consubstanciava-se com ele. Não obstante, o falecimento precoce da esposa em circunstâncias misteriosas, das quais só ele tinha conhecimento, fragilizara-o de tal modo que o fizera afastar-se da agitação política, retirando-se para os seus domínios, nos arredores da Capital. E o facto de o Parlamento estar suspenso há quase um ano também pesara nessa decisão. Enquanto falava, Frederico levantou-se e olhou, através da porta envidraçada, para o jardim onde as crianças brincavam. Nesse instante, como que atraído pelo olhar penetrante do pai, Afonso virou-se. Ao vê-lo, parou de brincar. – Vamos até lá – propôs Eulália, erguendo-se da poltrona. Frederico seguiu-a até ao jardim. – Pai! Que alegria! – exclamou Afonso, surpreendido. – Não vem buscá-lo, pois não? – reclamou Francisco, meio aborrecido. – Ainda é cedo. – O Sr. Deputado veio despedir-se – anuncioulhe a mãe. – O Afonso e o seu pai vão viajar. Pela fisionomia de Afonso, perpassou uma sombra de pavor. Instintivamente, abraçou-se à jovem senhora como quem procura protecção, ocultando o rosto no braço dela. Embora Eulália se sentisse embaraçada, a prova de afecto do menino comoveu-a. A ele, juntaram-se Francisco e Catarina. – Que é isto, meus filhos? – ralhou Eulália, pas-
assim, tentaram relacionar a fatalidade ao Partido Republicano, embora se soubesse que os responsáveis pelo duplo assassinato eram anarquistas e pertenciam à Carbonária, uma associação revolucionária com ligações à Maçonaria. Doravante, a tragédia fez subir ao trono o infante D. Manuel, que tinha apenas dezoito anos de idade, sendo coroado Rei de Portugal nesse mesmo dia, ao anoitecer. A rainha Dona Amélia, sua mãe, sobrevivera defendendo-se com um ramo de flores e acompanhava-o na tarde do dia seguinte, quando o novo rei confessou a sua inexperiência e falta de preparação para reinar e pediu orientação ao Conselho de Estado que presidia. O Conselho votou a demissão de João Franco e a formação de um governo de coligação, a que se chamou Governo de Acalmação, que incluía membros dos partidos Regenerador e Progressista além de independentes, e visava fazer o País voltar à normalidade parlamentar, acabando-se o governo em ditadura. – O atentado foi uma consequência do clima de crescente tensão que perturbava o panorama político nacional – rematou Frederico, frisando que D. Manuel II decidira abandonar a posição seguida pelo último ministério do seu pai. De facto, o jovem soberano anularia brevemente as medidas ditatoriais anteriormente publicadas, sol155
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coisas bonitas merecem ser vistas. – Reconduziu-os à sala, escolheu uma enciclopédia, sentou-se numa poltrona com as três crianças ao redor, abriu o volume e começou a contar: – Irás à Itália, Afonso... à terra dos grandes pintores e dos grandes tribunos. Esta gravura é de Roma, uma cidade que dominou o mundo... – E com a voz doce e imaginosa, sonhadora, foi contando histórias de forma atraente e romanesca sobre cada gravura que examinavam. Os miúdos ouviram-na, interessados, bebendo-lhe as palavras com avidez. Frederico, sentado ao lado, não pôde furtar-se ao encanto da narração feita com erudição, mestria e graça. Que bela mulher! É linda por dentro e por fora!, pensava, fitando a anfitriã com enlevo; jamais conhecera outra dama que reunisse tanta beleza, tanta elegância, tanto amor. Observava-lhe o rosto expressivo a transbordar emoção, transmitindo aos que a ouviam tudo quanto desejava sobre a colorida narrativa da suposta viagem. Quando Eulália terminou, as crianças mostravam-se bastante entusiasmadas. – Será bom veres tudo isso, Afonso – disse Francisco. – Um dia, nós também iremos, não é, mãe? – Certamente, meu filho – concordou a mãe, sorrindo. – Agora, está na hora do lanche. Espero que o Sr. Deputado aceite tomar chá connosco. – É muita gentileza, Senhora Eulália. Enquanto os meninos lanchavam na varanda, Eulália mandou servir o chá na sala e Frederico ciciou: – Nunca imaginei que a notícia da nossa viagem pudesse causar tanto transtorno. Fico a pensar se valerá a pena. – Eulália surpreendeu-lhe nos olhos um brilho novo de admiração; ele prosseguiu: – Perdoe-me se lhe confesso, mas o meu filho e eu temos vivido muito sós. Desde que a minha esposa faleceu, a nossa casa esvaziou-se de calor e alegria. Não temos tido a ventura de en-
sando os braços em volta dos miúdos. – Não quero que o Afonso vá embora – choramingou Francisco. – Por favor, mãe, não deixe! – Eu também não quero – suplicou Catarina já em pranto. – O Sr. Deputado sabe o que convém ao Afonso. Não temos o direito de intervir. Frederico olhava-os admirado, sem saber o que dizer. Por fim, dirigiu-se ao filho: – Vamos viajar, meu filho, conforme combinámos. Temos feito planos de viagem há muito tempo. Tinhas tanto entusiasmo! Esqueceste de tudo? – Não esqueci, pai – respondeu o menino. – Mas eles não podem ir connosco? – Infelizmente, não – sussurrou Eulália. – Mas ficamos à espera do teu regresso. Quando voltares, contarás tudo: os passeios, as diversões, tudo! Sabes aonde vais? – Nunca fui a Itália – balbuciou Afonso. – Vem comigo lá dentro, vou mostrar-te. – Posso ver, mãe? – perguntou Francisco. – E eu também? – quis saber Catarina. – Claro, meus filhos! Irei mostrar-vos quantas 156
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contrar tanto aconchego como o que nos agasalha gurado. Teve ímpetos de desistir da viagem, mas aqui. Não sei se faço bem levar o meu filho para não queria dar uma impressão de leviandade ao longe. O amor é um sentimento tão precioso que, filho, agora desejoso de conhecer Itália. A viagem quando o encontramos sincero, jamais o devemos fazia parte da educação do menino e não poderia menosprezar. descurar esse dever. – Tem razão, Sr. Deputado – anuiu Eulália, fiMal eles partiram para Itália, Eulália e os filhos xando-lhe os olhos expressivos. – A presença do sentiram a falta de Afonso. Transcorridos dois meAfonso traz-nos muita alegria. Sensibiliza-me sases, conversavam animadamente no salão quando ber que ele também nos aprecia. Quando perdi o lhes foi anunciada a chegada dos viajantes. Fredemeu marido, aprendi a valoririco e Afonso traziam no olhar zar a presença daqueles que a alegria do regresso e o prame são caros. Apeguei-me aos zer do reencontro. Recebidos Catarina brincava com a meus filhos, procurei dar-lhes com surpresa, contaram as mais do meu tempo e, para peripécias da viagem, da qual boneca de porcelana que falar com franqueza, estamos Afonso trouxera muitos preAfonso lhe trouxera de juntos o mais que podemos. sentes para os amigos. Quero vigiá-los, amá-los, fazer – Resolvemos voltar, SeItália. Houve um momento tudo aquilo que puder para nhora Eulália. A saudade era em que tropeçou e teria que sejam felizes. muita... – confessou Fredericaído se Frederico, com – Não frequenta a Corte? – co, enquanto os miúdos se enindagou Frederico e ela sacutregavam à palestra fraterna. impressionante rapidez, diu a cabeça negativamente. Durante toda a viagem, a não a tivesse segurado. – Apesar da alegria aparendoçura e a beleza de Eulália Eulália também quis te, sinto-me triste quando tenão lhe saíra da mente e o nho de frequentar-lhe os safilho contribuíra para isso, faimpedir-lhe a queda, lões. Reminiscências da minha lando constantemente dela lançando-se sobre ela. juventude, talvez. Não me acom carinho. Os seus olhos eAo abraçá-los, roçou o grada a hipocrisia, Sr. Deputamotivos buscavam os da anfido. triã com insistência, deixandorosto na face masculina, – E não se sente sozinha, a perturbada. Vivia afogado as mãos estremecendo Senhora Eulália? na solidão e o novo sentimenao contacto daqueles – Às vezes, sim. Mas as festo que lhe despontava no cotas da Corte jamais poderiam ração era diferente de todos braços vigorosos. varrer essa solidão. Prefiro a os outros que experienciara companhia dos meus filhos. É antes. Sentia um calor agradádesolador para uma criança a vel ao fitá-la. Sentia um misto ausência materna. Ninguém lhe poderá preencher de respeito e admiração, mas ao mesmo tempo esse vazio. uma sensação de plenitude. Quando Frederico foi embora, levando o filho A viúva notou que ele interessava-se por ela pela mão, balsamizava-o um sentimento de paz mais do que deveria. A princípio, assustou-se. Paque há muito não experimentava. A presença serecia-lhe estar a ser desleal para com Miguel. Por rena e amorosa de Eulália Belmonte, a sua comoutro lado, as emoções que Frederico deixava preensão, cultura e sinceridade, tiveram o dom de transparecer descompassavam-lhe o coração. O lhe proporcionar tranquilidade ao coração amarseu amor com Miguel fora calmo, tranquilo. Inse-
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gura e inexperiente, frente aos primeiros contactos com a vida, desde muito cedo procurara no marido o amparo, a compreensão e o carinho que lhe deram segurança e paz. Assustou-se diante de um possível interesse amoroso de Frederico Borgonha e resolveu evitar a presença dele que, ao contrário de Miguel, lhe provocava inquietude e um certo temor. Não obstante, Frederico era um homem delicado. Percebendo-lhe o constrangimento, conduziu o assunto de modo impessoal e, aos poucos, a bela viúva tranquilizou-se, rendendo-se ao encanto de uma boa conversa. Frederico era um excelente conversador. A sua voz grave de entoações veludosas extravasava elegância, cultura, inteligência, prendendo a atenção do interlocutor mais exigente. Durante os últimos tempos, vivera entre o remorso de atraiçoar a esposa e a depressão, tornando-se triste, calado, circunspecto. Naquela tarde, reavivado por novas e acalentadoras emoções, mostrava-se tal como era. Encantada, Eulália combateu os pensamentos inoportunos e entregou-se ao prazer da palestra. E os dois foram ficando... Já escurecia e ainda falavam animadamente; Eulália sentada numa poltrona, à frente dele. Entre os dois, Catarina brincava com a boneca de porcelana que Afonso lhe trouxera de Itália. Houve um momento em que tropeçou e teria caído se Frederico, com impressionante rapidez, não a tivesse segurado. Eulália também quis impedir-lhe a queda, lançando-se sobre ela. Ao abraçá-los, roçou o rosto na face masculina, as mãos estremecendo ao contacto daqueles braços vigorosos. Acometida por um forte rubor, ergueu-se rapidamente murmurando desculpas e tentou consolar a filha cuja boneca espa-
tifara-se no chão. – Não chores, Catarina. Mandarei buscar outra boneca para ti. – Mas esta era minha – soluçou a menina, nos braços da mãe. – O Afonso deu-ma... – Vá lá, querida, não chores. Não sabias que se quebrava? Vamos, aprende a ser paciente. Aos poucos, Catarina acalmou-se e a criada levou-a para o quarto. Eulália procurou justificar-se: – Talvez não aprove a maneira livre de educar os meus filhos, tão diferente da rigidez dos nossos costumes. Acontece que somos muito unidos e penso de maneira diferente, Sr. Deputado. Acredito no amor como factor preponderante da educação. Não aprovo o rigor dos castigos e das punições. – Os seus filhos são encantadores, Senhora Eulália – retorquiu Frederico, fitando-a nos olhos. Recordando a maciez da tez feminina no leve e involuntário roçar de momentos antes, sentia-se tentado a beijar-lhe os lábios; porém, dominou-se. – Providenciarei outra boneca para a menina Catarina. – Descuidou-se, não sei se ela merece... – Pois eu acho que merece muito mais. Trarei a boneca com prazer. Não me prive da alegria de lha oferecer – insistiu Frederico, deixando Eulália embaraçada; no entanto, Afonso aproximou-se para as despedidas e ela não teve de responder. E logo a seguir, quando eles foram embora, a jovem senhora considerou que aquele fora um dia feliz... um dia tão feliz que não se recordava de ter vivido outro igual. Introdução do conto O Casamento de Eulália, incluído em Amargo Amargar. Se deseja continuar a história de Eulália Belmonte e Frederico Borgonha, leia o livro...
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ANTOLOGIAS SUI GENERIS
PRÓXIMAS EDIÇÕES Serão editadas, durante o segundo trimestre deste ano, novas obras colectivas com o selo Sui Generis, organizadas por Isidro Sousa, responsável pela Colecção Sui Generis: «Os Vigaristas», uma antologia focada nos vigaristas, que reúne crónicas, poemas e contos do vigário; «Devassos no Paraíso», a primeira antologia Sui Generis dedicada à sedução e ao erotismo; «Fúria de Viver», um Hino à Vida que contempla textos em prosa e poesia de 56 autores lusófonos; e «Crimes Sem Rosto» dedicada ao género policial.
Imediatamente a seguir, pelo início do Verão, serão lançadas «Anjos & Demónios», uma antologia de contos sobrenaturais, e o segundo volume de «A Bíblia dos Pecadores», a obra inaugural da Colecção Sui Generis, que reúne «Os Três Testamentos» com textos maioritariamente em prosa, mas também inclui poesia, agrupada no terceiro testamento: o «Testamento Poético». As datas de lançamento destes livros não foram ainda definidas até ao fecho desta edição; serão brevemente divulgadas pela Sui Generis. Mais informações: http://letras-suigeneris.blogspot.pt
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COLABORAÇÕES & PUBLICIDADE Deseja colaborar com a SG MAG? Publicar uma crónica, um artigo de opinião, um conto, um portfólio, etc... Deseja promover o seu livro? O seu evento? O seu serviço? O seu espaço? Contacte através do email:
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REGULAMENTO
A PRIMAVERA DOS SORRISOS Nova antologia Sui Generis dedicada à Primavera! Sem taxa de participação. Nem qualquer obrigação.
em Prosa e Poesia, para publicá-los sob a forma de um livro, integrado na Colecção Sui Generis. O tema dos textos é livre, assim como o género literário. Podem ser estórias fictícias ou textos reais: conto, crónica, carta, pensamento, desabafo, poema tradicional ou prosa poética, desde que sejam ambientados na Primavera… ou simplesmente dedicados a esta estação do ano... a estação das flores, do verde, da vida. Neste projecto, não existe obrigação de comprar a obra finalizada, embora o possam fazer (se e quando desejarem). Sabemos das dificuldades de muitos autores em cumprirem regras de regulamentos relacionadas com aquisição de livros. Para que não deixem de participar por essa razão, o espaço disponível é mais limitado em relação ao que as antologias temáticas disponibilizam, podendo os textos ocupar até 2 (duas) páginas A4 – embora não se desconsidere a possibilidade de um texto em Prosa ultrapassar esse limite, mediante comunicação e acordo prévio.
«A Primavera dos Sorrisos» é um projecto literário que visa seleccionar textos dedicados à Primavera, 166
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Porque não existe obrigatoriedade de compra e o espaço disponível é menor, o envio de textos para este projecto deverá ser feito igualmente num período menor, ou seja, no prazo de um mês. Data limite: 21 de Junho – dia em que termina, no Hemisfério Norte, a Primavera. Para que se possam organizar, revisar e paginar todos os textos e imprimir o livro logo após a Primavera ter finalizado.
Contamos, então, com a sua participação em «A Primavera dos Sorrisos». Conte-nos as suas estórias desta Primavera. Participe!... Leia o Regulamento (nas páginas seguintes) e não hesite em contactar o Coordenador para dissipar qualquer dúvida que porventura possa existir. E bom trabalho! 167
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3. O tema dos textos a serem apresentados é livre. O género literário fica ao critério dos Autores. No entanto, todos os textos (Prosa e Poesia) devem abordar de algum modo a Primavera, ou serem ambientados nesta estação.
REGULAMENTO | CONDIÇÕES DE PARTICIPAÇÃO
1. «A Primavera dos Sorrisos» é um projecto literário integrado na Colecção Sui Generis, organizado e coordenado por Isidro Sousa, que visa seleccionar textos escritos na Língua Portuguesa, de Autores Lusófonos que residam em qualquer parte do Mundo, independentemente das suas raças, crenças, orientações sexuais e identidades de género, para serem publicados num livro. Só se aceitam participações que obedeçam a este Regulamento. A utilização do Acordo Ortográfico é facultativa.
4. Os textos devem ter títulos próprios (diferentes do nome da Antologia) e ser enviados para o email letras.suigeneris@gmail.com, com a referência «A PRIMAVERA DOS SORRISOS» na linha de assunto, até ao dia 21 de Junho de 2017. Os Autores podem assinar os textos com Nome ou Pseudónimo, devem declarar no corpo do email que aceitam as condições do Regulamento (caso contrário, as participações serão desconsideradas) e enviar uma nota biográfica, até 5 linhas, e contacto telefónico. O Organizador reformulará as notas biográficas que ultrapassem o limite de 5 linhas e ignorará qualquer informação pessoal que as mesmas possam conter; privilegiará somente, para efeitos de publicação, descrições, gostos ou hobbies do Autor, ano e local de nascimento, localidade onde reside e respectivas obras publicadas, individuais ou colectivas.
2. Cada Autor pode apresentar 1 (um) texto – em Prosa ou em Poesia – com o mínimo de 1 (uma) e o máximo de 2 (duas) páginas A4. Se participar com Poesia, pode apresentar 2 poemas, desde que o conjunto dos dois poemas não ultrapasse a totalidade de duas páginas A4. Os textos (revisados pelos Autores) devem ser digitados no Word, Times New Roman, letra tamanho 12, espaçamento simples entre linhas e parágrafos. Rejeitam-se formatos de apresentação que sejam diferentes do Word.
5. A selecção dos textos, efectuada pelo Organizador, irá sendo feita à medida que os mesmos forem re-
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cebidos – com ordenação, no livro, por ordem de chegada. Cada Autor receberá uma comunicação imediata, acusando a recepção do seu texto, sendo o resultado global da selecção divulgado num prazo máximo de uma semana, após a data limite para recepção dos trabalhos. Todos os passos efectuados na produção desta obra colectiva (ou eventuais alterações ao Regulamento) serão sempre comunicados aos Autores.
ridos na Livraria online da EuEdito e noutras plataformas não usufruem do desconto de 10% sobre o PVP. 8. O envio de um texto para o email indicado no Ponto 4 implica (automaticamente) a aceitação de todas as normas deste Regulamento e a autorização dos direitos de publicação na antologia «A Primavera dos Sorrisos», sem qualquer outra con-
6. Não existe taxa de inscrição. Ao contrário do que sucede habitualmente noutras obras colectivas, a participação em «A Primavera dos Sorrisos» não implica qualquer obrigatoriedade de comprar a obra finalizada. Porém, Autores que desejem adquirir esta Antologia deverão manifestar essa intenção logo após a divulgação do resultado da selecção; se não fizerem a reserva atempadamente, ficarão sujeitos à disponibilidade do stock existente, após a primeira impressão. Não obstante, o livro estará sempre disponível na Livraria online da EuEdito e será enviado para várias plataformas de distribuição digital, onde também poderá ser adquirido. 7. O PVP (preço de ven-da ao público) da Antologia será definido após a paginação do livro, tendo em conta o número de páginas da obra a ser editada. Autores participantes podem adquirir quantos exemplares pretenderem, sempre com desconto de 10% sobre o PVP, desde que os mesmos sejam adquiridos directamente à Sui Generis. Exemplares adqui-
trapartida além do desconto de 10% nos exemplares desta obra colectiva que os Autores, porventura, possam querer adquirir. 9. «A Primavera dos Sorrisos» é uma Antologia Sui Generis, integrada na colecção Sui Generis (funda-
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da e dirigida por Isidro Sousa), que será publicada com a chancela EuEdito. As Antologias Sui Generis, representadas pelo Organizador, e a editora EuEdito não reservam a exclusividade ou os direitos dos trabalhos editados. Após o lançamento do livro, cada Autor pode utilizar livremente os seus textos noutras publicações que considere pertinentes.
gue e a Página abaixo indicada. Para esclarecimento de dúvidas ou informações adicionais, devem contactar por email.
Desde já, estão todos convidados a participar nesta Antologia. Esperamos os vossos textos... Prosa ou Poesia. Sejam bem-vindos... e bom trabalho!
10. Se porventura se verificar algum tipo de infracção na originalidade, autenticidade e autoria de um texto apresentado, será da exclusiva responsabilidade do respectivo Autor, ficando o Organizador e a Editora isentos de qualquer responsabilidade legal sobre a infracção cometida – nesse caso, o Autor em questão responderá perante a Lei por plágio, cópia indevida ou outro crime relacionado com direitos de autor.
A PRIMAVERA DOS SORRISOS Colecção Sui Generis Organização Isidro Sousa letras.suigeneris@gmail.com http://letras-suigeneris.blogspot.pt http://www.euedito.com/suigeneris https://www.issuu.com/sui.generis
11. Recomendamos que os Autores se mantenham atentos aos grupos «Antologias SG» e «Isidro Sousa e Autores» no Facebook; através destes grupos, o Organizador estará em contacto permanente com os participantes. Podem também seguir o Blo-
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Sandra Boveto é co-autora de Graças a Deus!, Sexta-feira 13 e Torrente de Paixões
Carlos Pompeu é co-autor de Graças a Deus! e Sexta-feira 13
Cadu Lima Santos é co-autor de Graças a Deus! e Saloios & Caipiras
Guadalupe Navarro é co-autora de Graças a Deus!, A Bíblia dos Pecadores, O Beijo do Vampiro, Vendaval de Emoções, Ninguém Leva a Mal, Sexta-feira 13 e Saloios & Caipiras.
Madalena Cordeiro é co-autora de Graças a Deus! e Torrente de Paixões
Marizeth Maria Pereira é co-autora de Graças a Deus!, Ninguém Leva a Mal, Sexta-feira 13 e Torrente de Paixões
Scarleth Menezes é coautora de Graças a Deus! e Vendaval de Emoções
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Teresa Morais é co-autora de Graças a Deus!, A Bíblia dos Pecadores e Saloios & Caipiras
LIVROS SUI GENERIS
À venda em http://www.euedito.com/suigeneris Leituras gratuitas em https://issuu.com/sui.generis
Jonnata Henrique é co-autor de A Bíblia dos Pecadores, O Beijo do Vampiro, Vendaval de Emoções, Graças a Deus!, Ninguém Leva a Mal, Saloios & Caipiras, Torrente de Paixões e Sexta-feira 13
SG MAG #02 | MAR 2017
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